O Projeto Comprova é uma iniciativa colaborativa e sem fins lucrativos liderada pela Abraji e que reúne jornalistas de 42 veículos de comunicação brasileiros para descobrir, investigar e desmascarar conteúdos suspeitos sobre políticas públicas, eleições, saúde e mudanças climáticas que foram compartilhados nas redes sociais ou por aplicativos de mensagens.
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Saúde

Investigado por: 2021-11-26

Ativista antivacina espalha boatos sobre AVC em pilotos e aborto em palestra

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Falso
Ao contrário do que diz médica, as vacinas contra a covid-19 não contêm grafeno ou células de fetos abortados, a Fiocruz não comprou cofre de R$ 130 mil, não há comprovação de que tenha havido aumento de AVCs em pilotos ou de abortos em gestantes após inicio da campanha de vacinação. Além disso, vários estados norte-americanos aprovaram hidrólise alcalina antes da pandemia.
  • Conteúdo verificado: Trecho de palestra de uma médica na qual ela afirma que as vacinas são tóxicas, contêm grafeno e possuem células de fetos abortados, que espera-se aumento de pessoas demenciadas em decorrência da imunização e que houve aumento dos abortos entre mulheres e AVC entre pilotos de avião vacinados. A palestrante acrescenta, ainda, que estados norte-americanos aprovaram leis para dissolver os corpos porque há a expectativa de tantas mortes a ponto de não haver tempo para sepultamento ou cremação.

São falsas as diversas alegações feitas pela médica Maria Emília Gadelha Serra em relação às vacinas contra a covid-19 durante evento realizado no dia 14 de novembro de 2021 e gravado em vídeo que circula no WhatsApp, Twitter, Facebook e Telegram.

Na palestra, ela diz ter havido aumento de abortos entre mulheres vacinadas, o que é desmentido pelas evidências científicas mais robustas e também pela ginecologista Cecilia Roteli Martins, presidente da Comissão Nacional Especializada em Vacinas da Federação Brasileira de Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo), que afirmou ao Comprova não ter havido aumento de abortos durante a campanha vacinal.

Maria Emília Gadelha alega não ser seguro viajar de avião porque pilotos vacinados estariam tendo AVCs. A Associação Brasileira das Empresas Aéreas (ABEAR) e a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) negaram ao Comprova haver tais registros vinculados à vacina entre esses profissionais.

A médica também diz que estados norte-americanos estão aprovando a utilização da hidrólise alcalina para decompor cadáveres por conta de um falso aumento de mortes pós-vacinação. O método, contudo, foi aprovado por vários estados antes da pandemia e está ligado a preocupações ambientais.

Diz, ainda, que a Fiocruz “resolveu comprar” um cofre importado de R$ 130 mil para guardar contratos com a AstraZeneca, mas o órgão informou ao Comprova estar projetando um espaço para condicionamento de diversos documentos que possuem cláusulas em sigilo, não apenas com a farmacêutica citada. A fundação ainda não abriu licitação, portanto, não se sabe quanto isso irá custar.

Maria Emília repete, no discurso, afirmações amplamente desmentidas, como a de que as vacinas possuem grafeno na composição ou que sejam feitas a partir de células de fetos abortados.

O Comprova considera falso o conteúdo que é inventado e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.

Atualização: Esta verificação foi atualizada em 29 de novembro para incorporar resposta do Ministério da Saúde. A atualização não modificou a conclusão da investigação.

Como verificamos?

O Comprova identificou, inicialmente, em quais circunstâncias o vídeo foi gravado e confirmou que se tratava da médica Maria Emília Gadelha Serra fazendo as alegações.

Em seguida, entramos em contato com a Agência de Vigilância Sanitária (Anvisa), responsável pela liberação de imunizantes no país e por monitorar dados de segurança após as vacinas serem liberadas para a população. Pedimos informações ao Ministério da Saúde, que enviou a resposta após a publicação da reportagem.

Entrevistamos a ginecologista Cecilia Roteli Martins, presidente da Comissão Nacional Especializada em Vacinas da Febrasgo, para informar as evidências científicas mais robustas sobre vacinação em grávidas.

Procuramos a Anac e a ABEAR para checar as alegações referentes à vacinação de pilotos.

Contatamos a Fiocruz para perguntar se há processo de compra de um cofre no valor de R$ 130 mil para armazenamento de partes do contrato com a AstraZeneca.

Consultamos checagens anteriores do Comprova para resgatar informações de alegações que já haviam sido refutadas.

Por fim, entramos em contato com a médica que fez as alegações, mas não obtivemos resposta.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 26 de novembro de 2021.

Verificação

Abortos não tiveram aumento

As evidências científicas mais robustas mostram que é falso associar as vacinas contra a covid-19 e a incidência de abortos espontâneos, diz a ginecologista Cecilia Roteli Martins, da Febrasgo. Ela explica que abortos espontâneos são muito comuns entre a 12ª e a 14ª semana de gestação por vários motivos, como malformação e deficiência hormonal. “Não houve nenhum aumento de abortos durante a campanha vacinal em comparação com o período anterior à pandemia.”

A Anvisa disse que até o momento foram aplicadas 305 milhões de doses das vacinas e que o perfil de segurança encontrado nos estudos clínicos não foi alterado. “Não há indicação ou dados que apontem um aumento na ocorrência de abortos como resultado de reações a vacinas”, diz a nota.

Um estudo conduzido pelo Centro de Controle de Doenças (CDC) juntamente com nove sistemas de saúde dos Estados Unidos monitorou os casos de abortos espontâneos em gestantes vacinadas entre 15 de dezembro de 2020 e 28 de junho de 2021. Os resultados, publicados no Journal of the American Medical Association, mostram que não houve diferença estatisticamente relevante entre vacinadas e não-vacinadas.

As grávidas fazem parte do grupo que pode sofrer complicações mais graves da covid-19. A doença está associada a um número maior de mortalidade materna e risco de óbito fetal. Por isso, é importante que todas as gestantes se vacinem. O imunizante recomendado é o da Pfizer, em duas doses. “Relatórios do Ministério da Saúde mostram que as gestantes tomam a primeira dose, mas não retornam para a segunda, pois acreditam nas fake news que são disseminadas”, alerta a ginecologista da Febrasgo.

Empresas aéreas negam incidentes com AVC

A médica diz que “pilotos vacinados estão tendo AVCs” e que a malha aérea, militar e comercial, estaria “em risco”. A ABEAR informou que não existe nenhum registro de casos de AVC vinculados à vacina entre as associadas. Dentre elas, algumas das maiores companhias brasileiras como a Latam e a Gol. Em outubro, a associação já havia informado que todas as suas associadas tornarão obrigatória a vacinação contra a covid-19 de todos os seus funcionários até o final do ano.

Também procuramos a Anac, responsável por supervisionar a atividade de aviação civil no país. A agência afirmou que “desconhece tais informações”. Em março deste ano, a agência emitiu um comunicado aos médicos examinadores e serviços médicos de operadores aéreos recomendando o afastamento por 48 horas de pilotos que tenham sido vacinados contra a covid-19.

Na ocasião, afirmava que a orientação visava garantir a segurança das operações por conta de possíveis reações adversas, sem se referir ao AVC. “Embora a grande maioria dos efeitos colaterais relatados sejam leves e não coloquem em questionamento a segurança das vacinas aprovadas, eles podem ser potencializados em condições de voo, com ambiente hipóxico e hipobárico”.

Agora, ao ser procurada pelo Comprova, a Anac afirmou que o Ministério da Saúde é o órgão responsável pela emissão de recomendações médicas relacionadas à covid-19 para todos os setores e orientou que a reportagem o procurasse. 

Já Anvisa lembrou que a ocorrência de trombose é um evento adverso extremamente raro das vacinas de Adenovírus (Janssen e AstraZeneca) e que foi incluído na bula de ambos os imunizantes. Os eventos adversos mais comuns após a vacinação continuam sendo dor no local da aplicação, dor de cabeça e febre.

O órgão ressaltou que o AVC pode ter diversas causas e que “somente uma investigação de um caso concreto poderia apontá-las”.

A aplicação da vacina em pilotos é recomendada pelo Ministério da Saúde. Os trabalhadores do transporte aéreo foram classificados como grupo prioritário pelo Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a covid-19. São considerados tanto os funcionários de companhias aéreas quanto de aeroportos.

Em nota, o ministério informou que monitora a segurança e a efetividades de todas as vacinas incorporadas ao Programa Nacional de Imunizações (PNI). “A pasta ressalta que, até o momento, não foi identificada relação de causalidade entre a imunização contra a covid-19 e os casos citados”, diz.

Em junho deste ano, o Estadão Verifica já informou ser seguro para os imunizados contra a covid-19 viajarem de avião, ao contrário do que dizia um site antivacina. Na ocasião, afirmava-se falsamente que os vacinados poderiam desenvolver trombose, o que também foi negado pela Lupa.

Hidrólise alcalina é adotada nos Estados Unidos como alternativa ecológica

A adoção do método de dissolver corpos nos Estados Unidos é anterior à pandemia e não tem nada a ver com a vacinação contra a covid-19, como defende o discurso da médica aqui verificado.

Trata-se, na verdade, de um debate ecológico, como explica detalhadamente uma reportagem do Huffpost, apontando que a cremação, que libera carbono, é atualmente a prática mais popular de atendimento ao óbito no país, seguida do sepultamento, que muitas vezes utiliza embalsamento e tecido sintético. Ambos os processos envolvem matérias-primas e têm efeitos colaterais potencialmente perigosos ao meio-ambiente.

Em 2017, portanto antes da pandemia, a BBC esteve em uma funerária norte-americana em Minnesota que já realizava o processo. Na ocasião, um dos diretores, Jason Bradshaw, explicou que o método se trata da reprodução da decomposição natural pela qual o corpo passa quando é enterrado, mas de forma muito mais rápida.

Conforme ele, uma máquina pesa o corpo e calcula o quanto de água e hidróxido de potássio deve adicionar. A solução alcalina, com um pH de 14, é aquecida a 150 °C. O que leva décadas em um sepultamento, ocorre em 90 minutos no laboratório.

O Comprova identificou que alguns estados americanos aprovaram a hidrólise alcalina bem antes da pandemia do novo coronavírus, tanto por legislação própria quanto por modificações do significado do termo cremação em leis já existentes.

Em 2011, portanto oito anos antes do primeiro caso de infecção por covid-19 ser registrado no mundo, uma reportagem da NBC News já apresentava a discussão e afirmava que estados norte-americanos estavam considerando a legalidade de dissolver corpos, sendo que os proponentes defendiam os custos operacionais mais baixos e o fato de ser uma forma mais ecológica de descarte do que a cremação tradicional.

À época, o estado de Ohio, por exemplo, já permitia a utilização da hidrólise alcalina e a maior parte dos estados alterava a definição de cremação em suas legislações.

Mudanças mais recentes ocorreram na Califórnia, mas ainda antes da pandemia. Em 2017, o estado alterou a Seção 7611.9 do Código de Negócios e Profissões, pela Lei AB-967, que trata da eliminação de restos mortais por hidrólise alcalina. Com a alteração, passou a identificar que um “eliminador de restos mortais cremados” é uma pessoa que, por sua própria conta ou de outrem, dispõe, ou se oferece para descartar restos mortais humanos cremados ou hidrolisados, espalhando-os sobre a terra ou no mar.

A legislação entrou em vigor em 1º de julho de 2020, porém foi sancionada pelo governador do estado em 15 de outubro de 2017, quando já estava prevista a data em que passaria a vigorar.

| Captura de imagem da Lei AB-967, que trata da eliminação de restos mortais por hidrólise alcalina na Califórnia. Fonte.

Componentes das vacinas são seguros

A médica diz que a vacinação supostamente levaria a um aumento nos casos de demência. O Comprova já mostrou ser falsa a relação entre vacinas e a manifestação de demências como a doença de Alzheimer. A alegação é de que a causa seria o alumínio presente nos imunizantes, mas eles são usados em vacinas, desde 1930, para aumentar a resposta imunogênica. O Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC), dos Estados Unidos, explica que a quantidade de alumínio presente nos imunizantes é segura.

Além disso, a Alzheimer’s Society, organização que atua em pesquisa e cuidado a pessoas com demência no Reino Unido, informa em seu site que “até o momento, nenhum estudo ou grupo de estudos confirmou que o alumínio esteja relacionado com o desenvolvimento da doença de Alzheimer”.

Vacinas contra a covid não possuem grafeno

A médica cita duas alegações amplamente desmentidas por agências de checagem e especialistas na área da saúde: de que as vacinas conteriam grafeno em sua fórmula e que teriam o efeito de magnetizar o corpo humano. Ambas as falas são falsas.

O Comprova mostrou, no começo de novembro, que o grafeno é uma das formas do carbono. Ele é estudado como adjuvante de algumas vacinas — utilizado para aumentar a resposta imunogênica — mas não foi utilizado em nenhuma das vacinas contra a covid-19 atualmente utilizadas no país. Em nota, a Anvisa disse que “a regulamentação de produtos estéreis é bastante rigorosa em relação à presença de impurezas, inclusive aquelas que possam ser resultantes do processo de produção de medicamentos e vacinas”.

Já a alegação de que as vacinas estariam deixando as pessoas magnetizadas apareceu depois que circularam vídeos nas redes sociais de pessoas com moedas “grudando” no braço. Mas dois professores da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) mostraram que é possível obter o mesmo resultado apenas umedecendo o braço.

Vacinas não possuem células de fetos abortados

O polissorbato é um componente químico utilizado como solvente na indústria alimentícia e farmacêutica. Ele é utilizado para transformar todos os ingredientes da vacina em uma substância homogênea. O Comprova já explicou ser falso que fetos precisem ser abortados para que as vacinas sejam produzidas ou que os imunizantes contenham células dos fetos em sua composição.

A confusão ocorre por causa da produção da tecnologia empregada na vacina de Oxford-AstraZeneca, produzida no Brasil pela Fiocruz. Ela funciona por meio de um vetor adenovírus recombinante. Em outras palavras, os pesquisadores pegaram o vírus que causa gripe em chimpanzés, inofensivo para o corpo humano, e o alteraram geneticamente para que ele passasse a ter características do coronavírus. Ao ser injetado no corpo, as células de defesa do sistema imunológico vão aprender a identificar essas características e atacá-las. Assim, quando o corpo for infectado pelo coronavírus em uma infecção natural, ele já saberá como se defender.

Os adenovírus precisam se replicar em células mantidas em laboratório. Essas células são da linhagem HEK-293. Sua origem vem, sim, de um feto abortado legalmente na Holanda nos anos de 1970. Mas desde então, elas se multiplicam por meio de um mecanismo natural e é por isso que novos fetos não precisam ser abortados.

As cópias dessas células é que são utilizadas pela indústria e servem como “pequenas fábricas” para que os vírus atenuados possam se multiplicar. As células não entram na composição final do imunizante, apenas os adenovírus que se reproduziram nelas.

Fiocruz mantém sigilo em diversos contratos, não apenas com a AstraZeneca

O Comprova procurou a Fiocruz questionando se a fundação comprou – ou pretende comprar – um cofre de R$ 130 mil para guardar os contratos com a AstraZeneca, como afirma o conteúdo verificado, dando a entender que a fundação estaria tentando esconder informações relacionadas ao composto da vacina.

Em nota, a assessoria de comunicação informou que a afirmação feita no vídeo não está correta e acrescentou que a Bio-Manguinhos, unidade de tecnologia em imunobiológicos, está sim desenvolvendo um projeto, com prazo de 24 meses, para organizar uma estrutura de trabalho que atenda a evolução da legislação de acesso à informação, mas que o objetivo é a preservação do sigilo de mais de 20 contratos de transferência de tecnologia, não apenas do documento firmado para produção da vacina contra a covid-19. Todos eles, acrescenta, possuem cláusulas de sigilo, e há também outros documentos na mesma situação.

Conforme a Fiocruz, a estrutura será organizada no Centro Administrativo Vinicius Fonseca, prédio administrativo de Bio-Manguinhos no Rio de Janeiro, e inclui a compra de um cofre, sistemas de segurança e insumos, além da contratação de pessoal e outros serviços. Os valores do projeto são estimativos e todas as aquisições serão realizadas por licitação, incluindo a do cofre – que não precisa ser importado, mas sim atender às especificações e ter o menor preço. Os valores finais, destaca a fundação, dependerão dos custos com pessoal e dos processos licitatórios ainda não realizados.

Em relação à classificação de sigilo, o órgão explicou que vem acompanhando a legislação em vigor que trata do tema, em decorrência do aumento do fluxo de informações na administração pública, registradas em meio físico ou digital, abertas ou sensíveis. Neste sentido, as unidades da fundação estão adotando procedimentos padronizados e uniformes no que diz respeito à normatização das atividades de classificação e desclassificação de informações de acordo com a Lei de Acesso à Informação (12.527/2011). A Fiocruz diz que também orienta sobre o tratamento de informações classificadas segundo outras hipóteses legais, como as da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (13.709/2018), também relacionadas aos acordos de Transferência de Tecnologia como o firmado entre a Fiocruz e AstraZeneca.

A adoção dessas medidas, contudo, não se dá apenas em relação à AstraZeneca, explica a fundação, informando que somente no caso específico de Bio-Manguinhos, todos os contratos de transferência de tecnologia com parceiros para a internalização da produção de vacinas, kits para diagnóstico e biofármacos possuem cláusulas de sigilo.

“O compromisso no recebimento das tecnologias repassadas para Bio-Manguinhos/Fiocruz, via de regra, fica condicionado à manutenção do sigilo e confidencialidade das mesmas, dado o seu valor comercial para os parceiros que investiram inicialmente no desenvolvimento destes produtos e continuam a fornecê-los para o mercado privado”, diz a nota, afirmando que a estrutura que se pretende construir irá colaborar com a proteção de informações e de dados institucionais e pessoais relacionados a pesquisas e estudos clínicos, contratos, patentes e dados de pacientes.

A autora do post

Maria Emilia Gadelha Serra é médica otorrinolaringologista, com registro nº 63.451 no Conselho Regional de Medicina de São Paulo (Cremesp). Em seu perfil no Instagram, ela se apresenta como presidente da Sociedade Brasileira de Ozonioterapia Médica. A prática é contestada pelo Conselho Federal de Medicina (CFM), que em Resolução de 2018 a definiu como “procedimento de caráter experimental, cuja aplicação clínica não está liberada, devendo ocorrer apenas no ambiente de estudos científicos”.

Em seu Instagram, Serra tira de contexto dados sobre efeitos adversos de vacinas e faz postagens contrárias a uma eventual obrigatoriedade dos imunizantes. Ela afirma já ter sofrido sanções da rede social por conta de seus posts espalhando desinformação.

Procurada pelo Comprova, ela não se manifestou até a publicação desta reportagem.

O vídeo foi gravado durante o 2° Congresso Conservador Liberdade e Democracia, realizado, em 14 de novembro, em São José, na Região Metropolitana de Florianópolis. O evento contou com políticos e jornalistas alinhados ao governo federal, bem como ativistas antivacina e defensores de tratamentos comprovadamente ineficazes contra a covid-19.

Por que investigamos?

Em sua quarta fase, o Comprova checa conteúdos enganosos sobre eleições, governo federal ou sobre a pandemia que tenham atingido alto grau de viralização. O conteúdo verificado foi sugerido por leitores do Comprova via WhatsApp, onde o vídeo circula. Sugestões como esta podem ser encaminhadas pelo número (11) 97045-4984, ou clicando neste link.

As alegações contidas neste vídeo também foram checadas pela Lupa e por Fato ou Fake.

Conteúdos falsos sobre a pandemia possuem grande apelo porque se aproveitam de dúvidas e receios da população. Eles são danosos porque tiram a confiança das pessoas nas instituições sanitárias e podem induzir comportamentos nocivos, como não se vacinar. A imunização com vacinas aprovadas por órgãos regulatórios é a principal estratégia disponível para conter novas infecções, hospitalizações e mortes.

O Comprova já mostrou ser falso que a vacina da Pfizer contenha ‘partículas contaminantes’. Também não é verdade que o número de pessoas infartadas em Israel tenha aumentado após a vacinação.

Falso, para o Comprova, é conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.

Saúde

Investigado por: 2021-11-25

CDC não coleta dados de pessoas reinfectadas transmitindo covid-19

  • Enganoso
Enganoso
É enganoso que o Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) emitiu documento que comprove a inexistência de casos de pessoas não vacinadas que tenham transmitido a doença depois de uma segunda infecção. O documento existe, mas tem outro teor. Informa que não foram encontrados registros porque os dados não são coletados devido a proteções de privacidade. O CDC destaca que o fato de os dados não serem coletados não significa que não existam casos desse tipo.
  • Conteúdo verificado: Tuítes com documentos enviados pelo Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC), dos EUA, afirmam que não existem registros de pessoas que, não vacinadas e após reinfecção da covid-19, tenham transmitido a doença.

São enganosos os posts no Twitter que afirmam que o Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos Estados Unidos não tem registros de pessoas não vacinadas contra a covid-19 que tenham transmitido a doença para terceiros após reinfecção. O documento utilizado nos tuítes aqui verificados, em que o CDC responde a uma consulta sobre o assunto feita por uma advogada, é autêntico. Contudo, o órgão afirma não ter os registros porque estes dados não são coletados, o que não significa que não existam casos de pessoas não vacinadas que tenham transmitido a doença.

Em pelo menos quatro postagens feitas no Twitter, é anexado um documento do CDC enviado a uma advogada de Nova York, após uma solicitação de informações por meio do Freedom of Information Act (FOIA), lei de acesso à informação do governo norte-americano. No documento, ela consulta o CDC sobre a existência de “documentos que refletem qualquer caso documentado de um indivíduo que: (1) nunca recebeu uma vacina contra covid-19; (2) foi infectado com covid-19 uma vez, se recuperou e, mais tarde, ficou infectado novamente; e (3) transmitiu Sars-CoV-2 para outra pessoa quando reinfectado”.

A resposta do CDC é de que não foram encontrados registros, porque os dados pedidos não são coletados devido às proteções de privacidade. Os posts no Twitter, de fato, afirmam que o CDC disse não ter registros. Contudo, os tuítes em resposta não deixam claro que a pergunta feita pela advogada foi sobre transmissão por não vacinados após reinfecção.

A interpretação de boa parte das pessoas que interagiram com os posts é de que o fato de não haver registros no CDC significa que não há casos desse tipo.

Essa interpretação fica evidente nas respostas: há perfis que falam que a imunidade natural é melhor do que a da vacina, que este é um “segredo guardado a sete chaves pela indústria” e que esta é uma prova de que o “experimento” não tem dado o resultado desejado, se referindo à vacina.

No momento em que um perfil questiona a interpretação de que a falta de registros significaria a ausência de casos, é rebatido pelo autor de um dos tuítes: “Se não há a informação, porque a afirmação é feita então? Este é o ponto”.

Os quatro autores dos tuítes verificados — @RafaelFontana, @DiretoDaAmerica, @Dr_Francisco_ e @profcabarros, — foram procurados, mas somente os dois últimos responderam, no sentido de reafirmar que a ausência de dados do CDC valida a tese de que reinfectados não transmitem covid-19.

Este conteúdo foi considerado enganoso pelo Comprova porque leva a uma interpretação diferente da intenção do autor, com ou sem a intenção de causar dano.

Como verificamos?

O Comprova usou o Google para localizar a advogada cujo nome é citado no documento utilizado nos tuítes e, ao encontrar um contato de e-mail no site oficial do escritório onde ela trabalha, a questionou sobre a veracidade do documento utilizado na rede social.

Em seguida, entrou em contato com o CDC, a fim de saber se o documento era verdadeiro e por que razões não existem registros para casos de pessoas que não foram vacinadas e tenham transmitido covid-19.

Por fim, foram procurados os autores dos quatro tuítes verificados por meio de mensagens diretas enviadas no Twitter, Instagram e Facebook. Dois deles responderam ao contato do Comprova, os outros dois, até a publicação deste texto, não retornaram.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 24 de novembro de 2021.

Verificação

O documento é autêntico?

Sim. Ele foi enviado pelo CDC no dia 5 de novembro de 2021 à advogada Elizabeth Brehm, que trabalha no escritório Siri & Glimstad, em Nova York. O pedido de informações tinha sido feito em 2 de setembro de 2021 por meio de um formulário no site do FOIA. Os dois documentos – pergunta e resposta – foram disponibilizados em um texto escrito pelo sócio-gerente do escritório, Aaron Siri.

Quem é Elizabeth Brehm e qual o contexto da consulta?

Ela é uma das advogadas do escritório Siri & Glimstad, sediado em Nova York. De acordo com informações do site da empresa, ela tem formação em Ciências e em Direito e, antes de se juntar à equipe do Siri & Glimstad, trabalhou por nove anos em outro escritório, atuando sobretudo em ações antitruste e fraudes no sistema de saúde.

O escritório onde ela trabalha atualmente mantém uma página em seu site oficial, na qual afirma defender clientes dos 50 estados norte-americanos, “com compaixão e experiência” e “sem custos de representação”, que tenham sofrido lesões decorrentes de vacinas. Eles consideram como as mais comuns bursite, tendinite, lesões no manguito rotador e capsulite adesiva – uma condição de rigidez na articulação do ombro também chamada de ombro congelado. O escritório ainda menciona a Síndrome de Guillain-Barré como uma “lesão de vacina”.

Ao ser questionada sobre a veracidade do documento, que circulava em tuítes no Brasil, e sobre a consulta que teria feito ao CDC, Elizabeth Brehm respondeu ao Comprova por e-mail apenas encaminhando um link para um texto publicado pelo sócio-gerente do escritório onde ela trabalha, Aaron Siri.

No texto, em que anexa a pergunta feita pela funcionária e a resposta do CDC, Aaron afirma que seria de se imaginar que o CDC deveria ter ao menos uma prova de que um indivíduo não vacinado transmitiu a covid-19 para outras pessoas.

No mesmo post, ele confirma que o CDC respondeu que não tinha os registros solicitados por Elizabeth Brehm porque os dados não eram coletados. No decorrer da publicação, Aaron afirma que há estudos que comprovam que pessoas vacinadas transmitem a covid-19 e que é “distópico” que o CDC suspenda as restrições aos vacinados, enquanto “está ativamente destruindo os direitos de milhões de indivíduos naturalmente imunes neste país, caso eles não recebam a vacina”.

Ele ainda afirma que a proteção natural pela doença é superior à da vacina. O Comprova já mostrou que era a falsa a afirmação de que o CDC tinha admitido que a proteção natural era superior à da vacina contra a covid-19 e que autoridades de saúde do Brasil seguem recomendando que todos se vacinem, já que a imunidade natural também tende a cair com o tempo.

Por que o CDC não tem registros?

O CDC alegou ao Comprova, por e-mail, que por “questões de privacidade” não mantém registros de eventuais casos de transmissão da covid-19 por pessoas que já tiveram a doença e não foram imunizadas. A agência, porém, salientou que não há razões para acreditar que pessoas que já testaram positivo não possam ser transmissoras.

Na sequência, dois estudos sobre taxas de reinfecção foram enviados (1 e 2) à reportagem pela agência norte-americana, embora não especificamente sobre o risco de transmissão por pessoas reinfectadas.

O primeiro, feito com cinco residentes de uma enfermaria especializada, mostrou que quatro deles apresentaram quadros mais severos da doença após a reinfecção, com uma morte. O segundo reuniu indícios de que a vacinação contra a covid-19 em pessoas já infectadas pelo vírus reduz a possibilidade de reinfecção.

Em janeiro deste ano, um estudo feito com profissionais de saúde do Reino Unido apontou que a resposta imune a partir de uma infecção anterior por covid-19 reduz em 83% o risco de se contrair de novo a doença. Os resultados apontados pelos pesquisadores foram publicados na plataforma MedRxiv, ainda em fase de pré-print, e sugeriam que essa proteção durava aproximadamente cinco meses.

Dos mais de 6 mil participantes no estudo, que já tinham tido a covid-19, houve reinfecção em menos de 1%. Contudo, os pesquisadores descobriram que, nos poucos casos em que isso ocorreu, os pacientes levavam altos níveis de carga viral no nariz e na garganta, mesmo sem apresentar sintomas. De acordo com a pesquisadora Susan Hopkins, investigadora principal do estudo, essas cargas virais estavam sendo associadas a um alto risco de transmissão do vírus para outras pessoas.

Quem são as pessoas que publicaram os documentos?

O Comprova entrou em contato com os quatro perfis que postaram o mesmo conteúdo verificado nesta reportagem. @RafaelFontana é jornalista, escritor e, de acordo com suas redes sociais, trabalha em uma empresa de comunicação brasileira sediada nos Estados Unidos. O segundo perfil contatado foi @profcabarros, jornalista e advogado.

Carlos respondeu à reportagem defendendo o conteúdo que foi publicado em seu tuíte: “A questão aqui é que você parte da premissa que existem estes casos, mesmo que não hajam dados” (sic). E, após o envio da resposta dada pelo CDC sobre não coletarem tais dados, o jornalista reafirmou que seu tuíte não estava distorcendo ou inventando o conteúdo publicado.

O perfil Direto da América também foi procurado. Nas redes sociais, o perfil é descrito como um portal de notícias dos Estados Unidos voltado para brasileiros de todo o mundo. O site do portal estava temporariamente desativado e o perfil no Instagram é privado. O contato foi feito por meio da página no Facebook, mas não houve retorno

Também foi contatado o médico infectologista Francisco Cardoso. Em junho deste ano, o profissional esteve presente na CPI da Covid a fim de defender o “tratamento precoce”, que não possui comprovação científica contra a covid-19, por indicação do governo federal.

Além disso, Francisco também é investigado pelo Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) por receber auxílio-doença mesmo sem estar incapaz de exercer a profissão. O contato foi realizado via e-mail disponibilizado nas redes sociais do médico.

Francisco Cardoso respondeu ao Comprova e defendeu que sua publicação no Twitter estava correta, visto que as afirmações feitas na postagem são as mesmas dadas ao Comprova pelo CDC, e que os documentos apresentados no tuíte são verdadeiros.

Por que investigamos?

Em sua quarta fase, o Comprova investiga publicações sobre o governo federal, as eleições e a pandemia que tenham viralizado nas redes sociais. A postagem aqui checada foi compartilhada no Twitter por pelo menos quatro perfis. Entre curtidas, retuítes e retuítes com comentários, foram mais de 5,8 mil interações.

Neste caso, o fato de os tuítes não refletirem o teor completo do documento levou a uma interpretação diferente daquela que foi a intenção do autor e reforçou o discurso antivacina, que tem sido base para a difusão de argumentos contrários à implementação do passaporte sanitário e ao próprio avanço da vacinação. É consenso na comunidade científica que a curva de mortos e de infectados pelo vírus cai com o avanço da cobertura vacinal, realidade que pode ser atestada no Brasil.

Outubro foi o mês com menos mortes por covid-19 no país desde abril de 2020. O esquema vacinal foi completado em mais de 60% da população brasileira, apesar da recusa do governo federal a ofertas para compra de vacinas como a Pfizer.

O Comprova já checou outros conteúdos relacionados a vacinas, como o que concluiu que o secretário de fomento à cultura desinformou ao afirmar que os imunizantes contra o coronavírus são experimentais, ou o que confirmou ser enganosa a relação entre eles e casos de mal súbito entre atletas.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Saúde

Investigado por: 2021-11-23

É falso que o diretor-geral da OMS tenha se posicionado contra o carnaval de 2022

  • Falso
Falso
É falsa uma postagem compartilhada por mais de um usuário no Facebook afirmando que o diretor-geral da Organização Mundial da Saúde (OMS), Tedros Adhanom, não recomenda a realização do carnaval em 2022. A entidade afirmou desconhecer a declaração dele neste sentido.
  • Conteúdo verificado: Postagem no Facebook traz a foto de Tedros Adhanom com a afirmação “Presidente da OMS não recomenda carnaval em 2022. E agora? Como ficam políticos, juízes, mídia e empresários mortadelas, que afirmaram ser crime de genocídio não seguir o determinado pela OMS?”. Há, ainda, o link para um vídeo no YouTube.

São falsas as postagens compartilhadas no Facebook afirmando que Tedros Adhanom, diretor-geral da Organização Mundial da Saúde (OMS), teria feito recomendação contrária ao carnaval em 2022 no Brasil em decorrência da pandemia. O Comprova e a própria organização não localizaram qualquer registro de fala dele neste sentido.

A última orientação da entidade, emitida em 4 de novembro de 2021 para governos, autoridades de saúde e organizadores de eventos, é de que a decisão de restringir, modificar, adiar, cancelar ou prosseguir com a realização de um evento deve sempre se basear na avaliação rigorosa de riscos e na situação epidemiológica de cada cidade, estado ou país.

A postagem anexa também inclui o link de um vídeo no YouTube, intitulado “Carnaval 2022. OMS não recomenda”. O autor, contudo, afirma ao longo da gravação que o diretor-geral “foi claro, ele não recomenda grandes multidões, ele alerta para o risco que isso pode significar”, mas não trata especificamente da tradicional festa brasileira. Além disso, o autor do vídeo não fornece a fonte da suposta fala de Adhanom.

Em outro trecho do vídeo, afirma que o diretor-geral chorou em julho de 2021, em decorrência da pandemia, mas este fato ocorreu um ano antes, em julho de 2020.

Sobre o carnaval de 2022 no Brasil, reportagem do Comprova fez recentemente um levantamento sobre os preparativos nas principais cidades que organizam grandes eventos de carnaval. Não há consenso entre as autoridades e a realização das festas depende do aval dos governos estaduais e municipais.

O infectologista Álvaro Furtado, do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP, ouvido pela reportagem, afirma que o país está em um momento favorável no que diz respeito à redução progressiva no número de casos, da circulação viral, do número de óbitos e da ocupação dos leitos, além de avanços na cobertura vacinal. Se o cenário continuar evoluindo desta maneira, avalia, os indicadores serão favoráveis à realização do evento.

Para o diretor da Sociedade Brasileira de Imunizações, Renato Kfouri, o momento epidemiológico será determinante para a decisão final sobre a realização do carnaval nas cidades brasileiras. Segundo o infectologista, esse cenário vai depender, essencialmente, do surgimento de novas variantes e do tempo de proteção conferido pelas vacinas.

Por fim, foram procurados dois autores das postagens no Facebook e o responsável pelo vídeo publicado no YouTube, mas nenhum respondeu as mensagens.

Para o Comprova, é considerado falso o conteúdo inventado.

Como verificamos?

O primeiro passo foi assistir ao vídeo linkado na postagem compartilhada e entrar em contato com o autor dele.

Em seguida, o Comprova procurou a própria Organização Mundial da Saúde e utilizou o Google para reportagens e entrevistas nas quais Tedros Adhanom pudesse ter falado sobre o carnaval de 2022.

Também foram procurados os infectologistas Renato Kfouri, diretor da Sociedade Brasileira de Imunizações, e Álvaro Furtado, do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP.

Por fim, o Comprova procurou os autores das publicações no Facebook.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 23 de novembro de 2021.

Verificação

OMS nega posicionamento de Tedros Adhanom sobre o carnaval

A OMS afirmou não ter conhecimento de nenhuma declaração do diretor-geral Tedros Adhanom contra o carnaval de 2022, conforme informado em nota encaminhada ao Comprova.

Conforme a entidade, houve uma menção à comemoração durante uma conferência da OMS com a imprensa em 30 de abril de 2021, mas não por Tedros Adhanom, e sim por Sylvain Aldighieri, gerente de Incidentes da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), braço da OMS nas Américas. Na ocasião, contudo, ele se referia ao feriado de carnaval de 2021, e não de 2022, como sugerem os posts aqui verificados.

Naquele momento, quando a maioria dos países da América do Sul relatava tendências crescentes, Aldighieri declarou que a ação mais importante para ajudar os serviços de saúde a dobrar a curva era a implementação estrita de medidas públicas de saúde e sociais.

Acrescentou que, de três a quatro meses anteriores, muitos países tiveram implementação abaixo do ideal das medidas de saúde pública em decorrência de uma sequência de feriados que desencadearam grande movimentação populacional, como Natal, Réveillon, carnaval e Páscoa.

O vídeo que baseou as publicações

O vídeo usado nas publicações do Facebook tem pouco mais de 23 minutos e foi publicado no dia 15 de novembro no canal Sofá di Pobre, que possui 7,22 mil inscritos.

Nele, o autor afirma que o diretor-geral da OMS não esconde sua preocupação e deixa claro: “o vírus recuou, mas ainda não foi derrotado, preparando um contra-ataque que já pode ser sentido em algumas partes do mundo, prudência determina que não é o momento de se organizar eventos com aglomeração de multidões, leviandade ignorando os efeitos colaterais pode trazer consequências com sequelas irreparáveis”.

A partir de quinze minutos e três segundos, o autor diz que Tedros Adhanom “foi claro, ele não recomenda grandes multidões, ele alerta para o risco que isso pode significar”, mas não declara que o diretor-geral tenha se referido especificamente ao carnaval. Mais adiante, diz que, segundo a OMS, o risco é gigantesco de haver uma contaminação violenta no Brasil. Em nenhuma das falas o autor apresenta as fontes de tais afirmações.

Ainda no vídeo, o responsável pelo canal diz que “o presidente da OMS, em julho de 2021, chorou em público e a razão das lágrimas era ele não entender por que é tão difícil o ser humano se unir, reação desesperada diante de uma pandemia assassina e das carinhas de paisagens espalhadas pelo mundo”.

Tedros Adhanom, de fato, chorou em público, mas isso ocorreu um ano antes do mencionado pelo autor do vídeo, em julho de 2020, como comprovam notícias em diversos veículos.

Ao longo do vídeo, o responsável pelo canal defende Jair Bolsonaro (sem partido) e o governo federal, critica o lockdown, governadores, prefeitos, vacinas, o Supremo Tribunal Federal (STF), a CPI da Pandemia, a mídia e defende “remédios alternativos” contra a covid-19. Também diz que o inverno europeu está “mandando recado assustador” ao brasileiro, e está sendo ignorado, referindo-se aos preparativos para o carnaval. O autor foi procurado pelo Comprova, mas não respondeu até a publicação desta reportagem.

Orientação atual da OMS sobre eventos de massa

A OMS compartilhou com o Comprova as orientações relacionadas aos eventos de grande porte durante a pandemia, datadas de abril de 2020. O documento define como reunião de massa um evento que reúna número de pessoas tão grande que tenha o potencial de sobrecarregar os recursos de planejamento e resposta do sistema de saúde na comunidade onde ocorre.

“Você precisa considerar o local e a duração do evento, bem como o número de participantes. Por exemplo, se o evento ocorrer durante vários dias em um pequeno estado-ilha onde a capacidade do sistema de saúde é bastante limitada, então mesmo um evento com apenas alguns milhares de participantes pode colocar uma grande pressão no sistema de saúde e ser considerado uma ‘reunião em massa’. Por outro lado, se o evento for realizado em uma grande cidade, em um país com um grande sistema de saúde, com recursos suficientes, e durar apenas algumas horas, o evento pode não constituir um evento de ‘reunião de massa’”, diz a organização.

A entidade também disponibilizou um documento, atualizado em 4 de novembro de 2021, que fornece orientações para governos, autoridades de saúde e organizadores de eventos sobre a tomada de decisões relacionadas à realização de encontros em massa durante a pandemia, informando que os mais importantes fatores de risco aumentado de transmissão são o tempo de permanência dos participantes no evento, a realização em locais fechados e o não cumprimento das medidas de precaução, como uso de máscaras e de higienização das mãos, além do distanciamento.

Conforme a OMS, a decisão de restringir, modificar, adiar, cancelar ou prosseguir com a realização de um evento deve ser sempre baseada em uma avaliação rigorosa dos riscos associados ao evento. O próprio órgão desenvolveu ferramentas de avaliação de risco para facilitar e orientar o processo de tomada de decisão relacionado à realização de eventos genéricos, religiosos e esportivos, atribuindo uma pontuação numérica para cada fator de risco e medida preventiva, permitindo o cálculo de um risco geral.

Os eventos associados a um risco baixo ou muito baixo de transmissão e tensão no sistema de saúde podem ser considerados suficientemente seguros. Já aqueles com nível de risco moderado, alto ou muito alto podem não ser suficientemente seguros e exigem a aplicação completa de medidas de precaução. Por fim, se o risco de transmitir SARS-CoV-2 permanecer significativo após a aplicação de todas as medidas de precaução relevantes, adiar, cancelar ou fazer o evento de forma online deve ser considerado.

“A abordagem baseada em risco é flexível e adaptável a encontros de diferentes tipos e tamanhos, ocorrendo no contexto de quaisquer cenários de transmissão Sars-CoV-2”, diz a OMS, acrescentando que mesmo considerado de baixo risco, a recomendação é sempre considerar a implementação de medidas de precaução para diminuir ainda mais o risco residual, uma vez que o risco zero não existe.

Ainda no texto, a OMS afirma que as reuniões de massa não são meramente eventos recreativos, tendo implicações importantes no bem-estar espiritual e na promoção de comportamentos saudáveis. O órgão recomenda que, dada a substancialidade social, cultural, política e econômica implicadas, as autoridades avaliem a importância e necessidade de um evento de reunião em massa e considerem se deve este ocorrer, desde que todos os riscos de saúde pública associados sejam adequadamente avaliados, tratados e mitigados.

Por fim, a entidade mantém uma página de perguntas e respostas sobre a realização de reuniões durante a pandemia.

O que dizem os especialistas?

A realização do carnaval no Brasil não é consenso entre as autoridades e depende do aval dos governos estaduais e municipais. Na comunidade médica, a avaliação é a de que a organização do evento dependerá da cobertura vacinal e dos dados epidemiológicos coletados próximos ao período do feriado.

O infectologista Álvaro Furtado, disse, em entrevista ao Comprova, que o momento atual da pandemia no Brasil é favorável para a realização de grandes eventos. “A gente vê os dados das últimas semanas epidemiológicas e observa redução progressiva no número de casos, diminuição da circulação viral, diminuição do número de óbitos e também na ocupação dos leitos de UTI. A gente também está avançando no nosso programa de imunização, com 60% da população vacinada (com a segunda dose)”.

Na avaliação dele, o cenário que se configura abre a possibilidade de realização de uma festa como o carnaval. O médico deixa claro, contudo, que isso pode mudar em caso de revés nos indicadores ou de retrocessos na vacinação.

“A questão é que, pelos dados dos últimos meses, pelos indicadores progressivamente melhores e com a cobertura vacinal avançando do jeito que está, com possibilidade de terceira dose que a gente já aprovou, isso deixa um cenário mais favorável para que aconteça um evento com grande quantidade de pessoas.”

Ao Comprova, o também infectologista Renato Kfouri, pondera, ainda, que a decisão final vai depender do surgimento ou não de novas variantes do coronavírus. “Não precisamos de um carnaval para aumentar a circulação [do vírus]. Vemos, hoje, os estádios de futebol, onde já há torcidas e muitas pessoas não usam máscaras… nem por isso o Brasil está vivendo uma nova onda.”

Kfouri acrescenta que, apesar da alta taxa de cobertura vacinal, ainda não é possível cravar a efetividade dos imunizantes a longo prazo, e isso pode, sim, alterar os planos para a realização de grandes eventos. “Não adianta dizer que, até lá, teremos 80% ou 90% da população vacinada, porque a duração da proteção da vacina se perde. É correta a preparação para o carnaval, mas o determinante é o momento epidemiológico, e isso é imprevisível.”

Por que investigamos?

Em sua quarta fase, o Comprova verifica conteúdos suspeitos que tenham viralizado nas redes sociais sobre as políticas públicas do governo federal, as eleições de 2022 e a pandemia, como o caso aqui verificado, que não apenas desinforma sobre a covid-19, como também faz ataques a políticos, juízes, mídia e empresários.

Apenas uma das postagens, no grupo Bolsonaro 2022 BR, somou 8,9 mil interações, e, conforme a ferramenta Crowdtangle, foi compartilhada em diversos grupos de apoio ao presidente.

Comentários mostram que usuários entenderam que Tedros Adhanom se referiu especificamente ao carnaval no Brasil, como este: “Algum esquerdopata vai ser contra a Ciência da OMS?”, referindo-se de forma pejorativa a opositores do governo federal.

Outros comentários comprovam que o conteúdo fomenta o ataque a grupos que discordam de Bolsonaro, como o que sugere que “o presidente veta o Carnaval em todo território brasileiro, se exime de toda e qualquer culpa, o STF vai contra a ordem do presidente e dá total autonomia para prefeitos e governadores decidir se vai ter carnaval ou não. Depois quero ver culparem o presidente Jair Bolsonaro.”

Em seguida, a mesma usuária afirma que foi exatamente o que ocorreu em 2021, e outro membro responde que “teve a CPI do Circo e ngm [ninguém] conseguiu provar nada contra o nosso presidente Jair Bolsonaro”. A CPI à qual se refere o usuário foi finalizada com o pedido de indiciamento de 78 pessoas, incluindo o presidente, além de duas empresas, por supostos crimes cometidos durante a pandemia.

Apesar de a usuária afirmar que Bolsonaro pode vetar o carnaval, neste mês, o Projeto Comprova já explicou que o veto à festa não está sujeito apenas à vontade do presidente da República.

Este conteúdo também foi verificado pela agência Aos Fatos, que o considerou falso. Peças desinformativas sobre o carnaval têm aparecido com frequência conforme se aproxima o feriado.

Para o Comprova, falso é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.

Saúde

Investigado por: 2021-11-22

Secretário de fomento à cultura engana ao dizer que vacinas contra a covid são experimentais

  • Enganoso
Enganoso
É enganoso o tuíte do secretário nacional de Incentivo e Fomento à Cultura, André Porciuncula, contra as vacinas que combatem a covid-19. Diferentemente do que ele afirma, os imunizantes não são experimentais, mas, sim, comprovadamente eficazes e aprovados por órgãos de vigilância em saúde, como a Anvisa, no Brasil, a FDA, nos Estados Unidos, a EMA (Agência Europeia de Medicamentos), além da OMS.
  • Conteúdo verificado: Tuíte de André Porciuncula engana ao dizer que vacinas desenvolvidas para combater a covid-19 ainda são experimentais e, por esse motivo, promete impedir o passaporte da vacina nos projetos da Lei Rouanet.

Uma publicação feita no Twitter do secretário de Incentivo e Fomento à Cultura, responsável pelo orçamento da Lei Rouanet, André Porciuncula, engana ao afirmar que as vacinas contra o coronavírus não impedem a transmissão da covid-19. Além disso, a mesma postagem distorce a realidade ao afirmar que os imunizantes ainda estão em fase experimental.

As desenvolvedoras de vacinas Pfizer/BioNTech, Oxford-AstraZeneca, Instituto Butantan, Johnson & Johnson, Moderna e Fiocruz realizaram testes em milhares de voluntários. Com estes procedimentos científicos, todas conseguiram provar que a vacina consegue reduzir a transmissão e contaminação geradas pela covid, sem comprometer a saúde da população.

O conteúdo do tuíte também afirma que o passaporte da vacina gera uma “odiosa segregação, sustentada na falsa premissa de que a vacina impede a contaminação e a transmissão”. O documento, solicitado em algumas cidades do país, visa garantir mais segurança em espaços públicos em que um grande volume de pessoas se concentra, como shows e eventos.

A medida foi adotada diante dos avanços na flexibilização das atividades comerciais no país, gerada pela redução de contaminados e mortos após a imunização massiva dos brasileiros pelo Sistema Único de Saúde (SUS).

André Porciuncula foi procurado pela reportagem, mas não deu retorno até a publicação deste texto. Diante dos dados imprecisos que induzem uma interpretação diferente do que é a realidade, o Comprova classificou como enganosa a publicação.

Como verificamos?

Inicialmente, fomos em busca de informações disponibilizadas pela Organização Mundial de Saúde (OMS) sobre o processo de aprovação de uma vacina. Também checamos dados presentes no site da Food and Drug Administration (FDA), dos Estados Unidos, da Agência Europeia de Medicamentos (EMA), que vigia a saúde da União Europeia. Como amplamente já divulgado, os imunizantes não são experimentais. A mesma informação é reforçada a partir do acesso a todas as plataformas, onde fica explícito que metodologias rígidas e pautadas na ciência foram utilizadas.

Entrevistamos o especialista em vacinologia e professor da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) Odir Antonio Dellagonstin e o doutor em imunologia e professor da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) Daniel Mansur.

A reportagem também entrou em contato com a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para checar quais eram os métodos adotados pelo órgão ao aprovar um imunizante para uso em território nacional. Até o momento não tivemos retorno.

Por fim, André Porciuncula, autor da postagem aqui verificada, foi contatado via e-mail. Até o momento da publicação desta matéria, não houve retorno.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 22 de novembro de 2021.

Verificação

Diferentemente do que afirma André Porciuncula, as vacinas desenvolvidas pelas farmacêuticas Pfizer/BioNTech, Oxford-AstraZeneca, Instituto Butantan, Johnson & Johnson, Moderna e Fiocruz são comprovadamente eficazes contra a covid-19. A conclusão foi definida após testes em milhares de voluntários.

Em verificações anteriores, o Comprova também mostrou estar provado que as vacinas em uso contra o coronavírus são seguras e, se não impedem que 100% dos imunizados não se infectem ou transmitam, reduzem significativamente estes riscos. Dados atualizados sobre a proteção gerada pelos imunizantes foram explanados em uma matéria recente, publicada no UOL.

Um exemplo que ilustra o avanço da proteção gerada pelas vacinas é a Pfizer, que tem sido amplamente utilizada para dose de reforço. O imunizante consegue manter 95% de prevenção contra infecções.

Para os adolescentes entre 12 a 15 anos, a vacina da Pfizer tem eficácia de 100%, segundo o resultado de um ensaio clínico divulgado pela farmacêutica em 22 de novembro, cujos dados serão enviados para revisão dos pares.

A eficácia dos imunizantes foi analisada, ainda, por agências reguladoras de saúde de diversos países, incluindo a Anvisa, no Brasil, e a FDA, nos Estados Unidos. As avaliações focaram na maneira como os imunizantes foram produzidos, a partir de dados apresentados pelos laboratórios e um conselho feito por membros das instituições.

Além dessas instituições, a própria OMS tem avaliado, com base na segurança e eficácia dos imunizantes, quais entram para a lista de aprovados para uso. Diante das evidências apresentadas pelas empresas de fármacos a partir de estudos científicos, os imunizantes aplicados não podem ser considerados como experimentais.

Os testes foram elaborados para testar segurança e eficácia porque até então era preciso conter o número de infectados de forma segura, de modo que os sistemas de saúde não ficassem sobrecarregados.

Superada esta etapa, os voluntários continuam sendo acompanhados para responder a outras perguntas: quanto tempo dura a imunidade fornecida pela vacina? Qual a vantagem de se tomar doses de fabricantes diferentes? Qual a necessidade de uma dose de reforço?

Termo ‘experimental’ é equivocado

O professor de infectologia da UFSC Daniel Mansur diz que o termo “experimental”, citado na publicação do secretário de incentivo à cultura, foi usado pejorativamente, mas não deveria.

Mansur explica que todas as vacinas existentes passaram por fases experimentais, mas que isso “não significa que elas não tiveram todas as etapas de segurança checadas”.

O infectologista complementou ainda que os imunizantes são submetidos a etapas de segurança e que algumas das farmacêuticas têm mais de 30 anos de experiência no desenvolvimento de vacinas de RNA, o que garante protocolos eficientes.

“A partir do momento em que [a vacina] entra em circulação, ela deixa de ser experimental e vira algo comprovado. Então, penso que nesse sentido a conotação de experimental, como sendo de algo ruim, é o problema [da postagem], mas essa fase que as pessoas podem estar chamando de experimental é restrita às fases 1, 2 e 3 que são necessárias [antes da aprovação das vacinas]”, diz Mansur.

No Brasil, as vacinas da Pfizer-BioNTech e da Oxford-Astrazeneca, produzida no país pela Fiocruz, já receberam autorização definitiva para aplicação. Já os imunizantes do Instituto Butantan e da Johnson & Johnson receberam autorização emergencial que vale enquanto durar a pandemia.

Monitoramento permanente das vacinas

Todas as vacinas em uso no mundo — e não apenas as desenvolvidas contra o coronavírus — devem ser constantemente monitoradas para que a segurança seja contínua, segundo recomendações da OMS.

Sobre este assunto, o professor e vacinologista da UFPel Odir Dellagostin explica que após a aprovação do uso emergencial dos imunizantes, a avaliação segue para a fase quatro, em que indivíduos vacinados estão sob monitoramento para que seja possível detectar qualquer tipo de alteração dos dados observados durante os testes. Qualquer efeito adverso grave detectado é informado e investigado.

“Felizmente, estes efeitos adversos graves têm sido muito raros. A maioria, após investigação, acaba sendo descartado, ou seja, é identificado que estes efeitos não são decorrentes das vacinas. A segurança e a eficácia continuam sendo monitoradas de forma permanente, assim como ocorre com outras vacinas, mesmo as mais tradicionais”, diz.

Por que investigamos?

Em sua quarta fase, o Comprova checa conteúdos suspeitos sobre o governo federal, as eleições ou a pandemia que tenham atingido alto grau de viralização. O post verificado alcançou 3,2 mil interações até o dia 22 de novembro.

A checagem de conteúdos como esse é importante, visto que a desinformação pode colocar a saúde das pessoas em risco. Como citado acima, ao contrário do que o post faz crer, a imunização é uma das principais formas para conter a pandemia.

O Comprova já checou outros conteúdos criticando as vacinas desenvolvidas para combater o coronavírus, como a live de uma médica afirmando que as vacinas são experimentais e a que afirmava de maneira falsa que os imunizantes seriam capazes de gerar HIV, câncer ou HPV, o que não procede.

Para o Comprova, enganoso é o conteúdo que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; ou ainda que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Saúde

Investigado por: 2021-11-19

Compra de máscaras por R$ 28,8 milhões na PB foi erro de cadastro; valor correto é R$ 9,6 mil

  • Enganoso
Enganoso
É enganosa a postagem indicando que o governo da Paraíba gastou R$ 28,8 milhões para comprar 3 mil máscaras de proteção contra a covid-19 em processo de licitação, o equivalente a R$ 9,6 mil a unidade. O valor é resultado de um erro de digitação, reconhecido pela administração estadual. No Portal da Transparência, o gasto está corrigido: R$ 9,6 mil é o valor global do contrato. O valor unitário de cada máscara foi de R$ 3,20.
  • Conteúdo verificado: Postagens no Twitter afirmam que o governo da Paraíba gastou R$ 28,8 milhões para comprar 3 mil máscaras de proteção contra a covid-19, o equivalente a R$ 9,6 mil a unidade.

Publicações no Twitter enganam ao afirmar que o governador da Paraíba desembolsou R$ 28,8 milhões para comprar 3 mil máscaras de proteção contra a covid-19, o equivalente a R$ 9,6 mil a unidade. Um dos autores é o deputado estadual Cabo Gilberto (PSL), alinhado ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e que tem pretensão de se candidatar em 2022 para comandar o Executivo paraibano.

O valor de R$ 28,8 milhões havia sido divulgado de forma equivocada pelo próprio governo no Portal da Transparência por um erro de digitação, segundo informações da Controladoria-Geral do Estado (CGE). O valor de R$ 9,6 mil não representava o preço de cada máscara (o que geraria o valor de R$ 28,8 milhões), mas sim o valor global para a compra das 3 mil máscaras. Assim, o custo unitário de cada máscara foi, na realidade, de R$ 3,20.

A correção foi feita no dia 13 de novembro e divulgada em redes sociais do Departamento Estadual de Trânsito (Detran) da Paraíba, órgão para o qual foram adquiridas as máscaras. Ainda assim, a história continuou circulando nas redes com um print que se assemelha a uma versão antiga da nota no Portal da Transparência. A postagem do deputado, por exemplo, foi realizada no dia seguinte, quando o valor correto já estava disponível para consulta pública.

O Comprova procurou os autores. Um deles não tinha a opção de mensagem direta no Twitter, enquanto que, para o deputado, foram enviados e-mails e mensagens, mas ele não respondeu. A página do Instagram que originou a história, dias antes da correção no portal da transparência, atribuiu a culpa ao governo da Paraíba.

O Comprova considerou o conteúdo enganoso porque usa dados imprecisos e confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Como verificamos?

Para conferir a veracidade do contrato exposto nas postagens, o Comprova fez uma pesquisa no Portal da Transparência do governo da Paraíba. Na página, foi identificado o mesmo número contratual apresentado na publicação, mas com valores muito inferiores ao divulgado nas redes sociais.

Uma tentativa de localizar o documento compartilhado também foi feita em uma consulta ao Diário Oficial, mas sem sucesso.

A reportagem ainda entrou em contato com o governo da Paraíba para questionar sobre o conteúdo da publicação e a divergência de dados, e também com a empresa citada no tuíte.

Além disso, foram consultados órgãos de controle – Ministério Público Estadual, Ministério Público Federal e Tribunal de Contas – para averiguar a existência de alguma investigação referente ao conteúdo da postagem.

Por fim, foram procurados os autores. Um deles não tinha a opção de mensagem direta no Twitter, enquanto que, para o deputado, foram enviados e-mails e mensagens, mas ele não respondeu. O Comprova também entrou em contato com uma página no Instagram que teve um vídeo mais antigo contestado pelo Detran-PB.

Verificação

Contratos do governo da Paraíba na pandemia

O Portal da Transparência do governo da Paraíba aponta que o estado empenhou, desde o início de 2021, o total de R$ 1,1 milhão com a empresa L&J Transfer, cujo CNPJ é citado no tuíte. A empresa forneceu uma série de produtos ao governo local, como luvas, material sanitizante, tecido – e também máscaras.

As duas publicações no Twitter que foram verificadas pelo Comprova indicam que a compra das 3 mil máscaras foi feita no dia 26 de março de 2021 pelo Detran-PB “para a campanha educativa do Maio Amarelo”.

No Portal da Transparência é possível encontrar um empenho (número 546) nessa mesma data, feito com a L&J Transfer, para a aquisição de “três mil máscaras descartáveis a serem distribuídas na campanha educativa Maio Amarelo, prevista para o período de 01/05/2021 a 31/05/2021”. O valor pago pelo Detran, no entanto, é bem inferior ao descrito nas postagens: R$ 9.600. Assim, cada máscara custou R$ 3,20.

O número do processo licitatório e do pregão também são idênticos aos que aparecem nas publicações.

Em 2021, o governo da Paraíba fez três processos licitatórios ou dispensas com a participação da L&J Transfer.

Ao fazer a consulta do documento que apresenta número idêntico ao divulgado nas redes sociais, o Portal da Transparência mostra uma tela semelhante à que viralizou, mas com o valor correto do contrato, de R$ 9,6 mil (abaixo).

Outro processo existente era de janeiro, tinha valor inferior a R$ 1 milhão, mas foi cancelado.

O terceiro, também de março, está em andamento. A soma dos serviços é de R$ 1,182 milhão para a aquisição emergencial de luvas e máscaras. A maior parte desse valor – R$ 1,165 milhão – tem a L&J Transfer como destinatária.

Analisando-se detidamente o contrato desta licitação, é possível identificar que a empresa deve fornecer 500 mil máscaras a R$ 0,40 cada; a um custo final de R$ 200 mil. O resto do valor é para a compra de luvas de diversos tipos.

Em contato telefônico com a L&J Transfer, a empresa informou o e-mail para o Comprova repassar a demanda, mas as questões não foram respondidas até a publicação do texto.

Autenticidade do documento nas redes sociais

Procurado pelo Comprova, o Governo da Paraíba explicou que houve um equívoco na inserção dos dados do contrato no Portal da Transparência. Em nota, a Controladoria-Geral do Estado (CGE) disse que houve um erro de digitação e que a correção foi providenciada tão logo ele foi identificado. A Controladoria indica que foi falha humana.

A Gerência Executiva de Auditoria da Controladoria também abriu uma investigação “com o objetivo de apurar procedimentos adotados e respectivos responsáveis pelo cadastramento do Processo Licitatório Nº 26.201.002582.2021 – Pregão nº: 0008/2021 no Sistema Gestor de Compras e sua disponibilização no Portal de Transparência do Estado”, informou, também em nota. O trabalho teve início no último dia 16 e a previsão é que ele seja concluído até 23 deste mês, segundo documento enviado ao Comprova.

A correção foi feita no dia 13, inclusive nas redes sociais do Detran-PB, o órgão promotor das ações educativas para as quais foram adquiridas as máscaras. A postagem, naquele momento, era uma reação a um vídeo que já estava circulando sobre o valor da proteção facial antes dos tuítes aqui verificados.

O Detran, no entanto, não deixava claro no post que havia ocorrido um erro no lançamento do portal da transparência, o que só foi confirmado a partir de um questionamento direto do Comprova para a CGE. O Detran escreveu que o vídeo era uma “fake absurda e folclórica”.

Para a publicação no Twitter, feita no dia seguinte à correção, os autores usaram prints do Portal da Transparência de data anterior à retificação do governo e, por esta razão, sugerem que houve sobrepreço nas máscaras.

Órgãos de controle

Com as informações sobre o suposto contrato de R$ 28,8 milhões para máscaras, os Ministérios Públicos do Estado da Paraíba e o Federal foram consultados sobre eventual investigação sobre o caso, ou outras apurações relacionadas a compras do governo durante a pandemia.

Em nota, o MPPB informou que atua na prevenção a compras superfaturadas e, durante a crise sanitária, uma das atribuições passou a ser a análise e monitoramento de despesas públicas feitas pelo Estado e municípios para o enfrentamento à covid-19.

“Esse trabalho vem sendo realizado por uma equipe de auditores de contas públicas do Centro de Apoio Operacional (CAO) às promotorias de Justiça de defesa do patrimônio público com o objetivo de identificar, através da análise de empenhos, indícios de sobrepreço em insumos, medicamentos, equipamentos hospitalares e em kits de higiene e cestas básicas destinados às famílias em situação de vulnerabilidade social”, sustentou o órgão.

O MPPB acrescentou que já foram elaborados relatórios sobre o assunto. Alguns, segundo o órgão, apontaram indícios de sobrepreço e, por isso, foram encaminhados aos promotores de Justiça que atuam na defesa do patrimônio público para que fossem adotadas as providências necessárias à apuração dos fatos.

Pesquisa realizada junto ao cartório da Promotoria de Justiça de defesa do patrimônio público de João Pessoa sobre aquisição de máscaras cirúrgicas pelo Estado da Paraíba apontou que foram instaurados, em 2020 e em 2021, procedimentos, inclusive em razão do relatório encaminhado pelo CAO. Uma das investigações, no entanto, foi encaminhada para o MPF porque os recursos empregados na compra de máscaras eram federais.

“Especificamente, em relação aos fatos nos prints, a coordenação do CAO informou que, em análise preliminar, não há relatório de auditoria sobre a compra de máscaras apontada e que foi aberto procedimento (PGA 001.2021.069137) visando à estruturação inicial dos documentos públicos relativos à contratação citada para, em seguida, encaminhá-lo a um dos promotores de Justiça de defesa do patrimônio público de João Pessoa para averiguação”, afirmou o órgão.

O MPF também afirmou que não há investigação relacionada ao conteúdo da postagem no Twitter, embora haja uma apuração vinculada a compras no período da pandemia em 2020. O órgão federal não repassou detalhes sobre o objeto do contrato, valores e empresas.

O Tribunal de Contas não se manifestou.

Origem do conteúdo

O conteúdo mais antigo encontrado nesta checagem é de uma página no Instagram chamada @bombaparaiba. Em 12 de novembro, a conta publicou um vídeo alegando que “recebeu uma denúncia” sobre uma compra de 3 mil máscaras por R$ 28,8 milhões pelo governo do Estado, citando como fonte o Portal da Transparência. Esse mesmo vídeo foi contestado pelo Detran-PB em 13 de novembro, data em que a informação foi corrigida no portal.

Em contato com o Comprova, a página @bombaparaiba confirmou que “foi a primeira a divulgar” e negou ter espalhado desinformação. “Depois da denúncia modificaram lá, mas eles (governo do Estado da Paraíba) só nos acusam de fake, em nenhum momento assumiram se foi erro de digitação, apenas modificaram sem justificativa. Falar que é fake foi a solução fácil, não assumir erro deve ser difícil.”

Em 14 de novembro, o deputado Cabo Gilberto Silva (PSL-PB) deu novo fôlego ao assunto quando postou um print do que parece uma versão anterior, ainda não corrigida, do site de transparência do governo da Paraíba. A imagem traz o dado equivocado de R$ 28,8 milhões.

Em tom irônico, Silva escreveu: “[…] nosso governo sabe gastar o dinheiro do pagador de impostos! O decreto de calamidade só acaba no meio do ano que vem, se ele não prorrogar novamente! João Azêvedo (governador do Estado da Paraíba) bom danado.” A história então viralizou no Twitter e virou objeto de apuração do Comprova.

De acordo com um site de notícias local, o deputado Cabo Gilberto, ex-policial militar, cogita concorrer ao cargo de Azevêdo nas eleições do próximo ano. Ele apoia o presidente Jair Bolsonaro e pretende se filiar ao mesmo partido do chefe do Executivo, este em conversas avançadas com o PL.

O deputado também foi notícia recentemente ao recorrer ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) contra o “passaporte da vacina” no Estado e ter o pedido negado pela Corte. Mais tarde, participou de uma sessão presencial da Assembleia Legislativa sem estar imunizado contra a covid-19, contrariando as regras e gerando reação contrária de colegas parlamentares. Dias depois, anunciou que havia tomado a primeira dose da Coronavac.

Quem é o governador da Paraíba?

O governador da Paraíba é João Azevêdo, eleito em 2018 no primeiro turno. Ele deixou o PSB em dezembro de 2019, em meio a desavenças com o seu antecessor, Ricardo Coutinho, que assumiu a presidência estadual do partido. Após seu mandato, Coutinho passou a ser acusado de lavagem de dinheiro e outras irregularidades, o que contribuiu para o afastamento entre os dois. Azevedo se filiou ao Cidadania em janeiro de 2020.

Azevêdo já entrou em atrito com o Bolsonaro, quando o presidente chamou gestores nordestinos de “paraíbas”, em 2019. O chefe do Executivo negou, posteriormente, estar fazendo uma crítica à região e disse se referir apenas aos governadores do Maranhão, Flávio Dino (PSB), e da Paraíba, Azevêdo, a quem chamou de “intragáveis”. Em março de 2021, Azevêdo também criticou as postagens de Bolsonaro sobre o envio de recursos para os estados. Em setembro, respondeu ao discurso do presidente na ONU, contra as medidas de distanciamento social adotadas pelos governadores.

Este ano, o governador paraibano também já se encontrou com o ex-presidente Lula (PT), possível adversário de Bolsonaro nas eleições de 2022.

Por que investigamos

Em sua quarta fase, o Comprova checa conteúdos suspeitos sobre governo federal, pandemia e eleições que tenham atingido alto grau de viralização. As postagens aqui verificadas tiveram, juntas, mais de 5 mil interações até o dia 19 de novembro.

Com a proximidade das eleições, o uso de desinformação torna-se ainda mais grave porque lança dúvidas sobre eventuais candidatos em favor de outros concorrentes, confundindo a população que tem direito a fazer sua escolha a partir de dados confiáveis.

O deputado, autor da desinformação, é apontado como possível candidato ao governo da Paraíba e adversário de João Azevêdo. Ele ainda se apresenta como aliado de Bolsonaro, que também deverá concorrer à reeleição para presidente.

O Comprova já fez inúmeras verificações que colocam candidatos que se opõem ao presidente em condições de desvantagem perante a opinião pública a partir de mentiras, como o vídeo de Bia Kicis sobre a retenção do passaporte de Lula, ou tentando favorecer outros, como o que sugere declaração de apoio de Lewis Hamilton a Bolsonaro.

Para o Comprova, enganoso é o conteúdo que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; ou ainda que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Atualização: Esta verificação foi atualizada em 22 de novembro para incluir a resposta da página do Instagram que originou a história. 

Saúde

Investigado por: 2021-11-19

Não há relação entre casos de mal súbito em atletas e vacinas contra covid

  • Enganoso
Enganoso
Vídeo viral no Twitter mostra atletas desmaiando durante partidas e faz associação com imunizantes, mas dois deles nem tinham sido vacinados quando sofreram o mal súbito. Os registros de desmaios entre atletas não são raros, e parte deles estão relacionados às questões climáticas. Até o momento, não há nenhum trabalho científico publicado que relacione vacinas à incidência de mal súbito ou morte súbita.
  • Conteúdo verificado: Um vídeo publicado por uma médica no Twitter mostra atletas e árbitros de diferentes modalidades desmaiando durante prática esportiva. A autora do post diz que “a incidência de mal súbito tende a subir”. Embora não cite as vacinas contra a covid-19, seguidores relacionaram os casos com a imunização nos comentários.

É enganosa a publicação compartilhada no Twitter que mostra um vídeo que exibe uma série de recortes nos quais atletas e árbitros desmaiam durante práticas esportivas.

O vídeo é acompanhado da legenda: “Meras coincidências? Não adianta vir com a história de sedentarismo e obesidade na pandemia. São todos atletas! A incidência de mal súbitos só tende a subir”. Comentários deixados na postagem mostram que usuários relacionam os incidentes às vacinas contra a covid-19.

À exceção de um dos casos mostrado no vídeo, que não conseguimos identificar a data, os demais ocorreram neste ano. Em dois deles, foi confirmado que as pessoas não estavam imunizadas no momento em que o desmaio foi registrado.

A reportagem também foi em busca de pesquisas ligadas ao tema, mas não há indícios de que ocorrências de mal súbitos tenham aumentado recentemente ou de que exista essa tendência, como sugere a publicação. Essa alegação não é respaldada pela ciência, que considera as vacinas seguras para o uso e eficazes contra o vírus.

Casos de desmaios e outras reações de mal súbito são comuns no meio esportivo, ainda que os atletas tenham uma rotina considerada saudável.

A reportagem procurou a usuária que publicou o vídeo, que alcançou mais de 2 mil compartilhamentos, mas não recebeu resposta até a publicação desta verificação.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações.

Como verificamos?

Inicialmente, foi realizada uma busca reversa de imagens, utilizando frames de cada um dos episódios que aparecem no vídeo. São sete situações diferentes, a maioria ocorrida em 2021. Além das situações individualmente, a sequência de atletas desmaiando também aparece em dois vídeos maiores, com mais desinformação sobre vacinas, postados na plataforma russa Vidio+.

Em seguida, o Comprova procurou a Organização Mundial de Saúde (OMS) e o Ministério da Saúde em busca de informações oficiais sobre casos de mal súbito e entrevistou o médico cardiologista Sérgio Timerman, diretor do Laboratório de Simulação de Emergências Cardiovasculares do InCor (Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da FMUSP).

Por fim, a autora do tuíte foi procurada através de um comentário no Twitter, mas não respondeu ao pedido de contato até a publicação desta reportagem.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 19 de novembro de 2021.

Verificação

Relação entre vacinas e mal súbito é enganosa

Tanto o mal súbito quanto a morte súbita são definidos por uma perda de consciência inesperada e repentina. A diferença é que, na morte súbita, há também uma parada cardiorrespiratória, segundo explica Sérgio Timerman, diretor do Laboratório de Simulação de Emergências Cardiovasculares do Instituto do Coração.

O mal súbito pode ter causas diversas: infarto, AVC, arritmia cardíaca, longo período sem alimentação, frio e calor intensos. “Diferentemente da morte súbita em que a pessoa perdeu a consciência porque o coração falhou como bomba e ela teve uma parada cardiorrespiratória”, explica Timerman.

Ele é enfático ao dizer que é enganosa a relação entre vacinação e casos de mal súbito ou morte súbita. “Eu fui conferir. Não há nenhum relato de parada cardiorrespiratória ou aumento de morte e mal súbitos relacionados à vacina. Isso é fake news.”

O Ministério da Saúde informou que não há uma classificação específica para “morte súbita” e não é possível comparar sua incidência ano a ano.

Os casos que aparecem no vídeo

Christian Eriksen, 12 de junho

A primeira cena do vídeo publicado pela médica mostra o jogador dinamarquês Christian Eriksen desmaiado em campo. O mal súbito ocorreu no dia 12 de junho durante uma partida de futebol entre Dinamarca e Finlândia pela Eurocopa 2020.

Ele recebeu massagem cardíaca até ser reanimado e encaminhado a um hospital. A partida chegou a ser suspensa, mas foi retomada após a notícia de que Eriksen estava em condição estável. Ele precisou colocar um desfibrilador cardíaco, o que o impediu de seguir como atleta da Inter de Milão, clube italiano pelo qual jogava até o incidente.

Três dias após o episódio, o Comprova mostrou que a morte súbita não tinha relação com a vacina contra a covid-19, como foi sugerido em boatos divulgados por um blogueiro bolsonarista. Ele se baseou em uma suposta entrevista do médico-chefe do clube de Eriksen a uma rádio italiana, mas a rádio informou que a entrevista nunca existiu. O médico também negou que Eriksen tivesse se vacinado anteriormente ao incidente.

| Jogador Christian Eriksen foi reanimado em campo; ele precisou colocar um desfibrilador no coração

Jogadora de críquete, 2 de julho

O segundo caso a aparecer no vídeo mostra uma jogadora de críquete caída em campo, enquanto outras se aproximam e chamam por socorro. Nas imagens, não fica claro quem é a mulher caída, mas o episódio aconteceu no dia 2 de julho, durante uma partida entre os times femininos das Índias Ocidentais e do Paquistão, no Coolidge Cricket Ground, em Antígua.

Naquela partida, duas jogadoras das Índias Ocidentais – Chinelle Henry e Chedean Nation – tiveram mal súbito, com cerca de dez minutos de diferença entre um caso e outro. O Comprova entrou em contato com o Windies Cricket – o time das Índias Ocidentais – questionando sobre o que causou os dois episódios, mas não obteve resposta.

Contudo, em 3 de julho, o jornal Hindustan Times, de Nova Délhi, publicou em uma reportagem sobre o caso que o clube emitiu um comunicado informando que as duas atletas estavam conscientes e estáveis.

No dia 4, a ESPN publicou que as duas já estavam de volta ao time e incluiu vídeos postados no Twitter do Windies em que elas afirmavam que estavam bem, sem internação hospitalar e sem restrições. As duas puderam disputar a partida seguinte dois dias depois.

| Jogadoras das Índias Ocidentais que tiveram mal súbito puderam disputar outra partida dois dias depois

Moussa Dembele, 23 de março

O terceiro atleta a aparecer nas imagens é o jogador de futebol francês Moussa Dembele. Ele sofreu um mal súbito e caiu durante um aquecimento, antes de entrar em campo pelo Atlético de Madrid, em 23 de março de 2021.

Segundo o site de notícias Sky Sports, ele chegou a ficar mais de um minuto inconsciente, mas deixou o campo “caminhando sem qualquer ajuda”. Outro site, o Talk Sport, afirmou que exames relacionaram o desmaio repentino à baixa pressão arterial.

O Comprova também procurou o Atlético de Madrid para comentar sobre o caso, mas não obteve resposta do clube até esta publicação.

| A imprensa profissional relatou que Moussa Dembele passou mal por causa de pressão baixa

Jack Draper, 25 de março

No vídeo compartilhado também aparecem imagens do momento em que o tenista britânico Jack Draper desmaia durante uma partida oficial. De acordo com publicação do jornal The Guardian, o episódio ocorreu em 25 de março, durante o torneio Miami Open.

Ao portal de notícias Sky Sports, o jogador afirmou que em janeiro ficou duas semanas afastado dos treinos por conta de um quadro “agressivo” de coronavírus.

A LTA, órgão britânico que patrocina atletas no tênis e que concede uma bolsa a Draper, confirmou ao Comprova por e-mail que o desmaio ocorreu por conta do calor. Além disso, afirmou que o tenista não era vacinado contra a covid-19 na época do episódio e que ele próprio afirmou posteriormente que não estava habituado àquele nível de tênis profissional no calor da Flórida.

| Jack Draper confessou que não estava habituado ao nível de tênis profissional no calor da Flórida

Desconhecido, 28 de abril

O quinto caso a aparecer nas imagens é de um homem que sofre um mal súbito, instantes antes de fazer um saque em uma partida de badminton. A disputa parece acontecer num ginásio ou em outro lugar onde haja mais de uma quadra, e não foi possível identificar elementos que mostrem onde o caso aconteceu, a identidade do homem que aparece nas imagens, nem o estado de saúde dele.

Esta mesma imagem aparece em dois vídeos com mais desinformação sobre vacinas, hospedados em um site russo. A busca reversa de imagens do Yandex localizou outros quatro vídeos, maiores do que o trecho que aparece no tuíte aqui verificado, que indicam que o caso aconteceu no dia 28 de abril de 2021, por volta das 19h, conforme aparece no topo das imagens de uma câmera de segurança.

Quatro perfis diferentes no YouTube compartilharam o mesmo vídeo, todos da Indonésia, mas os títulos e legendas não informam onde o caso aconteceu. Um quinto vídeo encontrado no YouTube sugere que o incidente tenha ocorrido na Malásia.

O Comprova tentou contato com o perfil cujo vídeo tinha mais visualizações, mas não obteve resposta.

| O mecanismo de busca reversa permite identificar outras vezes em que aquele vídeo foi postado

| Vídeo encontrado por meio da busca reversa do Yandex

Charles Bulu, 30 de março

O árbitro ganês Charles Bulu também aparece na seleção de imagens divulgadas. Ele desmaiou em 30 de março deste ano, enquanto apitava uma partida entre Costa do Marfim e Etiópia pelas eliminatórias da Copa Africana das Nações.

No dia seguinte, o portal de esportes Goal publicou que o árbitro de 34 anos tinha sido levado a um hospital em Abjdan, na Costa do Marfim, e que passava bem.

Solicitamos informações à Confederação Africana de Futebol, responsável pelo campeonato, mas não obtivemos resposta.

| Árbitro passou mal durante partida entre Costa do Marfim e Etiópia

Embora não haja informações se o árbitro já estava vacinado, é improvável que isso tenha ocorrido. Isso porque as primeiras vacinas contra a covid-19 só começaram a ser administradas em Gana, seu país natal, em 1º de março.

O início da campanha foi possível graças ao consórcio COVAX, da Organização Mundial da Saúde, que entregou um lote inicial de 600 mil doses para o país com aproximadamente 31 milhões de habitantes. À entidade, o presidente ganês, Nana Akufo-Addo, informou que os primeiros a serem imunizados seriam os profissionais da área da saúde.

Bert Smith, 30 de março

O último a aparecer nas imagens é o árbitro de basquete Bert Smith, que desmaiou durante uma final regional de um torneio universitário, em 31 de março de 2021, em Indianápolis, no estado de Indiana (EUA). A cena deste incidente também consta na seleção de imagens divulgadas pela médica Roberta Lacerda.

Em 9 de abril, Smith contou ao jornal The Indianapolis Star que, por causa do mal súbito naquela partida, descobriu que tinha um coágulo sanguíneo no pulmão. “A gente não sabe para onde o coágulo estava indo em seguida”, disse na época.

De acordo com o site de notícias USA Today, Smith testou positivo para coronavírus em agosto, contudo os médicos não disseram se há uma correlação entre a doença causada pelo vírus e seu coágulo sanguíneo.

O Comprova enviou um e-mail de contato ao NCAA Basketball Championship, torneio universitário de basquete dos Estados Unidos, mas não teve retorno até a publicação desta verificação.

| Árbitro desmaiou enquanto apitava partida de basquete universitário, nos Estados Unidos

Casos de mal súbito anteriores à pandemia

Sérgio Timerman lembra que já tivemos casos de mal súbito e morte súbita no ambiente esportivo no passado. “Não é algo frequente, mas acontece. Já vimos uma série de casos de parada cardiorrespiratória em campos e quadras esportivas. Muitas vezes houve uma reversão pelo bom atendimento. Outras vezes, não houve reversão.”

A reversão ocorre quando a pessoa sofre uma morte súbita, mas é reanimada pela equipe médica. É o que aconteceu com o dinamarquês Christian Eriksen.

Outros casos não tiveram um desfecho feliz. Em 2003, muito antes da pandemia e das atuais vacinas, o meio-campista Marc-Vivien Foé, da seleção de Camarões, disputava a semifinal da Copa das Confederações contra a Colômbia quando teve um colapso em campo e morreu. De acordo com a ESPN, tempos depois foi revelado que ele sofria de cardiomiopatia hipertrófica – uma rara condição hereditária, que afeta menos de 0,2% da população mundial.

Em 2004, o zagueiro do São Caetano Serginho passou mal em decorrência de uma parada cardiorrespiratória durante partida contra o São Paulo, no estádio do Morumbi, em 2004. Ele morreu horas depois no hospital. Posteriormente foi revelado pela imprensa que o clube saberia de um problema no coração do jogador que deveria tê-lo impedido de continuar jogando. Contudo, o time nega.

Atletas de alto rendimento precisam passar por bateria de exames rotineiramente para detectar problemas silenciosos no sistema circulatório e evitar que este tipo de incidente ocorra, explica Timerman. Exemplo disso é o caso do árbitro Bert Smith, cujo coágulo na circulação sanguínea passou despercebido até o momento em que ele desmaiou durante uma partida de basquete. Exames posteriores apontaram o diagnóstico como a causa do mal súbito.

A autora

A autora da publicação no Twitter do vídeo com uma seleção de imagens de atletas desmaiando é Roberta Lacerda Almeida de Miranda Dantas, graduada em Medicina pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Tanto em sua conta na rede social, como no Currículo Lattes (com última atualização em 2019), consta que possui especialização em infectologia.

Roberta ingressou no Twitter há seis meses, usando a conta para publicações antivacinas e a favor do tratamento precoce – sendo este último comprovadamente ineficaz. Apesar da recente existência da conta, ela reúne mais de 2,4 mil publicações, às vezes com aproximadamente 30 postagens por dia.

A médica também divulga um site que reúne vídeos sobre covid supostamente retirados das redes sociais por conter conteúdos considerados inadequados pelas empresas de tecnologia. Além disso, replica informações em uma conta no Telegram, que leva seu nome.

Outra publicação de Roberta Lacerda já foi verificada pelo Comprova. Em agosto deste ano, a médica distorceu dados apresentados por um diretor-médico do Herzog Hospital de Jerusalém para levantar suspeitas sobre infecções em não vacinados.

Por que investigamos?

Em sua quarta fase, o Comprova verifica conteúdos suspeitos que tenham viralizado sobre a pandemia, eleições e políticas públicas do governo federal. O tuíte checado foi compartilhado 2,3 mil vezes e recebeu 5,5 mil reações. O vídeo foi reproduzido ao menos 39,3 mil vezes até o dia 19 de novembro de 2021.

Conteúdos enganosos desestimulam a população a tomar as vacinas contra a covid-19, a principal forma atualmente de prevenir o contágio e evitar mortes. O Comprova já mostrou ser mentira que a vacina cause HIV, câncer ou HPV. Também é falso que pessoas possam ser rastreadas após se vacinarem.

Embora a médica não cite os imunizantes em sua postagem, usuários que deixaram comentários acreditam que eles seriam os responsáveis pelos casos mostrados. “Eu fico apavorada. Em minha família toda, apenas eu e meu dois filhos menores não nos vacinamos”, disse uma usuária. Outra diz que não tomou os imunizantes e se refere a eles como “experimentais” – alegação já desmentida pelo Comprova.

Para o Comprova, enganoso é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações e que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Política

Investigado por: 2021-11-18

Ao contrário do que diz vídeo, lei 14.132 não é para prender governadores e prefeitos que adotam medidas restritivas

  • Falso
Falso
É falso o conteúdo do vídeo que circula nas redes sociais afirmando que o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) criou uma lei para punir governadores e prefeitos que "perseguissem a população" por meio de lockdowns para frear a covid-19. A lei citada foi proposta em agosto de 2019, antes da pandemia, e trata sobre o crime de stalking (perseguição, em inglês), que surgiu como uma prática virtual, mas se estende também ao ambiente offline.
  • Conteúdo verificado: Vídeo no TikTok usa lei que trata sobre a prática do stalking para afirmar, falsamente, que governadores, prefeitos e policiais militares poderão ser multados e presos caso persigam “cidadãos de bem” contrários ao lockdown.

É falso o vídeo que circula no TikTok afirmando que o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) assinou um decreto permitindo que governadores, prefeitos e policiais militares sejam multados e presos caso “venham a prender ou perseguir ou agredir cidadão de bem no seu direito de ir e vir ou no seu direito de livre iniciativa de trabalho honesto”, referindo-se às medidas para conter a pandemia.

O autor da gravação tira de contexto a lei 14.132, de iniciativa do Congresso Nacional e sancionada por Bolsonaro em 31 de março de 2021. Diferentemente do que ele diz, a lei transforma em crime a prática do stalking, que é a perseguição reiterada de alguém em ambiente físico ou virtual.

A reportagem tentou contatar o responsável pelo perfil que postou a gravação, mas não obteve resposta até a publicação deste texto. A postagem foi considerada falsa porque usa informações inventadas.

Como verificamos?

O narrador do vídeo cita o “decreto 14.132”, que, na realidade, é o número da lei à qual ele se refere. Por uma busca simples no Google, a reportagem acessou o texto da lei no site da Imprensa Nacional, do governo federal. A partir desse documento, o Comprova classificou o conteúdo verificado como falso, já que o material não sustenta as alegações do vídeo.

A reportagem também tentou encontrar o autor do post original, mas não conseguiu. No entanto, foi localizada a postagem compartilhada no Instagram que aparece no vídeo, feita por uma apoiadora do presidente Jair Bolsonaro. Então, foi feito contato com o perfil que postou o vídeo no TikTok por mensagem direta e comentário aberto no post, mas ele não respondeu.

Por fim, a equipe entrevistou o advogado criminal Bruno Paiva para saber mais detalhes sobre a lei citada na gravação.

Verificação

A lei

Mencionada na postagem, a lei existe, mas seu conteúdo foi retirado de contexto para dizer que seria uma determinação de Bolsonaro contra governadores, prefeitos e policiais. A lei número 14.132 instituiu, na realidade, o crime de perseguição, conhecido como stalking (em inglês), e foi apresentada como projeto ainda em 2019, antes da pandemia.

A prática ilegal é definida como perseguição reiterada, por qualquer meio, como a internet — cyberstalking —, que ameaça a integridade física e psicológica de alguém, interferindo na liberdade e na privacidade da vítima. Portanto, não mantém relação com o que foi citado no vídeo que circula entre apoiadores do presidente nas redes sociais.

O documento foi sancionado por Bolsonaro, com publicação em 1º de abril de 2021, e acrescenta ao Código Penal o crime de perseguição, revogando o artigo 65, do decreto 3.688 de 3 de outubro de 1941, que descrevia a Lei das Contravenções Penais.

A pena para quem for condenado é de 6 meses a 2 anos de prisão, mas pode chegar a 3 anos com agravantes, como crimes contra mulheres, crianças e idosos. Antes, o crime não era tipificado e tinha como pena de 15 dias a dois meses, ou multa, quando enquadrado na infração de perturbação da tranquilidade alheia.

Segundo o advogado criminalista Bruno Paiva, o contexto do decreto levou em consideração que as mulheres são as maiores vítimas de perseguição na internet, que pode ou não se estender para a vida fora das redes sociais. Paiva diz ainda que apesar das estatísticas indicando quais são as vítimas recorrentes do stalking – majoritariamente mulheres –, a lei protege qualquer cidadão que seja alvo desse tipo de crime.

“Esse crime surge em um contexto que já vem de vários anos de crimes contra as mulheres, sobretudo de crimes que não chegam a se transformar em lesão corporal ou feminicídio. No entanto, atingem as mulheres muito mais, após términos de relacionamento, onde [homens] vão atrás tanto na forma física quanto na esfera virtual”, explica.

Constrangimento por meio de redes sociais e telefonemas no ambiente de trabalho podem caracterizar as ameaças que a lei coíbe, segundo o advogado.

Caso haja perseguição virtual, é possível fazer o registro em cartório por meio de uma ata notarial, em que um oficial vai atestar que aquele conteúdo de fato existiu, ainda que venha a ser apagado futuramente por quem cometeu o crime de perseguição.

“Se a ameaça acontecer presencialmente, de forma física, é interessante que seja registrado um boletim de ocorrência. Continuando a perseguição, que se procure a Defensoria Pública, um advogado ou uma delegacia, pedindo a investigação com as características da pessoa que está perseguindo”, detalha Paiva.

Autoria da lei

O projeto de lei foi apresentado pela senadora Leila Barros (PSB-DF), em agosto de 2019. Jogadora da seleção brasileira por 18 anos antes de entrar na política, Leila dedicou a aprovação do texto à radialista Verlinda Robles, obrigada a se mudar do Mato Grosso do Sul após sofrer stalking em 2018, e à jornalista Jaqueline Naujorks, que publicou o caso. “Quem já viveu o stalking na vida sabe o que isso significa”, disse a senadora.

De acordo com o site do Senado, o relator da matéria na Casa, Rodrigo Cunha (PSDB-AL), justificou a importância do projeto citando um dado da Organização Mundial da Saúde (OMS) de 2017, “que apontava o Brasil como o país com a quinta maior taxa de feminicídios por 100 mil mulheres em todo o mundo”. Ele também destacou que “76% dos feminicídios do país são cometidos por pessoas próximas à vítima”.

Por que investigamos?

Em sua quarta fase, o Comprova verifica conteúdos suspeitos que tenham viralizado sobre pandemia, políticas públicas do governo federal e eleições. O conteúdo checado aqui teve ao menos 44,7 mil interações até 18 de novembro.

Ao tirar de contexto a lei que tipifica o crime de stalking, o vídeo pode gerar confusão. E, por meio de informações falsas, pode colocar a população contra agentes estaduais e municipais, governadores e prefeitos e incentivar o descumprimento de eventuais medidas de restrição impostas para frear a covid-19.

A publicação segue a linha de Bolsonaro, que já chamou de tirano quem fechou estabelecimentos não essenciais por conta da pandemia.

O Comprova já checou outros conteúdos criticando medidas de restrição, como o vídeo que usava informações falsas para dizer que o lockdown foi inútil e o tuíte com frase de enviado da OMS retirada de contexto para sugerir que o órgão condena o fechamento.

Post viral semelhante foi verificado em abril pela agência Lupa e pelo Estadão Verifica.

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.

 

Política

Investigado por: 2021-11-12

Veto a carnaval não está sujeito apenas à vontade de Bolsonaro

  • Enganoso
Enganoso
É enganosa uma postagem afirmando que o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) pode vetar carnaval em todo o país. Legalmente, há possibilidade de restrições, mas o governo federal não sinalizou nenhuma medida para impedir a realização da festa em 2022. Especialistas em Direito ouvidos pelo Comprova dizem que mesmo que a União decidisse pelo cancelamento, haveria espaço para questionamentos na Justiça.
  • Conteúdo verificado: Postagem no Facebook afirma que Bolsonaro pode vetar carnaval de 2022 em todo o país se OMS ainda estiver em estado de pandemia.

É enganosa uma publicação no Facebook que afirma que o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) pode vetar o carnaval de 2022 se a Organização Mundial da Saúde (OMS) não tiver decretado o fim da pandemia. Embora, legalmente, ele possa adotar restrições, até o momento o governo federal não fez nenhum anúncio relacionado ao assunto, nem sinalizou a intenção de implementar a medida.

Dois professores especialistas em Direito apontam em que circunstâncias Bolsonaro poderia impedir a festa. Porém, mesmo que a União decida pelo cancelamento, há espaço para questionamento na Justiça.

A postagem também faz considerações sobre o impacto financeiro para as administrações locais que promovem o carnaval, com o suposto veto de Bolsonaro, mas os gestores ainda não definiram se vão fazer a festa em 2022, e eles próprios condicionam a sua realização ao quadro sanitário devido à covid-19.

O Brasil ainda vivencia um momento pandêmico, considerando as fases definidas pela OMS e, para o retorno à normalidade, precisa que a circulação do Sars-Cov-2 volte aos níveis observados em outras infecções sazonais.

Essa classificação depende da análise dos indicadores da doença no mundo e, até o carnaval, que ocorrerá no período de 26 de fevereiro a 1º de março, pode haver mudanças no comportamento da covid-19 que obriguem os governos a adotar medidas mais restritivas ou, ao contrário, a flexibilizar as atividades econômicas e sociais.

O perfil que publicou o conteúdo foi procurado, mas não respondeu à mensagem da reportagem.

O Comprova considerou o post enganoso porque usa dados imprecisos e confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Como verificamos?

Para avaliar se o presidente da República tem poder para vetar a realização de festividades como o carnaval, o Comprova entrevistou dois especialistas em Direito Constitucional: Gustavo Ferreira Santos, professor da Universidade Católica de Pernambuco, e Ricardo Gueiros, professor da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES).

Também procuramos os governos dos estados de Pernambuco, Bahia, São Paulo e Rio de Janeiro, bem como as prefeituras de Recife, Salvador, São Paulo e Rio de Janeiro, cidades que realizam os principais carnavais do país, para saber se há preparativos em andamento para a festa do próximo ano e que critérios serão usados para definir se elas serão liberadas ou não.

Nos sites da OMS e do Centro de Controle de Doenças (CDC), dos Estados Unidos, levantamos informações sobre as etapas de uma pandemia, desde o seu início até os critérios utilizados para declarar que ela foi encerrada.

Entramos em contato com a Secretaria de Comunicação da Presidência da República, e também com o Ministério da Saúde, para saber se Bolsonaro tinha o objetivo de tomar alguma medida em relação ao carnaval de 2022, mas não obtivemos retorno até o fechamento deste texto.

Por fim, procuramos o autor da postagem por meio de mensagens privadas do Facebook e deixamos um comentário na última publicação feita por ele em seu perfil na plataforma.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 12 de novembro de 2021.

Verificação

Presidente pode vetar as festas?

Em entrevista ao Comprova, o professor Gustavo Ferreira Santos lembrou que o STF entendeu as ações para combater o coronavírus como competência compartilhada entre a União, os estados e os municípios e que, dentro dessa decisão, valeriam as medidas mais restritivas adotadas por uma dessas esferas. Apesar disso, ele disse que uma decisão nesse sentido não poderia ser tomada agora, sem levar em consideração a situação epidemiológica de quando as festas vão acontecer.

Segundo o especialista, o presidente também teria que seguir o princípio da proporcionalidade em sua decisão. Nele, a medida de restrição de direitos precisa ser adequada (ser capaz de atingir o objetivo ao qual ela se propõe); necessária (não haver outra forma menos restritiva de atingir esses objetivos); e proporcional no sentido estrito (tem que valer a pena do ponto de vista jurídico restringir um direito, como a liberdade, para assegurar outro, como a saúde).

“O poder público não tem um cheque em branco em uma democracia constitucional. O presidente da República não pode fazer o que ele quiser”, lembra Santos. “No caso desse tipo de restrição, de fazer um lockdown durante o carnaval, se não existirem dados epidemiológicos que sustentem essa decisão, ela será considerada desproporcional e, portanto, excessiva; logo inconstitucional. Então, é um raciocínio que só pode ser feito na época”, diz.

Para o professor, Bolsonaro também não poderia recorrer a um estado de sítio para cancelar o carnaval. “O estado de sítio precisava ter uma grave comoção nacional que, para garantir ou restabelecer a ordem, precisasse de restrições a direitos. E mais: o estado de sítio precisa que o presidente da República peça autorização ao Congresso Nacional para decretar. Ele não pode simplesmente meter a caneta”, argumenta.

O professor de Direito Constitucional Ricardo Gueiros acredita que, se medidas restritivas propostas pela União e pelos entes subnacionais forem contraditórias, o tema provavelmente seria levado à Justiça.

“Mediante duas decisões, proferidas em 2020, o STF optou por afirmar que não haveria uma prevalência das normas do governo federal no campo da saúde pública. Na verdade, o que houve foi uma opção de se dizer que haveria uma cooperação e democratização gerencial entre os entes públicos – União, estados e municípios. Nesse sentido, o STF frisou que eventuais problemas – ou seja, as situações em que as normas da União, dos estados e dos municípios, sejam conflituosas – deveriam ser sanados pelo Poder Judiciário”, explica.

Ele argumenta ainda que, de forma geral, as normas municipais deveriam prevalecer, já que a prefeitura tem uma noção mais direta das particularidades de risco da sua região. Mas que também é preciso levar em consideração quais são as medidas mais restritivas.

“Em tese, o governo federal pode, sim, editar normas que proíbam os festejos de carnaval, sob o fundamento de medidas sanitárias. Entretanto, provavelmente, haverá normas estaduais ou municipais em sentido contrário. O que ocorreria? A situação, por certo, seria levada ao Judiciário”, prevê.

Planejamento para o carnaval

A assessoria do Governo de Pernambuco disse que ainda não está tratando desse assunto. Afirmou ainda que a Secretaria Estadual de Saúde está esperando os números da pandemia de dezembro para poder tomar uma decisão sobre a autorização ou não das festividades no estado. A gestão pernambucana também garantiu que qualquer decisão será baseada em critérios de saúde.

“Novas flexibilizações no nosso plano de convivência, bem como o relaxamento de qualquer medida restritiva de cuidado está atrelada diretamente ao avanço da vacinação. E é a sociedade que vai dizer se nós vamos ter carnaval ou não; na medida em que nós possamos atingir ou não o cumprimento das metas de vacinação”, afirmou o secretário estadual de Saúde, André Longo, em uma live no dia 21 de outubro.

A Prefeitura do Recife afirmou, em nota, que já deu início às tratativas administrativas para realização do carnaval em 2022. “No entanto, a execução dos contratos relativos às festividades do período está condicionada à decisão que será adotada pelas autoridades sanitárias”, diz o texto.

O Governo da Bahia respondeu com uma live do governador Rui Costa (PT) do último dia 9, em que ele diz ser cedo para tomar a decisão sobre autorizar ou não o carnaval no estado. “Primeiro, porque o número de contaminados está muito alto. Nós estamos oscilando em termos de 2,5 mil contaminados. E estamos com uma linha horizontal com mais de 200 pessoas na UTI há mais de 60 dias. Significa que a doença não está caindo. Se de um lado ela não está subindo, ela também não está caindo. Ela continua contaminando muita gente”, explica.

Segundo o gestor, se ele anunciar agora que a festa estará liberada e, ao longo do mês de dezembro, o número de casos subir, ele terá que cancelar o evento, o que pode gerar, inclusive, processos judiciais das pessoas que se sentirem economicamente lesadas por terem feito contratos ou comercializado produtos antecipadamente.

“A medida mais segura e responsável com a vida das pessoas é aguardar a repercussão do número de contaminados e de internados na UTI. Se ele começar a cair, as chances de ter carnaval aumentam. Se voltar a subir, é impossível ter carnaval”, disse.

Em Salvador, o município disse que a definição sobre a realização do carnaval deve ocorrer nas próximas semanas. “A Prefeitura de Salvador segue em diálogo com todos os atores envolvidos nos festejos do réveillon e carnaval, atenta ao cenário da covid-19 na cidade. A definição sobre a realização ou não destes eventos na capital baiana deverá ser divulgada ainda este mês de novembro”, diz a nota enviada ao Comprova.

A assessoria do Governo do Estado de São Paulo disse, por telefone, que ainda não há definições porque a realização ou não do carnaval dependerá do quadro sanitário. A prefeitura da capital paulista informou, por meio da Secretaria Municipal das Subprefeituras (SMSUB), que recebeu a inscrição para 867 desfiles de blocos no carnaval de 2022.

“As documentações para habilitação dos blocos serão analisadas e publicadas conforme as emissões das aprovações. Os cortejos dos blocos serão celebrados nas regiões das 32 subprefeituras”, afirmou.

Através da SPturis, o município também informou que o carnaval no Sambódromo já está sendo planejado. “A realização do evento, assim como os desfiles dos blocos, está condicionada ao quadro epidemiológico relativo à pandemia de covid-19 e entendimento das autoridades de saúde pública e sanitárias”, adianta a cidade.

Também por telefone, a assessoria de imprensa do Governo do Estado do Rio de Janeiro disse que as normas para realização ou não das festas no próximo ano cabem às prefeituras. Na capital, a assessoria da RioTur explicou que o planejamento está sendo feito como se tivessem 100% de segurança da realização do carnaval da cidade, mas que só vai acontecer se as condições sanitárias permitirem.

Definição de pandemia e quando ela acaba

Segundo esquema da Organização Mundial da Saúde (OMS), uma pandemia pode ser dividida em oito fases. Elas são pensadas para que governos e autoridades de saúde possam adotar diferentes medidas para proteger as pessoas.

Na fase 1, não há informações de que um vírus que circula entre animais tenha infectado humanos. Quando o vírus salta de uma espécie, seja doméstica, seja selvagem, para os seres humanos, o nível de alerta entra em fase 2, o que significa que há uma potencial ameaça. A fase 3 ocorre quando o vírus segue pulando entre espécies, causando casos esporádicos, mas a transmissão entre duas pessoas ainda é baixa, incapaz de causar um surto em uma comunidade.

Os riscos seguem aumentando na fase 4, quando se considera que a transmissão entre humanos já é frequente o suficiente para criar surtos locais da doença. Qualquer país que detecte uma doença neste estágio, deve comunicar a OMS e, portanto, a comunidade internacional.

Quando a infecção se espalha para mais de um país de um mesmo continente ou região, a situação avança para fase 5, descrita como “um forte sinal de que uma pandemia é iminente” e, assim, os demais governos devem começar a pôr em prática seus planos de mitigação da ameaça.

A fase 6 é chamada de fase pandêmica especificamente. Ela é caracterizada quando há surtos locais do vírus em ao menos um país de um continente ou região diferente daquela em que a doença foi inicialmente reportada. Esse estágio indica que a doença se tornou uma ameaça global.

A covid-19 foi classificada como uma pandemia pela OMS no dia 11 de março de 2020. Foi a primeira vez que uma infecção por coronavírus chegou à fase 6. Naquele momento, embora 90% dos casos ainda estivessem concentrados em quatro países da Ásia, o Sars-CoV-2 já havia sido detectado em 114 nações; algumas com transmissão local da doença.

“Pandemia não é uma palavra para ser usada de forma leviana ou descuidada. É uma palavra que, se mal utilizada, pode causar medo irracional ou uma admissão injustificada de que a batalha está perdida, levando a sofrimentos e mortes desnecessárias”, disse o diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom, em seu comunicado.

“Nós não podemos dizer isso de forma mais alta, ou mais clara: todos os países ainda podem mudar o curso desta pandemia. Se eles detectarem, testarem, tratarem, isolarem, rastrearem e mobilizarem seus povos em resposta, aqueles com alguns casos podem evitar que eles se tornem clusters, e que esses clusters se transformem numa transmissão comunitária”, afirmou, sobre o motivo de classificar a covid-19 como uma pandemia.

O estágio seguinte é chamado de “período de pós-pico”, quando o nível da doença na maioria dos países com vigilância sanitária adequada apresentam uma redução nos níveis de infecção. Esse estágio pode indicar que a pandemia parece estar regredindo.

No entanto, é possível que a doença ainda possa provocar novas ondas de infecção e, por isso, autoridades sanitárias devem se manter vigilantes em relação a possíveis surtos. Segundo a OMS, em pandemias anteriores, a sequência de ondas duraram meses. Uma onda também pode ser separada da outra por vários meses e, por isso, um relaxamento imediato nas medidas de prevenção nessa etapa pode ser prematuro.

A última etapa é o período pós-pandêmico. Nesse ponto, a atividade do vírus retornou aos seus níveis normais, vistos em outras infecções sazonais. Ao menos no caso do vírus da gripe, o mais comum a provocar pandemias na história humana, é de se esperar que o novo vírus provoque surtos sazonais, que devem continuar a ser monitorados pelas autoridades.

Antes da covid-19, a última pandemia foi a de H1N1, um dos tipos de vírus da gripe. A fase 6 foi declarada pela OMS em 11 de junho de 2009. Na época, a doença havia sido identificada em mais de 70 países. Em novembro, a OMS informou que a infecção havia se espalhado por quase todas as nações do mundo. Em 10 de agosto de 2010, a evolução para o período pós-pandêmico foi anunciada, embora ainda houvesse surtos locais, particularmente na Nova Zelândia.

Para declarar o fim da pandemia, a OMS considerou que nenhum novo surto estava sendo reportado. Durante a pandemia, o H1N1 foi o vírus da gripe dominante nas análises laboratoriais, mas, naquele momento, o monitoramento mostrava que havia um mix de diferentes cepas, compatível com a situação normal da doença. Além disso, havia uma boa cobertura de vacinação na maior parte dos países, especialmente quando considerados os grupos de risco, e os números de imunização seguiam crescendo.

O autor do post investigado

O autor se identifica como membro do grupo Bolsonaro 2022, no Facebook, que já apareceu em outras verificações do Comprova. Nos comentários de sua publicação, há vários internautas concordando com a suposta restrição imposta pelo presidente. Ele foi procurado para falar sobre a sua postagem, mas não deu retorno.

Esta não é a primeira vez que circulam postagens relacionadas ao carnaval e a possibilidade de suspensão da festa. Em janeiro de 2019, a Lupa constatou que era falso que Bolsonaro havia assinado decreto pelo fim do carnaval e da parada gay. Um ano depois, já com informações sobre a covid-19, também houve boato sobre a suspensão da folia relacionada à doença.

Por que investigamos?

Em sua quarta fase, o Comprova verifica conteúdos suspeitos que tenham viralizado nas redes sociais sobre a pandemia, as políticas públicas do governo federal e as eleições de 2022. A publicação no Facebook verificada aqui dialoga com os três tópicos ao mesmo tempo. A postagem teve mais de 22 mil interações, entre curtidas, comentários e compartilhamentos.

Recentemente, o Comprova mostrou que uma tabela sobre pagamentos do Bolsa Família estava sendo retirada de contexto para favorecer o presidente Jair Bolsonaro; que é falso que Bolsonaro está distribuindo aos estados máquinas que Dilma Rousseff doaria a países africanos; e que jogadores de times europeus não dedicaram gols ao presidente brasileiro.

Enganoso, para o Comprova, é o contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; ou o conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Saúde

Investigado por: 2021-11-12

Médico engana ao relacionar eficácia da vacina a novo remédio da Pfizer

  • Enganoso
Enganoso
É enganoso o tuíte de um médico questionando a eficácia da vacina da Pfizer/BioNTech contra a covid-19 pelo fato de o laboratório estar desenvolvendo um remédio contra a doença. A relação feita por ele entre o imunizante e o medicamento não se sustenta, já que o primeiro atua na prevenção e o outro no tratamento. Além disso, o desenvolvimento do fármaco nada tem a ver com a eficácia da vacina.
  • Conteúdo verificado: Post no Twitter levanta suspeitas sobre a vacina contra a covid-19 da Pfizer/BioNTech ao dizer que o mesmo fabricante agora investe “milhões de dólares no desenvolvimento de uma droga para tratar uma doença que sua vacina evitaria por completo”.

É enganosa uma postagem no Twitter, feita por um médico defensor do chamado “tratamento precoce”, que coloca dúvidas sobre a eficácia da vacina da Pfizer/BioNTech pelo fato de o laboratório norte-americano trabalhar no desenvolvimento de um comprimido contra a doença. Remédios e vacinas são estratégias complementares e servem para finalidades diferentes: um para tratar pacientes diagnosticados com o vírus; outro para treinar o sistema imunológico e prevenir a infecção e a evolução para quadros graves.

Diferentemente do que sugere o conteúdo, a vacina não evita “por completo” a doença. Nenhum imunizante é 100% eficaz contra a covid-19, e os estudos que embasaram a aprovação da Comirnaty mostram isso: a eficácia geral da vacina foi calculada em 95% em ensaios clínicos que envolveram mais de 43 mil voluntários. Esses dados foram publicados em uma renomada revista científica e referendados por autoridades de saúde de vários países, incluindo o Brasil.

Além disso, o fato de uma vacina ter sido aprovada não significa que ela está disponível para todos de forma imediata. Cerca de metade da população mundial não tomou sequer uma dose de qualquer vacina disponível e permanece desprotegida contra a covid-19. Um quarto da população brasileira se enquadra nessa situação. Dados mostram que em torno de 460 mil pessoas são infectadas e 7 mil morrem diariamente por complicações do coronavírus em todo o planeta.

Por fim, o desenvolvimento de medicamentos eficazes é necessário para um cenário adverso em que uma nova variante surja com capacidade de driblar a proteção conferida pelas vacinas. A resposta de quanto tempo dura essa imunidade também está sendo investigada pela ciência.

O autor do post, Ricardo Zimerman, foi procurado por e-mail, mas não respondeu até a publicação da checagem. O Comprova considerou o post enganoso porque usa dados imprecisos e confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Como verificamos?

O Comprova iniciou a verificação buscando informações junto à Pfizer sobre o medicamento que está em fase de teste pelo laboratório farmacêutico.

Em seguida, fez a análise da relação entre ele e a vacina contra a covid-19, desenvolvida pela mesma empresa, e que possui registro definitivo no Brasil – pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) – e em outros países.

A reportagem leu estudos sobre a eficácia do imunizante citado e pesquisou números relacionados à vacinação no país, incluindo os da vacina da Pfizer.

O Comprova buscou, ainda, a opinião de um especialista no assunto, o professor e imunologista Jorge Andrade Pinto, coordenador da Unidade de Pesquisa Clínica da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

Por fim, pesquisou quem é o médico autor da postagem e entrou em contato, mas não recebeu resposta até esta publicação.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 12 de novembro de 2021.

Verificação

Vacina confere nível altíssimo de proteção, mas não é infalível

Não é verdade que a vacina da Pfizer “evitaria a doença por completo”, como alega o post do médico checado pelo Comprova. Os testes que resultaram na aprovação da vacina (estudos clínicos de fase 3) demonstraram uma eficácia de 95% em prevenir casos de covid-19, segundo consta em estudo publicado na revista científica The New England Journal of Medicine, uma das mais prestigiadas do mundo. Apesar de alto, o índice não significa que todas as pessoas vacinadas estão livres do risco de adoecer pela covid-19.

Um total de 43.548 voluntários foram divididos em dois grupos: os que receberiam a vacina da Pfizer e os que receberiam placebo. O sorteio resultou em 21.720 vacinados com a Comirnaty e 21.728 no grupo controle. Foram constatados 162 casos de covid-19 no grupo placebo e apenas oito entre as pessoas imunizadas, sete dias após a segunda dose. Eficácia semelhante foi observada independentemente de idade, sexo, raça, etnia, comorbidades prévias e peso dos participantes.

O estudo ainda demonstrou que a vacina oferece alguma proteção, em menor grau, também com esquema vacinal incompleto. Foram registrados 39 casos em voluntários que haviam tomado apenas a primeira dose da vacina, contra 82 no grupo controle nesse mesmo período, o que resulta em eficácia geral de 52%. O estudo comprovou ainda que o imunizante é seguro, sendo que as reações adversas mais comuns são de caráter leve a moderado, como dores no braço e sintomas semelhantes aos de uma gripe.

Em 23 de fevereiro de 2021, a Anvisa concedeu o registro definitivo à vacina contra a covid-19 desenvolvida em parceria pelos laboratórios Pfizer e BioNTech. A equipe técnica da agência referendou os dados de segurança e eficácia e autorizou a aplicação da vacina em pessoas com 16 anos ou mais.

Em 11 de junho, a Anvisa aprovou o uso da vacina em jovens de 12 a 15 anos. A vacina demonstrou eficácia de 100% em estudo clínico com jovens dessa faixa etária. A taxa não significa que seja impossível que ocorram casos de covid-19 entre vacinados nesta faixa etária — quando o produto passa a ser aplicado em larga escala, na ordem de milhões de pessoas, um número estatisticamente pequeno, ignorado em determinada amostra, pode aparecer. Os ensaios de fase 3 foram realizados em 2.260 adolescentes, nos Estados Unidos. A aplicação nesta faixa etária começou em setembro no Brasil.

Em 26 de outubro, a Administração de Alimentos e Medicamentos (FDA), agência regulatória norte-americana, emitiu autorização para uso emergencial da vacina da Pfizer/BioNTech contra a covid-19 para crianças de 5 a 11 anos nos Estados Unidos. Estudo clínico com 4.647 crianças concluiu que a vacinação infantil apresenta uma eficácia de quase 91% na prevenção da covid-19 sintomática. O pedido está sob análise no Brasil.

Segundo dados do Ministério da Saúde, até 10 de novembro, foram aplicadas 75,68 milhões de doses desta vacina no Brasil, o equivalente a 27,8% do Programa Nacional de Imunização (PNI). A vacina da Pfizer é aplicada em duas doses, e o produto também está sendo utilizado como dose de reforço para grupos de risco desde agosto.

Além dessas evidências de que o produto funciona e é seguro para os grupos indicados, outros estudos foram realizados com o objetivo de avaliar quão eficiente a vacina é em prevenir contágio, hospitalizações e mortes pela doença no “mundo real”. A resposta da ciência é amplamente positiva.

Apesar disso, evidências relacionadas à queda no nível de anticorpos após alguns meses e o surgimento de novas variantes mais transmissíveis, como a Delta, trazem alguma preocupação entre os cientistas. As vacinas continuam funcionando e salvando vidas nesse contexto, mas doses de reforço passaram a ser recomendadas por autoridades de saúde, assim como a adoção de medidas não farmacológicas, como o uso de máscaras, em locais com alta circulação do vírus.

Remédios são necessários mesmo com vacinas

O objetivo de se desenvolver um medicamento contra a covid é o tratamento de pessoas infectadas pelo vírus, a fim de reduzir a gravidade da doença, hospitalizações e mortes, bem como a probabilidade de infecção após a exposição. De acordo com o professor e imunologista Jorge Andrade Pinto, coordenador da Unidade de Pesquisa Clínica da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), os remédios que estão sendo estudados são antivirais que visam diminuir a replicação do vírus Sars-Cov-2 na pessoa infectada, diminuindo a chance de progressão para a doença grave e internação.

As vacinas operam de uma forma diferente: o objetivo é treinar o sistema imunológico para que a pessoa tenha uma resposta rápida e robusta contra o vírus no caso de uma contaminação futura. Como é de conhecimento público, as vacinas não eliminam completamente a possibilidade de uma infecção pelo novo coronavírus e medicamentos ainda são necessários para o tratamento de casos que podem evoluir para forma grave.

Em uma entrevista para a revista Veja Saúde, em março deste ano, o médico português Guilherme Pessoa-Amorim, pesquisador da Universidade de Oxford e da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto, explicou por que os medicamentos continuam sendo necessários para combater a pandemia.

“As vacinas terão um efeito tremendo na redução da transmissão, hospitalizações e mortalidade da covid-19, mas não são 100% eficazes, e demorará algum tempo até atingirmos a imunidade de grupo em cada um dos países, e ainda mais a nível global”.

O pesquisador também ressalta que podem surgir novas variantes no futuro que escapem da proteção vacinal — o que não ocorreu até o momento — e destacou que ainda não se tem a resposta sobre quanto tempo dura a proteção conferida pelas vacinas.

“É possível que a covid-19 se torne uma doença endêmica na população, como a gripe comum, com picos sazonais e necessidade de atualização periódica de vacinas”, explicou à revista. “Sendo assim, continuará a haver um grande número de pessoas sendo infectadas e manifestando doença grave, com necessidade de hospitalização e, consequentemente, de tratamentos eficazes e cuidados adequados.”

O post aqui checado desconsidera vários aspectos. A principal falha da tese é que o fato de uma vacina ter sido aprovada com um elevado patamar de eficácia não significa que imediatamente todas as pessoas passaram a ter acesso a ela. No Brasil, por exemplo, 57,08% da população tinha completado o esquema vacinal e 73,28% havia recebido ao menos uma dose de alguma das quatro vacinas aprovadas até terça-feira, 9 de novembro. O produto da Pfizer/BioNTech representa cerca de 28% das doses aplicadas.

Aproximadamente um quarto da população brasileira permanece totalmente desprotegida, enquanto cerca de 16% ainda aguardam a segunda dose da vacina, mesmo com quase 10 meses de campanha — lembrando que alguns grupos, como crianças de até 11 anos, ainda não podem ser imunizadas no país, enquanto uma parcela minoritária simplesmente se recusa a tomar a vacina mesmo com as evidências disponíveis atualmente.

Em todo o mundo, cerca de 40% da população estava com o esquema vacinal completo na mesma data e 51,2% receberam ao menos a primeira dose, segundo a plataforma Our World In Data, mantida por pesquisadores da Universidade de Oxford. O levantamento informa que 123 países e territórios tinham menos da metade da população com as doses necessárias, enquanto 44 deles sequer chegaram a 10%. Do outro lado, apenas 10 nações superaram a marca de 80% (veja mais no gráfico abaixo).

 

Esses números ajudam a explicar porque, mesmo com a disponibilização das primeiras vacinas a partir de dezembro de 2020, o número de casos e mortes por covid-19 continua elevado e a pandemia ainda não pode ser controlada em muitos lugares.

Segundo o mapa de monitoramento da covid-19 da Universidade Johns Hopkins, a quantidade semanal de casos confirmados no mundo está próxima a 3 milhões, enquanto o número de mortes fica em torno de 48 mil por semana. A plataforma Our World In Data informava no dia 10 de novembro uma média móvel de 474.729 casos e 7.167 mortes por dia no mundo.

No Brasil, a média móvel de casos estava em 11.039 por dia, e a de mortes, 243 por dia, em 9 de novembro de 2021, de acordo com levantamento do consórcio de veículos de imprensa, que leva em conta os boletins fornecidos pelas Secretarias Estaduais de Saúde. Essa média é calculada a partir dos dados dos últimos sete dias, como forma de evitar distorções em determinados momentos da semana.

Outro fator que impacta esses valores é o surgimento de variantes mais transmissíveis do coronavírus, como a Delta, que apresenta uma maior chance de sucesso em driblar as defesas do corpo, inclusive entre os vacinados. Ainda assim, as vacinas continuam prevenindo casos, hospitalizações e mortes pela doença. O estado de São Paulo, por exemplo, registrou no início de novembro uma queda de 93% nas mortes por covid-19 ante abril, pico da segunda onda da pandemia. Atualmente, o maior risco está entre aqueles que não se vacinaram ou ainda não completaram a imunização.

Diante da quantidade de pessoas afetadas pela pandemia hoje, a estratégia de buscar medicamentos que funcionem contra a doença segue relevante, do ponto de vista humanitário — e existe demanda para as empresas farmacêuticas interessadas em descobrir esse tipo de tratamento.

O post também ignora que as vacinas e as terapias medicamentosas constituem estratégias complementares. Um dos motivos é justamente que nenhum imunizante é capaz de prevenir 100% uma infecção. Para esses casos — a taxa de breakthrough, infecções em quem já foi imunizado com duas doses — somados com os indivíduos que não tiveram acesso aos imunizantes anteriormente, a disponibilização de um tratamento que comprovadamente funcione é essencial para salvar vidas e reduzir os danos causados ao organismo pela covid-19.

Pfizer diz que medicamento reduziu o risco de hospitalização ou morte em 89%

No dia 5 de novembro de 2021, a Pfizer anunciou que o seu candidato a tratamento por via oral contra a covid-19, o medicamento batizado de Paxlovid, reduziu o risco de hospitalização ou morte em 89% na análise provisória em estudo de fase 2 e 3. A porcentagem foi calculada em comparação com o placebo em adultos de alto risco não hospitalizados com a doença. Os resultados foram noticiados pela imprensa.

De acordo com a farmacêutica, na população geral do estudo, até o dia 28 nenhuma morte foi relatada em pacientes que receberam o medicamento, em comparação com 10 mortes em pacientes que receberam placebo. A Pfizer planeja enviar os dados como parte de sua apresentação contínua à FDA o mais rápido possível.

O Paxlovid é uma terapia antiviral projetada para ser prescrita ao primeiro sinal de infecção ou ao primeiro conhecimento de uma exposição, no intuito de evitar o agravamento da doença e a consequente hospitalização e morte.

“A prevenção é o nosso objetivo primário. Nós recebemos a imunidade através da vacina, mas para a população que mesmo vacinada foi contaminada pela doença ou para o não vacinado, disponibilizamos os medicamentos antivirais, com a intenção de modificar o curso da doença” reforça o coordenador da Pesquisa Clínica na UFMG, Jorge Pinto.

Estudo randomizado duplo-cego foi realizado

De acordo com o anúncio da Pfizer, um estudo randomizado duplo-cego – quando nem o examinado e nem o examinador sabem o que está sendo utilizado como variável em um dado momento – foi realizado em pacientes adultos não hospitalizados com covid-19 e que apresentavam alto risco de progredir para doença grave. Os pacientes foram tratados dentro de três dias do início dos sintomas.

Os resultados apontaram que 0,8% dos pacientes que receberam o medicamento foram hospitalizados até o dia 28 após a randomização (3/389 hospitalizados, sem mortes), em comparação com 7,0% dos pacientes que receberam placebo e foram hospitalizados ou morreram (27/385 hospitalizados, com sete mortes subsequentes).

Ainda conforme a Pfizer, reduções semelhantes na hospitalização ou morte relacionadas à covid-19 foram observadas em pacientes tratados dentro de cinco dias do início dos sintomas: 10% que receberam o medicamento foram hospitalizados até o dia 28 após a randomização (6/607 hospitalizados, sem mortes), em comparação com 6,7% dos pacientes que receberam placebo (41/612 hospitalizados, com 10 mortes subsequentes)

Na população geral do estudo, até o dia 28 nenhuma morte foi relatada em pacientes que receberam o remédio da Pfizer, em comparação com 10 (1,6%) mortes em pacientes que receberam placebo.

A análise primária do conjunto de dados provisório avaliou 1219 adultos que foram inscritos até 29 de setembro de 2021. No momento da decisão de interromper o recrutamento de pacientes, a inscrição era de 70% dos 3 mil pacientes planejados de locais de ensaios clínicos nas Américas do Sul e Norte, Europa, África e Ásia, com 45% dos pacientes localizados nos Estados Unidos.

Os indivíduos inscritos tinham um diagnóstico confirmado por laboratório de infecção por Sars-CoV-2 dentro de um período de cinco dias com sintomas leves a moderados e eram obrigados a ter pelo menos uma característica ou condição médica subjacente associada a um risco aumentado de desenvolver doença grave. Cada paciente foi randomizado (1:1) para receber Paxlovid ou placebo por via oral a cada 12 horas por cinco dias.

A Pfizer diz ter comparado também eventos adversos emergentes do tratamento ​​entre o medicamento (19%) e o placebo (21%), a maioria de intensidade leve.

Testes no Brasil

Procurada pelo Comprova, a Pfizer informou que em outubro de 2021 iniciou no Brasil a condução de uma série de estudos clínicos de Fase 2/3 com o uso da molécula PF-07321332.

No país, são mais de 20 centros de pesquisa que participam da pesquisa e que estão convocando voluntários nos estados do Amazonas, Bahia, Ceará, Distrito Federal, Pernambuco, Rio Grande do Norte, Mato Grosso, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Rio de Janeiro e São Paulo.

São selecionados maiores de 18 anos e, dependendo em qual das três vertentes dos estudos sejam elegíveis, podem ou não já estar vacinados contra covid-19. “A PF-07321332 já demonstrou potente atividade in vitro contra o Sars-CoV-2 nas fases pré-clínicas, assim como adequadas segurança e tolerabilidade em estudos de Fase I em humanos”, afirma a farmacêutica.

A Pfizer Brasil explica, ainda, que nesses estudos, o fármaco também será coadministrado com uma baixa dose de ritonavir, assim como ocorreu nos Estados Unidos.

“Considerando os resultados positivos obtidos nos estudos pré-clínicos, a Pfizer deu continuidade ao programa de desenvolvimento clínico dessa molécula e realiza três estudos pivotais, randomizados, duplo-cego e controlados por placebo”.

O primeiro estudo se dá em pacientes não vacinados ou vacinados com suspeita e/ou diagnóstico de covid-19 e com baixo risco de desenvolver doença grave. O segundo em pacientes não vacinados com suspeita e/ou diagnóstico de Covid-19 e com alto risco de desenvolver doença grave. E o terceiro em pessoas não vacinadas cujos contatos domiciliares estão com covid-19.

A diretora médica da Pfizer Brasil, Márjori Dulcine, por meio da assessoria de comunicação, afirma que a empresa entende que as medidas de combate à pandemia de covid vão além da vacinação, por isso a realização de ensaios iniciais de rastreamento de compostos antivirais em busca de potenciais moléculas.

Por fim, a empresa destaca que tais estudos foram previamente aprovados pela Anvisa e Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP), assim como pelos Comitês de Ética dos centros de pesquisa selecionados.

O autor

O autor do tuíte é o médico infectologista Ricardo Ariel Zimerman, que em junho deste ano foi ouvido na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Pandemia, onde se manifestou a favor do chamado “tratamento precoce”, que utiliza medicamentos sem comprovação científica contra covid-19.

Zimerman também foi citado em uma reportagem do Matinal Jornalismo, publicada em agosto de 2021, como um dos responsáveis por testes com a substância proxalutamida em pacientes contaminados pelo novo coronavírus, que teriam ocorrido em um hospital da Polícia Militar do Rio Grande do Sul (RS) sem autorização da Anvisa, o que é investigado pelo Ministério Público Federal. Ele foi denunciado, ainda, por ter ameaçado jornalistas envolvidos na reportagem.

O médico já foi alvo de verificações em outras ocasiões e por diferentes motivos. O próprio Comprova já identificou ser enganosa uma mensagem publicada por ele no Twitter comparando pedido de um vidente para que as pessoas sigam usando máscara como meio de proteção contra a covid-19 com os resultados de um estudo da Dinamarca que não teria mostrado benefício para o uso de proteção facial.

Outros veículos, como Estadão Verifica e GHZ, também verificaram conteúdos do infectologista, que recomendou tratamento precoce sem eficácia comprovada e usou dados distorcidos para falar de isolamento social nas cidades.

Ele foi procurado pela reportagem, mas não respondeu até esta publicação.

Por que investigamos?

Em sua quarta fase, o Comprova verifica conteúdos suspeitos sobre pandemia, políticas públicas do governo federal e eleições. O tuíte verificado teve 700 retuítes e mais de 3 mil curtidas até o dia 12 de novembro de 2021.

Publicações enganosas como esta colocam a saúde da população em risco ao sugerir que a vacinação contra a covid-19 é dispensável. Tanto a eficácia quanto a segurança dos imunizantes já foram comprovadas em estudos de órgãos e agências nacionais, como a Anvisa, e internacionais.

O Comprova já publicou outras checagens que desmentem boatos ligados à vacinação e pandemia, como o que informa ser falso que antiviral em teste da Pfizer teria ivermectina na fórmula e ser enganoso post que afirmava que a vacina contra a covid-19 poderia gerar HIV, câncer e HPV.

Enganoso, para o Comprova, é todo o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos.

Saúde

Investigado por: 2021-11-11

Vacina contra a covid-19 é segura e não gera HIV, câncer ou HPV

  • Falso
Falso
São falsas as afirmações contra a vacina da covid-19 ditas pelo médico Nelson Modesto, em um áudio que circula no Telegram. O profissional da saúde afirma que os imunizantes conseguem gerar HIV, câncer e HPV nos vacinados, o que é mentira. Verificações anteriores realizadas pelo Comprova mostram serem inventadas as ligações entre a vacina e uma série de doenças, como as citadas na publicação.
  • Conteúdo verificado: Um homem se apresenta em um áudio como o médico Nelson Modesto. Ele afirma que realizou um estudo provando que as vacinas com “insumo chinês” têm a capacidade de desenvolver doença autoimune e câncer nos imunizados. Ele também diz, sem provas, que os políticos estão tentando calar os médicos.

É falso o conteúdo que circula no Telegram, em formato de áudio, no qual há afirmações sobre as vacinas contra a covid-19 conseguirem gerar nos imunizados doenças autoimunes e câncer. O conteúdo é atribuído ao médico Nelson Modesto, especialista em clínica médica, que atua com imunoterapia ativada e imuno-oncologia.

O áudio foi compartilhado no grupo Médicos Pela Vida e gerou pânico entre os membros, além de reforçar a falsa ideia de que as vacinas não são seguras e eficazes. É possível chegar a esta conclusão a partir de comentários deixados na publicação, como o de um homem afirmando que o “China vírus veio de lá, tudo por dinheiro“.

Além de comentários xenofóbicos, outros negacionistas também aparecem, como o de uma mulher que afirma não existir o coronavírus. Ela utiliza como justificativa que “nenhum cientista encontrou o vírus isolado”, o que é mentira.

A reportagem entrou em contato com o profissional para checar se o áudio seria, de fato, da autoria dele. O médico confirmou e deu mais detalhes da pesquisa elaborada que foi citada no áudio.

Segundo o médico, todas as vacinas aplicadas no Brasil foram elaboradas com o insumo chinês que causa câncer e doenças autoimunes, além de estar contaminando os vacinados com uma variante do coronavírus mais forte. Modesto fez as afirmações sem apresentar qualquer tipo de prova que pudesse ratificar sua tese.

Ainda sem provas, o médico diz que o insumo chinês contém Nagalase — enzima chamada de proteína de ligação à vitamina D —, óxido de grafeno e nanopartículas de grafeno, substâncias que, segundo ele afirma também erroneamente, causam as doenças já citadas. Esses componentes não integram a lista de substâncias presentes nos imunizantes desenvolvidos pela Pfizer, Coronavac e AstraZeneca.

“Eu fiz o estudo que prova que as pessoas vacinadas contra a covid-19 estão na realidade se contaminando com uma nova variação do vírus, bem como também podem desenvolver câncer e doenças autoimunes, meu estudo foi elaborado em torno do BDORT, o insumo chinês contém substâncias que causam todos esses problemas que eu descobri”, afirmou Modesto. Questionado sobre como o suposto estudo foi desenvolvido e a veracidade deste, o médico informou que a pesquisa ainda não está completa.

“Ainda não tenho este estudo escrito para publicação, estou fazendo o levantamento de participantes, já avaliei e tratei cerca de 75 pessoas que estavam contaminadas com a vacina. Para ter um bom resultado quero chegar em 100 participantes no meu estudo. A pesquisa está em Powerpoint. Não vou publicar meu trabalho no Brasil, irei publicar a pesquisa no Canadá”, disse Modesto.

Especialistas entrevistados pelo Comprova relatam que as afirmações do médico são equivocadas e infundadas, visto que as pesquisas publicadas apontam resultados diferentes.

Diante das informações apuradas, a verificação do Comprova definiu o conteúdo como falso, por ter sido inventado.

Como verificamos?

O Comprova buscou informações sobre a relação de vacinas e o desenvolvimento de doenças em matérias jornalísticas e no site oficial da OMS (Organização Mundial da Saúde) e do Ministério da Saúde brasileiro.

Entrevistamos, por WhatsApp, o médico infectologista e professor da Universidade Católica de Brasília César Carranza Tamayo.

Também conversamos por WhatsApp com Gilmar Alves Zonzin, ex-presidente da Sociedade de Pneumologia e Tisiologia do Estado do Rio, além de Ethel Maciel, professora da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), que tem pós-doutorado em epidemiologia pela Universidade Johns Hopkins, nos Estados Unidos.

A reportagem entrou em contato com Nelson Modesto, citado como autor do áudio aqui verificado, que confirmou a autenticidade da gravação. Também entramos em contato com a instituição de ensino superior em que ele leciona, no interior de São Paulo, e aguardamos retorno.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 11 de novembro de 2021.

Verificação

Vacinas contra covid-19 não causam doenças autoimunes ou câncer

Especialistas ouvidos pela reportagem do Comprova afirmam que as vacinas desenvolvidas para combater o coronavírus não são responsáveis pelo desenvolvimento de doenças autoimunes ou câncer, conforme afirma falsamente o áudio aqui verificado. O mesmo é dito por autoridades sanitárias do Brasil — como a Anvisa — e do mundo — como o FDA, CDC e OMS.

Gilmar Alves Zonzin, ex-presidente da Sociedade de Pneumologia e Tisiologia do Estado do Rio, classificou como ‘bizarras’ e ‘absurdas’ as afirmações de Nelson Modesto ligando o citomegalovírus, HIV e HPV aos imunizantes contra a covid-19.

“Já lhe adianto que essas são informações bizarras, absurdas, sem nenhum fundamento. Outrossim, vacinas, como também medicamentos, e diversos insumos, não são ausentes em efeitos indesejáveis, que devem ser identificados, relatados, monitorados, estudados, etc., mas não essas bizarrices”, concluiu.

O médico infectologista César Carranza Tamayo disse que as vacinas são seguras e que a maior parte dos efeitos adversos é leve, como febre e dor no local da aplicação. Segundo o especialista, as vacinas não são causadoras de doenças autoimunes ou câncer.

“O que acontece, e isso é um efeito largamente conhecido, é que pessoas com esse tipo de doenças, mas que ainda não desenvolveram sintomas, podem começar a apresentá-los após uma infecção viral ou algumas vacinas com vetor viral”, explica o infectologista.

Na sequência, Tamayo complementou informando que uma pessoa que tem alguma doença autoimune ainda não manifestada de forma plena pode ter uma virose, como a mononucleose — doença do beijo —, e posteriormente iniciar os sintomas da doença. “Isso não quer dizer que o vírus causou a doença, mas que serviu como gatilho para essa pessoa começar a apresentar sintomas da doença autoimune”, descreve.

“As vacinas em geral são amplamente testadas em laboratório antes de serem liberadas para sua distribuição e comercialização. As medidas de fabricação são extremamente estritas para garantir a esterilidade da vacina. Ou seja, uma vacina não pode ter absolutamente nenhum contaminante que possa causar doenças (como bactérias, vírus, etc). Até porque, se isso acontecesse, existiria a chance de uma vacina perder sua eficácia”.

A mesma afirmação sobre a segurança dos imunizantes contra a covid-19 foi feita por Ethel Maciel.

“Sobre a segurança das vacinas contra covid-19: São seguras e eficazes. Os eventos graves pós vacinais são raros. O evento raro mais comum é a trombose, mas a doença (covid-19) causa muito mais essa doença (trombose) que a vacina”.

A cientista recomendou a leitura do artigo disponível na página da Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz) a respeito do risco de trombose.

Em complemento, a epidemiologista disse que outro evento raro, pós-vacina, é a miocardite, mas que os casos também são mais registrados nas pessoas que desenvolveram a covid-19 do que em vacinados. Maciel contestou o áudio de Nelson Modesto, alegando que o imunizante não provoca ‘qualquer outra doença’.

“A vacina contra covid-19 não provoca HIV, HPV ou qualquer outra doença. A vacina auxilia o sistema imunológico a construir a resposta imune contra a covid, essa é a ação, não causa doença”, afirmou.

Outro estudo sugerido pela especialista foi divulgado pelo CDC (Centro de Controle e Prevenção de Doenças) dos Estados Unidos. O artigo relaciona a covid-19 e a miocardite, utilizando como base dados coletados em hospitais norte-americanos entre março de 2020 e janeiro de 2021.

Quem é o médico

Nelson Modesto, citado como autor do áudio aqui verificado, afirma ser médico desde 1967, graduado pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), com especialização em Clínica Médica pela Sociedade Brasileira de Clínica Médica e doutorado em Medicina pela Unicamp (Universidade Estadual de Campinas).

As informações foram obtidas pelo Comprova por meio de uma busca na Plataforma Lattes, do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), que agrega currículos virtuais com foco na trajetória acadêmica. Todas as informações foram preenchidas pelo próprio médico nessas plataformas.

As mesmas informações presentes no Lattes constam no perfil do Facebook do médico. Modesto não tem pesquisas publicadas em revistas de relevância dentro da sua área de atuação.

Modesto declara nas plataformas digitais que ainda atua como professor titular da Pontifícia Universidade Católica de Campinas e como Médico do Hospital da Real Sociedade Beneficência de Campinas. O especialista foca suas atividades no nicho de leptômonas — tipo de parasitas. No entanto, segundo o site da instituição, ele não consta como docente.

Confrontado com as informações pela reportagem do Comprova, Modesto alegou que há anos não atua mais como professor na PUC Campinas, mas não esclareceu por quais motivos ainda mantém o título nas redes sociais e no currículo acadêmico como se fossem referentes ao atual status dele.

Uma outra checagem foi feita pelo Boatos.org desmentindo as afirmações contidas no áudio. O Comprova também desmentiu outras afirmações contidas na declaração de Modesto, como a verificação que conferiu que as vacinas de RNA mensageiro não geram doenças autoimunes e não são responsáveis pelo desenvolvimento de câncer.

Congresso citado pelo médico

Por meio de uma busca na internet, a reportagem localizou o congresso citado no áudio que circula nas plataformas de mensagens. Trata-se da 1ª Jornada Brasileira Sobre o BDORT e Cuidados Integrativos, que aconteceu virtualmente em julho deste ano.

Em conversa com a reportagem, o médico confirmou ter sido palestrante no evento e ainda disse ter apresentado sua pesquisa, no entanto, Nelson Modesto não consta na lista de palestrantes que integra o site oficial do evento. As apresentações da jornada foram transmitidas via YouTube, onde ainda constam os vídeos e Modesto não aparece nas gravações.

A sigla BDORT significa Bi Digital O-Ring Test (Teste do Anel Bi-Digital, em português). A técnica consiste em uma “investigação clínica não invasiva, desenvolvida pelo médico engenheiro nipo-americano Yoshiaki Omura”, segundo informações divulgadas pela organização que representa a categoria no país, situada em São Paulo.

A técnica, considerada como uma ponte entre métodos orientais e ocidentais, usa como teste a musculatura dos dedos, em forma de anel. O teste, segundo o site da AMBBDORT (Associação Médica Brasileira do Bi-Digital O-Ring Test), é baseado na pesquisa da força muscular em um grupamento muscular padrão.

No site, a associação explica que o método tem sido utilizado para o “diagnóstico e tratamento experimental”.

“Este método não deve substituir, em hipótese alguma, os métodos convencionais de diagnóstico e tratamento vigentes com base em protocolos de pesquisa”, diz a AMBBDORT.

Diante da falta de evidências que pudessem comprovar a presença de Nelson Modesto no evento, o Comprova encaminhou um e-mail solicitando a confirmação da AMBBDORT sobre a lista de palestrantes e participantes.

O objetivo é checar se Modesto integrou alguma mesa de debate ou se submeteu, de fato, o artigo citado no áudio. Até o momento da publicação desta matéria, a reportagem não teve retorno da associação.

Por que investigamos?

Em sua quarta fase, o Comprova verifica conteúdos suspeitos que tenham viralizado sobre a pandemia, as políticas públicas do governo federal e as eleições. A publicação no canal Médicos pela Vida do Telegram teve mais de 21 mil visualizações.

Informações sobre a pandemia, especialmente as vacinas, são importantes de serem verificadas porque podem afetar a confiança da população nos imunizantes — que possuem comprovação científica e são defendidos por autoridades de saúde para combater a doença.

Recentemente, o Comprova mostrou ser falso que pessoas imunizadas com a vacina da Pfizer se tornem rastreáveis e que CDC não disse que imunidade natural é superior à das vacinas, como sugere empresário indiciado pela CPI.

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que sofreu edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.