O Projeto Comprova é uma iniciativa colaborativa e sem fins lucrativos liderada pela Abraji e que reúne jornalistas de 42 veículos de comunicação brasileiros para descobrir, investigar e desmascarar conteúdos suspeitos sobre políticas públicas, eleições, saúde e mudanças climáticas que foram compartilhados nas redes sociais ou por aplicativos de mensagens.
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Saúde

Investigado por: 2021-10-26

Comparar número de mortes por covid em 2020 e 2021 não indica ineficácia da vacinação

  • Enganoso
Enganoso
Publicação feita no Twitter engana ao relacionar o número de vacinados e o avanço de mortes por covid-19 entre 2020 e 2021. O post compara cenários diferentes da pandemia, da evolução de casos e da cobertura vacinal no Brasil. Ele descontextualiza matérias jornalísticas utilizadas como base dos argumentos apresentados no Twitter. Entidades de saúde brasileiras e internacionais reforçam que a vacina tem sido eficaz no combate e na redução de casos graves e mortes pela doença.
  • Conteúdo verificado: Publicação feita pelo economista e comentarista da Jovem Pan Rodrigo Constantino, no Twitter, distorce dados oficiais sobre a covid-19 apresentados pelo G1 para contestar a eficácia das vacinas.

É enganosa a publicação compartilhada no Twitter pelo economista e comentarista da Jovem Pan Rodrigo Constantino contestando a eficácia das vacinas contra a covid-19, porque descontextualiza matérias jornalísticas utilizadas como base dos argumentos apresentados.

No tuíte verificado, Constantino utiliza dados divulgados pelo portal G1 em 1º de janeiro e em 15 de outubro de 2021. Na primeira data, o Brasil registrava 195 mil mortes pela doença, enquanto, na segunda, havia ultrapassado 600 mil mortes.

Diante disso, o comentarista escreveu: “Em 2020, sem vacinas, o Brasil não chegou a 200 mil mortes com covid; em 2021, com mais de 100 milhões de pessoas vacinadas com 2 doses, até agora mais de 400 mil pessoas morreram, ou seja, o dobro”.

A construção narrativa feita por Constantino descredibiliza os imunizantes contra a covid-19 por uma comparação sem fundamento, visto que os números de mortes e casos da doença têm caído desde o início da vacinação. Além disso, a publicação não considera o ritmo da imunização do país, distorcendo a realidade.

Diante disso, o Comprova considerou o conteúdo enganoso porque se baseia em dados imprecisos e confunde os internautas sobre os efeitos gerados pela vacina contra o coronavírus, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Como verificamos?

O Comprova buscou informações sobre o caso em matérias jornalísticas e no site oficial da OMS (Organização Mundial da Saúde), da Universidade Johns Hopkins e do Ministério da Saúde brasileiro.

Entrevistamos, por WhatsApp, o autor da publicação, Rodrigo Constantino. Procuramos Sabine Righetti, pesquisadora de Política Científica associada à Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e fundadora da Agência Bori, com trabalho voltado para a covid-19.

Também conversamos por WhatsApp com Leonardo Weissmann, infectologista do instituto Emílio Ribas e consultor da Sociedade Brasileira de Infectologia, além do infectologista da Sociedade Mineira de Infectologia, Carlos Starling.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 26 de outubro de 2021.

Verificação

A relação estabelecida pelo comentarista da Jovem Pan Rodrigo Constantino entre o número de vacinados e o avanço de mortes por covid-19 entre 2020 e 2021 não tem fundamento, porque compara cenários diferentes da pandemia, da evolução de casos e da cobertura vacinal no Brasil. Ele descontextualiza matérias jornalísticas utilizadas como base dos argumentos apresentados no Twitter.

Não é cabível utilizar como parâmetro as métricas citadas por Constantino devido a uma série de fatores. O colunista errou ao afirmar que o ano de 2020 tinha menos mortes devido à ausência de vacinas.

Em entrevista ao Comprova, o infectologista Leonardo Weissmann, analisou a publicação de Constantino.

Segundo Weissmann, a informação citada na postagem está “fora de contexto” e é “sem sentido”. Ele explicou o motivo em 6 pontos:

  • A primeira pessoa foi vacinada no Brasil no dia 17 de janeiro e é de conhecimento geral que a vacinação no país demorou a engrenar, por falta de organização e de vacinas.
  • Em 10 de abril de 2021, o país registrou 2.616 óbitos em um único dia, segundo dados oficiais do Ministério da Saúde. O número de óbitos acumulados já passava de 351 mil. Nessa mesma data, de acordo com o site Our World in Data, ligado à Universidade de Oxford, na Inglaterra, 9,7% da população brasileira havia tomado a primeira dose da vacina e apenas 2,8% tinha imunização completa.
  • Com o aumento de vacinados no país, a curva de hospitalização e óbitos assumiu uma tendência de queda, demonstrando que o imunizante está cumprindo com o seu papel de proteção contra formas graves da covid-19. Os números demonstram isso claramente.
  • Estudo realizado pelo Instituto de Infectologia Emílio Ribas, em São Paulo, e divulgado recentemente, com 1.174 pacientes internados de janeiro a setembro de 2021, demonstrou que aproximadamente 88% não tinham imunização completa, ou seja, quase 9 em cada 10 pacientes. Desses, 274 morreram, sendo que 237 não estavam vacinados e apenas 16 pessoas tinham recebido duas doses, isto é, quase 15 vezes mais óbitos entre os não vacinados.
  • Outro estudo, realizado por pesquisadores da Fiocruz, com dados oficiais de 1º a 26 de setembro, demonstrou que, dos indivíduos entre 0 e 59 anos que morreram nesse período, 85% tinham vacinação incompleta.

Também contatado pelo Comprova, o ex-presidente da Sociedade Mineira de Infectologia Carlos Starling, que é um dos integrantes do Comitê de Enfrentamento à Covid-19 de Belo Horizonte, criticou a colocação do tuíte e a chamou de ingênua “do ponto de vista epidemiológico”, além de “contaminada por ideologia política”.

“Vacinas não são mágicas. O fato de termos as doses não significa que tenham sido aplicadas”, respondeu o infectologista à reportagem. Na avaliação dele, a capacidade vacinal do SUS poderia ter salvado muito mais vidas no começo do ano, caso os imunizantes tivessem sido adquiridos antes.

Starling lembrou ainda que o país teve, no começo de 2021, a disseminação da variante Gama (P1), mais transmissível e virulenta do que a Alpha, até então predominante.

“Somente agora, no segundo semestre de 2021 podemos ver o efeito real da vacinação nos indicadores epidemiológicos. Estudos de vida real publicados pelo Reino Unido, Israel, Uruguai, Chile, etc; mostram que as vacinas – todas elas – reduziram em mais de 90% o risco de morte por covid”, completou.

Pesquisadora de Política Científica associada à Unicamp, com trabalho voltado para a covid-19, Sabine Righetti afirmou ao Comprova que a análise tem de ser feita a partir do início da vacinação no país.

“Em abril a gente chegou a 4 mil mortos por dia, com uma média móvel aí de mais de 3,5 mil. De lá pra cá, com a aceleração da vacinação, a tendência de queda de mortos tem se mantido, nunca foi revertida, mesmo com as variantes”, disse a pesquisadora, fundadora da Agência Bori.

O mês de abril de 2021 foi o mais letal da pandemia no Brasil. Foi encerrado com média móvel de mortos superior a 2,5 mil, com 82.401 óbitos. A média móvel é o cálculo por meio do qual é possível analisar com mais precisão os movimentos da curva de infectados ou mortos, se ascendente ou decrescente.

Consiste na soma do número de casos ou de mortos dos sete dias anteriores. O resultado da soma deve ser dividido por sete. Não são os óbitos ocorridos na semana os que entram na operação matemática, mas os que foram registrados no sistema no decorrer da semana.

Em 30 de abril, o esquema vacinal havia sido completado em 15.677.543 pessoas, isto é, em 7,40% da população brasileira.

Para que um resultado coletivo favorável contra o vírus seja atingido, especialistas citam uma cobertura vacinal entre 80% e 90%, como mostra esta reportagem do UOL. “Só assim a gente terá uma prevenção de casos moderados e graves, o que tornará a doença algo possível de conviver”, projetou em janeiro Melissa Palmieri, diretora da SBIm (Sociedade Brasileira de Imunizações) em São Paulo.

As vacinas funcionam

Números do Consórcio de Veículos de Imprensa e do site Our World in Data mostram que a curva de mortos pela covid-19 caiu na medida em que a vacinação avançou no Brasil. É uma relação de causa e consequência possível de ser estabelecida, como afirmou Leonardo Weissmann e ao contrário do que sugeriu Constantino.

Em 25 de outubro, a média móvel de mortes diárias por covid-19 no país estava em 338, segundo dados do Consórcio de Veículos de Imprensa. Já o Our World in Data demonstra que a taxa de vacinação contra a covid estava, em 24 de outubro (último dado disponibilizado, até a publicação desta checagem), em 53,97%. Outros 20,08% da população tomaram uma dose do imunizante.

No país, onde há maior recusa de aplicação das vacinas, o número de internados por covid-19 tem sido elevado. Em uma matéria publicada em 30 de setembro, o UOL mostrou que, no Rio de Janeiro, 94,5% dos internados em um hospital de referência eram pessoas não vacinadas.

Um total de 206 pessoas entre os 218 internados com o vírus no Hospital Municipal Ronaldo Gazolla não foram imunizados. Desse grupo, 12 hospitalizados haviam tomado ao menos uma dose da vacina. As informações foram repassadas ao portal de notícias pela Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro.

O cenário se repete nos Estados Unidos: o número de casos e mortes tem aumentado nos estados com as menores taxas de vacinação.

Como mostrou uma verificação anterior, feita pelo UOL Confere, dados da Universidade Johns Hopkins utilizados pelo monitoramento do site Our World in Data sobre o avanço da covid-19 entre março de 2020 e outubro de 2021 nos Estados Unidos comprovam que o avanço da imunização gerou queda no número de mortes pela doença entre janeiro — que foi o pico de casos no país — e julho deste ano.

O autor

O Comprova entrou em contato com Rodrigo Constantino. O economista respondeu que “publicou um dado oficial” e que “deixou perguntas sobre qual a explicação para tal fenômeno no ar”.

Em seguida, o comentarista da Jovem Pan expôs a repórter do Comprova no Twitter, por meio do compartilhamento das mensagens trocadas na apuração das informações aqui checadas, mas sem incluir a íntegra da mensagem enviada.

100 milhões de vacinados no Brasil

O Brasil alcançou a marca de 100 milhões de pessoas totalmente vacinadas em 13 de outubro deste ano, de acordo com dados levantados pelo consórcio de veículos de imprensa, do qual o UOL, a Folha de S. Paulo, o Estadão, o G1, o O Globo e o Extra fazem parte.

Naquela altura, o país passou a integrar a lista de nações mais populosas a ultrapassar a marca. Os Estados Unidos, a Índia e a China também haviam completado o esquema de vacinação em mais de 100 milhões de pessoas, segundo dados do Our World in Data e de veículos internacionais de imprensa.

O número foi alcançado 58 dias após a marca de 50 milhões de pessoas com o esquema de imunização completo, que ocorreu no dia 16 de agosto.

No dia em que o país atingiu a marca de imunizados, 201 novas mortes por covid-19 foram registradas. Ao todo, o Brasil notificou 605.884 óbitos por conta da doença desde o início da pandemia até o dia 25 de outubro de 2021.

São Paulo registrava mais de 100 mortes diárias e na data em que houve o recorde foram notificados apenas nove. No mesmo momento, os estados do Acre, Amapá, Ceará, Rondônia e Roraima não registraram nenhum óbito.

Ao todo, 18 estados apresentam queda e sete, alta. O Distrito Federal e o Ceará apresentaram estabilidade. O dado foi comparado com o mesmo índice de 14 dias anteriores.

A variação do Brasil está pelo quarto dia seguido em queda: o índice ficou em -41%. Se ficar abaixo de -15%, indica tendência de queda; acima de 15%, aceleração; entre esses dois valores, estabilidade.

Por que investigamos?

Em sua quarta fase, o Comprova verifica conteúdos suspeitos sobre pandemia, políticas públicas do governo federal e eleições. O post verificado foi compartilhado originalmente no Twitter e alcançou mais de 15,4 mil interações, entre curtidas, comentários e compartilhamentos.

Publicações enganosas como esta colocam a saúde da população em risco ao sugerir que a vacinação contra a covid-19 é dispensável. A eficácia e a segurança dos imunizantes já foram comprovadas em estudos de órgãos nacionais, como a.Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) e internacionais.

É por meio da imunização que os números de casos e óbitos da doença têm caído. Além da repercussão, a postagem torna-se nociva por partir de uma pessoa de visibilidade, capaz de formar opinião de outras pessoas sobre assuntos diversos. Dessa maneira, o tuíte acaba sendo considerado por pessoas que o têm como autoridade.

Outras verificações desmentem boatos da internet como essa, ligada à vacina, como a de um deputado do Paraná que afirma que teste de anticorpos podem substituir os imunizantes e a de um tuíte que engana ao dizer que a vacina da Pfizer tem partículas contaminantes.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Saúde

Investigado por: 2021-10-25

Antiviral em teste da Pfizer não tem ivermectina na fórmula

  • Falso
Falso
São falsas as alegações feitas em vídeo de que a Pfizer estaria desenvolvendo um remédio para covid-19 que contém, entre seus componentes, a ivermectina. A farmacêutica está, sim, produzindo um medicamento via oral contra a doença, mas, como a empresa informou ao Comprova, sua fórmula não contém o antiparasitário, comprovadamente ineficaz contra o coronavírus.
  • Conteúdo verificado: Um vídeo que circula no TikTok afirma que a Pfizer está desenvolvendo um remédio para covid-19 com ivermectina na composição.

É falso o conteúdo de um vídeo que circula no TikTok afirmando que a Pfizer está desenvolvendo um medicamento contra a covid-19 com ivermectina em sua fórmula. O PF-07321332 (nome provisório do medicamento em teste) é uma terapia antiviral projetada especificamente para ser administrada por via oral.

Como a farmacêutica informou ao Comprova, o remédio é um “inibidor de protease”, enzima presente no novo coronavírus necessária para que ele se replique, e não tem nenhuma semelhança com a ivermectina ou com “qualquer composição” dela.

Naylson Ribeiro, farmacêutico clínico formado pelo Instituto de Ciência e Tecnologia da Qualidade (ICTQ) do Piauí, explica que a ivermectina é um antiparasitário, enquanto o medicamento desenvolvido pela Pfizer é um antiretroviral. “São mecanismos de ação diferentes”, disse.

A reportagem tentou contato com o autor do vídeo, mas não obteve retorno até a conclusão desta verificação. O Comprova considerou o conteúdo falso porque foi inventado.

Como verificamos?

A reportagem buscou informações sobre o autor do vídeo em redes sociais como TikTok, Facebook e LinkedIn.

Para saber sobre o remédio em desenvolvimento, levantamos informações no site da farmacêutica Pfizer e contatamos a assessoria de imprensa da empresapor e-mail. Além disso, buscamos sua composição química nos sites DrugBank, PubChem e Chemical & Engineering News.

No site da Abbott Laboratories, fabricante da ivermectina, encontramos informações sobre o antiparasitário, inclusive sua fórmula molecular.

Também entrevistamos Naylson Ribeiro e o professor doutor em Farmacologia da Universidade Federal de Campina Grande Sávio Benvindo Ferreira.

Verificação

O medicamento em teste

Em março deste ano, a Pfizer iniciou um estudo clínico de fase 1 de um antiviral contra a covid-19 via oral em adultos saudáveis para verificar sua segurança, tolerabilidade e farmacocinética. Chamado inicialmente de PF-07321332, o medicamento atua como um inibidor que impede a replicação do vírus causador da doença nas células.

Em julho, a farmacêutica anunciou em seu site o progresso dos estudos e a evolução para testes nas fases 2 e 3 com o intuito de avaliar a eficácia e a segurança do medicamento, administrado com uma baixa dose de ritonavir (antirretroviral prescrito no tratamento do HIV) em pacientes diagnosticados com o coronavírus e com alto risco de ter o quadro piorado.

Segundo explica reportagem da Galileu, “a droga foi desenvolvida para se conectar à estrutura do Sars-CoV-2, impedindo que ela realize o seu papel: ‘cortar’ o material genético do patógeno e dar origem a novos vírus”. E, como informou a farmacêutica ao Comprova, no passado, o mecanismo dos inibidores de protease revolucionaram o tratamento de HIV e hepatite C, outras doenças virais.

O medicamento em teste e a ivermectina

Diferente do que o autor do vídeo afirma, o remédio que a Pfizer está testando não leva ivermectina em sua fórmula. No vídeo, ele diz que quando a farmacêutica “precisava vender vacina, a ivermectina não tinha comprovação científica” e que, “agora, ela pode ser usada”, o que é uma informação falsa, segundo a checagem feita pela reportagem.

A Pfizer está pesquisando medicamentos contra a covid desde o início da pandemia, como afirma em seu site. E, como afirma mensagem enviada ao Comprova, o PF-07321332 não tem relação nenhuma com o antiparasitário.

O mesmo já havia sido informado pela empresa anteriormente. Conforme a Folha noticiou em agosto, “em ofício enviado ao senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), vice-presidente da CPI da Covid, que solicitou informações sobre o medicamento à empresa”, a Pfizer afirmou que o antiviral estudado “é composto de estruturas químicas e mecanismos de ação totalmente diferentes da hidroxicloroquina, da azitromicina e da ivermectina”.

Entrevistado pela reportagem, Naylson Ribeiro, farmacêutico do ICTQ do Piauí, diz que os dois remédios são de classes farmacológicas totalmente diferentes. “A ivermectina é um antiparasitário de amplo espectro, enquanto que o PF-07321332 atua na inibição da protease, enzima que o vírus precisa para se replicar e infectar novas células”, diz ele.

Sobre o uso do antiparasitário contra a covid, o Ministério da Saúde do Brasil afirmou em março que “o uso da ivermectina para covid-19 não está previsto em bula e a utilização off label [fora do que a bula prescreve], até o momento, não teve o respaldo das agências reguladoras, bem como do fabricante do medicamento”. Mesma opinião da Organização Mundial da Saúde (OMS), que não recomenda a utilização “para quaisquer outros propósitos diferentes daqueles para os quais seu uso está devidamente autorizado, como para tratamento de oncocercose e sarna”.

O vídeo

O autor do vídeo usa como fundo de tela uma ampliação de um texto do site Zero Hedge intitulado “Pfizer lança estudo final para medicamento covid que é supostamente semelhante a ‘pasta de cavalo'” e, logo após ler o título, aponta no conteúdo do texto a palavra “ivermectina”.

O Zero Hedge afirma em um manifesto no site que uma de suas missões é “liberar o conhecimento oprimido”. A página é conhecida por compartilhar informações de extrema-direita.

O link do texto citado no vídeo está com um aviso no Twitter dizendo que ele pode ser inseguro.

Em uma reportagem da ABC News, divulgada em fevereiro deste ano e intitulada “​Os super espalhadores por trás das principais teorias da conspiração covid-19​”, o Zero Hedge é citado por republicar um texto de um site ligado a teorias da conspiração.

No ano passado, o Zero Hedge foi banido do Twitter por relacionar um cientista chinês à pandemia.

O autor do vídeo

No Linkedin, Luciano Raul Mazeo – que usa o perfil @lucianomazeo no TikTok – se denomina jornalista, estudante de História e autodidata e afirma ter experiência como “coordenador de mídias sociais no partido Patriotas”.

A reportagem enviou e-mail para o grupo Anhanguera Educacional, que aparece no LinkedIn de Mazeo, para confirmar se ele estuda ou já estudou na instituição – a faculdade respondeu que ele “não é mais aluno da instituição”.

Já em sua página no Facebook, Mazeo se apresenta como empreendedor.

O Comprova tentou falar Mazeo via WhatsApp e mensagem privada no Facebook e no Instagram, mas ele não respondeu em nenhum dos canais. Após a tentativa de contato, o post verificado aqui passou a aparecer como “vídeo indisponível” no TikTok.

Por que investigamos?

Em sua quarta fase, o Comprova verifica conteúdos suspeitos sobre pandemia, políticas públicas do governo federal e eleições. O post verificado aqui foi visualizado 31,7 mil vezes no TikTok até 18 de outubro — depois, foi retirado do ar.

Ao defender a ivermectina contra a covid-19, o autor do vídeo vai contra as evidências científicas e coloca a saúde da população em risco ao indicar um medicamento que até o momento não possui eficácia comprovada contra a doença. Além disso, ele menospreza a vacina, dizendo que não se imunizou, sendo que o produto é a ferramenta mais eficaz contra o coronavírus no momento.

UOL Confere, Boatos.org, AFP Checamos, Associated Press e Politifact checaram conteúdos semelhantes.

O Comprova já publicou outras verificações relacionadas à pandemia, como a que informa ser falso que documento da Suprema Corte dos Estados Unidos afirma que vacinados se tornam transumanos e a reportagem que mostra que deputada distorce entrevista de diretora do CDC para criticar vacinas e “passaporte sanitário“.

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.

Política

Investigado por: 2021-10-22

Polícia não tem indícios de participação de movimentos sociais e partidos em depredação de moradias populares em Pernambuco

  • Enganoso
Enganoso
Vídeos virais no Facebook, YouTube, Twitter e TikTok enganam ao atribuir aos movimentos sociais MST e MTST e aos partidos de esquerda a depredação de um residencial do programa Minha Casa Minha Vida, em Santa Cruz do Capibaribe, em Pernambuco. O caso ainda está sendo investigado, e a Polícia Federal afirmou que, até o momento, não foi identificada a participação de partidos políticos e/ou movimentos sociais.
  • Conteúdo verificado: Vídeos que circulam nas redes sociais mostram um imóvel depredado do Minha Casa Minha Vida, em Pernambuco, e colocam a culpa nos movimentos sociais do MST e MTST e nos partidos de esquerda.

São enganosos os vídeos que circulam nas redes sociais, um deles, inclusive, compartilhado pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido), afirmando que casas construídas com recursos federais na cidade de Santa Cruz do Capibaribe, em Pernambuco, foram depredadas por integrantes do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) e do Partido dos Trabalhadores (PT). A Polícia Federal diz não ter indícios de que partidos ou movimentos sociais tenham qualquer ligação com os atos de vandalismo.

Procurados pelo Comprova, o MST, o PT e os dois movimentos que usam a sigla MTST em Pernambuco negaram participar da ocupação. Em sites de notícias da cidade também não há nenhuma menção à participação de grupos políticos ou movimentos sociais no processo de ocupação dos imóveis. Eles também afirmam que não têm nenhuma relação com a depredação do residencial, cuja autoria ainda não foi determinada pelas autoridades.

O ex-candidato a vereador pelo PP (Progressistas) Abimael Santos, um dos autores dos vídeos, diz que se baseou em áudios e vídeos de uma suposta líder da ocupação do residencial, que menciona fazer parte do MST e do MTST e fala em “tocar fogo” em pontos da cidade. O Comprova enviou os áudios e o vídeo em que a mulher aparece para os líderes dos movimentos. Todos negaram ter relação com ela e dizem que desconhecem quem seja.

O Comprova considerou o conteúdo enganoso porque ele usa dados imprecisos e confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Como verificamos?

O Comprova buscou informações sobre o caso em matérias jornalísticas e no site oficial da prefeitura de Santa Cruz do Capibaribe. Além disso, procurou as assessorias de imprensa da Polícia Federal, da Polícia Civil, da Caixa Econômica Federal e do município pernambucano.

Entrevistamos, por telefone e WhatsApp, o presidente do PT no estado, Doriel Barros; o coordenador do MST em Pernambuco, Jaime Amorim; e os coordenadores de dois movimentos que usam a sigla MTST em Pernambuco, Vitória Genuíno e Marcos Cosmo.

Por fim, procuramos Abimael Santos, autor de um dos vídeos que foi até o residencial após os episódios de depredação. O primeiro contato com ele se deu através da sua conta no Instagram, por onde ele passou um número de celular.

Verificação

Residencial Cruzeiro

O Residencial Cruzeiro é um projeto de 500 casas no bairro da Palestina, em Santa Cruz do Capibaribe. As obras começaram antes da gestão Bolsonaro, com o cadastro para receber os imóveis em setembro de 2018. As casas foram construídas em uma parceria entre a prefeitura e a Caixa Econômica Federal pelo Minha Casa Minha Vida — esse programa, criado em 2009, foi substituído pelo Casa Verde e Amarela em 2021. A obra deveria ter sido entregue em 2019, mas atrasou e a previsão era que ficasse pronta em novembro de 2021.

A obra completa estava orçada em R$ 35 milhões e a estimativa era que 2 mil pessoas fossem beneficiadas.

Em vídeos que circulam nas redes sociais, pode-se ler detalhes sobre a obra em uma placa em frente ao empreendimento, que confirmam o que foi apurado pelo Comprova: o Residencial Cruzeiro faz parte do programa Minha Casa Minha Vida e conta com um valor total de R$ 35 milhões para a construção de 500 unidades habitacionais. O início da obra foi em 28 de novembro de 2017 e a previsão de término era 28 de maio de 2019.

Em 21 de agosto deste ano, a prefeitura informou que as obras estavam 91% concluídas. A previsão é que elas fossem entregues em novembro. Mesmo quase três anos depois do início do cadastramento, ainda era possível ser incluído no programa. Em agosto, já havia preocupação com invasões e depredações e, por isso, o município informou que estava reforçando a segurança no local, com a Guarda Municipal e apoio da Polícia Militar.

Pouco tempo depois, no dia 29 daquele mês, as casas foram ocupadas, como informou o G1. A Caixa Econômica Federal disse que estava providenciando um processo de reintegração de posse.

Dois blogs locais (Ney Lima e Merece Destaque) dizem que quem participou da ocupação foram pessoas que chegaram a ter o nome na lista de contemplados, mas, depois, foram retirados e, portanto, não receberiam as casas. O Comprova questionou a Caixa a respeito dessa informação, mas a instituição financeira se limitou a dizer que “o cadastro, indicação e seleção dos beneficiários são atribuições do Ente Público”.

No dia 23 de setembro, a Justiça Federal determinou a reintegração de posse do residencial. Segundo a decisão, a ocupação teve início com 50 pessoas, mas já havia evoluído para cerca de 200 famílias. O texto da Justiça Federal também diz que, no dia 21 de setembro, policiais e guardas civis foram recebidos com pedradas ao tentar cortar a luz do local. Seis pessoas foram detidas e levadas para a Delegacia de Santa Cruz do Capibaribe. Não há menção a qualquer partido ou movimento social.

No dia 6 de outubro, as polícias federal, civil e militar foram ao local para comunicar um prazo de cinco dias para desocupação dos imóveis. Um dia antes do encerramento deste prazo, no dia 10, houve as depredações e os furtos nas casas. A última família deixou o residencial na segunda-feira,18 de outubro, segundo informou a gestão municipal.

Depredação

Houve depredação no residencial, como mostram sites da região. Segundo o blog do Ney Lima, pessoas atearam fogo em algumas casas. Em outras, haviam sido furtadas pias, torneiras, lâmpadas, caixas d’ água e portas. As imagens, tanto externas quanto internas, mostram que se trata do mesmo local. O site cita o fato de os imóveis estarem sendo ocupados, mas não apresenta o nome de nenhum movimento ou partido. O texto foi postado no dia 11 de outubro, afirmando que as depredações teriam ocorrido no final de semana anterior (9 e 10 de outubro).

Em nota enviada ao Comprova, a Superintendência da Polícia Federal em Pernambuco afirmou que há um inquérito em andamento na Delegacia de Caruaru, cidade a 50 quilômetros de Santa Cruz do Capibaribe. “Até o momento não foi identificada a participação de partidos políticos e/ou movimentos sociais”, diz a PF. A Polícia não informou a autoria, portanto, não há como saber se as pessoas que ocupavam o local, ou quais delas, foram responsáveis pelos prejuízos nas moradias.

A empresa responsável pela obra, J3 Empreendimentos, ainda irá fazer o levantamento dos danos até o final de outubro. A Caixa enviou uma nota ao Comprova em que diz que “procederá a análise técnica necessária e adotará os procedimentos pertinentes para condução do processo de retomada das obras, à luz das regras do Programa”.

PT, MST e MTST

O deputado estadual Doriel Barros, presidente do PT em Pernambuco, disse ao Comprova que o partido não tem relação com a ocupação ou com os fatos narrados no vídeo. “O PT já acionou seu jurídico, vamos processar esse indivíduo”, informou ainda.

Em Pernambuco, existem dois movimentos que utilizam a sigla MTST. O primeiro é um braço local do grupo liderado nacionalmente pelo ex-presidenciável Guilherme Boulos (PSOL). Eles negaram qualquer relação com a ocupação mostrada no vídeo. “Podemos afirmar com tranquilidade que não temos absolutamente nada a ver com esse caso. Inclusive porque nossa atuação nunca se deu em Santa Cruz do Capibaribe. Só em Recife e em Olinda, até então”, disse Vitória Genuíno, coordenadora estadual do movimento, ao Comprova.

O segundo grupo é o MTST Pernambuco, vinculado à União Nacional por Moradia Popular (UNMP). Segundo Marcos Cosme, coordenador estadual, o movimento participou da negociação para a construção do residencial junto com o ex-prefeito de Santa Cruz, Edson Vieira, e com o então ministro das Cidades, Bruno Araújo, e conseguiu ter várias famílias sorteadas para receber parte das 500 casas. Quando houve a ocupação, em agosto, o MTST Pernambuco diz ter sido contra e repudiado publicamente.

“Nós somos, por uma questão de princípio, contra ocupação em qualquer empreendimento construído para um determinado grupo. Porque quando uma gestão, seja municipal, estadual ou federal, está construindo algumas casas, nós entendemos que esses empreendimentos já têm famílias cadastradas. Então, a posição do MTST é contra que se ocupe qualquer empreendimento construído ou em fase de construção. Mesmo que ele esteja abandonado, nós não ocupamos, porque entendemos que aquele empreendimento já tem um público, tem uma finalidade, e tem famílias no aguardo”, explicou Cosme.

O MTST Pernambuco enviou um vídeo oficial com um posicionamento, em que reafirma que as alegações do vereador Abimael são enganosas e que eles não são responsáveis pelo ataque.

No Instagram, o MST soltou uma nota oficial, em que afirmou que não destruiu as casas em Pernambuco e que “vai processar um militante bolsonarista que espalhou afirmações falsas sobre uma suposta depredação”.

Procurada pelo Comprova, a assessoria da Prefeitura de Santa Cruz do Capibaribe afirmou que, com relação aos envolvidos, não poderia passar nada oficialmente, porque o caso está sob investigação da Polícia Federal.

Abimael Santos

Abimael dos Santos Pereira foi candidato a vereador em Toritama em 2020, pelo PP (Partido Progressistas). Toritama fica a apenas 20 quilômetros de Santa Cruz do Capibaribe. Ao se registrar na Justiça Eleitoral, Abimael disse que era eletricista e que possuía R$ 135 mil em bens (dois imóveis e um automóvel). Ele teve 677 votos e ficou na suplência.

No Instagram, ele se apresenta como apoiador do presidente Jair Bolsonaro, “patriota” e cristão. Também diz ser ativista do movimento de direita Liberta Pernambuco.

O Comprova entrou em contato com Abimael por telefone e o questionou a respeito da origem da história e se tinha provas do suposto envolvimento de movimentos sociais e do PT nos atos de vandalismo.

Abimael encaminhou para a reportagem um áudio em que uma mulher, supostamente envolvida na ocupação e na depredação das casas, alega primeiro que “o nosso movimento é o sem terra” e depois que seria uma “dirigente regional de sem tetos”. Segundo ele, a gravação foi feita por um colega “infiltrado” durante a ocupação.

Ele também enviou um vídeo em que outro blogueiro bolsonarista conversa com uma mulher de voz parecida no Residencial Cruzeiro. Ela diz que estaria pronta para “guerrear” e “tocar fogo dentro de Santa Cruz, BR, prefeitura, o que for” caso as pessoas fossem retiradas do local pelas autoridades.

O Comprova encaminhou o vídeo aos dirigentes de movimentos sociais consultados anteriormente. Eles disseram desconhecer essa pessoa. “Ela não integra o MTST. Se ela fosse uma mera militante do nosso movimento, tenha certeza que nós seríamos os primeiros a denunciá-la. Eu nunca vi essa senhora”, respondeu Marcos Cosme, coordenador estadual do MTST Pernambuco. “Não a conhecemos”, afirmou Vitória Genuíno, coordenadora nacional do MTST. “Nunca vimos ela”, afirmou Jaime Amorim, do MST Pernambuco.

Quanto ao suposto envolvimento do PT, o áudio não traz nenhuma informação nesse sentido. A mulher que estaria envolvida na ocupação apenas fala a certa altura que tenta contato “com advogado e com deputado para dar o documento para quem tá aqui dentro”, sem identificar quem seriam.

O autor do vídeo negou ter espalhado desinformação. Ele sustenta que obteve uma “prova concreta” com os áudios da mulher e disse que aguarda para discutir o caso na Justiça com o MST. “Estamos baseados na moça que diz ser do MST. Se ela diz que é do MST, eu não posso dizer que foi outra pessoa. Se ela cometeu falsidade ideológica dizendo que era do MST, então ela é que tem que pagar pela consequência não só do dano que causou, mas também de ter exposto a entidade.”

Compartilhado por Bolsonaro

A história de que movimentos sociais e partidos de esquerda seriam os responsáveis pela depredação teve ajuda de políticos para ganhar alcance nas redes. Bolsonaro, por exemplo, compartilhou no Facebook e Twitter um outro vídeo, que não é de Abimael, mas contendo essa mesma alegação.

Na legenda, o presidente coloca: “Marginais depredaram 800 casas que seriam entregues em novembro. Santa Cruz do Capibaribe/PE, cidade onde estive em 04/setembro último”. O número citado é maior até que a quantidade de casas que estão sendo construídas no Residencial Cruzeiro, 500 ao todo. O vídeo traz uma narração que acusa o “MTST, um dos braços do movimento sem terra (sic)” de ter promovido o ato de vandalismo “muito provavelmente influenciado por partidos de esquerda”. Só a peça compartilhada pelo presidente teve 1,3 milhão de visualizações no Facebook. Outros parlamentares da base aliada, como o senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ) e a deputada federal Bia Kicis (PSL-DF), também espalharam o boato, assim como o assessor especial da Presidência, Mosart Aragão Pereira. O mesmo vídeo também ganhou tração em páginas de apoio ao presidente, que investem em uma narrativa de que os atos de vandalismo teriam como objetivo evitar que o governo Bolsonaro entregasse a obra.

A cidade

Santa Cruz do Capibaribe foi a única cidade de Pernambuco onde Jair Bolsonaro venceu no segundo turno das eleições de 2018. Ele teve 53,83% dos votos, contra 46,17% do ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad (PT).

No início de setembro, quando visitou o estado, Bolsonaro fez uma “motociata” pelas principais cidades do polo de confecções que teve início em Santa Cruz. Foi o último evento público do presidente antes dos atos convocados para o 7 de setembro.

Por que investigamos?

Em sua quarta fase, o Comprova verifica conteúdos suspeitos sobre as políticas públicas do governo federal, pandemia e eleições que tenham viralizado nas redes sociais. Os vídeos analisados tiveram mais de 575 mil visualizações no YouTube, Facebook e TikTok, além de terem sido compartilhados por autoridades, o que influencia no debate público.

Os conteúdos iguais ou similares foram considerados falsos pelas agências de checagem Lupa, Aos Fatos e Boatos.org.

O Comprova também já mostrou ser falso que o MST tenha destruído uma estação de energia no Amapá; que é falso que o Exército tenha apreendido madeira ilegal ligada a ONGs e ao MST; e que postagens acusavam, sem provas, o MST de ter relação com as queimadas na Amazônia e no Pantanal.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; ou o conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Saúde

Investigado por: 2021-10-22

Infectologista engana ao comparar imunidade gerada por sarampo, febre amarela e hepatite B com a gerada por covid-19

  • Enganoso
Enganoso
É enganoso o tuíte de um médico comparando os vírus da covid-19 com os do sarampo, febre amarela e hepatite B para defender que pessoas já infectadas pelo coronavírus não precisariam se vacinar. Diante das altas taxas de mutação do Sars-CoV-2 e do fato de que até aqui não se sabe a duração da imunidade após a infecção ou mesmo após a vacinação, as autoridades de saúde recomendam que mesmo os já infectados tomem a vacina
  • Conteúdo verificado: Tuíte afirma de maneira enganosa que “ninguém recomenda vacina da gripe após a pessoa ter pego gripe” e sugere que a mesma lógica deve ser aplicada para os casos de covid-19. A mesma publicação usa como exemplo outros tipos de vírus, como hepatite b, sarampo e febre amarela.

Pessoas que já foram infectadas pela covid-19 devem ser vacinadas porque há o risco de reinfecção. Por isso, é enganosa a relação que um médico faz no Twitter entre a imunização contra o novo coronavírus e outras doenças, como sarampo, febre amarela e hepatite B.

O pediatra e infectologista Marcio Nehab, do Instituto Fernandes Figueira/Fiocruz, explicou ao Comprova que o poder de mutação da covid-19 e da gripe são maiores que o das outras três doenças.

Além disso, até aqui, as pesquisas não mostraram por quanto tempo uma pessoa está protegida contra o novo coronavírus após se recuperar da doença. Estudos iniciais indicam que a vacinação ajuda a protegê-la, mesmo que já tenha sido infectada. Os principais órgãos de saúde do mundo recomendam a vacinação de quem já teve a doença, e essa também é a orientação do Ministério da Saúde no Brasil.

Em relação ao sarampo, à hepatite B e à febre amarela, a postagem diz não ser recomendada a vacina caso a pessoa já tenha sido infectada, mas as organizações orientam pela vacinação caso não haja comprovação sorológica de imunidade. Além disso, algumas das doenças citadas são prevenidas por vacinas que protegem contra múltiplas enfermidades, como a tríplice viral.

Sobre a gripe comum — influenza —, as vacinas sazonais são projetadas para proteger contra os vírus mais comuns durante a próxima temporada, e as pessoas devem se vacinar mesmo que tenham apresentado estado gripal recentemente. Além disso, a imunidade natural ou vacinal ao vírus cai com o tempo, uma possibilidade que também está sendo levantada no caso da covid-19.

Este conteúdo é enganoso, para o Comprova, porque usa dados imprecisos. Procurado, o autor do tuíte, o médico Francisco Cardoso, fez uma resposta pública ao Comprova, mas bloqueou a conta do projeto no Twitter. Ele alegou que imunizar esse grupo seria um “desperdício de vacinas” porque os casos de reinfecção seriam raros e normalmente mais brandos.

Como verificamos?

A reportagem buscou informações oficiais sobre o esquema vacinal do sarampo, da gripe, da covid-19 e da hepatite B nos sites oficiais do Ministério da Saúde, da Bio-Manguinhos e da Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz) e OMS (Organização Mundial da Saúde). A intenção era encontrar quais recomendações eram feitas em casos nos quais o paciente já foi infectado pelo vírus anteriormente.

A pasta da Saúde foi procurada em 18 de outubro, mas não retornou. As demais mantinham disponíveis as informações em seus sites ou responderam e-mails encaminhados pelo Comprova. Reportagens e artigos científicos fizeram parte da pesquisa.

Em seguida, foram entrevistados o pediatra e infectologista Marcio Nehab, do Instituto Fernandes Figueira/Fiocruz, e a microbiologista Jordana Reis, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

Por fim, o Comprova contatou o autor do post. A resposta foi feita de maneira pública, no Twitter, à reportagem.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 21 de outubro de 2021.

Verificação

Vírus da covid-19 tem mutação acelerada

Reportagem da National Geographic Brasil explica de forma detalhada haver milhares de variantes do Sars-CoV-2 que surgiram desde o início da pandemia e que estas são produzidas de forma rápida e intensa porque há muita gente infectada. O processo é aleatório, mas tende a ocorrer com mais frequência em um cenário de alta circulação do vírus.

Depois que o coronavírus entra em contato com as mucosas do corpo (olhos, nariz e boca), ele inicia a trajetória de infecção ao se prender na superfície das células e ao disparar o seu material genético (RNA). O objetivo é fazer com que o nosso corpo ajude a produzir cópias do vírus. Neste processo, contudo, é possível ocorrer mutações.

Parte delas compromete estruturas e acaba prejudicando os próprios organismos, mas algumas dessas mutações se mostram úteis para o vírus e o fortalecem para que passe de um hospedeiro a outro, ajudando-o a superar outras variantes existentes na região.

No caso dos coronavírus, a taxa de mutação é ligeiramente mais baixa do que outros vírus de RNA, mas não o suficiente para impedir que essas mutações sigam ocorrendo. À medida que o novo coronavírus se espalhava de maneira descontrolada pelo mundo, tornou-se inevitável que uma série de variantes surgisse.

Vacina contra coronavírus deve ser aplicada em quem foi infectado

O infectologista Marcio Nehab, afirmou ao Comprova que o poder de mutação dos vírus da covid-19 e da gripe é maior que o de doenças como sarampo, hepatite B e febre amarela. Portanto, as pessoas devem ser vacinadas, independentemente de já terem sido infectadas pelo novo coronavírus.

“As pesquisas ainda não mostraram por quanto tempo você está protegido contra a covid-19 depois de se recuperar da doença. A vacinação ajuda a protegê-lo, mesmo que você já tenha tido a doença e a manter anticorpos circulantes por mais tempo”, diz.

A mesma orientação é dada pela Fiocruz: “Quanto à vacina contra covid-19, ela deve ser ministrada mesmo nos usuários que já tenham tido o diagnóstico da doença, pois pode haver o risco de reinfecção. Deve ser observado o intervalo preconizado entre a doença e a vacinação”.

A microbiologista e professora da UFMG Jordana Reis relata que as evidências disponíveis sugerem diferenças na imunidade gerada pela infecção por covid-19 em relação a doenças como o sarampo e a febre amarela, neste caso, duradouras.

Casos de reinfecção por covid-19 foram registrados por várias autoridades sanitárias e em estudos científicos, com o primeiro caso apontado ainda em agosto de 2020, em Hong Kong. Em dezembro, o Ministério da Saúde confirmou o primeiro caso no Brasil. Ainda assim, questões como a frequência desse tipo de caso e o nível de risco oferecido para os pacientes permanecem incertas.

A maior preocupação é que o surgimento de variantes do novo coronavírus possa facilitar essas ocorrências. Evidências sugerem, no entanto, que essa possibilidade existe mesmo com as mesmas linhagens do vírus, em um caso em que a pessoa não desenvolve uma resposta imunológica robusta o suficiente para evitar uma nova contaminação — o que geralmente está associado a um primeiro quadro brando ou assintomático.

Os principais órgãos de saúde do mundo recomendam a aplicação da vacina contra a covid-19 em quem já teve a doença. A OMS justifica essa posição pelo fato de que “a proteção que as pessoas recebem por uma infecção anterior de covid-19 varia muito de pessoa para pessoa” e de que a imunidade obtida com a vacina nestes grupos é “muito forte”, fazendo com que a pessoa fique mais protegida e por mais tempo.

Pessoas que tiveram a doença e depois foram vacinadas receberam até o apelido de “superimunizadas”, como mostra esse artigo de divulgação científica da revista Nature. Rishi Goel, imunologista da Universidade da Pensilvânia, conta que algumas pessoas que tiveram covid-19 desenvolvem um nível altíssimo de anticorpos ao receber as vacinas. Estudos iniciais de laboratório sugerem, inclusive, que essa resposta pode gerar uma proteção mais eficiente contra as variantes.

O Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos Estados Unidos afirma que pessoas que tiveram covid-19 devem receber as vacinas por dois motivos principais: a ciência ainda não sabe por quanto tempo elas continuam protegidas após a recuperação; e pelo fato de que já foram constatados benefícios da vacinação neste grupo.

O órgão sanitário norte-americano cita como evidência um estudo que analisou casos no Estado de Kentucky e mostrou que, entre pessoas que tiveram covid-19 antes, as não vacinadas tinham cerca de duas vezes mais chances de contrair a doença novamente do que aquelas com o esquema vacinal completo.

O Centro Europeu de Prevenção e Controle de Doenças (ECDC), agência que faz parte da União Europeia, destaca que não existem informações suficientes para dizer por quanto tempo alguém que teve covid-19 está protegido de uma reinfecção, ou seja, a chamada imunidade natural. “Evidências iniciais sugerem que a imunidade natural contra a covid-19 pode não durar muito, porém, mais estudos são necessários para entender essa questão.”

No Brasil, o Ministério da Saúde defende a vacinação de pessoas com infecções prévias, como mostra essa página oficial do órgão. “Pessoas que já pegaram covid-19 devem ser vacinadas. Pesquisas apontam que a vacina pode proporcionar uma imunidade mais duradoura à covid-19 e fortalecer a imunidade natural à doença”, aponta o conteúdo. Procurada pela reportagem, a pasta não respondeu aos questionamentos.

Gripe

O post engana também ao afirmar que “ninguém recomenda vacina de gripe APÓS a pessoa ter pego gripe”. A gripe (influenza) é uma infecção viral aguda de elevada transmissibilidade e distribuição global e, apesar de ter evolução autolimitada, pode apresentar-se de forma grave.

Conforme a Fiocruz, a vacinação deve ser realizada anualmente nas campanhas oferecidas pelo Programa Nacional de Imunizações (PNI) para os grupos prioritários com predisposição para complicações, mesmo os que já tenham apresentado algum “estado gripal”, pois são grandes as variações antigênicas, ou seja, quando o vírus altera as proteínas ou carboidratos em sua superfície e, assim, evita uma resposta imune do hospedeiro. Além disso, na rotina, não se faz o diagnóstico etiológico dos casos.

Nehab explica que as vacinas contra a gripe fazem com que os anticorpos se desenvolvam no corpo cerca de duas semanas após a vacinação e estes anticorpos fornecem proteção contra infecção por vírus influenza circulantes. “As vacinas sazonais contra a gripe são projetadas para proteger contra os vírus da gripe que a pesquisa indica que serão mais comuns durante a próxima temporada.”

Ele acrescenta que se você teve influenza recentemente, ainda assim deve tomar a vacina que contém três ou quatro cepas diferentes do vírus. “Fora que sua imunidade natural ou vacinal ao vírus cai com o tempo. Daí a importância das doses de reforço”, destaca.

Sarampo

De acordo com a Fiocruz, o sarampo é uma doença viral, infecciosa aguda, potencialmente grave, transmissível e altamente contagiosa e, por isso, a vacinação é a única forma de prevenir a ocorrência na população suscetível e ela, sendo administrada na rotina da rede básica de saúde em bloqueio ou intensificação vacinal e nas campanhas de vacinação de seguimento.

Desde 2013, o calendário básico de imunizações do Brasil passou a contar com a vacina tetravalente viral que inclui a imunização contra a varicela (catapora), além de sarampo, caxumba e rubéola, já contempladas anteriormente na tríplice viral. O imunizante é produzido pelo Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos – Bio-Manguinhos.

Após os últimos casos da doença no ano de 2015, o Brasil recebeu em 2016 a certificação da eliminação do vírus. Consequentemente, nos anos de 2016 e 2017 não foram confirmados casos de sarampo no país. Em 2018, contudo, o vírus voltou a circular.

O Ministério da Saúde, via Boletim Epidemiológico da Secretaria de Vigilância em Saúde de outubro de 2021, informa que em 2021, até a Semana Epidemiológica (SE) 35, 580 casos de sarampo foram confirmados. Atualmente, existem casos no Amapá, Pará, Alagoas, São Paulo, Ceará e Rio de Janeiro.

Considerando que alguns estados ainda mantêm circulação do vírus do sarampo, é recomendado que as ações de vacinação na rotina sejam mantidas e que todas as pessoas de 12 meses até 59 anos de idade estejam vacinadas contra a doença.

Recomenda-se não serem vacinados apenas casos suspeitos de sarampo, entre a primeira amostra de sangue coletada e a coletada de 15 a 25 dias após a primeira, isso porque a administração da vacina interfere diretamente no resultado laboratorial e classificação final do caso.

Após a fase aguda do sarampo, contudo, com ausência de sinais e sintomas e com coleta das amostras para confirmação e/ou descarte do caso, é orientado seguir com a administração da vacina tríplice ou tetra viral, considerando a imunização para as demais doenças prevenidas pelas vacinas.

A Fiocruz afirma que os indivíduos que comprovam sorologicamente que já foram infectados pelo vírus, em princípio, apresentam proteção natural pela doença.

Em entrevista ao Bem Estar, em 2019, a infectologista e diretora técnica da Secretaria de Saúde de São Paulo Helena Sato afirmou que aqueles que já tiveram sarampo devem tomar a vacina. “O sarampo pode se confundir com outras doenças. Não necessariamente a pessoa teve sarampo”, lembrando que outras infecções virais têm sintomas semelhantes.

O Ministério da Saúde destaca ser fundamental que as pessoas que não tomaram a vacina ou que não sabem se tomaram a vacina procurem os postos de saúde.

Marcio Nehab reforça que, se a pessoa não tem certeza se é imune ao sarampo, deve primeiro tentar encontrar os registros de vacinação ou documentação de imunidade à doença. Caso não possua comprovação escrita sobre a imunidade, deve ser vacinada.

“Não há mal nenhum em receber outra dose da vacina tríplice se você já for imune ao sarampo (ou caxumba ou rubéola). E se você não for imune e pegar o vírus, a doença pode ser muito grave e até matar. Outra opção é pedir a um profissional de saúde para testar seu sangue para determinar se você está imune, mas isso geralmente não é recomendado e poucos laboratórios fazem esse teste validado pelo Ministério da Saúde”, explica.

Febre amarela

A maioria dos infectados pela febre amarela, transmitida por um vírus que tem como vetor em áreas urbanas o mosquito Aedes aegypti — o mesmo da dengue —, adquire imunização permanente contra a doença, segundo informações divulgadas pela Fiocruz.

O vírus só causa sintomas em pessoas que nunca tiveram contato com a doença ou que não receberam a vacina. Desde 1937, a Bio-Manguinhos prepara os imunizantes a partir da cepa atenuada 17D, da febre amarela.

O vírus é cultivado em ovos embrionários de galinhas, acompanhando as normas que a OMS estabelece.

O Ministério da Saúde recomenda que a vacina seja aplicada a partir dos nove meses de vida, com um reforço a cada dez anos, no mínimo. A medida vale especialmente para quem reside em regiões endêmicas ou quem irá viajar para esses locais, acompanhando o Calendário Nacional de Vacinação

Também devem evitar a vacinação contra a febre amarela quem teve histórico de reações anafiláticas a ovos de galinha e seus derivados, gelatina, eritromicina e canamicina. Gestantes, a não ser em situação epidemiológica com alto risco de exposição, seguindo recomendações expressas das autoridades de saúde, devem evitar o imunizante.

Quem tem imunodeficiência congênita ou secundária por doenças, como câncer e leucemia, ou por medicamentos, não pode receber a dose. O mesmo vale para quem possui histórico de doença do timo, como miastenia grave, timoma ou timectomia e para crianças com menos de seis meses de idade.

A reportagem entrou em contato com a Bio-Manguinhos, responsável pela fabricação da vacina, para saber se quem teve um quadro infeccioso por conta do vírus precisa tomar o imunizante. Em resposta, a entidade afirmou que se a infecção foi confirmada laboratorialmente, a pessoa deve ter anticorpos contra a febre amarela e, portanto, está protegida contra uma nova infecção e não é preciso se vacinar.

“Há, porém, algo a se considerar: se o fato ocorreu há mais de 10 anos, por segurança seria recomendada a vacinação, já que os títulos de anticorpos neutralizantes se reduzem no decorrer dos anos”, afirmou em nota a Bio-Manguinhos.

Hepatite B

A hepatite B é um dos cinco tipos de hepatites existentes no Brasil, causada pelo vírus HBV, que atinge o fígado. Assim como a C, ela pode ser transmitida por sangue contaminado, sexo desprotegido e compartilhamento de objetos perfurocortantes. Conforme a Fiocruz, também há risco potencial de transmissão vertical (da mãe para o bebê) no momento do parto.

Sobre a imunidade adquirida naturalmente pela doença, o instituto diz que esta deve ser avaliada sorologicamente. “A vacina é recomendada, de forma universal, a partir do nascimento.”

Segundo o infectologista Marcio Nehab, a maioria das pessoas infectadas por hepatite B na idade adulta é capaz de lutar contra o vírus e se recuperar totalmente em 1 a 3 meses e ficará imune à infecção pelo resto da vida. Porém, há pessoas que precisam ser vacinadas para adquirir a imunidade. “Se não souber se é ou não imune pode tomar a vacina sem problemas.”

A principal forma de prevenção da doença é a vacina, que está disponível no SUS (Sistema Único de Saúde), de acordo com dados do Ministério da Saúde. A pasta oferta o imunizante para todas as faixas etárias.

O Ministério da Saúde estima que o risco da infecção tornar-se crônica depende da idade do indivíduo. Enquanto as crianças de até um ano têm 90% de chance de desenvolver um quadro mais agudo, as demais, entre um e cinco anos, têm entre 20% e 50% de chance.

Em adultos, as chances caem: entre 20% a 30% das pessoas infectadas cronicamente pelo vírus desenvolverão cirrose ou câncer de fígado.

Diferenças entre covid-19 e outras doenças

As doenças não são causadas pelo mesmo agente patológico, e algumas também diferem entre si pelo meio de transmissão. Além disso, ao contrário do sarampo, da hepatite B, da febre amarela e da gripe, a covid-19 é uma doença nova e é a única caracterizada como pandemia atualmente.

O vírus do sarampo é um RNA vírus, que pertence à família Paramyxoviridae, sendo uma doença de transmissão respiratória como a covid-19. A hepatite viral B é causada por um vírus com genoma de DNA, pertencente à família Hepadnaviridae; a transmissão ocorre por meio do sangue contaminado e de relações sexuais desprotegidas.

O vírus da febre amarela é um gênero de vírus RNA da família Flaviviridae, transmitido por meio da picada de um mosquito. A gripe é causada por diferentes tipos de vírus influenza, que fazem parte da família Orthomyxoviridae, de vírus de RNA, transmitida também pelas vias respiratórias.

Já a covid-19 é causada pelo vírus Sars-CoV-2, um coronavírus que está mais próximo dos agentes causadores da MERS e da SARS, por exemplo. O seu genoma é de RNA e ela também é definida como uma doença de transmissão respiratória. As formas de contágio mais comuns ocorrem por meio do contato próximo com pessoas infectadas, a partir da entrada de gotículas nas mucosas dos olhos, nariz e boca.

Está bem estabelecido que pessoas que tiveram sarampo, por exemplo, passam a ficar imunes contra a doença ao longo de toda a vida. Da mesma forma, a aplicação de vacinas contra o sarampo, a hepatite B e a febre amarela costuma ocorrer somente uma vez, de preferência já durante a infância.

No caso da covid-19, no entanto, estudos iniciais sugerem que a proteção individual contra o vírus (adquirida pela doença prévia ou pela vacina) tende a cair com o tempo — inclusive, esse é o motivo da dose de reforço estar sendo recomendada para grupos de risco atualmente no Brasil. Mas uma resposta exata sobre a duração da proteção ainda não é certa, até porque o surgimento do novo coronavírus ocorreu apenas em 2019.

No caso da gripe, a situação é um pouco diferente. Por conta da variabilidade de tipos (influenza A, B e C) e de subtipos (como H1N1, por exemplo, que causou uma pandemia em 2009) as vacinas são atualizadas todos os anos, observando quais vírus estão circulando mais e representam maior perigo para a saúde pública. A campanha de imunização acontece antes de cada inverno.

Por fim, apesar de ocorrerem em várias partes do mundo, as outras quatro doenças citadas não configuram uma pandemia atualmente, ao contrário da covid-19. Ou seja, o risco de exposição ao Sars-CoV-2 é consideravelmente mais elevado hoje.

O Comprova acessou uma série de boletins epidemiológicos do Ministério da Saúde para checar a frequência com que aparecem cada uma dessas doenças no Brasil. Em relação ao sarampo, foram registrados 20.901 em 2019 e 8.848 casos em 2020. Para a hepatite B, foram 13.256 em 2019 e 6.064 em 2020.

Sobre a febre amarela, um documento recente menciona cinco casos confirmados entre julho de 2020 e abril de 2021. O impacto da gripe influenza foi verificado com base no número de pacientes hospitalizados, 2.602 no ano passado, mas uma grande parte dos casos gera sintomas leves e dispensa atendimento hospitalar.

A covid-19 supera todos esses números em 24 horas. Em 20 de outubro, o Brasil registrava uma média móvel de 11.933 novos casos e 380 mortes por dia, de acordo com o levantamento do consórcio de veículos de imprensa. Desde a chegada do vírus no País, em fevereiro do ano passado, foram registrados 21,6 milhões e 604,3 mil óbitos pela doença.

O autor

Francisco Eduardo Cardoso Alves é especialista em Infectologia pelo Instituto Emílio Ribas e diretor-presidente da Associação Nacional dos Médicos Peritos da Previdência Social (ANMP). Defensor do “tratamento precoce” com medicamentos que não possuem eficácia comprovada contra a covid-19, foi ouvido pela CPI da Pandemia, onde defendeu a prática, em junho deste ano.

Já foi alvo de verificação anterior do Comprova, ao afirmar, em sequência de tuítes, que Casa Branca, CDC, FDA, OMS, Pfizer, Moderna e Johnson & Johnson não obrigam funcionários a se vacinarem, o que é enganoso.

O Comprova procurou Alves por e-mail e o questionou a respeito de dados sobre reinfecção pelo vírus e estudos mostrando benefícios da vacinação neste grupo, entre outros pontos. Ele não retornou o email mas decidiu “responder publicamente” em sua conta no Twitter.

O médico afirmou que está ciente da possibilidade de reinfecção por covid-19, mas alegou que as chances são mínimas, sustentando a tese de dispensar a vacinação. No entanto, um estudo publicado por autoridades dos Estados Unidos mostra que não vacinados tiveram mais que o dobro de chances de serem reinfectados, em comparação com os completamente vacinados.

Francisco diz que teve acesso aos estudos mostrando que a vacina melhora a resposta imunológica das pessoas com infecções prévias, mas afirmou que a imunização “é desnecessária quando a pessoa já tem imunidade natural”.

A opinião do infectologista vai à contramão do que determina o Ministério da Saúde e a OMS em relação às vacinas. A orientação é para que quem já teve covid-19, após a baixa da infecção, seja imunizado para diminuir as chances de uma nova infecção.

Por fim, ele diz que não teve covid-19 e que não concorda com a aplicação “obrigatória sob coação” das vacinas.

Por que investigamos?

Em sua quarta fase, o Comprova verifica conteúdos suspeitos sobre pandemia, políticas públicas do governo federal e eleições. O post verificado foi compartilhado originalmente no Twitter e alcançou mais de 7,5 mil interações. Na repostagem do mesmo conteúdo feita no grupo Médicos pela Vida, no Telegram, o conteúdo enganoso foi visualizado por outras 20,2 mil pessoas.

Publicações enganosas como esta acabam reforçando que a vacinação contra a covid-19 seria dispensável quando, na realidade, é por meio da imunização que os números de casos e óbitos da doença têm caído. Além disso, por ser médico, o discurso do autor da postagem acaba sendo considerado por pessoas que o têm como autoridade em saúde.

Fica claro nos comentários da publicação que os usuários do Twitter e Telegram que viram o post acreditam que a vacina não é eficaz e que haveria uma “conspiração” por trás do imunizante, o que não é verdade.

Outros conteúdos no mesmo sentido foram checados pelo Comprova, como a informação falsa sobre um documento da Suprema Corte dos Estados Unidos apontando que os vacinados se tornariam transumanos. Outra postagem verificada foi sobre a deputada Bia Kicis, que distorceu entrevista de diretora do CDC para criticar vacinas e “passaporte sanitário“.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Política

Investigado por: 2021-10-20

Maior investimento no laboratório Sirius foi no governo Temer; com Bolsonaro, houve cortes na pasta da Ciência

  • Enganoso
Enganoso
É enganosa a publicação no Twitter que atribui a Jair Bolsonaro o investimento que resultou na construção do Sirius, estação de aceleração de partículas em Campinas, no estado de São Paulo. Segundo o post, o presidente investe "pesadamente" em ciência. Mas o projeto teve início em 2014, no governo Dilma Rousseff e, desde então, recebeu recursos durante os mandatos de todos os presidentes do país. Além disso, Bolsonaro anunciou grandes cortes no Ministério da Ciência desde que assumiu.
  • Conteúdo verificado: Tuíte afirma que o laboratório Sirius, em Campinas, é resultado do trabalho de Jair Bolsonaro, um presidente que, segundo o post, investe de forma “pesada em ciência”.

É enganosa a publicação no Twitter que atribui ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido) a construção da estação de aceleração de partículas Sirius. No post, um usuário da rede social compartilha vídeo da inauguração de área do complexo, em 21 de outubro de 2020, na qual Bolsonaro esteve presente, para dizer que ele investe “pesado (sic) em Ciência”.

Conforme o Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM), supervisionado pelo Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTI), a assinatura do contrato com a construtora e o lançamento da pedra fundamental da obra ocorreu em dezembro de 2014, no primeiro mandato de Dilma Rousseff (PT). De lá pra cá, o projeto, ligado ao ministério, recebeu recursos anuais do governo federal.

Além da construção ter começado cinco anos antes do início do governo Bolsonaro, o presidente anunciou cortes na pasta da Ciência. Em março de 2019, no início de sua gestão, efetuou um corte de 42% no orçamento do ministério, equivalente a R$ 2,1 bilhões. À época, o ministro Marcos Pontes disse que a verba era necessária para o andamento do projeto Sirius.

Mais recentemente, em 8 de outubro deste ano, houve outro corte, de R$ 690 milhões. Consultado pelo Comprova, o CNPEM afirmou que a redução da verba “não afeta diretamente o Sirius, pois eram recursos alocados para outras atividades”, mas que “afeta a ciência brasileira e todo o ecossistema de pesquisa e, portanto, indiretamente, afeta também o Sirius”.

A reportagem tentou contato com o perfil @BiroliroBrasil, autor do post, mas não obteve retorno até a conclusão desta verificação. Dias depois, o Twitter suspendeu a conta.

O Comprova considerou o conteúdo enganoso porque ele induz a uma interpretação diferente da verdade.

Como verificamos?

A reportagem buscou informações sobre a construção do Sirius para verificar quando teve início e quais são os órgãos responsáveis pelo projeto. No site oficial do laboratório, verificamos que o contrato com a empresa responsável para iniciar a obra foi assinado no fim de 2014 (no ano seguinte ao início da terraplanagem), sendo que a inauguração da primeira etapa ocorreu em 2018.

A partir destas informações, buscamos os dados referentes à construção do Sirius no Portal da Transparência do governo federal.

Em seguida, sobre a alegação feita na postagem de que a mídia “não teria coragem” de falar sobre a contribuição de Bolsonaro para o Sirius, a reportagem buscou verificar por meio de pesquisa no Google se a imprensa nacional divulgou notícias relacionadas a isso.

Além disso, o Comprova contatou, por e-mail, as assessorias de imprensa do Ministério da Ciência, que não respondeu, e do CNPEM.

A equipe também entrou em contato com o usuário que fez a postagem original, mas não obteve retorno até a publicação deste texto.

Verificação

Início em 2014

O Sirius é uma infraestrutura de pesquisa aberta, ou seja, à disposição da comunidade científica, e foi desenvolvido no CNPEM.

Conforme informações do site do Laboratório Nacional de Luz Síncroton, instituição que abriga o Sirius, a terraplanagem do terreno de 68 mil metros quadrados de área construída em Campinas, doado pelo Estado de São Paulo, foi concluída em 2014.

Em 19 de dezembro do mesmo ano, foi assinado o contrato com a construtora e lançada a pedra fundamental da obra, como informou o CNPEM à reportagem. Nessa época, a presidente do Brasil era Dilma Rousseff.

As edificações tiveram início em 2015, ano em que 20% das obras civis foram concluídas.

Já durante o governo de Michel Temer (PMDB), as obras civis do Sirius alcançaram 75% de conclusão, com a implantação do piso especial para a instalação dos aceleradores e das linhas de luz, e, em 2018, quando as obras civis foram concluídas e deu-se início à instalação dos equipamentos.

Recursos do Ministério da Ciência

De acordo com o site oficial do laboratório, “o Sirius é financiado com recursos do MCTI e projetado por pesquisadores e engenheiros do CNPEM, em parceria com a indústria nacional”.

Dados disponíveis no Portal da Transparência mostram que o governo federal investiu, até outubro de 2021, R$ 1,3 bilhão desde o início da construção do Sirius, em 2014, dentro de um orçamento inicial de R$ 1,5 bilhão.

Ainda conforme o Portal da Transparência (Planilha 1 | planilha 2), os maiores montantes pagos anualmente até então foram R$ 352,4 milhões em 2018 (governo Temer); R$ 325,9 milhões em 2017 (governo Temer); e R$ 277,1 milhões em 2019 (governo Bolsonaro).

Apesar de Bolsonaro já ter direcionado mais de R$ 441 milhões para o Sirius de 2019 a 2021, foi durante o governo Temer que o projeto teve mais investimento: cerca de R$ 678 milhões entre 2017 e 2018. Na gestão Dilma, foram pagos R$ 243,1 milhões.

Cortes

Embora a mensagem analisada nesta verificação declare que Bolsonaro “é um presidente do Brasil, que ‘os corruptos’ ainda dizem ser contra a ciência, investindo pesado (sic) em Ciência ‘de verdade’ e ‘da verdade’…”, no dia 8 de outubro deste ano houve uma modificação do Projeto de Lei do Congresso Nacional (PLN) 16, pela Comissão Mista do Orçamento do Congresso Nacional, que atendeu um ofício do Ministério da Economia e subtraiu os recursos destinados a bolsas e apoio à pesquisa do Ministério de Ciência e impossibilita projetos agendados pelo CNPq.

Com o desfalque, inclusive, pode haver a possibilidade de cortes de custos para o Sirius, já que ele é financiado pela pasta da Ciência. O PLN 16/2021 retirou R$ 690 milhões da pasta e destinou o valor para outros ministérios – a verba representava cerca de 90% do orçamento do ministério, que caiu para R$ 89 milhões.

Na ocasião, o ministro da Ciência, Marcos Pontes, lamentou a decisão. No mesmo dia, conforme a Agência Brasil, foram inauguradas cinco novas linhas de luz no Sirius.

Ao Comprova, a assessoria do CNPEM lamentou o corte na pasta. “Foi um baque enorme para o sistema científico brasileiro”, escreveu, por e-mail. “Isto não afeta diretamente o Sirius neste momento, pois eram recursos alocados para outras atividades. No entanto, afeta a ciência brasileira e todo o ecossistema de pesquisa e, portanto, indiretamente afeta também o Sirius.”

Visitas do presidente

Além de usar um vídeo sobre o Sirius para dizer que Bolsonaro investe de forma pesada na ciência, o post verificado pede: “vamos divulgar porque a mídia brasileira não vai ter coragem!…”, levando à interpretação de que a imprensa nacional não noticiou nada sobre investimentos do governo Bolsonaro e as visitas do presidente ao complexo.

Entretanto, diversos veículos jornalísticos divulgaram os assuntos. Em novembro de 2019, por exemplo, o UOL publicou que “em julho, ele (o Sirius) teve R$ 75 milhões liberados pelo governo federal e pôde concluir os testes recentes”. Em setembro, o G1 escreveu: “o projeto recebeu até setembro repasse de R$ 75 milhões dos R$ 255,1 milhões previstos para 2019”.

A visita de Bolsonaro, que participou da inauguração da primeira linha de pesquisa no laboratório, em outubro de 2020, também foi amplamente noticiada.

“Bolsonaro inaugura linha de pesquisa do Sirius e ministro projeta laboratório de biossegurança 4 em Campinas”, escreveu, no título, o G1. O UOL também publicou uma notícia sobre o evento, ressaltando que Bolsonaro foi o terceiro presidente a inaugurar uma das etapas do projeto.

A Folha, além de ter publicado reportagem em seu site, divulgou a visita do presidente na versão impressa do dia 22 de outubro, com o título “Bolsonaro inaugura estação de aceleração de partículas em Campinas”. O Estadão citou a participação do chefe de Estado no evento em um texto que destacou o posicionamento do ministro Marcos Pontes sobre a obrigatoriedade da vacina contra a covid-19. O jornal O Globo também fez menção à cerimônia em uma reportagem.

Em 8 de de outubro de 2021, quando foram inauguradas cinco estações do Sirius, o G1 também noticiou e SBT News divulgou a visita na TV e, na versão on-line, com o título “Bolsonaro visita superlaboratório e conhece acelerador de partículas”.

Por que investigamos?

Em sua quarta fase, o Comprova verifica conteúdos suspeitos sobre pandemia, políticas públicas do governo federal e eleições. O vídeo compartilhado no post verificado teve 6,2 mil visualizações no Twitter até 13 de outubro.

Retuítes com frases como “Que orgulho, é maravilhoso ver o Brasil saindo do atraso, se libertando da cultura do bumbum, Carnaval, futebol, turismo sexual, pra ser de fato a nação predestinada a ser. Parabéns a todos os envolvidos e ao PR JB pela coragem. Orgulho” e “Feliz de ter votado na pessoa certa para comandar esse país. Se fosse o poste do Lula, com certeza esse investimento nunca teria saído do papel porque o dinheiro teria sido usado para sustentar os amigos ditadores” sugerem que Bolsonaro seria responsável pela construção do Sirius, interpretação que é errônea.

Em 2021, o Comprova já verificou que um vídeo omitia as ações de governos anteriores para exaltar as ações de Bolsonaro na Transamazônica e checou a realização de outras supostas obras atribuídas ao presidente, como uma realizada em 2015 pelo Governo de São Paulo e uma intervenção no Rio Grande do Norte, iniciada em governos anteriores, mas também atribuída somente ao governo de Bolsonaro.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; ou ainda aquele que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Saúde

Investigado por: 2021-10-15

Teste de anticorpos não deve substituir vacina contra a covid, como sugere deputado do PR

  • Falso
Falso
São falsas as alegações do deputado estadual Ricardo Arruda (PSL-PR) em um vídeo em que ele afirma que os exames de anticorpos garantem que as pessoas que já tiveram a doença estão imunes contra a covid-19 e, por isso, elas não precisam se vacinar; que o “tratamento precoce” teve a sua eficácia comprovada; e que ninguém monitora os efeitos colaterais dos imunizantes. Segundo a ciência, a vacinação garante uma proteção mais robusta do que a demonstrada pelos exames de anticorpos pós-infecção. Não há nenhum ensaio clínico que comprove a eficácia de medicamentos contra o novo coronavírus; pelo contrário, esses tratamentos são desaconselhados por autoridades de saúde internacionais. Já as reações aos imunizantes são monitoradas de perto, no Brasil, pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
  • Conteúdo verificado: Vídeo que circula no Facebook mostra o deputado estadual do Paraná Ricardo Arruda fazendo diversas alegações falsas sobre a pandemia. Entre elas, ele afirma que o “tratamento precoce” foi “comprovado estatisticamente” por “milhões de médicos”.

São falsas várias alegações do deputado estadual do Paraná Ricardo Arruda (PSL-PR), declaradas em um vídeo que viralizou na Internet com críticas ao programa de vacinação contra a covid-19 e defesa de tratamentos ineficazes contra a doença.

Segundo Raphael Rangel, virologista, coordenador do curso de biomedicina do Instituto Brasileiro de Medicina e Reabilitação (IBMR) e membro da Rede do Centro de Informações Estratégicas de Vigilância em Saúde, o grupo não vacinado é aquele que mais tem risco para exposição ao vírus, assim como a possibilidade de evolução para a forma grave da covid-19.

O virologista afirma que o grande perigo desse grupo é que essas pessoas podem se infectar recorrentemente e, por isso, dar origem a novas variantes.

Também é falso que não exista um acompanhamento dos efeitos colaterais das vacinas. Em primeiro lugar, porque antes de ser autorizado no Brasil, cada imunizante passou por três fases de testes clínicos para garantir a sua segurança e eficácia. Em segundo, porque notificações de reações adversas são monitoradas de perto por órgãos de vigilância sanitária como a Anvisa, que tem poder para suspender a aplicação das vacinas se houver risco à saúde da população.

Além disso, o deputado erra ao afirmar que o Supremo Tribunal Federal (STF) retirou a autonomia do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) para atuar durante a pandemia e, por isso, todas as ações são decididas por governadores e prefeitos. O que a Suprema Corte decidiu foi que União, estados e municípios têm competência conjunta para atuar em questões de saúde pública, como determina a Constituição Federal. Segundo o órgão, caberia ao governo federal coordenar as ações específicas dos governos subnacionais.

Outra declaração falsa do parlamentar inclui a defesa do “tratamento precoce”. Ele alega, sem provas, que o método foi “estatisticamente” comprovado. O próprio Ministério da Saúde já afirmou à CPI da Pandemia que os remédios do kit covid, inicialmente defendido pelo governo federal, são, na verdade, ineficazes no combate ao vírus.

Ricardo Arruda também estabeleceu falsa equivalência entre a proteção contra o vírus oriunda da contaminação e a conferida pela vacina. O doutor em Epidemiologia pela Universidade de São Paulo (USP) Julio de Carvalho Ponce explica que a proteção “mais robusta” somente é garantida com a aplicação dos imunizantes.

O legislador ainda diz que o “tratamento precoce” contra a covid-19 é perseguido, enquanto as pessoas defendem a liberação de compostos medicinais a base de cannabis. De acordo com a médica especialista em dor crônica e medicina canabinóide Maria Teresa Jacob, “não há comparação possível entre tratamento precoce e maconha medicinal’. Aliás, nem se pode afirmar que existe tratamento precoce consensual [contra a covid-19]”.

Em nota, a assessoria do deputado afirmou que todas as informações sobre saúde que constam no vídeo tiveram como fonte “médicos confiáveis e renomados”, sem detalhar a quem se refere. A equipe do parlamentar também disse que as informações são checadas antes de serem publicadas.

Para o Comprova, é falso todo conteúdo inventado e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.

Como verificamos?

Inicialmente, buscamos informações em verificações acerca da vacinação contra covid-19 e do “tratamento precoce” já publicadas pelo Comprova. Além disso, entrevistamos o virologista Raphael Rangel; o epidemiologista Júlio de Carvalho Ponce; e a médica especialista em dor crônica e medicina canabinóide Maria Teresa Jacob.

Por email, o Comprova entrou em contato com a assessoria do gabinete do autor do vídeo.

Foram consultadas, por fim, informações científicas da Organização Mundial da Saúde (OMS), dos Institutos Nacionais de Saúde dos Estados Unidos, da Anvisa e portais de notícias.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 15 de outubro de 2021.

Verificação

Efeitos colaterais das vacinas são monitorados

Em todas as bulas das vacinas autorizadas no Brasil, a Anvisa afirma que os imunizantes, como qualquer outro medicamento, podem causar efeitos colaterais, ainda que eles passem por três fases de testes clínicos que, além da eficácia, indicam se são seguros; isto é, que não provocam reações graves.

Não significa, contudo, que, após serem autorizadas, as vacinas não são mais acompanhadas pelas autoridades sanitárias. A Anvisa continua monitorando qualquer evento adverso por meio de um processo chamado farmacovigilância, assim como outras agências ao redor do mundo. Quando uma pessoa tem um episódio de saúde que se suspeita estar relacionado à imunização, o profissional de saúde que a atendeu notifica os órgãos competentes, incluindo a Anvisa, para que iniciem uma investigação criteriosa do caso.

A Anvisa tem poder para suspender total ou parcialmente (para alguns grupos) o uso de algum medicamento ou imunizante que esteja sendo aplicado em desacordo com a bula e que possa causar risco à saúde da população. Um exemplo foi a suspensão do uso da vacina da AstraZeneca em gestantes, no dia 10 de maio de 2021 A aplicação desse imunizante em mulheres grávidas não era prevista pela bula.

Em junho deste ano, o médico David Urbaez, presidente da Sociedade de Infectologia do Distrito Federal, disse ao Comprova que a existência de algumas reações leves são comuns em todas as vacinas contra qualquer doença, já que elas estimulam o sistema imune. Essas reações leves, como dor no local da aplicação e febre, não têm relação com a forma como esse imunizante foi desenvolvido. “O sistema imune estimulado gera uma série de substâncias biológicas, que em mais ou menos proporção, geram os efeitos adversos sistêmicos como febre, dores musculares, indisposição, etc”, explicou.

De acordo com Urbaez, em mais de 99% das vezes, as reações aos imunizantes são leves. “Rarissimamente podem acontecer efeitos adversos mais sérios, sempre menos de 1% das ocorrências. Sempre lembrando, todas as vacinas em uso não têm vírus vivos, pelo que sua segurança é garantida após as fases de ensaio clínico”, afirmou.

STF e o papel dos estados e da União

Em 15 de abril de 2020, o plenário do STF reconheceu a competência concorrente entre a União, os estados e municípios no enfrentamento da pandemia. Na ação que avaliava trechos da Medida Provisória 926/2020, ficou entendido que governadores e prefeitos tinham autonomia para adotar medidas de distanciamento social que pudessem prevenir a infecção pela covid-19, considerando as realidades locais, já que o número de casos e de leitos varia de um lugar para outro do país. O papel do governo federal seria coordenar nacionalmente essas ações locais.

A decisão tinha como base o artigo 23, inciso II, da Constituição Federal, segundo o qual, “cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência” é uma competência comum da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios.

O presidente Jair Bolsonaro e seus apoiadores sempre criticaram a decisão do STF. No entendimento do chefe do Planalto, o Judiciário limitou seus poderes para atuar durante a pandemia. O governo chegou a apresentar ações na Suprema Corte contra decretos estaduais que instituíram lockdown para contenção do vírus. Mas elas não prosperaram.

Em julho deste ano, o STF lançou uma peça de marketing dizendo ser falso que o Judiciário tenha retirado poderes do presidente para atuar na pandemia. “O STF decidiu que União, estados e prefeituras tinham que atuar juntos, com medidas para proteger a população”, explica o vídeo divulgado nas redes sociais. A peça também trazia o slogan “Uma mentira contada mil vezes não vira verdade”.

A decisão mais recente, citada no vídeo verificado, ocorreu após o Ministério da Saúde recomendar a suspensão da vacinação de adolescentes. A imunização de pessoas acima de 12 anos com a vacina da Pfizer havia sido autorizada pela Anvisa desde 11 de junho deste ano, após avaliar estudos que comprovaram a segurança e a eficácia do composto para esta faixa etária.

Apesar da orientação da União, alguns estados anunciaram que seguiriam aplicando a vacina. No dia 21 de setembro, o ministro do STF Ricardo Lewandowski concedeu uma liminar afirmando que “a imunização de adolescentes acima de 12 anos é da competência dos estados, do Distrito Federal e dos municípios”. A decisão dizia que estados e municípios deveriam observar, sob pena de responsabilização, as orientações dos fabricantes dos imunizantes, da Anvisa e das autoridades de saúde.

No dia seguinte, a Anvisa concluiu que o óbito de adolescente que ocorreu em São Paulo — citado pelo Ministério da Saúde como justificativa para suspensão da imunização — não tinha relação com a aplicação da vacina da Pfizer, após um processo de investigação. Na mesma data, o Ministério da Saúde voltou atrás e passou a recomendar novamente a imunização dos adolescentes.

Tratamento precoce não foi comprovado estatisticamente

Diferentemente do que afirma o parlamentar, não há comprovação estatística sobre eficácia do dito “tratamento precoce”. Ricardo Arruda não citou números nem alguma fonte que tenha embasado sua fala.

Como o Comprova já mostrou, a hidroxicloroquina é ineficaz no combate ao vírus. Trata-se de um dos remédios difundidos pelo presidente Jair Bolsonaro e aliados como antídoto para a infecção, ao lado da ivermectina e da azitromicina, sem comprovação de eficácia.

A OMS e a Organização Pan-Americana de Saúde (Opas) já emitiram recomendações contrárias ao uso da hidroxicloroquina, da cloroquina e da ivermectina.

Um estudo randomizado – que compara duas ou mais intervenções conduzidas por pesquisadores e aplicadas de modo aleatório em voluntários – publicado na revista The Lancet mostrou que a azitromicina é ineficaz e não tem relação com redução de mortes por covid-19.

O próprio Ministério da Saúde assumiu que os medicamentos do chamado kit covid são incapazes de neutralizar o vírus. Em documento enviado à CPI da Covid, a pasta disse:

“Alguns medicamentos foram testados e não mostraram benefícios clínicos na população de pacientes hospitalizados, não devendo ser utilizados, sendo eles: hidroxicloroquina ou cloroquina, azitromicina, lopinavir/ritonavir, colchicina e plasma convalescente. A ivermectina e a associação de casirivimabe + imdevimabe não possuem evidência que justifiquem seu uso em pacientes hospitalizados, não devendo ser utilizados nessa população” .

O infectologista Julio Ponce explica que relatos individuais de “cura” não são suficientes para provar a eficácia de um medicamento. “Em medicina, não abordamos a capacidade de cura como um evento pessoal, único, mas sim com redução de risco, melhora de sintomas, diminuição de evolução a óbito, etc”, afirmou ao Comprova em entrevista feita pelo Twitter.

Exame de anticorpos não substitui vacina

Não é verdadeira a fala do parlamentar Ricardo Arruda que estabelece equivalência entre o resultado do teste de covid-19 e a vacina contra o vírus, como se ambos fossem atestados de imunidade contra o Sars-CoV-2.

A Anvisa alertou em seu site, em junho deste ano, que os testes disponíveis servem tão somente para a identificação de pessoas que tenham sido infectadas pelo coronavírus.

Na nota técnica 33/2021, a agência reguladora brasileira afirma que “não existe, até o momento, a definição da quantidade mínima de anticorpos neutralizantes necessária para conferir proteção imunológica contra a infecção pelo Sars-CoV-2, uma reinfecção, as formas graves da doença e nem contra as novas variantes circulantes.”

A FDA, agência sanitária norte-americana, equivalente à Anvisa no Brasil, também advertiu que os testes não devem ser usados para avaliar o nível de imunidade contra o vírus, seja antes ou depois da vacinação. De acordo com o comunicado, emitido em maio deste ano, são necessárias mais pesquisas para entender o significado de um teste de anticorpos positivo ou negativo.

Sobre os não vacinados, público ao qual o parlamentar se dirige na fala, a FDA sublinha que um resultado positivo não é significado de quantidade específica de imunidade ou proteção contra a infecção. O resultado positivo significa que o paciente provavelmente deve ter sido infectado pelo vírus. Dessa forma, a recomendação da agência reguladora estadunidense é de que um médico seja consultado.

“Se os resultados do teste de anticorpos forem interpretados como uma indicação de um nível específico de imunidade ou proteção contra a infecção pelo Sars-CoV-2, há um risco potencial de que as pessoas tomem menos precauções contra a exposição ao vírus. Tomar menos precauções pode aumentar o risco de infecção e pode resultar no aumento da disseminação do Sars-CoV-2”, diz o comunicado.

Júlio de Carvalho Ponce disse ao Comprova que o exame de anticorpos é um “indicativo de proteção, mas há uma proteção mais robusta com o uso de vacinas, mesmo para quem já foi infectado.”

Há mais literatura sobre maconha medicinal

Ricardo Arruda criticou o colega de Assembleia, o deputado Goura Nataraj (PDT), por ele ser contrário ao “tratamento precoce”, mas favorável ao uso da maconha para fins medicinais. Arruda então estabeleceu falsa equivalência entre o uso de produtos à base de cannabis e o tratamento que ele defende contra o Sars-Cov-2, cuja ineficácia já foi comprovada pela comunidade científica.

De acordo com a médica especialista em dor crônica e medicina canabinóide Maria Teresa Jacob, “não há comparação possível entre tratamento precoce e maconha medicinal”. Segundo ela, “nem se pode afirmar que existe tratamento precoce consensual [contra a covid-19]”.

Em entrevista ao Comprova, ela afirma que “estudos sobre cannabis medicinal têm crescido muito a cada ano e mostram como é possível aliviar a dor crônica no caso de muitas doenças como endometriose, problemas de coração e cefaléia, inclusive incluindo tratamento de covid-19”.

Uma resolução colegiada da direção da Anvisa, de número 327/2019, entrou em vigor no dia 10 de março de 2020 e definiu as condições e procedimentos para a concessão da Autorização Sanitária para a fabricação e importação de produtos de cannabis para fins medicinais.

A empresa farmacêutica Prati-Donaduzzi, como mostra matéria do portal UOL, conseguiu autorização para comercializar o canabidiol com cinco anos de validade. Não significa, porém, que os produtos tenham status de medicamento.

No quinto capítulo da mesma resolução, o segundo inciso do artigo 50 determina que os pacientes devam ser informados de que “o produto de Cannabis não é medicamento”.

Em 2021, a Anvisa aprovou dois novos produtos à base de cannabis fabricados nos Estados Unidos, ambos com concentração de tetra-hidrocarbinol (THC) de até 0,2%. O THC é o principal componente ativo da maconha, responsável pelos efeitos alucinógenos da planta.

O Conselho Federal de Medicina, citado pelo deputado, de fato adota postura resistente ao uso destes produtos. Ao lado da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), a instituição assinou um decálogo em que se contrapôs ao uso do termo “maconha medicinal”. O argumento usado foi o mesmo da Anvisa, o de que não podem ser considerados medicamentos.

“Como os poucos resultados obtidos estão longe de ser generalizados, mesmo que o uso controlado possa ser feito, deve-se levar em conta os potenciais malefícios já comprovados”, dizem as associações no item 3 do documento.

O autor do vídeo

Segundo seu perfil no site da Assembleia Legislativa do Paraná, Ricardo Arruda (PSL) é formado em finanças e foi presidente do Banco Comercial. Ele também se diz ligado à Igreja Mundial do Poder de Deus, a quem prestou consultoria financeira durante a carreira. Exerceu o primeiro cargo político em 2013, quando se tornou deputado federal após o licenciamento de Edmar Arruda. Em 2014, foi eleito deputado estadual do Paraná, sendo reeleito em 2018. Entre seus projetos, propôs a adoção no Paraná do “Escola Sem Partido”, movimento que defende que professores não podem falar de política em sala de aula.

Em seu perfil oficial do Instagram, ele também se define como “anti-PT” e apoiador do presidente Jair Bolsonaro.

De acordo com o site Paraná Portal, parceiro do UOL, ele já foi condenado a retirar um vídeo do ar após acusar uma médica do estado de estar “matando pacientes” por se recusar a prescrever o tratamento com cloroquina. A BandNews FM de Curitiba também informa que ele já foi multado pela Justiça Eleitoral por propaganda antecipada ao contratar outdoors com sua foto e a do presidente da República.

Procurada, a assessoria de Ricardo Arruda afirmou que o objetivo do vídeo era “informar a população” e “transmitir dados que a grande mídia não divulga”. Segundo a equipe do parlamentar, todas as informações relativas a questões de saúde citadas na fala foram extraídas de “médicos confiáveis e renomados”; sem citar nomes. A assessoria também garante que elas são checadas antes de serem publicadas.

Por que investigamos?

Em sua quarta fase, o Comprova verifica conteúdos suspeitos sobre pandemia, políticas públicas do governo federal e eleições. O vídeo verificado aqui teve mais de 40 mil visualizações e 1,2 mil curtidas no Twitter.

Em falas que reverberam as mesmas falácias do vídeo verificado, o presidente Jair Bolsonaro voltou a dizer que não tomará a vacina, por considerar que já está imunizado contra a covid-19 depois de ter sido infectado com o Sars-Cov-2.

A desinformação sobre o processo de imunização é prejudicial para a saúde pública e a manutenção do controle da pandemia no país.

Segundo monitoramento do Imperial College de Londres, pela primeira vez, desde o início da pandemia, a taxa de transmissão da doença no Brasil atingiu o menor nível desde abril de 2020, quando começou a ser medida.

O Comprova já publicou diversos conteúdos sobre imunização, como o que informa que é falso que documento da Suprema Corte dos EUA afirma que vacinados contra a covid-19 se tornam transumanos e a reportagem que mostra que deputada distorce entrevista de diretora do CDC para criticar vacinas e ‘passaporte sanitário’. O Estadão também já verificou alguns dos temas abordados nessa checagem, como uma postagem no Facebook desinforma ao transferir responsabilidade do combate à pandemia ao STF e uma reportagem que informa que testes de anticorpos não servem para medir proteção das vacinas contra a covid-19.

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.

Saúde

Investigado por: 2021-10-15

Tuíte engana ao dizer que vacina da Pfizer tem partículas contaminantes

  • Enganoso
Enganoso
É enganosa a publicação que circula nas redes sociais afirmando que há micropartículas contaminantes na vacina desenvolvida pela Pfizer contra a covid-19. Os argumentos utilizados pelo autor da postagem não encontram respaldo na realidade e vão contra os preceitos básicos da OMS para definir a aprovação de uso emergencial de uma vacina, que inclui a eficácia e segurança. A Pfizer, a Anvisa e especialistas ouvidos pela reportagem afirmaram que o conteúdo é de cunho enganoso e que os imunizantes passam por processos rigorosos antes da liberação.
  • Conteúdo verificado: A tradução de uma sequência de tuítes feita por uma conta que seria de um médico norte-americano publicada no grupo Médicos Pela Vida no Telegram. As imagens postadas falam de partículas presentes na vacina da Pfizer e termina afirmando que podem ser “contaminantes”. Nos comentários, os leitores do grupo de Telegram se perguntam se as imagens comprovariam teorias segundo as quais as vacinas têm como objetivo acabar com a humanidade.

Um grupo do Telegram voltado a pessoas contrárias à vacinação republicou uma sequência de tuítes feita por um suposto médico norte-americano.

A publicação enganosa diz que há micropartículas contaminantes dentro de imunizante desenvolvido pela Pfizer contra a covid-19 e gerou especulações de internautas sobre as vacinas serem criadas para prejudicar a humanidade.

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), a Pfizer e um cientista consultado pela reportagem apontam que as informações checadas não procedem, uma vez que as vacinas passam por três etapas de testagem, que avaliam a pureza, a eficácia e a segurança delas. O órgão de vigilância sanitária afirmou ainda que, na análise do imunizante, não constatou nenhum resíduo com potencial de impacto tóxico ou genético.

O Comprova tentou contatar o autor da postagem, mas as redes sociais do suposto médico John B. não permitem o envio de mensagens. A reportagem também não localizou qualquer indício de que o perfil seja, de fato, de um especialista norte-americano e a origem real das amostras que são apresentadas como sendo da vacina da Pfizer.

Enganoso, para o Comprova, é todo conteúdo retirado do contexto original e usado em outro, de modo que seu significado sofra alterações.

Como verificamos?

Foram realizadas buscas na internet para conseguir mais informações sobre quem é o suposto médico norte-americano John B. O primeiro resultado que aparece redireciona a busca para o Twitter do perfil que compartilhou as informações com críticas à composição da vacina desenvolvida pela Pfizer.

Com a falta de resultados capazes de mostrar a formação e mais detalhes sobre a carreira e pesquisa de John B., a reportagem realizou uma busca reversa da imagem do perfil no Twitter para localizar outras redes sociais do suposto médico, mas também não encontrou registros além da conta do Twitter e do Telegram — que também não traz detalhes.

Pela falta de registros, a reportagem suspeitou que o perfil pudesse ser falso. Utilizamos duas ferramentas de checagem para nos aproximarmos de respostas sobre quem estaria por trás do gerenciamento da conta: o Pegabot e o Botometer. Ambos foram desenvolvidos para identificar contas automatizadas no Twitter, também conhecidas como ‘bots’, ou ‘robôs’.

As plataformas indicaram que há mais de 51% de chance do Twitter ser gerido por um terceiro, que não seria médico, tampouco cientista.

O Comprova tentou contactar o suposto médico via Twitter, mas o perfil de Dr. John B. recusa automaticamente o recebimento de mensagens.

Junto à Pfizer, o Comprova quis saber se as imagens analisadas em microscópio eram verdadeiras. Também contactamos a Anvisa para identificar se havia algum registro de denúncia ou pesquisa capaz de colocar em dúvida a pureza do imunizante ComiRNAty — nome que a Pfizer deu à vacina contra a covid-19.

Também consultamos o site da OMS (Organização Mundial da Saúde) para levantar informações oficiais sobre os processos de aprovação e produção de vacinas, além de consultar o virologista e professor da UnB (Universidade de Brasília) Bergmann Ribeiro para conferir a veracidade das imagens.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 15 de outubro de 2021.

Verificação

Quem é o John B.?

A reportagem buscou informações sobre quem é o doutor John B. na internet. O primeiro resultado que aparece redireciona a busca para o Twitter do perfil que compartilhou as informações sobre supostas micropartículas contaminantes presentes na vacina da Pfizer.

Por meio de uma busca reversa da imagem do perfil de John B., o Comprova tentou localizar outras redes sociais do suposto médico, mas também não encontrou registros além da conta do Twitter.

O nome, muito comum nos Estados Unidos, indica para o perfil de diversos médicos, mas nenhum parecido com o que aparece na foto do Twitter.

A reportagem suspeitou que o perfil fosse falso, considerando que a mesma foto parece ter sido retirada de um banco de imagens. Esses bancos produzem fotografias produzidas, com cenários genéricos, que podem ser utilizadas para ilustrar conteúdos diversos. O padrão de imagens presente nesses sites se aproxima da foto utilizada no perfil de John B.

Outro elemento suspeito é o número expressivo de seguidores — mais de 31 mil até 6 de outubro de 2021 — em apenas quatro meses de criação do perfil, que, segundo o Twitter, foi criado em junho de 2021.

Então, a reportagem partiu para uma segunda análise na tentativa de descobrir quem são alguns dos seguidores do doutor John B.. De forma aleatória, entrou em alguns dos perfis e descobriu que, coincidentemente, também eram contas recentes e com conteúdos contrários à vacina.

Checagem do perfil

Para verificar se o perfil era ou não falso, utilizamos duas ferramentas de checagem: o Pegabot e o Botometer. Ambos foram desenvolvidos para identificar contas automatizadas no Twitter, também conhecidas como “bots”, ou robôs.

Segundo o Pegabot, há 51% de chances de o perfil de John B. ser gerido por alguém que se passa por um médico capaz de analisar imunizantes em nível microscópico. Pelas métricas apresentadas pela plataforma, há grandes chances de o perfil ser fake — falso, em português. O termo é usado para denominar contas ou perfis usados na Internet com o intuito de ocultar a identidade real de um usuário.

A métrica do Botometer calcula as chances de perfis serem verdadeiros ou falsos em uma escala de 0 a 5, sendo 5 a maior chance de ser falso e 0 a menor probabilidade. Ao checarmos o perfil do suposto médico, a plataforma apontou uma nota de 4.2. De acordo com a base de dados do Botometer, apenas 17% das contas com uma pontuação similar eram gerenciadas por humanos, enquanto outros 83% eram, de fato, perfis automatizados.

O Comprova tentou contactar o suposto médico via Twitter, mas o perfil de Dr. John B. recusa automaticamente o recebimento de mensagens.

Uma segunda busca foi feita pela reportagem via Telegram, no entanto, o grupo em que a mensagem verificada aqui circulou não redireciona o contato para o criador do conteúdo. Também procuramos o perfil dele no Instagram, mas não encontramos.

Por esse motivo, a reportagem não conseguiu acioná-lo para questionar o levantamento que ele diz ter realizado sobre a composição da vacina da Pfizer.

O que dizem a Anvisa e a Pfizer

O Comprova quis saber, então, se as supostas imagens da análise microscópica do imunizante da Pfizer eram verdadeiras. A empresa diz desconhecer a análise em questão e reafirma “que seu processo de fabricação respeita regras rigorosas de vigilância sanitária, para garantir a pureza e a segurança do imunizante”.

A Pfizer esclarece que todas as etapas de fabricação do imunizante, “incluindo análise de qualidade do produto, são minuciosamente avaliadas pelas agências regulatórias em todo mundo por ocasião de aprovação de uso e seguem processos contínuos de inspeção e análise por esses órgãos de acordo com a legislação vigente. A Pfizer dedica seus maiores esforços na vigilância da qualidade, segurança e eficácia dos insumos e produtos que fabrica e comercializa, disponibilizando seus produtos de forma segura e responsável ao mercado, em conformidade com as mais rigorosas normas de qualidade e segurança.”

E, por fim, a farmacêutica compartilhou o link da bula da vacina destacando que todas as informações, inclusive a sua composição, estão disponíveis ao público.

Nossa equipe também questionou a Anvisa se havia denúncia ou pesquisa que colocassem em dúvida a pureza do imunizante ComiRNAty. Por e-mail, a autarquia informou que os estudos de biodistribuição avaliados durante o registro do produto “não indicaram qualquer resíduo com potencial de impacto tóxico ou genético para as células do corpo humano”.

Segundo a agência, um ponto central na análise de todas as vacinas em uso no Brasil são os critérios de pureza e esterilidade nos ambientes de produção dos imunizantes. “A Anvisa mantém as indicações aprovadas para a vacina e não há dados que indiquem alteração no perfil de benefício-risco.”

Produção e aprovação de vacinas pela OMS

A aprovação de uma vacina pelo órgão conta com três fases de ensaios clínicos. Além disso, os imunizantes são avaliados para que sua segurança e eficácia sejam comprovados.

Essa aprovação regulatória precede o envio do imunizante pelos fabricantes à OMS. Com a entrega desse material ao órgão de saúde, um novo processo de avaliação é feito com ajuda da ONU (Organização das Nações Unidas) e de outras entidades internacionais para garantir a qualidade da vacina.

No site da OMS, a entidade explica que o controle de qualidade monitora de forma constante as vacinas e estabelece a gravidade de qualquer efeito colateral adverso e resposta das pessoas imunizadas.

Não existe um tempo mínimo determinado para o desenvolvimento de vacinas e a duração desse processo depende de uma série de variáveis, que incluem o processo, do teste pré-clínico à fabricação. Em casos de maior impacto para a saúde global, como o que ocorreu durante a pandemia em 2020, um procedimento legal permite que vacinas sejam aprovadas para uso emergencial, respeitando critérios de segurança e eficácia. A agilidade que acelerou o processo de fabricação das vacinas ocorreu porque entidades públicas e privadas uniram recursos financeiros e tecnológicos para combater a covid-19.

A organização afirma, ainda, que os estudos são realizados de forma frequente para determinar por quanto tempo a imunização será estabelecida pela vacina.

Bergmann Ribeiro, virologista e professor da Universidade de Brasília (UnB) classificou a divulgação das imagens como “absurdas” porque não dá para saber como foram feitas e se realmente usaram um frasco da vacina da Pfizer.

Segundo ele, qualquer remédio, antes de ser aprovado para uso, passa por testes rigorosos de qualidade e as agências de controle só aprovam após analisar e constatar que o conteúdo do frasco é o mesmo descrito na bula.

O especialista explica que o imunizante da Pfizer é composto por ácido nucleico (informação genética do coronavírus para produzir uma proteína chamada espícula), lipídios (que formam uma proteção para quando RNA-mensageiro for injetado nas pessoas), colesterol, fosfolipídio, sacarose, cloreto de sódio, cloreto de potássio, fosfato de sódio, por exemplo.

“Como se vê, são vários sais e, se eles forem ressecados, produzem cristais de diferentes tamanhos. Essas moléculas, num processo de precipitação, podem formar um cristalzinho. Nem por isso significa que o cristal é impureza. É um absurdo espalhar esse tipo de informação”, alerta Bergmann Ribeiro.

Por que investigamos?

Em sua quarta fase, o Comprova verifica conteúdos suspeitos sobre pandemia, políticas públicas do governo federal e eleições. O conteúdo verificado aqui teve mais de 37 mil visualizações no Telegram, com 149 comentários que, em sua maioria, falam sobre teorias conspiratórias a respeito de um “great reset” — grande reinicialização, em português — envolvendo a vacina contra a covid-19, o que não procede.

O impacto gerado por esse conteúdo enganoso é observado a partir desses comentários. Um deles é a desinformação e o outro é a aversão aos imunizantes, ainda que sejam comprovadamente seguros e eficazes em salvar vidas ao redor do mundo.

Além disso, o Comprova decidiu investigar o material por conta da fonte de difusão desses dados, que seria um suposto médico norte-americano. A reportagem tentou localizá-lo, mas não há indícios de que realmente seja um médico por trás do gerenciamento da conta que difundiu as informações.

Outras checagens verificaram conteúdos semelhantes, como a agência Aos Fatos, que desmentiu um estudo japonês que havia “encontrado’ nanopartículas de mRNA em pessoas vacinadas com a Pfizer. A BBC também produziu uma matéria que traz esclarecimentos sobre os boatos de DNA alterado, microchips e supostos efeitos colaterais das vacinas.

Enganoso para o Comprova é todo conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações. Também se encaixa nessa categoria a publicação que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

 

Saúde

Investigado por: 2021-10-13

É falso que documento da Suprema Corte dos EUA afirme que vacinados contra a covid-19 se tornam transumanos

  • Falso
Falso
É falso o vídeo que circula nas redes sociais em que um homem afirma que, segundo documento da Suprema Corte dos Estados Unidos, pessoas que receberam vacina de RNA mensageiro sofrem alterações no DNA e se tornam transumanas, podendo ser patenteadas. O link citado por ele é, de fato, do órgão de Justiça, mas o trecho que ele lê não consta no documento. Publicado em 2013, o documento informa que os genes humanos não podem ser patenteados, mas o DNA criado artificialmente pode ser reivindicado como propriedade intelectual.
  • Conteúdo verificado: Vídeo que circula nas redes sociais mostra homem com suposto documento da Suprema Corte dos Estados Unidos, afirmando que quem recebeu vacina de RNA mensageiro sofre alteração no DNA e deixa de ser considerado humano.

É falso o vídeo que circula em plataformas como TikTok, Facebook e Telegram em que um homem afirma que, segundo um documento da Suprema Corte dos Estados Unidos, as pessoas que se imunizaram com vacina de RNA mensageiro sofrem alteração no DNA, tornam-se transumanas e passam a ser consideradas bens patenteados do governo.

O documento apresentado pelo autor do vídeo é, de fato, uma decisão do órgão de Justiça norte-americano, mas não tem relação com a pandemia e não cita vacinas, como sugere o falso vídeo. O texto foi publicado em 2013, após decisão unânime da Suprema Corte determinar que os genes humanos não podem ser patenteados, mas que o DNA criado artificialmente pode ser reivindicado como propriedade intelectual. A decisão ocorreu após a empresa de biotecnologia Myriad Genetics reivindicar a propriedade de dois genes ligados ao câncer de ovário e de mama.

No vídeo, o autor inventa dados para atacar as vacinas, mas os imunizantes contra a covid-19 são eficazes e seguros, de acordo com diversas autoridades de saúde, como a Organização Mundial da Saúde (OMS) e o Centro de Controle de Doenças (CDC) dos Estados Unidos.

Procurado, o autor do vídeo insistiu que não relatou informações falsas. Também foi feito contato com o canal que distribuiu o conteúdo com tradução para o português, mas não houve retorno até a publicação deste texto.

O Comprova considera falso o conteúdo que tenha sido inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.

Como verificamos?

Ao buscar as palavras “transhuman”e “RNA” no Facebook, a reportagem encontrou o vídeo compartilhado na página Holistic Health Through Nature (em português, Saúde Holística por meio da Natureza), página que compartilha, entre outras coisas, publicações antivacinação. Nela, diferentemente da versão que o Comprova recebeu pelo Telegram, aparece o nome do autor do vídeo.

Foi feito contato com o perfil do autor do vídeo no Facebook e com a página que legendou o vídeo em português que viralizou no Telegram.

Para confirmar que o arquivo citado era original, a reportagem buscou o documento mencionado no vídeo no site da Suprema Corte dos Estados Unidos, mas verificou que a página “Opiniões do Tribunal” só mostra arquivos de 2014 a 2021. Para ter a certificação de que o documento é real, foi feita uma busca no Google, que encontrou o texto citado no vídeo.

Com a ferramenta de tradução do Google, foi possível ler a íntegra do documento da Corte em português e verificar que a publicação dele ocorreu em junho de 2013.

Por último, a reportagem consultou o site do CDC para checar informações sobre a segurança das vacinas.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 13 de outubro de 2021.

Verificação

A decisão

O documento citado pelo autor do vídeo – que, inclusive, publica o link para o texto no site da Suprema Corte – é uma decisão publicada em junho de 2013 pelo órgão.

A decisão se referia ao caso em que a empresa Myriad Genetics reivindicava a propriedade de dois genes ligados ao câncer de ovário e de mama. Ao contrário do que afirma o autor do vídeo, o tribunal não permite que o DNA humano seja patenteado.

“Um segmento de DNA de origem natural é um produto da natureza e não pode ser patenteado simplesmente porque foi isolado, mas o DNA complementar pode ser patenteado porque não se produz de maneira natural”, diz a segunda página do documento.

Em entrevista à AFP Fact Check sobre postagem com conteúdo semelhante, a pesquisadora Jennifer Piatt, do Centro de Legislação e Política de Saúde Pública da Universidade do Estado do Arizona, diz que “a alegação feita nas redes sociais é uma distorção completa de como as vacinas funcionam e do que o tribunal diz”. Segundo ela, “em primeiro lugar, não há possibilidade de alteração do DNA humano por meio das vacinas” e, ao afirmar que a Corte decidiu que pessoas podem ser patenteadas, “eles (os desinformadores) estão olhando para isso por uma perspectiva que nem está presente na decisão do tribunal”.

Segurança das vacinas

No vídeo que está viralizando, o autor enfatiza a questão da vacina, sugerindo que as pessoas não devem tomar a “picadinha estúpida” – ou seja, o imunizante contra a covid-19. Mas, no documento citado por ele não há relação com qualquer vacina ou mesmo citação sobre alterações causadas por vacinas no DNA humano.

De acordo com o CDC, “as vacinas são seguras e eficazes” e todos com mais de 12 anos são elegíveis à imunização.

Na área de perguntas e respostas sobre vacinas do site do órgão, há uma questão sobre a segurança dos produtos. A resposta: “Sim, as vacinas contra a covid-19 são seguras e eficazes. Centenas de milhões de pessoas nos Estados Unidos receberam as vacinas sob o mais intenso monitoramento de segurança da história do país”.

Especificamente sobre as vacinas de RNA mensageiro, o CDC afirma: “são um novo tipo de vacina para proteger contra doenças infecciosas” e “o benefício delas, como de todas as vacinas, é que as pessoas vacinadas ganham proteção sem nunca ter que correr o risco das graves consequências de adoecer de covid-19”.

Como diversos conteúdos desacreditando esses imunizantes já viralizaram, há, no site do órgão, a informação de que “eles não afetam ou interagem com o DNA de forma nenhuma”.

O autor do vídeo

Em seu perfil no Facebook, Ben Barlow publica conteúdos anti-vacina e anti-máscara. Também continua defendendo que as eleições norte-americanas, que deram a vitória ao democrata Joe Biden, empossado em janeiro, foram fraudadas.

Pelo menos oito conteúdos publicados por ele desde agosto de 2020 estavam marcados como “informação falsa”, “parcialmente falsa” ou “sem contexto” pelo Facebook. Procurado, Barlow não respondeu sobre a origem da informação falsa que compartilha no vídeo. Ele insistiu que não divulgou falsidades e chamou a vacina de “veneno forçado que eles estão nos empurrando”.

Por que investigamos?

Em sua quarta fase, o Comprova verifica conteúdos suspeitos sobre pandemia, políticas públicas do governo federal e eleições. O vídeo verificado aqui teve mais de 45 mil visualizações e mais de 2,4 mil interações até 11 de outubro.

O conteúdo verificado aqui tenta enganar e causar desinformação referente à segurança das vacinas, que já foram cientificamente comprovadas como o principal método contra o coronavírus. Além disso, ao citar que “causa alteração no DNA humano”, o vídeo pode gerar pânico na população, aumentando o número de pessoas que não querem tomar a vacina por medo.

Outros veículos verificaram conteúdos semelhantes, como AFP Fact Check e Newschecker. Só nos últimos dias o Comprova classificou como enganoso post da deputada federal Bia Kicis que distorcia entrevista de diretora do CDC para criticar vacinas e “passaporte sanitário” e vídeo de apresentadora com estilista dizendo que o número de pessoas infartadas em Israel não cresceu após a imunização.

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.

Saúde

Investigado por: 2021-10-11

Deputada distorce entrevista de diretora do CDC para criticar vacinas e ‘passaporte sanitário’

  • Enganoso
Enganoso
Tuíte engana ao trazer trecho descontextualizado de uma entrevista da diretora do CDC, Rochelle Walensky, feita em agosto, para afirmar que o fato de a vacina contra a covid-19 não prevenir totalmente a transmissão do vírus mostra a “total inutilidade do passaporte sanitário”. Na verdade, pessoas imunizadas tendem a se infectar menos e a apresentar uma carga viral mais baixa comparada com os não vacinados, o que indica que a medida traz benefícios do ponto de vista da saúde pública.
  • Conteúdo verificado: Tuíte de deputada federal traz o trecho de uma entrevista da diretora do Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos Estados Unidos. Na legenda, diz que o órgão sanitário estaria admitindo que as vacinas contra a covid-19 não previnem a transmissão e que isso mostraria a “total inutilidade do passaporte sanitário”.

Para criticar o chamado “passaporte da vacina” adotado em dezenas de municípios brasileiros para reduzir o risco de contágio e incentivar a vacinação, a deputada federal Bia Kicis (PSL-DF) compartilhou no Twitter um trecho de uma entrevista antiga de Rochelle Walensky, diretora do Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC), órgão sanitário dos Estados Unidos. O conteúdo havia sido veiculado dois meses antes na rede de televisão CNN e não sustenta o argumento da deputada, de que vacinados e não vacinados apresentam o mesmo risco de transmissão do coronavírus e, portanto, a medida seria inútil.

Sem o contexto original, o trecho solto de uma fala de Walensky causou confusão nas redes. Na época da entrevista, início de agosto, os Estados Unidos enfrentavam uma escalada no número de casos de covid-19 por conta da variante Delta. Diante desse fato e de estudos comprovando que pessoas imunizadas também poderiam transmitir o vírus, o CDC passou a recomendar novamente o uso de máscaras para toda a população em espaços públicos fechados, como forma de reduzir o risco de contágio.

Walensky aparece na entrevista reforçando a necessidade das medidas de prevenção, como uso de máscaras, e convocando as pessoas para que se vacinassem assim que possível. No trecho recortado pela deputada Bia Kicis, a diretora do CDC afirma que as vacinas “continuam funcionando excepcionalmente bem” em prevenir quadros graves e mortes, mas que elas “não podem mais prevenir a transmissão” em um cenário de avanço da Delta.

Isso não quer dizer que vacinados e não vacinados tenham a mesma chance de serem contaminados e passar o vírus adiante. Os fabricantes das vacinas aprovadas nos Estados Unidos comprovaram, por meio de estudos, que elas funcionam para diminuir as infecções na população, além de drasticamente reduzir a chance de quadros graves e mortes. O que ocorre é que elas não são infalíveis — no momento em que existe uma alta circulação do vírus, o número de casos da doença entre pessoas vacinadas, ainda que menos frequente, também aumenta.

Estudos científicos demonstram ainda que a Delta consegue romper essa barreira com mais facilidade do que outras cepas do vírus. Porém, novas pesquisas com as vacinas mostram que elas continuam sendo eficazes contra a Delta. E mesmo que haja uma infecção entre os vacinados, essa pessoa tende a transmitir menos o vírus do que aqueles que se recusam a tomar o imunizante, o que vem sendo associado por especialistas a uma carga viral mais baixa e a uma duração mais curta dos sintomas.

A posição atual do CDC, atualizada em 15 de setembro, é de que “pessoas totalmente vacinadas têm menos probabilidade do que pessoas não vacinadas de adquirir Sars-CoV-2” e de que as eventuais “infecções com a variante Delta em pessoas vacinadas têm potencialmente menos transmissibilidade do que as infecções em pessoas não vacinadas, embora estudos adicionais sejam necessários”.

O Comprova classificou o conteúdo como enganoso porque a deputada usa informações de forma a induzir uma interpretação errada – de que as vacinas não auxiliam a reduzir a transmissão do vírus para diminuição de casos. A deputada foi procurada, mas não retornou o contato.

Como verificamos?

Primeiramente, o Comprova buscou no Google o link do vídeo original da entrevista feita pela CNN dos Estados Unidos, encontrando no Facebook da emissora. Em seguida, foi procurada uma transcrição completa. Além disso, também foram buscadas notícias que repercutiam as falas do vídeo com Rochelle Walensky.

A partir dessas informações, o Comprova foi em busca de dados sobre o número de vacinados e de pessoas que testaram positivo para a covid-19 nos Estados Unidos na data que a entrevista foi ao ar.

Foram contatados os especialistas Juarez Cunha, presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), e o doutor em Imunologia e professor da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) Daniel de Oliveira Gomes.

A reportagem também consultou a biomédica Mellanie Fontes-Dutra, coordenadora da Rede Análise Covid-19, difusora de dados sobre o coronavírus em redes sociais, e a epidemiologista e professora da Ufes Ethel Maciel. Por fim, o Comprova contatou o CDC e a deputada Bia Kicis, autora do post verificado, mas não obteve resposta de ambos até a publicação desta checagem.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 11 de outubro de 2021.

Verificação

Origem do vídeo

A postagem é da deputada federal Bia Kicis (PSL-DF), presidente da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania na Câmara. A parlamentar é uma das lideranças da base aliada de Jair Bolsonaro (sem partido) na casa legislativa.

Na legenda, a deputada escreve: “A diretora do CDC, Rochelle Walensky, agora admite que a v4c1n4…não pode prevenir a transmissão. Isso mostra a total inutilidade do passaporte sanitário, além da grave violência à liberdade”. Kicis substituiu a palavra “vacina” por letras e números. Essa é uma tática utilizada por muitos perfis e páginas que buscam escapar do monitoramento das redes.

O vídeo é apenas um trecho de uma entrevista em inglês de Rochelle Walensky para a rede de televisão CNN, dos Estados Unidos. Quem faz as perguntas é o jornalista Wolf Blitzer.

A partir dessas informações, o Comprova pesquisou no Google por “Rochelle Walensky CNN Wolf Blitzer” e encontrou o conteúdo original na página da CNN no Facebook. A entrevista é de 5 de agosto deste ano — ou seja, Bia Kicis resgatou um conteúdo de quase dois meses antes e o compartilhou como se fosse uma revelação recente.

O Comprova encontrou ainda a transcrição completa do programa The Situation Room daquele dia e uma notícia publicada no site da CNN repercutindo as declarações da diretora do CDC.

Um tuíte de Wolf Blitzer confirma ainda a data e o horário da entrevista com Rochelle Walensky e o motivo do convite: os Estados Unidos haviam registrado mais de 100 mil casos de covid-19 em 24h. Era o começo de uma nova onda de covid-19 no País, segundo dados do órgão de saúde, cenário atribuído ao aumento do número de casos da variante Delta, quando metade da população tinha o esquema vacinal completo.

O que diz a entrevista

O vídeo original postado pela CNN tem 3 minutos e 25 segundos, enquanto o trecho usado por Bia Kicis no Twitter explora apenas 26 segundos. De acordo com a transcrição completa do programa, a participação da especialista durou cerca de 20 minutos.

No recorte da deputada, Walensky diz: “Nossas vacinas estão funcionando excepcionalmente bem. Elas continuam funcionando bem com a Delta em relação a quadros graves da doença e mortes. Elas previnem isso”.

E completa a seguir: “Mas o que elas não podem mais fazer é prevenir a transmissão. Então, se você está indo para a casa de alguém que não foi vacinado ou que não pode ser vacinado, imunossuprimido ou um pouco frágil, com comorbidades de alto risco, eu sugiro que você use uma máscara em ambientes públicos fechados”.

A postagem engana porque dá a entender que o posicionamento oficial do CDC é de que uma pessoa vacinada tem a mesma chance de transmitir o vírus do que alguém que não tomou a vacina, o que não é verdade. Esse tipo de alegação desconsidera o fato de que a imunização reduz a possibilidade de infecção em primeiro lugar, conforme os estudos científicos que resultaram na aprovação dos imunizantes pelo órgão sanitário.

Na entrevista, Walensky falava sobre as chamadas taxas de “breakthrough”, ou seja, sobre os casos de pessoas totalmente vacinadas que eventualmente se contaminam com o vírus da covid-19. Nenhuma vacina elimina completamente a chance de pegar o vírus, desenvolver a doença ou mesmo vir a óbito, mas é fato que os imunizantes protegem a população, dificultam a infecção e reduzem drasticamente a chance de agravamento do quadro.

Nesse ponto, as vacinas contra a covid-19 se assemelham a outras, como a do rotavírus, que não conseguiram chegar a um patamar esterilizante. Esse debate não é uma novidade: especialistas alertavam para esse fato desde o começo do ano, quando os países davam os primeiros passos na imunização.

Vacinação X transmissão

Na época, a entrevista da diretora do CDC repercutiu em uma reportagem da CNN. A publicação lembra, por exemplo, que na semana anterior, em 30 de julho, o órgão sanitário havia divulgado um estudo indicando que a variante Delta poderia produzir uma quantidade semelhante de vírus em pessoas vacinadas e não vacinadas no caso de uma contaminação. “Dados sugerem que pessoas vacinadas que pegam o vírus podem apresentar uma tendência parecida de espalhar o vírus em relação aos não vacinados”, informa o conteúdo. Com o estudo, que foi considerado uma “descoberta fundamental” na época, o CDC voltou atrás na recomendação sobre máscaras em ambientes fechados.

Meses antes da entrevista de Walensky, já era discutido entre cientistas a questão da transmissibilidade em pessoas vacinadas, como é possível ver em matéria da BBC de fevereiro: “Não há evidências de que qualquer uma das vacinas covid-19 atuais possa impedir completamente a infecção de pessoas – e isso tem implicações em nossas perspectivas de obter imunidade coletiva”.

E na da revista Fapesp, em março: “Estudos clínicos sobre as formulações em uso revelam que elas são eficazes na prevenção da enfermidade, reduzindo os sintomas e evitando quadros graves, mas não se sabe ainda se também conseguem impedir que o vírus invada as células humanas e inicie o processo de replicação”.

Para Juarez Cunha, presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), sempre se soube que, mesmo com a vacinação, o vírus continuaria circulando. “No início, não se tinha muitas respostas, mas a partir do momento que veio a variante Delta isso mudou. Ficou bem estabelecido, que independente da vacina utilizada, mesmo a pessoa vacinada, ela pode se infectar e transmitir”, afirma.

Além disso, ele ressalta que, no caso dos EUA, há dois fatores importantes: uma taxa bastante elevada de pessoas não vacinadas e, ao mesmo tempo, uma alta circulação da variante Delta, que é o que não tem sido observado no Brasil, já que aqui a Delta não circulou com tanta força.

Reportagem da Nature, de 12 de agosto, destaca que “relatórios de vários países parecem confirmar o que os cientistas temiam depois que a variante atravessou a Índia com velocidade alarmante em abril e maio: a Delta tem mais probabilidade do que outras variantes de se espalhar por pessoas vacinadas”.

“Dados de testes covid-19 nos Estados Unidos, Reino Unido e Cingapura mostram que as pessoas vacinadas que são infectadas com Delta SARS-CoV-2 podem carregar tanto vírus no nariz quanto as pessoas não vacinadas. Isso significa que apesar da proteção oferecida pelas vacinas, uma proporção de pessoas vacinadas pode passar para a Delta, possivelmente auxiliando no seu aumento”, acrescenta o conteúdo.

Publicação no site da Universidade Johns Hopkins traz que os dados do estudo do CDC mostraram “que pessoas vacinadas infectadas com a variante delta podem carregar cargas virais detectáveis ​​semelhantes às de pessoas não vacinadas, embora nos vacinados esses níveis diminuam rapidamente. Também há dúvidas sobre o quão cultivável – ou viável – esse vírus recuperado de pessoas vacinadas realmente é”.

Segundo a publicação, embora pareça desencorajador, é importante manter três coisas em mente: as vacinas permanecem altamente eficazes na prevenção de doenças graves; infecções disruptivas entre indivíduos vacinados permanecem incomuns e a maioria das novas infecções por covid-19 nos Estados Unidos estava ocorrendo entre pessoas não vacinadas.

O texto destaca que é fundamental entender que o estudo é derivado principalmente de um local no qual as atividades e os ambientes que estavam levando a infecções não são necessariamente representativos da vida cotidiana de um indivíduo totalmente vacinado. O estudo descreve 469 residentes de Massachusetts que foram infectados em um surto de julho no Condado de Barnstable, que inclui o destino de férias de verão Provincetown. Nenhuma morte foi relatada entre eles.

Pesquisas recentes

Uma série de estudos científicos contrariam a tese de que vacinados teriam o mesmo risco de adquirir a doença — e consequentemente de transmiti-la — do que não vacinados, mesmo em um cenário de prevalência da variante Delta. Desde o final de agosto já existem dados para os quatro imunizantes aplicados no Brasil — Coronavac, Astrazeneca, Pfizer, Janssen — como mostra essa reportagem do UOL.

Cientistas da Universidade de Oxford, por exemplo, recentemente divulgaram um artigo em que examinam 139 mil contatos próximos rastreados de 95 mil casos de covid-19 no Reino Unido entre janeiro e agosto deste ano. O objetivo era comparar qual foi o impacto de uma ou duas doses das vacinas da Astrazeneca e da Pfizer na transmissão da doença contra as variantes Delta e Alfa.

De acordo com esse estudo, pessoas que haviam recebido duas doses da vacina da Pfizer tiveram 58% menos chance de pegar a variante Delta de uma pessoa contaminada com a qual tiveram contato. No caso da Astrazeneca, o risco foi reduzido em 36%. Esse percentual sobe para 82% e 63% contra a variante Alfa. Os autores, por outro lado, alertam para uma redução da efetividade três meses depois da segunda dose, algo que também já vinha sendo debatido na comunidade científica e que indica a necessidade de doses de reforço em grupos de risco. Apesar de ainda não ter sido revisado e publicado, o estudo foi citado pela Nature, uma das principais revistas científicas do mundo.

Nos estudos que embasaram a aprovação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) no Brasil, realizados ao longo do ano passado, os imunizantes da Pfizer e da Astrazeneca tiveram 95% e 70,4% de eficácia geral, ou seja, reduziram o risco de casos sintomáticos da doença nessa proporção. A Coronavac teve 50,38% e a Janssen, 67%.

Outras pesquisas focaram na comparação entre contaminados no grupo de pessoas vacinadas versus pacientes não vacinados — e mais uma vez, o grupo protegido se saiu melhor nessas análises preliminares. Pesquisadores das universidades de Harvard, Yale e Columbia, nos Estados Unidos, analisaram amostras de 175 indivíduos infectados de uma liga de basquete. Vacinados ou não, eles atingiram o pico de carga viral de forma semelhante, por volta do terceiro dia. Só que os vacinados conseguiram eliminar o vírus já no quinto dia, contra sete a oito dias nos demais. O artigo ainda passa por revisão

Dessa forma, apesar de estudos anteriores, na época da fala de Walensky, descobrirem que as pessoas infectadas com Delta têm aproximadamente os mesmos níveis de materiais genéticos virais em seus narizes, pesquisas mais recentes sugerem que as pessoas vacinadas têm menos probabilidade de espalhar o vírus se subsequentemente contraírem Delta.

Como aponta um artigo escrito para a revista Nature, encaminhado ao Comprova pela epidemiologista Ethel Maciel, os níveis de vírus presentes no nariz de pessoas vacinadas caem mais rápido do que os de pessoas infectadas não vacinadas — e elas também são menos propensas a contaminar contatos próximos.

O que dizem especialistas e órgãos de saúde

A posição oficial do CDC está disponível no site do órgão sanitário norte-americano, com atualização mais recente em 15 de setembro de 2021. De acordo com o texto, “dados mostram que mostram que pessoas totalmente vacinadas têm menos probabilidade do que pessoas não vacinadas de adquirir SARS-CoV-2, e infecções com a variante Delta em pessoas com esquema vacinal completo estão associadas com menos desfechos clínicos graves”.

O CDC afirma ainda que “as infecções com a variante Delta em pessoas vacinadas têm potencialmente menos transmissibilidade do que as infecções em pessoas não vacinadas, embora estudos adicionais sejam necessários”. A nota lembra que o risco não pode ser completamente eliminado enquanto existir uma elevada circulação do vírus na comunidade.

Da mesma forma, o posicionamento da Organização Mundial da Saúde (OMS) é que os dados apontam que a chance de infecção e de transmissão é menor entre os vacinados, mas a entidade sugere que esse poder das vacinas é menos crítico comparado à queda de hospitalizações e mortes. A OMS também destaca que existem incertezas a partir do momento que surgem novas variantes de preocupação.

Juarez Cunha, da SBIm, explica que “as pessoas vacinadas, quando se infectam, têm uma carga viral mais baixa comparada com os não vacinados, ou seja, transmitem muito menos que uma pessoa com a doença natural. Para as formas graves e óbitos, a eficácia das vacinas, mesmo com a variante delta, tem se mantido bastante elevada”.

Segundo o médico, com esse cenário, é fundamental manter as medidas farmacológicas, em especial o uso de máscaras. “As vacinas não são só a proteção do indivíduo, mas a proteção da coletividade. Quanto maior o número de pessoas vacinadas, menor as chances de continuar circulando os vírus, inclusive de aparecerem novas variantes”, comenta.

A biomédica Mellanie Fontes-Dutra observa que as vacinas podem impactar na proteção contra infecção (proteger contra a entrada do vírus na célula) e podem reduzir a replicação viral do Sars-Cov-2 na célula (o que gera menos partículas virais).

Assim, os vacinados, reforça Mellanie, a partir dessa redução da replicação viral, liberam menos partículas virais para o ambiente, permanecem contagiosos por um tempo menor (comparado com não vacinados), além de se protegerem contra a doença sintomática e suas versões mais sérias.

“Portanto, já temos um conjunto de evidências demonstrando que vacinados transmitem menos do que não vacinados”, frisa a especialista, que atua na Rede Análise covid-19, equipe Halo da ONU, grupo InfoVid, Todos Pelas Vacinas e União Pró-Vacina.

Ela também já havia abordado o assunto em postagens no Twitter, como a que diz que imunização reduz transmissão de delta e indivíduos vacinados transmitem menos e a que apresentou dados de Harvard sobre infecção e transmissão entre vacinados e não vacinados. Nessa publicação, ela pontua como as vacinas contribuem para a redução do contágio.

‘Passaporte da vacina’

O chamado “passaporte sanitário” citado pela deputada Bia Kicis — ou “passaporte da vacina” — é como ficou conhecida popularmente a exigência de comprovante de vacinação contra a covid-19 para que as pessoas frequentem certos ambientes, sejam eles públicos ou privados, como bares, restaurantes, academias, shows, museus e outros estabelecimentos durante a pandemia.

Diferentemente do que sugere a parlamentar, esse tipo de medida poderia, em tese, diminuir o risco de contágio ao barrar a presença de pessoas suscetíveis ao vírus dentro de um ambiente fechado, por exemplo. Já existem pesquisas indicando que as eventuais falhas vacinais – que é quando a vacina não gera imunidade efetiva, portanto, se exposta ao agente infeccioso, a pessoa pode adoecer – geralmente resultam em menor carga viral e duração reduzida de sintomas, o que contraria a ideia de que o potencial de transmissão seria o mesmo independentemente de quem frequenta o local.

Além disso, esse tipo de medida costuma ser imposta pelo poder público como um incentivo para a população buscar o posto de saúde. Em um boletim técnico divulgado em 1º de outubro, a Fiocruz recomendou a adoção da medida em todo o território nacional como forma de incentivar a imunização no País e de proteger mais a população.

O professor da Ufes Daniel de Oliveira Gomes ressalta que a alegação da deputada, relacionando a transmissibilidade ao passaporte da vacina, não procede.

Embora seja de conhecimento público, desde o início da vacinação, que nenhum dos imunizantes bloqueia a transmissão, Gomes observa que a parlamentar desconsiderou que, ao ser vacinada, a pessoa tem menos possibilidade de manifestar a doença nas fases moderada e severa e, portanto, de ser hospitalizada.

“É bom lembrar que são raras as vacinas que bloqueiam a transmissão; não é nenhum demérito da vacina da covid. Não impede a transmissão, mas previne uma evolução clínica com gravidade”, pontua.

Na avaliação de Gomes, o passaporte sanitário é uma importante estratégia de política pública porque, indiretamente, leva mais pessoas a se vacinar. “Porque se flexibilizadas todas as situações, sem necessidade de comprovação da vacina, o indivíduo que naturalmente é mais resistente vai falar que não precisa se vacinar. O passaporte é uma forma de fomentar a própria campanha de vacinação”, argumenta.

O professor faz ainda ponderações do ponto de vista de saúde pública. Ele diz que o passaporte vai restringir o acesso a locais eventualmente com aglomeração, e se as pessoas estão vacinadas, apesar da possibilidade do vírus circular, reduz-se a incidência de infecção.

“O vírus pode ser disseminado, mas o indivíduo tem anticorpos neutralizantes (protetores) que impedem de acessar, infectar as células. E, caso infecte, não vai impactar de maneira significativa”, reforça.

De acordo com um levantamento da Confederação Nacional de Municípios (CNM), ao menos 249 municípios brasileiros impuseram algum tipo de regra desse tipo até o final de setembro. A pesquisa ouviu gestores de 2.461 cidades, de um total de 5.568.

A exigência está presente em uma série de localidades fora do Brasil, como Nova York, nos Estados Unidos. Driblando as restrições, o presidente Jair Bolsonaro apareceu em uma foto comendo pizza na calçada durante a viagem para a Assembleia Geral da ONU. Ele afirma que não se vacinou até hoje.

Reportagem do G1 de agosto cita ainda os exemplos de França, Itália, Israel e China. Outra notícia, do El País, do começo de agosto, menciona ao todo 21 países da União Europeia, incluindo Portugal, Grécia e Dinamarca. Um terceiro levantamento, da CNN Brasil, acrescenta informações sobre os casos de Japão e Coreia do Sul.

Críticas de bolsonaristas

A postagem de Bia Kicis, uma das principais aliadas do presidente Jair Bolsonaro na Câmara, vai ao encontro das declarações recentes do presidente e de outros integrantes do governo, como o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga.

Bolsonaro se posicionou contra o “passaporte”, inclusive, em seu discurso na ONU. “Apoiamos a vacinação, contudo o nosso governo tem se posicionado contrário ao passaporte sanitário ou a qualquer obrigação relacionada a vacina”, afirmou o mandatário brasileiro, que causou desconforto no evento diplomático como único líder do G20 a sustentar publicamente que recusou o imunizante.

Em 27 de agosto, em uma agenda no Rio de Janeiro, Queiroga classificou a adoção do “passaporte” como uma medida “descabida”. “Você começar a restringir a liberdade das pessoas, exigir um passaporte, carimbo, querer impor por lei uso de máscaras para estar multando as pessoas, indústria de multa, nós somos contra isso”, disse.

Outro a atacar a medida foi o secretário especial de Cultura, Mário Frias. “Nenhum prefeito irá decidir o que os órgãos vinculados a mim irão ou não fazer. Não aceitarei fazer parte do teatrinho autoritário sanitarista. Nas entidades vinculadas da Cultura, não iremos adotar o abominável passaporte de vacinação, ponto final”, escreveu em sua conta no Twitter, no dia 24 de setembro.

Por que investigamos?

Em sua quarta fase, o Projeto Comprova checa conteúdos de redes sociais sobre políticas públicas do governo federal e sobre a pandemia que alcancem uma grande quantidade de visualizações, reações e compartilhamentos.

O tuíte da deputada Bia Kicis teve quase 10 mil curtidas e mais de 3,5 mil retuítes em pouco mais de uma semana, de acordo com a plataforma CrowdTangle. Publicações enganosas sobre as vacinas contra a covid-19 são perigosas porque podem levar a população a colocar a saúde em risco.

O Comprova já verificou anteriormente que a deputada defendeu o uso da ivermectina contra a covid-19, mesmo que o vermífugo não tenha eficácia comprovada contra a doença, e afirmou que máscaras podem causar problemas à saúde, o que também é mentiroso.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; ou ainda aquele que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Saúde

Investigado por: 2021-10-07

Número de pessoas infartadas em Israel não cresceu após vacina

  • Enganoso
Enganoso
É enganoso que motos e desfibriladores estejam sendo empregados em Israel porque pessoas estão infartando após serem vacinadas contra a covid. Os equipamentos pertencem ao serviço nacional de emergência e já eram utilizados em socorros antes da pandemia e da imunização. Além disso, o Ministério da Saúde do país negou aumento de ocorrências coronárias.
  • Conteúdo verificado: Vídeo no YouTube em que apresentadora e estilista conversam sobre a pandemia em Israel. Eles dizem que está havendo grande quantidade de infartos entre pessoas vacinadas contra a covid-19.

Motos e desfibriladores não estão sendo empregados em Israel para socorrer pessoas que estariam infartando “como moscas” após terem sido vacinadas contra a covid-19. A afirmação foi feita de forma enganosa em uma live da qual participam uma apresentadora e um estilista brasileiro que mora em Tel Aviv.

Procurado pelo Comprova, o Ministério da Saúde do país negou aumento de ocorrências coronárias, incluindo infarto. Além disso, os dois equipamentos citados no vídeo já eram utilizados pelo serviço nacional de atendimento a emergências e desastres antes da pandemia e da vacinação.

O Comprova procurou a dona do canal em que foi realizada a live, mas ela não respondeu até a publicação da verificação.

O conteúdo foi considerado enganoso porque usa dados imprecisos.

Como verificamos?

O Comprova assistiu à live, seguindo solicitação de um leitor que enviou o conteúdo por WhatsApp.

A partir do vídeo, capturou duas imagens – da moto e do desfibrilador – utilizando uma extensão para o navegador Chrome chamada Awesome Screenshot. A partir disso, foi utilizada a ferramenta TinEye para buscar imagens semelhantes publicadas na internet com auxílio de diversos buscadores, como o Google e outros.

Identificou que as imagens são de equipamentos pertencentes ao Magen David Adom (MDA), o serviço nacional de atendimento a emergências médicas e desastres de Israel. A reportagem encaminhou um e-mail, que não foi respondido.

Também foi contactado o Ministério da Saúde do país e realizada pesquisa a respeito de eventual relação causal entre as vacinas contra a covid-19. A reportagem também analisou os alertas sobre risco de miocardite e pericardite pós-vacinação com imunizantes com RNA mensageiro, como o da Pfizer.

Em seguida, foi realizado o levantamento de dados relacionados à vacinação e contaminação em Israel e, ainda, pesquisado quem são as duas pessoas que aparecem no vídeo. O Comprova procurou, por fim, a autora do perfil em que a entrevista foi publicada.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 7 de outubro de 2021.

Verificação

Motos e desfibriladores já eram usados antes da vacinação

Na live realizada no dia 29 de setembro, a apresentadora Karina Michelin e o estilista Mauricio Pollacsek, que mora em Tel Aviv, estão falando sobre a vacinação em Israel, embora utilizem eufemismos para se referirem ao assunto, como as palavras “agulhinha” e “benção”.

A partir de dezesseis minutos e oito segundos, ela afirma que, recentemente, motos começaram a rodar em Israel e desfibriladores foram espalhados por toda a cidade, pedindo para ele comentar o assunto.

Enquanto são apresentadas fotos dos equipamentos, o estilista afirma que a função da moto é apenas socorrer infartados e que estes “estão por todo lado”. Sem apresentar fontes, o estilista diz que estas pessoas possuem entre 18 e 30 anos e estão “infartando assim, como moscas”, acrescentando que 100% destes casos são de pessoas vacinadas.

O Comprova identificou postagens comprovando que as motocicletas já eram utilizadas antes de 2020, ou seja, quando não existia pandemia. No país, empresas interessadas em operar motocicletas de primeiros socorros precisam obter uma licença de operação do Ministério da Saúde.

Tanto a moto quanto o desfibrilador mostrados em fotos pertencem ao Magen David Adom , o serviço nacional de atendimento a emergências médicas e desastres de Israel, idealizado em 1915 e reconhecido por lei desde a fundação do estado.

Dentre os veículos que compõem a frota do MDA estão listadas as motos de suporte avançado de vida, cuja principal característica é o bom tempo de resposta no atendimento, principalmente em casos de obstrução respiratória, hemorragia maciça ou arritmias letais.

“O curto tempo de resposta para iniciar o tratamento médico avançado permite utilizar os recursos da Organização de maneira mais eficaz, chegar ao paciente imediatamente e fornecer ao paciente o tratamento servido por um paramédico experiente”, informa o site da empresa.

Há, ainda, a motocicleta de suporte de vida que permanece de plantão, sendo operada por um funcionário ou voluntário para acesso rápido às ocorrências principalmente em congestionamentos urbanos.

No site em hebraico da organização, é descrito que o serviço conta com cerca de 600 motocicletas que chegam ao local de ocorrência em 1 a 4 minutos, com equipamento médico adequado para a realização de operações que salvam vidas até a chegada da ambulância.

Sobre o desfibrilador, o estilista entrevistado diz que os equipamentos estão sendo instalados em “todo lugar”.

De fato, em Israel, o uso de equipamentos para reanimar vítimas de ataques cardíacos é aprovado pelo Ministério da Saúde e as máquinas estão espalhadas por parques, bairros, sinagogas e ruas. O aparelho não necessita de conhecimento médico para ser utilizado e pessoas comuns conseguem manusear, pois ao ser acionado ele mesmo fornece instruções para guiar o usuário.

Ao mesmo tempo, uma equipe do call center 101 — específico do MDA — recebe um chamado automático do equipamento e fica em contato com quem está manuseando o aparelho até que as equipes médicas cheguem ao local. O Comprova identificou que os desfibriladores já eram instalados no país antes da vacinação, como mostra este post, de julho de 2020, que comemora a inauguração de um novo posto para desfibrilador inteligente na cidade de Tiberíades.

Vacina e coração

O Ministério da Saúde de Israel informou não haver aumento da síndrome coronariana, que inclui ataques cardíacos, em adultos jovens.

Em junho, o Ministério da Saúde informou ter nomeado uma equipe epidemiológica para investigar a possível ligação entre casos de miocardite e a vacina. Conforme a publicação, entre dezembro de 2020 e maio de 2021, foram notificados 275 casos de miocardite e, destes, 148 ocorreram na época da vacinação.

As equipes concluíram haver alguma probabilidade de ligação entre a segunda dose e o aparecimento do problema entre homens jovens de 16 a 30 anos. Esta ligação foi considerada mais forte entre o grupo de idade mais jovem, de 16 a 19. Na maioria dos casos, a miocardite assumiu a forma de doença leve que passou em poucos dias.

Em maio, o Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) norte-americano também citou casos de miocardite relatados ao Sistema de Notificação de Eventos Adversos de Vacinas, relacionados aos imunizantes de RNA mensageiro.

Em setembro, informou que continua monitorando ativamente relatos de miocardite e pericardite após a vacinação, o que inclui a revisão de dados e registros médicos e a avaliação da relação com a vacinação. Os casos incluem principalmente adolescentes e adultos jovens do sexo masculino.

A miocardite é a inflamação do músculo cardíaco e a pericardite é a inflamação do revestimento externo do coração. Em ambos os casos, o sistema imunológico causa uma inflamação em resposta a uma infecção ou algum outro fator. Os sintomas podem incluir dor no peito, falta de ar ou palpitações.

O CDC continua a recomendar que todas as pessoas com 12 anos ou mais sejam vacinadas, defendendo que os riscos conhecidos da doença e suas complicações, possivelmente graves, como problemas de saúde de longo prazo, hospitalização e até morte, superam em muito os riscos potenciais de ter uma rara reação adversa à vacinação, incluindo o eventual risco de miocardite ou pericardite.

No Brasil, onde a Pfizer está registrada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária para uso por meio do Programa Nacional de Imunizações (PNI), do Ministério da Saúde, o órgão emitiu em julho um alerta sobre risco de miocardite e pericardite pós-vacinação, com base nos casos dos Estados Unidos. Os alertas sobre potenciais ocorrências dos dois problemas foram incluídos na bula do imunizante.

Até o momento, a Anvisa não relatou casos dessas complicações no Brasil. A agência brasileira esclareceu, na ocasião do alerta, que o risco de ocorrência desses eventos adversos é baixo, mas recomendou aos profissionais de saúde que fiquem atentos e perguntem às pessoas que apresentarem sintomas se elas foram vacinadas, especialmente com a vacina da Pfizer.

Vacinação em Israel

Israel tem hoje mais de 60% da população com idade acima dos 50 anos imunizada com três doses contra a covid. Mais de 80% acima dos 30 anos foi vacinada com a segunda e mais de 70% daqueles acima dos 16 anos com a primeira.

| Índice de vacinados com a primeira, a segunda e a terceira dose em Israel no dia 06/10/2021, quando a captura foi realizada pelo Comprova. Fonte. 

No momento, o país atua para conter a quarta onda de contaminação, com a média diária caindo cerca de 54% nas últimas duas semanas e o número de casos graves entre os hospitalizados diminuindo. Conforme a imprensa local, a covid está se tornando, em Israel, uma pandemia de não vacinados.

No último dia 3, foram introduzidas novas regras para determinar o status de vacinação contra o coronavírus, tornando a injeção de reforço – terceira dose – uma exigência para inoculação completa e para passaportes de vacinação.

Para serem consideradas totalmente vacinadas no país, as pessoas devem atender a um dos seguintes critérios: ter 12 anos ou mais e ter recebido uma injeção de reforço há pelo menos uma semana; estar dentro de seis meses após ter recebido uma segunda injeção de vacinação; ou estar dentro de seis meses após ter testado positivo para covid-19.

Conforme a plataforma que apresenta os dados relacionados à pandemia em Israel, em números absolutos, as pessoas vacinadas com a segunda dose na faixa etária dos 20 e 49 anos são maioria das internadas no país, o que é natural quando a maior parte desta população está imunizada com pelo menos duas doses.

Quando essa análise é feita comparando-se o índice de internados para cada 100 mil habitantes, o número de pacientes não imunizados supera em muito os internados que receberam duas ou três doses de vacina.

 

No cenário onde são analisados os pacientes graves, estes são majoritariamente não vacinados, como demonstra o gráfico a seguir:

Desta forma, é possível analisar que as pessoas imunizadas com duas ou três doses estão desenvolvendo formas leves da covid-19.

Dados do Ministério da Saúde apontam que após as doses de reforço, os idosos israelenses totalmente inoculados têm uma chance em cinquenta de morte por covid em comparação com pessoas não vacinadas na mesma faixa etária.

Nos últimos sete dias de setembro, por exemplo, houve 6,43 mortes diárias por cada 100 mil israelenses com mais de 60 anos. Para os idosos que foram vacinados três vezes, esta média caiu para 0,13. Já a mortalidade diária para os idosos duplamente vacinados foi de 1,5.

A live e os autores

A live foi realizada no canal de Karina Michelin, que afirma ser apresentadora, jornalista e atriz. Sobre a página no YouTube, ela afirma ter como objetivo “evoluir a espécie humana neste mundo contemporâneo, completamente focado na arte do Pensamento Livre”.

Essa é a quarta vez que vídeos de Karina são verificados pelo Comprova. Em uma delas, concluiu-se ter sido apresentado um índice de forma equivocada e que errou ao dizer que pesquisadores da Organização Mundial da Saúde (OMS) não têm citações acadêmicas.

Em outra, o Comprova identificou não haver nenhuma evidência de que vacinas contra a covid-19 possam modificar a composição genética das pessoas. Uma terceira concluiu serem falsas alegações sobre validade de testes e notificações erradas nos EUA.

No vídeo aqui verificado, ela entrevista o estilista Mauricio Pollacsek, que se mudou para Tel Aviv há mais de 10 anos e no Brasil foi criador da marca Moshe. O Anuário Brasil-Israel 2014, produzido pela Câmara Brasil Israel de Comércio e Indústria, traz uma reportagem sobre o estilista paulistano.

Conforme a publicação, ele se formou na Universidade da Filadélfia e trabalhou em diversas empresas do setor nos Estados Unidos, no Brasil e em Israel como designer e ilustrador de moda, além de dar aulas na Academia de Design e Educação Wizo, em Haifa.

Apesar de nem Karina, nem Pollacsek serem especialistas em saúde, o tema da entrevista gira apenas em torno da pandemia e, além da afirmação enganosa sobre as motos e os desfibriladores, gera outras desinformações. Sem apresentar fontes e dados, por exemplo, o estilista afirma que 90% das pessoas internadas foram vacinadas e defende o tratamento com medicamentos sem comprovação científica para uso contra a covid.

Os dois comparam, ainda, a emissão de passaporte de vacinação e a proibição do acesso de não vacinados em determinados ambientes com o holocausto e o apartheid.

Por que investigamos?

Em sua quarta fase, o Comprova verifica conteúdos suspeitos sobre pandemia, políticas públicas do governo federal e eleições. A publicação aqui verificada foi sugerida por um leitor via WhatsApp e teve mais de 24 mil visualizações no YouTube desde a publicação, em 29 de setembro.

Conteúdos que desacreditam as vacinas ou minimizam os riscos da pandemia são perigosos porque podem levar a população a colocar a saúde em risco.

O vídeo possui mais de 480 comentários e muitos deles demonstram descrença na eficácia das vacinas. Uma usuária acredita ter “algo muito sério por trás dessas vacinas” e questiona “por que tanta pressão para obrigar as pessoas a serem ratos de laboratório?”. Já outra afirma ter “medo da minha filha morrer por causa dessa vacina maldita…”

Em relação à Pfizer, o Comprova já demonstrou que morte de adolescente não tem relação causal com a vacina; que um boato tirou de contexto estudo com adolescentes nos EUA para atacar o imunizante; que uma mensagem tirava de contexto dados sobre sintomas adversos da marca.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; ou ainda aquele que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar danos.