O Projeto Comprova é uma iniciativa colaborativa e sem fins lucrativos liderada pela Abraji e que reúne jornalistas de 42 veículos de comunicação brasileiros para descobrir, investigar e desmascarar conteúdos suspeitos sobre políticas públicas, eleições, saúde e mudanças climáticas que foram compartilhados nas redes sociais ou por aplicativos de mensagens.
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Investigado por: 2022-06-22

Atividades de Bruno Pereira e Dom Phillips eram legais, ao contrário do que diz post

  • Enganoso
Enganoso
É enganosa a sequência de tuítes que alega que o indigenista Bruno Araújo Pereira e o jornalista britânico Dom Phillips estavam na Amazônia realizando atividades extremistas e ilegais. Pereira tinha autorização da Fundação Nacional do Índio (Funai) e Phillips não entrou em terras indígenas. O indigenista realizava um trabalho de proteção da área e orientação de sustentabilidade ambiental com o povo do Vale do Javari, e o jornalista fazia uma reportagem sobre o uso de tecnologia pelos indígenas para vigiar e denunciar invasões aos territórios.

Conteúdo investigado: Sequência de tuítes afirmando que após uma pesquisa sobre Bruno Pereira e Dom Phillips, assassinados no Vale do Javari, na Amazônia, chegou-se à conclusão que eles realizavam atividades extremistas e ilegais.

Onde foi publicado: Twitter.

Conclusão do Comprova: É enganosa a publicação que afirma que Bruno Pereira e Dom Phillips, cujos assassinatos foram confirmados pela Polícia Federal em 17 e 18 de junho, realizavam atividades extremistas e ilegais na Amazônia. Pereira foi à região, com autorização, para participar de reuniões em aldeias na área da calha do rio Curuçá, enquanto Phillips estava escrevendo sobre uma equipe de vigilância criada pelos povos originários para documentar e denunciar as invasões e crimes em seu território. A atuação do jornalista, no entanto, foi fora da área indígena.

O conteúdo questiona a credibilidade do trabalho dos dois profissionais, dando a entender que eles realizavam atividades ilegais. “Tinha vários inimigos na região, não só por questões legais, mas também por questões pessoais”, diz um trecho em referência ao indigenista, sem apresentar provas.

Para o Comprova, enganoso é todo conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações, que induz a uma interpretação equivocada e confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos de maior alcance nas redes sociais. Até o dia 22 de junho, o tuíte teve mais de 8 mil curtidas e 3,1 mil compartilhamentos.

O que diz o autor da publicação: A autora do post verificado é apoiadora do presidente Jair Bolsonaro (PL) e costuma publicar conteúdos enaltecendo pautas defendidas por ele. O Comprova entrou em contato com a autora via mensagem no Twitter, mas não obteve resposta até o fechamento desta verificação.

Como verificamos: O primeiro passo foi buscar informações a respeito do indigenista Bruno Pereira e do jornalista Dom Phillips, do trabalho que estavam desenvolvendo no Vale do Javari (AM) e se eles teriam autorização para estar no local.

Para isso, foram consultadas reportagens jornalísticas (BBC News Brasil, G1, Estado de Minas, CNN Brasil, UOL Notícias, Globo) e entidades como a Funai, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e a União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (Univaja).

O Comprova também procurou por notícias sobre a destruição de balsas citada pelo post aqui verificado (Folha, Estadão, UOL, Veja) e contactou a assessoria da Polícia Federal (PF) no Amazonas para esclarecimentos acerca do episódio.

Bruno Pereira tinha autorização para atuar no Vale do Javari

Em 8 de junho, três dias depois do desaparecimento de Bruno Pereira e Dom Phillips, o presidente da Funai, Marcelo Xavier, disse em entrevista à Empresa Brasil de Comunicação (EBC) que os homens não teriam comunicado aos órgãos sobre a viagem ao Vale do Javari. No entanto, documentos oficiais obtidos pela TV Globo apontam que o indigenista cumpriu os protocolos legais e que Phillips não entrou em terras indígenas.

Conforme o documento emitido pela Funai, Bruno Pereira foi autorizado a entrar no Vale do Javari e participar de reuniões em cinco aldeias na região da calha do rio Curuçá para conversar sobre o território e estratégias para protegê-lo entre os dias 17 e 30 de maio. Ele entrou no dia 21, mas não estava acompanhado do jornalista Dom Phillips.

A família do jornalista disse ao Jornal Nacional que ele só encontrou o indigenista no dia 1º de junho, em Atalaia do Norte, após Pereira ter visitado as aldeias indígenas.

Apesar de a autorização possuir vigência apenas até o dia 30 de maio, o local em que o indigenista e o jornalista foram vistos pela última vez, no dia 5 de junho, não exigia qualquer documentação para acesso, como noticiou o jornal CNN Brasil.

Além disso, Bruno Pereira e Dom Phillips poderiam ter entrado no Vale do Javari a convite dos indígenas, mesmo sem autorização da Funai, de acordo com a assessora jurídica da Univaja e do Observatório dos Povos Isolados, Carolina Santana.

“A lei brasileira garante sobretudo a autonomia dos povos indígenas sobre seus territórios. As leis e normativas internacionais também. O Brasil é signatário das normativas que garantem a autonomia. O próprio regulamento da Funai coloca a autonomia indígena como condição sine qua non para autorização do ingresso”, disse Santana ao Jornal Nacional.

A Funai foi procurada a respeito da autorização, mas não respondeu até o fechamento da verificação.

Dom Phillips fazia reportagem fora de terras indígenas

Ao contrário do que alega a postagem, Dom Phillips não fazia reportagem sem autorização da Funai e do Ibama, e sem o conhecimento dos governos estadual e federal. Na realidade, o jornalista estava escrevendo sobre uma equipe de vigilância criada pelos povos originários para documentar e denunciar as invasões e crimes em seu território. Tudo fora da área indígena.

Em entrevista ao UOL Notícias, o indigenista Leonardo Lennin, do Observatório dos Direitos Humanos dos Povos Indígenas Isolados e de Recente Contato, disse que, com a viagem, Phillips queria entender como a Univaja estava usando tecnologia, como drones e imagens de satélite, para documentar invasões e denunciá-las às autoridades.

Além do trabalho como jornalista, Dom Phillips estava escrevendo um livro sobre a floresta amazônica. Como noticiaram o G1 e o jornal britânico The Guardian, do qual Phillips era um colaborador de longa data, o projeto teria apoio da Fundação Alicia Patterson, instituição sem fins lucrativos que concede bolsas a jornalistas que trabalham para a realização de projetos independentes.

Queima de balsas no Amazonas

O conteúdo investigado acusa especificamente Bruno Pereira de atividades “extremistas” e cita “o episódio da queima das balsas”. Ao contrário do que sugere a autora do post, de que a ação teria sido irregular, as balsas foram destruídas por autoridades brasileiras com amparo na legislação, uma vez que eram estruturas utilizadas para o cometimento de crimes ambientais na região.

Em novembro de 2021, centenas de balsas de dragagem operadas por garimpeiros empreenderam uma corrida por ouro no rio Madeira, importante afluente do rio Amazonas. A ação ilegal deflagrou a operação Uiara, realizada pela Polícia Federal, Ibama e Forças Armadas.

Na primeira fase da intervenção foram presas três pessoas e destruídas 131 balsas apreendidas.

Ao UOL, o superintendente da PF no Amazonas, Leandro Almada, disse que não houve nenhum registro de violência, uso de força ou disparo de arma de fogo.

O que se pretendia com a destruição dos equipamentos era inviabilizar o maquinário utilizado para a prática do crime ambiental. A ação tem previsão legal e é regulamentada pelas Leis 9605/98 (Lei de Crimes Ambientais), e 8176/91 (Usurpação de bens da União).

Ainda conforme a matéria do UOL, a queima é feita com o próprio combustível encontrado nas estruturas, que normalmente carregam grandes tanques de plástico com centenas de litros de gasolina.

De acordo com matéria da Veja, em setembro de 2019, Bruno Pereira teria conduzido a operação Korubo, que terminou na destruição de 60 balsas usadas por garimpeiros ilegais no Vale do Javari. Por este motivo teria sido exonerado do cargo de coordenador de povos isolados da Funai.

O indigenista foi demitido do cargo 15 dias após a operação, que envolveu cerca de 60 agentes da Funai, da Polícia Federal e do Ibama. Segundo o UOL, após a Korubo, os garimpeiros teriam aumentado a pressão sobre a Funai pedindo pela demissão de servidores que estavam comandando ações desse porte na Amazônia – o que incluía Bruno Pereira.

Conforme o G1, a exoneração do indigenista veio “após pressão de setores ruralistas ligados ao governo do presidente Jair Bolsonaro”.

Desde a operação Korubo, a Funai não realizou mais nenhuma grande ação na região, que sofre também com a invasão de caçadores e pescadores ilegais.

Depois disso, em janeiro de 2020, Pereira pediu licença para atuar na proteção de indígenas fora do órgão e passou a atuar junto da Univaja para ensinar os povos originários a monitorar suas terras com o uso de tecnologias como drones.

Ao Comprova, a assessoria da PF no Amazonas informou que “as informações solicitadas fazem parte de investigação policial que tem o andamento totalmente sigiloso.”

A Funai, a Univaja e o Ibama foram procurados, mas não houve retorno.

Quem eram Bruno Pereira e Dom Phillips

Bruno da Cunha de Araújo Pereira era indigenista e um dos maiores especialistas em indígenas que vivem em isolamento no Brasil. Pereira estava licenciado da Funai e trabalhava como assessor da Univaja. Nascido no Recife, tinha 41 anos e deixa esposa e três filhos.

O jornalista Dom Phillips colaborava com diversos jornais no exterior, como o The New York Times, The Guardian e The Washington Post. Ele realizou diversas viagens para a Amazônia, onde fez reportagens sobre desmatamento e crimes. Ele vivia no Brasil há 15 anos e era casado com uma brasileira.

Phillips e Pereira já haviam viajado juntos para a Amazônia e, nesta ocasião, o jornalista estava acompanhado do indigenista brasileiro para coletar dados para um livro que estava escrevendo sobre como salvar a floresta.

No dia 5 de junho, o indigenista e o jornalista desapareceram a poucos quilômetros do Vale do Javari, que é a segunda maior reserva indígena do Brasil. Na última vez que foram vistos, eles pararam na comunidade de São Rafael, às 6h, onde tinham uma reunião marcada com o líder pescador Manoel Vitor Sabino da Costa, conhecido como “Churrasco”.

A dupla deveria ter chegado à Atalaia do Norte duas horas depois, mas isso nunca aconteceu. Os indígenas da Univaja foram os primeiros a alertar sobre o desaparecimento e começaram as buscas às 14h.

Em 15 de junho, um dos principais suspeitos pelo desaparecimento, Amarildo Oliveira da Costa, conhecido como “Pelado”, confessou ter participado do assassinato da dupla. Entre os dias 17 e 18, a PF confirmou o reconhecimento dos restos mortais pertencentes ao indigenista e ao jornalista.

De acordo com a perícia, eles foram assassinados com armas de caça. Bruno Pereira foi atingido por três tiros, enquanto Dom Phillips foi morto com um tiro.

Até o momento, a PF do Amazonas identificou oito suspeitos de terem ajudado a ocultar os corpos de Pereira e Phillips. Três suspeitos foram presos: Amarildo da Costa de Oliveira, conhecido como “Pelado”; Oseney da Costa de Oliveira, o “Dos Santos”; e Jeferson da Silva Lima, chamado de “Pelado da Dinha”.

Resposta do governo brasileiro

Além de críticas a falas do presidente Bolsonaro, que disse que a viagem dos dois era uma “aventura não recomendável” e que Phillips era “malvisto” na região, o governo brasileiro foi criticado por não agir rapidamente nas buscas.

No dia seguinte ao desaparecimento, o Comando Militar da Amazônia, do Exército, emitiu nota afirmando que estava “em condições de cumprir missão humanitária de busca”, mas que a ação só seria tomada “mediante acionamento por parte do Escalão Superior”.

No dia 10 de junho, a agência da Organização das Nações Unidas (ONU) para os Direitos Humanos criticou a lentidão das buscas e pediu que o governo brasileiro redobrasse os recursos e esforços disponibilizados nas buscas.

Nos últimos dias, diante da repercussão internacional do caso, políticos, organizações e artistas também denunciaram a atuação dos órgãos públicos e lamentaram a morte de Pereira e Phillips.

Por que investigamos: O Comprova investiga conteúdos suspeitos que tenham viralizado nas redes sociais sobre a pandemia de covid-19, políticas públicas do governo federal e eleições presidenciais. A peça de desinformação checada tenta desqualificar a atuação de dois profissionais que lutavam pelos direitos e proteção dos povos originários do Brasil enquanto ainda se investiga os assassinatos. O crime se tornou pauta eleitoral uma vez que colocou em evidência as políticas públicas do governo Bolsonaro para a região amazônica.

Outras checagens sobre o tema: Em 14 de junho, o site Boatos.org checou a mesma peça de desinformação verificada pelo Comprova e concluiu que Bruno Pereira e Dom Phillips tinham autorização para estar no Vale do Javari.

Em verificações anteriores, o Comprova mostrou que protesto de indígenas na Bahia era por melhoria na educação e não por verba para ato contra Bolsonaro; que a Polícia Federal negou que ONGs que atuam na Amazônia transportaram ouro ilegalmente e que vídeo distorce dados sobre queimadas na Amazônia.

Política

Investigado por: 2022-05-30

Imposto estadual é menor parte do preço do botijão de gás

  • Falso
Falso
São falsos os valores apresentados em um post no Facebook sobre a composição do preço do botijão de Gás Liquefeito de Petróleo (GLP), o gás de cozinha. Ao contrário do que afirma a postagem, o imposto estadual (ICMS) corresponde à menor parcela do valor total, e não à maior. E os tributos federais (PIS/Cofins) que incidiam sobre o gás de cozinha foram anulados por decreto do presidente Jair Bolsonaro (PL) em março de 2021. A composição atualizada do preço do botijão pode ser consultada no site da Petrobras.

Conteúdo investigado: Post no Facebook traz a imagem de um botijão de gás. Um texto sobreposto à foto apresenta valores relativos ao preço do produto e sua composição: “Preço na Petrobrás, R$ 43,20; Frete Distribuição, R$ 19,00; Imposto Federal, R$ 2,80; Imposto Estadual, R$ 59,25; Total, R$ 124,45”. A palavra “federal” aparece circulada em vermelho.

Onde foi publicado: Facebook e WhatsApp.

Conclusão do Comprova: São falsos os valores apresentados em um post no Facebook sobre a composição do preço do botijão de gás. De acordo com a postagem, o produto custaria um total de R$ 124,45, dos quais R$ 43,20 corresponderiam ao “preço na Petrobras”, R$ 19,00 seriam do “frete [de] distribuição”, R$ 2,80 seriam de um “imposto federal” e R$ 59,25 viriam do “imposto estadual”.

A composição real e atualizada do preço do botijão de gás pode ser consultada em um gráfico no site da Petrobras, elaborado a partir de dados da ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis). Na semana de 15 a 21 de maio de 2022, o preço médio do botijão de 13 kg foi de R$ 112,89, composto da seguinte forma:

| Gráfico elaborado pela Petrobras a partir de dados da ANP

Compartilhada em um grupo de apoio ao presidente Jair Bolsonaro (PL), a publicação mente ao dizer que o imposto estadual (o ICMS) corresponde à maior parcela do preço do gás. Isso acaba por reforçar uma tese bolsonarista amplamente rejeitada por economistas, segundo a qual os governos estaduais seriam responsáveis pelo aumento do preço dos combustíveis. Como é possível constatar no gráfico acima, o ICMS tem a menor participação sobre o preço do botijão. E, embora o preço do gás tenha aumentado nos últimos meses, o valor do ICMS está congelado desde novembro de 2021.

A imagem do post também dá destaque à participação pequena de um suposto “imposto federal” no valor de R$ 2,80. Esse tributo corresponde ao PIS/Cofins, que não é mais cobrado do gás de cozinha desde março de 2021, por decreto do presidente Bolsonaro. O valor real do tributo era de R$ 2,18. No último mês em que foi cobrado, fevereiro de 2021, o preço médio do botijão ainda era de R$ 79,60, bem inferior aos R$ 124,45 citados no post falso.

| Tabela de evolução dos preços do botijão de gás de 13 kg em 2021, disponível no site da ANP

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma falsidade.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos de maior alcance nas redes sociais. O post original com os valores falsos foi feito em 13 de maio no Facebook e, até 30 de maio, reuniu 888 compartilhamentos. O conteúdo foi repostado em um grupo de apoiadores de Bolsonaro em 22 de maio, onde acumulou outros 719 compartilhamentos, 90 comentários e mais de 502 curtidas.

O que diz o autor da publicação: Por meio de mensagens diretas no Facebook, o Comprova entrou em contato com os perfis responsáveis pelo post original e pelo compartilhamento no grupo bolsonarista, mas não obteve resposta até a publicação da checagem.

Como verificamos: O Comprova iniciou a checagem buscando informações sobre a composição de preços de venda do GLP ao Consumidor disponíveis no site da Petrobras. Na sequência, acessamos um Sistema de Levantamento de Preços disponibilizado pela ANP.

A reportagem entrou em contato por e-mail com a agência na tentativa de conversar com um representante sobre a composição do preço do gás de cozinha. Por meio da assessoria de imprensa, a ANP respondeu com um link que direciona ao próprio site, alegando que todas as informações relativas ao assunto estão disponibilizadas online.

A equipe também fez contato por e-mail com a assessoria da Petrobras, que respondeu com links para a página no site da estatal com os gráficos de composição dos preços dos combustíveis e para a nota emitida pela empresa sobre o mais recente ajuste no preço do GLP.

O Comprova ainda entrevistou o economista César Augusto Bergo, professor de especialização em mercado financeiro da Universidade de Brasília (UnB), para entender melhor os motivos dos aumentos recentes no preço do botijão de gás.

 

Sobre o gás de cozinha

Segundo a Petrobras, o gás de cozinha comum, também conhecido como gás liquefeito de petróleo (GLP), é o principal combustível de uso doméstico, utilizado principalmente nos fogões residenciais, através de um botijão de 13kg. A Lei 9.478/97, que tornou aberto o mercado de combustíveis no país e retirou o monopólio exercido pela Petrobras no setor, permitiu que, desde 2002, o preço do GLP fosse definido pelo próprio mercado. Atualmente, o produto é regulamentado pela ANP.

O botijão de gás que chega até a casa do consumidor passa por várias etapas de produção e distribuição que influenciam no preço final. O produtor ou importador vende o GLP para as companhias distribuidoras do país, que repassam o produto para o segmento industrial ou para pontos de revenda que entregam o gás aos clientes comuns.

A Petrobras indica que o preço praticado pela estatal sobre o GLP na revenda para as distribuidoras leva em consideração o valor do produto e os tributos. Em relação aos impostos, existem os que são cobrados pelos estados (ICMS) e os pela União (CIDE, PIS/PASEP e Cofins). Além disso, o consumidor final também paga pelos custos e lucros das distribuidoras e pontos de revenda.

A ANP publica a evolução dos preços de GLP desde novembro de 2001. São apresentados gráficos consolidados com os preços médios ponderados dos produtores, incluindo as parcelas de ICMS e os impostos federais.

De acordo com a agência, a última amostra de preços do produto (abril de 2022) indica que, em média, o preço final é de R$ 113. Do valor, o ICMS representaria R$ 13,69 e a realização do produtor seria de R$ 56,25. A margem bruta de distribuição é de R$ 15,18 e a de revenda R$ 27,87. Os impostos federais estão zerados.

Alta no preço do GLP

Segundo César Augusto Bergo, professor de especialização em mercado financeiro da Universidade de Brasília (UnB), o aumento abrupto do consumo pós-pandemia contribuiu bastante para a variação de preço no botijão de gás. O economista comenta que o mercado de GLP teve uma queda grande do consumo no início da pandemia e depois uma retomada veloz, muito acima do esperado. Esse cenário afetou bastante a oferta e demanda do produto.

“A pressão crescente da demanda sobre a oferta fez o preço aumentar mundialmente e aqui no Brasil cerca de 35% do gás consumido é importado. Dessa porcentagem, 67% vêm da Bolívia, uns 14% dos Estados Unidos e outros sete países são responsáveis pelos restantes da importação. Tudo pago em dólar também. Então, tanto a questão dos preços subirem quanto também a volatilidade observada na moeda do dólar acaba pressionando o preço do gasto”, afirma Bergo.

De acordo com o professor, outro fator importante para o encarecimento do gás de cozinha é a questão do transporte entre os locais de produção, distribuição e revenda. “As longas distâncias entre o centro de produção e os de consumo ajudam no aumento do preço. Também a questão de acesso a determinadas localidades. Tudo isso acaba contribuindo também para onerar o gás”, ressalta.

Sobre a composição do preço do produto no Brasil, o professor explica que, excepcionalmente, o ICMS é o único imposto que incide sobre o gás porque os impostos federais (CIDE e PIS/COFINS) foram suspensos por decisão do governo publicada no Diário Oficial da União no dia 9 de março de 2022.

O economista detalha: “Atualmente, a alíquota fica em média em 13% do valor do botijão. Por volta de 38% é a parcela que fica tanto nas distribuidoras quanto nas revendas. Há uma variação nesse percentual em favor ou da revenda ou da distribuidora. Cerca de 48% fica para extração e refino”.

Alterações no cálculo do ICMS

O presidente Jair Bolsonaro sancionou, em março deste ano, a lei complementar 192/2022, que determina a criação de uma alíquota única em todos os estados para o ICMS de combustíveis. A medida ocorreu em meio a aumentos sucessivos nos preços anunciados pela Petrobras. À época, a alta dos combustíveis estava atrelada também ao conflito entre a Rússia e a Ucrânia.

O ICMS é o principal encargo estadual e, até então, varia de estado para estado. A alíquota única que os estados cobrarão ainda não foi definida. O texto também concedeu isenção do PIS/Pasep e da Cofins sobre combustíveis ao longo do ano de 2022. As novas normas alcançam não apenas o GLP (incluindo o derivado de gás natural), como a gasolina, etanol, diesel e o biodiesel.

O projeto sancionado pelo presidente estabelece a chamada monofasia, ou seja, o ICMS passa a incidir apenas uma vez sobre os combustíveis: gasolina e etanol, diesel e biodiesel e o GLP. Na prática, a cobrança do ICMS é feita apenas nas refinarias e não mais em toda a cadeia de distribuição.

Após a sanção presidencial, ainda no mês de março, o Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) – formado por secretários de estado de Fazenda – prorrogou o Convênio 01/2022, mantendo o congelamento da base de cálculo do ICMS para o gás de cozinha até 30 de junho de 2022.

Por que investigamos: O Comprova investiga conteúdos sobre pandemia, eleições e políticas públicas que atinjam grau de viralização nas redes sociais. Informações falsas ou enganosas sobre a aplicação de imposto geram um entendimento errado do funcionamento da economia brasileira, influenciando a percepção da população sobre a organização orçamentária do Estado e o desenvolvimento de políticas públicas.

Outras checagens sobre o tema: Anteriormente, o Projeto Comprova mostrou que é enganosa a postagem afirmando que preço do gás só não caiu significativamente por causa dos governadores; que o pagamento de indenização à Justiça dos EUA não influenciou preço da gasolina e que post compara de forma enganosa valores do gás de cozinha com o salário mínimo.

Política

Investigado por: 2022-05-25

Vídeo engana ao sugerir que motorista pode pedir reembolso de ‘imposto federal’ de combustível

  • Enganoso
Enganoso
É enganoso um vídeo em que um homem pede o reembolso de um “imposto federal” em um posto e incentiva outras pessoas a fazerem o mesmo. Não houve isenção de tributos federais sobre a gasolina, combustível usado no abastecimento em questão. Postos de combustíveis não recolhem impostos e, por isso, não podem devolver aos clientes valores referentes a eles.

Conteúdo investigado: Vídeo no qual um homem afirma que postos de combustíveis devem devolver aos clientes parte do valor pago na hora de abastecer o carro referente a impostos federais. Ele alega que o presidente Jair Bolsonaro (PL) teria zerado os tributos.

Onde foi publicado: Kwai e YouTube.

Conclusão do Comprova: É enganoso um vídeo gravado no interior de São Paulo no qual um homem aconselha consumidores a solicitarem a postos de combustíveis o ressarcimento de parte do valor pago referente a impostos federais. Ele alega que os combustíveis teriam sido isentos de tributos pelo governo de Jair Bolsonaro e que a devolução do valor cobrado “é um direito, está na lei”.

O governo federal anunciou recentemente a isenção de tributos federais sobre o diesel e o etanol importado para conter o aumento no preço desses combustíveis. A medida não inclui o etanol, a gasolina e o Gás Natural Veicular (GNV) vendidos nas bombas.

Não há como os postos devolverem o valor do tributo porque não são esses estabelecimentos que fazem o recolhimento. Os tributos são cobrados em fases anteriores da cadeia de produção.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo que usa dados imprecisos e confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos de maior alcance nas redes sociais. No Kwai, foram mais de 134 mil visualizações e 15 mil reações. No YouTube, o vídeo foi visto ao menos 283 mil vezes.

O que diz o autor da publicação: Não foi possível encontrar o autor do vídeo porque ele não se identifica. As contas no Kwai e no YouTube que compartilharam os vídeos de maior viralização não disponibilizam uma forma de contato.

Como verificamos: Por e-mail, o Comprova consultou a Receita Federal, por meio do Ministério da Economia, e a Secretaria da Fazenda e Planejamento do Estado de São Paulo, para checar a validade da suposta prática de devolução dos valores relativos a impostos. Também procuramos um posicionamento da Federação Nacional do Comércio de Combustíveis e de Lubrificantes (Fecombustíveis).

Para obter informações recentes sobre isenções de impostos sobre combustíveis, foram consultadas notícias publicadas por veículos de imprensa profissionais (Estadão, eInvestidor).

Para localizar o estabelecimento em que o vídeo foi gravado, foram feitas buscas no Google Street View a partir de informações disponíveis na nota fiscal que foi mostrada.

 

O vídeo

O vídeo está dividido em duas partes. Na primeira, um rapaz diz que seu pai teve “devolvido o dinheiro do imposto federal” — sem falar qual o combustível — e chama “Todo mundo, por favor, pede o imposto”.

Na segunda, um homem que se identifica apenas como Francisco fala com sotaque castelhano. Ele diz que “o presidente tirou” os impostos federais sobre os combustíveis, mas que um posto cobrou os tributos mesmo assim — o narrador não diz qual combustível usou em seu abastecimento, mas mostra uma nota fiscal onde é possível ler que foi com gasolina aditivada. Ele alega que, ao questionar uma funcionária, teve o vaor referente aos impostos devolvido (R$ 38). “Quem quiser chegar, reclame. É um direito, está na lei”, aconselha.

Ao dizer isso, ele mostra a nota fiscal da compra. É possível ver que ele está no Auto Posto Santo Antônio, localizado na Avenida Doutor Teixeira de Barros, 1258, em São Carlos, interior de São Paulo. A informação bate com a declaração do narrador de que o caso ocorreu em um posto Ipiranga “na Vila Prado”, que é o bairro da cidade onde fica o estabelecimento.

| Nota fiscal mostra o endereço do estabelecimento. Foto: Reprodução

Também pela nota fiscal, dá para ver que ele abasteceu com gasolina aditivada. A data da compra foi 16 de maio.

| Nota fiscal mostra que o homem abasteceu com gasolina aditivada (dir.) no dia 16 de maio (esq.). Foto: Reprodução

Para conferir se os dois momentos são da mesma situação, o Comprova procurou o endereço mostrado na nota fiscal no Google Street View e comparou as edificações vizinhas com aquelas mostradas no vídeo viral. Em ambos os casos, é possível ver uma loja com a fachada em azul e branco. Ao lado, pode-se ver uma casa com um jardim na frente. Assim, foi possível confirmar que as duas partes do vídeo foram gravadas no mesmo posto.

| O Comprova confirmou, por meio do Google Street View, que o vídeo realmente foi gravado em um posto de São Carlos (SP). Foto: Google Street View/Reprodução

Tributos federais continuam valendo para a gasolina

A nota fiscal exibida no vídeo mostra que o abastecimento foi feito com gasolina aditivada. Esse combustível permanece com a tributação federal e não foi abarcado por decisões recentes do governo federal para isenção de impostos.

O presidente Jair Bolsonaro determinou, em março, a isenção dos impostos federais (PIS, Cofins e Cide) sobre o diesel durante dois meses, contados a partir de 1º de março. A medida foi anunciada como uma resposta à insatisfação de parcela da população com os aumentos da Petrobras sobre o preço dos combustíveis.

Também em março, o Ministério da Economia zerou os tributos federais para o etanol importado. A isenção vale tanto para o etanol misturado na gasolina quanto para o vendido separadamente, até o final do ano.

Em nota divulgada na sexta-feira (20), a Fecombustíveis, representante dos postos de gasolina, informou que somente os impostos federais (PIS/Cofins) incidentes sobre o óleo diesel foram zerados. Os demais combustíveis, como gasolina, etanol e GNV, continuam sofrendo a incidência desses tributos.

Impostos não são recolhidos pelos postos

À agência Lupa, uma funcionária do posto informou que a atendente mostrada no vídeo devolveu o dinheiro porque se sentiu “coagida”. Ela disse que não é procedimento do posto devolver o imposto federal. O Comprova entrou em contato com o estabelecimento e pediu o contato do gerente para que ele confirmasse as informações. A funcionária que atendeu pediu que a reportagem deixasse um contato para retorno, mas não houve resposta até a publicação.

É falso que seja possível solicitar aos postos de combustíveis a devolução do imposto federal porque a tributação é concentrada nas refinarias, explicou o Ministério da Economia por meio de nota. “Os postos possuem alíquota zero nas suas vendas e não recolhem Pis/Cofins.”

A Secretaria da Fazenda de São Paulo (Sefaz/SP) reforçou que os estados regularam recentemente a tributação monofásica do ICMS (imposto estadual sobre o diesel) e permaneceu a cobrança nos produtores ou importadores. “O posto já adquire o combustível com o imposto recolhido”, sintetiza.

A Sefaz/SP ainda explica que o valor de R$ 38 mostrado na nota fiscal “parece referir-se” ao previsto na Lei 12.741/12, que estabelece a obrigatoriedade de informar ao consumidor o valor aproximado da carga tributária que influencia o preço de venda.

“Essa informação, de caráter informativo ao consumidor, não gera nenhuma obrigação, seja tributária ou de devolução”, diz a secretaria. E conclui: “Não cabe, portanto, aos postos revendedores de combustíveis a devolução de ICMS, uma hipótese não prevista na legislação.”

As explicações foram reforçadas pela Fecombustíveis. A entidade disse não haver a possibilidade de devolução de imposto no posto de gasolina, uma vez que o estabelecimento não recolheu tais tributos. E conclui afirmando que eventuais falhas nos softwares que registram a atualização de recolhimento de tributos não alteram a forma como o imposto é recolhido. “Vale destacar que esta suposta falha não traz prejuízo ao consumidor e nem benefício ao revendedor.”

Por que investigamos: Em sua quarta fase, o Comprova checa conteúdos sobre a pandemia, eleições e políticas públicas do governo federal. O país vive um momento de alta da inflação causada pela retomada no ritmo das atividades econômicas permitida pela vacinação contra a covid-19 e por incertezas com a guerra da Ucrânia. O aumento do preço dos combustíveis é um dos elementos que pressionam a inflação para cima e fonte de descontentamento da população com o governo federal, gerando um ambiente propício para a circulação de desinformação sobre o tema. Nesta segunda-feira (23), o presidente Jair Bolsonaro demitiu o terceiro presidente da Petrobras em seu governo.

Outras checagens sobre o tema: O Comprova já mostrou que é enganosa a comparação feita em uma postagem com percentuais sobre reajuste da gasolina no Brasil e crescimento patrimonial da família Bolsonaro. Também mostrou que circula fora de contexto um vídeo no TikTok em que Lula chama um colaborador da Petrobras de corrupto.

O UOL Confere e a Lupa também checaram o vídeo aqui analisado. No ano passado, o Fato ou Fake desmentiu um vídeo gravado em Cuiabá e que trazia alegações semelhantes.

Política

Investigado por: 2022-05-20

Post confunde ao mencionar aumento de salário de Bolsonaro e ministros

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É enganoso tuíte que diz que o presidente Jair Bolsonaro (PL) aumentou seu próprio salário e de seus ministros em até 69% e que a mídia pouco repercutiu o fato. Na verdade, os militares da ativa que ocupam postos no Executivo puderam acumular a remuneração das duas funções graças a uma portaria publicada em 2021. Com isso, Bolsonaro, que é capitão da reserva, teve um acréscimo de 7,55% em sua remuneração.

Conteúdo investigado: Tuíte que trata sobre o aumento salarial do presidente Jair Bolsonaro e dos ministros em até 69% e com críticas à imprensa por repercutir pouco o assunto.

Onde foi publicado: Twitter

Conclusão do Comprova: É enganoso tuíte que diz que o presidente Jair Bolsonaro (PL) aumentou seu próprio salário e de seus ministros e que a mídia pouco repercutiu o fato. Na verdade, os militares da ativa que ocupam postos no Executivo puderam acumular a remuneração das duas funções graças a uma portaria do Ministério da Fazenda publicada em 2021. Com ela, alguns militares obtiveram um ganho de mais de 60%, mas Bolsonaro recebeu um acréscimo de 7,55%. Embora um aumento tenha sido concedido, a medida é de 2021, mas, na postagem, não há nenhuma referência à data, levando a análises equivocadas.

No post investigado, comentários como “Que absurdo!! E o Guedes querendo saquear o FGTS do trabalhador” ou “vai ver o cartão corporativo não tá dando conta” demonstram o equívoco de alguns leitores na interpretação do conteúdo, publicado sem contexto.

A postagem também critica a cobertura jornalística sobre o assunto, como se não tivesse havido repercussão. No entanto, na época do aumento, vários veículos trataram do tema, como Estadão, Folha de S. Paulo, Estado de Minas, Correio Braziliense, Valor, CNN e G1.

O Ministério da Economia informou, em nota, que não há previsão de reajuste para o presidente e o primeiro escalão do governo em 2022.

Para o Comprova, enganoso é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos de maior alcance nas redes sociais. O tuíte aqui investigado teve quase 20 mil interações até o dia 20 de maio, entre curtidas, retuítes e comentários.

O que diz o autor da publicação: O Twitter do autor da publicação é fechado para mensagens diretas, mas ele foi localizado no Instagram, canal pelo qual o Comprova enviou questionamentos sobre a postagem. Até a publicação da verificação, ele não respondeu.

Como verificamos: Ao consultar o Google com as palavras-chave “Bolsonaro” + “aumento” + “salário” + “69%”, a pesquisa retornou com conteúdos jornalísticos de 2021 que tratavam do assunto, tanto sobre a portaria que possibilitou o aumento quanto a repercussão com o próprio presidente.

A reportagem também procurou o Ministério da Economia para saber se o teor do tuíte era verdadeiro, se há previsão de aumento do salário de Bolsonaro e dos ministros em 2022 e a quem cabe conceder o reajuste aos ocupantes desses cargos.

Além disso, a equipe buscou dados das remunerações de Bolsonaro e seus ministros no Portal da Transparência. Também foi enviada uma demanda ao Ministério da Cidadania para obter dados oficiais sobre os salários do ministro da pasta, Ronaldo Vieira Bento, mas não houve retorno.

O Comprova ainda tentou contato com o autor da publicação, também sem sucesso.

 

Portaria do teto duplo

Ao contrário do que supõe a postagem, a portaria que aumenta o salário de Bolsonaro e seus ministros não é recente e não foi publicada neste ano. Trata-se da Portaria SGP/SEDGG/ME Nº 4.975, de 29 de abril de 2021, que dispõe sobre a aplicação do teto do salário dos servidores públicos.

O limite da remuneração de cargos públicos federais não pode ultrapassar a remuneração recebida por ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), que atualmente é de R$ 39.293,32. Sendo assim, nenhum servidor poderia ter um salário maior que esse valor. O teto constitucional, segundo entendimento do próprio STF, deve ser aplicado sobre valor bruto da remuneração de servidor.

Porém, a portaria permitiu um novo cálculo do limite remuneratório. Nas hipóteses constitucionalmente admitidas de acumulação de cargos públicos, o teto seria calculado isoladamente em relação a cada um dos vínculos. Ou seja, nas condições legais, o limite ganho é relativo a cada função e não a cada servidor.

Uma das condições atribuídas pelo texto é a acumulação entre vínculo de aposentado ou militar na inatividade com cargo em comissão, cargo eletivo ou emprego público admitido constitucionalmente. Sendo assim, um general da reserva que também é ministro de governo recebe a sua remuneração pelos dois vínculos, com o teto salarial aplicado separadamente.

E foi a partir da publicação desta portaria que Bolsonaro conseguiu reajuste para o próprio salário, como capitão da reserva, e também promoveu um acréscimo estimado, na ocasião, em até 69% na remuneração de sua equipe. Além do presidente, o vice Hamilton Mourão, ministros militares e um grupo de cerca de mil servidores federais, que tinham desconto na remuneração para respeitar o teto constitucional, passaram a ser contemplados com a medida.

Conforme reportagem do Valor à época, a portaria possibilitaria pagamentos mensais que, a depender da autoridade, passariam de R$ 66 mil. O maior salto salarial projetado no ano passado era do ministro-chefe da Casa Civil, Luiz Eduardo Ramos. O governo deixaria de fazer um desconto mensal de R$ 27 mil, elevando a remuneração para R$ 66,4 mil – alta de 69%. Pelas mesmas projeções, Bolsonaro teria a menor correção, de 6%, e seus vencimentos passariam de R$ 39,3 mil para R$ 41,6 mil.

O documento foi assinado por Leonardo José Mattos Sultani, secretário da Secretaria Especial de Desburocratização, Gestão e Governo Digital, do Ministério da Economia.

Salário do presidente e seus ministros

De acordo com o artigo 49 da Constituição Federal de 1988, é de competência exclusiva do Congresso Nacional fixar os salários do presidente, do vice-presidente e dos ministros do governo. Esse processo ocorre por meio de decretos legislativos. Além disso, os senadores e deputados federais devem julgar anualmente as contas prestadas pelo chefe do Executivo.

A última definição sobre a remuneração do chefe de Estado aconteceu em 2014 através do Decreto Legislativo Nº 277. O ato fixou o subsídio mensal do presidente em R$ 30.934,70. O valor é o mesmo para o vice-presidente e os ministros. O texto também indicou que o Poder Executivo regulará, em conformidade com suas competências, os efeitos decorrentes da aplicação do decreto.

Em resposta ao Projeto Comprova, o Ministério da Economia esclareceu que não há previsão de reajuste dos salários para o presidente e o primeiro escalão neste ano. A pasta também afirmou que o reajuste para o funcionalismo está em análise.

No Portal da Transparência, o valor de R$ 30.934,70 é declarado como remuneração básica bruta porque a quantia passa por deduções obrigatórias, como o imposto de renda retido na fonte e a contribuição relativa à previdência social. Entretanto, há outros benefícios recebidos pelo presidente, como o auxílio-moradia, e ainda remunerações eventuais como a gratificação natalina.

Atualmente, o gabinete da Presidência da República conta com seis militares que estão aposentados ou na reserva. Portanto, recebem isoladamente por cada cargo. São eles: Jair Bolsonaro (Presidente da República), Hamilton Mourão (Vice-presidente da República), Augusto Heleno (Chefe do Gabinete de Segurança Institucional), Luiz Eduardo Ramos (Chefe da Secretaria-Geral da Presidência da República), Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira (Ministro da Defesa) e Ronaldo Vieira Bento (Ministro da Cidadania).

Segundo o Portal da Transparência, Jair Bolsonaro recebe uma remuneração básica bruta de R$ 11.324,96 por ser um capitão da reserva. Antes da portaria, ele deixava de receber R$ 2.966,34. Utilizando as remunerações médias recebidas pelo presidente nos últimos meses, o presidente teve um aumento na remuneração de 7,55% – índice um pouco maior que o estimado na época em que a medida foi anunciada.

A tabela abaixo mostra uma relação entre os cargos e o aumento na remuneração com a portaria. A base de dados usada foi o Portal da Transparência, em que foi analisado o último salário civil (abril de 2022) e o último salário militar (novembro de 2021) disponíveis na plataforma. Os valores podem variar um pouco de mês para mês por conta de remunerações eventuais e descontos obrigatórios, o que explica as pequenas diferenças entre os dados citados nas matérias de maio do ano passado e os dados atuais do portal.

 

Em relação a Ronaldo Vieira Bento foi utilizado o salário padrão ao cargo militar que ocupa (1º Tenente da Reserva do Exército Brasileiro) pois não foram encontradas no portal informações atualizadas sobre o subsídio. O Comprova perguntou ao Ministério da Cidadania sobre as remunerações do ministro, mas não houve resposta até a publicação da verificação. Os demais dados podem ser consultados aqui: Jair Bolsonaro; Hamilton Mourão; Augusto Heleno; Luiz Eduardo Ramos e Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira.

Repercussão

O post aqui investigado também sugere que houve pouca repercussão sobre o reajuste na imprensa. Na verdade, o assunto foi divulgado por diversos veículos, como Estadão, Folha de S. Paulo, Estado de Minas, Correio Braziliense, Valor, CNN e G1, por ocasião da edição da portaria, e também depois, nos desdobramentos.

Houve questionamentos sobre a portaria no Congresso Nacional e reportagens, como a do Uol e Estado de Minas, sobre a reação de parlamentares aos supersalários da cúpula do governo. O Executivo, por sua vez, atribuiu a medida a uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF). O próprio Bolsonaro também usou o argumento em uma de suas lives, no início de junho do ano passado, e que foi reportado pela imprensa.

Apesar disso, a postagem ainda confundiu internautas que, pela falta de contexto do tuíte, acreditaram que se tratava de uma notícia atual, como indicam alguns prints (print 1, print 2, print 3) coletados pelo Comprova.

Por que investigamos: O Comprova investiga conteúdos suspeitos que viralizaram nas redes sociais sobre a pandemia de covid-19, políticas públicas do governo federal e eleições presidenciais. O conteúdo investigado refere-se a Jair Bolsonaro, pré-candidato à reeleição, e informações fora de contexto sobre o presidente ou outros que pretendem disputar a cadeira no Palácio do Planalto não contribuem para o processo democrático do país. Os eleitores têm o direito de fazer sua escolha a partir de dados corretos.

Outras checagens sobre o tema: As eleições presidenciais se mostram um tema frequente de conteúdos de desinformação. Nesta semana, o Comprova demonstrou, entre outras publicações enganosas, que série sobre fome no Jornal Nacional foi ao ar antes da chegado do PT ao poder, a falta de contexto do vídeo sobre falhas já corrigidas nas urnas, e ainda que o Fies foi criado no governo de FHC, e não na gestão de Lula e que vídeo engana sobre empréstimos do BNDES no governo Lula. O autor da postagem já foi alvo de outras verificações do Comprova, como a que mostrou ser enganoso o tuíte acusando Bolsonaro de acabar com o Bolsa Atleta.

Eleições

Investigado por: 2022-05-06

Publicação tira de contexto declarações de Djavan para atacar a Lei Rouanet

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É enganosa uma postagem que sugere apoio do cantor e compositor Djavan ao governo de Jair Bolsonaro (PL) e reprovação, por parte do artista, ao mecanismo da Lei Rouanet. A publicação manipula e tira de contexto declarações dadas por Djavan em duas entrevistas.

Conteúdo investigado: Um post no Facebook fala que Djavan teria dito que nunca usou recursos da Lei Rouanet porque é “um dinheiro que pode ser melhor aplicado”. Também afirma que o artista teria dito estar “esperançoso com o governo Bolsonaro”.

Onde foi publicado: Facebook

Conclusão do Comprova: O cantor e compositor Djavan teve declarações distorcidas por uma postagem enganosa que voltou a viralizar recentemente na internet. A publicação usa trechos de duas entrevistas concedidas pelo artista no fim de 2018.

Em uma das declarações, ele se refere à Lei Rouanet. Djavan afirma que nunca captou recursos por meio da Lei e diz acreditar que ele, particularmente, não deva usar um dinheiro que possa ser melhor aproveitado.

A postagem reproduz a declaração fielmente, porém omite a sequência em que Djavan afirma ser a favor da existência da Lei Rouanet, para benefício de outros artistas. O post ainda sugere apoio do artista a Bolsonaro ao reproduzir, na mesma imagem montada com a foto de Djavan, outra suposta declaração: “Estou muito esperançoso com o governo Bolsonaro. O Brasil vai dar certo”.

A frase foi manipulada com a inserção das palavras “governo Bolsonaro”, que não fizeram parte da fala do cantor. Por conta das postagens, o artista veio a público duas vezes para desmenti-las.

Para o Comprova, é enganoso o conteúdo que retira declarações de contexto com o objetivo de sugerir interpretação diversa da realidade.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos de maior alcance nas redes sociais. A postagem analisada teve ao menos 3,8 mil reações

O que diz o autor da publicação: O Comprova encaminhou mensagem, via Facebook, à pessoa responsável pela postagem, mas não obteve resposta até o fechamento desta verificação.

Como verificamos: Inicialmente, o Comprova fez buscas no Google com os termos das falas de Djavan. A pesquisa levou à entrevista publicada pelo jornal Folha de S. Paulo, em 21 de novembro de 2018. Os resultados também trouxeram matérias em sites (GaúchaZH, Revista Forum) que repercutiram o trecho de uma outra entrevista que também foi utilizado no material enganoso.

Outras pesquisas online foram feitas na tentativa de identificar posicionamentos do artista sobre política. A equipe localizou duas postagens de Djavan desmentindo o apoio a Bolsonaro e uma entrevista à TV portuguesa em que ele faz críticas ao atual governo.

O Comprova também buscou contato com a assessoria do artista e com a pessoa que fez a postagem enganosa na internet. Não houve retorno nas duas ocasiões.

 

Djavan sobre a Lei Rouanet

O post alega que Djavan teria dito que “nunca usou e nunca vai usar” dinheiro captado por meio da Lei Rouanet. O artista também teria dito que já rejeitou convites para fazer shows públicos bancados por prefeituras. “Quem vai pagar? Se é o povo eu não quero. Rejeitei muitos convites. Eu nunca usei porque não preciso e não acho que eu deva usar um dinheiro que pode ser melhor aplicado.”

A frase realmente foi dita pelo cantor durante uma entrevista para o jornal Folha de S. Paulo, em 2018. No entanto, o post não traz a íntegra da resposta. Djavan defendeu a importância da Lei Rouanet como política pública para o setor cultural e se absteve de criticar outros artistas que façam uso dela.

“Acho que tem muita gente que precisa ser ajudada pela Lei Rouanet”, ressaltou o cantor. “O Brasil é enorme, precisa de cultura em todos os quadrantes. O povo precisa usufruir disso. Faz sentido. Não reclamo de quem usa. Eu é que peguei para mim a coisa de não recorrer à Lei Rouanet.”

As mensagens de resposta ao post mostram que ele confunde os usuários sobre o sentido real do posicionamento do cantor. Eles acreditam que Djavan estaria criticando a Lei Rouanet como um todo, e não apenas sua utilização em projetos próprios. “Vagabundos fingem que trabalham pois quase não têm público e vivem às custas de dinheiro público”, disse um usuário. Outro escreveu que “Djavan é um produtor de cultura de verdade, não iria manchar a sua carreira sendo um parasita dependente de dinheiro público”.

Suposto apoio a Bolsonaro não procede

Djavan lançou seu mais recente disco, “Vesúvio”, em novembro de 2018, cerca de um mês após a eleição de Jair Bolsonaro para a presidência da República. Já que uma música do álbum, “Solitude”, tratava de temas sociais, e como as eleições ainda eram recentes, Djavan foi instado a falar sobre política.

Uma das entrevistas teve trecho postado em dois canais do YouTube, em 31 de dezembro de 2018 e 1 de janeiro de 2019. Nessas mesmas datas, o trecho foi repercutido em portais na internet (LeiaJa, Gaúcha ZH, Revista Forum), com afirmações de que Djavan se referia a Jair Bolsonaro ao declarar:

“Eu tenho uma esperança que o Brasil vai dar certo, em algum momento. Tudo o que está começando a acontecer agora aponta para um futuro melhor. A gente não pode garantir, porque o governo ainda não está atuando, está apenas se formando, mas eu estou esperançoso”.

A postagem aqui verificada manipula a declaração e inclui “governo Bolsonaro” em uma das frases ditas por Djavan, que não cita o nome do presidente no trecho da entrevista. Enganosamente, a postagem repercute a frase “Estou muito esperançoso com o governo Bolsonaro. O Brasil vai dar certo”.

Ainda no dia 1º de janeiro de 2019, Djavan publicou uma primeira nota desmentindo a afirmação em sua página no Facebook:

O segundo veio em junho de 2021. Nele, Djavan afirma: “Eu não apoio Bolsonaro” e “Eu NÃO votei no Bolsonaro e NÃO apoio o seu governo”.

Em novembro de 2019, após praticamente um ano do governo Bolsonaro, Djavan deu uma entrevista à emissora portuguesa Canal Antena 1. Na ocasião, criticou o governo: “Eu acho que o futuro do Brasil, se depender deste governo, pelo que se tem apresentado até agora, não é bom”. (Trecho em 2’30).

Na entrevista, Djavan também fez críticas à atuação do governo em relação à preservação da Amazônia. (Trecho a partir de 3’18).

Bolsonaro e a cultura

O conteúdo checado foi publicado em um grupo do Facebook de apoio ao presidente Jair Bolsonaro, que fez ataques à classe artística desde a campanha. Em 2020, cerca de 400 projetos perderam R$ 500 milhões já captados, que haviam sido aprovados pela área técnica do governo. Faltava apenas a assinatura do secretário Nacional de Fomento à Cultura, André Porciúncula.

Em 2021, o Executivo publicou um decreto fazendo alterações na aplicação da Lei Rouanet. Entre elas, aumentou o poder de decisão do governo na Comissão Nacional de Incentivo à Cultura (CNIC), que decide os projetos aptos a captar recursos, e reduziu o teto dos incentivos fiscais por projeto e os valores pagos a artistas.

Nesta quinta-feira (5), Bolsonaro vetou integralmente a Lei Aldir Blanc 2, de apoio à Cultura. No mês anterior, vetou o projeto da Lei Paulo Gustavo, que repassaria R$ 3,8 bilhões à Cultura.

Por que investigamos: O Comprova investiga conteúdos sobre pandemia, eleições e políticas públicas que atinjam grau de viralização nas redes sociais. A Lei Rouanet é o principal mecanismo de fomento à cultura no país e é importante que os cidadãos tenham informações confiáveis sobre ele.

Outras checagens sobre o tema: Recentemente, o Comprova mostrou ser falso que o Zeca Pagodinho ganhou milhões de reais com a Lei Rouanet. Também desmentiu que um museu estaria usando dinheiro público para exibir pornografia infantil.

O Boatos.org também classificou como enganoso o post que atribui a Djavan elogios ao presidente Jair Bolsonaro.

Política

Investigado por: 2022-05-04

Livro crítico a Bolsonaro foi usado em escola do DF por iniciativa de um professor, não da rede de ensino

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É enganosa uma postagem sugerindo que uma cartilha com informações sobre a taxação de grandes fortunas e com críticas a Bolsonaro está sendo “amplamente distribuída” nas escolas públicas do Distrito Federal. A obra não foi adotada pela rede de ensino e, segundo a Secretaria da Educação do DF, só foi apresentada pelo professor de uma única escola de nível médio, sem o conhecimento da direção.

Conteúdo investigado: Vídeo em que a autora declara que material contra o presidente Jair Bolsonaro (PL) é distribuído em escolas da rede pública do Distrito Federal.

Onde foi publicado: Instagram.

Conclusão do Comprova: É enganoso vídeo em que a autora afirma que um material contrário ao governo Bolsonaro é “amplamente distribuído” em escolas da rede pública do Distrito Federal. A cartilha existe, mas, segundo a Secretaria da Educação, foi levada apenas para uma unidade, o Centro de Ensino Médio Asa Norte (Cean), na aula de um professor de Sociologia, e não para toda a rede do governo distrital.

No último dia 26 de abril, em reunião no colégio, conforme reportagem do Metrópoles, o professor afirmou que a cartilha foi usada em uma sala de aula como material complementar para tratar do tema desigualdade e concentração de renda, que estava sendo discutido com a turma. Ele se comprometeu a recolher a cartilha para não infringir a legislação.

A publicação reúne tirinhas de uma personagem, a Niara, criada para falar principalmente sobre tributação dos super-ricos, mas que também aborda questões referentes à pandemia da covid-19, teto de gastos e a luta contra o racismo e a violência doméstica. O compilado tem tirinhas de dezembro de 2020 a dezembro de 2021 e, no geral, tematiza fatos do período.

Bolsonaro aparece em alguns textos que reprovam a sua gestão perante problemas enfrentados pela população brasileira, como a crise sanitária, ou por sua falta de apoio ao tema principal da campanha de tributação: a taxação dos super-ricos. No ano passado, o presidente criticou o imposto sobre fortunas.

A autora também interpreta e faz considerações sobre o conteúdo da cartilha que extrapolam o que está escrito no material.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos de maior alcance nas redes sociais. Até o dia 4 de maio, o conteúdo teve mais de 23 mil visualizações, 293 comentários e 1,8 mil curtidas.

O que diz o autor da publicação: O Comprova entrou em contato com a advogada Amanda Marques pelo Instagram, mas não obteve resposta até a conclusão desta verificação.

Como verificamos: Para verificar a existência do material citado no vídeo, o Comprova procurou a Secretaria de Educação do Distrito Federal e, no site do órgão, identificou uma nota oficial referente ao assunto. Também foram feitos questionamentos por e-mail a fim de saber se a cartilha havia sido distribuída para toda a rede e como é feita a seleção do material usado nas escolas.

Em outras pesquisas na internet, a equipe também localizou manifestações sobre o assunto de entidades que defendem a tributação dos super-ricos e do Sindicato dos Professores do DF, todos a favor do professor que usou a cartilha em sala de aula.

A reportagem ainda leu a cartilha em busca dos pontos abordados pela autora do vídeo.

 

Cartilha foi distribuída apenas em uma escola do DF

Em nota oficial, divulgada no dia 27 de abril, a Secretaria de Educação do Distrito Federal confirmou que a cartilha com “apologia política” foi distribuída por um professor de Sociologia, mas que a iniciativa foi tomada sem o conhecimento da direção da escola, da Coordenação Regional de Ensino e da Subsecretaria de Ensino Básico. O caso foi encaminhado à corregedoria.

Segundo o órgão, além de a cartilha apresentar críticas ao governo Bolsonaro, promove uma dirigente sindical de partido de oposição que se apresenta como pré-candidata ao governo do Distrito Federal. Na versão online do material, contudo, não há qualquer referência a candidaturas.

“A secretaria repudia um ato como esse e informa que não permitirá proselitismo político de nenhuma espécie nas escolas públicas do DF e que fará cumprir fielmente o Regimento da Rede Pública de Ensino do Distrito Federal”, pontua em um dos trechos da nota.

O documento a que se refere a secretaria prevê, no artigo 304, que é vedado ao professor:

  • envolver o nome da unidade escolar em manifestações estranhas às suas finalidades educativas;
  • ferir a suscetibilidade dos estudantes no que diz respeito às convicções políticas, religiosas, etnia, condição intelectual, social, assim como no emprego de apelidos e/ou qualificações pejorativas;
  • fazer apologia à política partidária no interior da unidade escolar.

Questionada pelo Comprova se a cartilha foi distribuída nas demais escolas da rede, a secretaria afirmou que o material foi utilizado apenas no Cean.

Quanto à avaliação dos materiais utilizados nas instituições de ensino, o órgão ressalta que livros e demais publicações doados à secretaria devem passar por uma verificação pedagógica para analisar se obras atendem às legislações para entrada na rede pública. “A SEEDF verifica se os materiais estão de acordo com critérios da Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil, do Programa Nacional do Livro e do Material Didático (PNLD) do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), entre outros”, finaliza.

O material

Segundo a versão online do livro, a obra foi criada pelo cartunista Renato Aroeira e teve a primeira tirinha publicada em dezembro de 2020. Através da personagem Niara, uma pré-adolescente negra, a publicação defende que, proporcionalmente, é cobrado pouco imposto dos ricos e muito dos pobres, situação que se agravou com a pandemia de covid-19.

O material reúne mais de 50 histórias, publicadas entre dezembro de 2020 e dezembro de 2021, que abordam temas diversos, como o desemprego no Brasil, racismo, desigualdade de gênero, desmatamento, pandemia de covid-19 e a discussão em torno da concentração de renda no país.

Em alguns textos há críticas ao presidente Bolsonaro principalmente por sua gestão da pandemia e assuntos relacionados ao meio ambiente, além da falta de apoio à política de taxação de grandes fortunas, tema central da tirinha.

A obra foi produzida para fortalecer a campanha Tributar os Super-ricos, um movimento nacional lançado por 70 organizações que visa promover justiça fiscal, propondo medidas para reduzir impostos aos mais pobres e pequenas empresas e aumentar para altas rendas e grandes patrimônios.

Segundo uma estimativa da campanha, seria possível arrecadar cerca de R$ 300 bilhões ao ano aumentando a taxação de pessoas físicas com salários acima de R$ 60 mil por mês e o imposto sobre heranças, onerando apenas os 0,3% mais ricos da população, o que representa 59 mil pessoas entre 210 milhões de brasileiros. As propostas de alterações legislativas tributárias foram protocoladas no Congresso Nacional em setembro de 2021.

Conforme a cartilha, os super-ricos são poucas pessoas com muita riqueza acumulada e fortunas superiores a US$ 1 bilhão. No total, segundo dados da revista Forbes, em 2021 o Brasil tinha 315 bilionários, 40 a mais que no ano anterior. O patrimônio dos bilionários, juntos, é estimado pela revista em R$ 1,9 trilhão.

Os quadrinhos são publicados nas redes sociais da campanha e das entidades apoiadoras, que incluem o Sinpro-DF e a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj).

O presidente Bolsonaro se mostra contrário à taxação dos super-ricos e, entre os argumentos, alega a fuga de capitais do país.

Entidades defendem professor

Através de nota, a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE) repudiou “a polêmica criada por uma advogada no Distrito Federal sobre o livro contendo as histórias em quadrinho da personagem Niara”. O texto também foi assinado pelo Instituto Justiça Fiscal (IJF), Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf-CUT) e Sindicato Carioca dos Fiscais de Renda (Sincaf/RJ).

Entre os argumentos das entidades, a nota invoca a liberdade de cátedra, princípio constitucional que assegura a autonomia de aprender e ensinar, uma prerrogativa fundamental da democracia. Para elas, a história em quadrinho reflete a realidade, não apenas do Brasil, e serve para debater a taxação de grandes fortunas como prevista na Constituição Federal de 1988.

O Sindicato dos Professores do Distrito Federal (Sinpro-DF) também divulgou, na página oficial da entidade, um artigo em defesa da liberdade de cátedra e criticando a maneira como o assunto está sendo conduzido por parlamentares e o governo distrital a partir do vídeo aqui investigado.

Ressalta ainda que a tributação dos super-ricos é um conteúdo compatível com a grade curricular das competências e habilidades previstas na Base Nacional Comum Curricular (BNCC) do Ensino Médio.

Quem é a autora do post

Amanda Marques é advogada formada pelo Centro Universitário de Brasília (UniCEUB) e mora na capital federal. Conforme o perfil no Linkedin, atualmente ela é chefe de gabinete na Junta Comercial, Industrial e Serviços do Distrito Federal.

No Instagram, a advogada costuma publicar vídeos em que fala sobre religião cristã e política, com manifestações elogiosas a Bolsonaro e Sergio Moro e críticas ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Ela tem 22,9 mil seguidores na rede social.

Por que investigamos: O Comprova investiga conteúdos suspeitos que viralizaram sobre a pandemia de covid-19, políticas públicas do governo federal e eleições presidenciais. O vídeo aqui verificado envolve o nome do presidente Jair Bolsonaro, provável candidato à reeleição. A menção de presidenciáveis em publicações deve ser baseada em fatos porque, do contrário, pode induzir eleitores a interpretações equivocadas e a uma avaliação distorcida no momento de votar, o que configura um prejuízo ao processo democrático.

Outras checagens sobre o tema: Conteúdos enganosos relacionados às eleições se tornaram recorrentes. Em verificações anteriores, o Comprova já apontou que um post confunde dados sobre conflitos no campo no governo Bolsonaro, que Lula não deu indulto a Cesare Battisti e que o livro de infância de Moro estava disponível na década de 70.

Política

Investigado por: 2022-05-02

Zeca Pagodinho não recebeu milhões de reais pela Lei Rouanet por musical

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É enganoso um post que insinua que o cantor Zeca Pagodinho apoia o PT porque teria recebido milhões de reais captados por meio da Lei Rouanet. A postagem traz uma imagem com informações sobre o projeto “Zeca Pagodinho - Uma história de amor ao samba”, uma peça de teatro musical que recebeu o incentivo fiscal. O nome do cantor e o valor captado aparecem circulados. Mas Zeca não esteve envolvido diretamente com a produção, e tampouco declarou apoio ao PT abertamente, embora tenha uma relação amistosa com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Conteúdo investigado: Post no Facebook traz uma imagem com informações sobre o projeto “Zeca Pagodinho – Uma história de amor ao samba”, peça de teatro musical financiada pela Lei Rouanet. O nome do cantor e o valor captado através da legislação aparecem circulados. Também foram inseridos sobre a imagem um emoji de polegar para cima e a sigla “PT”. O conteúdo é acompanhado da legenda “Acabou a mamata”.

Onde foi publicado: Facebook.

Conclusão do Comprova: É enganoso um post que insinua que o cantor Zeca Pagodinho apoia o PT porque teria recebido milhões de reais captados via Lei Rouanet. A postagem traz uma imagem com informações sobre o projeto “Zeca Pagodinho – Uma história de amor ao samba”, uma peça de teatro musical que recebeu o incentivo fiscal. O nome do cantor, no título da peça, e o valor captado (R$ 2.197.000,00) aparecem circulados. Também foram inseridos sobre a imagem um emoji de polegar para cima e a sigla “PT”. O conteúdo é acompanhado da legenda “Acabou a mamata”.

Uma consulta ao portal VerSalic, que permite a visualização dos projetos vinculados às Leis de Incentivo à Cultura, confirma que as informações da imagem são verdadeiras. Mas isso não significa que Zeca Pagodinho tenha recebido milhões de reais captados pela Lei Rouanet. Embora leve o seu nome e tenha sido inspirada na sua vida e obra, a peça “Zeca Pagodinho – Uma história de amor ao samba” não contou com envolvimento direto do artista na produção, na direção e nem no elenco.

Procurada pelo Comprova, a assessoria de imprensa de Zeca Pagodinho afirmou que o cantor só recebeu pagamentos relativos aos direitos autorais de suas músicas, mas não soube informar o valor exato. No site VerSalic, está discriminado um valor de R$ 16.394,30 executado com direitos autorais. “Não foi só ele que deve ter recebido algum valor, mas todos os compositores que tiveram suas músicas executadas no espetáculo, como é de praxe”, disse a assessoria. “E ele, na verdade, não assinava a maioria delas”.

Quanto à insinuação de que Zeca apoia o PT, a assessoria afirmou que o cantor “nunca declarou seu voto, seja para o Lula, ou para outro político”, mas “sempre declarou sua simpatia, pela pessoa, pelo jeito de ser” do ex-presidente. Em março, Zeca esteve entre um grupo de artistas que se reuniu com Lula no Rio de Janeiro e gravou um vídeo com cantos de apoio ao petista, pré-candidato à Presidência da República em 2022.

Para o Comprova, enganoso é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos de maior alcance nas redes sociais. A publicação alcançou 8,4 mil interações, entre comentários, curtidas e compartilhamentos, até o dia 2 de maio.

O que diz o autor da publicação: O Comprova solicitou esclarecimentos ao autor do post no Facebook, mas não obteve resposta até o fechamento desta checagem.

Como verificamos: O primeiro passo foi checar se a imagem da publicação era verdadeira. Para isso, o Comprova consultou o portal VerSalic, que permite a visualização dos projetos vinculados às Leis de Incentivo à Cultura.

Através das informações presentes no próprio portal VerSalic e em matérias da IstoÉ e da Revista Veja São Paulo, verificamos que o post trata de uma peça teatral intitulada “Zeca Pagodinho – Uma história de amor ao samba”, que captou recursos por meio da Lei Rouanet.

O Comprova então procurou informações sobre o funcionamento da Lei Rouanet e as mudanças que a legislação sofreu desde 2019 em sites do governo federal (aqui, aqui e aqui) e reportagens jornalísticas.

Após isso, a equipe buscou a assessoria de Zeca Pagodinho para entender se ele esteve envolvido no projeto e se teria recebido algum valor pela produção da peça. Também foi questionado a respeito do posicionamento político do cantor.

Por fim, entramos em contato com o autor do post no Facebook, mas não obtivemos retorno.

 

Sobre a peça

“Zeca Pagodinho – Uma história de amor ao samba” é um musical roteirizado, dirigido e estrelado por Gustavo Gasparani, com produção de Victoria Dannemann e Sandro Chaim. Inspirada na obra e na vida do cantor, a peça estreou em 2017, no Rio de Janeiro, e no ano seguinte teve temporadas em outras cidades brasileiras, como Salvador, Fortaleza, Recife, São Paulo, entre outras.

Em entrevista ao jornal O Estado de S.Paulo, Gasparani disse que fez suas primeiras pesquisas sobre Zeca Pagodinho em 2009 e foi convidado a escrever uma peça sobre a sua vida em 2012, mas o projeto não teria deslanchado até 2017.

O artista foi consultado sobre o roteiro, e sua única exigência teria sido a inclusão do personagem Baixinho, caseiro de seu sítio em Xerém, na Baixada Fluminense. Ainda de acordo com o Estadão, o cantor assistiu ao espetáculo quatro vezes durante a temporada no Rio de Janeiro e, em todas as ocasiões, subiu ao palco no final para cantar as músicas “Deixa a vida me levar” e “Vai vadiar”. Questionada pelo Comprova sobre o papel que Zeca teve na produção, sua assessoria respondeu que ele não teve envolvimento e apenas “foi homenageado”.

Por meio do portal VerSalic, verifica-se que o projeto do musical teve uma verba proposta de R$ 3.743.600,00, dos quais R$ 2.197.000,00 foram captados por meio da Lei Rouanet. Nos relatórios fiscais do projeto, consta um valor programado de R$ 45.000,00 em gastos com direitos autorais, dos quais foram executados R$ 16.394,30.

Declarações recentes de Zeca Pagodinho

Em maio de 2020, a equipe de Zeca Pagodinho notificou extrajudicialmente um usuário do Twitter para que apagasse uma foto do cantor com legendas que sugeriam apoio a Bolsonaro. À época, a assessoria do artista afirmou que ele não associa sua imagem a questões políticas.

O cantor publicou nas redes sociais que faz parte do “movimento de compositores que é contra o uso de paródias de suas canções para fins políticos sem autorização”, quando o tema estava sendo discutido pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), em fevereiro de 2022. Pagodinho assinou um manifesto contrário à possibilidade junto a mais de 350 artistas, como Marisa Monte, Gilberto Gil, Roberto Carlos, entre outros.

Em 24 de abril de 2022, durante um show no Camarote Bar Brahma, no Sambódromo do Anhembi, em São Paulo, Zeca Pagodinho afirmou que pensa em sair do Brasil se o país continuar como está. Segundo reportagem da Folha de S.Paulo, o cantor teria dito que “o povo precisa se manifestar, mesmo através da música, porque caso contrário o Brasil vai continuar assim, do jeito que está”. Sobre as recentes manifestações políticas que tomaram conta do Carnaval de 2022, Zeca Pagodinho afirmou que cada um utiliza a festa como quiser.

Em março de 2022, o ex-presidente Lula (PT) se encontrou com diversos artistas no Rio de Janeiro, incluindo Zeca Pagodinho, Ludmilla, Martinho da Vila e Gaby Amarantos. O grupo filmou um vídeo em que fazem o símbolo de L (de Lula) com as mãos e cantam uma música de apoio ao petista.

Em entrevista ao F5, em abril deste ano, Zeca Pagodinho disse que só se encontra com Lula em época de eleição: “Eu não tenho o número dele [de Lula]. Também não tenho muito o que falar com ele, a gente gosta de tomar cerveja junto. O Lula ainda não foi ao meu bar, mas disse que quer ir.” Ao Comprova, a assessoria de Zeca disse que o cantor “sempre declarou sua simpatia, pela pessoa, pelo jeito de ser de Luiz Inácio. Além disso, sempre foi muito bem tratado pelo antigo presidente, que já o visitou em [seu sítio em] Xerém e que o convidou com família e equipe para uma apresentação de um de seus DVDs”.

Em redes sociais, o cantor não costuma fazer publicações políticas, tampouco declarou voto em algum pré-candidato à Presidência em 2022. “Mas nada impede que ele o faça até as eleições”, disse sua assessoria.

Sobre a Lei Rouanet

Criada em 23 de dezembro de 1991, a Lei de Incentivo à Cultura, conhecida como Lei Rouanet, é um mecanismo de incentivo fiscal do Governo Federal que permite que empresas (4%) e pessoas físicas (6%) possam destinar uma porcentagem de seu imposto para iniciativas culturais. O objetivo é estimular e fomentar a produção, preservação e difusão cultural.

Ao invés de seguir para o governo, o valor do imposto é destinado aos programas aprovados pela Secretaria Especial da Cultura, do Ministério da Cidadania. Os principais critérios de avaliação utilizados pela pasta para aprovar um projeto são: a capacidade de ampliar o acesso da população à cultura; compatibilidade de custos e capacidade técnica e operacional do proponente, respectivamente.

Uma vez aprovados, os proponentes dos projetos devem convencer as empresas e pessoas a enviarem seus impostos. Isso significa que nem todas as propostas aprovadas recebem os recursos captados pela Lei Rouanet.

Em fevereiro de 2022, o governo oficializou uma série de mudanças na Lei. Foi reduzido de R$ 60 milhões para R$ 1 milhão o valor máximo permitido por projeto para captação, com algumas exceções, como restauração de patrimônio tombado. O valor máximo que poderia ser captado por empresa, que também era de R$ 60 milhões, passou para R$ 6 milhões.

E o valor limite para captação por projeto leva em conta o tipo de atividade cultural:

  • R$ 500 mil: tipicidade normal – como peças de teatro não musical;
  • R$ 4 milhões: tipicidade singular – desfiles festivos, eventos literários, exposições de arte e festivais;
  • R$ 6 milhões: tipicidade específica – concertos sinfônicos, museus e memória, óperas, bienais, teatro musical, datas comemorativas (Carnaval, Páscoa, Festas Juninas, Natal e Ano-Novo), inclusão de pessoa com deficiência, projetos educativos e de internacionalização da cultura brasileira.

Quem pode inscrever projetos: pessoas físicas com atuação na área cultural e pessoas jurídicas, com ou sem fins lucrativos, com propósito cultural. Microempreendedores individuais (MEIs) ou pessoas físicas podem ter até dois projetos ativos, totalizando R$ 1 milhão; empresas podem ter até cinco projetos ativos, totalizando R$ 4 milhões; sociedades limitadas (Ltda.) e demais pessoas jurídicas podem ter até oito projetos ativos, totalizando R$ 6 milhões.

O prazo máximo para a captação dos recursos passou de 36 meses (3 anos) para 24 meses (2 anos).

Por que investigamos: O Comprova investiga conteúdos suspeitos que viralizaram sobre a pandemia de covid-19, políticas públicas do governo federal e eleições presidenciais. A publicação aqui verificada induz a conclusões enganosas sobre o funcionamento de uma lei de incentivo à cultura e sobre o posicionamento político de uma figura pública, o que pode influenciar na eleição presidencial de 2022.

Comentários no post indicam que muitas pessoas acreditaram que Zeca Pagodinho recebeu os R$ 2 milhões obtidos via Lei Rouanet para o financiamento da peça que leva o seu nome.

Outras checagens sobre o tema: Em verificações anteriores, o Comprova mostrou que o projeto de lei Paulo Gustavo não tentava liberar bilhões de reais da Lei Rouanet e que não houve desvio de orçamento de hospitais a projetos culturais.

Política

Investigado por: 2022-04-27

Tuíte engana ao alegar que Abraji foi à ONU pedir punição a Bolsonaro

  • Enganoso
Enganoso
É enganosa a publicação no Twitter que afirma que a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo, a Abraji, pediu à ONU punição ao presidente Jair Bolsonaro, pelo indulto concedido ao deputado federal Daniel Silveira (PTB). O Comprova apurou que a Associação Brasileira de Imprensa, a ABI (não a Abraji), encaminhou um documento às Nações Unidas pedindo que acompanhe os desdobramentos do caso. Não houve pedido de punição ao presidente.

Conteúdo investigado: Uma publicação no Twitter afirma que a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) pediu à Organização das Nações Unidas (ONU) uma punição ao presidente brasileiro Jair Bolsonaro por ter concedido perdão ao deputado federal Daniel Silveira, condenado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) a mais de oito anos de prisão por grave ameaça ao exercício dos Poderes constitucionais.

Onde foi publicado: Twitter.

Conclusão do Comprova: É enganosa a publicação no Twitter que afirma que a Abraji, Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo, teria feito um pedido à ONU para que o presidente Jair Bolsonaro fosse punido por ter concedido perdão ao deputado federal Daniel Silveira (PTB), condenado pelo STF por ameaças aos ministros.

Na verdade, a ABI, Associação Brasileira de Imprensa, foi quem enviou às Nações Unidas um relato do ocorrido e pediu que o órgão se posicionasse com uma nota pública e acompanhasse os desdobramentos do caso. Não houve pedido de punição ao presidente.

Enganosos, para o Comprova, são os conteúdos que usam dados imprecisos ou que induzem a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdos que confundem, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos de maior alcance nas redes sociais. A publicação checada alcançou, até a manhã do dia 27 de abril, 5.999 curtidas e 849 compartilhamentos.

O que diz o autor da publicação: Até a conclusão desta apuração, a autora do post não respondeu aos questionamentos do Comprova via rede social.

Como verificamos: A partir de mecanismos de busca do Google, o Comprova apurou que a ABI divulgou, no dia 25 de abril, notícia sobre o envio de um Informe ao Relator Especial da ONU sobre Independência de Juízes e Advogados, Diego García-Sayán, denunciando o decreto de perdão ao deputado federal Daniel Silveira.

O Comprova também buscou informações com a ABI, que confirmou o envio do material à Organização das Nações Unidas.

Citada no post no Twitter, buscamos a Abraji, que negou ter realizado tal procedimento.

Ressalta-se que a apuração deste fato é realizada pelo Comprova, que é um projeto colaborativo de verificação liderado pela Abraji.

 

Documento ABI

No documento enviado à ONU, a ABI afirma que o decreto do presidente Bolsonaro “afronta a democracia, a separação de poderes, a independência do Judiciário e a administração da Justiça”. A entidade contextualiza os acontecimentos no Brasil desde a eleição de 2018, quando peças de desinformação também foram usadas para atacar instituições democráticas.

O documento narra que “milícias digitais” passaram a atuar com disseminação de informações falsas, bem como ataques a autoridades dos poderes Legislativo e Judiciário do país. Também cita os inquéritos de números 4.781 e 4.828 abertos para investigar notícias falsas, ataques ao Supremo e existência de organização criminosa com a finalidade de atentar contra a Democracia e o Estado de Direito.

Na sequência, o Informe menciona que o deputado Daniel Silveira foi investigado e condenado pela prática de coação no curso do processo (três vezes), de incitação “à animosidade entre as Forças Armadas ou entre estas e as classes sociais ou as instituições civis” (uma vez) e de “tentar impedir, com emprego de violência ou grave ameaça, o livre exercício de qualquer dos Poderes da União ou dos Estados” (duas vezes).

Verificamos que no documento encaminhado pela ABI, no dia 22 de abril, a entidade procura chamar atenção da ONU para a Lei de Execução Penal no Brasil, mais recente que o Código de Processo Penal, em que descreve que o “indulto individual poderá ser provocado por petição do condenado, por iniciativa do Ministério Público, do Conselho Penitenciário, ou da autoridade administrativa, não prevendo a possibilidade de concessão espontânea pelo Presidente da República”.

No documento, a entidade também solicita uma reunião com o Relator da ONU, com a participação de outras entidades da sociedade civil, e espera que a Comissão se “posicione sobre as violações ocorridas com uma nota pública”.

O Informe não solicita punição ao presidente Jair Bolsonaro.

O arquivo em PDF com a íntegra do conteúdo está disponível no site da entidade.

A Abraji, por meio da secretaria-executiva, informou ao Comprova que não enviou documento algum à ONU e que não há qualquer previsão disso acontecer.

Interpretação jurídica

Após julgamento no STF no dia 20 de abril de 2022, Daniel Silveira foi sentenciado a oito anos e nove meses de reclusão e à perda do mandato. Um dia depois, o presidente Jair Bolsonaro perdoou a pena do parlamentar, antes mesmo de se esgotarem as possibilidades de a defesa recorrer à decisão do tribunal

No dia do anúncio do decreto de Bolsonaro, o professor de direito Bruno Melaragno explicou à Globonews que “a graça é individual, pessoal, e que o chefe de Estado concede a alguém condenado ou que já está cumprindo pena. Não digo que [a concessão da graça] é [algo] inédito, mas é muito raro”.

No site da BBC News, juristas disseram que, tradicionalmente, graças são dadas a casos que já foram transitados em julgado, ou seja, quando todas as possibilidades de recorrer são esgotadas em um processo.

O jurista e desembargador aposentado Walter Maierovitch declarou que o decreto do presidente poderia ser considerado tecnicamente nulo, uma vez que o julgamento de Daniel Silveira ainda está em curso e ainda cabem recursos da decisão do STF.

“Esse ato é, tecnicamente, nulo. O julgamento ainda não acabou, pois ainda cabem recursos. Como é que ele pode extinguir a pena de uma pessoa que, do ponto de vista jurídico, ainda é inocente?”, afirmou o jurista.

Para o jurista Gustavo Badaró, o indulto a Silveira pode ser interpretado como um crime de responsabilidade.

“É um crime de responsabilidade porque ele está interferindo no funcionamento do Judiciário. É uma forma de dizer que, independentemente do que o Judiciário faça em relação a uma determinada pessoa, o Executivo não permitirá que ela seja punida”, explicou.

Já o ex-ministro do STF Marco Aurélio Mello considerou que o presidente Jair Bolsonaro não cometeu crime de responsabilidade ao perdoar o deputado federal Daniel Silveira. Para o ex-magistrado, Bolsonaro exerce seu papel como Presidente da República, acompanhando a decisão dos eleitores que o colocaram à frente do Palácio do Planalto.

Por que investigamos: O Comprova checa conteúdos suspeitos que viralizaram a respeito das eleições presidenciais, políticas públicas do governo federal e pandemia de covid-19.

Entidades ligadas à imprensa também são alvo de informações suspeitas e isso gera diferentes prejuízos. Conteúdos enganosos ou falsos colocam em dúvida a credibilidade do setor, que tem o objetivo de informar o público de maneira imparcial.

Outras checagens sobre o tema: No dia 25 de abril, diversos órgãos de imprensa, como a Carta Capital, o Estadão e o UOL, noticiaram o fato de a Associação Brasileira de Imprensa ter enviado um documento à ONU relatando o indulto de Bolsonaro e pedindo que o órgão internacional acompanhasse o caso no país.

Eleições

Investigado por: 2022-04-11

Vídeo de Bolsonaro é de inauguração de trecho do VLT na Grande Natal e não de ferrovia que liga o Pará ao Maranhão

  • Enganoso
Enganoso
É enganoso o vídeo que viralizou no TikTok e procura atribuir ao governo federal a realização da estrada de ferro que liga o Pará ao Maranhão. A ferrovia e o serviço de transporte de passageiros no trecho é de responsabilidade da Vale e está em operação há 36 anos. As imagens mostram, na realidade, o presidente Jair Bolsonaro em evento de conclusão das obras do Trecho 1 da Linha Branca do VLT da Grande Natal - esta obra sim, de responsabilidade do governo federal.

Conteúdo investigado: Publicações no Facebook e TikTok mostram um vídeo em que o presidente Jair Bolsonaro (PL) aparece a bordo de um trem e acena para o público. Os posts afirmam que a gravação foi feita em um trem que liga os estados do Pará e Maranhão.

Onde foi publicado: TikTok e Facebook

Conclusão do Comprova: Vídeo engana ao vincular Jair Bolsonaro e o governo federal à criação do serviço de transporte de passageiros na linha férrea entre o Pará e o Maranhão. O conteúdo enganoso tem aparecido recentemente nas redes sociais, em diferentes formatos.

O vídeo que ilustra a postagem mostra o presidente dentro de um vagão do Veículo Leve sobre Trilhos em Parnamirim, no Rio Grande do Norte. A obra é do governo federal. Já a estrada de ferro entre o Pará e o Maranhão, que também conta com o serviço de transporte de passageiros, está em operação há 36 anos pela Vale.

Para o Comprova, é enganoso o conteúdo retirado de contexto com o intuito de provocar interpretação diversa da realidade.

Alcance da publicação: O Comprova verifica os conteúdos duvidosos de maior viralização nas redes sociais. No TikTok o vídeo atingiu 549 mil visualizações, 53 mil curtidas e 3 mil comentários até o dia 11 de abril de 2022. Já no Facebook as publicações somam 200 interações.

O que diz o autor da publicação: O Comprova entrou em contato com o autor do post no Facebook, mas não obteve retorno. Não foi possível acionar o perfil do TikTok, pois de acordo com a plataforma, a conta não pode receber mensagens “devido a várias violações das Diretrizes da Comunidade”. No perfil, são compartilhados conteúdos pró-Bolsonaro.

Como verificamos: A análise do vídeo viral trouxe referência do bairro Cajupiranga, em Parnamirim, no Rio Grande do Norte, no letreiro eletrônico do trem. Em seguida, buscas por notícias na imprensa e em sites oficiais do governo federal mostraram o evento de inauguração da estação de Cajupiranga e da conclusão das obras do Trecho 1 do VLT da Grande Natal. A Agência Brasil e o site da Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU) repercutiram o evento, assim como os portais Metrópoles, G1, UOL, entre outros.

 

O Comprova também procurou pelos vídeos originais, que não foram encontrados. No entanto, a equipe chegou a outras gravações feitas no contexto do evento (1 e 2) e, com isso, foi possível confirmar a correspondência visual.

Por fim, entramos em contato com os autores das publicações.

 

Imagens não mostram trem que vai do Pará ao Maranhão

A única linha de trem de passageiros que liga o Maranhão ao Pará no Brasil é o trem da Estrada de Ferro Carajás. A linha percorre 861 km ao longo de 27 municípios, maioria no estado do Maranhão. Recentemente o Comprova verificou outra desinformação a respeito do tema. Na publicação, o autor agradecia Bolsonaro e o ex-ministro da Infraestrutura Tarcísio de Freitas pela operação da linha, no entanto, a verificação esclareceu que o trem não tem relação com o governo federal pois é de responsabilidade da empresa Vale e existe há 36 anos.

Nos comentários, usuários alertam para a informação falsa.

Vídeo é de evento de conclusão das obras de trecho de VLT em Parnamirim/RN

As imagens que mostram o presidente Jair Bolsonaro dentro de um trem acenando para o público foram gravadas na cidade de Parnamirim, no Rio Grande do Norte (RN). A visita, na manhã do dia 30 de março, consta na agenda do presidente, que participou, na ocasião, da cerimônia de inauguração da Estação Cajupiranga, na Linha Branca da Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU).

O sistema de transporte de passageiros é no modelo VLT. O modal na Região Metropolitana de Natal é formado pelas linhas Branca e Roxa. As obras da Linha Branca foram iniciadas em fevereiro de 2021. Já as da Linha Roxa, em setembro de 2021.

O evento marcou, ainda, a conclusão das obras do Trecho 1 da Linha Branca, que é formada ainda pelos trechos 2 e 3. O sistema, incluindo as Linhas Branca e Roxa, parte do bairro Boa Esperança, em Parnamirim, e segue até São Gonçalo do Amarante/RN, como mostra trecho de documento localizado no site do Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR).

De acordo com o documento, o governo federal está investindo um total de R$ 83.142.096,71 nas obras do sistema, que é operado pela CBTU.

“Com a construção das linhas Branca e Roxa, a malha ferroviária da Grande Natal se tornará a mais extensa do Nordeste e a terceira maior do país – atrás apenas das Regiões Metropolitanas de São Paulo e do Rio de Janeiro”, diz um trecho do documento.

Confirmação da localização das imagens

A confirmação da localização do presidente no trem em Parnamirim, e não na composição que vai do Pará ao Maranhão, como diz a postagem, se deu a partir da análise de outros vídeos sobre o evento disponíveis no YouTube. As imagens apresentam as mesmas características da que aparece na publicação do TikTok aqui verificada.

Reportagem da TV Brasil sobre a inauguração da estação do VLT em Cajupiranga, mostra o modal passando em buzinaço com o presidente dentro, a partir de 1’31. Já neste outro vídeo, a comparação entre as imagens não deixa dúvida. Em 9’51, é possível ver Bolsonaro dentro do vagão acenando para a população, ao lado do ex-ministro do Desenvolvimento Regional Rogério Marinho e de um cameraman:

Os mesmos personagens e as mesmas características do trem e do local também aparecem no vídeo verificado:

Evento de inauguração em Parnamirim custou R$ 550 mil

O documento localizado pelo Comprova no site do MDR, que aparece acima, é sobre contratação de empresa para a realização do evento “Inauguração da Estação Cajupiranga e conclusão da obra de expansão do primeiro trecho da Linha Branca” no dia 30 de março de 2022.

O valor total é de R$ 550 mil. Na página 3, aparece a descrição do serviço:

“Apoio na realização de eventos de inauguração entregas do Governo Federal. Planejamento do evento; Montagem da estrutura; Realização do evento; Desmontagem da estrutura; Prestação de contas”.

Por que investigamos: O Comprova investiga conteúdos suspeitos que viralizaram a respeito da pandemia de covid-19, políticas públicas do governo federal e eleições presidenciais. Publicações que exaltam feitos de pré-candidatos — no caso de Bolsonaro — e são baseadas em informações enganosas podem influenciar negativamente na escolha do eleitor. O voto é o principal instrumento de participação popular em uma democracia. A decisão sobre o candidato deve ser tomada com base em informações verdadeiras e confiáveis.

Outras checagens sobre o tema: As agências Lupa e Aos Fatos checaram o mesmo conteúdo e a conclusão foi igual à do Comprova, de que o vídeo foi feito na inauguração da estação de Cajupiranga e não no trem que liga o Pará ao Maranhão. Recentemente, o Comprova verificou que a linha de trem que liga o Pará ao Maranhão existe há 36 anos e não é obra do governo Bolsonaro, que a obra de uma ponte sobre o Rio das Mortes em Mato Grosso é de responsabilidade do estado e não do governo federal e que o Parque do Iguaçu foi criado por Vargas, não por Lula.

Política

Investigado por: 2022-04-05

Polícia Federal nega que ONGs que atuam na Amazônia transportaram ouro ilegalmente como afirma publicação

  • Enganoso
Enganoso
São enganosas as publicações nas redes sociais que atribuem transporte ilegal de barras de ouro a ONGs que atuam na Amazônia. As publicações usam o vídeo de uma abordagem policial que encontrou barras de ouro dentro de peças de carro. A ação ocorreu em Goiás e acarretou na prisão de contrabandistas que faziam a extração de ouro de forma irregular no interior do Pará.

Conteúdo investigado: Vídeo publicado nas redes sociais mostra um militar abrindo uma peça de motor e encontrando dentro dele uma grande quantidade de envelopes com barras de ouro. Na legenda, os autores das publicações afirmam ser uma investigação do Exército brasileiro, que desconfiava da quantidade de motores enviados por ONGs que atuam na Amazônia para fora do país para conserto.

Onde foi publicado: Facebook, Telegram e Youtube

Conclusão do Comprova: São enganosas as publicações que usam vídeo de uma apreensão de ouro para culpar ONGs que atuam na Amazônia. Essas publicações associam indevidamente uma ação da Polícia Militar – que acarretou em uma apreensão de ouro escondido dentro de peças de carros – a uma investigação do Exército brasileiro sobre o envio para conserto no exterior de motores de veículos de ONGs que atuam na Amazônia. Ao Comprova, a Polícia Militar e a Polícia Federal negaram a participação de ONGs no caso.

O vídeo mostra na verdade uma apreensão feita pela Polícia Militar do estado de Goiás durante uma abordagem na cidade de Montes Claros de Goiás, no Centro-Oeste. Os policiais apreenderam 19 barras, com mais de 11 quilos ao todo, e que somavam mais de R$ 4 milhões. Os dois ocupantes do veículo foram presos. Conforme a Polícia Militar, o ouro seria oriundo de garimpos ilegais no interior do estado do Pará.

Para o Comprova, enganoso é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos, que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

O que diz o autor da publicação: Os autores das publicações foram procurados pelas redes sociais e até o momento não retornaram os questionamentos do Comprova.

Como verificamos: Com a utilização do Youtube DataViewer e do InVid, ferramentas gratuitas que permitem a análise de vídeos, foi possível fazer a busca reversa no Google e nas redes sociais usando frames, imagens congeladas do vídeo, e encontrar outras publicações semelhantes.

Entre as opções destacadas pelas ferramentas estavam vídeos com descrições iguais ao vídeo investigado e matérias dos sites Metrópoles e Jornal Opção, ambas com data de publicação anterior aos vídeos afirmando ser uma operação do exército contra ONGs, que mostravam uma abordagem policial que tinha apreendido cerca de 11 quilos de ouro em uma cidade no interior de Goiás.

O Comprova procurou a Polícia Militar de Goiás e a Polícia Federal sobre o caso.

 

Ouro foi apreendido em Goiás

Em 18 de fevereiro deste ano, a Polícia Militar de Goiás, por meio do Comando de Operações de Divisas (COD), apreendeu 19 barras de ouro durante a abordagem de uma caminhonete em Montes Claros de Goiás, distante 270 quilômetros de Goiânia. A ocorrência foi descrita pela própria corporação em seu site oficial (veja aqui).

Conforme a polícia, a presença de uma peça de câmbio avulsa na carroceria do carro chamou atenção. Ao abrir a peça, a equipe encontrou o ouro. Ao todo foram localizadas 19 barras com tamanhos e pesos diversos. O material apreendido totalizou 11,3kg.

Ainda de acordo com a nota da polícia, o metal precioso era proveniente de garimpos e explorações ilegais. Os dois ocupantes do veículo foram presos em flagrante e conduzidos para a Polícia Federal de Goiânia.

O ouro e o carro foram apreendidos. O prejuízo calculado pelos polícias com a ação era de R$ 4 milhões.

Vídeo da apreensão foi divulgado por jornais

O Metrópoles divulgou em seu canal no Youtube um vídeo da apreensão. As imagens são as mesmas que foram usadas na publicação verificada. Além do vídeo, o portal publicou matéria sobre o caso.

A ação policial também foi noticiada pelo Jornal Opção. A matéria ainda divulga o vídeo do momento da apreensão.

O Estadão Verifica também apurou o conteúdo no último mês de março e chegou à mesma conclusão de que o vídeo de apreensão de ouro em peça mecânica não tem relação com ONGs da Amazônia.

Polícia Militar e Polícia Federal negam envolvimento de ONGs

A Polícia Militar de Goiás confirmou ao Comprova o caso e as circunstâncias. A corporação afirmou que nenhuma relação com ONG foi feita durante o trabalho dos PMs.

Já a Polícia Federal revelou que o ouro apreendido foi apresentado e que duas pessoas foram presas. A investigação da PF não determinou nenhuma relação entre o ouro e ONGs.

Por que investigamos: O Comprova investiga conteúdos suspeitos que tenham viralizado nas redes sociais sobre a pandemia de covid-19, políticas públicas do governo federal e eleições presidenciais.

Sobre o conteúdo aqui investigado, o Comprova apurou postagens que estão desinformando sobre a operação da PM de Goiás que prendeu dois suspeitos de transportarem minério extraído de garimpo ilegal. O boato amplamente divulgado em redes sociais e aplicativos insinua que ONGs que atuam na Amazônia seriam as responsáveis pelo ouro encontrado escondido em peça mecânica e que as organizações também estariam praticando crimes ambientais na Amazônia.

Alcance da publicação: No Facebook, até 4 de abril de 2022, a postagem teve 1,1 mil visualizações e 468 interações. No Twitter, até 4 de abril, a publicação alcançou 1.998 views.

Outras checagens sobre o tema: Em outras verificações, o Comprova já mostrou que um vídeo de protesto contra Lula em show de Marina Sena é falso e que um tuíte distorceu fatos sobre redução de preços de gasolina em ano eleitoral.