O Projeto Comprova é uma iniciativa colaborativa e sem fins lucrativos que reúne jornalistas de 41 veículos de comunicação brasileiros para descobrir e investigar informações suspeitas sobre políticas públicas, eleições presidenciais e a pandemia de covid-19 que foram compartilhadas nas redes sociais ou por aplicativos de mensagens.Filtro:
O governo brasileiro não toma partido na atual tensão entre Venezuela e Guiana pelo controle do território de Essequibo, região com mais de 160 mil quilômetros, rica em recursos naturais e que está sob administração da Guiana. A posição oficial do Itamaraty é de busca por uma solução negociada e pacífica para o caso. O Ministério da Defesa enviou reforço de tropas do Exército Brasileiro a Roraima, na região da fronteira com os dois países. O objetivo, segundo o ministro José Múcio disse à TV Globo, é impedir que militares venezuelanos transitem pelo território brasileiro.
Conteúdo investigado: Vídeo no Instagram aborda tensão entre Venezuela e Guiana pelo domínio do território de Essequibo, administrado pela Guiana e onde foram descobertas ricas jazidas de petróleo em 2015. Ao afirmar que tropas do Exército Brasileiro se deslocaram para Roraima, na região da fronteira do Brasil com os dois países, o responsável pela gravação diz que, devido à proximidade do presidente brasileiro com o venezuelano, “a população fica na dúvida se este comboio seria para impedir a invasão venezuelana ou para apoiá-la”. Ele alega também que o episódio pode colocar em xeque a relação do Brasil com os Estados Unidos, já que uma empresa americana de petróleo atua na região.
Onde foi publicado: Instagram.
Contextualizando: Informações de que o Exército Brasileiro enviou reforço a Pacaraima (RR), na região da tríplice fronteira entre Brasil, Venezuela e Guiana, começaram a ganhar projeção nas redes sociais em novembro de 2023. Segundo publicação do jornal Folha de Boa Vista do dia 24, “moradores do município de Pacaraima divulgaram, nas últimas duas semanas, vídeos que registram uma movimentação anormal de tropas do Exército Brasileiro em direção à fronteira do Brasil com a Venezuela”.
Posteriormente, entre os dias 29 e 30, outros veículos começaram a publicar notícias sobre o reforço (Folha de S.Paulo, Estadão, TV Globo, Agência Brasil), que acontece em momento em que a Venezuela ameaça anexar a região de Essequibo, que corresponde a dois terços do território da Guiana, fica na fronteira entre os dois países e é rica em petróleo recursos naturais. A região é disputada entre Venezuela e Guiana desde 1841. A reivindicação do território pela Venezuela se intensificou a partir de 2015, quando foram descobertas jazidas de petróleo em Essequibo.
A controvérsia pela soberania da região remonta a 1811, quando a Venezuela tornou-se independente do domínio espanhol tendo a região de Essequibo como parte de seu território. Três anos depois, em um acordo com a Holanda, o Reino Unido assumiu o controle da área que corresponde à Guiana e, segundo denúncia da Venezuela em 1841, se apoderou do território. O impasse resultou, em 1899, em um tribunal internacional que decidiu que o território pertencia à então Guiana inglesa.
A Venezuela, porém, voltou a contestar o domínio da região de Essequibo e atualmente se apega a um acordo, firmado em Genebra, pouco antes da independência da Guiana, em 1966, que decidiu por uma solução negociada, mas que nunca saiu. A Guiana, por sua vez, reivindica a validade do acordo de 1899, não reconhecido pela Venezuela.
Reforço militar é para impedir trânsito de tropas venezuelanas em território brasileiro
Segundo o G1, o ministro da Defesa, José Múcio Monteiro, afirmou à TV Globo, em 30 de novembro, que o envio de reforço do Exército Brasileiro a Pacaraima tem o objetivo de evitar qualquer trânsito de militares venezuelanos pelo território brasileiro. Ao Comprova, o Ministério da Defesa afirmou, em nota, que tem acompanhado a situação: “As ações de defesa têm sido intensificadas na região da fronteira ao Norte do país, promovendo maior presença militar”, informou a pasta.
Itamaraty busca solução pacífica para o caso
O vídeo que viralizou no Instagram sobre o assunto diz que, devido à proximidade de Lula com Nicolás Maduro, presidente venezuelano, não se sabe se o reforço do Exército Brasileiro na fronteira seria para impedir a invasão venezuelana da Guiana ou para apoiá-la. Segundo posicionamento do Ministério das Relações Exteriores, o Brasil é neutro no caso.
Em 30 de novembro, a embaixadora brasileira Gisela Padovan, secretária de América Latina e Caribe do Itamaraty, disse que o Brasil tem conversado com as duas partes em busca de uma solução negociada e pacífica para a questão. “O nosso interesse realmente é não ter nenhuma questão militar e bélica na nossa região. A gente prima pela paz e pela cooperação e todos os esforços brasileiros, nos mais diferentes âmbitos, são nesse sentido”, disse a embaixadora.
A embaixadora ressaltou que o caso está sendo avaliado pela Corte Internacional de Justiça da Organização das Nações Unidas (ONU), e que o governo brasileiro está acompanhando as resoluções do órgão sobre o caso. “O Brasil está acompanhando e mantendo um diálogo construtivo em busca de uma solução bilateral ou pela Corte, mas uma solução pacífica”, disse Gisela Padovan.
Em meio à tensão entre os dois países, Nicolás Maduro convocou um referendo para 3 de dezembro em que os venezuelanos terão que responder se apoiam a anexação de cerca de 75% do território da Guiana para a criação da chamada “Guiana Essequiba”.
Em 1º de novembro de 2023, a Corte Internacional de Justiça decidiu que a Venezuela não pode tentar anexar a região de Essequibo, na Guiana. Porém, o governo de Caracas diz que não reconhece o órgão e que o referendo está mantido. A Corte tem o papel de resolver disputas entre Estados, mas sua atuação é mais simbólica do que prática, já que o tribunal não pode obrigar países a cumprirem suas decisões.
Como o conteúdo pode ser interpretado fora do contexto original: Da forma como foi veiculado, o vídeo e o comentário do autor dão margem à interpretação de que o envio de tropas do Exército Brasileiro para Roraima teria o objetivo de apoiar o governo venezuelano em uma possível invasão à Guiana.
O que diz o responsável pela publicação: O Comprova fez contato com o responsável pela conta que postou o vídeo. Ele alegou propósito informativo. Porém, quando perguntado sobre a origem da informação, critério e contexto da publicação em seu perfil no Instagram, não respondeu.
Alcance da publicação: Até o dia 1º de dezembro, o vídeo que motivou esta verificação tinha 1,7 milhão de visualizações, 159.413 mil curtidas no Instagram, 22,6 mil envios, além de 1,7 mil comentários.
Como verificamos: O Comprova buscou notícias na imprensa sobre o conflito entre Venezuela e Guiana pelo domínio de Essequibo e fez contato com o Ministério da Defesa e o Ministério das Relações Exteriores para entender a posição do Brasil na disputa e o envio de tropas do Exército para a região da tríplice fronteira. O Comprova também identificou um padre que atua há 11 anos em Pacaraima para buscar informações sobre o clima na região e fez contato com o responsável pelo vídeo que deu origem a esta verificação.
Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.
Decreto do governo federal que regulamenta Lei da Igualdade Salarial estabelece que empresas com mais de 100 empregados deverão divulgar relatórios constando o cargo de seus trabalhadores e trabalhadoras e os valores de suas remunerações. A intenção é verificar se a legislação está sendo cumprida. Caso constatada desigualdade salarial entre homens e mulheres, a empresa será notificada e terá que elaborar um plano para mitigação do problema.
Conteúdo investigado: Publicações afirmam: “de acordo com um decreto do Governo Federal, as empresas estão agora obrigadas a divulgar os salários de seus colaboradores”. Nas postagens, não fica claro se os nomes das pessoas também serão divulgados junto com os valores nem qual é o motivo da política governamental.
Onde foi publicado: X (antigo Twitter) e Telegram.
Contextualizando: A partir de 2024, empresas com mais de 100 empregados terão que divulgar o Relatório de Transparência Salarial e de Critérios Remuneratórios, que deverá conter cargo ou ocupação das trabalhadoras e dos trabalhadores e os valores de todas as remunerações. A publicação deve trazer as informações com os dados pessoais anonimizados, ou seja, sem identificação.
A medida está prevista no Decreto nº 11.795, publicado no Diário Oficial da União (DOU) do dia 23 de novembro, regulamentando a Lei nº 14.611, de julho deste ano. A lei estabeleceu a obrigatoriedade de igualdade salarial entre mulheres e homens para a realização de trabalho de igual valor ou no exercício da mesma função, enquanto o decreto trata dos mecanismos a serem utilizados para garantir e fiscalizar isso.
Os relatórios deverão ser divulgados a cada seis meses, sempre nos meses de março e setembro, e devem conter os valores relativos ao salário contratual; 13° salário; gratificações; comissões; horas extras; adicionais noturno, de insalubridade, de penosidade, de periculosidade, entre outros; terço de férias; aviso prévio trabalhado; descanso semanal remunerado; gorjetas; e outras remunerações previstas em norma coletiva de trabalho.
Outras informações que deverão constar nos relatórios ainda serão estabelecidas pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), bem como o formato e procedimento de envio, que deverá ser por meio de ferramenta informatizada. Além do envio ao MTE, os relatórios deverão ser disponibilizados ao público na internet.
Caso seja constatado que há desigualdade salarial entre homens e mulheres, funcionários da mesma empresa, ela será notificada pelo MTE e a empresa terá 90 dias para elaborar um Plano de Ação para Mitigação da Desigualdade Salarial e de Critérios Remuneratórios entre Homens e Mulheres. Estes planos deverão conter as medidas a serem adotadas, bem como a implementação de ações de promoção da diversidade e inclusão no ambiente de trabalho.
Como o conteúdo pode ser interpretado fora do contexto original: Sem o contexto, o usuário que se depara com a publicação não tem como compreender do que se trata o decreto em questão e por qual motivo as empresas são obrigadas a divulgar os salários dos colaboradores. A afirmação isolada pode até gerar interpretações equivocadas sobre vazamento de dados pessoais e invasão de privacidade.
O que diz o responsável pela publicação: Foi enviada mensagem direta para o autor da publicação via X . O perfil em questão enviou como resposta links de matérias que anunciam o decreto publicado pelo governo federal. A página, que se classifica como portal de “notícias, comédia, paródia, ironia e sátira”, já compartilhou outros conteúdos alvos de investigação do Comprova.
O que podemos aprender com esta verificação: Usuários das redes sociais devem estar atentos a informações incompletas que circulam online. No caso da publicação em questão, não havia contexto suficiente para entender do que se tratava o decreto, o que dá margem para interpretações equivocadas, como por exemplo, a compreensão errônea de que os dados pessoais dos trabalhadores e trabalhadoras seriam expostos, sem respeito à Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais.
Alcance da publicação: No X, a publicação teve 26,8 mil visualizações, 23 comentários, 37 republicações e 329 curtidas até 29 de novembro. No Telegram, foram 8,3 mil visualizações até a mesma data.
Como verificamos: No Google, fizemos uma busca pela frase: “empresas estão agora obrigadas a divulgar os salários de seus colaboradores”. Como resultado da pesquisa, apareceu uma matéria da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), portal de notícias governamental, anunciando a publicação do decreto que regulamenta a lei da igualdade salarial. A partir disso, analisamos as informações incluídas no Decreto nº 11.795 e na Lei nº 14.611, sancionada em julho deste ano.
Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.
A Amazônia é frequentemente alvo de desinformação nas redes sociais. Números e imagens mostrando desmatamento e queimadas são usados, muitas vezes sem contexto, por diferentes grupos políticos para atacar opositores. O Comprova analisa dados de queimadas e incêndios na Amazônia brasileira e esclarece, a partir de análises de especialistas, o aumento de focos de incêndio no bioma em 2023.
Conteúdo investigado: Em vídeo publicado no Instagram, uma mulher aborda pessoas na rua e mostra imagens de queimadas que ela diz serem na Amazônia. Ela questiona os passantes se as fotos seriam de incêndios que ocorreram durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) ou do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Os respondentes indicam que seriam imagens feitas durante o governo Bolsonaro e ela afirma que são fotos de 2023 e que “a mídia não está noticiando nada”. O vídeo é acompanhado da legenda “Até ano passado, queimadas na Amazônia eram escândalo. Hoje, não dá nem notícia. Por quê?”.
Em 2023, dados oficiais do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) mostram que houve uma redução do desmatamento no bioma, mas um aumento nas queimadas. Segundo especialistas ouvidos pelo Comprova, os motivos são diversos e incluem as condições climáticas — principalmente pela influência do El Niño —; queimadas para gestão da terra; e o legado de desmatamentos anteriores, que acabam deixando o solo seco e, com isso, mais propenso a incêndios.
Nas redes sociais, opositores de Lula cobram do poder público, de ativistas e até artistas posicionamento a respeito do aumento nos focos de incêndio, alegando que durante o mandato do ex-presidente Bolsonaro havia uma exigência maior de ações governamentais para controlar a degradação da Amazônia. Alguns grupos políticos afirmam ainda que a imprensa estaria deixando de noticiar os incêndios para favorecer a atual gestão.
Para esclarecer a questão, o Comprova analisou dados de queimadas e desmatamentos registrados nos quatro anos de governo Bolsonaro e no primeiro ano de governo Lula (até setembro) e reuniu informações a respeito das políticas de ambos relativas ao meio ambiente. Também foram consultados especialistas para detalhar a situação do desmatamento e das queimadas na Amazônia e quais as causas dos incêndios recentes.
Os primeiros anos do governo Bolsonaro foram marcados por recordes no número de incêndios na Amazônia. Em 2019, foram detectados mais focos de incêndio entre os meses de março e abril do que durante toda a série histórica do Projeto Queimadas, do Inpe, que começou em 1999. Em agosto do mesmo ano, o número de incêndios foi o maior em 15 anos. Foi naquele ano que aconteceu o “Dia do Fogo”, ocasião em que fazendeiros do Pará se uniram para causar incêndios e desmatar áreas para criação de gado. O caso foi noticiado internacionalmente.
No ano seguinte, 2020, as queimadas se mantiveram e foram somadas a um aumento no desmatamento. Segundo o Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), a taxa de desmatamento entre agosto de 2020 e julho de 2021 foi 57% maior que a da temporada anterior e a pior dos últimos dez anos.
Sob a gestão do ex-ministro Ricardo Sales na pasta de Meio Ambiente, funcionários de perfil técnico no Ibama e no ICMBio foram preteridos por indicados do círculo pessoal dele. Foram nomeados, particularmente, muitos policiais militares para postos relevantes.
A frase de Salles que marcou sua passagem pelo governo aconteceu em um pronunciamento na reunião ministerial de 22 de abril de 2022. Ele defendeu que o governo aproveitasse os dias de transtorno do início da pandemia de Covid-19 para “ir passando a boiada”. A sugestão era que o governo emitisse decretos e medidas provisórias para afrouxar a fiscalização ambiental diante do caos global causado pela pandemia.
Após ser alvo de uma ação de busca e apreensão pela Polícia Federal, Sales deixou o cargo e foi substituído por Joaquim Leite, que manteve, grosso modo, as mesmas diretrizes da gestão anterior.
Às Forças Armadas ficou relegado o planejamento e o combate ao desmatamento na Amazônia.
As promessas e ações de Lula para a Amazônia
Durante a campanha eleitoral de 2022, o então candidato Luiz Inácio Lula da Silva (PT) destacou projetos de preservação ambiental e principalmente o combate ao desmatamento na Amazônia como uma maneira de se diferenciar de Bolsonaro, mas também de obter apoio internacional.
Dias depois, o presidente do Ibama, Rodrigo Agostinho, admitiu ao Estadão que a estrutura de combate a incêndios e a resposta à crise na Floresta Amazônica ainda são insuficientes.
Lula também prometeu, em discurso na COP27, zerar o desmatamento e a degradação de biomas até 2030.
Considerando o período compreendido somente no governo Lula – 1º de janeiro a 31 de julho –, a redução na destruição da floresta amazônica no Brasil foi de 63%. A pesquisadora do Imazon Larissa Amorim afirmou ao site O Eco que o resultado só foi possível devido à retomada da pauta ambiental pelo novo governo.
“Somente o fato de não incentivar o desmatamento ilegal, por si só, já causa um efeito, por perda daquela sensação de impunidade. O fortalecimento dos órgãos responsáveis pelas ações de combate ao desmatamento, como, por exemplo, o Ibama e o ICMBio, também são muito importantes”, disse ao site.
Do ponto de vista político, Lula enfrenta problemas para dar destaque à questão do meio ambiente. Sob pressão da bancada ruralista e com apoio de deputados do Centrão, foi aprovado um projeto de lei complementar que retirou poderes dos Ministérios de Meio Ambiente e dos Povos Indígenas. A pasta, que é comandada por Marina Silva, ficou sem o Cadastro Ambiental Rural (CAR) e sem a Agência Nacional de Águas (ANA).
A relação do desmatamento com o atual cenário das queimadas
No entanto, a Amazônia tem sido castigada com o crescimento no número de focos de queimadas. De acordo com Inpe, entre 1º de janeiro e 20 de novembro de 2023, 91.162 focos foram registrados no bioma. Só em novembro são 11.160. O acumulado, porém, ainda é menor se comparado ao mesmo período em 2022, quando foram 110.481 focos — uma queda de 17%.
“Embora exista uma relação entre desmatamento e incêndios florestais, a dinâmica atual mostra que os incêndios podem persistir e até aumentar mesmo em um contexto de desmatamento reduzido, devido a fatores climáticos e legados do desmatamento passado”, explica o professor do Departamento de Engenharia Civil e Ambiental da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) Celso Augusto Guimarães Santos.
Entre as condições climáticas, o El Niño é apontado como um dos fatores já que o fenômeno deixa o tempo mais seco. Outro ponto são as queimadas para gestão da terra, como a limpeza de terrenos de pastagem, que podem sair do controle devido às condições ambientais.
“Esta situação destaca a complexidade dos desafios ambientais enfrentados na Amazônia e a necessidade de abordagens de gestão e conservação que considerem tanto o desmatamento quanto às condições propícias para incêndios”, afirma.
Guimarães Santos integra um grupo de pesquisadores que publicou um artigo na revista Nature Ecology & Evolution que aponta que apenas 19% dos incêndios registrados este ano na Amazônia estão ligados ao desmatamento recente. O dado faz parte de uma pesquisa feita por cientistas de diversas instituições nacionais e internacionais.
“A fragmentação resultante do desmatamento anterior pode tornar as florestas remanescentes mais vulneráveis a incêndios, pois as bordas das florestas são mais suscetíveis a secar e queimar”, complementa.
O professor José Salatiel Rodrigues Pires, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), explica, ainda, que as queimadas são rastreadas como pontos de calor, gerados pela queima de áreas para agricultura, em áreas de pastagens secas que já haviam sido desmatadas ou em florestas secas. Nesta situação, um raio, por exemplo, pode gerar um ponto de combustão que será detectado pelo satélite, mas que nem sempre terá ligação com o desmatamento
Esta questão técnica já vigia no governo Bolsonaro, mas no cenário atual, de seca na Amazônia, se torna mais relevante. Assim, explica Pires, para ter certeza da origem da queimada, é preciso usar um conjunto de dados.
“Quando o satélite detecta um ponto de calor, ele não verifica qual o uso da terra existe nessa área (se é uma área de cana-de-açúcar, uma área de pastagem ou uma floresta desmatada queimando)”, diz. “Para poder analisar se as áreas de queimadas são áreas desmatadas, temos que cruzar essa informação com as imagens de outros satélites. Se o foco de calor está em uma área de agricultura, sabemos que foi uma queimada de manejo agrícola, mas se está em uma floresta, podemos verificar se é devido a desmatamento”, afirma.
Sem cruzar os dados, diz o pesquisador, pode-se pensar, “de forma errônea, que tudo se trata de área desmatada sendo queimada”.
A mídia não mostra as queimadas atualmente?
Ao contrário do que é dito na publicação investigada, a mídia tem relatado o atual momento na Amazônia e a relação entre as queimadas e o desmatamento. Em julho, o Nexo publicou uma reportagem que explica os motivos para o aumento nas queimadas, mesmo com a queda no desmate.
O Estadão também trouxe um conteúdo em que mostra os motivos para o aumento no número de focos de incêndio na Amazônia. O artigo, inclusive, aponta que, segundo a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, os impactos do El Niño, agravados pelas mudanças climáticas, são um desafio e, por isso, aumentou o número de brigadistas na região. Além disso, na mesma reportagem, o presidente do Ibama, Rodrigo Agostinho, admite que a estrutura de combate ao fogo é insuficiente e, por isso, solicitaria mais recursos ao Fundo Amazônia para ações como essa.
O tema também foi discutido no episódio do podcast “OAssunto”, do G1, em 7 de novembro. No episódio, a diretora de ciência do Ipam (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia), Ane Alencar, apontou a seca e os índices anteriores de desmatamento como fatores que contribuem para o alastramento do fogo.
Como o conteúdo pode ser interpretado fora do contexto original: A publicação dá a entender que as queimadas na Amazônia não estão na pauta da mídia. No entanto, como mostra a verificação, o tema tem sido discutido, assim como o foi no governo passado. Atualmente, as matérias focam em explicar o motivo do aumento nos incêndios uma vez que os índices de desmatamento tem caído.
O que diz o responsável pela publicação: O Comprova entrou em contato com o perfil no Instagram responsável por um vídeo viral a respeito do tema, mas não houve retorno até a conclusão deste conteúdo.
O que podemos aprender com esta verificação: Formar opiniões baseadas em fatos e evidências é importante para a tomada de decisão dos cidadãos. A Amazônia é um dos biomas mais importantes do mundo e é tema de discussões na sociedade e nos diversos níveis do poder público. Diante de conteúdos que tratam o tema de forma alarmista, sem apresentar fontes de informação ou contexto e sem respaldo de especialistas, é preciso desconfiar – ainda mais no ambiente político polarizado do Brasil. Munidos de informações relevantes e atualizadas, os cidadãos podem acompanhar e fiscalizar governos para que sejam tomadas medidas para a preservação da região.
Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. No instagram, a publicação contava com 5,6 milhões de visualizações em 21 de novembro.
Como verificamos: A reportagem buscou dados sobre desmatamento no sistema Prodes e sobre queimadas no Programa Queimadas, ambos do Inpe. Também pesquisamos por reportagens atuais a respeito da situação da Amazônia e matérias feitas durante o governo Bolsonaro. Ainda entrevistamos os pesquisadores José Salatiel Rodrigues Pires, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e Celso Augusto Guimarães Santos, do Departamento de Engenharia Civil e Ambiental da Universidade Federal da Paraíba (UFPB).
O Comprova também demandou o Inpe, mas o órgão informou que não iria se manifestar sobre postagens de terceiros.
Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.
Publicações nas redes sociais alegam que Lula cortou uma 13ª parcela do pagamento dos beneficiários do Bolsa Família. Entretanto, os favorecidos pelo programa receberam o “13º” uma única vez, em 2019. Apesar da inclusão de uma parcela extra já ter sido discutida outras vezes, o entendimento até o momento foi que o programa assistencial não se enquadra na lógica trabalhista, não comportando, portanto, o pagamento do 13º.
Conteúdo analisado: Vídeo que circula nas redes sociais mostra trecho de transmissão da CNN Brasil em que uma apresentadora afirma que o Bolsa Família não terá “13º salário” em 2023 e, na sequência, uma autoridade fala sobre a questão. Ao redor da imagem, foram acrescentados gifs de pessoas “fazendo o L” e dando risadas.
Comprova Explica: O Programa Bolsa Família é alvo frequente de peças de desinformação nas redes sociais. Muitas delas afirmam que o governo federal cortou beneficiários aleatoriamente ou reduziu o valor de maneira deliberada. Devido à nova onda de desinformação sobre o tema, sobre o pagamento de uma 13ª parcela do benefício, o Comprova Explica detalha como são os pagamentos do novo programa.
Diferentemente do que sugerem posts virais, o Bolsa Família não contava com um “13º salário”, que foi cortado por Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Uma parcela extra do benefício foi paga uma única vez, em 2019. Em março de 2023, o governo federal, sob o comando de Lula, afirmou que não deve retomar o benefício extra e avaliou o pagamento de 2019 como uma “promessa de campanha” do governo anterior, de Jair Bolsonaro (PL).
Entretanto, o novo Bolsa Família, aprovado em 2023, prevê pagamentos superiores ao antigo Auxílio Brasil, do governo Bolsonaro. Até junho de 2022, o pagamento mínimo do Auxílio Brasil era de R$ 400. Então, passou a R$ 600 com a adição de uma ajuda por causa da guerra na Ucrânia — para compensar pela alta de preços de comida e energia. A ajuda extra era temporária, seria disponibilizada até o mês de dezembro. No novo Bolsa Família, o pagamento mínimo foi fixado em R$ 600. Valor que pode aumentar conforme condições específicas dos beneficiários.
O pagamento fixo de uma 13ª parcela do benefício social já foi discutido outras vezes, mas nunca foi aprovado pelo Congresso. Ainda assim, em alguns estados, os beneficiários do Bolsa Família recebem um pagamento extra, como uma espécie de bônus natalino, por meio de programas assistenciais estaduais.
Como verificamos: A partir das imagens utilizadas na publicação investigada, fizemos uma busca no YouTube com as palavras “CNN + 13º + Bolsa Família” e chegamos ao vídeo original, veiculado originalmente em 4 de março de 2023.
Na sequência, com uma busca no Google por “13º Bolsa Família”, encontramos uma notícia do g1 sobre a entrevista que aparece no post investigado.
13º do Bolsa Família foi pago somente em 2019
Conforme informado pelo governo federal no início de março, não haverá pagamento de 13º parcela do Bolsa Família. O pagamento de uma parcela extra do benefício ocorreu apenas uma vez, em 2019. O bônus foi pago em dezembro daquele ano a 13,5 milhões de famílias e teve custo de R$ 2,58 bilhões.
Em entrevista coletiva, a secretária de Avaliação de Gestão da Informação e Cadastro Único, Letícia Bartholo, afirmou que “o Bolsa Família é um programa de assistência, de complemento de renda, não se adequa à vinculação de um 13º salário”.
Em 2019, o pagamento foi feito por meio de uma Medida Provisória (MP). Para se tornar lei, deveria ser votada e aprovada pela Câmara e pelo Senado em até 120 dias. De acordo com Ricardo Barros (PP-PR), líder do governo na Câmara à época, a votação não ocorreu a pedido do próprio governo. “Não havia recursos orçamentários para isso, portanto o Ministério da Economia pediu que a medida não fosse votada”, afirmou.
Novo Bolsa Família
O programa Bolsa Família foi criado em outubro de 2003, no primeiro governo Lula, e tem como objetivo a transferência direta de renda para famílias em situação de pobreza e extrema pobreza em todo o país.
Em 2021, no governo de Bolsonaro, o programa foi extinto e substituído pelo Auxílio Brasil. Neste ano, na terceira gestão Lula, ele voltou a ser chamado de Bolsa Família.
No dia anterior à entrevista coletiva concedida por Letícia Bartholo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) havia assinado uma MP reformulando o programa. Desde então, a MP já se transformou na Lei 14.601/23, aprovada em junho pela Câmara dos Deputados.
O novo Bolsa Família prevê:
pagamento de pelo menos R$ 600 por família;
R$ 150 adicionais para cada criança de até 6 anos;
R$ 50 adicionais para crianças com mais de 7 anos e jovens com menos de 18;
R$ 50 adicionais para gestantes.
Podem ter acesso ao programa famílias com renda mensal familiar per capita igual ou menor a R$ 218. De acordo com o governo federal, cerca de 21 milhões de famílias recebem o benefício.
Para fins de comparação, o Auxílio Brasil, aprovado pelo Senado no final de 2021, tinha como pagamento mínimo R$ 400. De acordo com o Ministério da Cidadania, o valor médio do benefício na folha de pagamento de janeiro de 2022 foi de R$ 407,54. A renda familiar máxima para ter direito ao benefício era de R$ 210 per capita.
13º do Bolsa Família
O pagamento de uma 13ª parcela para beneficiários do Bolsa Família já foi discutido em outros momentos. Em 2007, a Comissão de Seguridade Social e Família rejeitou um Projeto de Lei que criava o 13º do Bolsa Família.
A justificativa dada pelo relator do projeto na comissão, o então deputado Dr. Rosinha (PT-PR), para a rejeição foi o entendimento que o 13º salário é de natureza trabalhista e não se encaixa nas regras e lógicas da assistência social — de forma similar ao que afirmou Letícia Bartholo este ano.
Apesar de não existir no âmbito federal, existem programas estaduais que garantem o recebimento de um “13º do Bolsa Família”. Isso ocorre em Pernambuco. A iniciativa concede anualmente uma parcela extra aos beneficiários do Bolsa Família no estado.
Em 2023, aproximadamente 1.077.294 famílias serão atendidas pelo programa, de acordo com a Secretaria Estadual de Desenvolvimento Social, Criança, Juventude e Prevenção à Violência e às Drogas. A iniciativa concedeu, em 2023, até R$ 150 por família.
Na Paraíba, uma lei estadual institui um abono natalino para os beneficiários do programa federal. O valor do abono é fixado em R$ 64.
Por que explicamos: O Comprova Explica tem a função de esclarecer temas importantes para que a população compreenda assuntos em discussão nas redes sociais que podem gerar desinformação. É importante esclarecer situações referentes a programas de auxílio, pois a menção de cancelamento ou diminuição de valores pagos pelo governo dão a entender que a população está sendo prejudicada, e informações descontextualizadas ou em tons alarmistas são frequentemente compartilhadas com o objetivo de causar pânico nos beneficiários.
Uma lei sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em agosto de 2023 reconheceu a tradição do uso do pau de arara em romarias religiosas como manifestação cultural e imaterial do Brasil. Esse tipo de veículo consistia na adaptação de caminhões para o transporte de pessoas, com a inclusão de bancos e toldos em carrocerias. Embora tradicional em cidades do interior do Nordeste, a utilização é proibida desde 2014 por resolução do Conselho Nacional de Trânsito (Contran). A lei sancionada não faz qualquer mudança quanto a isso.
Conteúdo investigado: Vídeo mostra trechos de uma solenidade do governo federal com a presença do presidente Lula e outras autoridades. O narrador do conteúdo diz que o povo nordestino “pode comemorar”, pois o “governo petista oficializou o pau de arara patrimônio cultural brasileiro”. O autor ainda cita supostos financiamentos para meios de transporte como ônibus e metrôs destinados a países como Cuba e Argentina, dando a entender que o governo estaria, ao mesmo tempo que financia obras no exterior, incentivando o transporte precário no Brasil. Na sequência, aparecem trechos de declarações de Lula, do deputado José Guimarães (PT) e do padre Cícero José da Silva, da Diocese do Crato, no Ceará, durante a cerimônia.
Onde foi publicado: Kwai e Telegram.
Contextualizando: Em 1º de agosto de 2023, o presidente Lula (PT) sancionou uma lei que torna a tradição do uso do pau de arara em romarias religiosas como manifestação cultural e imaterial do Brasil. No dia, foi realizada uma cerimônia em Brasília junto a lideranças políticas e religiosas do Ceará. Dentre os que aparecem nos registros fotográficos, estão os deputados federais José Guimarães (PT) e Yury do Paredão (sem partido), o atual prefeito de Juazeiro do Norte, Gledson Bezerra (Podemos) e o ex-gestor do município, Arnon Bezerra (PDT). O padre Cícero José da Silva, reitor da Basílica Santuário Nossa Senhora das Dores, da Diocese do Crato, também compareceu.
| Foto: Ricardo Stuckert/PR
No encontro, Guimarães, que é o autor da proposta, ressaltou que o transporte hoje mudou, mas ficaram “o legado e a cultura”. “Um projeto reconhecendo o transporte pau de arara como patrimônio cultural e imaterial do Brasil, essa é a natureza do projeto”, disse.
Em nota enviada ao Comprova, o deputado reiterou o posicionamento. Ele ressaltou que a lei não significa o retorno do veículo ou “qualquer tipo de regularização junto ao Código Brasileiro de Trânsito”, como enganam posts virais nas redes sociais. “Trata-se claramente de uma homenagem aos romeiros e romeiras que, por décadas, utilizaram esse transporte para o turismo religioso, criando assim uma tradição histórica que ultrapassa gerações”, afirmou. “Tentar distorcer esse fato configura, no mínimo, uma atitude de má fé e merece ser repudiada inclusive com medidas judiciais”, disse.
A Lei Nº 14.641 declara como “manifestação da cultura nacional a tradição do uso, em romarias religiosas, do transporte conhecido como “pau de arara”, como está disponibilizado no Diário Oficial de 2 de agosto deste ano. Não há qualquer menção a uma mudança no Código de Trânsito Brasileiro (CTB) ou invalidação de resoluções do Conselho Nacional de Trânsito.
Desde 2014, é proibido o transporte de pessoas em pau de arara, que é uma adaptação de carrocerias de caminhões usadas para comportar passageiros durante o deslocamento. Na resolução Nº 508 de novembro de 2014, o conselho instituiu os requisitos de segurança para a circulação, a título precário, de veículo de carga ou misto transportando passageiros no compartimento de cargas.
A resolução revogou uma determinação anterior, emitida em 1998, que permitia o uso dos veículos em algumas situações. Por meio de nota, o Ministério dos Transportes, pasta à qual o conselho é vinculado, destacou a obrigatoriedade dos bancos revestidos com espuma, presença de encosto de cabeça e cintos de segurança para todos os ocupantes, devidamente fixados na estrutura da carroceria, além de boa qualidade da carroceria, presença de barras de apoio, proteção lateral, entre outros.
“Deste modo, esta resolução é explícita quanto aos requisitos necessários para a possibilidade de utilização destes veículos, como é o caso do projeto sancionado pelo presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva”, apontou a pasta.
Ficou proibida, com a resolução, a utilização de veículos de carga tipo basculante e boiadeiro.
O descumprimento da medida, ou seja, o transporte de pessoas nesse tipo de veículo, acarreta ao proprietário ou condutor do veículo penalidades e medidas administrativas. Reportagem do UOL, publicada em 2022 mostrou que, apesar de proibido, o transporte ainda é usado em alguns locais.
Pau de arara faz parte da cultura de romeiros
Os veículos do tipo pau de arara eram tradicionalmente usados em diversas regiões do Nordeste e estão ligados especialmente ao êxodo rural e às romarias. Atualmente, mais de quatro milhões de pessoas utilizam todos os anos o transporte em romarias, como a de Padre Cícero, em Juazeiro do Norte, e de São Francisco das Chagas, em Canindé, ambas no Ceará, e a de Bom Jesus da Lapa, na Bahia. Diante da proibição, grupos de romeiros pedem ao Contran medidas mais simplificadas que garantam a segurança, sem descaracterizar este meio de transporte.
Padre Cícero José da Silva, reitor da Basílica Santuário Nossa Senhora das Dores, da Diocese do Crato, divulgou carta, quando houve a sanção da lei, e ressaltou o caráter cultural do transporte. “Trazemos na memória a coragem dos primeiros peregrinos que iam a Juazeiro do Norte nas carrocerias adaptadas dos caminhões e, através da experiência de fé, contribuíram para a construção da identidade religiosa e cultural da cidade, além do desenvolvimento econômico.”
A Diocese do Crato, inclusive, mantém, em seu site, registros de festas antigas que tinham o uso do transporte. “Como de costume os romeiros enfeitam os carros, ônibus, caminhões pau de arara. Colocam a imagem do padre Cícero, da Mãe das Dores, usam bandeirolas nas mais diversas cores para demonstrarem a alegria por estarem no Juazeiro do ‘Padim Ciço’. Os juazeirenses, por sua vez, ficam nas calçadas das ruas aguardando os bombons, pirulitos e pipocas jogados pelos romeiros que estão nos transportes”, escreve uma publicação de setembro de 2016.
Empréstimos e falta de água já foram esclarecidos pelo Comprova
No mesmo dia, Lula disse que ele e empresários brasileiros estariam interessados na conclusão da rede de tubulação para transporte de gás natural argentino. Ele afirmou que iria criar condições para “ajudar” nas obras, com o BNDES atuando como financiador do empreendimento. No entanto, não houve nenhuma formalização para a retomada de financiamentos neste sentido.
A ligação entre empréstimos e financiamentos a países vizinhos com um suposto descaso com o Brasil é uma crítica comum aos governos do PT. O tema é comum em peças de desinformação. O Comprova já investigou vídeo que citava 20 operações que supostamente teriam sido financiadas pelo BNDES entre os anos de 2009 e 2014 (durante os governos petistas de Lula e Dilma Rousseff). A peça apresenta informações falsas referentes aos valores financiados, além de atribuir ao banco sete construções que não tiveram acesso a recursos de linhas de crédito do banco.
O fornecimento de água no Nordeste do país também tem sido um tema recorrente de desinformação em posts compartilhados nas redes sociais. No vídeo alvo desta checagem, o autor cita, sem dar detalhes, que “cortaram a água” do povo nordestino.
Como o conteúdo pode ser interpretado fora do contexto original: A postagem analisada aqui, como foi veiculada sem a devida contextualização, dá a entender que o uso do veículo poderá ser retomado no Brasil. Além disso, ao mencionar investimento em outros países, o vídeo possibilita a interpretação que haveria uma ação direta do governo federal para desfavorecer a aplicação de recursos na região em comparação com países como Argentina e Cuba.
O que diz o responsável pela publicação: O Comprova tentou contato com o autor da publicação, mas não houve retorno até a publicação desta verificação.
Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Até o dia 26 de outubro, a publicação no Kwai acumulava mais de 106 mil visualizações, 10,5 mil curtidas e 3,4 mil comentários. O conteúdo também vem sendo disseminado no Telegram.
Como verificamos: A verificação buscou no Google pelos termos “Lula + pau de arara”, o que resultou em links de reportagens publicadas na imprensa e que tratam da solenidade que marcou a assinatura da lei que torna a tradição do uso do pau de arara em romarias religiosas como manifestação cultural e imaterial do Brasil, entre as quais, a do Correio Braziliense, Metrópoles e da própria agência de notícias do governo federal.
O Comprova também buscou a assessoria de imprensa do deputado federal José Guimarães, autor da lei sancionada, e com o Ministério dos Transportes.
Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.
O músico britânico Roger Waters, que fez visita recente ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), já foi acusado de antissemitismo, que se caracteriza por atos de preconceito, hostilidade ou discriminação contra judeus. O artista diz se opor, na verdade, às violações que entende serem cometidas por Israel contra palestinos. Nos shows, o músico costuma vestir um uniforme alusivo à SS, a tropa de Hitler, quando interpreta o que diz ser um demagogo fascista desequilibrado, personagem presente na iconografia do Pink Floyd, do qual era integrante, desde os anos 1980. Além disso, não há registro de que ele tenha sido proibido de tocar nos Estados Unidos, como alega uma publicação.
Conteúdo investigado: Publicação em canal do Telegram compartilha notícia do G1 sobre uma visita do músico britânico Roger Waters ao presidente Lula no Palácio do Planalto. A postagem xinga o petista e diz que o ex-baixista do Pink Floyd é o mais famoso antissemita do mundo. O conteúdo alega ainda que Waters faz show com uniforme nazista e que foi proibido de se apresentar nos Estados Unidos por conta disso.
Onde foi publicado: Telegram.
Contextualizando: O músico Roger Waters visitou o presidente Lula (PT) em Brasília, em 23 de outubro, um dia antes de fazer show na cidade. O encontro foi divulgado pelo próprio presidente em publicações nas redes sociais. “Há cinco anos, @rogerwaters tentou me visitar em Curitiba e foi impedido. Hoje, quando ele retorna ao Brasil, nos encontramos no gabinete da presidência no Palácio do Planalto”, escreveu o petista em post no X (antigo Twitter).
Waters é um histórico apoiador do movimento BDS (Boicote, Desinvestimento e Sanções, em tradução do inglês), contra a expansão do Estado de Israel sobre territórios também reivindicados por palestinos na Cisjordânia e na Faixa de Gaza. Por conta disso, ele é recorrentemente acusado de antissemitismo por entidades judaicas. Para muitos judeus, o apoio ao BDS é uma forma de antissemitismo. Além disso, o músico foi acusado de usar termos ofensivos a judeus e criticado por usar a Estrela de Davi em um contexto negativo.
Waters afirma, no entanto, que não é nem nunca foi antissemita. Ele contesta que a definição de antissemitismo colocada sobre ele parte de pressupostos distorcidos de que toda crítica a Israel seja inerentemente antijudaica e de que o sionismo seja um elemento essencial da identidade judaica.
A alegação de que Waters veste uniforme nazista faz alusão à performance comum do músico em shows ao cantar “In the Flesh”. Nessas ocasiões, ele veste um sobretudo militar com uma braçadeira vermelha, conjunto parecido ao de militares da polícia nazista SS, e empunha uma metralhadora falsa contra os fãs.
O músico afirma que se trata, no entanto, da interpretação crítica de um personagem: o roqueiro fictício Pink, que acredita ser um ditador fascista. Ele aparece em shows e na iconografia do Pink Floyd desde os anos 1980, quando foi lançado o álbum conceitual “The Wall”, que conta com a canção “In the Flesh”.
Já sobre a alegação de que Roger Waters foi proibido de se apresentar nos Estados Unidos, não há registro que sustente isso. Um show dele em Frankfurt, na Alemanha, previsto para 28 de maio deste ano, chegou a ser cancelado provisoriamente por autoridades locais que acusavam o músico de antissemitismo. No entanto, a apresentação foi liberada posteriormente, por decisão da Justiça.
Como o conteúdo pode ser interpretado fora do contexto original: Diante do contexto da guerra entre Israel e o grupo extremista palestino Hamas, a publicação pode levar a crer que o encontro entre Lula e Roger Waters sinaliza um endosso do presidente à suposta posição antissemita do cantor.
O que diz o responsável pela publicação: O canal responsável pela publicação não disponibiliza qualquer informação que possibilite uma tentativa de contato, como endereço de e-mail ou telefone.
Alcance da publicação: A publicação compartilhada pelo canal do Telegram alcançou 4,2 mil visualizações até o dia 26 de outubro.
Como verificamos: O Comprova realizou buscas no Google pelos termos “Roger Waters faz apologia ao nazismo” e por “shows cancelados de Roger Waters”, a fim de, primeiramente, compreender o contexto da associação do artista ao antissemitismo.
Nas buscas realizadas, encontramos reportagens (G1, Veja, Agência Brasil, GZH) falando sobre o mesmo assunto: que Roger Waters utilizou um traje semelhante ao uniforme nazista em um show realizado em Berlim; e, em resposta a tal acusação, as reportagens mostram que o artista justificou o uso da roupa como protesto, e não apologia.
Como Roger Waters passou a ser acusado de antissemitismo
As acusações de que Roger Waters seria antissemita são antigas. Em 2010, ele recebia as primeiras críticas após shows da turnê mundial “The Wall Live”, em que ele apresentou um cenário retratando bombas no formato da Estrela de Davi – um símbolo judaico – durante a música Goodbye Blue Sky.
| Print da transmissão de “Roger Waters Goodbye Blue Sky Live 2010”. Disponível aqui
Outra polêmica envolvendo o artista ocorreu em 2015, quando ele insistiu, por meio de uma carta aberta, para que Gilberto Gil e Caetano Veloso, à época em turnê conjunta, não realizassem show em Israel, pedido que não foi atendido. Além disso, ele já pediu para outros artistas que não se apresentassem no país, entre eles Neil Young, Robbie Williams e Lauryn Hill.
Em entrevista de 2017, Roger Waters disse não ter problemas com o povo judeu, mas, sim, com a atuação do Estado de Israel contra palestinos. Ele afirmou, na ocasião, ser “fundamentalmente contra a ideia de pessoas serem subjugadas e privadas de seus direitos. Expressei esse meu posicionamento, e aí sugeriram que eu fosse antissemita, o que não é verdade. Irei para o meu túmulo defendendo os direitos das pessoas comuns”, disse.
Em fevereiro de 2023, Polly Samsom, mulher de David Gilmour, guitarrista do Pink Floyd, tuitou que Waters é “antissemita até o seu núcleo podre”. Ela ainda afirmou na ocasião que o músico é mentiroso, ladrão, hipócrita, sonegador de impostos, dublador, misógino, doente de inveja, megalomaníaco e apologista de Vladimir Putin, presidente da Rússia.
Em posicionamento mais recente, Waters afirmou ser colocada sobre ele uma noção distorcida de antissemitismo, por não ser contrário ao povo judeu, mas se opor a violações de direitos humanos que entende terem sido cometidas por Israel contra palestinos.
“Sei que o povo judeu é um grupo diversificado, interessante e bastante complicado, tal como o resto da humanidade. Muitos são aliados na luta pela igualdade e justiça, em Israel, na Palestina e em todo o mundo”, escreveu ele em comunicado divulgado em 29 de setembro de 2023.
A manifestação foi publicada em resposta ao documentário “The Dark Side of Roger Waters”, da organização não governamental britânica Campaign Against Antisemitism (Campanha contra o Antissemitismo, em tradução do inglês).
O filme traz acusações de um produtor musical e de um saxofonista que trabalharam com Waters sobre declarações antissemitas dele na rotina pessoal. Por exemplo, ele é acusado de ter chamado seu agente de “judeu de merda”.
O assunto ainda retornou aos holofotes devido ao conflito protagonizado por Israel e Hamas, grupo extremista palestino que controla a Faixa de Gaza. O Hamas, sigla do árabe “Ḥarakah al-Muqawamah al-‘Islamiyyah”, significa Movimento de Resistência Islâmica.
Conforme já explicado anteriormente pelo Comprova, o grupo fundamentalista islâmico é considerado terrorista por países como Estados Unidos, Japão e as nações vinculadas à União Europeia. O Hamas foi criado durante a Primeira Intifada palestina, um movimento contra a ocupação israelense da Cisjordânia e da Faixa de Gaza. Em sua carta fundadora, de 1988, o grupo rechaça a existência do Estado de Israel.
Não há registro de apoio expresso de Roger Waters ao Hamas, mas, sim, ao povo palestino, que não é representado em sua totalidade pelo grupo extremista. Em 2020, contudo, ele concedeu entrevista à agência de notícias Shehab, afiliada ao Hamas, na qual afirmou que “o sionismo é uma mancha feia e que precisa ser gentilmente removida por nós”.
Suposto uniforme nazista retrata personagem dos anos 80
A performance de Waters com uniforme que remonta à SS, citada pela postagem verificada pelo Comprova, ocorre durante os shows do artista no momento em que ele canta a canção “In The Flesh”, que abre o álbum conceitual “The Wall”, do Pink Floyd, de 1979.
Esse personagem também aparece no filme “The Wall”, de 1982, com o mesmo uniforme preto alusivo à SS e com a braçadeira vermelha que exibe, em vez de uma suástica nazista, dois martelos cruzados. Desde o lançamento do longa-metragem, a figura de Pink é interpretada por Roger Waters em shows.
| Personagem Pink no filme “The Wall”, de 1982 (Foto: Reprodução)
Ao repetir a performance em um show em Berlim, na Alemanha, em 17 de maio deste ano, a polícia local abriu investigação por suspeita de incitação ao ódio público. Waters disse à época que as acusações de apologia ao nazismo usavam de má-fé e que os elementos de sua performance eram claramente uma declaração em oposição ao fascismo, injustiça e fanatismo em todas as suas formas.
“A representação de um demagogo fascista desequilibrado tem sido uma característica dos meus shows desde ‘The Wall’, do Pink Floyd, em 1980”, comunicou, em nota, na ocasião.
Mesmo com a polêmica, a turnê passou pelos Estados Unidos entre julho e outubro de 2022, ou seja, antes da apresentação que foi alvo de críticas, em Berlim.
Durante a passagem pela Europa, Waters chegou a ter um show cancelado em Frankfurt, na Alemanha. A apresentação estava prevista para acontecer em 28 de maio, no Festhalle, uma casa de eventos que, durante a Segunda Guerra Mundial, funcionou como centro de detenção do regime nazista.
O conselho da cidade, ao justificar o cancelamento, classificou o cantor como “um dos antissemitas mais conhecidos do mundo”. Outras cidades alemãs também consideraram suspender as apresentações.
No entanto, após o cantor recorrer, a Justiça decidiu manter o show em Frankfurt. O tribunal afirmou que, por questões contratuais, a cidade não poderia impedir o concerto de acontecer. Além disso, considerou que, apesar do uso de símbolos durante o show, não havia indícios de uso de propaganda nazista.
Na apresentação de Berlim naquele mesmo mês de maio, uma mensagem exibida em um telão minutos antes de o músico subir ao palco citou a decisão do tribunal de Frankfurt. “Apenas para ser claro, eu condeno o antissemitismo sem qualquer reserva”, dizia o texto, em tradução do inglês.
A homenagem de Waters em Berlim também fez menção, entre outros nomes, a Sophie Scholl, ativista anti-nazista morta por se opor ao regime de Hitler; Shireen Abu Akleh, jornalista palestino-americana morta pelo exército de Israel; Mahsa Amini, jovem morta pela polícia da moralidade do Irã; e George Floyd, afro-americano assassinado por estrangulamento por um policial branco nos Estados Unidos.
Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.
Vídeo que circula no TikTok afirma que governo federal estaria expulsando famílias que vivem há mais de 50 anos no território indígena Apyterewa, no município de São Félix do Xingu, no estado do Pará. Entretanto, o território passou por uma ação de desintrusão da terra, em cumprimento a um conjunto de decisões judiciais da Justiça Federal e do Supremo Tribunal Federal (STF). A operação consistiu na retirada de não indígenas que, segundo a Justiça, ocupam irregularmente parte das terras indígenas. O objetivo da operação foi devolver aos povos originários a posse e o direito de uso exclusivo de seus territórios. O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) abriu processo de cadastro e seleção das famílias que ocupam o território de forma irregular. O Incra informou que, caso os núcleos estejam aptos a integrar o Programa Nacional de Reforma Agrária, serão assentados em novas áreas. Até o momento, 95 famílias foram cadastradas.
Conteúdo investigado: Homem em vídeo afirma que o governo federal está expulsando famílias de um assentamento na região do Território Indígena Apyterewa, no município de São Félix do Xingu, no Pará. Na gravação, ele alega que o governo disse “não a todos os recursos que foram feitos para um acordo” e que mais de 2 mil famílias que sobrevivem no lugar estão sendo expulsas da região. As pessoas, conforme o autor do vídeo, teriam como provar que ocupam a região há 50 anos e que agora “querem que se torne terra dos originários, dos índios”.
Onde foi publicado: TikTok.
Contextualizando: No dia 2 de outubro, em cumprimento de um conjunto de decisões da Justiça Federal e do STF, foi realizada mais uma ação de desintrusão da Terra Indígena (TI) Apyterewa, situada no Pará. O objetivo da operação foi devolver aos povos originários a posse e o direito de uso exclusivo de seus territórios.
A operação consistiu na retirada de não indígenas que, segundo a Justiça, ocupam irregularmente parte das terras. O território foi homologado em 2007, antes mesmo que a tese do Marco Temporal fosse criada em 2009, com parecer da Advocacia-Geral da União (AGU) sobre a demarcação da reserva Raposa-Serra do Sol, em Roraima. Nesta época, foi usado o critério de que os povos indígenas só teriam direito de ocupar apenas as terras que ocupavam ou já disputavam em 5 de outubro de 1988, data de promulgação da Constituição. A tese foi considerada inconstitucional pelo STF em 21 de setembro de 2023.
No começo dos anos 2000, mais de mil famílias não indígenas ocuparam a terra indígena Apyterewa. Entre agosto de 2011 e maio de 2012, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) abriu processo de cadastro e seleção destas famílias.
Durante o novo processo de desintrusão, o Incra afirmou que disponibilizou uma equipe para cadastro das famílias que ocupam a área irregularmente. Até a quarta-feira,11, foram cadastradas 95 famílias, mas levantamento preliminar apontou que 10% dos cadastrados já haviam sido beneficiados pelo Incra e voltaram para a terra indígena. “O cadastro será colocado no banco de dados do Incra para avaliar a aptidão ao Programa Nacional de Reforma Agrária. As famílias aptas serão assentadas em novas áreas”, explicou por meio de nota.
O Instituto ressaltou que é responsável somente pelo cadastro para possível reassentamento, não cabendo ao órgão avaliar indenizações. Isso acontece por se tratar de uma terra indígena demarcada e a decisão judicial já está transitada em julgado para retirada dos invasores.
A operação é resultado de pedido feito pelo Ministério Público Federal (MPF) do Pará ao STF, no final de 2021, para suspender decisão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), que impedia a realização de operações para a retirada de pessoas consideradas pelo órgão como invasores da terra indígena. A sentença foi favorável à ação de reintegração de posse. Localizada no município de São Félix do Xingu, o local é de posse tradicional da etnia Parakanã. Conforme o MPF, a área vem sofrendo com o aumento gradual no número de invasores, desde sua homologação. A estimativa é que mais de 3 mil pessoas não pertencentes à etnia estejam residindo ilegalmente na região, ocupada por aproximadamente 1,4 mil indígenas.
Apesar de homologada em 2007, a TI Apyterewa é reconhecida como de posse tradicional dos indígenas desde 1992. Há pelo menos 30 anos o território é alvo de invasões para fins de grilagem de terras e mineração ilegal. Na ação de desintrusão, voltada para a retirada de não indígenas, as ocupações são classificadas pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) em duas categorias: de boa-fé e má-fé, conforme a Resolução nº. 220/2011.
Os ocupantes de boa-fé são aqueles que se instalaram no território até 31 de dezembro de 2001, data de publicação da Portaria nº 1.192/2001 do Ministério da Justiça, primeira a fixar os limites atuais da TI Apyterewa em 773 mil hectares. Conforme entendimento judicial, essas pessoas têm direito a receber indenização pelas modificações realizadas, por não saberem que se tratava de terra indígena. No entanto, todos os que ocuparam o território a partir de 2002 são considerados de má-fé, já que teriam conhecimento da área pertencente aos Parakanã. Por isso, o MPF aponta que essas famílias recebem “tratamento jurídico de invasores sem direito a indenização”.
Como o conteúdo pode ser interpretado fora do contexto original: Fora do contexto original, o vídeo pode causar interpretações distintas da realidade, sugerindo o confisco de terras de forma ilegal. Na publicação, um homem que aparece no vídeo afirma que pessoas que vivem no local há mais de 50 anos estão sendo expulsas pelo Governo Federal.
Contudo, o Comprova apurou que a retirada das pessoas faz parte de uma operação, em cumprimento de um conjunto de decisões da Justiça Federal e do STF, para retirar não indígenas que, segundo a Justiça, ocupam irregularmente parte das terras indígenas.
Ainda segundo a Justiça, o objetivo da operação foi devolver aos povos originários a posse e o direito de uso exclusivo de seus territórios.
O Incra abriu processo de cadastro e seleção das famílias que ocupam o território de forma irregular. O Incra informou que, caso os núcleos tenham aptidão para integrar o Programa Nacional de Reforma Agrária, serão assentados em novas áreas.
Por isso, antes de compartilhar qualquer conteúdo na internet, é importante conferir se as afirmações de vídeos divulgados nas redes sociais foram publicadas em canais oficiais ou por meio de veículos de comunicação.
O que diz o responsável pela publicação: O Comprova entrou em contato com a autora da postagem, mas não recebeu respostas até o momento da publicação desta reportagem. Já o homem que aparece nos vídeos não foi identificado até a publicação deste material.
Operação tentava tirar invasores de terras indígenas
Forças de segurança deflagraram, nesta segunda-feira, 2 de outubro, uma desintrusão de invasores de terras indígenas no Pará. Cerca de 150 agentes da Força Nacional e outros 60 policiais federais iniciaram a primeira etapa da operação de retirada de não indígenas da TI Apyterewa.
Segundo o governo federal, foram 9,7 mil itens apreendidos e o valor de R$ 1,8 milhão aplicado em multas aos infratores. Ao todo, três pessoas foram presas. O levantamento é resultado das ações realizadas no período de 1º a 7 de outubro. O objetivo era combater a ocupação ilegal na região. “Com apoio da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), o Governo Federal cumpre decisão judicial para garantir aos povos das duas Terras Indígenas o direito de usufruir de seu território de forma plena e integral”, afirma o governo.
Do total de itens apreendidos estão: 6 armas de fogo, 9 mil metros de arame, 150 metros de fio de alta-tensão, 202 botijões de gás, 145 litros de agrotóxico, 113 litros de gasolina, 8 máquinas leves e 2 pesados, 1 trator, 1, caminhão, 1 veículo, 2 motocicletas, 3 antenas de internet, além de maconha (70 gramas) e 3,5 metros cúbicos de madeira.
Em um trabalho conjunto, a equipe da operação também fiscalizou 15 estabelecimentos, entre comércios e propriedades, constatando 12 empregados sem registro e dois mantidos em condições de trabalho análogas à escravidão. Em nenhuma das inspeções foi constatada formalização de trabalho pelos empregadores. Foram realizadas ainda 5 notificações, 3 prisões e 1 Termo Circunstanciado de Ocorrência, referente a porte de anfetamina.
Conforme informações do jornal O Globo, um comunicado foi entregue aos invasores para que desocupassem imediatamente a área de maneira voluntária levando pertences e animais antes de a operação ter início. O panfleto cita o artigo 231 da Constituição Federal, sobre a demarcação, proteção e respeito aos bens das terras ocupadas pelos povos indígenas como obrigação da União.
Além de Secretaria Geral, Ministério dos Povos Indígenas, Funai, Força Nacional e Agência Brasileira de Inteligência (ABIN), também participam da operação Incra, Ibama, Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal, Centro Gestor e Operacional do Sistema de Proteção da Amazônia (Censipam), Comando Militar do Norte, Ministério do Trabalho e Emprego.
Território é alvo de invasão e desmatamento
O Incra informou que a Terra Indígena Apyterewa está localizada no município de São Félix do Xingu e tem área aproximada de 773 mil hectares. Ainda segundo o órgão, na TI existem 20 comunidades indígenas com uma população total estimada em 1.383 indígenas, de acordo com o censo do IBGE de 2022. O Incra comunicou que os principais atos ilícitos realizados na terra indígena, são a grilagem de terra, desmatamento e mineração ilegais.
O MPF ressalta que a permanência de ocupantes não indígenas na área aumenta o risco de conflitos e desmatamento na região. “O Ministério Público Federal está envolvido nessas ações para desintrusão das terras indígenas há mais de uma década, e é nosso interesse que isso ocorra da melhor forma possível, garantindo que todas as pessoas – todos os cidadãos brasileiros, indígenas ou não indígenas – tenham seus direitos assegurados, de forma tranquila e pacífica”, afirmou a coordenadora da Câmara de Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais do MPF (6CCR), Eliana Torelly, por meio de comunicado no site.
De acordo com levantamento do Imazon, o território é o que registrou a maior área de floresta desmatada na Amazônia Legal em 2022. Este é o 4º ano seguido que a TI Apyterewa ocupa a posição. Foi registrado um desmate de 80 km2 de vegetação em 2022. Somente nos últimos quatro anos, foram desmatados 324 km2, uma área superior ao território de Fortaleza, capital do Ceará.
Marco Temporal foi considerado inconstitucional
De acordo com a tese do Marco Temporal, rejeitada pelo STF no dia 21 de setembro de 2023, a data da promulgação da Constituição Federal, 5 de outubro de 1988, poderia ser utilizada para definir a ocupação tradicional de terras por comunidades indígenas, orientando as demarcações de territórios no Brasil.
Alcance da publicação: O vídeo compartilhado no TikTok somou 11,2 mil curtidas, 1778 comentários, além de 5,8 mil compartilhamentos até 13 de outubro.
Como verificamos: O Comprova consultou o Instituto Socioambiental (Organização da Sociedade Civil de Interesse Público) para compreender informações a respeito do número de habitantes, situação jurídica, área demarcada e hectares.
Também foram consultadas informações veiculadas pela imprensa relacionadas ao território de São Félix do Xingu, além de notas publicadas pelo Ministério Público Federal, Governo Federal, Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) e Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). O Incra respondeu aos questionamentos.
O Comprova também solicitou o posicionamento e informações da autora da publicação com relação às afirmações do vídeo. Utilizamos o Google Reverse para tentar identificar o homem que aparece na postagem. Contudo, a ferramenta não o reconheceu. Também não conseguimos identificar o autor do vídeo.
Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para publicações que obtiveram maior alcance e engajamento e que induzem a interpretações equivocadas. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.
Vídeo que circula no Instagram afirma que não há recursos para empréstimos ao produtor rural no Plano Safra 2023/2024 e que os repasses feitos em julho foram inferiores ao verificado no mesmo mês de 2022, apesar do valor recorde previsto neste ano. A autora cita dados não consolidados à época e tira informações de seu contexto. Na comparação entre os meses citados por ela, houve, na verdade, aumento de repasse para a agricultura empresarial e perda em menor grau à produção familiar. Além disso, operando sob nova metodologia, os recursos do Plano Safra passaram a ser liberados de forma trimestral e, diante da alta demanda por crédito, os valores previstos para o primeiro trimestre foram, de fato, rapidamente absorvidos, gerando interrupção de algumas linhas de crédito. No entanto, houve antecipação de valores e retomada das linhas de crédito.
Conteúdo investigado: Publicação no Instagram afirma que não há dinheiro para o Plano Safra 2023/24. Ela alega que, embora tenha sido anunciado um valor recorde à iniciativa pelo governo federal, a concessão de crédito pelas instituições bancárias que operam as linhas do plano está travada por falta de recursos. A autora do conteúdo afirma também que a agricultura familiar perdeu, na comparação de julho de 2023 com o mesmo mês de 2022, 47% dos recursos do Plano Safra, enquanto os médios e os grandes produtores teriam 36,8% a menos, o que estaria travando a cadeia produtiva do agronegócio no país. No fim do vídeo, ela questiona: “Onde vamos parar? Onde estão os recursos do Plano Safra?”.
Onde foi publicado: Instagram.
Contextualizando: Lançado no fim de junho, o Plano Safra 2023/2024 teve recorde de recursos previstos para empréstimos a produtores rurais – R$ 435,82 bilhões (R$ 364,22 bilhões para agricultura e pecuária empresarial e R$ 71,6 bilhões para a produção familiar).
Nesta edição, o Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) alterou a metodologia para repasse dos recursos aos agentes financiadores, que são bancos e cooperativas de créditos. Agora, os valores são repassados a cada trimestre mediante o planejamento informado pelas instituições ao governo, e não mais por livre demanda dos produtores.
Esse contingenciamento, aliado à forte demanda por crédito no mês de julho, fez com que os recursos previstos para o primeiro trimestre fossem rapidamente consumidos nos primeiros trinta dias do programa, o que interrompeu algumas linhas de financiamento. Como resultado, o mês de julho de 2023, comparado com o mesmo mês de 2022, registrou queda de 8% no número total de contratos. O montante de recursos disponibilizados, no entanto, teve alta de 15%.
Se considerarmos apenas a produção empresarial (médios e grandes produtores), houve alta de 12% no número de contratos e de 21% no volume de recursos concedidos, e não queda de 36,8% do dinheiro. Já em relação somente à produção familiar, cujo crédito é repassado via Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), o mês de julho registrou quedas de 15% no volume de contratos e de 10% dos recursos concedidos, e não um montante 47% menor de verba.
Os percentuais, portanto, diferem dos apresentados no vídeo verificado. Isso porque, na época em que ele foi divulgado, os dados de julho ainda não haviam sido consolidados, informação que não é mencionada no conteúdo.
A informação divulgada – “não tem dinheiro para o Plano Safra” – também carece de contextualização. Após a interrupção de algumas linhas de financiamento, o governo federal antecipou recursos que estavam previstos para o trimestre seguinte.
Considerando-se os dois primeiros meses com dados consolidados (julho e agosto), o Plano Safra 2023/2024 registra aumento de 2,5% no número de contratos, de 21% no valor contratado e de 18% no valor médio por contrato. Já no Pronaf, há aumento de 1,2% no número de contratos e queda de 9,8% no valor do crédito concedido. Os dados de setembro ainda não foram fechados.
Como o conteúdo pode ser interpretado: Da forma como os dados foram divulgados, há margem para a interpretação de que há irregularidades no repasse dos recursos do Plano Safra 2023/2024.
O que é o Plano Safra?
O Plano Safra oferece linhas de crédito para o financiamento das atividades de pequenos, médios e grandes produtores rurais no Brasil. Criado pelo governo federal em 2003, ele começa a valer no dia 1º de julho de cada ano, com validade até junho do ano seguinte, acompanhando o calendário das principais safras do país.
O programa oferece diferentes linhas de crédito, com taxas de juros subsidiadas, destinadas aos distintos tipos de produtores rurais. A intenção é estimular o aumento da produção agropecuária. Cada grupo de produtores (pequenos, médios e grandes) recebe um volume diferente de recursos e taxas de juros de financiamento distintas.
Repasses passaram a ser trimestrais
O Plano Safra 23/24 trouxe como novidade a liberação de recursos para as linhas de crédito de forma trimestral. A intenção por trás da nova metodologia é poder realizar uma avaliação das aplicações das instituições financeiras a cada trimestre, e remanejar o crédito onde for necessário. “Na medida que uma instituição fale que vai gastar determinada quantidade e não gaste, a gente não precisa esperar até o fim da safra para poder saber isso”, explica Guilherme Rios, assessor técnico da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA).
Entretanto, a demanda pelos recursos do Plano Safra não é linear, ou seja, a necessidade por crédito é mais alta em alguns meses do que em outros. A liberação de crédito de maneira trimestral teve por consequência o rápido esgotamento dos recursos que haviam sido previstos para o 1º trimestre. De acordo com Rios, a demanda é maior nos meses de julho e agosto, levando ao esgotamento temporário de algumas linhas de crédito no início de agosto. As linhas foram retomadas com a antecipação dos recursos do 2º trimestre, a partir do dia 25 do mesmo mês.
“Os bancos informam ao governo o que eles pretendem gastar a cada trimestre e o governo faz o repasse. A demanda foi tão alta que os bancos não esperavam. Então, o recurso que eles planejaram por trimestre acabou logo ali no fim de julho e começo de agosto, e a gente ficou algumas semanas sem algumas linhas de crédito. O que o governo fez? Ele teve que adiantar os recursos do segundo trimestre do plano safra para poder cobrir”, esclarece Rios.
Percentuais reais são diferentes do que autora citou
Em contato com o Comprova via WhatsApp, a autora da publicação no Instagram afirmou que os percentuais citados por ela sobre a queda de recursos do Plano Safra, na comparação de julho de 2023 com o mesmo mês de 2022, haviam sido divulgados por Bruno Lucchi, diretor técnico da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), em entrevista à jornalista Kellen Severo no programa Hora H do Agro, da Jovem Pan News, em edição exibida em 26 de agosto de 2023.
Lucchi faz de fato menção aos percentuais, mas tratando de queda no número de contratos, e não de recursos disponibilizados. O Banco Central, que faz o levantamento dos dados do Plano Safra, faz uma separação entre as duas coisas, uma vez que cada contrato tem valores diferentes cedidos.
No dia anterior, em 25 de agosto de 2023, a jornalista Kellen Severo já havia mencionado os mesmos percentuais durante um comentário no Jornal da Manhã, também da Jovem Pan News, que foi transcrito em um artigo para o portal do veículo. Foram exibidas sobre sua fala duas cartelas com infográficos, com dados que teriam como fonte o Banco Central (BC) e a CNA.
A primeira delas trata de números de contratos e do volume de crédito concedido para a agricultura familiar com o Plano Safra, o que ocorre por meio da linha de crédito do Pronaf.
Na altura em que os gráficos foram veiculados, no entanto, os dados do Plano Safra referentes ao mês de julho de 2023 não estavam consolidados na Matriz de Dados do Crédito Rural, página do Banco Central dedicada a essa divulgação. Conforme o Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) informou ao Comprova, a consolidação dos dados só é realizada a partir do terceiro dia útil do mês posterior ao mês subsequente. Ou seja, os números de julho de 2023 só teriam um retrato fiel a partir de 5 de setembro de 2023. Antes disso, segundo o Mapa, os dados consultados no BC variam diariamente, “levando a incorreções se a comparação for realizada, antes do fechamento, com o mesmo período do ano anterior”.
O Mapa também cedeu ao Comprova um balanço consolidado do Plano Safra nos dois meses comparados, a partir de dados do Sistema de Operações do Crédito Rural e do Proagro (Sicor), do Banco Central. O documento está disponível no site do governo federal.
Em julho de 2022, o Pronaf teve 144.753 contratos e concedeu R$ 6,939 bilhões em crédito, números que batem com os dados brutos da agricultura familiar divulgados pela Jovem Pan News para aquele mês. No entanto, em julho de 2023, foram assinados 123.291 contratos, e não cerca de 76,2 mil, e concedidos R$ 6,247 bilhões em crédito, e não cerca de R$ 5,04 bilhões.
Assim, de um período a outro, houve quedas de 15% no volume de contratos e de 10% dos recursos concedidos à agricultura familiar pelo Plano Safra, percentuais menores dos que foram divulgados pelo veículo e em parte replicados pela autora no post no Instagram.
Também em julho de 2022, foram fechados 190.990 contratos pelo Plano Safra, mas referentes a todas as linhas de crédito dele, incluindo o Pronaf, e não apenas às que atendem médios e grandes produtores, como apontou a Jovem Pan News. Eles totalizaram R$ 37,662 bilhões em recursos naquele mês.
Já em julho de 2023, foram assinados 175.168 contratos, e não cerca de 120,4 mil, que somaram R$ 43,382 bilhões, e não cerca de R$ 36,39 bilhões apresentados pelo veículo. Houve, portanto, na comparação entre os dois períodos, queda de 8% no número total de contratos e alta de 15% no montante de recursos disponibilizados.
Por fim, se considerada apenas a agricultura empresarial (médios e grandes produtores), ou seja, todas as linhas de crédito com exceção do Pronaf, houve alta de 12% no número de contratos, que foram de 46.237 para 51.877, e de 21% no volume de recursos concedidos, que passou de cerca de R$ 30,723 bilhões para R$ 37,135 bilhões de julho de 2022 em comparação com o mesmo mês de 2023.
Razão para a queda no Pronaf: taxa de juros
Apesar do valor recorde de financiamento no Plano Safra 2023/2024, o número de contratos e o volume de crédito liberado registraram queda no segmento da agricultura familiar, ao considerarmos apenas o mês de julho. Segundo o assessor técnico da CNA e o professor Omar Jorge Sabbag, do curso de Engenharia Agronômica da Universidade Estadual Paulista (Unesp), um dos fatores que explicam a queda nos números é a alta taxa de juros que, quando não subsidiada pelo governo, se torna desvantajosa para o produtor familiar. Com isso, ele acaba deixando de contratar o crédito.
Rios explica que essa é a maior dificuldade para que os empréstimos do Plano Safra cheguem até o produtor. Para isso, é necessário que haja verba disponível para que o governo subsidie parte dos juros praticados pelo agente financiador para que a taxa seja menor para o produtor – a esta operação dá-se o nome de juros equalizáveis. Caso contrário, o produtor da agricultura familiar, que depende desse subsídio, deixa de contratar o empréstimo. Ou seja, como diz Omar Sabbag, o crédito “trava”: está disponível, mas não em execução.
“Por mais que seja anunciado um volume de R$ 435 bilhões, não necessariamente todo o montante vai estar disponível”, diz Guilherme Rios. “Eu dependo dos recursos de subvenção para equalização das taxas do Pronaf, do custeio e do investimento. Neste ano, o volume que foi anunciado para essas subvenções dentro da Lei Orçamentária Anual já acabou. A gente espera do governo uma suplementação da parte equalizada, para que não falte recursos para o produtor.”
O patamar de juros equalizáveis previsto no Pronaf do Plano Safra 2023/24 é de 4% ao ano. Portanto, para que essa taxa seja atingida, é necessária a subvenção do governo. O professor dá um exemplo hipotético: “Vamos fazer uma analogia: eu vou lhe emprestar R$ 10 mil, e digo: ‘lhe cobro 15% de juros’. Aí vem, digamos, um parente seu e se predispõe a cobrir metade desses juros. Só que chega um determinado momento que esse seu parente não consegue mais subsidiar. O dinheiro permanece disponível comigo, mas, se o seu parente não subsidiar a metade, você vai ter que me pagar 15% de juros. Aí eu lhe pergunto: você vai conseguir bancar? O mais provável é que você desista do empréstimo”.
Outros fatores para redução de contratos no Pronaf
Além da dificuldade na obtenção de juros subsidiados, Sabbag cita outros obstáculos que atingem principalmente o produtor da agricultura familiar. Um deles é a dificuldade de comprovar junto ao agente financiador a capacidade de pagamento do crédito que se pretende contratar:
“É preciso apresentar um projeto técnico que demonstre a capacidade de pagamento para aderência ao crédito. Nele, constam diversas informações, como o croqui da área e a descrição das principais atividades. Enfim, não é algo simples. O médio e grande produtor tem uma assessoria mais robusta para produzir esse projeto técnico. Já o pequeno produtor está mais vulnerável”.
“Muitas das vezes o produtor familiar não consegue ter um controle adequado da produção. Ele pode chegar ao final de uma safra com um lucro abaixo do esperado e ter prejuízo diante das taxas de juros que precisa pagar. Assim, ele chega endividado na safra seguinte e, automaticamente, o banco o classifica como restrito a crédito. Aí o financiamento do Plano Safra ‘trava’ para ele.”
O professor ainda cita outros empecilhos de ordem burocrática para acesso ao financiamento, como dificuldade em obter licenças ambientais, específicas para cada tipo de produção, e o Cadastro Ambiental Rural (CAR): “O CAR é uma espécie de RG do produtor e é um dos documentos exigidos para a contratação do crédito. Em relação a ele, há uma assimetria informacional. O produtor sabe que tem direito, mas muitas das vezes não sabe como obtê-lo, que órgão deve procurar”.
Dados do acumulado julho/agosto em 2022 e 2023
De acordo com a Matriz de Dados do Crédito Rural do Banco Central, no acumulado de julho e agosto de 2023 em comparação com o mesmo período de 2022, houve aumento de 2,5% no número de contratos, de 21% no valor contratado e de 18% no valor médio por contrato. Os dados brutos podem ser conferidos nas tabelas abaixo:
Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. No Instagram, foram 91.5 mil visualizações, 4.1 mil likes e 181 comentários.
Como verificamos: O Comprova consultou dados referentes ao Plano Safra no site do governo federal, em matérias publicadas na imprensa e em portais de entidades do setor como a CNA. Foram consultados o professor Omar Jorge Sabbag, do curso de Engenharia Agronômica da Unesp, e o assessor técnico da CNA, Guilherme Rios. O Comprova ainda fez contato com o Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) e analisou dados sobre o crédito rural no site do Banco Central. Além disso, entramos em contato com a autora da publicação original para questionar onde os dados por ela divulgados haviam sido consultados.
Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.
Em setembro de 2023, o Supremo Tribunal Federal (STF) invalidou o marco temporal, tese que sustenta que os povos indígenas só teriam direito à demarcação das terras que estivessem habitadas por eles em 1988, data de promulgação da Constituição Federal. A decisão contraria um projeto de lei aprovado no Senado que ratifica o ano de promulgação da Carta Magna como limite para definir a ocupação do território por indígenas. Defendida por ruralistas, a tese é vista pelos povos originários e movimentos sociais como uma ameaça aos direitos dos indígenas. Lideranças avaliam que, apesar da vitória no Supremo, ainda há muitas barreiras para a concretização das demarcações.
Conteúdo analisado: Tema que pode influenciar diretamente a vida de indígenas e proprietários de terras, a tese do marco temporal está em discussão no STF e no Congresso, e pode ser objeto de desinformação nas redes.
Comprova Explica: No dia 21 de setembro de 2023, o Supremo Tribunal Federal (STF) rejeitou a tese de que a data da promulgação da Constituição Federal, 5 de outubro de 1988, poderia ser utilizada para definir a ocupação tradicional de terras por comunidades indígenas e orientar as demarcações de territórios no Brasil. A decisão é de repercussão geral, ou seja, outros julgamentos sobre o tema tomarão como base o entendimento da Suprema Corte.
A tese, defendida por ruralistas, reflete a disputa pela posse de terra no país e a situação dos direitos dos povos originários. Em paralelo ao julgamento do Supremo, no Congresso, parlamentares aprovaram, em 27 de setembro, o projeto de lei 2.903/2023 que fixa o ano de 1988 para determinar o reconhecimento de terras indígenas.
Lideranças indígenas apontam que, apesar da vitória no STF, ainda há obstáculos para o pleno reconhecimento de seus territórios. Além da batalha contra o parlamento, comunidades enfrentam dificuldades para avançar com as demarcações, pois, na maioria das vezes, dependem da judicialização das disputas.
Com o objetivo de prevenir desinformação sobre o tema, este Comprova Explica apresenta o histórico e os principais pontos do marco temporal, analisa os efeitos da decisão do STF, e o futuro das demarcações dos territórios indígenas no país.
Como verificamos: O primeiro passo foi pesquisar informações a respeito da tese do marco temporal, sua origem e implicações, e sobre o julgamento do tema no STF e a tramitação do projeto de lei no Congresso Nacional. Depois, o Comprova conversou com o advogado e coordenador executivo da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), Dinamam Tuxá, com uma das lideranças da Terra Indígena (TI) Ibirama Laklãnõ, em Santa Catarina, Tukun Gakran, e com o professor da FGV Direito Rio, Alvaro Palma de Jorge. Também buscou a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) por e-mail, mas não houve retorno até a publicação da verificação.
A tese do marco temporal
O marco temporal é uma tese jurídica que afirma que os povos indígenas só teriam direito à demarcação das terras que estivessem habitadas por eles no momento da promulgação da Constituição Federal, em 5 de outubro de 1988. O marco temporal se contrapõe à teoria do indigenato, que considera que o direito desses povos sobre as terras tradicionalmente ocupadas é anterior à criação do Estado brasileiro, cabendo a este apenas demarcar e declarar os limites territoriais.
No âmbito judiciário, a discussão sobre o marco temporal teve início no STF em 2009 no julgamento da demarcação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima. A discussão, no entanto, voltou à tona quando, em 2019, uma ação de reintegração de posse movida pelo governo de Santa Catarina contra o povo Xokleng, da Terra Indígena Ibirama Laklãnõ, onde também vivem povos Guarani e Kaingang, ganhou status de repercussão geral. Isso significa que a decisão tomada neste caso serviria como uma orientação para outros julgamentos de procedimentos demarcatórios.
Segundo os apoiadores da proposta, que são sobretudo do setor ruralista, a falta de uma data definida para a ocupação das terras pelos indígenas geraria insegurança jurídica e conflitos fundiários no país. Além disso, há a interpretação de que todo o território brasileiro poderia ser reivindicado como terra indígena, incluindo grandes centros urbanos. Isso geraria insegurança sobre proprietários de imóveis.
Já as lideranças contrárias ao marco temporal apontam que ele seria inconstitucional e que seu intuito é inviabilizar o processo de demarcação de terras indígenas, uma vez que, de acordo com a APIB, caso fosse aprovado, todos os territórios, independentemente do status, estariam sujeitos à avaliação de acordo com a tese. Isso poderia resultar em novos processos de revisão, ameaçando a perda de terras indígenas já homologadas e o não reconhecimento de regiões em disputa.
“Imagina uma terra que não caísse no critério do marco temporal, portanto uma terra que não estivesse ocupada e não estivesse em disputa em 1988. E essa terra foi demarcada posteriormente. Com o marco temporal, seria possível dizer que aquela área foi demarcada incorretamente e você poderia ter uma disputa sobre essa questão”, explicou ao Comprova o professor da FGV Direito Rio Alvaro Palma de Jorge.
Outro ponto é a questão dos povos isolados e de recente contato. Entidades ligadas aos direitos dos povos indígenas relatam dificuldade em comprovar a presença desses grupos no período determinado pela tese, o que inviabilizaria a demarcação.
A TI Ibirama Laklãnõ e o marco temporal
Com uma área de 37 mil hectares, a Terra Indígena (TI) Ibirama Laklãnõ fica entre quatro municípios catarinenses do Alto Vale do Itajaí (Doutor Pedrinho, Vitor Meireles, José Boiteux e Itaiópolis). Atualmente, a TI abriga 2.057 indígenas das etnias Guarani, Guarani Mbya, Guarani Ñandeva, Kaingang e Xokleng.
Parte da área da TI está em disputa judicial, uma vez que o estado de Santa Catarina sustenta que os indígenas teriam direito a apenas 14 mil hectares. No entanto, um decreto de 3 de abril de 1926 assinado pelo então governador catarinense, Antônio Vicente Bulcão Vianna, delimita o território dos Xokleng em 20 mil hectares – número inferior aos 37 mil reivindicados pelos povos, no entanto maior que os 14 mil defendidos pelo governo estadual.
Entretanto, líderes indígenas apontam que o decreto nunca foi cumprido na prática. Ao longo do século XX, a região foi sendo tomada por imigrantes e os povos indígenas foram expulsos. Além disso, quando a terra foi demarcada, em 1956, ficou restrita aos 14 mil hectares, o que significa que os 23 mil hectares restantes foram loteados e vendidos.
“O povo Laklãnõ foi expulso de lá. Fomos dizimados, colocados em um espaço pequeno, onde hoje existe uma barragem, que não tem como a gente trabalhar”, afirma Tukun Gakran, uma das lideranças da Ibirama Laklãnõ. Gakran faz referência à construção da Barragem Norte no rio Itajaí, na década de 1970, que alagou a área produtiva dos indígenas e alterou o perfil do rio Hercílio no trecho, agora represado e com menos peixes, o que prejudica até hoje a segurança alimentar dos Xokleng.
O documento que certifica os 37 mil hectares reivindicados pelos indígenas é um laudo feito por um grupo de trabalho da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) em 1997, que, por sua vez, deu origem à portaria 1.128, de 14 de agosto de 2003, aumentando a área da Terra Indígena. Essa portaria foi contestada na Justiça pelo estado de Santa Catarina e por empresas e particulares que receberam títulos de propriedade daquelas terras.
Em 2009, com base na tese do marco temporal, o Instituto do Meio Ambiente de Santa Catarina (IMA-SC) entrou com um pedido de reintegração de posse da área, alegando que parte do território reivindicado pelos Xokleng (cerca de 8 hectares) se sobrepõe à Reserva Biológica Estadual do Sassafrás, criada em 1977. Quatro anos depois, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) deu parecer favorável ao governo do estado.
A Funai recorreu da decisão do TRF-4 e moveu um recurso extraordinário no STF, sustentando que a Constituição garante aos indígenas o direito originário de seu território. Em 2019, o caso ganhou status de repercussão geral. Foi esse recurso que o Supremo julgou em 21 de setembro e decidiu por derrubar a tese do marco temporal.
“Os políticos criaram essa tese dizendo que de 1988 para cá teria que ter um marco para definir a demarcação. Mas nós entendemos que a nossa história não começa em 1988. A gente não quer tomar a terra do povo não indígena, a gente quer o nosso espaço, onde nós vivíamos”, diz Tukun Gakran.
O julgamento no STF
O STF encerrou, no dia 21 de setembro deste ano, o julgamento da tese do marco temporal, com 9 votos contra e 2 a favor. Os ministros Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Cristiano Zanin, Luís Roberto Barroso, Dias Toffoli, Luiz Fux, Cármen Lúcia, Gilmar Mendes e Rosa Weber foram contrários ao entendimento que restringe a demarcação de terras indígenas. Apenas André Mendonça e Kassio Nunes Marques, ambos indicados pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), votaram a favor da tese.
Na avaliação de Nunes Marques, primeiro a votar a favor da tese, a Constituição reconheceu os direitos originários dos indígenas sobre as terras que tradicionalmente ocupam, mas essa proteção depende do marco temporal. Conforme o ministro, a posse tradicional não deve ser confundida com posse imemorial, sendo necessária a comprovação de que a área estava ocupada na data da promulgação da Constituição ou que os indígenas tenham sido expulsos em decorrência de conflito pela posse.
Já André Mendonça considerou que o marco temporal equilibra os interesses de proprietários de terras e dos indígenas. O ministro também entendeu que o laudo antropológico para demarcação dos territórios deve ser conduzido por uma comissão integrante por todos os envolvidos.
No julgamento, os ministros entenderam que o artigo 231, que garante os direitos originários sobre as terras, é uma cláusula pétrea, ou seja, não pode ser alterada depois da promulgação da Constituição. A decisão tem impacto em todos os conflitos judiciais sobre o tema.
| Sessão de julgamento sobre marco temporal no STF em agosto deste ano. (Foto: Carlos Moura/STF)
No dia 27 de setembro, o Supremo concluiu o julgamento e decidiu, por unanimidade, que os não-indígenas que ocuparam de boa-fé os territórios que venham a ser demarcados como terras indígenas poderão ser indenizados. O valor de indenização deve ser pago pela União e deve contemplar o valor integral da terra, além de mudanças feitas no local.
O advogado e coordenador executivo da APIB, Dinamam Tuxá, avalia que um dos efeitos da decisão do STF é o destravamento de mais de 200 processos de demarcação que estão paralisados na Justiça aguardando a definição sobre a tese. “São processos que estão relacionados justamente à questão da demarcação de terras, questões possessórias. De forma automática, esses processos têm que voltar a tramitar”, argumenta.
O julgamento também deve desobstruir pedidos de demarcação que estavam impedidos de tramitar na esfera administrativa, sob o mesmo argumento do marco. “O estado brasileiro está com vários processos de demarcação no âmbito administrativo paralisados, e tinham uma arguição sob, também, a tese do marco temporal, que inviabilizava alguns processos de tramitarem. Agora, não tem mais essa justificativa ou nenhum tipo de impedimento legal para que faça o processo de demarcação caminhar”, completa Tuxá.
O marco temporal no Senado
Em 30 de maio deste ano, a Câmara dos Deputados aprovou por 283 votos a favor e 155 contra, o projeto de lei 490/2007, que estabelece o marco temporal. A proposta seguiu para análise do Senado, onde tramitou como PL 2.903/2023. Em 27 de setembro, o projeto foi aprovado em Plenário por 43 votos a 21. Agora, a proposta vai para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que pode sancionar ou vetar o texto.
A proposta define como “terras indígenas tradicionalmente ocupadas” aquelas que comprovem que o local era habitado de forma permanente e utilizado em atividades produtivas na data da promulgação da Constituição. Prevê também a necessidade de demonstrar a imprescindibilidade da terra para a reprodução física e cultural dos povos indígenas, assim como à preservação dos recursos ambientais necessários para o bem-estar dessa população.
Além disso, o projeto proíbe a ampliação de terras já demarcadas, torna nula as demarcações de áreas que não atendam aos requisitos previstos no texto e estabelece uma indenização a ocupantes não indígenas de territórios que vierem a ser reconhecidos como TI pelas benfeitorias realizadas no local.
Por mais que o STF tenha considerado o marco temporal inconstitucional, a decisão do Senado não impede que a lei seja aprovada e siga para sanção de Lula. Caso seja sancionada, há ainda a possibilidade de que a questão seja novamente judicializada e caiba ao Supremo decidir por sua validade. No entanto, o presidente já afirmou a senadores e governistas que deve vetar a tese.
Conforme reportagem da CNN, a bancada do agronegócio avalia um pacote de medidas para reagir à decisão do STF. A ofensiva deve incluir reuniões com os presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), além de obstrução de votações e do apoio ao andamento de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) para encarecer indenizações a ruralistas.
Em nota, a Frente Parlamentar da Agropecuária afirmou que a decisão do STF seria um “ataque” ao direito de propriedade. Segundo o presidente da entidade, deputado Pedro Lupion (PP-PR), o Supremo “usurpou” a função do Legislativo ao declarar a inconstitucionalidade da tese.
Inconstitucionalidade da tese é celebrada pelos povos indígenas
A tese do marco temporal é amplamente criticada por lideranças indígenas e movimentos sociais, pois, segundo eles, representa um retrocesso aos direitos dos povos originários e uma afronta à sobrevivência dessas comunidades.
“O STF decidindo pela inconstitucionalidade dessa tese, ele reconhece também o direito originário dos povos indígenas. Ele reconhece que os povos indígenas sofreram com inúmeras violências no transcorrer dos anos, desde a data da invasão. Essa tese queria moer a nossa história, queria fazer mais um apagamento histórico”, afirma Dinamam Tuxá.
Caso fosse aprovado, o marco temporal colocaria em risco tanto terras já demarcadas, que podem ser reduzidas, quanto aquelas que ainda estão em processo de delimitação, que podem não ser regularizadas. De acordo com dados do “Relatório Violência Contra os Povos Indígenas do Brasil“, produzido pelo Conselho Indigenista Missionário (CIMI) em 2022, 63% (871) das 1.393 terras indígenas que existem no Brasil têm alguma pendência administrativa no processo de demarcação.
“Para nós, a decisão do Supremo é muito importante porque tem muitos indígenas que precisam de terras, porque eles foram expulsos dos lugares onde moravam. A gente fica muito feliz que pelo menos uma parte do que foi tirado de nós pode ser devolvido”, destaca Tukun Gakran.
Conforme pesquisadores, lideranças e entidades contrárias ao marco temporal, a tese ignora o histórico de violência e marginalização que os povos indígenas viveram no Brasil. Além disso, há o argumento de que, caso a tese fosse aprovada, ela não só dificultaria ainda mais a demarcação de terras indígenas como fomentaria o início de novas disputas, inclusive em terras já pacificadas.
| Indígenas no Supremo Tribunal Federal em maio de 2023. (Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil)
A demarcação de terras indígenas também tem sido considerada importante para garantir a preservação ambiental, pois o avanço indiscriminado de garimpeiros e novos pastos tem contribuído para o desmatamento de florestas e a emergência climática.
Em 2021, a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) e o Fundo para o Desenvolvimento dos Povos Indígenas da América Latina e do Caribe (FILAC) publicaram o relatório “Povos Indígenas e Comunidades Tradicionais e a Governança Florestal”, que reúne 300 estudos científicos publicados sobre o tema nas últimas duas décadas.
A compilação demonstra que as taxas de desmatamento nas florestas da América Latina e Caribe são significativamente menores em áreas indígenas e tradicionais cujos direitos territoriais coletivos foram formalmente reconhecidos pelos governos. No Brasil, as taxas de desmatamento dentro de terras indígenas são cerca de 2,5 vezes menores do que fora delas.
De acordo com o MapBiomas, as terras indígenas perderam apenas 1% de sua vegetação nativa nos últimos 30 anos, enquanto nas áreas privadas essa supressão foi de 20,6%. De 1990 a 2020, foram desmatados um total de 1,1 milhão de hectares em terras indígenas, ao passo que o desmatamento em áreas privadas foi de 47,2 milhões de hectares.
Para os povos indígenas, determinados territórios também são uma maneira direta de conexão com antepassados, da manutenção da própria cultura e também de sobrevivência diante da expansão da vida urbana e rural no Brasil.
Apesar da recente vitória no STF, lideranças defendem que ainda existem barreiras para que todas as terras indígenas sejam reconhecidas. O coordenador executivo da APIB, Dinamam Tuxá, pontua: “Nós temos diversas barreiras, desde políticas a barreiras orçamentárias. Temos barreiras no próprio judiciário, porque muitas dessas demarcações foram judicializadas ou vão ser judicializadas”.
“Nós só garantimos o mínimo para que consigamos avançar com a política de demarcação. Mas esse mínimo é muito importante. É o pilar, a base para garantir que os processos de demarcação ocorram, agora e no futuro”, completa.
Demarcação de terras indígenas
De acordo com a Constituição Federal, as terras indígenas são bens da União e de usufruto exclusivo dos povos indígenas. Elas são bens inalienáveis e indisponíveis, ou seja, não podem ser objeto de compra, venda, doação ou qualquer outro tipo de negócio, sendo nulos e extintos todos os atos que permitam sua ocupação, domínio ou posse por não indígenas. Outro ponto importante é o fato de que os direitos dos povos indígenas sobre suas terras são imprescritíveis.
No artigo 231, a Constituição prevê que as terras tradicionalmente ocupadas por povos indígenas se destinem à posse permanente deles. Segundo o documento, “são terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as por eles habitadas em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as necessárias a sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições”.
A Constituição também estabelece que a União deveria encerrar todas as devidas demarcações em até cinco anos contados a partir da promulgação do texto (ou seja, até 5 de outubro de 1993), mas isso não se cumpriu.
Conforme o “Estatuto do Índio” (Lei 6001/1973), que define a demarcação das terras indígenas, o processo tem início com a identificação e delimitação do território pela Funai. O órgão então realiza estudos que incluem avaliações antropológicas e um levantamento fundiário. As análises passam pelo Ministério da Justiça e, caso aprovadas, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) precisa reassentar eventuais não-indígenas que estavam no local. No fim, a documentação chega ao presidente da República para homologação por decreto da Terra Indígena.
Por que explicamos: O Comprova Explica esclarece temas relevantes para a população e que têm potencial de gerar desinformação nas redes sociais. A luta contra o marco temporal é uma das principais pautas defendidas pelas comunidades indígenas nos últimos anos. As questões sobre direito à terra no Brasil, assim como as decisões de grande repercussão do STF, constantemente são alvos de desinformação. Por isso, é importante munir a população de informações verídicas e com a devida apuração. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.
Postagens têm circulado nas redes sociais afirmando que a Resolução nº 2, de 19 de setembro de 2023, do Conselho Nacional dos Direitos das Pessoas Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Trans., Queers, Intersexos (CNLGBTQIA+), ligado ao Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania (MDHC), seria de autoria do governo Lula e que o presidente teria decretado a instalação de banheiros unissex em escolas. A medida em questão não tem força de lei ou decreto, apenas enumera orientações para futuras políticas públicas sobre as condições de garantia de acesso e permanência de pessoas travestis, mulheres e homens transexuais, e pessoas transmasculinas e não binárias nas instituições de ensino. Não há menção ao termo “unissex” em qualquer parte do documento.
Conteúdo investigado: Vídeos e publicações de deputados federais afirmam que o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) teria decretado a instalação de banheiros unissex em escolas e instituições de ensino de todo o Brasil, incluindo para menores de idade. Nas postagens, utiliza-se também uma frase dita pelo presidente durante a campanha eleitoral de 2022, de que a ideia de banheiro unissex teria “saído da cabeça de satanás”. Um dos autores dos posts ainda coloca que “Lula quer que sua filhinha entre no mesmo banheiro com um marmanjo de 40 anos”.
Onde foi publicado: YouTube e X (antigo Twitter).
Contextualizando: O governo Lula não decretou que as escolas do Brasil deverão ter banheiros unissex. Publicações de congressistas brasileiros sugerem que orientações contidas na Resolução nº 2 de 2023 serão instituídas no país. Mas o documento, além de não prever a criação de banheiros unissex coletivos em estabelecimentos de ensino, não tem caráter de lei. A resolução foi elaborada pelo Conselho Nacional dos Direitos das Pessoas Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Trans., Queers, Intersexos (CNLGBTQIA+), ligado ao Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania. O órgão tem participação de representantes da sociedade civil e sua função é debater e propor políticas públicas – mas nada obriga o governo a adotá-las.
A resolução foi publicada no Diário Oficial da União em 22 de setembro. No mesmo dia, o senador Sergio Moro (União Brasil-PR) disse que o “governo Lula impõe banheiros unissex para todas as escolas públicas do país”. O deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG) falou que “o ministro do Lula de Direitos Humanos instituiu o banheiro unissex em escolas de todo o país”. Filipe Barros (PL-PR) e Carlos Jordy (PL-RJ) citaram a resolução e afirmaram o mesmo. O deputado federal André Fernandes (PL-CE) explicou que a resolução não tem caráter de lei, mas afirmou que “Lula quer que sua filhinha entre no mesmo banheiro com um marmanjo de 40 anos”.
De acordo com Luís Renato Vedovato, professor de Direito Internacional e Direitos Humanos da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e da Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC-Campinas), um conselho tem como função assessorar um ministério, para escutar a população representada e produzir orientações para essa pasta, que podem ou não ser aceitas como base para futuras políticas públicas. Em nota, a Secretaria de Comunicação Social (Secom) da Presidência da República reforçou que a resolução não tem caráter de lei nem de obrigatoriedade, e que não há decreto ou ordem para o cumprimento do tema.
O documento do CNLGBTQIA+ estabelece parâmetros que garantem condições de acesso e permanência de pessoas travestis, mulheres e homens transexuais, e pessoas transmasculinas e não binárias nos sistemas e instituições de ensino como um todo. De acordo com Amanda Souto, advogada e integrante do conselho, a resolução não sugere a instauração de banheiros unissex, mas sim destaca o direito da pessoa utilizar o banheiro de acordo com sua identidade de gênero. O texto propõe ainda, “sempre que possível, a instalação de banheiros de uso individual, independentemente de gênero, para além dos já existentes masculinos e femininos nos espaços públicos”, para “minimizar os riscos de violências e/ou discriminações”.
Como o conteúdo pode ser interpretado: Ao sugerir que uma resolução tem peso de lei ou decreto, as publicações distorcem o contexto do documento e podem confundir a população. O texto da resolução, na realidade, traz orientações para futuras políticas públicas, que podem ou não ser acatadas pelo presidente ou pelos ministérios.
O que dizem os responsáveis pelas publicações: O Comprova entrou em contato com os parlamentares citados acima por terem compartilhado o conteúdo.
André Fernandes e Felipe Barros disseram que o artigo 5º, que defende o direito ao uso de banheiros de acordo com a identidade de gênero, comprovaria a determinação de banheiro unissex.
“O governo está mentindo se falar que não se trata de banheiro unissex coletivo”, falou Fernandes. Já Barros lembrou que “As próprias entidades LGBT, como a ANTRA [Associação Nacional de Travestis e Transexuais], comemoraram a publicação da resolução por garantir o uso de banheiros de acordo com o gênero de cada estudante”.
Sergio Moro defende que a resolução segue a orientação ideológica do governo e que “ao permitir o ingresso em banheiros segundo a autodeclaração de gênero pelo estudante, a resolução, sem usar o termo unissex, permite que banheiros masculinos e femininos sejam utilizados independentemente do gênero biológico”.
Nikolas Ferreira e Carlos Jordy não se manifestaram até a publicação desse texto.
Resolução não tem caráter de lei
A Secom do governo explicou, em nota à imprensa, que a resolução não possui caráter legal ou de obrigatoriedade. “A resolução apenas formula orientações quanto ao reconhecimento institucional da identidade de gênero e sua operacionalização”, informa.
As orientações que constam na resolução nº2/2023 são de autoria dos membros do conselho. Instituído em 6 de abril de 2023 pelo decreto nº 11.471, o CNLGBTQIA+ substituiu o Conselho Nacional de Combate à Discriminação (CNCD), que, segundo comunicado da Secretaria de Comunicação Social, deixou de ter foco nesse grupo nos últimos anos. Em caráter excepcional, a primeira composição do conselho não aconteceu de forma eleitoral, como trata o decreto, mas através de indicação do ministro Silvio Almeida, chefe do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, a partir de lista de entidades composta por meio de chamamento público. Os representantes foram empossados em 17 de maio deste ano, durante cerimônia alusiva ao Dia de Enfrentamento à Violência contra as Pessoas LGBTQIA+.
“Ele é formado por 19 representantes de organizações da sociedade civil, 19 do governo e tem sete instituições convidadas com direito a voz, mas não a voto”, conta a advogada Amanda Souto, integrante convidada do conselho. Dentre as cadeiras da sociedade civil, estão representadas as seguintes organizações:
Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexos (ABGLT);
Aliança Nacional LGBTI+;
Articulação Brasileira de Gays (ARTGAY);
Articulação Brasileira de Jovens Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais;
Articulação Brasileira de Lésbicas;
Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação;
Associação Nacional de Travestis e Transexuais;
Central Única dos Trabalhadores;
Coletivo LGBTI+ Sem Terra;
Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação;
Fórum Nacional de Travestis e Transexuais Negras e Negros;
Instituto Brasileiro Transmasculinidade;
Liga Brasileira de Lésbicas;
Mães da Resistência;
Rede Nacional de Lésbicas e Bissexuais Negras Feministas;
Rede Nacional de Negras e Negros LGBT;
Rede Nacional de Operadores de Segurança Pública LGBTI;
União Nacional LGBT.
Luís Renato Vedovato explica que os conselhos podem ser criados por lei ou por decreto e servem para assessorar os ministérios do governo. “Eles vão fazer o papel de ouvir a população específica e a partir da oitiva dessa população eles vão montar sugestões para o ministério”.
Nesse sentido, o professor de Direito Internacional e Direitos Humanos da Unicamp e da PUC-Campinas explica que uma resolução de um conselho pode servir de amparo para as políticas públicas no futuro, mas que isso não significa que ela é determinante.
“Pode ser que o conselho chegue à conclusão de algo, dizendo que o melhor caminho seria aquele, mas o ministério respectivo pode entender que não é o caso e também depois mesmo que o ministério entenda que é o caso o Presidente da República pode não seguir esses parâmetros”, explica o professor.
Resolução não sugere banheiro unissex
Souto negou que o conselho discutiu a implementação de banheiros unissex. Segundo ela, o que o CNLGBTQIA+ defende é o direito ao uso do banheiro de acordo com a identidade de gênero da pessoa. Nesses casos, por exemplo, um estudante trans que se identifica como mulher teria a possibilidade de utilizar o banheiro feminino.
No entanto, no inciso I do Artigo 6º da resolução, os conselheiros orientam que escolas tenham “banheiros de uso individual, independente de gênero, para além dos já existentes masculinos e femininos nos espaços públicos”, visando minimizar riscos de violência ou discriminações desse grupo. Não há no documento qualquer menção ao termo “unissex” ou que sugere um banheiro de uso coletivo independentemente de gênero da pessoa.
| Trecho da Resolução nº 2/2023
A advogada explica que a Resolução nº 2/2023 visa garantir o respeito às pessoas LGBTI+ no ambiente escolar, e que além da questão do banheiro, traz recomendações sobre outros aspectos pertinentes à essa população, como o uso do nome social.
Resolução não foi produzida ou decretada por Lula
Nas publicações nas redes sociais, há referências sobre uma fala do presidente Lula durante o período eleitoral de 2022. Em 19 de outubro daquele ano, em evento de lançamento da carta aos eleitores evangélicos, o petista desmentiu conteúdos que o associavam a instauração de banheiros unissex: “Agora inventaram a história do banheiro unissex. Gente, eu tenho família, eu tenho filha, eu tenho netas, eu tenho bisneta. Só pode ter saído da cabeça de Satanás a história de banheiro unissex”. A acusação também foi negada pelo então candidato em entrevista concedida ao Flow Podcast.
Com a resolução, as publicações passaram a relacionar a orientação como algo instituído por Lula. “Nem o Ministro nem o Presidente tiveram qualquer participação ou influência na produção da Resolução”, destacou Silvio Almeida em ofício enviado à Advocacia Geral da União (AGU). No documento, o ministro solicitou a tomada de providências administrativas, cíveis e penais por parte da AGU contra os deputados que publicaram que a proposta era de autoria do governo federal.
Resolução não contraria verificação anterior do Comprova
Em 29 de maio de 2023, o Comprova publicou uma verificação mostrando ser falso que Lula esteja implementando banheiros unissex no país. Na ocasião, um vídeo publicado no Kwai, TikTok e X mostrava imagens de homens e mulheres dividindo um banheiro coletivo para insinuar que o governo federal estivesse transformando todos os banheiros públicos do Brasil em unissex.
À época, o projeto entrou em contato com o MDHC que, por meio da Secretaria Nacional dos Direitos das Pessoas LGBTQIA+, informou que não havia “nenhuma iniciativa nesse sentido em curso”.
Tanto Souto quanto Vedovato ressaltam que a resolução não tem o peso de lei, e é criada para servir de base para futuras decisões sobre o grupo que o conselho em questão – no caso, a população LGBTQIA+ – representa. A formulação desse documento é apenas uma indicação aos ministérios e ao presidente da República para futuras formulações de políticas públicas.
Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Até o dia 27 de setembro, o vídeo no YouTube publicado pelo deputado Nikolas Ferreira contava com 185 mil visualizações e 34 mil curtidas. Já as publicações dos parlamentares Carlos Jordy, Filipe Barros, André Fernandes e Sergio Moro no X somavam, juntas, 1,3 milhão de visualizações, 47,9 mil curtidas e 15 mil compartilhamentos.
Como verificamos: Em primeiro lugar, pesquisamos pela resolução citada nos conteúdos no Diário Oficial da União. Em seguida, buscamos informações sobre a resolução nos canais oficiais do governo federal, como a Secom e a Advocacia-Geral da União (AGU).
Via WhatsApp, contatamos Amanda Souto Baliza, advogada e integrante convidada do CNLGBTQIA+, e Luís Renato Vedovato, professor de Direito Internacional e Direitos Humanos da Unicamp e da PUC-Campinas. Por fim, também entramos em contato com os responsáveis pelas publicações.
Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para publicações que obtiveram maior alcance e engajamento e que induzem a interpretações equivocadas. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.
Outras checagens sobre o tema: Na última semana, boatos.org, Agência Lupa e Aos Fatos também publicaram verificações de conteúdos sobre a resolução.
Outras resoluções de conselhos já foram alvo de desinformação. Em agosto, recomendações da Resolução nº 715 do Conselho Nacional de Saúde foram interpretadas de maneira equivocada e enganaram sobre aspectos relacionados ao candomblé e à “mudança de sexo” para menores de idade.
Atualização: Este Contextualizando foi atualizado em 29 de setembro de 2023 para um ajuste no texto do quarto parágrafo da seção “Resolução não tem caráter de lei”.