O Projeto Comprova é uma iniciativa colaborativa e sem fins lucrativos liderada pela Abraji e que reúne jornalistas de 41 veículos de comunicação brasileiros para descobrir, investigar e desmascarar conteúdos suspeitos sobre políticas públicas, eleições, saúde e mudanças climáticas que foram compartilhadas nas redes sociais ou por aplicativos de mensagens.
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Contextualizando

Investigado por: 2024-02-26

Médico foi premiado nos EUA por entidade da qual é membro e ainda responde a ação na Justiça Federal

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Contextualizando
Publicação que diz que o endocrinologista Flávio Adsuara Cadegiani, após ser inocentado de crimes no Brasil, recebeu prêmio nos EUA, omite contexto relevante. O médico é membro da instituição que fez a homenagem. Criada na pandemia da covid-19, a entidade é formada por profissionais que defendem o uso de medicamentos sem comprovação científica de eficácia para tratar a doença, como a ivermectina. Cadegiani é investigado por estudo realizado com o medicamento proxalutamida em pessoas internadas com covid-19 no qual houve a morte de 200 pacientes no Amazonas. Ele foi inocentado em processos administrativos nos Conselhos Regionais de Medicina do Amazonas e do Rio Grande do Sul, mas ainda é alvo de um inquérito criminal no Amazonas e uma ação civil pública no Rio Grande do Sul.

Conteúdo investigado: Uma publicação de uma ex-integrante do governo Bolsonaro sobre o médico Flávio Cadegiani aponta que o endocrinologista recebeu prêmio de reconhecimento pela contribuição científica nos Estados Unidos. Postagem acompanha manchete “Depois de ser inocentado de crimes no Brasil, cientista brasileiro é premiado nos EUA”. A matéria, publicada pelo Médicos pela Vida, associação que defende o “tratamento precoce” contra covid-19, afirma que Cadegiani foi atacado pela imprensa por estudo com proxalutamida em 2021 e que foi injustamente alvo de busca e apreensão. O texto também afirma que o estudo de Cadegiani foi reconhecido nas mais renomadas instituições científicas do mundo como de alta qualidade.

Onde foi publicado: Instagram, X (antigo Twitter), Facebook e YouTube.

Contextualizando: O médico Flávio Cadegiani, investigado no Brasil por supostas irregularidades em estudo para tratar pacientes com covid-19 com o medicamento proxalutamida, ainda não aprovado para tratar a doença, recebeu um prêmio nos Estados Unidos, no dia 2 de fevereiro, por “Contribuições para a Excelência em Pesquisa”. A notícia repercutiu nas redes sociais, com um tom de que seria uma prova de que o médico teria sofrido perseguição em seu país.

O prêmio, porém, foi concedido pela Front Line COVID-19 Critical Care Alliance (FLCCC), que apresenta Cadegiani como um de seus membros-fundadores e defende o tratamento precoce contra a covid-19 com medicamentos como a ivermectina e a hidroxicloroquina, que não são recomendados pela Organização Mundial da Saúde (OMS) para tratamento da doença. Segundo informações da equipe do médico e confirmadas pela FLCCC, no entanto, Cadegiani não participou da criação da aliança. A associação alega que o endocrinologista recebeu o título porque “se juntou à organização em seus primeiros dias e contribuiu extensivamente para o que a organização se tornou”.

O Comprova analisou versões anteriores do site da associação por meio da ferramenta Wayback Machine e constatou que o nome de Cadegiani, de fato, não aparece nas primeiras edições. A primeira aparição do nome do médico como membro data de 2021.

O prêmio foi entregue pelos médicos Paul Marik e Pierre Kory, diretor científico e presidente e diretor médico da FLCCC, respectivamente. Em novembro de 2021, um artigo escrito pelos dois foi retirado de publicação pela revista científica Journal of Intensive Care Medicine. A retirada aconteceu após o hospital cujos dados de mortalidade foram utilizados no estudo entrar em contato com o periódico e sinalizado erro nos números da pesquisa. Dessa forma, o artigo, intitulado “Clinical and Scientific Rationale for the ‘MATH+’ Hospital Treatment Protocol for COVID-19”, passava a falsa impressão de que o protocolo defendido pela FLCCC para o tratamento de pessoas hospitalizadas com covid-19, chamado “MATH+”, que inclui medicamentos como hidroxicloroquina e ivermectina, tinha tido resultado positivo na redução do número de mortes. Os outros médicos que assinam o estudo também são da organização.

Os médicos Pierre Kory e Flávio Cadegiani participaram de um outro estudo sobre o uso da ivermectina como tratamento profilático da covid-19, publicado na revista Cureus, que, posteriormente, divulgou uma errata ao tomar conhecimento que os autores haviam omitido informações sobre conflitos de interesses. Segundo a errata, Cadegiani não informou ser “consultor pago (US$ 1,6 mil, cerca de R$ 8 mil) da Vitamedic, fabricante de ivermectina” e “membro fundador da Front Line COVID-19 Critical Care Alliance (FLCCC), uma organização que promove a ivermectina como tratamento da covid-19”.

Já Pierre Kory omitiu ser presidente e diretor médico da FLCCC. A errata ainda diz que, em fevereiro de 2022, “Kory abriu um serviço privado de telessaúde para avaliar e tratar pacientes com covid aguda, covid de longa duração e síndromes pós-vacinais”.

A informação também consta em artigo da revista Time, intitulado “Right-Wing Doctors Are Still Peddling Dubious COVID Drugs”, de maio de 2023. Segundo o texto, o médico Pierre Kory lançou um “centro de tratamento avançado da covid-19” com consultas a U$ 1.650 (cerca de R$ 8.250) para atendimento de ‘síndrome pós-vacinação’ ou outros problemas”. Ainda segundo a matéria, outro membro da FLCCC, o médico Fred Wagshul, vende consultas sobre ivermectina a U$ 211 (cerca de R$ 1.055).

Cadegiani foi inocentado em Conselhos de Medicina mas ainda responde a ação na Justiça Federal

A postagem sobre o prêmio de Flávio Cadegiani diz que o médico foi “inocentado de crimes no Brasil”, mas necessita de contexto. Cadegiani é investigado por supostas irregularidades em estudo com o medicamento proxalutamida, administrado em pacientes com covid-19, no qual houve a morte de 200 pacientes no Amazonas. O médico foi inocentado em processos administrativos nos Conselhos Regionais de Medicina do Amazonas e do Rio Grande do Sul. Porém, dois procedimentos contra ele ainda tramitam na Justiça Federal: um inquérito criminal, no Amazonas, e uma ação civil pública, no Rio Grande do Sul.

Em setembro de 2021, no ofício enviado à Procuradoria-Geral da República (PGR) para que o órgão investigasse as mortes no estudo no Amazonas, a Conep relata uma série de irregularidades, como aplicação em locais diferentes e com número de participantes acima do autorizado, desrespeitando, segundo o órgão, o protocolo da pesquisa que havia sido aprovado.

De acordo com a Conep, a autorização dada ao endocrinologista permitia que a pesquisa com proxalutamida fosse realizada com 294 voluntários, em Brasília. No entanto, Flavio Cadegiani começou a aplicar o medicamento em pacientes no Amazonas e em outros estados, como o Rio Grande do Sul. O órgão também alega que o parecer final entregue pelo médico continha resultados de 645 pessoas, mais do que o dobro do número autorizado.

Procurada pelo Comprova, a PGR informou que o inquérito criminal aberto pelo Ministério Público Federal (MPF) para apurar as mortes durante o estudo está em tramitação na Justiça Federal do Amazonas, sob sigilo. O órgão ainda informou que há outro inquérito que investiga Cadegiani em processo em andamento na Justiça Federal do Rio Grande do Sul. Neste último caso, o MPF moveu ação civil pública contra um conjunto de réus em razão de supostos fatos lesivos à saúde pública em estudo com proxalutamida para tratamento da covid-19 no Hospital Arcanjo São Miguel, em Gramado, no Rio Grande do Sul. A pedido do MPF, a Polícia Federal chegou a cumprir mandados de busca e apreensão contra o médico e outros envolvidos no estudo.

O caso resultou em denúncia contra Cadegiani na CPI da Pandemia por crime contra a humanidade. Na época, a Rede Latino-americana e Caribenha de Bioética (Redbioética), da Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (Unesco), disse que o caso “poderia ser um dos episódios mais graves e sérios de infração à ética de pesquisas e de violação aos direitos humanos dos participantes na história da América Latina”.

Em relação às mortes, Cadegiani argumentou que a maioria havia sido registrada no grupo que tomou placebo. Segundo a Conep, diante do alto número de mortes era necessário interromper o cegamento do estudo – o medicamento fornecido aos participantes (proxalutamida ou placebo) era desconhecido do pesquisador – para verificar se os óbitos estariam associados à toxicidade do medicamento ou se o grupo de controle estaria em desvantagem por suposta eficácia da proxalutamida.

A comissão ainda alegou que o pesquisador “nunca demonstrou a rastreabilidade dos medicamentos fornecidos na pesquisa (cadeia de distribuição e dispensação), sendo impossível certificar qual produto o grupo controle realmente recebeu”.

Em entrevista ao portal Metrópoles, Flávio Cadegiani negou violações éticas e defendeu o estudo. Já em nota enviada ao Comprova, a assessoria do médico alegou que ele não fez publicações em que nega responder a processo na Justiça e ressaltou que Cadegiani foi inocentado pelos Conselhos de Medicina do Amazonas e do Rio Grande do Sul. “Ambos os conselhos concluíram pela total regularidade da conduta do pesquisador e que o estudo fora, sim, autorizado. Ainda constatou-se que a condução dos ensaios estava de acordo com os princípios éticos e com a legislação vigente no país”, destaca trecho da nota (Parágrafo acrescentado após a publicação de uma primeira versão deste texto).

Quem é Flávio Cadegiani

Flávio Cadegiani é médico formado pela Universidade de Brasília (UnB) com especialização em endocrinologia e metabolismo pela Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabolismo (Sbem). Com histórico de obesidade na infância, o médico se tornou conhecido no tratamento de pessoas com a doença, em Brasília. O especialista é autor do livro “Overtraining Syndrome in Athletes, A Comprehensive Review and Novel Perspectives”, publicado pela editora Nature.

Em 2021, um estudo coordenado por Cadegiani ganhou projeção nacional após se tornar alvo da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep), do Conselho Nacional de Saúde (CNS), atrelado ao Ministério da Saúde. A comissão enviou, em setembro daquele ano, ofício à Procuradoria-Geral da República (PGR) para que o órgão investigasse a morte de 200 pessoas que participaram do estudo com proxalutamida no Amazonas.

O endocrinologista foi convocado, ainda em 2021, a depor na Comissão Parlamentar de Inquérito da Pandemia, que o indiciou por crime contra a humanidade relativo ao estudo com proxalutamida. Assim como Cadegiani, a médica Mayra Pinheiro, autora da postagem analisada aqui, foi convocada no inquérito. Ela foi indiciada por epidemia com resultado morte, crime contra a humanidade e prevaricação. Na época, a médica ocupava a Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde, do Ministério da Saúde, durante o governo de Jair Bolsonaro. Mayra Pinheiro, que ficou conhecida como “Capitã Cloroquina”, chegou a disputar eleições em 2022 para deputada federal pelo Partido Liberal (PL), mas não se elegeu.

Ambos os profissionais defendiam o chamado “kit-covid”. De acordo com o relatório da CPI, o conjunto de remédios sem eficácia comprovada, cujos mais conhecidos eram a cloroquina, a hidroxicloroquina, a ivermectina e a azitromicina, não é um “rol fechado”. “A depender de quem se expressa, podem ser incluídos a flutamida, proxalutamida, colchicina, spray nasal, bem como vitaminas diversas e suplementos alimentares”, destaca o texto. Segundo a Anvisa, além das vacinas, os medicamentos aprovados para tratar a covid-19 são: remdesivir, sotrovimabe, baricitinibe, paxlovid (nirmatrelvir + ritonavir), molnupiravir e tocilizumabe.

Como o conteúdo pode ser interpretado fora do contexto original: Da forma como foi divulgada, a postagem dá a entender que Cadegiani recebeu prêmio de instituição americana independente e respeitada no meio científico, e que ele foi absolvido de investigações do MPF que tiveram repercussão na imprensa, umas delas criminal, por estudo com proxalutamida no tratamento a pacientes com covid-19. Essas interpretações, sugeridas pela postagem, não condizem com a realidade.

O que diz o responsável pela publicação: O Comprova buscou a médica Mayra Pinheiro por meio de contato disponibilizado em sua rede social, por mensagens nas plataformas, e pelo PL do Ceará, mas sem sucesso. 

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Publicado no Instagram, a postagem alcançou 24,3 mil visualizações até 26 de fevereiro.

Como verificamos: O Comprova buscou informações sobre o prêmio dado a Cadegiani e constatou que ele foi concedido pela FLCCC Alliance. Em seguida, foram consultadas informações no site da organização e em veículos de imprensa sobre seus fundadores, além de pesquisas sobre o médico. Também foram consultados documentos oficiais da CPI da Pandemia. O Comprova ainda fez contato com a PGR para apurar sobre os inquéritos abertos pelo MPF contra Cadegiani, consultou um deles, que não está sob sigilo, no site da Justiça Federal do RS, e buscou informações sobre a responsável pela postagem analisada.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: O Comprova já publicou uma série de checagens que desmistificam o uso de medicamentos sem eficácia comprovada contra a covid-19. Entre eles, Flavio Cadegiani já apareceu em verificação de vídeo enganoso em que médicos associam o aumento de problemas cardíacos à vacinação e em estudo sobre ivermectina, que apresenta dados imprecisos e não comprova eficácia do antiparasitário contra covid.

 

Atualização: Este Contextualizando foi atualizado em 27 de fevereiro de 2024 para incluir resposta da equipe do médico Flavio Cadegiani recebida posteriormente à publicação e, em 28 de fevereiro, para incluir esclarecimento da Front Line COVID-19 Critical Care Alliance (FLCCC) sobre o nome do médico constar em seu site como membro fundador da entidade.

Correção: uma primeira versão deste Contextualizando informou equivocadamente que o médico respondia a “processos” na Justiça Federal. Como consta deste texto atualizado, Cadegiani é alvo de um inquérito que corre sob sigilo na Justiça Federal no Amazonas e de uma ação civil pública na Justiça Federal do Rio Grande do Sul.

Comprova Explica

Investigado por: 2024-02-20

Entenda se declaração de Lula sobre Holocausto pode justificar abertura de processo de impeachment

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Comprova Explica
Deputados federais de oposição pretendem ingressar com um pedido de impeachment contra o presidente Lula (PT) por uma declaração em que ele comparou a guerra de Israel na Faixa de Gaza com o Holocausto. O assunto tomou as redes sociais e expôs dúvidas dos usuários sobre o processo. O Comprova explica como funciona e o que prevê a legislação sobre o impedimento do presidente da República.

Conteúdo analisado: Vídeo publicado nas redes sociais em que o youtuber e blogueiro Allan dos Santos, atualmente foragido da Justiça, diz que deputados federais ingressaram com um pedido de impeachment contra o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) por colocar o Brasil em uma “zona de não neutralidade”, o que configuraria crime de responsabilidade. A denúncia estaria baseada na fala do mandatário durante uma coletiva de imprensa em Adis Abeba, na Etiópia, em 18 de fevereiro, quando fez um paralelo entre a guerra na Faixa de Gaza e o Holocausto durante a Segunda Guerra Mundial. 

Comprova Explica: O presidente Lula classificou a resposta de Israel na Faixa de Gaza aos ataques terroristas promovidos pelo Hamas como “genocídio” e “chacina”. Em seguida, comparou a ação israelense ao extermínio de milhões de judeus pelos nazistas, então chefiados por Adolf Hitler, no século XX. As declarações foram dadas por Lula no dia 18 de fevereiro, durante entrevista em Adis Abeba, na Etiópia, onde participou da 37ª Cúpula da União Africana e de reuniões bilaterais com chefes de Estados do Continente.

As falas levaram deputados federais da oposição, liderados pela deputada Carla Zambelli (PL-SP), a anunciarem que irão protocolar um pedido de impeachment contra o presidente, com a alegação de que a afirmação de Lula é “injustificável, leviana e absurda”, além de “uma afronta aos judeus, aos descendentes do horror do nazismo e algo que só fomenta o crescimento do antissemitismo no Brasil”. Os parlamentares alegam que ele cometeu crime de responsabilidade ao expor o Brasil ao perigo de guerra, por cometer ato de hostilidade contra Israel.

O termo “impeachment” esteve nos trending topics do X nos dois dias seguintes e expôs dúvidas dos usuários sobre um eventual processo de impedimento do presidente. Por isso, o Comprova decidiu explicar como funciona o processo e mostrar se as declarações de Lula se enquadram no que prevê a legislação para o tema.

A lei 1.079, de 10 de abril de 1950, e o artigo 85 da Constituição Federal regulam o processo de impeachment e estabelecem que o presidente pode ser afastado do cargo caso cometa crime de responsabilidade, como aqueles que atentem contra a Constituição e contra a existência da União; o livre exercício dos poderes constitucionais e dos direitos políticos, individuais e sociais; a segurança interna do país; a probidade na administração; a lei orçamentária; a guarda e o legal emprego dos dinheiros públicos; e o cumprimento das decisões judiciárias.

A aceitação de um processo de impeachment depende do presidente da Câmara dos Deputados, e consiste em uma das principais responsabilidades de quem ocupa este cargo. A legislação brasileira diz que é permitido a qualquer cidadão denunciar perante à Casa o presidente da República ou ministro de Estado, por crime de responsabilidade. Apesar de o processo de impeachment ser um julgamento, trata-se de um processo eminentemente político.

Não há nenhuma norma no Regimento Interno da Câmara dos Deputados que exija o processamento automático ou com prazo estabelecido para pedidos de impeachment. Assim, cabe ao presidente da Casa decidir quando um processo de impeachment será iniciado ou não. Além disso, em 2022, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu por unanimidade que a avaliação de admissibilidade dos requerimentos é política e não cabe intervenção da Justiça.

Como verificamos: A reportagem buscou a Lei 1.079, de 10 de abril de 1950 e o artigo 85 da Constituição Federal para entender em quais casos o presidente da República pode sofrer um impeachment, e consultou o site e Regimento Interno da Câmara dos Deputados e do STF para verificar quem é apto a fazer a solicitação e quais são os procedimentos, desde a denúncia até a possível aprovação. Também ouviu Rubens Beçak, doutor em Direito Constitucional e professor da Universidade de São Paulo (USP).

Além disso, foram feitas consultas à Câmara dos Deputados para verificar quantos pedidos de afastamento foram protocolados no atual mandato de Lula e de seus antecessores desde 1990. O Comprova também confirmou com deputados da oposição a intenção de apresentar um pedido de impeachment contra o presidente.

Pedidos de impeachment fazem parte do jogo político

Em entrevista coletiva em Adis Abeba, capital da Etiópia, em 18 de fevereiro, Lula definiu as mortes de civis em Gaza como genocídio, criticou países desenvolvidos pelo corte de ajuda humanitária para moradores da região e declarou: “O que está acontecendo na Faixa de Gaza com o povo palestino não existiu em nenhum momento histórico. Aliás, existiu quando Hitler resolveu matar os judeus”.

O governo de Israel repudiou as falas e declarou o presidente brasileiro persona non grata – expressão em latim que, no contexto diplomático, representa que um país se mostra contrário à presença de uma pessoa que integre uma missão diplomática ou representante de outro Estado em seu território -, até que se desculpe ou se retrate. Após a repercussão, deputados federais da oposição anunciaram que vão entrar com um pedido de impeachment contra Lula, sob a justificativa de que ele teria atentado contra a existência da União, exposto o Brasil ao risco de guerra e comprometido a neutralidade do país.

Para Rubens Beçak, professor da USP, a declaração de Lula não configura crime de responsabilidade, porque não atenta contra a governabilidade brasileira ou sua credibilidade. “Eu não vejo nas declarações nada mais a ser condenado do que uma declaração desastrada, não acho que dê substrato para um pedido de impeachment. Faz parte do jogo político pedir o impeachment, mas, apesar de deplorar as declarações, não acho que ainda chegamos nesse ponto”, disse.

Somente no atual mandato, já foram protocolados 18 pedidos de impeachment contra Lula, por variados atos. Um deles, por exemplo, protocolado em outubro passado, o acusou de atacar o Legislativo e o Judiciário brasileiro ao declarar, em janeiro de 2023, que o impeachment da presidente Dilma Rousseff (PT), em 2016, foi um “golpe”.

Todos os presidentes desde a redemocratização foram alvos de pedidos de impeachment, segundo levantamento da Câmara dos Deputados, com no mínimo quatro (Itamar Franco, 1992 a 1995) e, no máximo, 158 (Jair Bolsonaro, 2018 a 2022). Só dois requerimentos foram levados a cabo pela Casa, os que culminaram no impeachment de Fernando Collor, em 1992, e no de Dilma Rousseff, em 2016.

Apesar do processo de impeachment ser um julgamento, cabe somente ao presidente da Câmara dos Deputados a aceitação ou não da denúncia e decidir quando e se será iniciado. Não há norma no Regimento Interno da Casa que exija o processamento automático ou com prazo estabelecido para os pedidos. O Supremo Tribunal Federal também reforça que a admissibilidade dos requerimentos é política e não cabe intervenção da Justiça.

As formalidades da abertura do processo

O Artigo 218 do Regimento Interno da Câmara dos Deputados também afirma que qualquer cidadão pode fazer a denúncia, desde que a entregue assinada e com firma reconhecida, acompanhada de documentos que comprovem, ou da declaração de impossibilidade de apresentá-los, com indicação do local onde possam ser encontrados, bem como, se for o caso, apresentação de, no mínimo, cinco testemunhas.

Se o pedido for aprovado pelo presidente da Câmara, representantes de todos os partidos formarão, em até 48 horas, uma comissão especial para análise do requerimento. O denunciado também deve ser comunicado e tem até dez sessões parlamentares para se manifestar. A partir do pronunciamento ou do término do prazo previsto, a Comissão tem de cinco a dez sessões para oferecer o parecer, deferindo ou indeferindo o pedido.

Após 48 horas da publicação no Diário Oficial, em caso de deferimento, o parecer será incluído na ordem do dia da próxima sessão e será votado pelos deputados federais. O processo contra o presidente é instaurado somente se aprovado por dois terços dos parlamentares (342 do total de 513). Nesse caso, a denúncia segue para o Senado e, do contrário, é arquivado e o processo fica suspenso até o término do mandato presidencial.

Por que explicamos: A seção Comprova Explica esclarece assuntos em discussão nas redes sociais que têm potencial de gerar desinformação. O vídeo verificado pode causar dúvida sobre o processo de impeachment, quem pode protocolá-lo e por quais motivos. Ao conhecer o procedimento e observar que a oposição protocola pedidos semelhantes desde a redemocratização, o leitor pode dar a devida dimensão à denúncia apresentada agora.

Outras checagens sobre o tema: O Comprova já desmentiu um boato que a Constituição permitiria revogar um mandato político por coletar assinaturas dos cidadãos. Na seção Comprova Explica, detalhou como age o mosquito da dengue geneticamente modificado e o que os protestos dos agricultores na Europa têm a ver com políticas ambientais.

Comprova Explica

Investigado por: 2024-02-15

Entenda como age o mosquito da dengue geneticamente modificado

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Comprova Explica
Posts com desinformação envolvendo mosquitos Aedes aegypti geneticamente modificados para o controle de doenças como dengue estão viralizando em um momento em que o país vive uma alta no número de casos. Uma dessas postagens cita reportagem de 2019 sobre um estudo que questionava a eficácia da tecnologia e, mais do que isso, afirmava que poderiam agravar o quadro das doenças. A reportagem é verdadeira, mas a revista Nature, que publicou o estudo originalmente, divulgou meses depois um texto com críticas ao artigo dizendo não haver dados que apoiem a tese de que o mosquito modificado seria mais resistente do que a espécie anterior.

Conteúdo analisado: Posts envolvendo o Aedes do Bem, caixa com ovos de mosquitos Aedes aegypti geneticamente modificados para o controle de doenças como dengue e febre amarela. Um dos conteúdos usa reportagem exibida pela Band em 2019 sobre um estudo que sugere que a alteração genética pode ter criado um supermosquito mais resistente.

Comprova Explica: Dados do Ministério da Saúde divulgados na quarta-feira, 14 de fevereiro, dão conta de mais de 524 mil casos prováveis de dengue em todo o país em 2024, com 84 mortes confirmadas desde o início do ano. Em paralelo, crescem nas redes sociais publicações de boatos envolvendo a dengue que confundem e podem causar danos à população.

Um dos boatos detectados pelo Comprova trata do Aedes do Bem, produto de uma empresa britânica com filial no Brasil constituído por ovos de mosquitos Aedes aegypti geneticamente modificados com o objetivo de controlar a dengue e outras infecções, como chikungunya e febre amarela. Posts usando uma reportagem da Band de 2019 sobre uma possível piora do quadro de transmissão de doenças que o Aedes do Bem poderia causar estão sendo compartilhados de forma descontextualizada. O estudo citado na reportagem foi questionado pela comunidade científica e rebatido por editores da revista Nature, onde havia sido publicado originalmente.

Frente ao perigo da desinformação relacionada à saúde, a seção Comprova Explica traz detalhes sobre o que é o mosquito Aedes aegypti geneticamente modificado para o controle de doenças.

Como verificamos: O primeiro passo foi pesquisar a situação da dengue no Brasil em sites como o do Ministério da Saúde e o que é o Aedes do Bem na página da empresa e em reportagens sobre o assunto.

Também foi consultada a página da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio), agência reguladora de biossegurança do Brasil, da revista Nature e da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS).

Aedes do Bem

Este é o nome comercial usado pela empresa britânica Oxitec para seu carro-chefe: uma caixa com ovos do mosquito Aedes aegypti geneticamente modificados para controle de doenças. Como diz o site da empresa, que tem filial em Campinas, no interior paulista, os mosquitos que vêm na caixa são machos e, do cruzamento com as fêmeas – que são as transmissoras de doenças como dengue, zika, chikungunya e febre amarela, entre outras –, apenas os filhotes machos sobrevivem, reduzindo a população transmissora dos vírus.

O produto é apresentado em duas versões, uma para uso em residências e outra para utilização profissional. A primeira pode ser comprada pela internet por R$ 199 (valor em 14 de fevereiro).

Fundada em 2002 na Universidade de Oxford, no Reino Unido, a Oxitec está no Brasil há mais de dez anos. Os mosquitos Aedes do Bem já foram testados em cidades brasileiras (leia mais abaixo) e possuem um gene marcador fluorescente, que brilha ao ser exposto a uma luz específica sob o microscópio, permitindo que sejam rastreados e diferenciados dos mosquitos selvagens, como explica o site da empresa.

Segundo parecer técnico da CTNBio publicado em 2020, o produto atende à legislação que visa “garantir a biossegurança do meio ambiente, agricultura, saúde humana e animal”.

Em quais evidências científicas ele se baseia?

Um projeto piloto de quatro anos foi realizado em Piracicaba, no interior de São Paulo, com o objetivo de apurar a eficácia do programa em áreas com altos índices de transmissão de dengue, entre 2015 e 2018. Os testes tiveram início em um bairro com 5 mil moradores e, ao longo do tempo, foram ampliados para 11 regiões do município, englobando 60 mil residentes. Após quatro anos de liberação do “mosquito do bem”, os estudos identificaram uma redução média de 98% na população do “mosquito selvagem” nas áreas controladas pelos pesquisadores.

O projeto foi conduzido em três fases: na primeira, foram coletados dados do histórico do mosquito na região monitorada, incluindo sazonalidade, incidência de dengue e demografia, e também montadas as armadilhas para os ovos do mosquito; na segunda, teve início a liberação do “mosquito do bem”; na terceira, os pesquisadores avaliaram se a supressão do mosquito selvagem já era suficiente para reduzir os vetores modificados.

No piloto, a prefeitura de Piracicaba selecionou o bairro CECAP/Eldorado para receber o produto e tentar controlar a epidemia de dengue naquele momento, com 133 casos entre cinco mil pessoas. O bairro controle, Alvorada, que serviu de referência para comparar a eficácia do programa e não recebeu os mosquitos modificados, ficava a dois quilômetros de distância. As áreas possuíam características semelhantes de tipo de edificação, saneamento básico e densidade populacional.

A liberação dos mosquitos modificados ocorria três vezes por semana. No primeiro ano, foram soltos 45 milhões de mosquitos; no segundo, 30 milhões; no terceiro, 13 milhões. No primeiro pico da estação chuvosa, período em que o transmissor se reproduz com mais facilidade, a quantidade de larvas nas armadilhas foi sete vezes menor no bairro CECAP/Eldorado do que a observada no bairro controle, o Alvorada. A redução da população do mosquito foi de 79%. Com o resultado positivo, os pesquisadores diminuíram em 33% a liberação de novos vetores.

Na segunda estação chuvosa, entre 2016 e 2017, a circulação do mosquito selvagem permaneceu em queda, de 81%. Na terceira estação, a supressão foi de 76%. Durante esse período, os bairros não receberam inseticidas de origem química.

Em outro estudo de caso, foram realizados testes na cidade de Indaiatuba, também em São Paulo, em 2018, com uma segunda geração do produto. O projeto alcançou 12 bairros, uma área com 45 mil habitantes. Após cinco anos de monitoramento, a queda média da população do Aedes aegypti nas áreas tratadas foi de 96%.

Entre 2011 e 2015, a empresa também fez testes em duas cidades do interior da Bahia: Jacobina e Juazeiro. As pesquisas foram realizadas por cientistas da Universidade de São Paulo em conjunto com a Biofábrica Moscamed Brasil, primeira fábrica de mosca do país. A fábrica foi criada em 2006 com o objetivo de realizar o controle biológico da mosca-do-mediterrâneo, uma praga da fruticultura brasileira, por meio de insetos estéreis. Em ambos os municípios, o projeto-piloto identificou uma queda de mais de 90% da população de Aedes aegypti após a liberação dos mosquitos modificados.

Um parecer técnico emitido pela CTNBio em 2020 atestou que o programa “não é potencialmente causador de significativa degradação do meio ambiente ou saúde humana”. No mesmo ano, o programa foi testado na Flórida, nos Estados Unidos, e também não representou riscos de biossegurança, garantindo aprovação da Agência de Proteção Ambiental do país. Os resultados do piloto em território americano ainda não foram divulgados, e o estudo segue em andamento.

Estudo publicado pela Nature em 2019 e revisado em 2020

Um dos posts que viralizou sobre o Aedes do Bem usa uma reportagem da Band de 2019 que citava um estudo publicado na revista Nature segundo o qual a alteração genética poderia gerar um supermosquito, piorando o quadro de doenças que ele deveria combater. Só que, em 2020, editores da publicação fizeram alguns apontamentos revisando o que havia sido publicado inicialmente.

O estudo, publicado em setembro de 2019, foi assinado por dez cientistas do Brasil e dos Estados Unidos, e analisou dados do Aedes do Bem em um piloto realizado entre junho de 2013 e setembro de 2015 em Jacobina, na Bahia. Os pesquisadores alegam ter concluído que a liberação de mosquitos geneticamente modificados criou um “supermosquito”, mais selvagem do que o Aedes aegypti anterior e possivelmente resistente a inseticidas.

De acordo com a pesquisa, os mosquitos manipulados em laboratório transferiram os genes para a população local do inseto, o que teria contribuído para a suposta adaptação da espécie. Os cientistas alegam na conclusão do estudo que não é possível apontar os efeitos dessa transferência no controle de transmissão de doenças, e afirmam não terem encontrado “diferenças significativas” nas taxas de infecção por dengue e zika em laboratório, o que, segundo os autores, pode ser alterado em condições de campo.

O programa criado pela Oxitec parte do princípio de que os mosquitos modificados não chegarão à idade adulta por terem nascido mais frágeis. O estudo aqui verificado diz que, se essa letalidade for completa, a liberação da espécie com o novo genoma deverá resultar apenas na redução da população, sem alterar a genética do inseto natural. Os cientistas reconhecem, no entanto, que entre 3% e 4% dos descendentes do mosquito modificado com o mosquito selvagem podem sobreviver até a idade adulta, embora sejam fracos e possivelmente inférteis.

O estudo também afirma que a cepa liberada pela empresa Oxitec em território baiano foi derivada do cruzamento de duas outras cepas: uma originária de Cuba e outra do México. Essa combinação “tri-híbrida” teria gerado características genéticas distintas, resultando em uma população mais robusta do que a espécie anterior do mosquito devido justamente ao “vigor híbrido”, de acordo com os pesquisadores.

Em março de 2020, a revista Nature publicou um “editorial de preocupação” com o artigo. A nota cita falta de dados e omissão de resultados que comprovem as conclusões da pesquisa e faz ponderações quanto à linguagem utilizada pelos cientistas.

“O título não deixa claro que os autores examinaram apenas genomas de espécimes que não possuíam os transgenes e foram amostrados durante o período de liberação”, diz trecho do editorial. “Nenhuma amostragem para este estudo foi realizada mais do que algumas semanas após o programa de liberação e, como tal, não há evidências no artigo que estabeleçam se as sequências introgredidas não transgênicas da cepa liberada permaneceram na população ao longo do tempo. Além disso, trabalhos anteriores de alguns dos autores (referência 6 no artigo) mostraram que, com o tempo, o transgene se perde da população, mas o artigo não divulga esta informação”, afirma a nota.

A revista também faz um alerta sobre as alegações de que a espécie híbrida seria mais resistente do que a população anterior. “Não existem dados no artigo que apoiem este ponto; além disso, os dados incluídos no artigo indicam que um número de indivíduos híbridos diminuiu rapidamente após a libertação”, diz o comunicado. Os editores ponderam, ainda, que os pesquisadores sugerem a ausência de monitoramento da liberação do mosquito geneticamente modificado no município de Jacobina. O programa, no entanto, já estava sendo acompanhado pela CTNBio.

Os cientistas que assinam o artigo foram contatados sobre as preocupações apontadas pela revista, que também procurou outros revisores especialistas no assunto. A comunidade científica consultada pelos editores confirmou que as ponderações são válidas. Dos dez pesquisadores envolvidos no estudo, seis concordaram com a revisão e outros quatro discordaram das notas. A publicação ofereceu a possibilidade de correção dos pontos abordados, mas, segundo a Nature, os autores não responderam se chegaram a um consenso sobre a retificação.

Por que explicamos: A seção Comprova Explica esclarece temas importantes para que a população compreenda assuntos em discussão nas redes sociais que podem gerar desinformação. Quando posts geram boatos infundados sobre temas relacionados à saúde, como neste caso, a desinformação pode colocar vidas em risco. No momento em que o Brasil vive surtos da dengue, com ao menos 84 mortos e mais de 226 mil casos confirmados da doença até 14 de fevereiro, segundo o Ministério da Saúde, a sociedade tem o direito de receber a informação correta para se proteger.

Outras checagens sobre o tema: Outros conteúdos de desinformação tentando assustar a população com assuntos ligados à saúde já foram verificados pelo Comprova. Para levar a informação correta ao leitor, a seção Comprova Explica já trouxe detalhes de como funciona a lista de espera por transplante de órgão no Brasil e mostrou por que recomendação da vacina da Astrazeneca contra a covid-19 foi alterada.

Contextualizando

Investigado por: 2024-02-14

O que os protestos de agricultores na Europa têm a ver com políticas ambientais

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Contextualizando
Publicações nas redes sociais alegam que supermercados da Europa estão desabastecidos por conta dos recentes protestos de agricultores, que estariam se manifestando contra políticas ambientais. As postagens omitem que a escassez de determinados produtos em supermercados ocorre de forma pontual, e não generalizada. Os conteúdos virais também sugerem que as regulamentações ambientais seriam o único descontentamento dos manifestantes. Na verdade, os agricultores têm uma série de outras reivindicações, como a redução de importações estrangeiras mais baratas e a redução da burocracia.

Conteúdo investigado: Vídeo exibe gôndolas vazias de um supermercado. A postagem alega que os mercados da Bélgica e França estão desabastecidos por conta dos protestos realizados por agricultores europeus, que estariam se manifestando contra os “lunáticos climáticos e suas políticas”.

Onde foi publicado: X (antigo Twitter), Facebook e TikTok.

Contextualizando: Desde janeiro deste ano, agricultores têm protestado por toda a Europa. Ao contrário do que sugerem as postagens virais, as queixas dos manifestantes vão além do descontentamento com regulamentações ambientais. Os agricultores também protestam contra a concorrência externa, inflação, rendimentos baixos, burocracia da União Europeia (UE), entre outros.

Ações adotadas pelos agricultores como forma de protesto incluem o bloqueio de estradas e de centros de distribuição. A medida acarretou o atraso de entregas e desabastecimentos pontuais de determinados produtos em supermercados da Europa.

Protestos na Europa

Os movimentos orquestrados por diversas entidades sindicais de agricultores ganharam destaque no fim de janeiro na França, com o bloqueio de estradas e de uma fábrica da Lactalis, maior grupo de laticínios do mundo. Os produtores franceses reclamam dos aumento dos custos da energia e das regras ambientais europeias, que impactam os gastos com a produção.

Esses protestos ganharam fôlego para se espalhar pelo continente durante um protesto em Bruxelas, na Bélgica, embora tenham sido registrados uma série de manifestações anteriores. Na ocasião, em 1º de fevereiro, agricultores jogaram ovos e pedras no Parlamento Europeu, em Bruxelas, além de soltarem fogos de artifício próximo ao prédio, em um ato contra os crescentes custos de produção que afetam a agricultura local e favorecem a importação de produtos.

Uma das demandas mais recorrentes entre as organizações de trabalhadores é a alegação de que a concorrência com produtos vindos de outros países seria desleal com os produtores locais. O internacionalista e fundador do instituto Global Attitude, Rodrigo Reis, explica que o movimento da classe agricultora se concentra na competição com o mercado externo em meio a um cenário de aumento de custos. “Existe um receio da classe agricultora em proteger o mercado interno de produtos importados que serão mais baratos do que os produzidos internamente, e aí existe também um argumento usado por eles na questão ambiental de que esses produtos importados não respeitam as mesmas normas ambientais respeitadas por eles”, destaca.

Além dos dois países, foram registrados protestos na Espanha, em Portugal, Itália, Romênia, Polônia, Grécia, Alemanha e Países Baixos. As reivindicações são semelhantes em quase todos os países, com descontentamento em relação à inflação, concorrência externa, burocracia da União Europeia e regulamentações. Apesar disso, existem demandas específicas para a categoria agrícola de cada Estado.

Desabastecimento nos supermercados

Por consequência de bloqueios realizados por manifestantes, algumas unidades de supermercados começaram a sofrer com escassez de produtos frescos, como frutas e verduras. Na Bélgica, de acordo com o The Brussels Times, as redes que passaram por desabastecimento em determinadas regiões foram Aldi, Colruyt, Lidl e Delhaize.

Em 6 de fevereiro, a RTBF informou que os centros de distribuição da Colruyt já estavam funcionando desde o dia 1º do mesmo mês. Ainda de acordo com o veículo, unidades da rede Delhaize também estavam de volta ao normal. A Delhaize ainda acrescentou que a perda de itens durante as manifestações foi limitada e estima que 100 mil quilos de produtos foram doados a bancos de alimentos. De acordo com a rede, alguns supermercados não ficaram desabastecidos.

De acordo com uma reportagem do Le Parisien, publicada em 29 de janeiro, os bloqueios tiveram pouco impacto no abastecimento dos supermercados da França. Ao jornal, o delegado geral da Federação do Comércio e Distribuição – que reúne marcas como Carrefour, Système U, Auchan e Aldi – afirmou que atrasos poderiam acontecer “aqui e ali”, mas de forma marginal.

Segundo o Europe 1, os agricultores pretendiam bloquear o mercado internacional de Rungis, atacadista de produtos frescos, o que levantou a preocupação de escassez de alguns alimentos. No entanto, a reportagem apontou que a distribuição em massa não deveria ser afetada, já que as marcas costumam ter armazenamento próprio. Conforme o Le Parisien, manifestantes tentaram invadir o mercado de Rungis e ao menos 91 pessoas foram presas na ocasião.

O bloqueio de estradas e centros de distribuição afetou outros países, como Luxemburgo. De acordo com o RTL Today, houve escassez de produtos frescos em algumas unidades do Lidl e Delhaize no país que faz fronteira com a Bélgica, França e Alemanha.

Como o conteúdo pode ser interpretado fora do contexto original: A postagem utiliza um registro isolado de um supermercado para alegar que há desabastecimento generalizado na Europa. Além disso, associa o protesto de agricultores europeus apenas a normas ambientais. Dessa forma, a publicação gera um cenário alarmista e omite que a insatisfação dos manifestantes em relação à política verde é apenas uma pauta entre diversas outras reivindicações.

O que diz o responsável pela publicação: Não foi possível entrar em contato com a responsável pela postagem analisada, já que o perfil não aceita mensagem de contas que não segue.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Até o dia 9 de fevereiro, o conteúdo viral no X acumulava mais de 77,4 mil visualizações, 2 mil compartilhamentos e 5 mil curtidas. No Facebook, o vídeo foi publicado ao menos 40 vezes em contas diferentes com a mesma legenda. No TikTok, uma das publicações descontextualizando as imagens teve mais de 64 mil visualizações e 3,5 mil curtidas.

Como verificamos: Primeiramente, realizamos uma busca reversa do vídeo para verificar o contexto da gravação original. Um dos registros que integra a peça verificada foi encontrado em uma conta do TikTok, indicando que a gravação foi feita em um supermercado na Bélgica. Para comprovar que trata-se de um registro recente, o perfil publicou os metadados do vídeo, que apontam que a gravação foi realizada em 31 de janeiro deste ano.

Depois, também transcrevemos e traduzimos o áudio do vídeo. Com a tradução, foi possível identificar que o supermercado gravado pertencia à rede Lidl. Na gravação, a pessoa que filma diz: “O Lidl está começando a ficar sem estoque, não há mais produtos graças à greve. Continuem assim, pessoal, logo alcançarão sua meta. Estamos indo!”.

Em sequência, procuramos notícias em jornais europeus que informassem sobre desabastecimento em supermercados, sobretudo na rede Lidl. Também buscamos informações sobre os protestos e as reivindicações dos agricultores. Por fim, entramos em contato com um especialista para entender a dimensão da pauta climática nas manifestações.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: Recentemente, o Comprova explicou por que a ação humana é responsável pela crise climática no planeta. A checagem mostrou que a participação do ser humano nas mudanças climáticas é um consenso científico.

Comprova Explica

Investigado por: 2024-01-29

Entenda por que é consenso científico que ação humana causa mudanças climáticas

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Comprova Explica
Conteúdos nas redes sociais desinformam ao afirmar que as mudanças climáticas não são um problema e que a ação humana não é responsável por elas. São postagens que vão contra o consenso científico, como mostrou estudo de 2023 realizado pelo Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima (IPCC, na sigla em inglês), vinculado à Organização das Nações Unidas (ONU). Como toda desinformação, essas também são perigosas, e, por isso, a seção Comprova Explica esclarece alguns pontos envolvendo o assunto.

Conteúdo analisado: Posts nas redes sociais negam as mudanças climáticas e a responsabilidade do ser humano sobre elas, afirmando, por exemplo, que o clima já mudou antes e que o aquecimento global não é ruim.

Comprova Explica: A crise climática que estamos vivendo não é uma ideia que os cientistas inventaram para receber mais financiamentos para suas pesquisas. Nem está sendo causada sem a participação humana. Diferentemente do que afirmam posts nas redes sociais, ela é real e é consenso entre cientistas que a responsabilidade pela crise é do ser humano.

Há quem afirme que o aquecimento global não é ruim, que o clima já mudou antes e que as soluções apresentadas não funcionam, afirmações perigosas diante de um cenário cada vez mais problemático, segundo especialistas. Em Milão, na Itália, um grupo investigado por espalhar teorias conspiratórias sobre a vacina contra a covid-19 assinou um cartaz onde se lê: “Quem fala de aquecimento global é o mesmo que quer vacinação obrigatória”. É a mistura de duas teorias mentirosas, mostrando que a crise climática passou a ser alvo de negacionistas da pandemia, como mostrou a Folha.

O ano passado, inclusive, foi o mais quente em ao menos 174 anos, desde que se iniciaram as medições meteorológicas, segundo a Organização Meteorológica Mundial, agência da Organização das Nações Unidas.

Como afirmou ao Comprova o geólogo José Maria Landim Dominguez, professor titular da Universidade Federal da Bahia (UFBA), “modelos climáticos cada vez mais sofisticados, que têm sido desenvolvidos para investigar o funcionamento do clima, confirmam inequivocamente o impacto das emissões de dióxido de carbono (pelo homem) nas mudanças climáticas em curso”.

É o mesmo que afirma o resumo para formuladores de políticas públicas, do Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima (IPCC, na sigla em inglês). “As atividades humanas, principalmente por meio das emissões de gases com efeito de estufa, inequivocamente causaram o aquecimento global “, diz o estudo.

Aumento da temperatura na Terra, secas intensas, incêndios severos e aumento do nível do mar são algumas das alterações que essas ações estão causando, de acordo com especialistas, e que vêm sendo citadas em conteúdos de desinformação não só nas ruas, mas, principalmente, nas redes sociais. Para combater esse fenômeno, a seção Comprova Explica traz detalhes sobre o que é consenso em relação à crise climática.

Este Comprova Explica abre uma nova frente de verificações no Projeto Comprova. A desinformação em torno das mudanças climáticas passa a ser, juntamente com eleições e políticas públicas em nível federal, um dos focos do Comprova em 2024.

Como verificamos: O primeiro passo foi pesquisar na internet publicações relacionadas às mudanças climáticas. Reportagens e relatórios de órgãos meteorológicos, citados abaixo, foram consultados para a elaboração deste texto.

A equipe também entrevistou o geólogo José Maria Landim Dominguez, da UFBA, e a bióloga Mariana Vale, doutora em Ecologia pela Universidade de Duke, dos Estados Unidos, e uma das autoras do mais recente relatório do IPCC, da ONU.

O que são mudanças climáticas?

De acordo com esta publicação da ONU, as mudanças climáticas são “transformações a longo prazo nos padrões de temperatura e clima”. Elas podem ser naturais – influenciadas pela variação no ciclo solar, por exemplo. Ou podem ser provocadas por uma desregulação do efeito estufa, que gera um aumento da temperatura do planeta, causando assim as mudanças climáticas.

O Instituto Nacional de Pesquisa Espacial (INPE) explica que o efeito estufa é um fenômeno natural que faz com que a temperatura na superfície da Terra seja favorável à existência de vida no planeta. Esse efeito permite que parte do calor do sol que entra pela atmosfera fique retido, regulando a temperatura na Terra. Sem ele, a média da temperatura na superfície seria de -18ºC, e não de 15ºC, como temos hoje.

As mudanças climáticas partem da desregulação do efeito estufa, provocada pelo excesso de emissão de gases por conta da carbonização da economia desde a revolução industrial. Esses gases dificultam ainda mais a saída do calor pela atmosfera, aumentando a temperatura média do planeta, o que desperta um efeito em cadeia que intensifica e aumenta a ocorrência de eventos extremos.

“Desde 1800, as atividades humanas têm sido o principal impulsionador das mudanças climáticas, principalmente devido à queima de combustíveis fósseis como carvão, petróleo e gás”, diz a ONU, que chama a atenção para o fato de que as mudanças climáticas não significam apenas aumento na temperatura, mas alterações em outras áreas, como secas intensas, escassez de água, incêndios severos, aumento do nível do mar, inundações, derretimento do gelo polar, tempestades catastróficas e declínio da biodiversidade.

Consenso científico

De acordo com o dicionário Michaelis, a palavra consenso significa “concordância ou unanimidade de opiniões, raciocínios, crenças, sentimentos etc. em um grupo de pessoas; decisão, opinião, deliberação comum à maioria ou a todos os membros de uma comunidade”.

Na ciência, não é diferente. Como explica em vídeo o imunologista Helder Nakaya, pesquisador do Hospital Israelita Albert Einstein e membro do comitê científico da Sociedade Brasileira de Imunologia, “o consenso tem a ver com o fato de que há tantas evidências que suportam algum fenômeno que não há dúvida entre os cientistas do que está mais próximo da verdade”.

Na animação, ele dá um exemplo ligado às mudanças climáticas: “Se muitos estudos demonstram o papel do homem no aquecimento global, por exemplo, se torna consenso entre os cientistas dessa área que isso é real”. Como ele pontua, “ter um ou outro cientista que pensa diferente não altera a realidade, mas, obviamente, confunde, sim, quem não é o especialista”. Segundo Nakaya, isso acontece porque, quando ouve alguém que pensa diferentemente da maioria, a pessoa acredita que a comunidade científica está dividida, “quando isso não é o que acontece”.

Ação humana e crise climática

Considerando o exposto acima, de que consenso é o que a maioria dos cientistas concordam, embora não seja unanimidade, é consenso que as mudanças climáticas são causadas pela atividade humana, como mostra o mais recente resumo para formuladores de políticas públicas, do IPCC. “As atividades humanas, principalmente por meio das emissões de gases com efeito de estufa, inequivocamente causaram o aquecimento global “, informa o estudo.

Outro levantamento, realizado em 2021 pela Universidade Cornell, dos Estados Unidos, analisou 90 mil estudos e chegou à mesma conclusão: 99,9% dos cientistas concordam que a crise climática é causada pelo homem.

Como explicou ao Comprova o geólogo José Maria Landim Dominguez, da UFBA, existe um consenso na comunidade científica de que a causa principal das mudanças climáticas são as emissões de gases de efeito estufa (GEE) relacionadas às diferentes atividades humanas, principalmente à queima de combustíveis fósseis (hidrocarbonetos e carvão) e desmatamento, mas também à agricultura e à produção de cimento, por exemplo.

“Sempre se soube que o dióxido de carbono (CO2) é um gás estufa muito potente. Desde o século XIX já existiam cientistas que chamavam a atenção que a queima do carvão eventualmente contribuiria para o aumento da temperatura do planeta. As mudanças climáticas são resultado do aumento da temperatura do planeta e existem várias medidas instrumentais que mostram que a temperatura média do planeta já subiu mais de 1ºC desde a era pré-industrial (1850-1900)”, afirma.

No último dia 24 de janeiro, pesquisadores do World Weather Attribution (WWA), um consórcio formado por cientistas de diversas partes do mundo, apontaram que foram as mudanças climáticas – e não o El Niño – o responsável pela seca excepcional na Bacia do Rio Amazonas ao longo de 2023. Lá, a seca é impulsionada pelo baixo nível de precipitação associado às altas temperaturas.

Os pesquisadores apontaram que as populações altamente vulneráveis foram muito mais atingidas pelos impactos da seca, o que foi agravado por “práticas históricas de gestão de terras, água e energia, incluindo desmatamento, destruição de vegetação, incêndios, queima de biomassa, agricultura corporativa, pecuária e outros problemas socioclimáticos que diminuíram a capacidade de retenção de água e umidade do terra e, portanto, piorou as condições de seca”.

O estudo foi tema de reportagem da BBC, que mostrou que, em um mundo onde a atividade humana não tivesse aquecido o planeta, uma seca assim aconteceria uma vez a cada 1.500 anos. As mudanças climáticas provocadas pelo homem, contudo, tornaram uma seca como a da Bacia do Rio Amazonas 30 vezes mais provável – e, agora, espera-se que ela aconteça uma vez a cada 50 anos.

Consenso na mira da desinformação

Para geólogo José Maria Landim Dominguez, apesar do consenso na quase totalidade da comunidade científica a respeito da responsabilidade humana sobre as mudanças climáticas, ainda há um grupo de negacionistas, ou “semeadores de dúvidas”, que não acreditam nisso, sob o argumento de que o homem não seria capaz de promover tal mudança e que outras alterações já aconteceram no passado.

“Realmente, na história passada da Terra, quando o homem ainda não tinha surgido, tais mudanças ocorreram, mas se desenvolveram ao longo de escalas de tempo muito dilatadas, de alguns milênios. Hoje, as mudanças estão ocorrendo em uma escala de tempo de algumas décadas a um ou dois séculos e não podem ser explicadas apenas por variações naturais de emissões de CO2 ou variações de luminosidade do sol”, aponta.

Para Landim, o argumento desses grupos não se sustenta. “É contraditório que aqueles que consideram o homem como um novo agente geológico, a ponto de batizarem uma nova era geológica de Antropoceno, considerem ao mesmo tempo que suas atividades não são capazes de alterar a composição da atmosfera a ponto de desencadear mudanças climáticas”, completa.

Desinformação de cara nova

Para Mariana Vale, uma das autoras do último relatório do IPCC, da ONU, é preciso considerar que as formas de disseminar desinformação sobre mudanças climáticas mudaram nos últimos tempos. Ela considera que não se nega mais as mudanças climáticas, nem que elas foram causadas pelo homem. No entanto, nega-se que essas mudanças sejam um problema, bem como a possibilidade de que as soluções propostas funcionem.

“Como já ficou praticamente impossível negar as mudanças climáticas, porque elas estão acontecendo diante dos nossos olhos, e também a quantidade de evidências científicas de que o homem é o principal ator por trás dessas mudanças, esses negacionistas climáticos começaram a se concentrar em criar fake news em torno das soluções, desacreditar as soluções que são propostas a partir de evidências científicas”, diz Vale, que é professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e tem as mudanças climáticas entre os principais temas de suas produções acadêmicas.

Para ela, há algo de positivo nisso, pois mostra que a sociedade se convenceu de que as mudanças climáticas são reais e estão acontecendo. Mas ela aponta um novo desafio: “demonstrar que existe evidência científica de que as soluções propostas são viáveis e têm que ser implementadas o quanto antes”.

As soluções, afirma Vale, passam pela decarbonização da economia em escala global e, especificamente no contexto do Brasil, também pela conservação de florestas – a Floresta Amazônica e a Mata Atlântica – e no reflorestamento, sobretudo da Mata Atlântica e do Cerrado, os dois biomas brasileiros mais degradados.

Para combater a desinformação sobre o tema, os cientistas têm recorrido à geração de informação de qualidade: “São evidências científicas a partir de dados robustos, e isso a gente gera em abundância já há muito tempo. O importante é conseguir aliados, e há muitos aliados que trabalham para difundir essa informação”, afirma Vale, citando ONGs especializadas, mídias alternativas, redes sociais e mídia convencional, como jornais que replicam a informação correta.

Relação entre mudanças climáticas e desinformação

O 19º relatório do Fórum Econômico Mundial sobre riscos globais, publicado em janeiro deste ano, aponta que os eventos climáticos extremos e a desinformação são os dois maiores riscos globais em curto e longo prazo. Nos próximos dois anos, a desinformação aparece no topo da lista dos dez principais riscos, seguida imediatamente dos eventos climáticos extremos.

Já no prazo de dez anos, os quatro primeiros itens da lista envolvem questões climáticas: eventos climáticos extremos; mudanças críticas nos sistemas da Terra; perda de biodiversidade e colapso de sistemas; e escassez de recursos naturais. O próximo item do ranking, não por acaso, é a desinformação.

Pesquisador do Global Change Institute, da Universidade de Queensland, na Austrália, John Cook mantém desde 2007 o site Skeptical Science (Ciência Cética, em tradução livre), que atua desbancando mitos em torno do aquecimento global com base em evidências científicas.

Entre os argumentos usados por aqueles que negam as mudanças climáticas estão as teses de que “o clima já mudou antes”, o aquecimento global “não é ruim”, “não há consenso científico”, que “animais e plantas podem se adaptar” e até que a Terra “está esfriando” e que a Antártida está “ganhando gelo”.

Todos os argumentos são desbancados por artigos, a exemplo deste que aponta que há consenso de 99% dos cientistas sobre o aquecimento global ser provocado, principalmente, pela atividade humana – o que reafirma o artigo de 2021 da Universidade de Cornell, citado acima –, ou este outro, que mostra como os impactos negativos do aquecimento global são muito maiores do que quaisquer aspectos positivos. Também não é verdade que a Antártida esteja ganhando gelo ou que a Terra esteja esfriando.

O geólogo José Maria Landim Dominguez acrescenta outras alegações que também foram sendo descartadas ao longo do tempo, como é o caso da tese de que a luminosidade do sol poderia aumentar a temperatura global – investigada e descartada. “Outros processos como emissões naturais de CO2 devido à atividade vulcânica foram investigados e não conseguem explicar o aumento verificado”, afirma.

Por que explicamos: O Comprova Explica tem a função de esclarecer temas importantes para que a população compreenda assuntos em discussão nas redes sociais que podem gerar desinformação. Mentiras sobre as mudanças climáticas, tirando a responsabilidade do homem sobre elas, são perigosas por sugerir que podemos continuar degradando o meio ambiente sem olhar para as consequências. Por isso, é importante que as pessoas tenham acesso a informações verificadas, como as trazidas neste texto.

Outras checagens sobre o tema: O Comprova já verificou diversos conteúdos ligados à crise climática, como o que mentia ao afirmar que a retirada de gado de áreas rurais tem a ver com a venda da Amazônia pelo governo – na verdade, a medida era para combater o desmatamento ilegal. Classificou como enganoso um post afirmando que a Amazônia não estava queimando e um vídeo que, entre outros erros, distorce falas do presidente Lula (PT) sobre mudanças climáticas.

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Investigado por: 2023-12-22

Entrega de chaves de condomínio no Amapá começou no dia de evento com Lula

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Publicações nas redes sociais alegam que o governo Lula (PT) teria descumprido uma promessa de entregar as chaves de um conjunto habitacional em Macapá apenas para lotar a cerimônia de lançamento do empreendimento, com participação do presidente. A entrega teve início, no entanto, ainda no dia do evento e não era de responsabilidade do governo federal, mas da construtora que fez a obra, em processo sob supervisão da Caixa Econômica Federal e com apoio do governo do Amapá.

Conteúdo investigado: Publicações alegam que o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) prometeu a entrega de chaves no evento de lançamento de um conjunto habitacional, com participação do presidente, para que estivesse lotado e não houvesse vaias. As postagens são acompanhadas de um vídeo em que uma mulher questiona, sem aparecer na imagem, onde estão as chaves e narra, em meio a uma multidão, que o público presente teria sido enganado.

Onde foi publicado: X (antigo Twitter) e TikTok.

Contextualizando: Publicações nas redes sociais alegam que o governo Lula (PT) teria descumprido uma promessa de entregar as chaves de um novo conjunto habitacional durante uma cerimônia de lançamento com participação do presidente. As chaves começaram a ser entregues, contudo, ainda no dia do evento, ocorrido em 18 de dezembro deste ano.

As postagens são acompanhadas de um vídeo gravado após a cerimônia de inauguração do Miracema III e IV, em Macapá (AP), com mil unidades habitacionais do programa Minha Casa, Minha Vida (MCMV).

A cerimônia de lançamento contou com a participação do presidente Lula e do ministro da Cidades, Jader Filho (MDB), além do governador do Amapá, Clécio Luís (Solidariedade), entre outras autoridades locais, como membros do Ministério Público amapaense.

O conjunto habitacional foi lançado pela modalidade Recursos do Fundo de Arrendamento Residencial (FAR) do MCMV, que oferece imóveis subsidiados com recursos públicos em áreas urbanas para famílias em situação de vulnerabilidade, que estejam em um cadastro habitacional local, por exemplo.

O modelo MCMV – FAR também prevê a participação de diferentes agentes públicos e privados para viabilizar cada empreendimento, com responsabilidades distintas entre si.

Conforme estabelece uma portaria do Ministério das Cidades, estão envolvidos, em geral, a própria pasta, que regula regras e propostas do MCMV – FAR; a Caixa Econômica Federal, gestora dos recursos do FAR; algum ente público local, que pode ser uma prefeitura ou o governo do Estado; um agente financeiro, que supervisiona o processo e pode ser a própria Caixa; uma construtora, a quem cabe propor e erguer a obra; e os beneficiários, que, entre outras coisas, devem assumir o financiamento do imóvel, se necessário.

No caso do Miracema III e IV, a entrega das chaves aos novos moradores foi realizada pela construtora CMT Engenharia, em operação com apoio do governo do Amapá, na condição de ente público local, que fez a seleção e orientação dos beneficiários ao longo de todo o processo, e com supervisão da Caixa, agente financeiro do conjunto habitacional, segundo comunicou o banco ao Comprova.

A entrega das chaves começou ainda no dia 18 de dezembro, logo após o evento com a participação de Lula. Até o começo da tarde do dia 22, foram entregues 862 unidades, também segundo a Caixa.

“A entrega das chaves é realizada mediante assinatura do contato e realização de vistoria pela família beneficiária indicada pelo Ente Público local, neste caso o Governo do Estado, à luz das regras estabelecidas pelo Programa”, escreveu a assessoria de imprensa da Caixa, em nota.

A Secretaria de Habitação do Amapá (Sehab) reforçou que a entrega das chaves é de responsabilidade da CMT Engenharia. A pasta divergiu da Caixa, contudo, ao comunicar que todas as mil chaves já foram entregues: “Informa ainda que, no mesmo dia do evento, foram entregues 300 chaves, e que a conclusão desta etapa foi realizada nesta quinta-feira, 21”, escreveu, em nota.

A construtora CMT Engenharia, citada pela Caixa e pela Sehab, não respondeu aos contatos do Comprova por telefone e e-mail até a publicação deste texto

Além das partes envolvidas no empreendimento, o Comprova também buscou contato com o MP-AP, que havia divulgado ter acompanhado todo o processo de finalização das obras. O órgão comunicou não ter recebido reclamação formal sobre não recebimento de chaves por parte dos beneficiários.

Como o conteúdo pode ser interpretado fora do contexto original: Sem o contexto completo, que mostra quando a entrega das chaves teve início, os leitores poderiam ser levados a acreditar que o governo tentou enganar as pessoas beneficiadas. A investigação mostra que o vídeo analisado não trazia, porém, todas as informações para que o leitor pudesse entender o que aconteceu na situação mostrada ali. 

O que diz o responsável pela publicação: O Comprova procurou o autor da postagem no X por mensagem privada. Além de não responder, ele apagou a publicação no X e no TikTok. Não é a primeira vez que conteúdos veiculados pelo mesmo autor são investigados. Anteriormente, já foi verificado ser falso que PT ou a governadora de PE reinauguraram obra de Bolsonaro ligada à transposição do São Francisco, que policiais foram expulsos pelo MST de protesto em rodovia no PR, e não feitos reféns, bem como que vídeo de mulher com rosto de Lula e delegado parecido com Bolsonaro é uma sátira.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. As publicações com o vídeo foram, no entanto, excluídas pelo autor. Ao menos até 21 de dezembro, quando ainda estava no ar, o post no X tinha 50,6 mil visualizações e 2 mil curtidas.

Como verificamos: O Comprova identificou, ao analisar o vídeo, uma faixa com a logomarca do atual governo federal (abaixo). Em seguida, a reportagem buscou por entregas recentes de moradias populares com participação do presidente Lula, ocasião em que encontrou a cerimônia realizada em Macapá, no Amapá.

A reportagem também identificou que a cor dos prédios e a estrutura de evento montada aparentes no vídeo condizem com o cenário mostrado em imagens oficiais da cerimônia e do empreendimento.

| Presidente Lula em cerimônia de lançamento de conjunto habitacional (Foto: Ricardo Stuckert/PR)

| Conjunto habitacional Miracema, em Macapá (Foto: Nayana Magalhães/GEA)

A partir disso, a equipe localizou postagens no X feitas por Max Yataco, secretário-adjunto de Habitação do Amapá, que mostram famílias recebendo as chaves de unidades do Miracema III e IV. Em contato por telefone, Yataco confirmou que o vídeo em que uma mulher contesta a falta das chaves teria sido gravado após a cerimônia em Macapá com a participação de Lula.

Além de Yataco, o Comprova fez contato, por e-mail, e obteve retorno da Caixa Econômica Federal, do Ministério das Cidades, do governo do Amapá e do Ministério Público amapaense.

A reportagem também procurou a CMT Engenharia, mas foi informada que a empresa não possui assessoria de imprensa e que as pessoas autorizadas a falar sobre o assunto não estavam no escritório nos dois dias em que telefonou. Por e-mail, também não houve resposta até esta publicação.

Chaves começaram a ser entregues após cerimônia em Macapá

Ao pesquisar sobre a cerimônia nas redes sociais, o Comprova localizou vídeos postados na mesma data, mas à noite, após o evento, em que famílias aparecem recebendo chaves dos imóveis.

Um deles foi compartilhado às 21h36 de 18 de dezembro no X pelo governador do Amapá, Clécio Luiz. No post, ele comunicava que a equipe do governo estadual seguia no residencial Miracema III e IV para realizar a entrega das chaves para os novos moradores do empreendimento.

O vídeo mostra o secretário-adjunto Max Yataco, segundo o qual, naquele momento, estavam sendo colhidas as assinaturas para a entrega de chaves. Ele diz também que o processo ainda demoraria um pouco. Mais tarde, às 23h15, Yataco compartilhou outro vídeo, de uma moradora com a chave em mãos.

Por telefone, o secretário-adjunto afirmou que algumas pessoas ficaram chateadas quando correu um rumor, não verdadeiro, de que não seria feita a entrega das chaves já naquele dia. Yataco também reafirmou que a responsabilidade da entrega era da construtora CMT Engenharia, que executou a obra.

“Eles [construtora] repassaram para a gente a dificuldade na logística da entrega, mas em nenhum momento foi repassado que não seriam entregues as chaves. Na verdade, o que aconteceu foi um rumor entre eles mesmos [beneficiários] de que não seriam entregues as chaves, aí algumas pessoas ficaram indignadas, chateadas, e começaram essa movimentação vista no vídeo”, relatou ao Comprova.

Yataco disse também que a Secretaria de Habitação enviou convites da cerimônia para os beneficiários, comunicando que poderiam levar até três familiares para participar do evento, mas que não teria sido ventilada informação sobre a entrega das chaves, uma vez que o procedimento caberia à construtora.

Na véspera da cerimônia, o governador do Amapá divulgou vídeo no Instagram anunciando a entrega de mil unidades habitacionais junto do presidente Lula. No dia do evento de lançamento, o governo federal também reafirmou, com publicação oficial, que seria feita a entrega dos imóveis.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: É comum a disseminação de desinformações associadas a eventos dos quais o presidente participa. O Comprova já demonstrou, por exemplo, que Lula se encontrou com liderança religiosa da Nigéria em evento de igualdade racial, não com “feiticeiro”, que ele não foi hostilizado em visita a polo automotivo de Goiana nem dentro do Bahia Farm Show e ser falso que defendeu o nazismo e o fascismo em evento do PT em 2017.

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Investigado por: 2023-12-19

INSS pagou 13º em novembro apenas para beneficiários que não tiveram adiantamento

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Publicação no TikTok confunde ao fazer uso de imagens do INSS e alegar que aposentados receberão até R$ 12 mil em dezembro. Na verdade, apenas os segurados e dependentes da Previdência Social que não puderam receber antecipadamente em 2023 o abono anual, equivalente ao 13º salário, tiveram valores referentes a ele depositados agora em novembro. Para quem se tornou beneficiário ativo em junho e recebe o teto do INSS, foi paga uma parcela única de R$ 11.886,85 no mês passado.

Conteúdo investigado: Vídeo exibe imagens do INSS e a legenda “Está assinado! Pagamento de até R$ 12.000 reais [sic] para aposentados”. Ao fundo, uma narradora afirma que aposentados e pensionistas, entre outros beneficiários, que tiveram um benefício acima de um salário mínimo concedido a partir de maio deste ano poderão receber até R$ 12 mil com uma parcela única do 13º agora em dezembro.

Onde foi publicado: TikTok.

Contextualizando: A maior parte dos segurados e dependentes da Previdência Social recebe anualmente um abono do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) equivalente ao 13º salário pago para os trabalhadores com vínculo empregatício ligado à Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

Em 2023, esse abono anual foi pago em duas parcelas iguais, nos meses de maio e junho, de modo adiantado. Costumeiramente, elas são depositadas nos meses de agosto e novembro de cada ano. Desde 2020, contudo, o valor tem sido quitado antecipadamente, a priori para minimizar perdas econômicas da pandemia de covid-19. Neste ano, a ideia foi aquecer a economia ao injetar recursos em mercados locais.

Ainda em 2023, quem se tornou beneficiário ativo do INSS apenas depois de maio não pôde contar com o abono anual antecipado. Esse valor equivalente ao 13º só foi pago agora em novembro, com uma parcela única e em quantia proporcional aos meses deste ano em que a pessoa teve direito ao benefício comum. O abono proporcional e o benefício foram pagos juntos, seguindo o calendário de depósitos do INSS.

Um segurado que esteja aposentado desde junho de 2023 e receba o valor do teto do INSS (R$ 7.507,49), por exemplo, teve depositados em sua conta agora em novembro R$ 11.886,85. Esse valor equivale a R$ 7.507,49 do benefício comum e R$ 4.379,36 de abono proporcional a sete meses (de junho a dezembro).

Publicações nas redes sociais têm confundido esse pagamento efetuado em novembro com um suposto novo 13º ou um abono extra para aposentados e pensionistas, o que não é verdade. Os beneficiários que tenham recebido as parcelas de maio e junho não têm direito a um novo depósito em 2023.

Em setembro, o INSS emitiu comunicado para alertar isso devido à circulação de conteúdos de desinformação. Ao Comprova, o INSS reafirmou não haver previsão de um novo abono.

“O INSS, inclusive, tem uma ação em curso na Procuradoria Federal Especializada para retirada desses conteúdos do ar”, escreveu, em contato por e-mail.

O abono anual é pago para segurados e dependentes da Previdência Social que, durante o ano de 2023, tenham recebido auxílio por incapacidade temporária, auxílio-acidente, aposentadoria, pensão por morte ou auxílio-reclusão. Isso corresponde a cerca de 30 milhões de beneficiários, segundo o governo federal.

Os segurados que recebem benefícios assistenciais do INSS, caso do Benefício de Prestação Continuada (BPC) e da Renda Mensal Vitalícia (RMV), não têm direito ao abono anual.

Como o conteúdo pode ser interpretado fora do contexto original: A publicação desinforma ao afirmar, em um primeiro momento, que aposentados vão receber R$ 12 mil em dezembro. O texto narrado no vídeo ainda é confuso e, apesar de retificar a fala de abertura em um segundo momento, não esclarece quem terá direito ao abono em novembro e como calculou o valor de até R$ 12 mil.

O que diz o responsável pela publicação: O Comprova não conseguiu contato com o autor da publicação, uma vez que apenas perfis que sejam seguidos por ele no TikTok podem enviar mensagem.

O que podemos aprender com esta investigação: É comum que desinformadores façam uso da imagem de órgãos oficiais para atribuir credibilidade a conteúdos enganosos e deixem de informar as fontes primárias de alegações fora de contexto. Para ter a clareza sobre a informação divulgada, é importante pesquisá-la junto aos canais de órgãos oficiais e em veículos de imprensa. Além disso, é necessário cautela com perfis que se autointitulam canais de notícias, mas não disponibilizam um link seguro nem fontes de informações em seus conteúdos. No caso do perfil em questão, há apenas um link para a compra de máquinas de cartões, na tentativa de gerar receita ao canal a partir da indicação de clientes.

Alcance da publicação: A postagem no TikTok teve 27,6 mil curtidas e 3,7 mil compartilhamentos até 19 de dezembro.

Como verificamos: O Comprova entrou em contato com o INSS via assessoria de imprensa, além de ter buscado por publicações sobre o abono anual em canais oficiais do governo e veículos de imprensa.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: O Comprova explicou recentemente por que não há pagamento de 13ª parcela no Bolsa Família e mostrou não existir uma nova lei que obrigue motorista a pagar pensão por invalidez em casos de acidentes de trânsito.

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Investigado por: 2023-12-13

Empréstimo do Brics foi aprovado pelo Senado e será destinado para pequenas e microempresas brasileiras

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Vídeo nas redes sociais aponta que o governo brasileiro pegou empréstimo de US$ 1 bilhão no "banco do Brics" sem ter uma finalidade definida para a quantia. O motivo seria o fato de a atual presidente da instituição internacional ser a ex-presidente da República Dilma Rousseff (PT). No entanto, o valor tem destino: será usado em um programa que garante acesso a crédito para as micro, pequenas e médias empresas brasileiras, via Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), criado em 2020 para reduzir os impactos econômicos da pandemia da covid-19.

Conteúdo investigado: Vídeo mostra homem relacionando a nomeação de Dilma Rousseff como presidente do Novo Banco de Desenvolvimento (NBD) – conhecido como “banco do Brics” – ao fato de o Brasil ter fechado um empréstimo de US$ 1 bilhão junto à instituição financeira. Segundo ele, a imprensa não teria dado publicidade à aprovação da operação de crédito. O conteúdo é acompanhado do trecho de um telejornal no qual a apresentadora fala sobre o empréstimo, citando que ainda não há destinação para o valor. Na sequência, um comentarista aparece para participar do jornal e diz que, com o empréstimo, o governo federal “pode roubar e muito”.

Onde foi publicado: TikTok.

Contextualizando: O Projeto de Resolução (PRS 44/2023) que autorizou o Brasil a fazer um empréstimo de até US$ 1 bilhão com o Novo Banco de Desenvolvimento (NDB, na sigla em inglês) foi aprovado pelo Senado em abril deste ano. A informação foi divulgada no portal Senado Notícias. Um vídeo que viralizou nas redes sociais, publicado no mês de outubro, usa essa informação para afirmar que o governo brasileiro obteve o crédito sem dar destinação aos recursos, com anuência da presidente do banco Dilma Rousseff e assinatura do ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT). Um comentarista ainda acrescenta que, com a operação, o governo federal “pode roubar e muito”.

No entanto, o próprio PRS 44/2023, de autoria da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado, sinaliza qual será o destino do valor da operação de crédito: o financiamento parcial do Programa Emergencial de Acesso a Crédito (FGI PEAC), criado em 2020 para reduzir os impactos econômicos da pandemia da Covid-19 e executado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). O programa garante a ampliação do acesso ao crédito para Microempreendedores Individuais (MEIs), micro, pequenas e médias empresas brasileiras (MPMEs).

O governo federal, em outubro, negou a informação de que a quantia do crédito não teria destinação determinada. Por meio de nota, a Secretaria de Comunicação da Presidência comunicou que o pagamento do empréstimo deverá ser feito em 30 anos, com juros de 1,64% ao ano.

Além disso, não se sustenta a afirmação de que a imprensa brasileira não teria dado publicidade à aprovação do crédito. O tema foi pautado por veículos jornalísticos como O Globo, Gazeta do Povo, Folha de S. Paulo e Correio Braziliense, também no mês de outubro, quando Dilma assinou o acordo para o empréstimo.

O que é o “banco do Brics”?

O Novo Banco de Desenvolvimento (NDB, na sigla em inglês) foi criado em 2015. Um ano antes, o Brasil foi sede da 6ª edição da cúpula do Brics, um bloco político-econômico composto por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. Neste evento, que aconteceu em Fortaleza, no Ceará, o grupo de países assinou a criação do NDB, com o objetivo de subsidiar projetos de infraestrutura e desenvolvimento, públicos ou privados, nas cinco nações que formam o grupo e em outros países emergentes.

A instituição realiza dois tipos de operações de crédito: soberanas, que são aquelas em que um país ou ente federativo da nação membro do Brics pede dinheiro; e não soberanas, que ocorrem quando uma empresa privada com sede em um dos países membros solicita o empréstimo.

O banco está sediado em Xangai, na China. Além dos cinco países fundadores, o NDB possui três novos membros: Bangladesh, Emirados Árabes e Egito. A instituição é formada por um conselho de governadores, outro de diretores, além de um presidente e quatro vice-presidentes. A presidência é rotativa, sendo periodicamente ocupada por representantes das nações do Brics.

Quem representa o Brasil no conselho de governadores atualmente é Fernando Haddad, ministro da Fazenda. Dilma Rousseff teve o nome aprovado para a presidência por um comitê do NDB após ser sabatinada por ministros da Economia de outros países membros do Brics. O mandato de Dilma como presidente do NDB vai até julho de 2025. Quem antecedeu a petista no cargo foi Marcos Troyjo, diplomata indicado à presidência do banco por Jair Bolsonaro, em 2020.

Projetos do Brasil no NDB

Os projetos subsidiados pelo NDB focam em áreas como energia limpa, infraestrutura de transporte, água e saneamento básico, proteção ambiental e infraestrutura digital. De acordo com dados coletados no site do banco, até 11 de dezembro de 2023, existiam 29 projetos do Brasil na instituição internacional, o que inclui aqueles aprovados (18), em tramitação (6), cancelados (3) e concluídos (2).

Portanto, o empréstimo de US$ 1 bilhão para o financiamento parcial do Programa Emergencial de Acesso a Crédito (FGI PEAC), aprovado pelo Senado em abril, não é o primeiro que o Brasil contrata com o NDB. A lista de projetos brasileiros envolve iniciativas públicas e privadas de diferentes estados e municípios do país.

O valor mais alto que o país já recebeu em empréstimo do NDB foi de US$ 1,2 bilhão para subsidiar a infraestrutura sustentável do BNDES, em 2020, durante a gestão do ex-presidente do banco, Marcos Troyjo.

 

Como o conteúdo pode ser interpretado fora do contexto original: Neste caso, a peça de desinformação tenta associar a imagem da ex-presidente Dilma Rousseff, enquanto atual presidente do NDB, ao fato do Brasil ter fechado acordo de empréstimo com o banco. Mas, na verdade, já existe um histórico de acordos do país com a instituição pelo menos desde 2018. Além disso, o conteúdo investigado dá a entender que a imprensa não cobriu o empréstimo, quando sua aprovação pelo Senado foi noticiada de forma vasta.

O que diz o responsável pela publicação: O Comprova tentou entrar em contato com o autor da publicação. Mas, até a publicação deste texto, ela não respondeu nossos questionamentos.

O que podemos aprender com esta investigação: É comum que os desinformadores usem trechos de reportagens ou fatos verdadeiros, de forma descontextualizada, para imprimir veracidade a determinadas teorias ou afirmações. Ao se deparar com publicações desse tipo, principalmente aquelas que não identificam fontes de informação e misturam opinião com fatos, é importante consultar diferentes veículos de imprensa de sua confiança, além de buscar canais oficiais, como o site do governo federal, do Senado e os dados no portal do próprio banco.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Até o dia 13 de dezembro, o vídeo tinha mais de 140 mil visualizações, 5.275 compartilhamentos, 5.005 curtidas e 625 comentários.

Como verificamos: Em busca no Google pelos termos “Dilma empréstimo Brics” localizamos matérias publicadas na imprensa a respeito do tema, além de uma publicação do Governo Federal que detalha a finalidade do empréstimo. Também foram feitas buscas por “Oeste sem filtro + Constantino + Dilma empréstimo Brics”, sendo possível localizar o trecho da reportagem que aparece no conteúdo investigado.

No site do NDB encontramos uma relação com o histórico de todos os projetos do Brasil, divididos em: aprovados, em tramitação, cancelados ou concluídos. A lista reúne empréstimos desde 2018. Também procuramos a responsável pelo perfil que compartilhou o conteúdo apurado.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: O Comprova verificou um vídeo publicado no TikTok, que alegava que um suposto membro da Otan ameaçou “desmantelar o Brasil”, dividindo-o em cinco partes, se o país continuasse sendo aliado dos Brics, grupo de países formado atualmente por Brasil, Rússia, China, Índia e África do Sul. O conteúdo foi considerado enganoso. Já mostramos também serem enganosos posts afirmando que o Brasil fará empréstimo a Argentina.

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Investigado por: 2023-12-01

Brasil defende solução pacífica entre Venezuela e Guiana em disputa por região petrolífera

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O governo brasileiro não toma partido na atual tensão entre Venezuela e Guiana pelo controle do território de Essequibo, região com mais de 160 mil quilômetros, rica em recursos naturais e que está sob administração da Guiana. A posição oficial do Itamaraty é de busca por uma solução negociada e pacífica para o caso. O Ministério da Defesa enviou reforço de tropas do Exército Brasileiro a Roraima, na região da fronteira com os dois países. O objetivo, segundo o ministro José Múcio disse à TV Globo, é impedir que militares venezuelanos transitem pelo território brasileiro.

Conteúdo investigado: Vídeo no Instagram aborda tensão entre Venezuela e Guiana pelo domínio do território de Essequibo, administrado pela Guiana e onde foram descobertas ricas jazidas de petróleo em 2015. Ao afirmar que tropas do Exército Brasileiro se deslocaram para Roraima, na região da fronteira do Brasil com os dois países, o responsável pela gravação diz que, devido à proximidade do presidente brasileiro com o venezuelano, “a população fica na dúvida se este comboio seria para impedir a invasão venezuelana ou para apoiá-la”. Ele alega também que o episódio pode colocar em xeque a relação do Brasil com os Estados Unidos, já que uma empresa americana de petróleo atua na região.

Onde foi publicado: Instagram.

Contextualizando: Informações de que o Exército Brasileiro enviou reforço a Pacaraima (RR), na região da tríplice fronteira entre Brasil, Venezuela e Guiana, começaram a ganhar projeção nas redes sociais em novembro de 2023. Segundo publicação do jornal Folha de Boa Vista do dia 24, “moradores do município de Pacaraima divulgaram, nas últimas duas semanas, vídeos que registram uma movimentação anormal de tropas do Exército Brasileiro em direção à fronteira do Brasil com a Venezuela”.

Posteriormente, entre os dias 29 e 30, outros veículos começaram a publicar notícias sobre o reforço (Folha de S.Paulo, Estadão, TV Globo, Agência Brasil), que acontece em momento em que a Venezuela ameaça anexar a região de Essequibo, que corresponde a dois terços do território da Guiana, fica na fronteira entre os dois países e é rica em petróleo recursos naturais. A região é disputada entre Venezuela e Guiana desde 1841. A reivindicação do território pela Venezuela se intensificou a partir de 2015, quando foram descobertas jazidas de petróleo em Essequibo.

A controvérsia pela soberania da região remonta a 1811, quando a Venezuela tornou-se independente do domínio espanhol tendo a região de Essequibo como parte de seu território. Três anos depois, em um acordo com a Holanda, o Reino Unido assumiu o controle da área que corresponde à Guiana e, segundo denúncia da Venezuela em 1841, se apoderou do território. O impasse resultou, em 1899, em um tribunal internacional que decidiu que o território pertencia à então Guiana inglesa.

A Venezuela, porém, voltou a contestar o domínio da região de Essequibo e atualmente se apega a um acordo, firmado em Genebra, pouco antes da independência da Guiana, em 1966, que decidiu por uma solução negociada, mas que nunca saiu. A Guiana, por sua vez, reivindica a validade do acordo de 1899, não reconhecido pela Venezuela.

A escalada atual na tensão, além de motivar o reforço do Exército Brasileiro na fronteira, resultou no envio de chefes militares à Guiana pelo governo norte-americano para planejar a defesa do país. O Reino Unido também se manifestou pela ajuda militar à Guiana contra uma possível investida bélica da Venezuela.

Reforço militar é para impedir trânsito de tropas venezuelanas em território brasileiro

Segundo o G1, o ministro da Defesa, José Múcio Monteiro, afirmou à TV Globo, em 30 de novembro, que o envio de reforço do Exército Brasileiro a Pacaraima tem o objetivo de evitar qualquer trânsito de militares venezuelanos pelo território brasileiro. Ao Comprova, o Ministério da Defesa afirmou, em nota, que tem acompanhado a situação: “As ações de defesa têm sido intensificadas na região da fronteira ao Norte do país, promovendo maior presença militar”, informou a pasta.

Itamaraty busca solução pacífica para o caso

O vídeo que viralizou no Instagram sobre o assunto diz que, devido à proximidade de Lula com Nicolás Maduro, presidente venezuelano, não se sabe se o reforço do Exército Brasileiro na fronteira seria para impedir a invasão venezuelana da Guiana ou para apoiá-la. Segundo posicionamento do Ministério das Relações Exteriores, o Brasil é neutro no caso.

Em 30 de novembro, a embaixadora brasileira Gisela Padovan, secretária de América Latina e Caribe do Itamaraty, disse que o Brasil tem conversado com as duas partes em busca de uma solução negociada e pacífica para a questão. “O nosso interesse realmente é não ter nenhuma questão militar e bélica na nossa região. A gente prima pela paz e pela cooperação e todos os esforços brasileiros, nos mais diferentes âmbitos, são nesse sentido”, disse a embaixadora.

A embaixadora ressaltou que o caso está sendo avaliado pela Corte Internacional de Justiça da Organização das Nações Unidas (ONU), e que o governo brasileiro está acompanhando as resoluções do órgão sobre o caso. “O Brasil está acompanhando e mantendo um diálogo construtivo em busca de uma solução bilateral ou pela Corte, mas uma solução pacífica”, disse Gisela Padovan.

Em meio à tensão entre os dois países, Nicolás Maduro convocou um referendo para 3 de dezembro em que os venezuelanos terão que responder se apoiam a anexação de cerca de 75% do território da Guiana para a criação da chamada “Guiana Essequiba”.

Em 1º de novembro de 2023, a Corte Internacional de Justiça decidiu que a Venezuela não pode tentar anexar a região de Essequibo, na Guiana. Porém, o governo de Caracas diz que não reconhece o órgão e que o referendo está mantido. A Corte tem o papel de resolver disputas entre Estados, mas sua atuação é mais simbólica do que prática, já que o tribunal não pode obrigar países a cumprirem suas decisões.

Como o conteúdo pode ser interpretado fora do contexto original: Da forma como foi veiculado, o vídeo e o comentário do autor dão margem à interpretação de que o envio de tropas do Exército Brasileiro para Roraima teria o objetivo de apoiar o governo venezuelano em uma possível invasão à Guiana.

O que diz o responsável pela publicação: O Comprova fez contato com o responsável pela conta que postou o vídeo. Ele alegou propósito informativo. Porém, quando perguntado sobre a origem da informação, critério e contexto da publicação em seu perfil no Instagram, não respondeu.

Alcance da publicação: Até o dia 1º de dezembro, o vídeo que motivou esta verificação tinha 1,7 milhão de visualizações, 159.413 mil curtidas no Instagram, 22,6 mil envios, além de 1,7 mil comentários.

Como verificamos: O Comprova buscou notícias na imprensa sobre o conflito entre Venezuela e Guiana pelo domínio de Essequibo e fez contato com o Ministério da Defesa e o Ministério das Relações Exteriores para entender a posição do Brasil na disputa e o envio de tropas do Exército para a região da tríplice fronteira. O Comprova também identificou um padre que atua há 11 anos em Pacaraima para buscar informações sobre o clima na região e fez contato com o responsável pelo vídeo que deu origem a esta verificação.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: Outros conteúdos que viralizaram recentemente nas redes sociais motivaram a criação dos seguintes textos explicativos pelo Comprova: Divulgação de salários por empresas visa igualdade de gênero e não prevê exposição de dados pessoais; Desmatamento na Amazônia cai, mas queimadas crescem; e Lei que institui pau de arara como manifestação cultural não permite retorno do uso dos veículos.

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Investigado por: 2023-11-29

Divulgação de salários por empresas visa igualdade de gênero e não prevê exposição de dados pessoais

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Decreto do governo federal que regulamenta Lei da Igualdade Salarial estabelece que empresas com mais de 100 empregados deverão divulgar relatórios constando o cargo de seus trabalhadores e trabalhadoras e os valores de suas remunerações. A intenção é verificar se a legislação está sendo cumprida. Caso constatada desigualdade salarial entre homens e mulheres, a empresa será notificada e terá que elaborar um plano para mitigação do problema.

Conteúdo investigado: Publicações afirmam: “de acordo com um decreto do Governo Federal, as empresas estão agora obrigadas a divulgar os salários de seus colaboradores”. Nas postagens, não fica claro se os nomes das pessoas também serão divulgados junto com os valores nem qual é o motivo da política governamental.

Onde foi publicado: X (antigo Twitter) e Telegram.

Contextualizando: A partir de 2024, empresas com mais de 100 empregados terão que divulgar o Relatório de Transparência Salarial e de Critérios Remuneratórios, que deverá conter cargo ou ocupação das trabalhadoras e dos trabalhadores e os valores de todas as remunerações. A publicação deve trazer as informações com os dados pessoais anonimizados, ou seja, sem identificação.

A medida está prevista no Decreto nº 11.795, publicado no Diário Oficial da União (DOU) do dia 23 de novembro, regulamentando a Lei nº 14.611, de julho deste ano. A lei estabeleceu a obrigatoriedade de igualdade salarial entre mulheres e homens para a realização de trabalho de igual valor ou no exercício da mesma função, enquanto o decreto trata dos mecanismos a serem utilizados para garantir e fiscalizar isso.

Os relatórios deverão ser divulgados a cada seis meses, sempre nos meses de março e setembro, e devem conter os valores relativos ao salário contratual; 13° salário; gratificações; comissões; horas extras; adicionais noturno, de insalubridade, de penosidade, de periculosidade, entre outros; terço de férias; aviso prévio trabalhado; descanso semanal remunerado; gorjetas; e outras remunerações previstas em norma coletiva de trabalho.

Outras informações que deverão constar nos relatórios ainda serão estabelecidas pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), bem como o formato e procedimento de envio, que deverá ser por meio de ferramenta informatizada. Além do envio ao MTE, os relatórios deverão ser disponibilizados ao público na internet.

Caso seja constatado que há desigualdade salarial entre homens e mulheres, funcionários da mesma empresa, ela será notificada pelo MTE e a empresa terá 90 dias para elaborar um Plano de Ação para Mitigação da Desigualdade Salarial e de Critérios Remuneratórios entre Homens e Mulheres. Estes planos deverão conter as medidas a serem adotadas, bem como a implementação de ações de promoção da diversidade e inclusão no ambiente de trabalho.

Como o conteúdo pode ser interpretado fora do contexto original: Sem o contexto, o usuário que se depara com a publicação não tem como compreender do que se trata o decreto em questão e por qual motivo as empresas são obrigadas a divulgar os salários dos colaboradores. A afirmação isolada pode até gerar interpretações equivocadas sobre vazamento de dados pessoais e invasão de privacidade.

O que diz o responsável pela publicação: Foi enviada mensagem direta para o autor da publicação via X . O perfil em questão enviou como resposta links de matérias que anunciam o decreto publicado pelo governo federal. A página, que se classifica como portal de “notícias, comédia, paródia, ironia e sátira”, já compartilhou outros conteúdos alvos de investigação do Comprova.

O que podemos aprender com esta verificação: Usuários das redes sociais devem estar atentos a informações incompletas que circulam online. No caso da publicação em questão, não havia contexto suficiente para entender do que se tratava o decreto, o que dá margem para interpretações equivocadas, como por exemplo, a compreensão errônea de que os dados pessoais dos trabalhadores e trabalhadoras seriam expostos, sem respeito à Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais.

Alcance da publicação: No X, a publicação teve 26,8 mil visualizações, 23 comentários, 37 republicações e 329 curtidas até 29 de novembro. No Telegram, foram 8,3 mil visualizações até a mesma data.

Como verificamos: No Google, fizemos uma busca pela frase: “empresas estão agora obrigadas a divulgar os salários de seus colaboradores”. Como resultado da pesquisa, apareceu uma matéria da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), portal de notícias governamental, anunciando a publicação do decreto que regulamenta a lei da igualdade salarial. A partir disso, analisamos as informações incluídas no Decreto nº 11.795 e na Lei nº 14.611, sancionada em julho deste ano.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: O Comprova já realizou outras checagens sobre o tema de regulamentação de empresas privadas. Em junho deste ano, mostramos que tarifação em Pix para empresas é facultativa e existe desde 2020. Anteriormente, também mostramos que é falso que PT tenha projeto de expropriar empresas privadas.