O Projeto Comprova é uma iniciativa colaborativa e sem fins lucrativos liderada pela Abraji e que reúne jornalistas de 41 veículos de comunicação brasileiros para descobrir, investigar e desmascarar conteúdos suspeitos sobre políticas públicas, eleições, saúde e mudanças climáticas que foram compartilhadas nas redes sociais ou por aplicativos de mensagens.
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Política

Investigado por: 2023-11-22

Mudanças da Anatel no setor de telefonia não isolarão Brasil; lojas das operadoras serão reduzidas

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Enganoso
É enganosa a publicação que alega que lojas de operadoras de telefonia vão fechar e o Brasil poderá ser isolado do resto do mundo. O pano de fundo do conteúdo investigado foi a aprovação, no fim de outubro deste ano, pelo Conselho Diretor da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), de novas regras dentro do Regulamento Geral de Direitos do Consumidor de Serviços de Telecomunicações (RGC). Entre outros termos, as operadoras ficam desobrigadas a terem no mínimo uma loja em cada região com 100 mil habitantes ou mais. A mudança, no entanto, abrange apenas a quantidade de estabelecimentos das operadoras e não menciona alterações no sistema de telefonia ou transmissão.

Conteúdo investigado: Vídeo em que um homem afirma que uma “decisão da Anatel pode acabar com as lojas da Vivo, Tim e Claro no Brasil”. Em sua fala, ele utiliza um texto do site Terra Brasil Notícias concluindo que a mudança deixaria os brasileiros isolados do mundo e que ninguém estaria fazendo algo para evitar isso. O homem também faz menção, em tom conspiratório, ao decreto de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) assinado no início do mês pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Onde foi publicado: TikTok.

Conclusão do Comprova: É enganosa a postagem em que um homem afirma que o Brasil seria “isolado” do restante do mundo em função de uma decisão da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), que, segundo o conteúdo lido por ele, reduziria drasticamente o número de lojas físicas das operadores de telefonia em todo o país. A mudança mencionada no vídeo, na realidade, é uma alteração do Regulamento Geral de Direitos do Consumidor de Serviços de Telecomunicações (RCG), que permite o fechamento de lojas de telefonia.

O texto utilizado como fonte na peça de desinformação fala sobre “uma drástica redução no número de lojas físicas das operadoras de telefonia, como Tim, Vivo e Claro”. O título da publicação, no entanto, diz que a decisão “pode acabar com lojas”.

A nova regra muda o regulamento aprovado em 2013. Anteriormente, as operadoras de telefonia deveriam manter ao menos uma loja de atendimento presencial para cada região com 100 mil habitantes ou mais, com uma unidade adicional a cada 400 mil habitantes. Essa regra deixará de valer. Fica previsto que o atendimento presencial passará a ser facultativo, mediante regras de acessibilidade. Para o fechamento de unidades, será necessária a autorização do Grupo de Implantação das mudanças. As alterações só entram em vigor em setembro de 2024.

Conforme apuração do jornal O Globo, a partir da mudança, a Anatel projeta que as lojas físicas possam reduzir de 2,8 mil para 789 unidades no país. Isso representaria, de fato, uma diminuição significativa, mas, a partir dela, não é possível afirmar que haverá isolamento do país. A alteração não menciona qualquer modificação no sistema de transmissão das operadoras.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Alcance da publicação: Até o dia 9 de novembro, a publicação do TikTok tinha 9,5 mil visualizações. Posteriormente, não foi mais possível mensurar o alcance, pois a postagem e o perfil responsável foram excluídos.

Como verificamos: Primeiramente, o Comprova buscou no Google pelos termos “fechamento lojas de telefonia celular” e “decisão da Anatel vai fechar lojas Vivo, Tim e Claro”. Como resultados, encontramos notícias (G1, O Globo, Estadão) divulgando uma mudança no Regulamento Geral de Direitos do Consumidor de Serviços de Telecomunicações, aprovada no dia 27 de outubro deste ano, pelo Conselho Diretor da Anatel.

Depois, tentamos contato com o autor da postagem. Entretanto, pouco tempo após o início da investigação, o post e página responsável foram desativados. Também contatamos a Anatel e as operadoras mencionadas no material investigado.

Mudança no regulamento e controvérsias

No dia 26 de outubro deste ano, o Conselho Diretor da Anatel aprovou mudanças no RGC. As alterações foram publicadas em 10 de novembro no Diário Oficial da União (DOU). No texto, foi estabelecida uma nova regra com relação ao número de lojas físicas que as operadoras são obrigadas a manter.

No Art. 20 consta que a “existência de estabelecimentos da Prestadora ou de terceiros que explorem exclusivamente a marca da Prestadora é facultativa, mas, uma vez existentes, devem oferecer Atendimento Presencial“. O documento não delimita uma regra específica em relação ao quantitativo de unidades por região.

Por meio de nota, a Anatel explicou que as lojas presenciais deviam ser usadas para a realização de atendimentos aos consumidores, mas alguns estabelecimentos exploravam a marca das operadoras para a venda de aparelhos. Neste caso, elas não eram obrigadas a prestar atendimento ao consumidor, o que segundo a agência, foi alterado com a revisão do regulamento.

“A partir de setembro de 2024, quando entram em vigor as novas regras, não haverá mais a obrigação específica quanto à quantidade de lojas citada acima. Mas o atendimento presencial deverá ser realizado em todas as lojas próprias ou de terceiros que utilizem exclusivamente a marca da prestadora para vender produtos ou serviços. Em outras palavras, todas as lojas das prestadoras agora serão lojas aptas a prestar atendimento presencial”, destacou a agência.

No texto, a Anatel destaca ainda que “não existem fundamentos para a tese levantada no vídeo de que as lojas vão acabar”. A agência ressaltou ainda a fundamentação do membro do Conselho Diretor que propôs a submissão da regra à consulta pública ainda em 2020.

“Ao prever a obrigatoriedade de atendimento presencial nos estabelecimentos comerciais que explorem a marca da Prestadora, atrela-se o atendimento à sua estratégia comercial. Como a prestadora provavelmente optará por vender, ela continuará prestando o atendimento presencial, atendendo os consumidores em toda e qualquer demanda”, afirmou.

A Anatel explicou que a maior parte do atendimento dos consumidores é realizada por meio de canais digitais (aplicativos e website) ou telefônicos.

Mesmo aprovada, a medida não teve apoio unânime. Um dos conselheiros, Vicente Aquino, presidente do Comitê de Defesa dos Usuários de Serviços de Telecomunicações (CDUST), destacou a relevância de se manter a obrigação à existência de estabelecimentos para atendimento presencial aos assinantes.

Aquino argumentou que, com dados extraídos das mais recentes Pesquisas de Satisfação da Qualidade Percebida divulgadas pela agência, parcela significativa da população recorre a essa forma de atendimento, especialmente os mais idosos e com menor renda. No entanto, o colegiado aprovou por maioria a proposta do ex-conselheiro Emmanoel Campelo, que tornou a existência de lojas facultativas.

Garantia da Lei e da Ordem em SP e RJ

No vídeo investigado, o homem menciona ainda um decreto de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) assinado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O autor da publicação sugere, em tom conspiratório, enganosa relação entre o decreto e um processo de isolamento do país. No início de novembro, o chefe do Executivo autorizou a GLO em áreas nos estados de São Paulo e Rio de Janeiro.

Desde então, o governo federal, por meio das Forças Armadas, Polícia Federal e Polícia Rodoviária Federal, está autorizado a atuar no Porto do Rio de Janeiro, Porto de Itaguaí (RJ) e Porto de Santos (SP), bem como no Aeroporto do Galeão, no Rio, e no Aeroporto de Guarulhos, em São Paulo. A GLO tem validade apenas em territórios federais até maio do ano que vem, com a possibilidade de ampliação.

As ações foram mobilizadas para tentar combater o crime organizado. O objetivo, segundo a gestão, é minimizar a entrada de recursos financeiros ao crime organizado, dificultando a logística e freando o abastecimento de drogas e armas. Na época em que foi assinado o decreto, o Rio de Janeiro vivia escalada de violência. Ao menos 35 ônibus e uma composição de um trem urbano já tinham sido incendiados por grupos criminosos em retaliação à morte de um miliciano na capital fluminense.

O governador de São Paulo, Tarcisio Freitas (Republicanos), e Cláudio Castro (PL), do Rio de Janeiro, foram favoráveis ao decreto.

O que diz o responsável pela publicação: Não foi possível contatar o autor do post, pois a conta responsável pela veiculação foi desativada logo após o início da investigação. Antes disso, o envio de mensagens diretas era bloqueado no perfil. Existem outros perfis na mesma rede social com a mesma foto e nome do autor do post, mas todos estão com a função de mensagens bloqueada. Esta não é a primeira verificação do Comprova relacionada a tal autor.

O que podemos aprender com esta verificação: É comum que desinformadores utilizem informações reais fora de contexto para tentar imprimir a sensação de verdade em teorias conspiratórias. Neste caso, é aproveitado também que as mudanças foram aprovadas recentemente e a implementação ainda não aconteceu de forma concreta para gerar medo na população diante da incerteza. Termos alarmistas, como “isolamento do Brasil”, também são utilizados para ampliar a sensação de pânico.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: O Comprova já esclareceu que não foram feitas mudanças na lei que dispõe sobre o pagamento de pensões por invalidez ou morte em casos de acidente de trânsito. Também explicou a proposta do Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar para destinar terras de “grandes devedores” a assentamentos de produtores rurais, por meio do processo de adjudicação de imóveis.

Política

Investigado por: 2023-11-17

Tarifa para estados que recebem águas do São Francisco não pagará obra da transposição; entenda por que há a cobrança

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Enganoso
São enganosos os vídeos afirmando que os cearenses terão que pagar uma tarifa para custear o uso das águas da transposição do Rio São Francisco porque o governo federal não quer arcar com as despesas do projeto. A cobrança pelo uso dos recursos hídricos, que, no caso da transposição beneficia os estados de Pernambuco, Ceará, Rio Grande do Norte e Paraíba, é uma ação prevista na Lei Federal 9.433, de 1997. Além disso, o pagamento dos custos operacionais do empreendimento está previsto em pré-acordos realizados entre os entes envolvidos desde 2005.

Conteúdo investigado: Em dois vídeos publicados no TikTok constam afirmações de que os cearenses terão que pagar uma tarifa para custear o uso das águas da transposição do Rio São Francisco. A cobrança estaria sendo feita por causa de uma suposta falta de verba do governo Lula (PT) para bancar o empreendimento, resultando em pressão sobre os estados para “cobrarem a taxa do povo”. Os vídeos mencionam um projeto de lei enviado pelo Governo do Ceará à Assembleia Legislativa, e aprovado em novembro de 2023, que determina que “a tarifa de segurança hídrica será cobrada na fatura de consumo dos usuários de água bruta”.

Onde foi publicado: TikTok.

Conclusão do Comprova: O Projeto de Integração do Rio São Francisco (PISF), a transposição do Velho Chico, é novamente alvo de desinformação. No caso em questão, conteúdos descontextualizados abordam uma lei estadual aprovada, em novembro de 2023, no Ceará e a cobrança por parte do governo federal pelo uso das águas provenientes da obra estruturante nos estados beneficiados – Pernambuco, Ceará, Rio Grande do Norte e Paraíba – e apontam, de forma enganosa, que isso decorre da falta de dinheiro para conclusão do empreendimento por parte do governo Lula.

Na realidade, a cobrança pelo uso dos recursos hídricos é uma ação prevista na Lei Federal 9.433 de 1997, chamada Lei das Águas, já sendo prática em algumas bacias hidrográficas do país desde os anos 2000 – visto que a água no Brasil é encarada como um bem que tem valor econômico. Logo, o pagamento pela utilização das águas do São Francisco está inserido nesse contexto e não é inédito.

No caso da transposição do São Francisco, além do pagamento pelo uso da água em si, os estados são cobrados, conforme acordos entre o governo federal e as gestões estaduais, pela manutenção e operação do sistema do PISF. Ainda assim, a arrecadação não tem a finalidade de custear a conclusão da obra, nem relação alguma com a construção da obra em si. A própria legislação que estabelece a cobrança não prevê essa aplicação.

Além disso, as tratativas na transposição do São Francisco para que estados beneficiários se responsabilizem pelos custos de operação e manutenção, pagando para isso uma tarifa à União, já acontecem desde 2005, ou seja, antes da obra ter início em 2007.

É fato que, há anos, existem muitas divergências entre os estados em questão e a União sobre o pagamento. Entre outros pontos são debatidos o formato, o modelo, os valores e os prazos. Esse é um dos pontos que faz com que, até o momento, nenhum dos quatro estados pague efetivamente a tarifa de uso. Tal recurso é bancado ainda pelo governo federal, pois, segundo a Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA), a cobrança só será iniciada após a assinatura do contrato entre a Operadora Federal e os estados receptores, ou seja, quando o PISF entrar em operação comercial.

Apesar disso, por atribuição, desde 2018, a ANA faz os cálculos de quanto deveria ser cobrado anualmente de cada estado pelo uso das águas.

A Lei estadual 18.558, de 1º de novembro de 2023 cumpre um preceito normativo e, segundo a ANA, define sobre a gestão das águas do PISF no Ceará e por isso é importante que os demais estados aprovem legislações que vão no mesmo sentido.

O texto da lei no Ceará fala em usuários de água bruta – sem tratamento. Sem definição específica na lei de quem são os usuários. Esse ponto também é questionado em conteúdos suspeitos. No Brasil, os usuários de água bruta podem ser pessoas físicas ou jurídicas e, em geral, quem faz uso do recurso nesse formato são indústrias, mineradoras, agronegócio e empresas de saneamento básico.

Nesse quesito, a ANA diz que os estados definirão “como ou se farão a cobrança dessa água dos seus usuários finais, ou seja, aos usuários a quem eles entregarem essa água”. No Ceará, a Secretaria de Recursos Hídricos (SRH-CE) diz que quando a tarifa entrar em vigor será para as empresas de saneamento e as indústrias, não incluindo, nesse caso, o segmento da agricultura. Mas, não há nada definido ainda sobre como o valor da água tratada por esses segmentos será repassado, por exemplo, aos consumidores domésticos.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Nesse caso, no TikTok as publicações tiveram mais de 17,6 mil visualizações até 16 de novembro de 2023.

Como verificamos: O Comprova buscou informações sobre o PISF no site do Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional (MIDR), responsável pela execução das obras. Foram consultados, via e-mail, órgãos como a SRH-CE e a ANA, além de legislações que dispõem sobre a temática, como a Política Nacional de Recursos Hídricos. A equipe consultou ainda o texto completo do Projeto de Lei, que virou lei, enviado pelo Governo do Ceará à Assembleia Legislativa.

A reportagem também tomou como base outras verificações do Comprova envolvendo o PISF. Para contextualização do assunto, buscamos matérias e notícias veiculadas pela imprensa sobre os acordos entre União e Estados (Pernambuco, Ceará, Rio Grande do Norte e Paraíba) para a gestão do projeto do São Francisco (Agência Brasil, G1).

O Comprova fez contato com os autores de dois vídeos publicados no TikTok sobre o tema e com o deputado estadual Carmelo Neto (PL), do Ceará, que teve uma postagem sua no Instagram exibida em um dos vídeos.

O que é a Transposição do Rio São Francisco

Com 477 quilômetros de extensão, o Projeto de Integração do Rio São Francisco (PISF) é a maior obra de infraestrutura hídrica do Brasil e atende 390 municípios em Pernambuco, Ceará, Rio Grande do Norte e Paraíba, segundo informações do MIDR. O empreendimento tem o objetivo de levar água para regiões secas e semiáridas do nordeste brasileiro, por meio da construção de canais e sistemas de bombeamento. O projeto é dividido nos eixos Leste e Norte.

A proposta nasceu em 1985 no extinto Departamento Nacional de Obras e Saneamento do governo federal, mas as construções só iniciaram de fato no ano de 2007, na época do segundo governo do presidente Lula.

A gestão do projeto e a execução das obras são de responsabilidade do MIDR. A Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf), empresa pública ligada ao MIDR, atua na operação e manutenção das estruturas prontas, que se tornam operacionais. Atualmente, a transposição funciona em fase pré-operacional e aguarda a operação comercial.

Quem paga pelos custos do serviço

Em verificações anteriores, o Comprova já havia explicado que em 2005, antes do início das obras do PISF, foi firmado um Termo de Compromisso entre os entes envolvidos no projeto. Nele ficou acordado que caberia à União arcar com os custos de implantação do sistema e aos estados (Ceará, Paraíba, Pernambuco e Rio Grande do Norte), os custos de operação e manutenção.

Um documento da Codevasf, disponível no site da Câmara dos Deputados, detalha aspectos do PISF, inclusive as obrigações da União e dos estados, definidas no Termo de Compromisso assinado em setembro de 2005.

A discussão sobre a cobrança pelo uso da água da transposição ocorre há muitos anos e gera debates e divergências entre os estados beneficiados e a União. No histórico, em abril de 2021, após tratativas no âmbito da Câmara de Conciliação e Arbitragem da Administração Federal (CCAF) da AGU foi assinado o Termo de Pré-acordo entre a União e os estados.

Segundo esse termo, cabe aos estados “implantar a cobrança de tarifas dos serviços de operação e manutenção e a cobrança de direito de uso no âmbito dos estados […]”. As decisões que dizem respeito à cobrança de taxas passam ainda pelo Conselho Nacional de Recursos Hídricos (CNRH) e por autorizações de licenças ambientais, de acordo com a SRH-CE.

“Vale ressaltar que essas medidas acontecem desde a concepção da obra, com todo o arcabouço jurídico institucional para alinhar com as solicitações dos órgãos de controle”, explicou Ramon Rodrigues, secretário executivo dos Recursos Hídricos do Ceará.

Rodrigues destacou que, no Ceará, não está em vigor a cobrança sobre o uso das águas do São Francisco: “o que estão sendo feitos são os compromissos assinados na gestão passada, em um pré-acordo, assinado pelo ex-ministro do MDR Rogério Marinho e pelo então governador [do Ceará] Camilo Santana e pelos demais governadores, com a AGU (Advocacia-Geral da União)”, afirmou.

De acordo com ele, a ideia é que “se defina uma tarifa que deverá ser diluída no máximo possível de usuários e, a depender dos valores, o estado pode entrar com algum subsídio. Mas tudo isso ainda é pauta de discussões, nenhuma tarifa foi cobrada e nem tem previsão de cobrança”, esclareceu.

Lei já estipulava cobrança e dinheiro não é para pagar obra

No Brasil, a cobrança pelo uso de recursos hídricos é um dos instrumentos de gestão da Política Nacional de Recursos Hídricos, e existe desde 1997, instituída pela Lei Federal 9.433/97, a chamada Lei das Águas. Isso porque devido às condições de escassez em quantidade e/ou qualidade, a água passou a ter valor econômico. Logo, as discussões sobre a cobrança pelo uso da água do São Francisco estão dentro do que já está previsto normativamente no país, não tendo relação com a disponibilidade de dinheiro usado para custear a obra estruturante.

Segundo a Lei Federal 9.433/97, a cobrança pelo uso de recursos hídricos existe para:

  • Dar ao usuário uma indicação do real valor da água;
  • Incentivar o uso racional da água;
  • Obter recursos financeiros para recuperação das bacias hidrográficas do país.

Segundo registros do site da ANA, nacionalmente, o pioneirismo na cobrança pelo uso de recursos hídricos é da bacia hidrográfica do Rio Paraíba do Sul na qual os valores são arrecadados desde março de 2003.

A Lei Federal 9.433/97 também estabelece que o dinheiro proveniente da cobrança do uso de recursos hídricos serão aplicados prioritariamente na bacia hidrográfica em que foram gerados e serão utilizados:

  • No financiamento de estudos, programas, projetos e obras incluídos nos Planos de Recursos Hídricos;
  • No pagamento de despesas de implantação e custeio administrativo dos órgãos e entidades integrantes do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos.

As obras mencionadas nesse ponto da lei são intervenções de melhoria na bacia hidrográfica que constem nos planos elaborados – com ações de curto, médio e longo prazo – para o gerenciamento, recuperação e preservação dos recursos hídricos em questão.

O secretário de Recursos Hídricos do Ceará reforça que, no caso da outorga das águas do São Francisco, emitida pela ANA, “é definido que essa operação e manutenção deveria ser incluída nos custos dos estados receptores”. Ele acrescenta que o dinheiro cobrado deve ser usado “somente para manutenção e operação. Nada de custeio de obras”.

Ao Comprova, a ANA afirmou, por email, que o valor não é para pagamento do custeio que foi “todo assumido pela União. Esses custos referem-se à manutenção e operação do sistema do PISF”.

Tarifas da transposição

Apesar de os estados beneficiados ainda não pagarem os valores à União pelo uso das águas da transposição, desde 2018, por atribuição, a ANA elabora e publica o desenho dos cálculos das tarifas a serem cobradas. Para isso, uma resolução é publicada anualmente.

Em 2023, conforme já apontado em verificação do Comprova, a ANA publicou a Resolução nº 148/2023 no Diário Oficial da União. A norma define as tarifas deste ano do PISF.

“Na Resolução ANA nº 148/2023 estão previstos os valores que cada estado deveria pagar. No entanto, a cobrança só será iniciada após a assinatura do contrato entre a Operadora Federal (CODEVASF) e os estados receptores, ou seja, quando o PISF entrar em operação comercial”, reiterou a ANA.

O custo total previsto para prover os serviços de captação e transporte de água bruta da transposição em 2023 é de R$ 274,7 milhões. Desse montante, segundo os cálculos, Ceará, Paraíba, Pernambuco e Rio Grande do Norte teriam, respectivamente, um custo de R$ 92,9 milhões; R$ 77,6 milhões; 82,4 milhões; e R$ 21,6 milhões. Peças desinformativas, muitas vezes, tomam essa projeção como evidência que o dinheiro está sendo efetivamente pago.

A cobrança, explica a ANA, será realizada pela Operadora Federal (Codevasf) que cobrará dos estados receptores. Estes, por sua vez, “definirão como ou se farão a cobrança dessa água dos seus usuários finais, ou seja, aos usuários a quem eles entregarem essa água”.

O diz a lei aprovada no Ceará

No dia 1º de novembro de 2023, a Assembleia Legislativa do Ceará aprovou o Projeto de Lei 104/23, do Poder Executivo, que dispõe sobre a gestão operacional e financeira do Projeto de Integração do Rio São Francisco (PISF) no estado.

Na justificativa, a proposta destaca o termo de pré-acordo firmado entre os estados beneficiados com a transposição das águas, em 2021, e detalha que os quatro estados devem gerar recursos que assegurem “o pleno funcionamento do PISF”. Uma das medidas previstas para garantir a verba é a “instituição de cobrança dos serviços de adução de água bruta ao usuário final”.

Segundo o secretário executivo dos Recursos Hídricos do Ceará, Ramon Rodrigues, ao assinar o pré-acordo, em 2021, os quatro estados se comprometeram a enviar um PL para as assembleias legislativas estabelecendo diretrizes para a gestão operacional e financeira do PISF. O representante do Executivo cearense disse também que existem critérios para a cobrança da taxa e que ainda não há definição sobre os valores.

Em termos práticos, o projeto aprovado no Ceará estabelece que a Secretaria dos Recursos Hídricos (SRH) e a Companhia de Gestão dos Recursos Hídricos do Ceará (Cogerh) serão responsáveis pela gestão operacional e financeira do PISF no Estado. Além disso, o ponto de destaque nos conteúdos enganosos é que a lei estabelece a cobrança pelo uso dos recursos hídricos por meio de Tarifa de Segurana Hídrica.

Essa cobrança, diz a lei, se baseará no valor da tarifa de prestação do serviço de adução de água bruta do PISF, definido pela ANA. A cobrança, aponta o texto, “ocorrerá de forma proporcional ao consumo de cada usuário”. A União, através da ANA, “irá cobrar da operadora estadual, no caso a Cogerh, e ela vai cobrar dos usuários de água bruta”, diz o texto.

O texto da lei fala em usuários de água bruta sem definir explicitamente quem são esses usuários. O representante da SRH, indica que no Ceará os valores devem ser arrecadados das empresas de saneamento e das indústrias já que a finalidade é o abastecimento humano.

“O que está sendo criado é uma tarifa de segurança hídrica, que será diluída nos usuários de água bruta, como o pessoal do saneamento e das indústrias. O segmento da agricultura não vai pagar por essa água, pois essa água não é para ser usada na agricultura, e sim para abastecimento humano. Além disso, essa tarifa deve respeitar também os custos sociais, as tarifas sociais que têm isenção. Porém, nada disso se encontra definido. Ainda existe uma discussão sobre o tema”, diz o secretário executivo dos Recursos Hídricos do Ceará, Ramon Rodrigues.

Contrato comercial deve ser assinado até março de 2024

No dia 4 de agosto de 2023, em um acordo interfederativo entre o governo federal e os estados receptores das águas, as gestões se comprometeram a firmar os contratos até março de 2024 para dar início à operação comercial do Projeto.

Conforme o acordo, esses estados deverão arcar com as tarifas relativas à prestação do serviço de adução de água bruta do PISF estabelecidas pela ANA. Os recursos para o pagamento devem estar previstos nos orçamentos estaduais a partir de 2024. No caso da Lei aprovada no Ceará, já há o estabelecimento desse compromisso de fixar na Lei Orçamentária Anual uma dotação específica que possa, eventualmente, completar os recursos arrecadados pela tarifa de segurança hídrica, caso a arrecadação não seja suficiente para pagar a fatura expedida pela União.

As tarifas a serem pagas pelos estados são de dois tipos:

  • De consumo: cobrada proporcionalmente ao volume de água fornecido às operadoras estaduais nos pontos de entrega. O valor é para cobrir os custos variáveis do empreendimento, como a energia elétrica utilizada para o bombeamento da água;.
  • De disponibilidade: referente à cobrança Codevasf junto às operadoras estaduais para cobrir a parcela fixa dos custos decorrentes da operação, como: manutenção da infraestrutura, cobrança pelo uso de recursos hídricos da bacia e gastos fixos com energia elétrica.

A soma dos dois critérios gera a cobrança total pela água. O valor da tarifa previsto para o ano de 2023, definido na Resolução ANA foi de:

  • R$0,322/m³ referente a disponibilidade;
  • R$0,204/m³ referente ao consumo.

No recente acordo, os governos estaduais também são obrigados a arcar com os custos de operação e manutenção de canais e adutoras conectados aos Eixos Norte e Leste do PISF e que beneficiem apenas um estado.

O que diz o responsável pela publicação: Por meio de mensagem direta no TikTok, um dos perfis não respondeu aos questionamentos da reportagem e outro não quis se manifestar sobre a veracidade das informações que compartilhou.

O deputado estadual Carmelo Neto (PL), do Ceará, através de nota, afirmou que “o vídeo divulgado nas redes sociais é sucinto, apenas destacando ipsis litteris o que foi enviado e aprovado pela Assembleia Legislativa do Estado do Ceará”.

O que podemos aprender com esta verificação: Uma das táticas mais utilizadas por desinformadores é usar fatos verdadeiros fora de contexto para causar pânico ou histeria, principalmente quando o tema envolve cobranças de taxas ou valores quaisquer por governos. No caso da verificação em questão, elementos como recortes de Projetos de Lei são utilizados para inferir credibilidade ao conteúdo, mas são utilizados de maneira isolada, sem o devido contexto e explicação.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: A transposição do Rio São Francisco é alvo frequente de desinformação. Somente em 2023, o Comprova já produziu conteúdo explicando a obra em si e por que ela gera dúvidas, já apontou que a polarização intensifica desinformação sobre transposição do São Francisco; que é falsa a alegação de que Lula desligou bombas da transposição, bem como alegações falsas de que um trecho do Eixo Norte da transposição foi fechado pelo governo Lula.

Comprova Explica

Investigado por: 2023-11-17

Entenda por que não há pagamento de 13ª parcela no Bolsa Família

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Comprova Explica
Publicações nas redes sociais alegam que Lula cortou uma 13ª parcela do pagamento dos beneficiários do Bolsa Família. Entretanto, os favorecidos pelo programa receberam o “13º” uma única vez, em 2019. Apesar da inclusão de uma parcela extra já ter sido discutida outras vezes, o entendimento até o momento foi que o programa assistencial não se enquadra na lógica trabalhista, não comportando, portanto, o pagamento do 13º.

Conteúdo analisado: Vídeo que circula nas redes sociais mostra trecho de transmissão da CNN Brasil em que uma apresentadora afirma que o Bolsa Família não terá “13º salário” em 2023 e, na sequência, uma autoridade fala sobre a questão. Ao redor da imagem, foram acrescentados gifs de pessoas “fazendo o L” e dando risadas.

Comprova Explica: O Programa Bolsa Família é alvo frequente de peças de desinformação nas redes sociais. Muitas delas afirmam que o governo federal cortou beneficiários aleatoriamente ou reduziu o valor de maneira deliberada. Devido à nova onda de desinformação sobre o tema, sobre o pagamento de uma 13ª parcela do benefício, o Comprova Explica detalha como são os pagamentos do novo programa.

Diferentemente do que sugerem posts virais, o Bolsa Família não contava com um “13º salário”, que foi cortado por Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Uma parcela extra do benefício foi paga uma única vez, em 2019. Em março de 2023, o governo federal, sob o comando de Lula, afirmou que não deve retomar o benefício extra e avaliou o pagamento de 2019 como uma “promessa de campanha” do governo anterior, de Jair Bolsonaro (PL).

Entretanto, o novo Bolsa Família, aprovado em 2023, prevê pagamentos superiores ao antigo Auxílio Brasil, do governo Bolsonaro. Até junho de 2022, o pagamento mínimo do Auxílio Brasil era de R$ 400. Então, passou a R$ 600 com a adição de uma ajuda por causa da guerra na Ucrânia — para compensar pela alta de preços de comida e energia. A ajuda extra era temporária, seria disponibilizada até o mês de dezembro. No novo Bolsa Família, o pagamento mínimo foi fixado em R$ 600. Valor que pode aumentar conforme condições específicas dos beneficiários.

O pagamento fixo de uma 13ª parcela do benefício social já foi discutido outras vezes, mas nunca foi aprovado pelo Congresso. Ainda assim, em alguns estados, os beneficiários do Bolsa Família recebem um pagamento extra, como uma espécie de bônus natalino, por meio de programas assistenciais estaduais.

Como verificamos: A partir das imagens utilizadas na publicação investigada, fizemos uma busca no YouTube com as palavras “CNN + 13º + Bolsa Família” e chegamos ao vídeo original, veiculado originalmente em 4 de março de 2023.

Na sequência, com uma busca no Google por “13º Bolsa Família”, encontramos uma notícia do g1 sobre a entrevista que aparece no post investigado.

13º do Bolsa Família foi pago somente em 2019

Conforme informado pelo governo federal no início de março, não haverá pagamento de 13º parcela do Bolsa Família. O pagamento de uma parcela extra do benefício ocorreu apenas uma vez, em 2019. O bônus foi pago em dezembro daquele ano a 13,5 milhões de famílias e teve custo de R$ 2,58 bilhões.

Em entrevista coletiva, a secretária de Avaliação de Gestão da Informação e Cadastro Único, Letícia Bartholo, afirmou que “o Bolsa Família é um programa de assistência, de complemento de renda, não se adequa à vinculação de um 13º salário”.

Em 2019, o pagamento foi feito por meio de uma Medida Provisória (MP). Para se tornar lei, deveria ser votada e aprovada pela Câmara e pelo Senado em até 120 dias. De acordo com Ricardo Barros (PP-PR), líder do governo na Câmara à época, a votação não ocorreu a pedido do próprio governo. “Não havia recursos orçamentários para isso, portanto o Ministério da Economia pediu que a medida não fosse votada”, afirmou.

Novo Bolsa Família

O programa Bolsa Família foi criado em outubro de 2003, no primeiro governo Lula, e tem como objetivo a transferência direta de renda para famílias em situação de pobreza e extrema pobreza em todo o país.

Em 2021, no governo de Bolsonaro, o programa foi extinto e substituído pelo Auxílio Brasil. Neste ano, na terceira gestão Lula, ele voltou a ser chamado de Bolsa Família.

No dia anterior à entrevista coletiva concedida por Letícia Bartholo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) havia assinado uma MP reformulando o programa. Desde então, a MP já se transformou na Lei 14.601/23, aprovada em junho pela Câmara dos Deputados.

O novo Bolsa Família prevê:

  • pagamento de pelo menos R$ 600 por família;
  • R$ 150 adicionais para cada criança de até 6 anos;
  • R$ 50 adicionais para crianças com mais de 7 anos e jovens com menos de 18;
  • R$ 50 adicionais para gestantes.

Podem ter acesso ao programa famílias com renda mensal familiar per capita igual ou menor a R$ 218. De acordo com o governo federal, cerca de 21 milhões de famílias recebem o benefício.

Para fins de comparação, o Auxílio Brasil, aprovado pelo Senado no final de 2021, tinha como pagamento mínimo R$ 400. De acordo com o Ministério da Cidadania, o valor médio do benefício na folha de pagamento de janeiro de 2022 foi de R$ 407,54. A renda familiar máxima para ter direito ao benefício era de R$ 210 per capita.

13º do Bolsa Família

O pagamento de uma 13ª parcela para beneficiários do Bolsa Família já foi discutido em outros momentos. Em 2007, a Comissão de Seguridade Social e Família rejeitou um Projeto de Lei que criava o 13º do Bolsa Família.

A justificativa dada pelo relator do projeto na comissão, o então deputado Dr. Rosinha (PT-PR), para a rejeição foi o entendimento que o 13º salário é de natureza trabalhista e não se encaixa nas regras e lógicas da assistência social — de forma similar ao que afirmou Letícia Bartholo este ano.

Apesar de não existir no âmbito federal, existem programas estaduais que garantem o recebimento de um “13º do Bolsa Família”. Isso ocorre em Pernambuco. A iniciativa concede anualmente uma parcela extra aos beneficiários do Bolsa Família no estado.

Em 2023, aproximadamente 1.077.294 famílias serão atendidas pelo programa, de acordo com a Secretaria Estadual de Desenvolvimento Social, Criança, Juventude e Prevenção à Violência e às Drogas. A iniciativa concedeu, em 2023, até R$ 150 por família.

Na Paraíba, uma lei estadual institui um abono natalino para os beneficiários do programa federal. O valor do abono é fixado em R$ 64.

Por que explicamos: O Comprova Explica tem a função de esclarecer temas importantes para que a população compreenda assuntos em discussão nas redes sociais que podem gerar desinformação. É importante esclarecer situações referentes a programas de auxílio, pois a menção de cancelamento ou diminuição de valores pagos pelo governo dão a entender que a população está sendo prejudicada, e informações descontextualizadas ou em tons alarmistas são frequentemente compartilhadas com o objetivo de causar pânico nos beneficiários.

Outras checagens sobre o tema: Programas de assistência social, como é o caso do Bolsa Família, são alvos frequentes de desinformadores por serem um tópico sensível. No Comprova, já mostramos que mães chefes de família não foram proibidas pelo governo de receber o benefício; que Geraldo Alckmin não sugeriu acabar com o programa; e também já explicamos o funcionamento do novo Bolsa Família.

Política

Investigado por: 2023-11-17

Produtora recebeu autorização para captar R$ 2 milhões via leis de incentivo, mas não pela Rouanet ou por ser amiga de Lula

  • Enganoso
Enganoso
É enganoso vídeo que diz que uma militante do PT e do MST teria captado R$ 2 milhões via Lei Rouanet por ser amiga do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Projeto de diretora e produtora baiana foi aprovado pela Agência Nacional do Cinema (Ancine) para captação por meio de mecanismos previstos na Lei do Audiovisual, sem relação com a Lei Rouanet. Além disso, não encontramos indícios de que ela seja amiga de Lula.

Conteúdo investigado: Em vídeo, homem afirma que uma mulher chamada Thamires Santos Vieira, que seria militante do PT e do MST, “captou R$ 2 milhões da Lei Rouanet por ser amiga do Lula”, enquanto 7 milhões de baianos estariam passando fome.

Onde foi publicado: Instagram, TikTok e X (antigo Twitter).

Conclusão do Comprova: Vídeo engana ao afirmar que Thamires Santos Vieira, diretora e produtora audiovisual da Bahia, teria captado R$ 2 milhões pela Lei Rouanet por ser amiga do presidente Lula (PT). Uma proposta de Vieira recebeu, sim, autorização para captar recursos, mas não pela Lei Rouanet. Além disso, o autor do post enganoso se baseia apenas em um post de Vieira em que ela declara apoio ao petista, mas não encontramos qualquer indício de que ela tenha uma relação de amizade com o presidente.

Sobre a captação de recursos, pela plataforma da Agência Nacional do Cinema (Ancine), é possível verificar que nenhuma das fontes de captação autorizadas têm relação com a Lei Rouanet. Dentro dos R$ 2.020.000 autorizados para captação, estão inclusos valores aprovados pelos mecanismos previstos na Lei 8.685/93, conhecida como Lei do Audiovisual, em editais da Ancine, leis estadual e municipal de incentivo e fomento à cultura e a contrapartida obrigatória do produtor.

O projeto ainda não captou recursos, tendo recebido autorização para tal no dia 26 de setembro de 2023. A produtora tem autorização para conseguir os recursos até o dia 31 de dezembro de 2026.

Questionado pelo Comprova, o MST informou que Thamires não é militante do movimento. Também buscamos o nome da diretora na base de dados de filiados a partidos políticos do site Brasil.io e, ao menos até abril de 2018, ela não era filiada a nenhum partido. 

O vídeo também erra o número de pessoas em situação de fome na Bahia. De acordo com pesquisa da Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional, de 2022, há 1,7 milhão de pessoas em situação de insegurança alimentar no estado, e não 7 milhões.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. No Instagram, a publicação teve 2.1 mil visualizações até o dia 17 de novembro de 2023. O vídeo também foi publicado no TikTok, mas foi retirado do ar, junto à conta do autor. A gravação foi republicada no X, alcançando cerca de 300 visualizações.

Como verificamos: Primeiramente, o Comprova buscou pelo perfil de Thamires no Instagram e encontrou as fotos usadas no vídeo: em uma imagem, ela aparece vestindo uma camisa vermelha com adesivos do número 13 e a outra é uma montagem com imagem de pessoas erguendo bandeiras do Movimento Sem Teto de Salvador (MSTS).

Depois, procuramos o nome de Thamires no Diário Oficial da União. A pesquisa retornou algumas publicações sobre produções audiovisuais submetidas à captação. Também entramos em contato com a Ancine para esclarecer os mecanismos de fomento utilizados pelo projeto. Consultamos o MST e a relação de filiados a partidos políticos do Brasil.io. Por fim, tentamos falar com Thamires e buscamos o responsável pelo vídeo.

Captação não foi autorizada pela Lei Rouanet

O projeto ao qual o vídeo se refere é o documentário Mulheres do Bando, produzido pela Terá Filmes, empresa coordenada por Thamires Vieira. A proposta recebeu autorização para captar recursos no dia 26 de setembro de 2023, conforme esta publicação no Diário Oficial da União (DOU). A postagem investigada, inclusive, usa uma captura de tela da publicação do DOU para mostrar o valor total aprovado para captação, de R$ 2,020 milhões.

Segundo a plataforma de consulta aos projetos audiovisuais da Ancine, nenhuma das fontes de captação têm relação com a Lei Rouanet, ao contrário do que alega o vídeo. Dentro do montante estão incluídos valores aprovados pelos mecanismos previstos na Lei 8.685/93, conhecida como Lei do Audiovisual, em editais da Ancine, leis estadual e municipal de incentivo e fomento à cultura e a contrapartida obrigatória do produtor. Conforme a plataforma, o projeto ainda não captou recursos. Veja o detalhamento:

| Reprodução/Ancine. Captura feita em 14/11/2023.

O Art 3º- A da Lei do Audiovisual define que as empresas detentoras de direitos de exibição de filmes, eventos e competições esportivas, transmitidas por rádio e televisão, a exemplo de emissoras de TV abertas ou a cabo, podem abater até 70% do imposto devido desde que invistam no desenvolvimento de obras cinematográficas brasileiras.

No âmbito das legislações locais, o Programa Estadual de Incentivo ao Patrocínio Cultural (Fazcultura) foi instituído pela Lei Orgânica da Cultura Baiana (Lei Estadual n° 12.365/2011) e prevê a possibilidade de incentivo a projetos culturais por meio da renúncia do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). Já o Viva Cultura, programa de incentivo de Salvador, também segue o sistema de renúncia fiscal. Nesse sentido, pessoas físicas e jurídicas conseguem abater parte do Imposto sobre Serviços (ISS) e do Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU) devidos, em compensação ao apoio a produções culturais.

A Terá Filmes também foi autorizada a captar recursos por meio de editais da Ancine, alimentados pelo Fundo Setorial do Audiovisual (FSA). O fundo é composto por diversas fontes de receita da União, sendo a principal delas a arrecadação da Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica Nacional (Condecine).

A Instrução Normativa nº 158, que traz diretrizes sobre projetos audiovisuais de competência da Ancine, determina que 5% do orçamento total do projeto deve ser custeado com recursos próprios do proponente. Dessa forma, dos R$ 2,020 milhões aprovados, a empresa deve custear, obrigatoriamente, R$ 120 mil.

Produtores que desejam captar fundos por meio de programas da Ancine devem atender algumas condições para receber aprovação do projeto. Além de condições básicas como ter registro na Ancine e adequação da atividade econômica ao objeto a ser realizado, a Ancine também exige regularidade fiscal, bem como tributária e previdenciária.

Os projetos também estão sujeitos a algumas condições para serem aprovados, como: a adequação do total de recursos de fomento indireto e direto solicitados ao limite total de captação da proponente, de acordo com a sua classificação de nível; e a adequação do projeto técnico às fontes de financiamento solicitadas e seus respectivos limites legais.

Após a aprovação do projeto para captação, são abertas contas bancárias exclusivas para captação e movimentação do dinheiro. Os valores são bloqueados até aprovação para execução do projeto, por ordem expressa da Ancine.

Quem é Thamires Vieira

Thamires é diretora e produtora audiovisual e coordena a Terá Filmes, produtora de cinema independente, sediada em Salvador. Em 2018, ela codirigiu a série documental “Diz Aí – Afro indígena” e contribuiu com a direção do documentário “Viva Nossa Voz”, uma parceria do Instagram com o Canal Brasil, em 2020.

A produtora também teve outros dois projetos aprovados pela Ancine, este ano, para captação de recursos. Eles tampouco captaram recursos até o momento. O período de captação do projeto Redoma segue até o dia 31 de dezembro de 2026 e o valor máximo de captação é de R$ 4 milhões. Já o longa Paraíso de Amanda tem autorização para captar recursos até 31 de dezembro de 2027, com valor máximo de R$ 2,2 milhões.

Em suas redes sociais, ela se manifestou a favor de Lula nas eleições presidenciais de 2022. No entanto, não há qualquer indício de que ela tenha uma relação de amizade com o presidente da República. O Comprova tentou entrar em contato com a diretora, mas não obteve resposta até a publicação desta verificação.

Questionado pelo Comprova, o MST informou que Thamires não é militante do movimento. Também buscamos o nome da diretora na base de dados de filiados a partidos políticos do site Brasil.io e, ao menos até abril de 2018, ela não era filiada a nenhum partido. A publicidade dos dados de filiação partidária foi limitada por decisão do TSE, em 2021, para conformidade com a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD).

Fome na Bahia

No vídeo, o homem afirma mais de uma vez que 7 milhões de baianos passam fome atualmente. Esse número também não condiz com a situação real. De acordo com a Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional, em 2022, ano de publicação do último relatório, 1,7 milhão de baianos conviviam com a fome.

Segundo o último censo, de 2022, a Bahia tem 14.141.626 habitantes.

Cabe ressaltar que os recursos voltados a iniciativas de incentivo e fomento à cultura são diferentes dos empregados em programas de combate à fome. Além disso, a Constituição Federal veda a transferência de recursos de uma pasta para outra, sem prévia autorização do Poder Legislativo. Ou seja, ainda que o governo quisesse tirar dinheiro da cultura para aplicar em programas de assistência social, seria necessário aprovar no Congresso uma lei específica para o remanejamento.

Em 2023, o governo federal recriou o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), considerado essencial para a retirada do país do Mapa da Fome da Organização das Nações Unidas (ONU). O orçamento total previsto para o programa neste ano chega a R$ 900 milhões. Recentemente, a Bahia aderiu à iniciativa e recebeu um montante de R$ 13,88 milhões para execução do PAA no estado.

O programa prevê que, no mínimo, 30% das compras públicas de alimentos devem ser adquiridas da agricultura familiar e, posteriormente, destinadas a ações de combate à fome.

Lei Rouanet

Criada em 23 de dezembro de 1991, a Lei de Incentivo à Cultura, conhecida como Lei Rouanet, é um mecanismo de incentivo fiscal do governo federal que permite que empresas e pessoas físicas possam destinar uma porcentagem de seu imposto para iniciativas culturais. O objetivo é estimular e fomentar a produção, preservação e difusão cultural.

O valor do imposto vai para os programas aprovados pelo Ministério da Cultura, em um investimento indireto. Os principais critérios de avaliação utilizados pela pasta para aprovar um projeto são: a capacidade de ampliar o acesso da população à cultura; e compatibilidade de custos e capacidade técnica e operacional do proponente, respectivamente.

Uma vez aprovados, os proponentes devem buscar empresas e pessoas dispostas a financiarem os projetos através dos impostos. Desse modo, o governo dá a autorização para a captação de um determinado montante, mas isso não significa que o proponente vai obter todo o dinheiro previsto.

A execução do projeto incentivado é acompanhada pelo ministério, de forma eletrônica, por trilhas implementadas no Sistema de Apoio às Leis de Incentivo à Cultura (Salic), que identificam possíveis inconsistências de execução. Esse acompanhamento é diferente dependendo do valor captado do projeto, classificado como pequeno (até R$ 750 mil), médio (de R$ 750 mil até R$ 5 milhões) e grande (acima de R$ 5 milhões).

Todos os projetos devem realizar a comprovação de despesas de forma eletrônica, durante a execução. Essas informações são cruzadas com os valores utilizados em conta bancária específica e acompanhada, em tempo real, pelo ministério.

O que diz o responsável pela publicação: O Comprova entrou em contato com o autor do post via mensagem no Instagram. Ele defendeu a publicação afirmando que o conteúdo foi retirado do DOU e argumentou que o dinheiro poderia ser usado em outras áreas. Como esclarecido nesta verificação, as alegações feitas no vídeo estão fora de contexto. O responsável já foi alvo de outras verificações do Comprova. A iniciativa já desmentiu que um produtor cultural teria viajado a Portugal com dinheiro recebido da Lei Rouanet.

O que podemos aprender com esta verificação: O vídeo usa uma publicação do Diário Oficial da União como forma de conferir credibilidade às alegações do autor. No entanto, é preciso verificar se o documento, de fato, corrobora com as informações dadas na gravação. Nesse caso, ele alega que os recursos aprovados foram captados por meio da Lei Rouanet. No entanto, os mecanismos de incentivo eram outros e sequer houve captação de recursos.

Além disso, é comum que agentes de desinformação associem os investimentos em cultura a problemas relacionados a outras questões sociais, como a fome, o desemprego e a desassistência à saúde. Mas é preciso entender que cada área possui orçamento próprio e o emprego de recursos em um setor não significa o abandono de outros.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: O Comprova já verificou outras publicações relacionadas à Lei Rouanet. Como afirmado acima, a iniciativa mostrou que um produtor cultural não foi a Portugal com dinheiro recebido do mecanismo e publicou também que tuíte engana ao dizer que Ludmilla receberá R$ 5 milhões por projeto que leva seu nome.

Problemas no Nordeste também são frequentemente alvos de desinformação. Recentemente, o Comprova verificou que o governo Lula não criou taxa para uso de poços artesianos e a gestão de recursos hídricos é papel dos estados e que vídeo resgata notícia antiga e engana sobre interrupção da Operação Carro-Pipa na gestão do petista.

Política

Investigado por: 2023-11-10

Vídeo confunde treinamento de militares brasileiros com suposta invasão de soldados venezuelanos

  • Enganoso
Enganoso
São enganosas as publicações que afirmam que soldados venezuelanos estariam invadindo o Brasil em busca de refugiados da Venezuela. Vídeos mostram, na realidade, um treinamento realizado pelo Corpo Fuzileiros Navais no estado do Espírito Santo, em outubro de 2023, conforme assinalado pela Marinha do Brasil, desmentindo qualquer relação das imagens com uma invasão venezuelana.

Conteúdo investigado: Publicações em vídeo que circulam no X (antigo Twitter) mostram militares em área urbana sendo hostilizados por civis e se movimentando com veículos militares. Os vídeos são acompanhados por legendas que afirmam que os militares seriam soldados venezuelanos que “invadiram o Brasil com a conivência do Lula”. As postagens afirmam ainda que os militares estariam aqui para prender ou perseguir refugiados venezuelanos.

Onde foi publicado: X (antigo Twitter).

Conclusão do Comprova: Publicações enganam ao afirmar que soldados venezuelanos estariam invadindo o Brasil. Na verdade, os vídeos analisados mostram o Corpo de Fuzileiros Navais durante um treinamento padrão, realizado pela Marinha do Brasil.

Os posts circulam com dois vídeos distintos. No primeiro, filmado de dentro de uma casa, militares parecem estar em conflito com um civil que repete as frases “vocês estão no meu país” e “atira em mim”.

No segundo vídeo, diversos militares disparam e se movimentam em uma encruzilhada. Aqui é possível ver dois veículos blindados de combate, e em um deles há a inscrição da palavra “Marinha” na lateral. Nesse segundo vídeo, também é possível perceber que os militares falam entre si em português.

O Comprova entrou em contato com a Marinha, que informou que as imagens dos dois vídeos são de fuzileiros em treinamento. O objetivo do treino é fazer com que a situação simulada seja a mais próxima da realidade de um cenário de confronto real. Em razão disso, vê-se um civil confrontando os soldados, não existindo qualquer relação com cidadãos brasileiros em confronto com o Exército, muito menos com refugiados da Venezuela.

O treinamento foi realizado em Itaoca (ES) em outubro de 2023. A Marinha esclareceu, também, que esse é “um exercício corriqueiro, que acontece todos os anos. O cenário é o mais real possível, mas o vídeo se desenvolve em uma situação simulada”, informou.

Enganoso para o Comprova é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. As três principais publicações dos vídeos na plataforma X somam mais de 998 mil visualizações, 695 comentários, 6 mil compartilhamentos e 10 mil curtidas.

Como verificamos: Para coletar informações acerca do acontecido, a equipe realizou pesquisas no Google, utilizando termos como “exército venezuelano invade o Brasil”. Os primeiros resultados dessas buscas mostraram verificações de outras agências de checagem (Boatos.org e Estadão Verifica) sobre o mesmo assunto, bem como algumas notícias (1 e 2).

Tais verificações e notícias já informaram que os soldados das imagens seriam, na verdade, oficiais da Marinha do Brasil. Logo, o Comprova também entrou em contato com a Marinha, a fim de confirmar ou negar a relação dos soldados das imagens com a entidade, a qual disse que realmente eram fuzileiros brasileiros em treinamento.

O Comprova também tentou contato com os autores das publicações.

Treinamento dos fuzileiros navais brasileiros

O treinamento em Operações de Paz foi realizado entre os dias 16 e 25 de outubro, na região de Itaoca.

A intenção de treinamentos como esse é levar a Marinha a atingir a nota máxima em todos os quesitos do Sistema de Prontidão das Capacidades de Manutenção da Paz das Nações Unidas (UNPCRS), uma espécie de banco de Forças Militares dos Estados integrantes da Organização das Nações Unidas (ONU).

Conforme divulgado, neste caso, “700 militares participaram da operação, atuando em situações simuladas, na execução de atividades como patrulhamento, escolta de comboios, controle de distúrbios, cerco e vasculhamento, estabelecimento de postos de controle de trânsito, entre outras”.

As peças de desinformação não refletem a realidade e recorrem a gravações de tais treinamentos para afirmar que seriam venezuelanos, construindo uma narrativa inventada.

Marinha do Brasil e treinamentos para Operações de Paz da ONU

De acordo com o site Poder Naval, especializado em Navios de Guerra, Marinhas de Guerra, Aviação Naval, Indústria Naval e Estratégia Marítima, em abril de 2022, a Marinha Brasileira contava com 74.868 militares na ativa, 92.808 inativos e 65.288 beneficiários de pensão.

Não é a primeira vez que um treinamento para Operações de Paz da ONU é realizado pelo órgão. Por exemplo, em 2022, também no mês de outubro, foi realizado um treinamento UNPCRS no Complexo Naval da Ilha do Governador, Rio de Janeiro.

Na ocasião, as atividades de treinamento foram conduzidas pela Força de Fuzileiros da Esquadra (FFE) em parceria com o Centro de Operações de Paz de Caráter Naval (COpPazNav), que foi criado em 2008, “a fim de suprir lacuna voltada para o preparo individual e coletivo em função das Operações de Paz (OpPaz)”.

O que diz o responsável pela publicação: O Comprova tentou contato com os autores das publicações, mas os perfis não aceitam receber mensagens pelo X.

O que podemos aprender com esta verificação: As postagens usam vídeos reais fora de seu contexto original e são compartilhadas sem informações como local e data de gravação, tornando sua identificação mais difícil. Ao se deparar com uma publicação como essa, desconfie. Pesquise sobre o tema abordado junto a fontes confiáveis, como órgãos oficiais e veículos jornalísticos.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema:

Além do site Boatos.org e do Estadão Verifica, a Lupa e a Reuters também checaram os vídeos.

Temas relativos à Venezuela são utilizados frequentemente por desinformadores. Já mostramos que post sobre ‘fuga de venezuelanos’ ao Brasil mostra vídeo de pessoas migrando para o Panamá; que é falso que Biden tenha convocado Congresso por falas de Lula em apoio à Venezuela; que vídeo sobre confronto envolvendo manifestantes e Exército venezuelano na fronteira com o Brasil é de 2019; e que postagem engana ao relacionar apagão a decreto para compra de energia na Venezuela.

Política

Investigado por: 2023-11-10

Governo Lula não criou taxa para uso de poços artesianos; gestão de recursos hídricos é papel dos estados

  • Falso
Falso
É falso que o governo Lula (PT) tenha determinado tarifa mensal para o uso de poços artesianos em propriedades privadas do Nordeste. De acordo com a legislação federal, é responsabilidade dos governos estaduais determinarem as taxas de gestão dos recursos hídricos. Uma das publicações usa como "prova" da instituição da cobrança um trecho de vídeo fora de contexto em que um cidadão reclama sobre a tarifa feita no Ceará. Porém, as taxas para o uso da água são previstas desde 1996 no estado.

Conteúdo investigado: Posts nas redes sociais afirmam que o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva está cobrando dos proprietários rurais uma taxa entre R$ 200 e R$ 300 para o uso de poços artesianos em propriedades privadas no Nordeste. Um dos conteúdos cita que os poços teriam sido instalados à época do governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Outro vídeo mostra o depoimento de um homem que diz ter feito um investimento privado para a construção do poço no Ceará, mas que agora terá que pagar uma taxa para a utilização.

Onde foi publicado: TikTok.

Conclusão do Comprova: É falso que o governo do presidente Lula (PT) tenha definido uma taxa mensal para que proprietários rurais usem poços artesianos construídos em suas terras. A legislação que institui a Política Nacional de Recursos Hídricos prevê que os estados são responsáveis por determinar as tarifas do uso de água. Não foi encontrada nenhuma decisão recente do Executivo que estabeleça novas cobranças.

Uma das publicações analisadas usa um vídeo fora de contexto feito no Ceará em que um homem afirma pagar pelo uso de poço que ele mesmo construiu em sua propriedade. No entanto, a tarifa para o uso das águas subterrâneas não é recente como sugere o post. A cobrança é prevista por lei estadual que existe desde 1996 e estabelecida por meio de decreto, segundo a Secretaria de Recursos Hídricos do Ceará.

Em nota, o Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional (MIDR) afirmou que a gestão de águas subterrâneas cabe aos estados. A Agência Nacional de Águas (ANA) também informou que a União não faz cobranças sobre o uso dos poços artesianos.

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma falsidade.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Até o dia 8 de novembro, foram mais de 935 mil visualizações, 72 mil curtidas e 7,7 mil comentários no Tik Tok.

Como verificamos: Inicialmente, o Comprova buscou informações com o Ministério do Desenvolvimento Regional e a Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico a respeito da suposta cobrança da taxa. A reportagem também solicitou um posicionamento junto ao Governo do Ceará, já que pesquisas no Google pelos termos “taxa poços artesianos + governo Lula” retornaram a uma verificação de Aos Fatos, que trata do mesmo tema e detalha que um dos vídeos teria sido gravado naquele estado.

Também entramos em contato com um deputado que publicou o conteúdo em que um homem questiona a cobrança de taxa pelo uso do poço em sua propriedade.

Vídeo mostra crítica ao governo do Ceará

Um dos vídeos verificados mostra o que seria uma demonstração da cobrança da suposta taxa. Nele, o produtor rural Clodoaldo Galvão dá um depoimento a respeito da situação vivenciada em sua propriedade, durante audiência da Comissão de Agropecuária da Assembleia Legislativa do Estado do Ceará. Ele alega ter feito um investimento de aproximadamente R$ 8 mil para a construção de um poço e que agora terá que pagar até R$ 300 mensais de taxa para o uso. Na gravação, o produtor faz diversas críticas ao governo, sem citar nomes.

O Comprova localizou um perfil no Instagram que seria do agricultor que fala no vídeo, mas ele não retornou ao nosso contato.

O conteúdo original foi publicado pelo deputado estadual Felipe Mota (União Brasil – CE) em seu perfil no Instagram, após uma visita ao Perímetro Irrigado de Morada Nova, que está localizado nos municípios de Morada Nova e Limoeiro do Norte, no Ceará. Na legenda da publicação, de 30 de outubro, o parlamentar deixa claro que a insatisfação do morador é relativa a gestão estadual, sob o comando do governador Elmano de Freitas (PT): “Embora o governo do Ceará alegue ser o governo do povo, lamentavelmente, constatamos a ausência de medidas efetivas para promover o desenvolvimento dessa região”.

Por nota, o parlamentar informou o nome do produtor rural que reclamou sobre a cobrança mensal do poço em sua propriedade e evidenciou que a audiência pública debateu a falta de água nas áreas de agricultura irrigada do estado. Mota não comentou sobre o uso da gravação em postagens fora de contexto.

Responsabilidade dos estados

O Comprova questionou o Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional e a Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico em relação à cobrança de tarifa pelo governo federal. Ambos os órgãos afirmaram que a gestão de águas subterrâneas é de responsabilidade dos estados, portanto, não existe recolhimento de pagamentos pela União.

Leis em vigor sobre o uso de poços artesianos

No Ceará, de acordo com a Secretaria de Recursos Hídricos do estado, a cobrança de taxas pelo uso de poços artesianos está prevista desde 1996, “e está dentro do que determina a Política Estadual de Recursos Hídricos”. Em fevereiro de 2021, o governo estadual publicou uma nota de esclarecimento sobre o tema. Na época, a gestão informou que não havia nova cobrança para a utilização de recursos hídricos superficiais e subterrâneos, mas sim a “atualização da inflação do período”. Dois anos depois, em 2023, circula novamente a desinformação a respeito da implementação de uma nova taxa.

Em nota ao Comprova, o governo cearense explicou que a cobrança pelo uso dos recursos hídricos está assegurada no artigo 16 da Lei 14.844, publicada no Diário Oficial do Estado do Ceará, em 30 de dezembro de 2010. A secretaria esclareceu ainda que a tarifa será atualizada “após emissão de resolução pelo Conselho dos Recursos Hídricos do Ceará (Conerh) e referendada por Decreto Estadual”.

Os valores atuais cobrados foram atualizados conforme o decreto estadual 35.501, publicado em 15 de junho de 2023. “Os recursos decorrentes da cobrança pelo uso de recursos hídricos serão empregados para viabilizar atividades de gestão dos recursos hídricos, para realização de obras de infraestrutura operacional do sistema de oferta hídrica, bem como para incentivo à racionalização do uso da água”, afirma o artigo 1º do referido decreto do estado do Ceará.

Existe ainda disponível de forma online um comunicado da Companhia de Gestão dos Recursos Hídricos (COGERH), datado de 15 de junho de 2023, que informa sobre o reajuste da tarifa pelo uso dos recursos hídricos de domínio do estado do Ceará ou da União. No documento, há uma tabela que especifica as novas tarifas e suas devidas definições.

Além da legislação estadual, a Lei da Política Nacional de Recursos Hídricos, de 1997, e a Lei do Saneamento Básico, de 2007, já estabelecem o pagamento de tarifa pelo uso de poços particulares.

O que diz o responsável pela publicação: O Comprova entrou em contato com os responsáveis pelas publicações por meio do TikTok. Um dos usuários, @mc.chefao.ofi, não quis se manifestar. O outro perfil, @jorge.damasceno6, informou que “há uma lei sancionada por Bolsonaro que isenta a taxa dos poços artesianos” e citou o Projeto de Lei 2497/2020. No entanto, a proposta que sugere a dispensa de tarifa para uso do recurso hídrico foi rejeitada em junho de 2022 no Congresso Nacional e, portanto, não foi sancionada como lei. O usuário já foi alvo de outra checagem do Comprova em que espalhou desinformação de que artista teria viajado para Portugal com dinheiro da Lei Rouanet.

O que podemos aprender com esta verificação: Uma das táticas mais utilizadas por desinformadores é usar trechos de gravações sem o contexto para enganar e falsificar informações. Muitas vezes, e esté é o caso aqui, usam manifestações de pessoas comuns para dar autenticidade ao seu discurso. Desconfie de publicações que parecem noticiosas mas que não fornecem informações contextuais como local e data dos acontecimentos retratados. Uma denúncia noticiada sempre deve trazer os dois lados. Na ausência de um deles, faça uma busca na internet para encontrar uma informação mais completa, que traga todo o contexto.

Neste caso, um dos conteúdos inventa que o governo federal estabeleceu taxas para o uso dos poços, baseado em um trecho de depoimento feito na Câmara de município cearense e omitindo a informação. Ao se deparar com situações como essa, é importante buscar se há alguma nova decisão do governo, seja em sites oficiais ou em reportagens da imprensa.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: Um dos vídeos checados também foi alvo de investigação pelo Aos Fatos. O Comprova já checou outros assuntos envolvendo os recursos hídricos, como que o governo federal não bloqueou água no Nordeste e nem todo problema na região tem relação com transposição do São Francisco, que vídeo de hidrelétrica transbordando é antigo e não tem relação com desligamento de bombas do São Francisco e explicou sobre o Projeto de Integração do Rio São Francisco.

Política

Investigado por: 2023-11-09

Vídeo distorce voz de Lula para alimentar teoria conspiratória

  • Falso
Falso
O vídeo que compara dois trechos de discursos de Lula, sendo que em um deles a voz aparece diferente, foi editado. O trecho em questão teve o áudio e o vídeo alterados para alimentar a teoria conspiratória de que o presidente teria sido substituído por um sósia. Análise de um perito forense apontou que o trecho foi acelerado, o que provoca uma mudança no áudio. Além disso, a imagem do vídeo foi invertida.

Conteúdo investigado: Vídeo exibe dois trechos de discursos de Lula, identificados com as datas de 27 e 28 de outubro. A voz do presidente do primeiro trecho é diferente da voz no segundo. Um homem aparece no vídeo falando que “a coisa está ficando séria”. “Eu vou deixar dois vídeos aqui e eu duvido que vocês me falem qual é a diferença de um vídeo para o outro”, afirma antes de apresentar os dois trechos de discurso. Na postagem ainda há as hashtags #bolsonaro, #foralula, #globolixoo, #bolsonaropresidente.

Onde foi publicado: TikTok.

Conclusão do Comprova: A voz do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) não mudou do dia 27 para o dia 28 de outubro, como sugere vídeo publicado no TikTok. Trecho de um discurso do presidente teve o áudio e a imagem alterados para alimentar a teoria conspiratória de que Lula teria um sósia que governa em seu lugar, como mostram comentários no post.

O vídeo desinformativo exibe trechos de dois discursos de Lula, que teriam sido proferidos em dias subsequentes. O Comprova encontrou os vídeos originais dos discursos. O professor de Engenharia da Informação da Universidade Federal do ABC (UFABC) Mário Gazziro, que é perito forense, concluiu que um deles foi adulterado para mudar a voz de Lula.

O primeiro trecho foi retirado de um discurso durante um café da manhã com jornalistas no Palácio do Planalto. O encontro ocorreu em 27 de outubro, e não no dia 28, como afirma o vídeo checado. A voz de Lula foi preservada no vídeo desinformativo.

Já o segundo trecho, que mostra o presidente com uma voz “diferente”, foi retirado de um pronunciamento na 1ª Reunião Plenária do Conselho da Federação, em 25 de outubro, também em data diferente daquela indicada no vídeo desinformativo.

Segundo o perito, ele passou por duas alterações no áudio:

  • O trecho foi acelerado e a duração total foi reduzida em dois segundos, passando de 31 para 29 segundos, o que já promove mudança no áudio.
  • A edição alterou a amplitude da voz, ou seja, aumentou o volume do som. Dessa forma, alguns dos sons mais altos no áudio foram retirados. Isso fez com que a frequência da voz de Lula mudasse, tornando-se mais aguda. Veja a comparação:

| Acima, a trilha retirada do vídeo original. Na parte de baixo, as ondas sonoras do vídeo editado — mais curto e com o aumento na amplitude. (Material cedido ao Comprova)

As imagens do vídeo original também foram alteradas e aparecem espelhadas no conteúdo desinformativo.

Desde a eleição de Lula, em 2022, circula a teoria conspiratória de que ele teria morrido e sido substituído por um sósia, ou que ele teria um sósia que estaria, de fato, governando o país. Pelos comentários no vídeo do TikTok (recorte 1 e recorte 2) é possível perceber que o vídeo analisado alimenta essa teoria.

Em janeiro deste ano, o ministro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) Benedito Gonçalves aplicou multa de R$ 10 mil em um candidato que acusou a Justiça Eleitoral de diplomar um sósia de Lula. Segundo o homem, o chefe do Executivo teria morrido após o resultado do pleito e teria sido substituído na cerimônia da Corte.

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma falsidade.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. O vídeo investigado teve 1,2 milhão de visualizações, 44,7 mil curtidas e 15,3 mil compartilhamentos até o dia 8 de novembro de 2023.

Como verificamos: Buscando no Google o trecho de cada discurso usado no vídeo desinformativo foi possível chegar à fonte original das imagens, no canal do presidente no YouTube e em matérias na imprensa. Em seguida, contatamos o perito forense para que fizesse a análise das imagens e do áudio.

Áudio sofreu mudanças

Segundo o professor de Engenharia da Informação da Universidade Federal do ABC (UFABC) Mário Gazziro, o segundo trecho do discurso foi acelerado. A mesma fala tem 31 segundos no vídeo original, publicado no YouTube do presidente, e no TikTok, 29 segundos.

Acelerar o áudio já promove uma mudança na voz do presidente. Além disso, de acordo com o perito, foi feita uma alteração no volume, o que resultou na retirada dos picos de áudio, uma espécie de corte nas frequências mais altas da voz. Frequência é o termo usado para medir os ciclos de uma onda sonora. Quanto maior for a frequência, mais agudo será o som, enquanto frequências mais baixas representam sons mais graves.

Essa mudança no volume está em todo o vídeo desinformativo, não só no segundo trecho de discurso. Não é possível saber se ela foi feita deliberadamente em um editor de vídeo/áudio, ou se é uma característica incluída a partir da publicação no TikTok. Confira a diferença, explicada por Gazziro:

Imagem invertida

Além da mudança no áudio, o trecho editado passou por uma alteração na imagem: ela foi espelhada. É possível perceber que, no primeiro trecho exibido, a mão direita do presidente tem cinco dedos. Já no segundo, a mesma mão aparece com quatro. Em 1964, Lula sofreu um acidente de trabalho que resultou na perda do dedo mínimo da mão esquerda.

Ao comparar o trecho utilizado no vídeo que viralizou e a gravação original, disponível no canal do petista no YouTube, é possível notar a inversão da imagem. Além da mão, a posição das bandeiras ao fundo aparecem invertidas.

| Trecho utilizado na peça de desinformação mostra mão direita com quatro dedos (Reprodução/TikTok)

| Vídeo original, com dedo amputado na mão esquerda (Reprodução/YouTube)

O que diz o responsável pela publicação: O Comprova entrou em contato com o autor do vídeo por mensagem no TikTok. Ele alegou que não fez as edições no material e apenas encontrou o vídeo na internet e repostou. Sobre as diferenças que sugere na gravação, o responsável pelo perfil respondeu que “em um vídeo ele está nervoso e no outro ele está mais calmo”.

O que podemos aprender com esta verificação: É comum que agentes de desinformação usem técnicas de edição de vídeo na tentativa de tornar o material mais crível. Neste caso, foram aplicados recursos para aumentar a velocidade e volume do vídeo, o que torna o som da gravação mais agudo e provoca uma distorção na voz. Ao se deparar com esse tipo de conteúdo, observe se há alteração na velocidade em que as pessoas se movem. Além disso, busque em outras fontes o vídeo publicado originalmente e compare.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: A teoria conspiratória de que Lula foi substituído por um sósia já foi checada diversas vezes. O Estadão Verifica mostrou que o presidente não tem “sósia com 10 dedos” e que ele está vivo e não foi substituído. O Comprova já investigou outros materiais adulterados para promover desinformação contra Lula. A iniciativa mostrou que o petista não estava bêbado nem agarrou apoiadora como alegam publicações que usam vídeo manipulado.

Eleições

Investigado por: 2023-11-09

Terminal do mesário não mostra votos de eleitores; TSE esclareceu o boato

  • Falso
Falso
É falso o vídeo que aponta uma suposta fraude nas eleições presidenciais de 2022 e sugere que o terminal do mesário teria registrado dois votos do mesmo eleitor, sendo um para cada candidato. O vídeo é antigo e já foi desmentido por diversas agências de checagem. O Tribunal Superior Eleitoral (TSE), na época, informou que os números que aparecem no painel são referentes à quantidade de eleitores que compareceram à seção, total do eleitorado que vota naquele local, eleitores que tiveram problemas na coleta da biometria e quantitativo de pessoas com digital cadastradas que compareceram à seção.

Conteúdo investigado: Vídeo em que uma mesária mostra uma série de números dispostos no terminal utilizado para verificar informações sobre a urna eletrônica. Ela alega que os numerais apontam que o eleitor teria votado duas vezes: uma para cada candidato. Em seguida, um homem comenta o vídeo afirmando que as urnas estariam programadas para dar a vitória a Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Sobre o vídeo, está a inscrição “fraude”.

Onde foi publicado: X (antigo Twitter) e Kwai.

Conclusão do Comprova: É falso o vídeo que aponta uma suposta fraude no segundo turno das eleições presidenciais de 2022 e sugere que o terminal do mesário teria registrado dois votos do mesmo eleitor, sendo um para cada candidato. O vídeo é antigo e já foi desmentido por diversas agências de checagem (Fato ou Fake, Estadão Verifica, Uol Confere, Aos Fatos e Lupa) e pelo próprio TSE.

Segundo a Corte, os números que aparecem no painel são referentes à quantidade de eleitores que compareceram à seção, total de pessoas que votam naquele local, eleitores que tiveram problemas na coleta da biometria e quantitativo de pessoas com digital cadastradas que compareceram à seção.

O terminal do mesário é o aparelho usado para o reconhecimento da digital dos eleitores na hora da votação. A partir dele também é possível acompanhar informações gerais sobre a urna eletrônica, como o nível de bateria e o tempo que o eleitor leva para votar. Não é possível obter qualquer dado sobre o voto do cidadão, que é sigiloso.

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma falsidade.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. No X, o vídeo investigado teve 106,3 mil visualizações, 1,1 mil compartilhamentos e 1,8 mil curtidas até 9 de novembro de 2023. Já no Kwai, o conteúdo atingiu cerca de 600 visualizações na mesma data.

Como verificamos: O vídeo contém uma marca d’água com o nome de uma conta do Kwai e uma inscrição com o nome de usuário de um outro perfil. O primeiro passo foi buscar por essas contas. Identificamos que o perfil do Kwai publicou o vídeo da mesária em 31 de outubro de 2022. A segunda conta pertence ao homem que aparece falando no conteúdo investigado. No entanto, não encontramos a publicação em nenhuma de suas redes sociais. O Comprova pediu um posicionamento do autor do vídeo e dos responsáveis pelas publicações no X e no Kwai.

O perfil oficial do TSE no X respondeu à postagem investigada com um texto publicado na época em que a desinformação começou a circular. Também procuramos informações sobre o funcionamento do terminal do mesário e da urna eletrônica e buscamos outras checagens sobre o tema.

Eleitor não votou duas vezes

De acordo com o TSE, a gravação foi feita em uma seção eleitoral em Rio Branco, no Acre. O painel mostrado no vídeo exibe duas linhas com duas sequências de números cada. A primeira linha aponta, respectivamente, a quantidade de eleitores com e sem biometria que compareceram à seção e o total de pessoas que votam naquele local.

A segunda linha do painel diz respeito ao quantitativo de eleitores com biometria cadastrada que tiveram problemas no reconhecimento da digital. O último número da sequência é referente às pessoas com biometria cadastrada que compareceram ao local de votação até o momento.

“Os dados da coluna inferior mudam concomitantemente porque há possibilidade de o eleitor ter a biometria cadastrada, mas que não foi reconhecida pelo leitor biométrico do terminal do mesário na hora da votação”, explica o TSE.

Conforme explicado neste vídeo, o terminal permite que o mesário acompanhe diversas informações sobre o status da urna eletrônica. Por exemplo, o tempo usado durante a votação, o nível de bateria, a conexão com a energia, entre outras. No entanto, o mesário não tem acesso a qualquer dado sobre o voto do eleitor, que é sigiloso. Dessa forma, não é possível saber em qual candidato o cidadão votou.

O desempenho de cada candidatura em uma seção só é disponibilizado após o encerramento da votação, por meio do Boletim de Urna (BU), que traz um relatório completo sobre o número de votos por candidato, partido, nulos e brancos.

Conforme já verificado pelo Comprova, o sistema de votação brasileiro pode ser auditado e nunca foi identificada ou comprovada qualquer fraude. Atualmente, o processo eleitoral passa por diversas etapas de auditoria e fiscalização antes, durante e depois das eleições.

Entre as iniciativas promovidas pela Justiça Eleitoral para aumentar a transparência e segurança sobre o processo estão a abertura do código-fonte, que é disponibilizado para entidades interessadas, e o Teste Público de Segurança, feito para identificar possíveis vulnerabilidades nas urnas e corrigi-las antes das eleições.

Neste site, o TSE lista todas as oportunidades de auditoria e fiscalização do sistema. Participam do processo de auditoria partidos políticos, federações e coligações, Polícia Federal, Ministério Público, Congresso Nacional, Supremo Tribunal Federal e diversas outras entidades.

O que diz o responsável pela publicação: O Comprova entrou em contato com o perfil responsável pela postagem no X (antigo twitter), mas ele não aceita mensagens. Também houve contato por meio do perfil do responsável pela gravação e pela conta do Kwai que publicou o vídeo, mas não obteve resposta até a publicação desta verificação.

O que podemos aprender com esta verificação: É comum em peças de desinformação o uso de linguagem em tom alarmante como se estivesse diante de uma denúncia grave. Também desconfie de vídeos compartilhados sem a indicação de autoria ou local da gravação. O fato de um dos materiais ter sido feito por uma mesária é uma tentativa de imprimir veracidade ao conteúdo. Ao se deparar com publicações desse tipo, sobretudo quando se trata de eleições, procure os canais do TSE, órgãos oficiais e veículos de imprensa de sua confiança.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: O mesmo vídeo foi checado pelo Fato ou Fake, Estadão Verifica, Uol Confere, Aos Fatos, Lupa e pelo próprio TSE. A segurança das urnas eletrônicas é tema frequente de verificações do Comprova. A iniciativa já mostrou que a abertura do código-fonte das urnas é padrão e não tem relação com escolha de conselhos tutelares; que não há dispositivo nas urnas eletrônicas capaz de alterar votação e que fala de Ciro Gomes sobre fraude na eleição era crítica a Lula e Bolsonaro, e não denúncia contra sistema eleitoral.

Política

Investigado por: 2023-11-09

Vídeo resgata notícia antiga e engana sobre interrupção da Operação Carro-Pipa no governo Lula

  • Enganoso
Enganoso
É enganoso vídeo publicado no Kwai com trecho de telejornal do SBT noticiando corte de recursos da Operação Carro-Pipa, do governo federal. Diferentemente do que alega a postagem, o vídeo não tem relação com o governo Lula (PT). As imagens são de novembro de 2022 e parte delas foi usada de forma descontextualizada atribuindo à atual gestão um problema registrado no final do governo de Jair Bolsonaro (PL).

Conteúdo investigado: Vídeo apresenta chamada de reportagem sobre corte de recursos da Operação Carro-Pipa, do governo federal. O post atribui a medida ao governo Lula ao sobrepor a frase “Faz o L” sobre o vídeo. Esse foi o mote de campanha do presidente Lula, mas é usado de forma irônica por críticos de seu governo.

Onde foi publicado: Kwai.

Conclusão do Comprova: Vídeo engana ao mostrar um trecho do telejornal SBT Brasil sobre corte de verba da Operação Carro-Pipa (OCP), do governo federal. O conteúdo insere a frase “Faz o L” na tela, indicando ser do governo Lula (PT) a responsabilidade pelo problema no Nordeste. Na verdade, o vídeo original trata de uma situação que aconteceu ainda no governo do então presidente Jair Bolsonaro (PL), em novembro de 2022. A reportagem foi exibida no dia 28 de novembro do ano passado, antes da posse de Lula.

Na época, o corte no serviço afetou 2 milhões de pessoas em mais de 600 cidades nordestinas. O Exército confirmou que as operações dos carros-pipas tinham sido suspensas desde o dia 16 de novembro, por falta de verbas. O restabelecimento da operação assistencial, no momento em que a reportagem foi veiculada, estava condicionado a uma suplementação no orçamento do Ministério do Desenvolvimento Regional, atual Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional (MDR).

Procurado pelo Comprova, o MDR informou que, em 2023, a Operação Carro-Pipa funciona normalmente, conforme as demandas apresentadas pelos municípios, por meio do S2ID (Sistema Integrado de Informações sobre Desastres). Sobre a situação no final de 2022, a pasta não respondeu sobre o que ocorreu com os carros-pipa nem quando aconteceu o retorno dos serviços.

Sobre o modelo do serviço, o ministério informou que não existe proposta de mudança. Porém, o governo vem estudando, ao longo dos anos, modelos nos quais cada gestão local teria capacidade de gerir e executar a operação já que se trata de um programa emergencial, visando proporcionar um atendimento perene de água potável para a população rural do semiárido brasileiro.

Enganoso para o Comprova é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Até o dia 8 de novembro, o vídeo verificado teve 61,4 mil visualizações, 3,6 mil curtidas e 1,6 mil comentários.

Como verificamos: O primeiro passo foi pesquisar no Google a frase da apresentadora no vídeo: “Quase 2 milhões de moradores correm o risco de desabastecimento de água”.

A busca retornou a reportagem original – publicada em 28 de novembro de 2022, disponível no Facebook do SBT News e também no YouTube do SBT, bem como checagens do mesmo vídeo já feitas pelo UOL Confere, Estadão Verifica e pela Reuters.

O Comprova procurou o MDR para saber sobre o atual funcionamento do programa. Também consultou informações disponibilizadas publicamente pela Secretaria Nacional de Defesa Civil sobre a situação das cidades atendidas, quantitativos e total de carros-pipas.

Operação Carro-Pipa

A Operação Carro-Pipa existe desde 1998, período do primeiro mandato do presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB). A ação ocorre por meio de cooperação mútua, técnica e financeira entre o Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional e o Ministério da Defesa. A iniciativa leva água potável, por meio de carros-pipa, a comunidades do semiárido brasileiro, afetadas por seca ou estiagem.

Uma das atribuições do Ministério da Defesa, por intermédio do Comando do Exército, é a contratação de pipeiros e outros serviços terceirizados de mão de obra, para atender estados do semiárido brasileiro.

O portal da Operação Carro-Pipa, da Secretaria Nacional de Defesa Civil, divulga a lista de cidades atendidas pelo Exército e informações sobre a situação da Operação (se em execução, se suspenso temporariamente, se em implantação) em cada localidade, além da quantidade de pipeiros e a população beneficiada. Os números podem variar a cada mês a depender da demanda.

No site, os dados sobre atendimento de localidades estão atualizados até setembro deste ano. Veja abaixo os atendimentos daquele mês:

 

Estado

Quantidade de cidades atendidas

Quantidade de cidades em execução

Carros-pipas

População atendida

Alagoas

29

29

170

124.297

Bahia

61

57

878

455.965

Ceará

22

20

228

110.080

Minas Gerais

0

0

0

0

Paraíba

149

149

705

292.479

Pernambuco

77

71

781

400.520

Piauí

8

7

98

30.122

Rio Grande do Norte

52

49

201

69.673

Sergipe

8

8

42

28.788

Fonte: Portal Operação Carro-Pipa

O MDR forneceu informações mais recentes ao Comprova. Em outubro, 392 municípios receberam atendimento, beneficiando 1.505.151 pessoas. Foram 3.134 carros-pipa envolvidos e 74.123 entregas de água. Levando em consideração as orientações do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) para cálculo de unidade familiar (quatro pessoas), estima-se que a OCP atenda a 376.288 famílias.

SBT Brasil

O vídeo investigado utilizou trecho do telejornal SBT Brasil apresentado pela jornalista Márcia Dantas. Na chamada da reportagem, a apresentadora fala: “Quase 2 milhões de moradores correm o risco de sofrer desabastecimento de água no Nordeste. A Operação Carro-Pipa, que leva água potável às famílias de mais de 600 cidades, teve os recursos cortados”.

O material produzido pelo SBT Brasil tem 2min16 de duração, incluindo a chamada e a reportagem. No vídeo enganoso foram utilizados 13 segundos do vídeo. A reportagem completa está disponível no canal do SBT no YouTube e no portal de notícias da emissora.

O que diz o responsável pela publicação: O Comprova não conseguiu contato com o perfil que publicou o post viral.

O que podemos aprender com esta verificação: Publicações enganosas, muitas vezes, utilizam conteúdos reais ou parte deles de forma descontextualizada para gerar supostas “denúncias de irregularidades”. No caso do vídeo em questão, a retirada de contexto leva ao entendimento enganoso sobre a data do fato narrado e quais os verdadeiros responsáveis. Desconfie de publicações que não forneçam informações contextuais como data, local, personagens envolvidos e as razões que possam ter ocasionado a situação exposta. Ao se deparar com conteúdos similares, é importante pesquisar as informações mencionadas em fontes seguras.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: Os temas da insegurança hídrica no Nordeste e o acesso à água envolvendo, por exemplo, a transposição do Rio São Francisco são alvos recorrentes de desinformação no ambiente digital. O Comprova desmentiu a morte de peixes na barragem de Oiticica por causa do fechamento de comportas da transposição. Também mostrou que Bolsonaro não concluiu 84% das obras da transposição, como alega o vídeo. A atividade dos carros-pipa também já foi checada pelo Comprova, no caso da falsa alegação de que a família de Ciro Gomes tinha 77 empresas de carros do tipo no Ceará e que esse tenha sido o motivo do atraso das obras da transposição.

Política

Investigado por: 2023-11-08

Não existe nova lei que obrigue motorista a pagar pensão por invalidez em casos de acidentes de trânsito

  • Enganoso
Enganoso
Vídeo engana ao afirmar que foram feitas mudanças na lei que dispõe sobre o pagamento de pensões por invalidez ou morte em casos de acidente de trânsito. Segundo a publicação, o repasse dos valores passaria a ser de responsabilidade do motorista causador do acidente. Consultados pelo Comprova, advogados explicam que os pagamentos seguem sendo feitos pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e destacam que não ocorreram alterações recentes na lei. O INSS, conforme já previsto em legislação, pode, porém, processar o motorista, quando comprovada a culpa, em uma ação para ressarcimento dos valores pagos às vítimas.

Conteúdo investigado: Vídeo mostra um suposto integrante da Polícia Rodoviária Federal (PRF) falando para algumas pessoas, que estão sentadas ao seu redor. Um homem faz uma narração por cima das imagens e afirma que uma mudança na lei passa a responsabilizar o motorista, em caso de acidente de trânsito, pelo pagamento de pensão à vítima. Segundo o narrador, antes, o governo era responsável por essa indenização. O discurso do suposto agente da PRF vai ao encontro do que diz o narrador.

Onde foi publicado: Kwai e WhatsApp.

Conclusão do Comprova: Vídeo que circula nas redes sociais engana ao afirmar que “nova lei” obriga o motorista ou o dono do carro causador de acidentes de trânsito a pagar pensões por invalidez às vítimas.

A responsabilidade pelos pagamentos de pensões por invalidez ou por morte em casos de acidente de trânsito segue sendo do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). O que ocorre é que o órgão pode entrar com uma ação contra o motorista, caso fique comprovada sua culpa, para o ressarcimento dos cofres públicos com o pagamento dos benefícios às vítimas. Nem o motorista nem o dono do veículo fazem pagamentos de pensões previdenciárias diretamente às vítimas.

Além disso, há uma diferença entre o pagamento de benefícios previdenciários e processos por responsabilidade civil. Vítimas de acidentes podem processar os causadores dos acidentes na esfera civil, em busca de indenizações.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. No Kwai, até 8 de novembro de 2023, o vídeo teve mais de 45 mil visualizações, 2 mil likes, 164 comentários e 1.6 mil compartilhamentos. Não é possível saber o alcance da publicação no WhatsApp.

Como verificamos: O Comprova entrevistou dois advogados trabalhistas e os questionou sobre as informações apresentadas no vídeo, e então verificou a legislação a respeito deste tipo de situação. Também entrou em contato com a PRF e o INSS, além do autor do conteúdo.

Responsabilidade pelo pagamento de pensões e auxílios segue sendo do INSS

“O que ocorre no vídeo, me parece, é uma confusão entre o benefício previdenciário, que permanece sob a obrigação do INSS, e a ação que o INSS pode tomar contra o motorista que causou esse acidente, então comprovada a culpa”, explica Lucas Vieira Negrão, advogado especialista em direito previdenciário e do trabalho, do escritório Miguel Neto Advogados Associados.

Conforme previsto na Lei nº 8.213/1991, o INSS é responsável pelo pagamento de seus assegurados, inclusive em caso de acidente de trânsito, em casos de invalidez ou morte. Quando um contribuinte do INSS é vítima de um acidente de trânsito que o deixe inválido, o instituto previdenciário arca com o auxílio-acidente ou a aposentadoria por invalidez. Em casos de morte do assegurado, o INSS passa a pagar a pensão por morte à família.

“Essa mesma sistemática permanece, não houve nenhuma alteração legal”, assegura Negrão. “O que há é que o motorista culpado pode sofrer um processo de ação regressiva pelo INSS, para ressarcir aos cofres públicos as despesas do instituto com o pagamento desses benefícios. Isso já é algo que está previsto em lei, não é algo novo.”

Ainda assim, segundo o advogado, na maioria dos casos, não ocorrem processos por ações regressivas. “Apesar do INSS ter essa possibilidade, não é algo que ele está tomando muito comumente, até pelo alto volume de acidentes. É algo que está começando a engrenar agora”, diz Negrão.

Responsabilidade civil em casos de acidentes

Além da possibilidade de ações de ressarcimento movidas pelo INSS, existe a responsabilidade civil da pessoa que causa um acidente. O Código Civil (CC), de 2002, no artigo 927, prevê que “aquele que, por ato ilícito, causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo”. “Existe a possibilidade da vítima ou dos familiares da vítima pedirem na esfera civil uma pensão vitalícia em razão do acidente verificado, se for comprovada culpa ou dolo”, esclarece Lucas Sampaio Santos, do escritório Abe Advogados. O pagamento de uma indenização na esfera civil não impede que a vítima tenha direito aos benefícios previdenciários.

A indenização civil está prevista no artigo 950 do CC. O referido trecho afirma que, “se da ofensa resultar defeito pelo qual o ofendido não possa exercer o seu ofício ou profissão, ou se lhe diminua a capacidade de trabalho, a indenização, além das despesas do tratamento e lucros cessantes até ao fim da convalescença, incluirá pensão correspondente à importância do trabalho para que se inabilitou, ou da depreciação que ele sofreu”.

“Esse direito sempre existiu. Se um caminhoneiro atropela meu filho e deixa ele paraplégico, eu tenho todo o direito de pedir que ele pague essa indenização na esfera civil. Não há nada que tenha mudado. Esse temor deveria ser anterior a qualquer tipo de situação, a responsabilidade civil sempre existiu”, afirma Santos.

O que diz a PRF

Por e-mail, a PRF afirmou que realizou consulta junto às assessorias regionais de comunicação do órgão, mas não conseguiu identificar o local, a data e o contexto em que foi gravado o vídeo. A entidade disse ainda que não tem registro de ações em que os agentes da PRF orientem condutores sobre a possibilidade de pagamento de aposentadorias em casos de acidente de trânsito. O órgão não confirmou se a pessoa no vídeo se trata de fato de um agente da Polícia Rodoviária Federal.

O que diz o INSS

Em resposta ao Comprova, o INSS disse que “o governo federal continua sendo o responsável por pagar todos os benefícios da Previdência Social, por meio do INSS”. E reforçou que o órgão pode pedir ressarcimento ao motorista causador do acidente que provocou a morte ou a invalidez de outra pessoa.

O que diz o responsável pela publicação: O Comprova buscou contato com a pessoa responsável pela publicação através de mensagem direta via Facebook, mas não obteve resposta até a publicação desta verificação.

O que podemos aprender com esta verificação: O vídeo dá a entender que houve a criação de uma nova lei, que poderia prejudicar motoristas, mas não houve mudanças recentes na lei. Misturar fatos verídicos e informações inventadas é uma prática comum de perfis que costumam disseminar desinformação. Nessas publicações, também é comum que sejam citados altos valores, associados a supostas políticas do governo que prejudicam a população. Ao se deparar com conteúdos deste tipo, consulte os órgãos oficiais e veículos de imprensa de sua confiança.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: O Estadão Verifica também realizou checagem sobre o mesmo vídeo investigado aqui. O Comprova já verificou outros conteúdos relativos a pagamentos de pensões e auxílios pelo INSS. Já mostramos que o auxílio-reclusão é garantido por lei desde 1960 e seu valor é equiparado ao salário mínimo e que é enganoso que Paulo Guedes anunciou redução em aposentadorias e outros benefícios do INSS.