O Projeto Comprova é uma iniciativa colaborativa e sem fins lucrativos liderada pela Abraji e que reúne jornalistas de 41 veículos de comunicação brasileiros para descobrir, investigar e desmascarar conteúdos suspeitos sobre políticas públicas, eleições, saúde e mudanças climáticas que foram compartilhadas nas redes sociais ou por aplicativos de mensagens.
Filtro:

Saúde

Investigado por: 2021-10-07

Número de pessoas infartadas em Israel não cresceu após vacina

  • Enganoso
Enganoso
É enganoso que motos e desfibriladores estejam sendo empregados em Israel porque pessoas estão infartando após serem vacinadas contra a covid. Os equipamentos pertencem ao serviço nacional de emergência e já eram utilizados em socorros antes da pandemia e da imunização. Além disso, o Ministério da Saúde do país negou aumento de ocorrências coronárias.
  • Conteúdo verificado: Vídeo no YouTube em que apresentadora e estilista conversam sobre a pandemia em Israel. Eles dizem que está havendo grande quantidade de infartos entre pessoas vacinadas contra a covid-19.

Motos e desfibriladores não estão sendo empregados em Israel para socorrer pessoas que estariam infartando “como moscas” após terem sido vacinadas contra a covid-19. A afirmação foi feita de forma enganosa em uma live da qual participam uma apresentadora e um estilista brasileiro que mora em Tel Aviv.

Procurado pelo Comprova, o Ministério da Saúde do país negou aumento de ocorrências coronárias, incluindo infarto. Além disso, os dois equipamentos citados no vídeo já eram utilizados pelo serviço nacional de atendimento a emergências e desastres antes da pandemia e da vacinação.

O Comprova procurou a dona do canal em que foi realizada a live, mas ela não respondeu até a publicação da verificação.

O conteúdo foi considerado enganoso porque usa dados imprecisos.

Como verificamos?

O Comprova assistiu à live, seguindo solicitação de um leitor que enviou o conteúdo por WhatsApp.

A partir do vídeo, capturou duas imagens – da moto e do desfibrilador – utilizando uma extensão para o navegador Chrome chamada Awesome Screenshot. A partir disso, foi utilizada a ferramenta TinEye para buscar imagens semelhantes publicadas na internet com auxílio de diversos buscadores, como o Google e outros.

Identificou que as imagens são de equipamentos pertencentes ao Magen David Adom (MDA), o serviço nacional de atendimento a emergências médicas e desastres de Israel. A reportagem encaminhou um e-mail, que não foi respondido.

Também foi contactado o Ministério da Saúde do país e realizada pesquisa a respeito de eventual relação causal entre as vacinas contra a covid-19. A reportagem também analisou os alertas sobre risco de miocardite e pericardite pós-vacinação com imunizantes com RNA mensageiro, como o da Pfizer.

Em seguida, foi realizado o levantamento de dados relacionados à vacinação e contaminação em Israel e, ainda, pesquisado quem são as duas pessoas que aparecem no vídeo. O Comprova procurou, por fim, a autora do perfil em que a entrevista foi publicada.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 7 de outubro de 2021.

Verificação

Motos e desfibriladores já eram usados antes da vacinação

Na live realizada no dia 29 de setembro, a apresentadora Karina Michelin e o estilista Mauricio Pollacsek, que mora em Tel Aviv, estão falando sobre a vacinação em Israel, embora utilizem eufemismos para se referirem ao assunto, como as palavras “agulhinha” e “benção”.

A partir de dezesseis minutos e oito segundos, ela afirma que, recentemente, motos começaram a rodar em Israel e desfibriladores foram espalhados por toda a cidade, pedindo para ele comentar o assunto.

Enquanto são apresentadas fotos dos equipamentos, o estilista afirma que a função da moto é apenas socorrer infartados e que estes “estão por todo lado”. Sem apresentar fontes, o estilista diz que estas pessoas possuem entre 18 e 30 anos e estão “infartando assim, como moscas”, acrescentando que 100% destes casos são de pessoas vacinadas.

O Comprova identificou postagens comprovando que as motocicletas já eram utilizadas antes de 2020, ou seja, quando não existia pandemia. No país, empresas interessadas em operar motocicletas de primeiros socorros precisam obter uma licença de operação do Ministério da Saúde.

Tanto a moto quanto o desfibrilador mostrados em fotos pertencem ao Magen David Adom , o serviço nacional de atendimento a emergências médicas e desastres de Israel, idealizado em 1915 e reconhecido por lei desde a fundação do estado.

Dentre os veículos que compõem a frota do MDA estão listadas as motos de suporte avançado de vida, cuja principal característica é o bom tempo de resposta no atendimento, principalmente em casos de obstrução respiratória, hemorragia maciça ou arritmias letais.

“O curto tempo de resposta para iniciar o tratamento médico avançado permite utilizar os recursos da Organização de maneira mais eficaz, chegar ao paciente imediatamente e fornecer ao paciente o tratamento servido por um paramédico experiente”, informa o site da empresa.

Há, ainda, a motocicleta de suporte de vida que permanece de plantão, sendo operada por um funcionário ou voluntário para acesso rápido às ocorrências principalmente em congestionamentos urbanos.

No site em hebraico da organização, é descrito que o serviço conta com cerca de 600 motocicletas que chegam ao local de ocorrência em 1 a 4 minutos, com equipamento médico adequado para a realização de operações que salvam vidas até a chegada da ambulância.

Sobre o desfibrilador, o estilista entrevistado diz que os equipamentos estão sendo instalados em “todo lugar”.

De fato, em Israel, o uso de equipamentos para reanimar vítimas de ataques cardíacos é aprovado pelo Ministério da Saúde e as máquinas estão espalhadas por parques, bairros, sinagogas e ruas. O aparelho não necessita de conhecimento médico para ser utilizado e pessoas comuns conseguem manusear, pois ao ser acionado ele mesmo fornece instruções para guiar o usuário.

Ao mesmo tempo, uma equipe do call center 101 — específico do MDA — recebe um chamado automático do equipamento e fica em contato com quem está manuseando o aparelho até que as equipes médicas cheguem ao local. O Comprova identificou que os desfibriladores já eram instalados no país antes da vacinação, como mostra este post, de julho de 2020, que comemora a inauguração de um novo posto para desfibrilador inteligente na cidade de Tiberíades.

Vacina e coração

O Ministério da Saúde de Israel informou não haver aumento da síndrome coronariana, que inclui ataques cardíacos, em adultos jovens.

Em junho, o Ministério da Saúde informou ter nomeado uma equipe epidemiológica para investigar a possível ligação entre casos de miocardite e a vacina. Conforme a publicação, entre dezembro de 2020 e maio de 2021, foram notificados 275 casos de miocardite e, destes, 148 ocorreram na época da vacinação.

As equipes concluíram haver alguma probabilidade de ligação entre a segunda dose e o aparecimento do problema entre homens jovens de 16 a 30 anos. Esta ligação foi considerada mais forte entre o grupo de idade mais jovem, de 16 a 19. Na maioria dos casos, a miocardite assumiu a forma de doença leve que passou em poucos dias.

Em maio, o Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) norte-americano também citou casos de miocardite relatados ao Sistema de Notificação de Eventos Adversos de Vacinas, relacionados aos imunizantes de RNA mensageiro.

Em setembro, informou que continua monitorando ativamente relatos de miocardite e pericardite após a vacinação, o que inclui a revisão de dados e registros médicos e a avaliação da relação com a vacinação. Os casos incluem principalmente adolescentes e adultos jovens do sexo masculino.

A miocardite é a inflamação do músculo cardíaco e a pericardite é a inflamação do revestimento externo do coração. Em ambos os casos, o sistema imunológico causa uma inflamação em resposta a uma infecção ou algum outro fator. Os sintomas podem incluir dor no peito, falta de ar ou palpitações.

O CDC continua a recomendar que todas as pessoas com 12 anos ou mais sejam vacinadas, defendendo que os riscos conhecidos da doença e suas complicações, possivelmente graves, como problemas de saúde de longo prazo, hospitalização e até morte, superam em muito os riscos potenciais de ter uma rara reação adversa à vacinação, incluindo o eventual risco de miocardite ou pericardite.

No Brasil, onde a Pfizer está registrada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária para uso por meio do Programa Nacional de Imunizações (PNI), do Ministério da Saúde, o órgão emitiu em julho um alerta sobre risco de miocardite e pericardite pós-vacinação, com base nos casos dos Estados Unidos. Os alertas sobre potenciais ocorrências dos dois problemas foram incluídos na bula do imunizante.

Até o momento, a Anvisa não relatou casos dessas complicações no Brasil. A agência brasileira esclareceu, na ocasião do alerta, que o risco de ocorrência desses eventos adversos é baixo, mas recomendou aos profissionais de saúde que fiquem atentos e perguntem às pessoas que apresentarem sintomas se elas foram vacinadas, especialmente com a vacina da Pfizer.

Vacinação em Israel

Israel tem hoje mais de 60% da população com idade acima dos 50 anos imunizada com três doses contra a covid. Mais de 80% acima dos 30 anos foi vacinada com a segunda e mais de 70% daqueles acima dos 16 anos com a primeira.

| Índice de vacinados com a primeira, a segunda e a terceira dose em Israel no dia 06/10/2021, quando a captura foi realizada pelo Comprova. Fonte. 

No momento, o país atua para conter a quarta onda de contaminação, com a média diária caindo cerca de 54% nas últimas duas semanas e o número de casos graves entre os hospitalizados diminuindo. Conforme a imprensa local, a covid está se tornando, em Israel, uma pandemia de não vacinados.

No último dia 3, foram introduzidas novas regras para determinar o status de vacinação contra o coronavírus, tornando a injeção de reforço – terceira dose – uma exigência para inoculação completa e para passaportes de vacinação.

Para serem consideradas totalmente vacinadas no país, as pessoas devem atender a um dos seguintes critérios: ter 12 anos ou mais e ter recebido uma injeção de reforço há pelo menos uma semana; estar dentro de seis meses após ter recebido uma segunda injeção de vacinação; ou estar dentro de seis meses após ter testado positivo para covid-19.

Conforme a plataforma que apresenta os dados relacionados à pandemia em Israel, em números absolutos, as pessoas vacinadas com a segunda dose na faixa etária dos 20 e 49 anos são maioria das internadas no país, o que é natural quando a maior parte desta população está imunizada com pelo menos duas doses.

Quando essa análise é feita comparando-se o índice de internados para cada 100 mil habitantes, o número de pacientes não imunizados supera em muito os internados que receberam duas ou três doses de vacina.

 

No cenário onde são analisados os pacientes graves, estes são majoritariamente não vacinados, como demonstra o gráfico a seguir:

Desta forma, é possível analisar que as pessoas imunizadas com duas ou três doses estão desenvolvendo formas leves da covid-19.

Dados do Ministério da Saúde apontam que após as doses de reforço, os idosos israelenses totalmente inoculados têm uma chance em cinquenta de morte por covid em comparação com pessoas não vacinadas na mesma faixa etária.

Nos últimos sete dias de setembro, por exemplo, houve 6,43 mortes diárias por cada 100 mil israelenses com mais de 60 anos. Para os idosos que foram vacinados três vezes, esta média caiu para 0,13. Já a mortalidade diária para os idosos duplamente vacinados foi de 1,5.

A live e os autores

A live foi realizada no canal de Karina Michelin, que afirma ser apresentadora, jornalista e atriz. Sobre a página no YouTube, ela afirma ter como objetivo “evoluir a espécie humana neste mundo contemporâneo, completamente focado na arte do Pensamento Livre”.

Essa é a quarta vez que vídeos de Karina são verificados pelo Comprova. Em uma delas, concluiu-se ter sido apresentado um índice de forma equivocada e que errou ao dizer que pesquisadores da Organização Mundial da Saúde (OMS) não têm citações acadêmicas.

Em outra, o Comprova identificou não haver nenhuma evidência de que vacinas contra a covid-19 possam modificar a composição genética das pessoas. Uma terceira concluiu serem falsas alegações sobre validade de testes e notificações erradas nos EUA.

No vídeo aqui verificado, ela entrevista o estilista Mauricio Pollacsek, que se mudou para Tel Aviv há mais de 10 anos e no Brasil foi criador da marca Moshe. O Anuário Brasil-Israel 2014, produzido pela Câmara Brasil Israel de Comércio e Indústria, traz uma reportagem sobre o estilista paulistano.

Conforme a publicação, ele se formou na Universidade da Filadélfia e trabalhou em diversas empresas do setor nos Estados Unidos, no Brasil e em Israel como designer e ilustrador de moda, além de dar aulas na Academia de Design e Educação Wizo, em Haifa.

Apesar de nem Karina, nem Pollacsek serem especialistas em saúde, o tema da entrevista gira apenas em torno da pandemia e, além da afirmação enganosa sobre as motos e os desfibriladores, gera outras desinformações. Sem apresentar fontes e dados, por exemplo, o estilista afirma que 90% das pessoas internadas foram vacinadas e defende o tratamento com medicamentos sem comprovação científica para uso contra a covid.

Os dois comparam, ainda, a emissão de passaporte de vacinação e a proibição do acesso de não vacinados em determinados ambientes com o holocausto e o apartheid.

Por que investigamos?

Em sua quarta fase, o Comprova verifica conteúdos suspeitos sobre pandemia, políticas públicas do governo federal e eleições. A publicação aqui verificada foi sugerida por um leitor via WhatsApp e teve mais de 24 mil visualizações no YouTube desde a publicação, em 29 de setembro.

Conteúdos que desacreditam as vacinas ou minimizam os riscos da pandemia são perigosos porque podem levar a população a colocar a saúde em risco.

O vídeo possui mais de 480 comentários e muitos deles demonstram descrença na eficácia das vacinas. Uma usuária acredita ter “algo muito sério por trás dessas vacinas” e questiona “por que tanta pressão para obrigar as pessoas a serem ratos de laboratório?”. Já outra afirma ter “medo da minha filha morrer por causa dessa vacina maldita…”

Em relação à Pfizer, o Comprova já demonstrou que morte de adolescente não tem relação causal com a vacina; que um boato tirou de contexto estudo com adolescentes nos EUA para atacar o imunizante; que uma mensagem tirava de contexto dados sobre sintomas adversos da marca.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; ou ainda aquele que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar danos.

Saúde

Investigado por: 2021-10-06

Recomendação de anticoagulantes feita pela OMS não está ligada a ‘tratamento precoce’

  • Enganoso
Enganoso
É enganosa montagem no Instagram que associa o título de reportagem da CNN Brasil sobre recomendação de anticoagulantes no tratamento da covid-19 feita pela OMS a um tuíte da deputada Janaina Paschoal, afirmando que o órgão estaria atrasado em relação aos tratamentos usados no Brasil. Como mostram os comentários, o post leva à interpretação de que o "tratamento precoce" funciona, mas ele não tem eficácia comprovada contra a doença.
  • Conteúdo verificado: Publicação no Instagram usa montagem com título de reportagem da CNN Brasil sobre tratamento contra o coronavírus com anticoagulantes recomendado pela OMS e tuíte da deputada estadual Janaina Paschoal.

É enganosa a publicação que viralizou no Instagram relacionando uma reportagem de janeiro deste ano da CNN Brasil com o título “OMS recomenda anticoagulantes em baixa dosagem para pacientes com covid-19” e um tuíte da deputada estadual Janaina Paschoal (PSL-SP). No post, ela dizia que o órgão estaria atrasado em relação ao Brasil, que, segundo Janaina, já fazia “tudo isso” desde o início da pandemia, em março de 2020.

Como mostram os comentários, a relação leva à interpretação errada de que a Organização Mundial da Saúde (OMS) referendou, mesmo que tardiamente, o uso de medicamentos sem eficácia comprovada contra a covid-19 defendidos pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido).

A recomendação, como é possível conferir no site do órgão, cita apenas anticoagulantes e é indicada exclusivamente a pacientes hospitalizados para prevenir a formação de coágulos sanguíneos (trombose).

Ao Comprova, a entidade afirmou: “Tendo em vista que algumas pessoas no Brasil se referem a ‘tratamento precoce’ como algo relacionado ao uso de medicamentos sem comprovação de eficácia contra a covid-19, a OMS e a OPAS (Organização Pan-Americana da Saúde, braço da entidade para as Américas) esclarecem que não recomendam” tais remédios em caso da doença.

O Comprova considerou o conteúdo enganoso porque ele retira informações do contexto original e usa dados que induzem a uma interpretação diferente da verdadeira.

A reportagem tentou entrar em contato com perfis que compartilharam a publicação, inclusive com a página @deputadopaulomartins – no post verificado aqui, aparece um selo com o nome do político, que publicou o mesmo conteúdo em 27 de janeiro, época do anúncio da recomendação da OMS. Nem ele, nem Janaina nem o perfil @direita_de_goias, que replicou a publicação agora, respondeu até a conclusão desta verificação.

Como verificamos?

Primeiramente, via TweetDeck, a reportagem buscou o tuíte da deputada usado no post verificado aqui e constatou que ela realmente o postou, em 26 de janeiro deste ano. No tuíte, inclusive, ela dá link para a reportagem da CNN.

Ainda pelo Tweetdeck, foi possível verificar que Janaina já havia mencionado tratamento contra a covid com vários medicamentos, como anticoagulantes e vermífugos, em 13 de janeiro.

O próximo passo foi verificar se a reportagem indicada na montagem havia sido publicada. Buscando no Google, encontramos o link da matéria, publicada no dia 26 de janeiro de 2021, mesmo dia em que a deputada fez o comentário no Twitter.

Em seguida, pesquisamos nos canais oficiais da OMS e verificamos que a entidade realmente recomendou o uso de anticoagulantes.

A partir dessas informações, atuamos em duas frentes. Além de entrar em contato, por e-mail, com a OMS, buscamos os canais oficiais do Ministério da Saúde para apurar quais medicamentos fazem parte do chamado “tratamento precoce”.

Também tentamos, via Instagram e e-mail, contatar o perfil que publicou o post verificado aqui (@direita_de_goias) e os autores de páginas que publicaram o mesmo conteúdo em janeiro, quando a reportagem da CNN foi publicada (@deputadopaulomartins e @JanainaDoBrasil) – não houve retorno até a publicação deste texto.

Por último, consultamos a professora e pesquisadora da Universidade de São Paulo (USP) Elnara Negri, que lidera um estudo observacional ainda não revisado por pares da comunidade científica sobre o uso do anticoagulante heparina em pacientes com covid-19.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 6 de outubro de 2021.

Verificação

OMS e anticoagulantes

A OMS, de fato, recomendou em 25 de janeiro de 2021 o uso de coagulantes em baixa dosagem para pacientes infectados pelo Sars-Cov-2.

A publicação foi divulgada originalmente em 27 de maio de 2020, sob o título “Clinical management of Covid-19: interim guidance, 27 May 2020” (em português, “Manejo clínico da Covid-19: orientação provisória, 27 de maio de 2020”), mas, nessa versão, não havia menção ao uso de anticoagulantes.

Posteriormente, em 25 de janeiro de 2021, o documento foi atualizado “para refletir as novas evidências científicas”, sob o título, em português, “Manejo clínico da Covid-19: orientação dinâmica e contínua”. Como informou a OMS à reportagem, “essas diretrizes são atualizadas regularmente, à medida que mais dados se tornam disponíveis”.

Na versão de janeiro, a diretriz é: “Para pacientes hospitalizados, a OMS sugere o uso de baixas doses de anticoagulantes para prevenir a formação de coágulos sanguíneos (trombose)”.

De acordo com a pesquisadora Elnara Negri, os pacientes que desenvolvem formas mais graves da covid podem apresentar “piora clínica, com febre e queda da oxigenação” e evoluir para uma condição chamada coagulopatia trombótica. “Nesses pacientes, o vírus consegue atingir a circulação pulmonar e sistêmica, levando ao aparecimento de tromboses dos capilares pulmonares, de outros órgãos e também de vasos maiores”, diz ela.

É nesses casos que o anticoagulante é indicado. “O remédio vai frear a inflamação e hipercoagulação e o tratamento só pode ser feito sob supervisão médica, pois há risco de sangramento com a automedicação”, afirma a especialista. “Automedicação, nesta doença, é extremamente perigosa. Há riscos graves à saúde, inclusive, risco de vida.”

Negri destaca que o anticoagulante “não é capaz de prevenir que o paciente desenvolva a forma grave” e ressalta que “contra a covid-19, a melhor prevenção é a vacina.”

Tuíte e o tratamento

Diferentemente do que afirma Janaina em seu tuíte, a OMS não referenda “tudo” o que se fazia no Brasil desde março de 2020. A fala da parlamentar, como fica claro nos comentários do post verificado aqui, incentivou seguidores a defender o “tratamento precoce”.

Tal opção – que, novamente, não tem eficácia comprovada –inclui medicamentos como ivermectina, nitazoxanida, cloroquina, zinco, remdesivir e azitromicina. O “tratamento precoce” é defendido por Bolsonaro desde o início da pandemia e era citado no site do Ministério da Saúde, mas o conteúdo sobre ele foi apagado da página por volta de 18 de janeiro de 2020, segundo reportagem da Folha.

Além disso, nenhum dos remédios que compõem o “tratamento precoce” é anticoagulante e, como informou a OMS ao Comprova, o órgão não recomenda nenhum desses produtos, o que reforça a desinformação no post verificado aqui.

Por que investigamos?

Em sua quarta fase, o Comprova verifica conteúdos suspeitos sobre pandemia, políticas públicas do governo federal e eleições. A publicação verificada teve quase 6 mil curtidas no Instagram até 6 de outubro.

Quando os conteúdos envolvem medicamentos ou tratamentos contra o novo coronavírus, sua checagem se torna ainda mais necessária, porque informações incorretas podem levar as pessoas a colocarem sua saúde em risco.

Comentários como “Minha família toda usou os remédios que eles falam que não são eficazes. Dezesseis pessoas da família estão curadas graças a Deus e ao kit proibido pela CPI do Circo” e “isso é rir dos que morreram sem ter a chance de lutar de alguma e qualquer forma para que a vida prevalecesse”, sugerem que a OMS está errada e que o tratamento sem eficácia comprovada é eficaz.

Outros conteúdos sobre o assunto já foram verificados pelo Comprova, como os que enganavam ao afirmar que estudo com hidroxicloroquina comprovava a eficácia do “tratamento precoce” e que a OMS teria se desculpado por reviravoltas com o medicamento.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; ou ainda aquele que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Saúde

Investigado por: 2021-10-05

Segunda dose da Pfizer não reduz imunidade em quem já teve covid, ao contrário do que diz médica em post

  • Enganoso
Enganoso
Post engana ao afirmar que a segunda dose da vacina da Pfizer reduz a imunidade. Na verdade, o estudo mencionado sugere que, para os infectados pelo coronavírus, apenas uma dose do imunizante é suficiente para garantir a proteção. E recomenda duas doses para quem não pegou covid-19. No entanto, a Pfizer explica, na bula do imunizante, que o esquema vacinal só fica completo com as duas doses. A farmacêutica diz ainda que “você pode ser vacinado se estiver apresentando febre baixa ou quadro leve de infecção” por covid-19, contrariando o que afirma a postagem da médica.
  • Conteúdo verificado: Postagem de médica no Instagram que menciona um estudo que propõe apenas uma dose da Pfizer para quem já teve covid, e duas para quem não contraiu a doença. A médica diz também que o imunizante contra o coronavírus prejudica a resposta celular de pacientes que já contraíram a doença.

É enganosa uma publicação que sugere que a aplicação da segunda dose da vacina da Pfizer reduz a imunidade de pessoas que já testaram positivo para a covid-19.

O estudo citado no post verificado pelo Comprova, no entanto, somente sugere a aplicação de uma dose da vacina, em vez de duas, para indivíduos que já se contaminaram com a doença. Isso porque, segundo a pesquisa, o grupo já havia desenvolvido parte da imunidade ao contrair o vírus. A fabricante Pfizer e a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), no entanto, não adotaram mudanças no esquema vacinal e continuam recomendando duas doses da vacina mesmo para quem já teve covid.

A pesquisa, em nenhum momento, afirma que há riscos para a imunidade de quem recebe a segunda dose, tampouco sugere a suspensão do uso de imunizantes, como cita a publicação. Por esse motivo, a reportagem considera como enganosa a publicação compartilhada pela médica Helen Brandão no Instagram.

A reportagem tentou contato com a médica, mas ela não respondeu.

Como verificamos?

Inicialmente, o Comprova buscou no Google o nome do artigo publicado no perfil da autora verificada.

Após encontrar o artigo citado na postagem do Instagram, contatou Anamelia Bocca, professora titular de Imunologia da Universidade de Brasília (UnB), para analisar o estudo.

A reportagem também buscou os dados profissionais de Helen Brandão, autora do post, no LinkedIn, no currículo acadêmico Lattes e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Por fim, enviou mensagem pelo Instagram da médica e por um contato de WhatsApp disponibilizado no perfil da rede social – em ambas tentativas, não houve retorno.

Também contactamos a Pfizer e a Anvisa para questionar se estavam mantidas as orientações para duas doses do imunizante. A farmacêutica manteve as orientações da bula, mesma informação repassada ao Comprova pela Anvisa.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 4 de outubro de 2021.

Verificação

O que diz o artigo

O primeiro link que aparece no Google a respeito do estudo citado pela médica faz o redirecionamento para a National Library of Medicine (Biblioteca Nacional de Medicina), página que reúne artigos sobre biotecnologia dos Estados Unidos.

O artigo citado no post também foi publicado pelo periódico científico Cell Reports, que é revisado por pares antes da publicação dos estudos.

O levantamento sugere que apenas uma dose da vacina da Pfizer contra a covid-19 é suficiente para imunizar pessoas que já tiveram a doença, divergindo do que foi compartilhado pela médica Helen Brandão no Instagram. Os pesquisadores afirmam que, 20 dias após a aplicação da primeira dose, a resposta imune de indivíduos que não tiveram covid começa a cair.

Já aqueles que tiveram a doença conseguem manter a imunidade mesmo após este período, o que sugere que pessoas que já tiveram covid têm uma resposta imune antes mesmo da primeira dose, necessitando apenas de uma dose da Pfizer.

Segundo o post da médica, a pesquisa demonstraria que a segunda dose do imunizante “prejudica a resposta celular de pacientes recuperados”. O levantamento traz, no entanto, constatações em outra linha de raciocínio: a de que a vacina é, sim, importante, mas em vez de duas doses da Pfizer, uma dose única seria o suficiente para pessoas já recuperadas de covid-19.

Isso é verdade?

Após ler o artigo e a publicação da médica goiana, o Comprova compartilhou os dois conteúdos com a professora titular de Imunologia da Universidade de Brasília (UnB), Anamelia Bocca e questionou se a segunda dose da Pfizer poderia prejudicar a resposta celular de pacientes recuperados. “Os autores não dizem isto em momento algum”, resumiu.

Em dois áudios, Anamelia Boca explicou o seguinte: os pesquisadores constataram não ter havido melhora nos níveis de IgG (anticorpo) nem de IL-2; e que houve uma queda muito pequena de interferon gama entre os que já tiveram covid. “Os autores não atribuem isso à redução da resposta imune provocada pela vacina. Eles concluem que pode haver uma mudança no esquema vacinal de recuperados da covid e de pessoas que não pegaram a doença. Porque, quem teve, com apenas uma dose de vacina, vai ter o mesmo nível de resposta imunológica que os indivíduos que não se infectaram com o novo coronavírus e receberam duas doses do imunizante”.

A Pfizer explica, na bula do imunizante, que o esquema vacinal só fica completo com as duas doses. A farmacêutica não descarta a vacinação para os que foram diagnosticados com a covid-19 e sugere apenas que, em casos agudos da doença, o paciente converse com médicos para saber o que fazer. Mas que, em casos de febre baixa ou quadro leve de infecção é possível, sim, ser imunizado com a Pfizer.

Segundo a fabricante, o medicamento não deve ser administrado apenas em casos que pessoas tenham apresentado reação alérgica aos componentes da vacina, citados na bula. Em nota ao Comprova, a Pfizer reforçou que não há estudos em andamento conduzidos pela empresa para a aplicação de apenas uma dose da vacina em pessoas que já foram contaminadas.

Apesar de o estudo publicado na National Library of Medicine sugerir apenas uma dose para quem já teve covid-19, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) informou não ter havido mudanças no esquema de imunização aprovado na bula da Comirnaty, a vacina da Pfizer. “A bula da vacina continua indicando a aplicação de duas doses com intervalo de três semanas”. E acrescentou: “Recentemente a Anvisa recebeu o pedido da Pfizer para inclusão de uma dose de reforço na bula. Este pedido ainda está em análise pela Anvisa.”

Sobre o pedido, a farmacêutica informou ao Comprova que “iniciaram em julho estudo que avalia uma terceira dose, ou dose de reforço, da vacina Comirnaty contra a covid-19 com voluntários dos Estados Unidos, África do Sul e Brasil”. De acordo com os dados iniciais do estudos, uma dose de reforço administrada pelo menos seis meses após a conclusão da série de vacinação primária é capaz de aumentar a taxa de anticorpos contra covid-19 incluindo boa resposta às variantes.

A médica

Helen Brandão divulga em suas redes que tem pós-graduação em Dermatologia e Medicina Estética. Brandão também diz ter residência médica em Saúde da Família e Comunidade pela Prefeitura do Rio de Janeiro.

A reportagem buscou os dados profissionais sobre a médica no LinkedIn, no currículo acadêmico Lattes, do CNPq e no Instagram. O Comprova também verificou que Brandão possui registro no CREMEGO (Conselho Regional de Medicina do Estado de Goiás).

Um link que redireciona para o número de WhatsApp da clínica dela foi encontrado no perfil das redes sociais e, por meio dele, fizemos contato. Até a publicação do texto, não houve retorno.

Embora o conteúdo verificado tenha sido uma republicação de outro perfil, é possível encontrar diversas publicações que abordam a vacinação e reações das vacinas contra a covid-19 no perfil da médica Helen Brandão.

As publicações do perfil também questionam as segundas doses dos imunizantes, mesmo que já exista a comprovação da eficácia e importância de completar o esquema vacinal.

Recentemente a médica Helen Brandão foi mencionada durante depoimento do empresário Luciano Hang na CPI da Covid. Na ocasião, Helen aparece em vídeo sendo entrevistada pelo empresário para participar do lançamento do aplicativo TrateCov, desenvolvido pelo Ministério da Saúde.

Por que investigamos?

Em sua quarta fase, o Comprova verifica conteúdos suspeitos sobre pandemia, políticas públicas do governo federal e eleições. A publicação verificada teve quase 2 mil curtidas e mais de 150 comentários no Instagram.

Conteúdos que desacreditam as vacinas ou minimizam os riscos da pandemia são perigosos porque podem levar a população a colocar a saúde em risco.

Em uma checagem anterior, o Comprova havia constatado que a médica Helen Brandão citava de forma enganosa estudos não conclusivos sobre a existência de uma conspiração da indústria farmacêutica contra a cloroquina, medicamento comprovadamente ineficaz contra a covid-19.

O Comprova também já verificou que as segundas doses servem de reforço e são comuns em programas de vacinação, bem como desmentiu que pessoas que são contaminadas após a vacinação diminuem a eficácia da vacina, ao contrário das publicações feitas no perfil da médica Helen Brandão.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; ou ainda aquele que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Saúde

Investigado por: 2021-10-01

Post engana ao comparar presidente austríaco que comeu na rua em NY com Bolsonaro

  • Enganoso
Enganoso
É enganoso o post que compara o presidente austríaco, Alexander Van Der Bellen, que se alimentou na calçada durante visita a Nova York, com Jair Bolsonaro, flagrado comendo pizza também na rua. O vídeo que circula nas redes, com o austríaco, é verdadeiro, mas Van Der Bellen está imunizado e comeu do lado de fora por opção. Ele poderia ter entrado no estabelecimento, que, assim como todos os outros da cidade, exige o certificado de vacina contra a covid-19, documento que o presidente brasileiro não possui – ele diz que não se vacinou – e informação omitida nos conteúdos que viralizaram.
  • Conteúdo verificado: Posts em redes sociais mostram vídeo do presidente da Áustria, Alexander Van Der Bellen, se alimentando na rua em Nova York e comparam com ato de Jair Bolsonaro, que comeu pizza do lado de fora de um estabelecimento na cidade.

É enganoso o post viral que compara Alexander Van Der Bellen, presidente da Áustria, e Jair Bolsonaro (sem partido), por comerem na rua em Nova York. O conteúdo ignora a situação dos dois mandatários: o austríaco está vacinado com duas doses contra a covid-19 e poderia comer dentro do restaurante, se quisesse; já o brasileiro afirma não estar imunizado e não poderiam acessar os restaurantes da cidade, que exigem o certificado de vacinação.

O post engana ao não contextualizar essa informação, passando a ideia de que Bolsonaro não estaria fazendo nada errado ao não se vacinar. Na ocasião, os dois presidentes estavam em Nova York para participar da Assembleia Geral da ONU. Bolsonaro chegou a ser criticado por Bill de Blasio, prefeito da cidade, que afirmou que, se ele não quisesse se vacinar, que não se incomodasse de ir ao destino.

Procurada, a autora do post verificado aqui apagou o tuíte e bloqueou a jornalista que fez o contato.

A reportagem também tentou contatar o site Jornal da Cidade Online, que publicou o conteúdo, mas nenhum deles respondeu até a publicação deste texto.

O Comprova considerou o conteúdo enganoso porque ele é usado de uma forma que induz a uma interpretação que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Como verificamos?

Primeiramente, fizemos uma análise do vídeo em busca de pistas que pudessem esclarecer sobre a veracidade da gravação. O nome do estabelecimento aparece nas imagens e, a partir disso, localizamos o endereço e comparamos com imagens do Google Street View.

Contatamos, então, o estabelecimento. Via mensagem privada no Instagram, foi confirmado que o austríaco esteve lá.

Tentamos falar com a equipe de Van Der Bellen por meio do site oficial do presidente, mas não tivemos resposta. O próximo passo foi analisar a conta verificada dele no Instagram, onde encontramos dois stories que mostram a refeição referida no vídeo. Por essas postagens, tivemos também a confirmação da data. O dia foi comprovado ao compararmos o vídeo do post enganoso com imagens de reportagens que mostraram o presidente austríaco e a comitiva com as mesmas roupas em uma visita à obra próxima à lanchonete no dia 23 de setembro.

Verificamos também o contexto dos atos. Por meio de pesquisas em reportagens e sites oficiais, foi possível comprovar as regras de saúde de Nova York. Também buscamos notícias e postagens nas redes sociais oficiais do governante austríaco para confirmar se ele havia se vacinado.

Não foi possível confirmar quem fez o vídeo, mas a reportagem fez contato com a autora do post que mais repercutiu no Twitter via mensagem privada na rede e, via Instagram e e-mail, com o site Jornal da Cidade Online, que também replicou o vídeo.

Verificação

Cachorro-quente na rua

Em um dos trechos do vídeo em que o presidente austríaco aparece comendo foi possível ver a placa indicando o nome da rua: 1 Av, ou First Avenue. Com essa informação, a reportagem encontrou no Google Maps o estabelecimento onde o vídeo foi gravado – na esquina da avenida com a 14th Street. Também foi possível verificar mais elementos em comum, como uma placa estendida em um prédio do outro lado da avenida (em destaque nas imagens abaixo).

Diferentemente do que a mulher que gravou o vídeo afirma, o local se chama Papaya Dog, e não Papadinos. O nome pode ser lido na própria gravação.

 

| Na vertical, frames do vídeo que destacam o nome do estabelecimento, Papaya Dog, a localização na esquina da 1av e letreiro no prédio do outro lado da rua, elementos que aparecem no Google Street View (foto horizontal)

É uma lanchonete estilo fast food que vende cachorro-quente e outras comidas, como pizza – inclusive, no vídeo, a narradora diz que o austríaco está comendo pizza, mas, segundo os stories da conta verificada de Van Der Bellen no Instagram, ele consumiu um cachorro-quente.

O presidente publicou fotos da ocasião na seção “destaques” do perfil junto a outros registros da viagem a Nova York. A imagem traz a pergunta “O que seria de Nova York sem cachorro-quente?”, enquanto mostra o momento em que Van Der Bellen recebeu o lanche típico americano.

| No Instagram, Van Der Bellen publicou fotos do momento em que compra cachorro-quente na lanchonete registrada no vídeo verificado aqui

Procurado via Instagram, o Papaya Dog confirmou a visita do austríaco ao local.

No mesmo dia em que foram à lanchonete, Van der Bellen e a comitiva visitaram as obras de construção de um muro às margens do East River, cuja intenção é proteger Nova York de consequências das mudanças climáticas, como tempestades e o aumento do nível do mar, como mostra matéria do Wiener Zeitung.

Reportagem em vídeo do jornal Tiroler Tageszeitung traz Van der Bellen e outras pessoas da delegação no local da obra com as mesmas roupas com as quais aparecem no vídeo verificado aqui e no stories do presidente.

| Integrantes da comitiva austríaca em Nova York aparecem com a mesma roupa em reportagem do dia 23 de setembro e no vídeo que repercutiu nas redes sociais

Conteúdo excluído

A reportagem não conseguiu encontrar quem fez a gravação. Foi feito contato com a autora de post que teve mais de 5 mil visualizações no Twitter até 29 de setembro (@brom_elisa), mas, assim que leu a mensagem, ela bloqueou a jornalista e excluiu o tuíte enganoso.

 

Opção x exigência

Apesar das similaridades nas situações, por comerem uma refeição popular em pé e em ambiente aberto em Nova York, os contextos de Jair Bolsonaro e Alexander Van Der Bellen são diferentes.

Para o presidente brasileiro, a situação ocorreu por falta de alternativa, já que ele afirma não ter se vacinado contra o coronavírus. Estabelecimentos da cidade exigem, desde agosto, a apresentação de um “passaporte da vacina” para quem quer comer em ambientes fechados.

A pizza não foi a única refeição de Bolsonaro na rua. No dia 20 de setembro, ele também comeu na área externa que a churrascaria brasileira Fogo de Chão abriu para atender clientes que não se imunizaram. Pelas regras da cidade, o presidente brasileiro não poderia usar o ambiente interno; uma situação diferente da do austríaco.

Van der Bellen se vacinou, como mostrou em publicação nas redes sociais. Na viagem aos Estados Unidos, ele visitou um conterrâneo que é pesquisador em um renomado centro de virologia no país norte-americano, destacando que a mensagem dos cientistas é “vacinar, vacinar, vacinar”. No começo de setembro, o presidente fez um apelo para que austríacos que ainda não tivessem se imunizado o fizessem.

Passaporte da vacina

Van der Bellen, inclusive, promoveu no dia 11 de julho o certificado digital de covid, uma espécie de passaporte da vacina que é aceito na Áustria e em outros países da União Europeia.

O documento eletrônico comprova que o indivíduo foi vacinado, testou negativo para a doença ou já se recuperou dela, o que permite a entrada em hotéis, restaurantes e outros estabelecimentos.

Em maio de 2020, quando quebrou a regra do lockdown no próprio país, Van der Bellen reconheceu o erro e pediu desculpas.

Já Bolsonaro é contra a medida, defendida por cientistas. Em junho, ele disse que vetaria proposta nesse sentido e, em 30 de setembro, afirmou que a medida é uma “maneira de discriminar e separar as pessoas”.

Por que investigamos?

Em sua quarta fase, o Comprova verifica conteúdos suspeitos sobre pandemia, políticas públicas do governo federal e eleições. O post no Twitter verificado aqui teve mais de 5 mil visualizações e mais de mil interações.

O conteúdo tenta minimizar críticas feitas à postura de Bolsonaro diante da pandemia ao comparar com ato isolado de Van der Bellen, mas é enganoso ao ignorar o contexto das duas ocasiões. O post sugere que não há nada errado na postura do presidente brasileiro de não se vacinar, sendo que a imunização é um dos principais meios de combate ao coronavírus.

Tal conclusão foi possível de ser percebida, inclusive, a partir de alguns comentários – como “Acho que ele também estava proibido de entrar em restaurantes” e “É o Bolsonaro fazendo escola! Mito!” – que mostram que alguns seguidores entenderam que o austríaco também não teria se imunizado e que o brasileiro faz certo ao não se proteger.

​​

Enganoso, para o Comprova, é conteúdo que foi retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Saúde

Investigado por: 2021-09-29

É falso que morte de jovem no Rio Grande do Sul esteja associada à vacina contra covid

  • Falso
Falso
É falso que a morte de jovem de 22 anos em Vera Cruz, no Rio Grande do Sul, tenha relação com a vacina contra a covid-19. A ligação inventada é mencionada em dois posts publicados no Twitter e no Instagram. Secretarias de saúde da cidade onde ele morava e de onde ele morreu, hospital onde o óbito ocorreu, família e Anvisa descartam qualquer suspeita de relação causal entre morte por AVC e o imunizante.
  • Conteúdo verificado: Posts no Twitter e no Instagram usam imagem com anúncio de sepultamento de jovem de 22 anos, morador da cidade de Vera Cruz, no Rio Grande do Sul, para afirmar que ele morreu por causa da vacina contra o coronavírus.

É falso que Samuel Pimentel de Oliveira, 22 anos, morreu por ter sido vacinado contra a covid-19. Dois posts compartilhados na semana passada no Twitter e no Instagram relacionam a morte do jovem, morador da cidade de Vera Cruz, no Rio Grande do Sul, à vacina contra a covid-19. A relação foi inventada. Samuel foi internado no dia 6 e morreu no dia 14 de setembro, vítima de um acidente vascular cerebral (AVC) isquêmico.

Nem o hospital e nem a vigilância epidemiológica da cidade de Cachoeira do Sul, onde fica a unidade, relacionam o óbito ao imunizante. A Prefeitura de Vera Cruz e a família do rapaz também negam essa ligação. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) não recebeu nenhuma notificação sobre suspeita de causalidade entre a morte do rapaz e a vacina. Samuel havia tomado a primeira dose mais de 30 dias antes da morte.

A morte cerebral do jovem foi confirmada em 14 de setembro no Hospital de Caridade e Beneficência (HCB) de Cachoeira do Sul, cidade a 88 km de Vera Cruz. Na certidão de óbito dele, consta que a causa do óbito foi “lesão encefálica anóxica, acidente vascular encefálico isquêmico”. (Entenda o que isso significa mais abaixo)

As duas publicações verificadas aqui reproduzem uma imagem divulgada na página do Facebook da Funerária Caminho da Paz, na qual a morte e o sepultamento de Samuel são informados, e distorcem a realidade ao afirmar que o falecimento dele foi provocado pela “injeção de veneno” e que o jovem é “mais uma vítima da vacina contra a covid-19”.

Pelos comentários nos dois posts, é possível perceber que os seguidores interpretaram, mesmo no caso tuíte, em que a vacina não é citada diretamente, que o imunizante teria sido o responsável pela morte.

Os autores dos posts no Instagram e no Twitter foram procurados pelo Comprova, mas não responderam até o fechamento desta reportagem.

Esse conteúdo foi classificado como falso porque a relação entre a morte do rapaz e a vacina foi inventada e divulgada de modo deliberado para espalhar uma mentira.

ATUALIZAÇÃO: Após a publicação desta verificação, a autora do tuíte que relaciona a morte de Samuel à vacina contra a covid-19 respondeu ao pedido de contato do Comprova. Pelo Twitter, ela encaminhou um link em que o próprio post é utilizado como fonte para afirmar que jovem recebeu “injeção de veneno”. Também disse que o caso de Samuel não é isolado e enviou links de vídeos em que outras mortes são atribuídas às vacinas (atualização publicada em 30 de setembro de 2021).

Como verificamos?

Primeiramente, buscamos no Google notícias de que um jovem morador de Vera Cruz, chamado Samuel Pimentel de Oliveira, tinha realmente morrido nos dias anteriores aos posts investigados aqui. Além do próprio tuíte verificado e de um texto em um blog que faz referência a ele, havia uma notícia em um site local que afirmava que os órgãos do rapaz tinham sido doados.

Em seguida, encontramos o perfil nas redes sociais da Funerária Caminho da Paz. O nome do estabelecimento aparece na imagem compartilhada pelos dois posts, anunciando a morte de Samuel. Encontramos a imagem postada no Facebook da funerária, que tem uma unidade na cidade de Vera Cruz, no dia 16 de setembro. No post, além do nome completo de Samuel, havia também os nomes dos pais, da esposa e dos irmãos do rapaz, e ainda sua data de nascimento.

A partir dessas informações, buscamos pelos perfis no Facebook da mãe, da esposa e de uma das irmãs de Samuel, que confirmaram a morte dele. Através dos familiares, que souberam das publicações que falavam do jovem pelo Comprova, tivemos acesso às informações da certidão de óbito do jovem. Essas informações também foram confirmadas pela Secretaria de Saúde de Cachoeira do Sul.

Entramos em contato com as prefeituras de Vera Cruz, onde Samuel morava, e de Cachoeira do Sul, cidade em que fica o hospital onde ele morreu, além do HCB. Por fim, procuramos a Anvisa, a neurologista e coordenadora do Programa de Neurologia Vascular do Hospital de Clínicas de Porto Alegre, Sheila Martins, e os autores dos posts verificados, que não responderam até a publicação desta reportagem.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 29 de setembro de 2021.

Verificação

Samuel sofreu AVC

O jovem de 22 anos morreu no dia 14 de setembro de 2021 após sofrer um AVC. Segundo a família do jovem, ele foi internado no dia 6 de setembro na instituição. O Comprova entrou em contato com a Prefeitura de Cachoeira do Sul e a assessoria de imprensa respondeu, por meio de áudio no WhatsApp, que Samuel foi levado ao HCB porque, no momento em que precisou de atendimento, não havia leitos de UTI disponíveis em Vera Cruz.

Também por WhatsApp, a prefeitura informou que, na certidão de óbito de Samuel, registrada no Cartório de Registros Público de Vera Cruz, consta que a causa da morte foi “lesão encefálica anóxica, acidente vascular encefálico isquêmico”.’

A família de Samuel compartilhou com o Comprova o trecho da certidão de óbito do jovem onde consta a causa da morte.

De acordo com a especialista em neurologia vascular Sheila Martins, existem dois tipos de AVCs: o hemorrágico, que é quando uma artéria cerebral se rompe, e o isquêmico, que acontece quando a artéria que leva o sangue ao cérebro sofre uma obstrução, entope e impede a passagem do sangue. “Hoje, o AVC isquêmico é o mais comum, sendo 85% dos casos de acidente vascular”, afirma a neurologista.

O superintendente do Hospital de Caridade e Beneficência de Cachoeira do Sul, Luciano Morschel, disse ao Comprova, por mensagem no WhatsApp, que a causa da morte de Samuel “foi uma isquemia cerebral”. Segundo ele, não é possível dizer, ainda, o que provocou a isquemia, pois “há várias hipóteses”.

Assim como as autoridades de saúde e administração dos municípios, familiares de Samuel contatados pelo Comprova também não acreditam nas afirmações feitas nas publicações verificadas.”Não acreditamos que a vacina tenha ligação com a morte do meu irmão”, afirmou, por WhatsApp, Geísa.

Não há relação entre morte e vacina

De acordo com informações do setor de Epidemiologia e Imunizações do Departamento de Vigilância em Saúde (DVS) da Secretaria Municipal da Saúde de Cachoeira do Sul, “o óbito de Samuel nunca foi relacionado à vacinação”.

Luciano Morschel, superintendente do HCB, também afirmou não saber se há alguma investigação sobre uma eventual relação entre a morte de Samuel e a aplicação da vacina contra a covid-19 e sugeriu que o Comprova entrasse em contato com a vigilância epidemiológica de Vera Cruz.

Por e-mail, a Secretaria Municipal de Saúde de Vera Cruz informou que não é de conhecimento da pasta que a morte de Samuel tenha relação com a vacina. O Comprova perguntou se e quando Samuel foi vacinado, e com qual vacina, mas não obteve resposta.

Então, o Comprova questionou a Anvisa se a agência investiga se há relação entre a morte de Samuel e a vacina contra a covid-19. Por e-mail, o órgão federal informou não ter sido notificado sobre caso suspeito de morte provocada por vacina.

“Não identificamos notificação com as características relatadas. Todas as notificações de suspeitas de eventos adversos são avaliadas pela Anvisa na busca por evidências de relação causal”, diz a nota.

Primeira dose da vacina tinha sido aplicada no dia 11 de agosto

Por telefone, a Prefeitura de Cachoeira do Sul informou que Samuel havia tomado a primeira dose da vacina quase 30 dias antes da morte. A vacina foi aplicada na cidade de Vera Cruz, onde ele morava. Procurada, a prefeitura da cidade não informou a data específica da aplicação, nem o fabricante da vacina.

Contudo, a imunização para a faixa de idade dele – acima de 18 – foi aberta no dia 10 de agosto. Dois dias antes, a vacina começou a ser aplicada em quem tinha mais de 23 anos, o que não era o caso de Samuel.

De acordo com a irmã do jovem, Geísa, ele foi vacinado no dia 11 de agosto com a primeira dose da Pfizer em Vera Cruz. Conforme mencionado anteriormente, Samuel foi internado no Hospital de Cachoeira do Sul somente no dia 6 de setembro, quase um mês depois de ser vacinado.

A neurologista e Coordenadora do Programa de Neurologia Vascular do Hospital de Clínicas de Porto Alegre, Sheila Martins, afirma que não existe comprovação científica que a vacina, independentemente do fabricante, ocasione um AVC, sendo o paciente jovem ou não.

Sheila ainda afirma que, ao contrário das afirmações das postagens verificadas, pessoas que não se vacinam e são contaminadas com a covid-19 têm mais chance de sofrer um acidente vascular cerebral, já que a doença costuma aumentar os riscos de AVC.

Família quer que posts sejam apagados

O Comprova também conversou via WhatsApp com a esposa de Samuel, Emilin Gabriele. A jovem, assim como a irmã dele, Geísa, não acredita que exista relação da morte do rapaz com a vacinação realizada quase um mês antes.

Tanto Geísa, quanto Emilin não sabiam da existência das publicações verificadas nesta reportagem. Após tomarem conhecimento das postagens, as duas concordaram em conversar com o Comprova a fim de verificar as publicações.

“Isso é, com certeza, uma fake news. Estão usando a imagem de uma pessoa que não está mais aqui e sendo mentirosos”, afirma Emilin, que pediu ajuda da reportagem para que os posts fossem apagados.

Efeito dos posts

Dos dois posts verificados aqui, o tuíte foi postado primeiro – às 17h21 do dia 18 de setembro de 2021. A autora não cita diretamente a vacina como responsável pela morte de Samuel, mas usa o termo “injeção de veneno”. Apesar de não fazer uma citação direta, os comentários no post deixam claro que esta foi a interpretação de boa parte das pessoas que interagiram com a postagem.

Muitos citaram, com ironia, que aquele era mais um “caso isolado”. Outros, questionaram a fonte das informações, o tipo de vacina aplicada e até mesmo o que a autora realmente quis dizer com o uso do termo “injeção de veneno”.

Em outro comentário, uma pessoa sugere que o caso seja notificado à Anvisa, ao que a autora responde que vai “postar no grupo”, dando a entender que teria recebido a informação de algum outro lugar. O Comprova entrou em contato com a autora através de um comentário na postagem, mas não recebeu resposta até a publicação desta verificação.

A postagem do mesmo conteúdo em um perfil do Instagram foi feita no dia seguinte, 19 de setembro. Desta vez, o post é mais direto: o autor incluiu uma inscrição na própria imagem em que atribui a morte de Samuel à vacina contra a covid-19.

Nos comentários, mais interações que desencorajam a vacinação. Em um deles, uma pessoa pergunta qual a fonte da informação e é repreendida por outra pessoa. Na resposta, a mulher afirma que não vacinou a filha e não quer ter outro post derrubado pela rede social, “como já aconteceu antes”.

Por que investigamos?

Em sua quarta fase, o Comprova verifica conteúdos suspeitos sobre pandemia, políticas públicas do governo federal e eleições. Os posts no Twitter e Instagram verificados aqui somam quase 5 mil interações.

Conteúdos que tentam criar uma relação causal entre óbitos e vacinas, desacreditando-as e influenciando outras pessoas a não se vacinarem, são perigosos porque podem levar a população a colocar a saúde pessoal e coletiva em risco.

O Comprova já publicou diversos conteúdos sobre imunização. Um deles, na última semana, mostrou que a morte de uma adolescente em São Bernardo do Campo (SP) não teve relação causal com o produto da Pfizer. Também já mostrou como um médico enganava ao afirmar que as vacinas não funcionam contra a variante delta, como um post desinformava ao afirmar que o CDC e Anthony Fauci não acreditam nos imunizantes e o caso de uma médica que enganava ao afirmar que vacinas são experimentais.

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.

Saúde

Investigado por: 2021-09-28

Vacinas de RNA mensageiro não geram doenças autoimunes

  • Falso
Falso
É falso vídeo viral publicado na rede social Kwai que afirma que vacinas que usam a tecnologia de RNA mensageiro, como Pfizer e Moderna, podem gerar doenças autoimunes e uma série de complicações respiratórias ou cardíacas. Ao contrário do que prega o vídeo, as vacinas são seguras, passaram pelas três fases de testes e foram aprovadas por agências relevantes de vigilância sanitária como a FDA, dos EUA.
  • Conteúdo verificado: Vídeo compartilhado no Kwai defende que os imunizantes que usam a tecnologia de RNA mensageiro (Pfizer e Moderna) geram doenças autoimunes, levam a quadros severos respiratórios e cardiovasculares e podem matar dentro de poucos minutos.

É falso um vídeo viral publicado no Kwai que estabelece relação de causa e consequência entre vacinas de RNA mensageiro e doenças autoimunes – quando o sistema imunológico produz anticorpos contra componentes saudáveis do organismo. O vídeo também cita, de forma falsa, que a enfermeira norte-americana Tiffany Dover morreu após receber a dose da Pfizer contra a covid-19.

O argumento utilizado no vídeo não tem respaldo científico. Fia-se em concepções erradas sobre como as vacinas de RNA mensageiro se processam no organismo e fornece um conceito errado sobre o significado de doença autoimune.

O conteúdo afirma que, se um corpo vacinado entrar em contato com o Sars-Cov-2 e atuar para neutralizá-lo, “estará combatendo algo que ele mesmo está produzindo”. E conclui: “Isso se chama doença autoimune”. A lógica não é verdadeira e vai na contramão do que especialistas explicaram ao Comprova para esta verificação.

A doença autoimune consiste no mau desempenho do sistema imunológico, que passa a atuar contra células saudáveis do próprio organismo. Não há evidências de que vacinas levem a esse quadro.

Procurado, o autor da publicação, Adilson Winans Goldberg, respondeu que viu a publicação em um “grupo de notícias”. O Comprova recebeu o vídeo por meio do WhatsApp, canal disponível para que leitores deem sugestão de conteúdos que podem ser checados.

O Comprova considera falso o conteúdo que tenha sido inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.

Como verificamos?

Inicialmente, buscamos informações em verificações acerca da vacina de mRNA e doenças já publicadas pelo Comprova, como esta, da semana passada. Depois, entrevistamos o virologista, coordenador do curso de biomedicina do Instituto Brasileiro de Medicina e Reabilitação (IBMR) e membro da Rede do Centro de Informações Estratégicas de Vigilância em Saúde, Raphael Rangel.

A imunologista Letícia Sarturi, mestre pela Universidade de São Paulo e doutora em Biociências e Fisiopatologia pela Universidade Estadual de Maringá, também foi consultada. Realizamos uma busca na internet pelas reportagens a respeito de Tiffany Dover, enfermeira que desmaiou após receber a vacina e foi citada no vídeo como se tivesse morrido. Encontramos checagens sobre esse episódio feitas pelo Estadão, Aos Fatos, Agência Lupa, Boatos.orgFato ou Fake.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 28 de setembro de 2021.

Verificação

Como a vacina de mRNA age no corpo

Indagada sobre como as vacinas de mRNA agem no organismo humano, a imunologista Letícia Sarturi afirmou de início que o mRNA é um trecho de RNA responsável por “dar a receita” para que as células produzam exatamente a proteína spike do Sars-Cov-2.

A proteína Spike é exclusiva do vírus da covid-19 e fica em sua superfície. É usada para entrar nas células do corpo. Sarturi salienta que o mRNA destes imunizantes é “bem produzido” e executado mediante “controle rígido”.

Ainda de acordo com ela, o mRNA está dentro de um lipídio cuja função é “entrar” nas células para que elas produzam sua própria proteína spike. As células então fazem o processamento desta proteína e a “apresentam” para os linfócitos T.

Estes linfócitos T são os responsáveis por “lembrar” de combater o vírus sempre que entrarem em contato com ele.

A explanação da pesquisadora está em linha com o que afirma o Centro de Controle de Doenças(CDC, na sigla em inglês) dos Estados Unidos sobre o funcionamento da tecnologia mRNA.

As vacinas que atualmente usam a tecnologia de mRNA são a Pfizer, desenvolvida pela empresa de biotecnologia alemã BioNTech, e a estadunidense Moderna; esta não disponível no Brasil. O FactCheck.org disponibilizou guias com informações sobre a Pfizer e a Moderna.

Quem é Tiffany Dover?

O autor do vídeo cita a enfermeira americana Tiffany Dover, que desmaiou durante uma entrevista logo depois de tomar uma dose da vacina contra covid-19 da Pfizer, no dia 17 de dezembro de 2020.

Defendeu-se, no material publicado no Kwai, o argumento de que vacinas mRNA podem matar em uma questão de minutos atacando o sistema respiratório, “como o que aconteceu com Tiffany Dover”.

Tiffany, no entanto, não morreu. O boato vem circulando desde o dia 21 de dezembro de 2020, e já foi desmentido pelo Estadão, Aos Fatos, Agência Lupa, Boatos.orgFato ou Fake.

O hospital CHI Memorial, localizado em Chattanooga, Tennessee, onde ela trabalhava na época, chegou a divulgar uma nota afirmando que a enfermeira estava saudável.

Depois do episódio, publicações em outras redes sociais relacionaram o desmaio à vacinação, o que é falso.

Tiffany Dover falou, em entrevista à Estação de TV WRCB Chattanooga: “Eu tenho um histórico de resposta vagal hiperativa e, com isso, se eu sinto dor por qualquer coisa (…), se eu bato um dedo do pé, eu posso simplesmente desmaiar”, explicou. “Eu provavelmente desmaiei seis vezes nas últimas seis semanas, é comum para mim”, acrescentou.. Ou seja, ela não atribuiu seu desmaio à vacina, mas à dor no momento da injeção.

Doenças autoimunes

O virologista Raphael Rangel, do IBMR, explica que a doença autoimune se caracteriza essencialmente pela incapacidade do corpo em “tolerar imunologicamente algumas proteínas que nós mesmos produzimos”.

O corpo humano, prossegue, “consegue distinguir o que nós produzimos do que é externo”. Ou seja, a doença autoimune é um problema imunológico não ocasionado pela vacina de RNA mensageiro – esta, um elemento inicialmente externo.

“Devemos estar sempre atentos e empenhados para desconstruir narrativas mentirosas contra as vacinas”, adverte o virologista.

Não se sabe ao certo o que leva o sistema imunológico a atacar células do próprio organismo. Doenças autoimunes geralmente são crônicas, ou seja, duram mais de um ano e necessitam de cuidados médicos constantes. Exemplos de doenças autoimunes são esclerose múltipla, artrite reumatoide e o lúpus.

Convulsões e paralisia de Bell?

No vídeo, o narrador cita que as vacinas produziriam danos ao sistema nervoso central e gerariam paralisia de Bell – o enfraquecimento ou a paralisia de um dos lados do rosto. Para ilustrar o primeiro exemplo, o conteúdo mostra uma mulher com tremores e dificuldades para caminhar. O Comprova printou a imagem da mulher e pesquisou a origem dela no Google.

O primeiro resultado da pesquisa é de um perfil no Twitter (@constanzag77) com publicações – no formato de fio – com série de supostos exemplos de eventos adversos causados pela vacinação contra a covid-19. Ao clicar no primeiro tuíte da série de posts, é possível verificar que o Twitter o classifica como “enganoso”.

A terceira publicação da sequência leva ao vídeo usado no conteúdo aqui verificado. No tuíte, o perfil escreve: “Mamãe de Brant Griner depois de receber a vacina da Pfizer.” Na mesma postagem, há o link da conta no Facebook de Brant Griner.

O Facebook alerta na parte inferior da publicação de Griner que a publicação é sem contexto. A plataforma disponibilizou para os usuários uma checagem do Estadão Verifica, que diz não haver provas de que o vídeo da mulher tenha relação com a vacina da Pfizer.

A checagem do Estadão leva ao PolitiFact, site americano de verificação de fatos, para quem Griner disse que a mãe, Angelia Gipson Desselle, de 45 anos, tomou a vacina Pfizer em 5 de janeiro e três dias depois teria começado a sentir sensações similares a de convulsões na perna esquerda. Mas ele se recusa a responder onde ela tomou a vacina, em que hospital ou quem aplicou o imunizante. Alegou que iria preservar a privacidade da mãe.

Ao Estadão Verifica, o Departamento de Saúde do Estado de Louisiana disse que investiga o caso e que não o confirma como efeito adverso da vacina.

No caso dos quatro casos de paralisia de Bell, o vídeo publicado no Kwai usa um print somente do título de uma matéria publicada no site de notícias R7 em dezembro de 2020, dentro da qual se lê um relatório publicado pelo FDA (Food and Drug Administration), agência reguladora dos Estados Unidos. Nele, os pesquisadores afirmam não haver base para conclusão de que houve uma relação causal entre a vacina e os casos.

Por que investigamos?

Em sua quarta fase, o Comprova verifica conteúdos suspeitos sobre pandemia, políticas públicas do governo federal e eleições. O vídeo verificado aqui teve mais de 15 mil curtidas e 25 mil compartilhamentos. O Kwai é um aplicativo chinês criado para compartilhamento de vídeos rápidos. Foi pensado inicialmente como uma plataforma para troca de imagens GIF. Em 2012 ganhou o formato atual.

O conteúdo fraudulento é prejudicial por desinformar e ter potencial de afastar as pessoas da vacinação num contexto em que o país se aproxima da marca de 600 mil mortos pelo vírus. A comunidade científica tem emitido sucessivos alertas de que somente a vacinação em massa devolverá o mundo a um ambiente de normalidade.

Conteúdos que tentam desacreditar as vacinas ou minimizar os riscos da pandemia, portanto, são perigosos porque podem levar a população a colocar a saúde em risco. Em alguns comentários na publicação, é possível verificar o potencial de desinformação dessas postagens.

“Conhecimento é poder, parabéns”, escreveu um usuário em resposta ao vídeo falso. “Pessoal, divulguem esse vídeo. Mais um falando a verdade. Deus tenha misericórdia de nós”, reagiu outra usuária da rede social. “Essas vacinas são para os cobaias”.

O Comprova já publicou diversos conteúdos sobre imunização, como o que informa que morte de adolescente não tem relação causal com vacina da Pfizer, o do médico que engana ao afirmar que os imunizantes não funcionam contra a variante delta e o post que desinforma afirmando que o CDC e Anthony Fauci não acreditam nas vacinas.

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.

(CORREÇÃO: Uma primeira versão desta verificação trouxe, em seu resumo, a informação de que a vacina da Moderna tinha aprovação da Anvisa. Na realidade, não há solicitação referente à vacina da Moderna na Anvisa, seja para registro ou para uso emergencial. Dessa forma, não há processo em análise na Anvisa. Correção feita em 29 de setembro de 2021)

Saúde

Investigado por: 2021-09-24

É enganosa conexão entre distribuição de ivermectina e controle da pandemia em estado da Índia

  • Enganoso
Enganoso
Tuíte engana ao sugerir que queda no número de casos e mortes de covid-19 no estado de Uttar Pradesh, na Índia, foi causada pelo uso da ivermectina. Não existe, até o momento, comprovação científica de que o medicamento salve vidas de infectados pelo novo coronavírus, conforme afirmam Anvisa e OMS, entre outras autoridades sanitárias.
  • Conteúdo verificado: Postagem no Twitter mostra imagens de gráficos e matéria do jornal indiano Hindustan Times afirmando que 33 distritos do estado de Uttar Pradesh estão livres da covid-19. Ainda neste tuíte, a autora menciona que neste estado foi distribuído “um remedinho para verme”, fazendo alusão ao vermífugo ivermectina. No entanto, na matéria do jornal indiano não é feita nenhuma relação entre a diminuição das mortes e o uso do remédio, apenas a vacinação é mencionada na matéria.

É enganosa uma postagem no Twitter que sugere que a ivermectina seria responsável pela queda do número de casos e mortes por covid-19 no estado de Uttar Pradesh, na Índia. Embora autoridades locais de saúde tenham adotado um protocolo com o medicamento, os potenciais benefícios clínicos e preventivos do remédio ainda não foram comprovados em estudos científicos bem estruturados.

Segundo especialistas consultados pelo Comprova, isso faz com que a associação do vermífugo ao declínio da transmissão do coronavírus no estado indiano seja uma “falácia”. Afinal, outros aspectos epidemiológicos podem ter influenciado no quadro da pandemia em Uttar Pradesh.

Com mais de 2 mil interações no Twitter, a postagem enganosa mostra uma matéria publicada em 10 de setembro no jornal Hindustan Times. O artigo cita que 33 distritos de Uttar Pradesh não registravam casos ativos de covid-19 naquela data e ressalta o avanço da vacinação no país. Não há qualquer menção à ivermectina ou outras substâncias, além dos imunizantes contra a doença.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) e outras agências sanitárias do mundo não aconselham ou se posicionam contrárias ao uso do medicamento fora de ensaios clínicos. Justamente porque faltam evidências confiáveis, de estudos adequados, para definir se a ivermectina traz algum benefício a pacientes com covid.

A reportagem do Comprova questionou o Ministério da Saúde da Índia e com o Governo de Uttar Pradesh sobre a distribuição do vermífugo para a população, mas até a publicação desta matéria não teve retorno.

O Comprova considerou a postagem enganosa pois é um conteúdo que usa dados imprecisos, já que a matéria citada no tuíte não menciona o uso do vermífugo ao relatar a diminuição de casos e mortes de covid-19.

Como verificamos?

O Comprova realizou uma busca reversa no Google para localizar as imagens do tuíte verificado. Depois disso, buscou matérias em portais de notícias da Índia sobre a situação da pandemia, a vacinação e a distribuição de ivermectina no país (aqui, aqui, aqui e aqui).

Também conversou com o médico infectologista da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) André Siqueira e com o médico e consultor da Sociedade Brasileira de Infectologia Julival Ribeiro. O Comprova também contatou a International Fact-Checking Network (IFCN), para auxiliar na busca por matérias que atualizassem a distribuição da ivermectina na Índia.

Além disso, entrou em contato com o Ministério da Saúde da Índia e com o Governo da Uttar Pradesh, via e-mail, mas não recebeu retorno até o fechamento deste material. A reportagem do Comprova não conseguiu entrar em contato com a autora do tuíte, já que não é possível enviar mensagem direta no em seu perfil no Twitter.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 24 de setembro de 2021.

Verificação

Covid-19 na Índia

Os gráficos sobre a vacinação apresentados na publicação verificada foram extraídos do Google. A plataforma de buscas digitais compila dados coletados pela Universidade Johns Hopkins, dos Estados Unidos, que tem sido uma referência de informações epidemiológicas sobre a pandemia.

Segundo país mais populoso do mundo, com 1,3 bilhão de habitantes, a Índia bateu recordes de infectados e mortos por covid-19 em maio e junho deste ano. Essas marcas foram responsáveis pelo colapso no sistema hospitalar do país. O país asiático acumula 445.385 mortes em decorrência da doença, de acordo com levantamento do governo indiano.

Depois de sofrer duras críticas pela posição adotada no enfrentamento à pandemia, o governo da Índia iniciou em junho uma campanha nacional e gratuita para a vacinação de todos os adultos. Desde então, a média de doses aplicadas diariamente tem sido positiva no país, que chegou a bater o recorde de 10 milhões de doses aplicadas em um único dia. O primeiro-ministro do país, Narendra Modi, comemorou em uma rede social o número atingido.

Atualmente, cerca de 45% da população indiana já foi vacinada contra a covid-19 com ao menos uma dose, e 16% da população já está totalmente vacinada, de acordo com o Our World in Data.

Até o momento, Uttar Pradesh é o estado que mais vacinou pessoas na Índia. Dados disponibilizados pelo governo mostram que mais de 97 milhões de pessoas, ou seja, cerca de 47% da população do estado, já foram vacinadas com ao menos uma dose da vacina, enquanto mais de 17 milhões estão com o esquema vacinal completo.

Em Uttar Pradesh, mais precisamente na cidade de Agra, está localizado o Taj Mahal.

Indicação da ivermectina

A curva de infecções em Uttar Pradesh ganhou tração em abril de 2021, atingiu um pico de mais de 30 mil casos diários no final do mesmo mês, até recuar a um patamar de menos de 200 registros diários a partir de junho. Os dados do estado são usados de forma inadequada para defender o uso da ivermectina contra a covid-19 porque autoridades locais aplicaram um protocolo medicamentoso com a substância.

Desde 2020 a Índia possui um protocolo para o uso da ivermectina – bem como a hidroxicloroquina – no tratamento de pacientes com covid-19. O medicamento, que é indicado para doenças parasitárias, foi amplamente distribuído pelos distritos do estado de Uttar Pradesh. Apesar de não ter obtido resposta das autoridades sanitárias e governamentais da Índia, a reportagem do Comprova listou em ordem cronológica as autorizações ao uso da ivermectina para o combate a covid-19 no país, de acordo com a mídia internacional.

  • Maio de 2020: No site do Governo de Uttar Pradesh é disponibilizado um documento que oferece orientações sobre o uso da ivermectina como tratamento para a covid-19. O documento é datado de maio de 2020.
  • Agosto de 2020: De acordo com o The Indian Express, em 6 de agosto de 2020 o Departamento de Saúde de Uttar Pradesh introduziu a ivermectina como uso profilático para contatos próximos de pacientes contaminados e profissionais de saúde através de uma ordem governamental.
  • Junho de 2021: O Governo de Uttar Pradesh iniciou uma campanha de distribuição de kits de medicamento de acordo com a idade e pesagem dos pacientes. Os kits tinham comprimidos de paracetamol, pacotes de SRO, multivitaminas e comprimidos de ivermectina, de acordo com o Times Of India.
  • Agosto de 2021: O distrito de Lucknow, capital do estado de Uttar Pradesh, instalou quiosques para distribuição de ivermectina para a população. As autoridades locais indicam que os comprimidos devem ser administrados com base nos sintomas do infectado, de acordo com matéria do Hindustan Times.

Apesar da ampla divulgação da ivermectina como tratamento profilático no estado de Uttar Pradesh, o próprio governo indiano descreve o vermífugo como uma “terapia baseada na baixa certeza de evidência” em documento disponibilizado pelo Conselho Indiano de Pesquisa Médica, órgão que aconselha as decisões do governo sobre a pandemia.

‘Falácia epidemiológica’

Para o médico infectologista da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), André Siqueira, a análise compartilhada na postagem é uma “falácia epidemiológica”. Ele explica que até o momento as principais evidências científicas indicam que a ivermectina não traz nenhum benefício clínico para pacientes com covid ou na prevenção da doença.

“Diversos fatores que não foram controlados podem estar relacionados. Não é possível dizer que foi o uso da ivermectina”, aponta o especialista.

Siqueira cita que a evolução dos dados da pandemia no estado indiano poderia sofrer a interferência de medidas restritivas de circulação ou mesmo da imunidade adquirida pelas pessoas infectadas e já recuperadas, cuja duração ainda é incerta para a ciência.

O estado de Uttar Pradesh instituiu lockdowns para conter a pandemia entre abril e junho de 2021, mostra esta matéria do India Today. Outras reportagens mostram que, em setembro, autoridades flexibilizaram um toque de recolher vigente no estado e relaxaram restrições a números de convidados em casamentos.

O médico e consultor da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), Julival Ribeiro, concorda que a associação do número de casos com um suposto efeito da ivermectina é insustentável. De acordo com ele, a forma adequada para avaliar os benefícios e segurança de um medicamento é por meio de ensaios clínicos randomizados duplo cego.

Neste tipo de estudo, voluntários são divididos em dois grupos: o primeiro recebe a terapia com o medicamento avaliado na pesquisa, o outro é submetido ao protocolo padrão ou recebe placebo (substância sem efeito). Os pesquisadores aplicam uma série de técnicas para minimizar ao máximo a possibilidade de fatores externos influenciarem nos resultados.

Eles estabelecem critérios rigorosos para selecionar pacientes, com o intuito de garantir que os voluntários presentes nos dois grupos tenham características mais similares possíveis. Nos estudos ‘duplo-cego’, nem pacientes, nem os médicos que aplicam o tratamento sabem quem tomou o medicamento e quem recebeu placebo.

“Não há indicação para uso da ivermectina contra a covid. O que sabemos é que quando você aumenta a cobertura de vacinação há um efeito na redução de hospitalizações e mortes pela doença”, destaca Julival Ribeiro.

Faltam evidências que comprovem o benefício da droga

Estudos laboratoriais com ivermectina mostraram um potencial efeito do fármaco contra o novo coronavírus em células animais. Como explicou o Comprova em verificações anteriores, os resultados observados nesse tipo de teste nem sempre são confirmados em ensaios clínicos com pacientes. Isso porque o organismo humano é muito mais complexo e envolve condições que não podem ser reproduzidas no laboratório.

No decorrer da pandemia, surgiram evidências contra e a favor de protocolos com a droga no tratamento da covid, mas as pesquisas conduzidas até o momento sofrem de limitações metodológicas que impedem os resultados conclusivos. Uma pesquisa que sugeriu resultados milagrosos da ivermectina contra a covid, por exemplo, foi retirada de uma plataforma de pré-publicação sob acusações de manipulação de dados pelos autores.

O painel de evidências dos Institutos de Saúde dos Estados Unidos (NIH) diz não recomendar contra nem a favor do uso do remédio. De acordo com o órgão, são necessários mais dados de ensaios clínicos bem conduzidos e estruturados. A Organização Mundial da Saúde (OMS) também afirma que as evidências são inconclusivas.

Até que mais informações estejam disponíveis, a entidade recomenda que o tratamento seja usado exclusivamente em ensaios clínicos. Também não há qualquer orientação para uso da droga de forma preventiva.

Julival Ribeiro destaca que um estudo recente indicou que a ivermectina não demonstrou capacidade de reduzir mortes ou tempo de hospitalização de pacientes com covid moderada. O especialista lembra que uma pesquisa ainda em andamento conduzida pela Universidade de Oxford deve fornecer dados sólidos sobre a questão.

O mesmo estudo já testou a eficácia de outros tratamentos para covid e não encontrou, por exemplo, benefícios do antibiótico azitromicina. Ribeiro alerta que a automedicação com ivermectina pode ser perigosa.

“Temos relatos de pessoas que tiveram problemas hepáticos [no fígado] por uso contínuo do medicamento”, alerta o especialista.

Por que investigamos?

Em sua quarta fase, o Comprova verifica conteúdos suspeitos sobre pandemia, políticas públicas do governo federal e eleições. O tuíte verificado aqui teve mais de 2,8 mil interações entre curtidas e retuítes.

Conteúdos que induzem o público a desacreditar na eficácia das vacinas ou incentivar o uso de medicamentos sem eficácia comprovada são perigosos porque podem levar a população a colocar a saúde em risco.

Assim como o Comprova que já verificou posts que mostram que estudo é insuficiente para comprovar eficácia da ivermectina, veículos como o Aos Fatos e o Estadão também verificaram publicações sobre o vermífugo.

Enganoso é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Saúde

Investigado por: 2021-09-24

Site usa título sensacionalista sobre morte de vacinados contra a covid e engana leitores

  • Enganoso
Enganoso
Título alarmista usado em publicação destoa do teor do texto, retirado de portal jornalístico, e engana leitores, que questionam a eficácia da vacinação.
  • Conteúdo verificado: Publicação de site com o título “BOMBA: Mais de 19 mil pessoas já morreram após tomar duas doses da vacina, mostra levantamento”, que reproduz matéria jornalística publicada originalmente com outro título.

É enganoso o título alarmista utilizado por um site na publicação de um texto sobre a morte de pessoas que já foram vacinadas contra a covid-19.

A reportagem foi copiada do Portal Metrópoles, que a publicou com um título totalmente diferente: “Mortos após imunização chegam a 19 mil. Entenda por que isso não reduz importância da vacinação”.

O texto traz, além dos dados, a fala de diversos especialistas, que explicam como funcionam as vacinas e porque as restrições sociais e sanitárias ainda são importantes para reduzir a circulação do novo coronavírus.

Uma análise dos comentários feitos sobre a matéria verificada, porém, mostra que boa parte dos leitores não acessou o conteúdo completo e compartilhou o link apenas com base no título — que induz a um questionamento da eficácia dos imunizantes contra a covid-19.

Em contato com o Comprova, um dos responsáveis pelo site disse que todos os títulos de publicações possuem palavras chamativas, como a expressão “bomba!”, mas todo o conteúdo é checado e os comentários de leitores sobre as matérias são monitorados.

Para o Comprova, é enganoso o conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Como verificamos?

O primeiro passo da reportagem foi analisar o conteúdo publicado pelo site. Como o texto fazia referência ao Portal Metrópoles, o Comprova fez uma pesquisa e chegou à publicação original sobre o assunto.

Após comparar as informações e conferir que se tratava de uma reprodução, a equipe passou à análise do título que, no site aqui verificado, tem um tom alarmista, contraditório à publicação do próprio veículo e também bastante diferente do Metrópoles.

Para verificar o impacto do título no leitor, o Comprova leu diversos comentários referentes à publicação do Terra Brasil Notícias e constatou que boa parte dos perfis se deteve na informação contida no título.

A equipe também fez contato com o site para entender por que razão a reportagem é acompanhada de um título com um enfoque tão diferente da matéria.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 24 de setembro de 2021.

Verificação

Texto original

O texto publicado pelo site Terra Brasil Notícias é uma cópia exata de parte de uma reportagem do portal Metrópoles, do dia 17 de setembro, assinada por Lucas Marchesini. O título original, porém, tem o tom inverso ao usado pelo Terra Brasil Notícias: “Mortos após imunização chegam a 19 mil. Entenda por que isso não reduz importância da vacinação”.

O texto original também é mais longo do que o publicado no site Terra Brasil Notícias, e traz informações sobre a faixa de idade das pessoas que, mesmo vacinadas, morreram devido à covid. Segundo a reportagem, a maioria das vítimas era idosa, com idade entre 61 e 97 anos. O médico sanitarista e consultor da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI) Julival Ribeiro, ouvido na matéria, explica que a resposta do organismo às vacinas diminui nas pessoas mais velhas – o que torna necessária uma terceira dose.

Além disso, a reportagem aponta que o surgimento de novas cepas também pode comprometer a eficácia de imunizantes já disponíveis. “Conjugados com o avanço da vacinação, os protocolos sanitários garantem uma redução mais expressiva na circulação da doença, protegendo as pessoas com imunidade mais baixa e também diminuindo a probabilidade de surgimento de novas variantes”, diz o texto.

O texto do Terra Brasil Notícias também omite todos os links que estavam no texto original e que ajudam a dar mais contexto à reportagem publicada pelo Metrópoles.

Os leitores

Embora o texto do site aponte elementos que demonstram a importância da vacinação contra a covid-19, o título induz muitos leitores a uma ideia equivocada sobre a imunização ao destacar o número de mortes após duas doses a uma “bomba”. Uma notícia bombástica, no meio jornalístico, é uma expressão que carrega em seu significado uma grande revelação ou denúncia.

E essa indução é fácil de ser constatada pelos inúmeros comentários que a matéria recebeu na publicação no Twitter, como o do usuário que escreveu: “E agora, quem é o responsável? Vacina sem eficácia usando o povo de cobaia”.

Ou a internauta que marca outro perfil para chamar a atenção para a matéria: “Veja a quantidade de pessoas que já morreram após tomar as vacinas: 19 mil.”

Tem ainda o perfil que pergunta: “Adiantou a vacina? E completa: “Ainda é permitido questionar ou a pergunta é absurda?”

Diante da matéria, um usuário conclui que os mortos de covid eram um alarde e que os mortos vacinados não têm importância. “Durma-se com esse barulho”, comenta.

Outro também faz uma ilação: “Vão dar um jeito de pôr na conta do Bolsonaro, pode crer.”

Esses são alguns dos comentários que sugerem que essas pessoas leram apenas o título, que nada tem a ver com o tom da reportagem. Uma pesquisa divulgada pela revista Galileu, há dois anos, já demonstrava que a maioria dos leitores de títulos tinha pouca informação, mas confiança em excesso sobre os seus conhecimentos.

E mesmo quando algum perfil tenta explicar, como o que menciona o percentual de mortes em comparação ao número de vacinados, há outros que retrucam, a exemplo do que escreveu: “0,02% de pessoas mortas pela vacina é grave, não é 0,02% baixa eficácia, é diferente… nenhuma fabricante colocou no estudo que pessoas morreriam por causa da vacina, ou colocou?”

Vale ressaltar que, diferentemente do que afirma o internauta em seu comentário, os números não estão relacionados a mortes provocadas pela vacina. Os óbitos registrados são de pessoas que, após duas doses, contraíram o coronavírus e morreram. O trecho da reportagem do site diz o seguinte: “O número de vacinados que terminariam como vítimas da doença é pequeno (0,02% do total) diante da quantidade de 72,8 milhões de pessoas protegidas contra a doença ou do total de mortes por conta do coronavírus, de 588,6 mil”. Mesmo assim, ele é utilizado por ativistas antivacinas para criticar a aplicação do imunizante.

Outro aspecto a ser observado é que, na página do site no Instagram, não há link para o texto. O único destaque é para o título que, como já mencionado, induz o leitor a uma interpretação errada sobre a vacina contra a covid-19.

O que diz o site?

O Comprova procurou o site Terra Brasil Notícias para saber o porquê do termo “bomba” no título; se eles perceberam o efeito causado em seus leitores e se, após a repercussão, houve uma revisão editorial.

Em resposta ao e-mail enviado pela nossa equipe, e em conversa pelo WhatsApp, o diretor e editor do site, Júnior Melo, que também é advogado e jornalista, informou que, “nossa linha editorial faz esse chamamento para a maioria de nossas notícias. Qualquer notícia que tenha maior relevância social, sempre chamamos atenção através de títulos superlativos: ‘bomba, lascou, deu ruim’ e etc.”

Júnior Melo ressaltou ainda que, “outras vezes, quando a notícia é mais amena, a equipe coloca uma “pitada de irreverência”. “Esse é nosso diferencial jornalístico, com notícias sempre checadas e que temos zelo pelo nosso trabalho de sempre passar a notícia verdadeira.”

Levantamento recente do Net Lab da Universidade Federal do Rio de Janeiro revela que o Terra Brasil Notícias é o mais compartilhado por bolsonaristas em grupos de WhatsApp e Telegram. Fundado há pouco mais de um ano, por um casal de Mossoró (RN), chegou a ter 12 milhões de visitas em julho, segundo reportagem publicada pela Folha de São Paulo em 16 de agosto deste ano.

Parte do conteúdo publicado copia notícias de veículos tradicionais e replica com um viés conservador. As postagens são alvos frequentes de checagens do Projeto Comprova, como o post que dizia que a ginasta Rebeca Andrade se apresentou ao som do “Funk de Bolsonaro”.

Por que investigamos?

Em sua quarta fase, o Comprova investiga conteúdos suspeitos sobre políticas públicas do governo federal, eleições e pandemia que tenham viralizado nas redes sociais, como é o caso desta publicação. Ela teve mais de 2 mil interações, no Twitter e Facebook, até o dia 24 de setembro.

Apesar de o conteúdo do texto ser verdadeiro, o tom alarmista do título induz o leitor a associar as 19,3 mil mortes como um efeito das vacinas contra a covid-19. Além disso, o site reproduz apenas parte da reportagem publicada originalmente pelo portal Metrópoles, omitindo o perfil dos mortos — idosos — e a análise dos especialistas.

O Comprova vem mostrando conteúdos enganosos e falsos sobre as vacinas, como a postagem sugerindo que a morte de uma adolescente de 16 anos, moradora de São Bernardo do Campo (SP), teria relação com a vacina da Pfizer. Ou a afirmação do médico americano Ryan Cole, de que as vacinas provocam aumento dos casos de câncer.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e publicado de modo que seu significado sofreu alterações, induzindo a uma interpretação diferente da intenção do autor. O conteúdo publicado confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Saúde

Investigado por: 2021-09-23

Vacinas contra covid-19 não provocam câncer, diferentemente do que afirma médico dos EUA

  • Enganoso
Enganoso
É enganoso vídeo publicado no Telegram em que médico afirma estar observando aumento de casos de câncer do endométrio e outras doenças em pessoas que se imunizaram contra a covid-19.
  • Conteúdo verificado: Vídeo publicado no Telegram em que médico norte-americano afirma ter observado aumento em 20 vezes dos casos de câncer de endométrio em pessoas que se vacinaram contra o Sars-Cov-2. Segundo ele, outras doenças também estão se tornando mais frequentes nesse público.

É enganoso vídeo publicado no Telegram em que o médico norte-americano Ryan Cole afirma ter observado aumento em 20 vezes dos casos de câncer do endométrio em pacientes vacinados contra o novo coronavírus. O médico também diz que percebeu uma diminuição na capacidade do sistema autoimune de matar células infectadas nesse público e cita o aumento também de outras doenças, como herpes e HPV. Na realidade, as vacinas contra o coronavírus não são capazes de provocar tais doenças.

As vacinas desenvolvidas para combater a covid-19 são seguras e eficazes, como também são responsáveis por aumentar a produção de células-T, também conhecidas como “células de memória”, que produzem anticorpos, para defender o corpo do vírus. Ou seja, diferentemente do que afirma o médico, os imunizantes não baixam a imunidade nem facilitam o surgimento de novas doenças, mas, sim, protegem o corpo contra o coronavírus.

No Brasil – o vídeo verificado aqui viralizou em um grupo de brasileiros – não há nenhuma indicação de que as vacinas em uso possam afetar a capacidade do corpo de se proteger de outras doenças, segundo a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Isso vale tanto para os estudos científicos, testes clínicos ou no monitoramento que o órgão faz das reações aos imunizantes.

Ouvida pelo Comprova, a médica Monica Levi, presidente da Comissão de Revisão de Calendários de Vacinação da SBIm (Sociedade Brasileira de Imunizações), também disse que as alegações do americano são um argumento antigo de grupos antivacinas já desmentidos pelos cientistas. Segundo ela, não só não há registro de que os imunizantes prejudiquem o sistema imune como há, inclusive, estudos que sugerem que eles podem fortalecer a defesa do corpo contra outras infecções além daquela para a qual o composto foi desenvolvido. Ela também lembra que não há registro na literatura médica de que as vacinas possam provocar câncer.

Procurado, o médico não respondeu até a publicação deste texto. O Comprova considerou o conteúdo enganoso porque Cole usa dados que induzem a uma interpretação errada – de que as vacinas são prejudiciais, como mostram alguns comentários da publicação. Uma pessoa escreve, por exemplo, ter esperança de que a campanha de imunização seja cancelada para menores de 30 anos no Brasil; outra, conta que não vai se vacinar.

Como verificamos?

O Comprova buscou informações sobre o médico Ryan Cole. Em uma pesquisa na internet, encontramos o site da clínica do médico e links de matérias feitas por outras agências de checagem e portais de notícias sobre as informações sem fundamento de Cole.

Para checarmos a fundamentação dos dados citados pelo médico durante o vídeo, entramos em contato via mensagem, pelo site do laboratório, mas não recebemos a confirmação no nosso e-mail. Então, escrevemos via perfil do Facebook do laboratório – não houve retorno até a publicação deste texto.

Também procuramos a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para saber se há algum indício de que as vacinas em uso no Brasil tenham efeito negativo sobre o sistema imune.

Por fim, entrevistamos a médica Monica Levi. presidente da Comissão de Revisão de Calendários de Vacinação da SBIm (Sociedade Brasileira de Imunizações).

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 23 de setembro de 2021.

Verificação

Quem é Ryan Cole

Ryan Cole é um dermatologista norte-americano especializado em patologia. Atua como CEO do laboratório Cole Diagnostics, focado em serviços de laboratório clínico e patologias.

Cole integra a Associação de Médicos Independentes do estado de Idaho, grupo formado em 2013 por profissionais que possuem suas próprias práticas médicas, com “liberdade de diagnosticar e tratar sem sobrecarga de interesses potencialmente conflitantes”, segundo define o site da organização.

“Somos uma organização de médicos independentes em Idaho. Donos de nossas clínicas, portanto, livres para nos juntar a nossos pacientes na escolha de suas melhores opções de cuidados de saúde”, diz o site.

Cole já havia questionado a eficácia e segurança das vacinas contra a covid-19. Suas declarações foram checadas e desmentidas pela FactCheck.Org.

Impacto das vacinas nas células-T

Para entender como as vacinas contra a covid-19 funcionam no corpo, é importante entender a função das células T, citadas por Cole e também conhecidas como linfócitos T ou glóbulos brancos.

São elas que entram em ação de forma rápida, caso o corpo encontre o mesmo vírus mais de uma vez. Por essa razão, também são chamadas “células de memória”, por efetivar as respostas antivirais com ataque às células que já foram infectadas.

Quando os vírus familiares são detectados pelas células T, fica a cargo dos linfócitos B — glóbulos brancos defensivos — produzirem anticorpos para atacá-los.

Os imunizantes são seguros e funcionam de maneiras distintas, a depender da tecnologia empregada para fabricação.

De maneira geral, eles agem para deixar o corpo com um suprimento extra de linfócitos T — para memorizar quais vírus devem ser combatidos — e linfócitos B — que saberão como executar esse combate.

A proteção das vacinas ocorre dentro de algumas semanas e, por isso, algumas pessoas podem ser infectadas com a covid-19 imediatamente após a aplicação da dose, ou antes da vacinação, pelo intervalo curto entre a aplicação da vacina e a produção de anticorpos.

Assim, a função das células T, presente nos imunizantes contra o coronavírus, é a de aumentar a imunidade contra a doença.

Por essa razão, é falsa a afirmação do patologista Ryan Cole sobre a queda do sistema imune do corpo após a aplicação da vacina. O médico antivacina afirma ainda que a aplicação das doses favorece o aparecimento de doenças autoimunes e o câncer, o que não é verdade.

Em outra ocasião, Cole havia indicado um artigo de 2018, publicado pela revista Nature Reviews Drug Discovery, para sustentar a tese de que as vacinas provocavam câncer. Ao FactCheck.Org, o autor principal do artigo, Norbert Pardi, afirmou que em nenhum momento a publicação demonstra que as vacinas de mRNA causam câncer ou doenças autoimunes.

Autoridades

Ao Comprova, a Anvisa afirmou que “não há indicações a partir dos estudos científicos e estudos clínicos ou ainda do monitoramento de notificações de que as vacinas contra covid-19 possam afetar a capacidade do organismo humano em responder contra outras doenças”. “Pelo contrário, as vacinas são consideradas seguras e com relação de benefício-risco positiva”, prossegue o órgão de segurança sanitária brasileira.

Segundo a médica Monica Levi, o discurso de que as vacinas sobrecarregam o sistema imune e baixam a imunidade é uma alegação antiga do movimento antivacina que já foi desmentida pela ciência. Ela explica que mesmo antes da pandemia já existiam dados que mostravam que a vacinação auxilia a resposta imune.

“Quando você pega um recém-nascido, ele em poucas horas está totalmente colonizado e tem que responder a um monte de estímulos antigênicos, em uma quantidade muito maior do que a carga antigênica de qualquer vacina”, diz Levi. “Além disso, cálculos matemáticos mostram que se 11 vacinas fossem aplicadas ao mesmo tempo numa criança, isso ativaria aproximadamente 0,1% do sistema imune”, afirma ainda.

De acordo com a especialista, também há indícios nas pesquisas científicas de que os imunizantes em geral possam ter exatamente o efeito contrário do que afirma o conteúdo verificado pelo Comprova. Isso porque entre as várias defesas ativadas pelos antígenos presentes nas vacinas, está uma barreira de resposta inespecífica, que pode atenuar outras infecções.

“Há estudo mostrando que crianças recém-vacinadas estão menos suscetíveis a vírus respiratórios, por exemplo”, ela cita. Embora os pesquisadores ainda trabalhem em estudos mais conclusivos sobre o efeito da resposta inespecífica, o tema já era bastante conhecido no ambiente científico mesmo antes da pandemia, diz Levi.

A médica também diz que jamais houve registro de aumento de câncer em pessoas vacinadas. “Muito pelo contrário. Em relação ao câncer, nós temos a vacina do HPV e da hepatite B. E a gente tem visto os resultados delas há muito tempo: a redução do câncer de colo de útero e a redução do câncer de fígado nas populações vacinadas”, lembra.

Segundo o Centro de Controle de Doenças dos Estados Unidos (CDC na sigla em inglês), as vacinas trabalham estimulando o sistema imune a produzir anticorpos, exatamente como acontece quando você é exposto à doença. Depois de ser vacinado, você desenvolve imunidade àquela doença sem ser infectado por ela.

Em um vídeo publicado em fevereiro deste ano, o médico Paul Offit, do Children’s Hospital of Philadelphia, explica porque as vacinas de RNA contra a covid-19 não comprometem o sistema imune.

“O RNA mensageiro entra nas células e, em essência, é transformado numa proteína. Nesse caso, a proteína spike do Sars-CoV-2, que se conecta com a superfície da célula. Assim, a célula produz a proteína spike. Enquanto a célula está produzindo a proteína spike, ela também está fazendo uma variedade de outras proteínas usando o RNA mensageiro do corpo, nenhuma das quais afeta o sistema imune negativamente. Nenhuma dessas proteínas deve desregular o sistema imune ou causar uma perturbação nele”, ele argumenta.

“Na verdade, ocorre exatamente o oposto. A vacina contra o Sars-CoV-2 não enfraquece o sistema imune, mas o fortalece. Porque agora finalmente você tem anticorpos contra esse vírus que pode causar uma infecção severa e ocasionalmente fatal”, conclui.

Por que investigamos?

Em sua quarta fase, o Comprova investiga conteúdos suspeitos sobre políticas públicas do governo federal, eleições e pandemia que tenham viralizado nas redes sociais, como é o caso deste vídeo, visualizado 42,2 mil vezes até 22 de setembro.

A verificação foi sugerida pelos leitores, por meio do número 11 97045-4984, pelo qual os usuários podem enviar ao Comprova sugestões de conteúdos cuja veracidade esteja sendo questionada.

O vídeo é prejudicial, pois desinforma ao dizer, erroneamente, que a vacina pode causar doenças. Fazendo isso, o conteúdo coloca a população em risco, pois pessoas que acreditam nele podem deixar de se vacinar, e o imunizante é a principal ferramenta contra a covid-19 atualmente.

O Comprova vem mostrando conteúdos enganosos sobre as vacinas, como o post que afirmava que empresas não exigem vacinação e que CEO da Pfizer não se imunizou e o vídeo em que médico dizia que imunizantes não são eficazes contra a variante dela.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Saúde

Investigado por: 2021-09-22

Morte de adolescente não tem relação causal com vacina da Pfizer, ao contrário do que sugere tuíte

  • Enganoso
Enganoso
Tuíte engana ao sugerir que a vacina da Pfizer teria sido a causa da morte de uma adolescente de 16 anos. No dia em que o post foi publicado, o caso era considerado suspeito e estava sendo investigado, ou seja, não tinha nenhuma confirmação. Um dia depois, o governo de São Paulo afirmou que não há como atribuir relação causal entre a Púrpura Trombótica Trombocitopênica (PTT) – doença preexistente detectada na garota – e a vacina. Além disso, foi concluído que a paciente não apresentou qualquer doença cardiológica, como dito na sequência do tuíte.
  • Conteúdo verificado: Tuíte fala sobre a morte de uma adolescente e traz imagens dela com o cartão de vacinação: “essas fotos são da última semana de sua vida feliz”. Além disso, a mesma pessoa fez outros dois tuítes, com imagens de comentários feitos por uma página no Instagram, que sugerem que a vacina foi a causa da morte, mas ao mesmo tempo falam em infarto, anemia e choque cardiogênico.

É enganoso um tuíte que sugere que a causa da morte de uma adolescente de 16 anos, de São Bernardo do Campo (SP), foi a vacina contra a covid-19 da farmacêutica Pfizer. Comentários no post, em sua maioria criticando os imunizantes, mostram que os usuários também interpretaram que a vacina foi a responsável pelo falecimento.

No dia da publicação, uma nota da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) já dizia que os dados sobre a morte da garota ainda eram preliminares e necessitavam “de aprofundamento para confirmar ou descartar a relação causal com a vacina”. Dessa forma, o caso ainda estava sendo investigado.

No dia seguinte, o governo de São Paulo descartou a possibilidade e concluiu que não havia como atribuir relação causal entre a Púrpura Trombótica Trombocitopênica (PTT) – doença preexistente detectada na garota – e a vacina. Além disso, um grupo de especialistas do governo concluiu que a paciente não apresentou qualquer doença cardiológica, como dito no tuíte.

Segundo um infectologista consultado pelo Comprova, a PPT é uma condição que ocorre na infância e na adolescência em que o organismo apresenta uma queda de plaquetas.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo que usa dados imprecisos ou conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Procurada, a autora do post apenas disse, por mensagem, que “a família (da jovem) está tomando as providências necessárias para os fatos serem devidamente esclarecidos”.

Como verificamos?

O Comprova buscou informações nos sites oficiais dos órgãos do governo e em matérias publicadas em veículos jornalísticos.

Além disso, pediu posicionamentos da Anvisa, Ministério da Saúde, Pfizer, Hospital Vida’s Alta Complexidade – onde a jovem faleceu – e conversou com especialistas: o infectologista pediátrico do Grupo Prontobaby (rede de hospitais pediátricos com 4 unidades no Rio de Janeiro) e professor da Universidade Federal Fluminense (UFF) André Ricardo Araújo da Silva e com o virologista, coordenador do curso de biomedicina do Instituto Brasileiro de Medicina e Reabilitação (IBMR) e membro da Rede do Centro de Informações Estratégicas de Vigilância em Saúde Raphael Rangel.

O Comprova chegou até a família da adolescente depois de entrar em contato com um repórter que entrevistou a mãe dela para um jornal do ABC Paulista.

Cristiane Borges, a mãe, nos enviou um áudio em que afirmou não ter condições de dar detalhes e passou o telefone de uma amiga, identificada como Juliana, que estaria acompanhando o caso.

Em seguida, pelo WhatsApp, Juliana disse que a adolescente não tinha doenças preexistentes, mas se recusou a encaminhar o atestado de óbito por, segundo ela, ser uma decisão dos advogados.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 21 de setembro de 2021.

Verificação

A autora do post verificado sugere que a causa da morte da adolescente foi a vacina. Na publicação, é possível notar inúmeros comentários negativos sobre os imunizantes, como: “Meu filho tem 6 anos, vai pra igreja, supermercado e escola. Nunca perdeu um dia de aula e… Não será vacinado. Não matarei meu filho com uma picada”; “Estamos em um pais (sic) que somos obrigados a ser cobaia destes crapula (sic) da medicina…que Deus possa confortar a família”; “Que tristeza. A minha filha não vai tomar de jeito nenhum”.

No dia em que o post foi publicado, 16 de setembro, havia apenas a suspeita de que a morte poderia estar relacionada com a vacina da Pfizer, sem nenhuma comprovação. A Anvisa disse em nota, na mesma data, que “os dados recebidos ainda são preliminares e necessitam de aprofundamento para confirmar ou descartar a relação causal com a vacina”. Dessa forma, o conteúdo aqui verificado já era enganoso por levar à interpretação de que a morte teria sido pela vacina quando, na verdade, nada estava confirmado.

Um dia depois, 17 de setembro, um comunicado divulgado pelo governo de São Paulo trazia a conclusão de que a morte da adolescente não foi causada pela vacina. O diagnóstico apontou que a causa do óbito, sete dias após a jovem ser imunizada, foi uma doença autoimune, grave e rara, conhecida como Púrpura Trombótica Trombocitopênica. Segundo o infectologista pediátrico André Ricardo Araújo da Silva, a PTT é uma condição que ocorre normalmente na infância, podendo se manifestar na adolescência, em que o organismo apresenta uma queda de plaquetas, um dos componentes do sangue envolvido na coagulação. De acordo com o especialista, a doença é a forma mais comum de queda de plaquetas e, na grande maioria dos casos, é um fenômeno benigno, permitindo que a pessoa se recupere bem. Mas existem alguns casos que, mesmo com tratamento, não evoluem de forma satisfatória.

“Existe um pico, que vai mais ou menos de 2 a 5 anos (de idade), que é a incidência maior, mas pode ocorrer também em adolescentes. A causa da PTT ainda é desconhecida, parece ser um fenômeno imune que ocorre no organismo, mas há algumas relações de como a pessoa adquire. Algumas infecções, como HIV, mononucleose ou outras doenças autoimunes, como lúpus, podem desencadear esses sintomas”, afirmou.

Dentre os 70 profissionais que participaram do diagnóstico da adolescente, estavam especialistas em Hematologia, Cardiologia, Infectologia, médicos dos Centros de Referência para Imunobiológicos Especiais (CRIEs) do Estado e representantes dos municípios de São Bernardo do Campo, Santo André e São Paulo. O Centro de Informações Estratégicas em Vigilância em Saúde (CIEVS) estadual também contribuiu para a análise.

Segundo o texto do comunicado, “não é possível atribuir diretamente a doença e óbito à vacinação” e “tal caso não pode ser usado como justificativa para alterar a estratégia de vacinação de adolescentes sem comorbidades”. A doença é rara e grave e não tem “uma causa conhecida capaz de desencadeá-la”, sendo assim “não há como atribuir relação causal” entre ela e as vacinas de RNA mensageiro, como é o caso da Pfizer.

No mesmo dia, a Anvisa informou que se reuniu com a Pfizer, mas no encontro não foram apresentadas novas informações sobre o caso. De acordo com a agência, “até o momento, os achados apontam para a manutenção da relação benefício versus risco para todas as vacinas autorizadas no Brasil, ou seja, os benefícios da vacinação excedem significativamente os seus potenciais riscos”.

Na segunda-feira (20), a agência confirmou a inexistência de relação causal. Segundo nota, representantes da área de Farmacovigilância da Anvisa se reuniram com membros da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo e técnicos do Centro de Vigilância Sanitária e Centro de Vigilância Epidemiológica e concluíram que os dados apresentados pelo governo paulista são “consistentes e bem documentados”.

Procurada pelo Comprova, a Anvisa afirmou que até 15 de setembro houve 32 notificações de eventos adversos de diferentes tipos após a vacinação de adolescentes com a Pfizer, mas nenhum óbito foi relacionado ao produto.

Em nota enviada ao Comprova, a farmacêutica informa estar ciente de relatos raros de miocardite e pericardite, além de outros possíveis eventos adversos, após a aplicação de vacina e leva o acompanhamento e monitoramento desses casos “muito a sério”. Sobre o caso específico do óbito da adolescente em São Bernardo do Campo, diz estar acompanhando e reafirmou que não foi estabelecida uma relação causal entre o ocorrido e o imunizante.

Suspensão

O caso da adolescente foi usado como uma das justificativas do Ministério da Saúde para recomendar a suspensão da imunização em adolescentes sem comorbidades em 16 de setembro. A própria Anvisa, entretanto, manteve a recomendação de vacinação neste grupo, com base em evidências científicas avaliadas e aprovadas pelo órgão.

O ministro Marcelo Queiroga atribuiu o recuo a dúvidas sobre a segurança e eficácia dos imunizantes em adolescentes. O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e seus apoiadores pressionaram Queiroga a rever as regras.

Na noite do dia 16, Queiroga enviou um áudio ao programa “Os Pingos nos Is”, da rádio Jovem Pan, no qual afirmou que adolescentes “sem comorbidade, no momento, não serão considerados para a vacinação para a covid”. A gravação era uma resposta às críticas do programa sobre a vacinação dos jovens. Um dos motores da campanha para não vacinar ainda os adolescentes é Ana Paula Henkel, ex-atleta de vôlei e comentarista da rádio.

A medida foi alvo de críticas. Segundo a Folha, o presidente do Conass (Conselho Nacional de Secretários de Saúde) e secretário de Saúde do Maranhão, Carlos Lula, disse que a decisão de restringir a vacinação dos adolescentes é o maior golpe que o PNI (Programa Nacional de Imunizações) recebe em quase 48 anos de atividades.

“Sempre achei que a gente poderia perder esse patrimônio diante de tudo isso que aconteceu no combate à pandemia, mas não [por gesto] vindo de um ministro da Saúde”, afirmou o secretário.

A Anvisa e especialistas recomendam a vacinação de todos entre 12 e 17 anos. A OMS (Organização Mundial da Saúde) diz que a vacinação de adolescentes não é prioridade, mas tendo vacinas, reforça que todos devem se vacinar.

A Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) também divulgou nota de posicionamento em que reafirma a recomendação de vacinar esse público.

Em 20 de setembro, o Ministério da Saúde concluiu, após sete dias de investigação, que a morte ocorreu por Púrpura Trombocitopênica Trombótica, que diz respeito a um distúrbio autoimune.

As informações foram divulgadas pela coluna da jornalista Mônica Bergamo, da Folha de S. Paulo, a partir de uma entrevista com o ministro Marcelo Queiroga.

O ministro ainda afirmou que “mesmo que o caso estivesse vinculado ao imunizante, isso não invalidaria a vacinação [desta faixa etária]. Os benefícios são infinitamente maiores do que os riscos”.

Reportagem do Estadão mostra que, desde o início da pandemia, 7.063 adolescentes foram internados com covid-19 no Brasil. Destes, 60% eram saudáveis, sem nenhum fator de risco para a doença, e 657 morreram. Especialistas ressaltam que os sobreviventes ainda precisam se recuperar das sequelas.

A conclusão do caso, no entanto, não deve fazer o ministério voltar a indicar a vacinação de adolescentes de forma imediata. O ministro afirma que talvez seja necessário segurar o freio por uma questão de “priorização e logística”.

Quem é a adolescente?

Isabelli Borges era de São Bernardo do Campo (SP). Ela, que tinha 16 anos, tomou a vacina no dia 25 de agosto de 2021. O Comprova chegou até a família da adolescente por meio de um repórter que entrevistou a mãe dela para um jornal do ABC Paulista.

Cristiane Borges, a mãe de Isabelli, nos enviou um áudio em que afirmou não ter condições de dar detalhes. A foto do perfil do Whatsapp dela é uma imagem da filha ainda criança. Ela passou o contato de uma amiga, identificada como Juliana, que estaria acompanhando o caso.

Segundo Juliana, após receber a primeira dose do imunizante, Isabelli apresentou algumas reações. Os detalhes sobre o caso foram reportados ao site Vigimed, da Anvisa, e no site da Pfizer, segundo ela.

A jovem foi ao Hospital Coração de Jesus, no ABC paulista, e depois transferida para o Hospital Vida’s Alta Complexidade, na cidade de São Paulo. Após alguns exames, foi informado que a vacina teria “roubado” hemácias e hemoglobinas dela.

Raphael Rangel, do IBMR, afirma que é infundado o argumento de que a vacina “roubou” hemácias e hemoglobinas. Segundo o especialista, isso é impossível de acontecer no mecanismo do imunizante de RNA mensageiro, como a da Pfizer. “Lembrando que a vacina tem por finalidade estimular a produção de anticorpos, então, não tem nenhum tipo de ligação com a questão hematológica do paciente”, afirmou.

Por três vezes, o Comprova solicitou mais informações sobre Juliana, como sobrenome, ocupação e a relação que mantém com a família da adolescente (duas direcionadas a ela e uma terceira a Cristiane), mas não obteve resposta.

Atestado de óbito

Em 2 de setembro de 2021, Cristiane foi chamada ao hospital, onde foi informada sobre a morte da filha.

“Os médicos relataram para a mãe que a jovem sofreu dois infartos, tendo sido descrito na certidão de óbito: ‘Choque cardiogênico, infarto agudo do miocárdio e anemia severa’. É importante ressaltar que ela era uma jovem saudável, não tinha comorbidades, não estava com covid e não tinha anemia”, disse Juliana.

No entanto, a nota do governo de São Paulo ressalta que o grupo de especialistas concluiu que a paciente não apresentou qualquer doença cardiológica e que o quadro clínico e os exames complementares sugerem Púrpura Trombótica Trombocitopênica.

O Comprova pediu para ter acesso ao atestado de óbito da adolescente e foi informado pela amiga da família que, no momento, não era possível “compartilhar nenhum documento” e que o caso está nas mãos dos advogados. A equipe pediu o contato desses advogados, mas não obteve resposta.

“A família tomará as providências necessárias para esclarecer a verdade”, afirmou Juliana, ao ser questionada sobre o posicionamento da família diante da conclusão feita pelo Ministério da Saúde que afastou a possibilidade de a morte ter relação com a vacina da Pfizer.

Procurado pelo Comprova, o Hospital Vida´s Alta Complexidade enviou uma nota, na qual confirma que a jovem esteve internada no local e faleceu, pois “não resistiu aos procedimentos adotados”. Apesar de ter sido solicitado, pelos verificadores, o atestado de óbito, eles não quiseram passar e não deram mais informações sobre a causa da morte, pois “toda e qualquer informação referente ao caso deverá (se assim, concordarem) ser respondida pelos responsáveis da menor”, e que, “obviamente, não fomos autorizados a divulgar mais informações, tampouco o laudo mencionado no atestado de óbito”.

Autora do post

Apoiadora do presidente Jair Bolsonaro, Valeria Rozen Scher é psicóloga e ficou conhecida nas redes sociais após publicar vídeos em que se recusava a usar máscara ao andar na praia de Búzios, no Rio de Janeiro.

“Continuando a saga das arbitrariedades da pandemia. Pode me prender, mas não vou colocar a p* da máscara!”, escreveu no Twitter em 8 de agosto de 2020. O perfil dela na plataforma conta com mais de 29 mil seguidores.

Em dezembro de 2020, Valeria desejou que 2021 fosse um ano “sem distanciamento e isolamento”. A psicóloga bolsonarista disse ainda que tem orgulho de estar entre as pessoas que não aceitam as medidas restritivas.

O uso de máscaras foi recomendado pela OMS para fornecer uma barreira contra as gotículas potencialmente infecciosas da covid-19. A organização deixou claro, no entanto, que apenas as máscaras não seriam suficientes para combater a pandemia, sendo necessário aliar o distanciamento social e a higiene das mãos. Mais tarde, quando as vacinas estavam disponíveis, o órgão passou a recomendá-las também.

O Ministério da Saúde do Brasil determina o uso obrigatório de máscaras para ambientes internos e externos, ficando a cargo dos estados e municípios determinar quais serão as punições aplicadas a quem descumprir a orientação.

Em postagens nas redes sociais, Valeria aparece ao lado de personalidades que apoiam o governo Bolsonaro em fotos e vídeos. Em um dos muitos registros ao lado da deputada federal Bia Kicis (PSL-DF), ambas aparecem para apoiar a candidatura de Alberto Szafran para vereador do Rio de Janeiro nas eleições de 2020.

A médica Nise Yamaguchi, que defende o uso de medicamentos comprovadamente ineficazes para combater a covid-19, também aparece ao lado de Valeria. A foto foi compartilhada em 2 de junho deste ano. Na legenda, ela detalha que a imagem é do dia em que conheceu Yamaguchi e que, no mesmo momento, estavam “entre amigos. Pessoas do bem, pensando em um país melhor”.

Procurada pelo Comprova, ela apenas disse, por mensagem, que “a família está tomando as providências necessárias para os fatos serem devidamente esclarecidos”.

Por que investigamos?

Em sua quarta fase, o Comprova verifica conteúdos suspeitos sobre pandemia, políticas públicas do governo federal e eleições. O tuíte verificado aqui teve mais de 8 mil interações.

Conteúdos que tentam desacreditar as vacinas ou minimizar os riscos da pandemia são perigosos porque podem levar a população a colocar a saúde em risco.

O Comprova já publicou diversos conteúdos sobre imunização, como o do médico que engana ao afirmar que as vacinas não funcionam contra a variante delta, o de post que desinforma afirmando que o CDC e Anthony Fauci não acreditam nos imunizantes e o de médica que engana ao afirmar que vacinas são experimentais.

Enganoso é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.