O Projeto Comprova é uma iniciativa colaborativa e sem fins lucrativos liderada pela Abraji e que reúne jornalistas de 42 veículos de comunicação brasileiros para descobrir, investigar e desmascarar conteúdos suspeitos sobre políticas públicas, eleições, saúde e mudanças climáticas que foram compartilhados nas redes sociais ou por aplicativos de mensagens.
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Investigado por: 2021-11-10

Prejuízo de refinaria não concluída no Maranhão foi de cerca de R$ 2 bilhões, não de R$ 5 bilhões

  • Enganoso
Enganoso
São enganosas as publicações coordenadas que afirmam que houve roubo de R$ 5 bilhões dos cofres públicos na construção da refinaria Premium I, em Bacabeira, no Maranhão, sem investigação dos órgãos responsáveis. A obra, que, de fato, não foi concluída, gerou prejuízos de cerca de R$ 2,1 bilhões para a Petrobras e é alvo de auditoria do órgão desde o início, além de ter sido mencionada na CPI da Petrobras na Câmara.
  • Conteúdo verificado: Publicações no Facebook afirmam que a construção da refinaria Premium I, em Bacabeira, no Maranhão, nunca saiu do papel e que foram roubados R$ 5 bilhões dos cofres públicos, sem que o caso tivesse atenção de órgãos fiscalizadores e imprensa.

Publicações coordenadas no Facebook enganam ao afirmar que foram roubados R$ 5 bilhões dos cofres públicos na construção da refinaria Premium I, em Bacabeira, no Maranhão. O projeto, que, de fato, não foi concluído, gerou prejuízo de R$ 2,1 bilhões para a Petrobras, segundo o Tribunal de Contas da União (TCU), e ainda está sob investigação.

O post também erra ao afirmar que “o TCU não viu” o caso. O órgão faz auditoria no projeto desde 2011 e já apontou irregularidades no decorrer dos anos, que foram mencionadas no relatório final da CPI da Petrobras na Câmara dos Deputados.

Também acusada de “não ver” a situação, segundo o post, a imprensa noticiou o cancelamento das obras, o reflexo da promessa não cumprida e o impacto que a decisão teve nas contas da estatal de petróleo.

A publicação engana ainda ao dizer que o vídeo utilizado, mostrando o então presidente Lula (PT) e sua equipe, é de 7 de fevereiro de 2005. A gravação, uma reportagem, foi publicada originalmente no dia 19 de janeiro de 2010 no canal do programa Maranhão TV no YouTube.

Procurado, o autor da publicação, que aparece em 11 grupos de Facebook diferentes, não respondeu ao contato. O Comprova considerou o conteúdo como enganoso porque usa dados imprecisos.

Como verificamos?

Para encontrar o vídeo original, fizemos uma busca no YouTube com o nome do canal que aparece no final do vídeo publicado no post verificado aqui e o nome do estado: MA TV Maranhão. O primeiro resultado é o canal do programa Maranhão TV.

Dentro do canal, na aba de vídeos, foi feita nova busca pelas palavras-chave “Petrobras” e “Premium I”.

O segundo vídeo que aparece entre os resultados é o mesmo do post desta verificação e foi postado em 19 de janeiro de 2010. Esta data foi confirmada como sendo a correta com outras reportagens da mesma época, como esta da TV Brasil, estatal, postada um dia antes.

O próximo passo foi pesquisar reportagens sobre o lançamento, a construção e o cancelamento da obra da refinaria.

Na sequência, a reportagem contatou a assessoria de imprensa da Petrobras por telefone e email.

Também verificamos as investigações de autoridades e órgãos de controle. No site da Câmara foi possível encontrar a página com o relatório final e o próprio documento da CPI da Petrobras. O relatório final menciona processos abertos no Tribunal de Contas da União. Na página do TCU na internet, com os números citados, foi possível fazer consultas por cada um. Buscamos informações também no Senado. Contatamos a assessoria de imprensa do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF), mas não obtivemos retorno.

Fizemos contato com a Secretaria de Comunicação do governo do estado do Maranhão, que não respondeu aos questionamentos. Procuramos ainda a Prefeitura de Bacabeira, mas o telefone e o email disponíveis no site da prefeitura não funcionam. Na página do Facebook, enviamos mensagem, mas não houve resposta.

Verificação

Início

A construção de uma refinaria no Maranhão havia sido citada pelo governo federal em 2007 em seu Plano de Aceleração do Desenvolvimento (PAC). No texto, o estado receberia investimentos em três eixos: logística, energia e infraestrutura social. O montante previsto no PAC era de R$ 9,1 bilhões, dos quais 5,6% destinavam-se ao eixo energia, que incluía a refinaria de petróleo.

O projeto da Premium I, da Petrobras, no município de Bacabeira, a 60 quilômetros de São Luís, foi lançado em 2010, pelo ex-presidente Lula (PT) e a a chefe da Casa Civil na época, Dilma Rousseff. A promessa era de que a fábrica entraria em funcionamento em 2015.

A construção foi incluída no Plano de Negócios e Gestão da Petrobras 2014-2018 e no PAC2. No entanto, a estatal cancelou a implantação da refinaria em 2015. Se a obra tivesse sido concluída, representaria a maior refinaria do Brasil, com capacidade de produzir cerca de 600 mil barris de petróleo por dia.

Obra cancelada

Existem alguns motivos para a construção da refinaria não ter sido concluída. Um deles é que o TCU apontou irregularidades na obra. Em um relatório de fiscalização de abril de 2013, o órgão identificou indícios graves de irregularidade na terraplanagem — a única obra que teve início, mas que foi paralisada. De acordo com o TCU, somente em 1º de novembro de 2010, oito meses depois do lançamento, e já com a terraplanagem em andamento, é que foi assinado um contrato para elaboração do projeto básico da refinaria.

Outro motivo: em informações coletadas no site do Senado, a parceria da petroleira chinesa Sinopec com a Petrobras para construir a Premium I não deslanchou porque os chineses deixaram claro que não confiavam na paridade de preços no Brasil (equilíbrio entre os preços internos dos combustíveis e do petróleo no mercado internacional) e exigiram uma rentabilidade mínima de 12% ao ano — enquanto a Petrobras trabalhava com um índice de 8,7%. A refinaria iria processar diesel para exportação.

Além disso, um terceiro ponto destacado foi a destruição da vegetação no Maranhão, que causou danos ambientais por causa da terraplenagem e outros serviços – citado no relatório do TCU. Em 2017, a Petrobras foi condenada a pagar R$ 53,7 milhões por essa questão, em decisão resultante de ação civil pública proposta pela Procuradoria-Geral do Estado.

O fato de o empreendimento ter sido iniciado sem projeto básico também foi apontado pelo TCU.

A obra da Premium I foi alvo de investigações na Câmara dos Deputados na CPI da Petrobras. Foram apontadas irregularidades na refinaria, com base em processos do Tribunal de Contas da União: sobrepreço decorrente de jogo de planilha, prática na qual o construtor muda valores durante a execução da obra, prejudicando o contrato (processo 007.321/2011-2); falha de planejamento, ocasionando aditivos e atrasos injustificáveis nas obras e serviços com prejuízos à Petrobras (006.280/2013-7).

Gastos

Com terraplanagem, construção de canais perimetrais, canteiro de obras e pontes de acesso e cercas foram gastos, pela Petrobras, R$ 583 milhões.

Além disso, o TCU apontou que foram gastos mais R$ 1 bilhão em projetos, treinamentos, transporte e estudos ambientais pela empresa estatal.

Procurada pelo Comprova, a Petrobras disponibilizou documento com os resultados consolidados do terceiro trimestre de 2015, quando houve baixa contábil das obras das refinarias Premium I e Premium II – esta última no Ceará. Segundo o documento, houve prejuízo de R$ 2,7 bilhões em ambas. De acordo com reportagem do G1 à época, R$ 2,1 bilhões eram da Premium I e R$ 596 milhões, da Premium II.

o item 561 do documento do TCU indica que “em 2015, em face da limitação de funding [financiamento] e da falta de parceiros para o empreendimento, propôs-se o encerramento parcial dos projetos com prejuízo de R$ 2,8 bilhões contabilizados até dezembro de 2014”.

Ação articulada

O autor do post se identifica no Facebook como Marcos Rocha e integra o grupo “#bolsonarotemrazão” na mesma rede, onde ele publicou o conteúdo verificado aqui. A reportagem tentou entrar em contato, mas ele não respondeu.

Após ele fazer a publicação com as informações enganosas, ela foi compartilhada em sete grupos públicos do Facebook ao mesmo tempo, sendo todos de apoio ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido). Cerca de uma hora depois foi postada em outros quatro grupos.

Por que investigamos?

Em sua quarta fase, o Comprova verifica conteúdos suspeitos sobre pandemia, políticas públicas do governo federal e eleições. O post aqui verificado foi usado em ação coordenada e publicado em 11 grupos diferentes, sendo em sete deles ao mesmo tempo, e, segundo a ferramenta CrowdTangle, somou cerca de 500 interações até o dia 10 de novembro de 2021. Na página do autor da publicação, ela foi visualizada 1,3 mil vezes.

Ao aumentar o valor e alegar roubo de um dinheiro investido em obras da Petrobras no governo Lula, a publicação tenta descredibilizar o político, que lidera pesquisa Datafolha de intenção de voto para presidente em 2022, sendo o principal concorrente de Jair Bolsonaro (sem partido).

O Comprova já verificou outros conteúdos que distorcem a verdade para favorecer o atual presidente, como o que acusa falsamente Lula e Dilma de terem pagado 6 mil euros em um jantar em Paris e o que retira de contexto tabela com dados do Bolsa Família.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado com alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Saúde

Investigado por: 2021-11-09

Segurança de vacina da Pfizer para crianças foi atestada pelo CDC; monitoramento de longo prazo é padrão

  • Enganoso
Enganoso
É enganosa a sequência de tuítes e a postagem no Instagram, feitas por um médico, questionando se a vacina da Pfizer contra a covid-19 é segura para crianças de 5 a 12 anos. Ele destaca apenas trecho de um documento da farmacêutica, que afirma ser pequeno o número de participantes nos estudos para identificar risco potencial de miocardite associada ao imunizante na faixa etária. O médico omite que autoridades sanitárias consideraram os benefícios da vacinação superiores aos riscos, o que também foi destacado no relatório.
  • Conteúdo verificado: Sequência de tuítes e postagem no Instagram expõem parte de um documento da Pfizer admitindo que os testes em crianças de 5 a 12 anos foram feitos em um grupo muito reduzido para que pudessem ser conclusivos para casos de miocardite nessa faixa etária. Ele orienta que as pessoas não acreditem na segurança da vacina para esse público só porque o FDA e o CDC a aprovaram.

É enganoso que as vacinas contra a covid-19 desenvolvidas pela Pfizer não são seguras para uso em crianças e adolescentes, conforme descontextualiza uma sequência de tuítes e uma postagem no Instagram aqui verificados.

Nos posts, um médico alega que a própria Pfizer informou em um documento que o número de participantes no programa de desenvolvimento clínico da vacina para crianças de 5 a 11 anos era muito reduzido para detectar risco potencial de miocardite associada ao imunizante.

O documento citado nas publicações de fato existe e foi apresentado em reunião junto ao Comitê Consultivo de Vacinas e Produtos Biológicos (VRBPAC), da Food & Drug Administration (FDA). Porém, o conteúdo publicado nas redes sociais não explicita coerentemente os dados que constam no relatório.

A própria FDA chegou a publicar um release informando ter autorizado a vacina da Pfizer-BioNTech para uso emergencial em crianças e adolescentes entre 5 e 11 anos, o que reforça ser enganosa a tese de que os imunizantes contra o coronavírus não seriam seguros para essa faixa etária.

O autor questiona a segurança da vacina citando que, a longo prazo, a possibilidade de miocardite só será avaliada em cinco estudos pós-autorização, incluindo um de cinco anos de duração. Porém, omite dados do próprio documento informando sobre os baixos riscos em comparação ao benefício, já que a covid-19 pode acarretar em problemas de saúde mais graves e até a morte.

Procurado, o autor do tuíte afirmou ser a favor da vacinação, mas “ser contra esta vacina, neste grupo etário”. Insistiu, erroneamente, que não houve “estudos de segurança adequados” e declarou que as pessoas têm o direito de saber “que o próprio fabricante diz que os riscos só serão conhecidos após cinco anos do início da vacinação”. Por fim, ele considerou a aprovação da vacina, sem todos os estudos, inédita e absurda.

O Comprova classificou o conteúdo como enganoso porque, publicado fora de seu contexto original e utilizando dados imprecisos, induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor.

Como verificamos?

Inicialmente, entramos em contato com a Pfizer para questionar quais eram os riscos da aplicação dos imunizantes contra a covid-19 em crianças e adolescentes de 5 a 12 anos de idade.

Na sequência, a reportagem acionou o FDA, agência reguladora de Saúde nos Estados Unidos, equivalente à Anvisa no país, que sugeriu a leitura de nota oficial sobre o assunto em seu site.

Em seguida, a Anvisa foi procurada para falar sobre o avanço da aprovação para o uso emergencial dos imunizantes no Brasil para estes grupos etários.

Também foi entrevistada a imunologista Fernanda Grassi, pesquisadora titular do Instituto Gonçalo Moniz/Fiocruz-Bahia, para falar sobre os riscos que envolvem a vacinação de crianças e o número de pessoas utilizadas nos testes vacinais.

Por fim, o autor do tuíte foi procurado.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 9 de novembro de 2021.

Verificação

Trecho destacado em tuíte é recorte do documento oficial

O trecho citado nas postagens feitas no Twitter e no Instagram pertence a um documento de 82 páginas apresentado pela Pfizer em reunião junto ao Comitê Consultivo de Vacinas e Produtos Biológicos Relacionados (VRBPAC), do FDA, a agência reguladora de medicamentos dos Estados Unidos, em 26 de outubro de 2021.

Por ocasião da reunião, os conselheiros votaram para recomendar a vacinação com o imunizante da Pfizer contra a covid-19 em crianças de 5 a 12 anos, conforme noticiou a imprensa americana.

A própria agência publicou release informando ter autorizado a vacina da Pfizer-BioNTech para uso emergencial na faixa etária. Segundo o comunicado, a autorização foi baseada na avaliação completa e transparente do FDA dos dados, que incluíram contribuições de especialistas de comitês consultivos independentes que votaram a favor de tornar a vacina disponível para crianças nessa faixa etária.

Dentre os pontos-chave para pais e cuidadores, a agência destacou a eficácia e a segurança da vacina para o público. Em relação à primeira, as respostas imunológicas das crianças foram comparáveis ​​às de indivíduos de 16 a 25 anos. A vacina foi considerada 90,7% eficaz na prevenção de covid-19 na faixa infantil. Sobre a segunda, a segurança da vacina foi estudada em aproximadamente 3,1 mil crianças de 5 a 12 anos que receberam a substância e nenhum efeito colateral sério foi detectado no estudo em andamento.

A FDA explica que o Comitê Consultivo sobre Práticas de Imunização do Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) se reunirá em breve para discutir outras recomendações clínicas.

De acordo com a agência, a vacina da Pfizer para crianças de 5 a 12 anos de idade é administrada como uma série primária de duas doses, com três semanas de intervalo, mas trata-se de uma dose mais baixa (10 microgramas) do que a usada para indivíduos com 12 anos de idade ou mais (30 microgramas).

Nos EUA, os casos de covid-19 em crianças nesta faixa etária representam 39% dos casos em indivíduos com menos de 18 anos. De acordo com o CDC, aproximadamente 8.300 casos da doença em crianças de 5 a 12 anos de idade resultaram em hospitalização. Em 17 de outubro, 691 mortes por covid-19 haviam sido relatadas nos Estados Unidos em indivíduos com menos de 18 anos de idade, sendo 146 mortes no grupo de 5 a 11 anos.

“Com base na totalidade das evidências científicas disponíveis, os benefícios conhecidos e potenciais da vacina Pfizer-BioNTech covid-19 em indivíduos de até 11 anos de idade superam os riscos conhecidos e potenciais”, afirma o órgão. O CDC recomendou no dia 2 de novembro a aplicação da vacina pediátrica para cerca de 28 milhões de crianças nessa faixa etária nos Estados Unidos.

Contexto da publicação feita no Twitter

A página do documento compartilhada no post apresenta, em inglês, as conclusões gerais de risco-benefício da vacinação em crianças de 5 a 12 anos. No texto, a farmacêutica informa que a covid é uma infecção grave e potencialmente fatal para crianças e que as duas doses primárias da vacina mostraram um perfil favorável de segurança e tolerabilidade, respostas imunes robustas contra todas as variantes preocupantes e alta eficácia contra a covid-19 sintomática em um período em que a variante delta foi predominante nos Estados Unidos.

De fato, como observado pelo autor das postagens, o documento destaca que o número de participantes no programa de desenvolvimento clínico é muito pequeno para detectar quaisquer riscos potenciais de miocardite associados à vacinação. Também cita que a segurança de longo prazo do imunizante será analisada em cinco estudos pós-autorização, incluindo um estudo de acompanhamento de cinco anos para avaliar a longo prazo sequelas de miocardite/pericardite pós-vacinal.

Nas postagens, contudo, o médico fala apenas sobre esse trecho da página, omitindo, nos comentários em português, por exemplo, a informação que consta no documento sobre os bancos de dados de vigilância de segurança de Israel sugerirem que as taxas de incidência de casos raros pós-vacinação de miocardite atingem o pico em indivíduos do sexo masculino com 16 a 19 anos de idade e que diminuem em adolescentes de 12 a 15 anos de idade.

O documento da Pfizer destaca, também, que a dose para crianças de 5 a 12 anos de idade é 1/3 da dose administrada aos vacinados mais velhos. “Com base nessas informações, é razoável prever que as taxas de miocardite pós-vacina provavelmente serão ainda mais baixas em 5 a 12 anos de idade do que as observadas em adolescentes de 12 a 15 anos”, diz o documento.

Para a infectologista Fernanda Grassi, que é pesquisadora titular do Instituto Gonçalo Moniz/Fiocruz-Bahia, os testes vacinais na fase anterior à aprovação de uma vacina – ou seja, a fase 3 – são mesmo limitados. “Você faz os testes em um número limitado de pessoas e quando essa vacina é aprovada e vai para a fase 4, você tem a farmacovigilância”, aponta.

Qualquer vacina precisa dessa vigilância, diz. “Todas as vacinas precisam de farmacovigilância, até as que são aprovadas há muito tempo. Evidentemente, qualquer vacina ou qualquer medicamento que entre (aprovada), a gente tem que continuar investigando, vendo se casos que vão surgindo estão ou não relacionados à vacina”, explica.

A pequena participação de crianças no ensaio clínico rendeu alguma polêmica nos Estados Unidos, como detalha essa reportagem do New York Times. Em outra notícia, contudo, o veículo explica serem reconfortantes os dados recentes sobre a frequência que as vacinas contra a covid causam problemas cardíacos em crianças, isso porque a miocardite continua muito incomum e quase sempre é leve e temporária. O risco cardíaco da própria covid-19 é muito maior, destacam especialistas ouvidos pelo veículo.

Conforme as informações, embora as vacinas feitas pela Pfizer-BioNTech e Moderna pareçam estar associadas a um risco aumentado de miocardite em pessoas com até 30 anos, o risco absoluto permanece muito pequeno.

O especialista em inflamação do coração em crianças do Hospital Infantil UPMC de Pittsburgh, Dr. Brian Feingold, por exemplo, afirma à publicação que estatisticamente é muito mais provável que a covid-19 cause danos ao coração. Para ele, deste modo, mesmo que o risco de miocardite após a vacinação seja real, a infecção causada pelo coronavírus é mais perigosa.

Desde o início da pandemia de coronavírus, afirma, dezenas de milhares de crianças foram hospitalizadas com covid e 657 morreram, de acordo com dados coletados pelo CDC. Além disso, algumas crianças infectadas podem desenvolver covid prolongada, permanecendo doentes por meses após o desaparecimento da infecção inicial, o que afetou pelo menos 5.200 crianças nos Estados Unidos.

O veículo também detalha que a incidência de miocardite após a vacinação varia com a idade, sexo e dose – e entre os diferentes estudos feitos sobre o assunto. Mas a tendência, até agora, sugere que as chances são maiores após a segunda dose de uma vacina de mRNA em pacientes do sexo masculino com idades entre 16 e 29 anos, com cerca de 11 casos de miocardite para cada 100 mil pacientes masculinos vacinados nessa faixa etária.

Embora os dados sobre miocardite em adolescentes de 12 a 15 anos após a vacinação sejam limitados, o Dr. Paul A. Offit, diretor do Centro de Educação de Vacinas do Hospital Infantil da Filadélfia, diz que, até o momento, os problemas cardíacos após a vacinação parecem ser menos comuns em meninos dessa idade do que em homens mais velhos. “A miocardite é geralmente um fenômeno pós-púbere”, observa.

O FDA informa que a Pfizer atualizou seu plano de monitoramento de segurança para incluir avaliação de miocardite, pericardite e outros eventos de interesse em crianças de 5 a 12 anos de idade. Além disso, o FDA e o CDC têm vários sistemas implantados para monitorar continuamente a segurança da vacina contra a covid-19 e permitir a rápida detecção e investigação de possíveis problemas de segurança.

É obrigatório para a Pfizer e os provedores de vacinação relatar quaisquer eventos adversos graves, casos de Síndrome Inflamatória Multissistêmica e casos de covid-19 que resultem em hospitalização ou morte em indivíduos vacinados. Também é obrigatório para os provedores de vacinação relatar todos os erros de administração da vacina ao Sistema de Notificação de Eventos Adversos de Vacinas norte-americano (VAERS), dos quais tenham conhecimento e para a Pfizer incluir um resumo e análise de todos os erros de administração da vacina identificados em relatórios mensais de segurança para o FDA.

Miocardite é rara em pacientes com ou sem covid-19

A miocardite geralmente resulta de infecção por um vírus ou bactéria e causa sintomas como batimento cardíaco rápido ou irregular, dor no peito e falta de ar. Globalmente, cerca de 10 a 20 pessoas em cada 100.000 desenvolvem miocardite a cada ano, mas muitas outras apresentam sintomas leves e podem nunca ser diagnosticadas.

No entanto, a covid-19 tem mais chances de gerar a complicação do que a vacina desenvolvida contra o coronavírus, segundo um estudo divulgado em agosto deste ano pelo CDC (Centro para a Prevenção e o Controle de Doenças), dos Estados Unidos. Os dados apresentados pela pesquisa analisaram consultas em mais de 900 hospitais norte-americanos.

“A miocardite permanece rara em pacientes com ou sem covid”, diz um trecho do relatório do CDC. Ao mesmo tempo, o CDC diz que apesar do vírus ampliar os riscos para o desenvolvimento de uma miocardite, as consequências podem variar conforme a idade do paciente.

Foram identificados pelo FDA casos de miocardite e de pericardite após vacinação contra a covid-19 com imunizantes de plataforma de RNA mensageiro (RNAm), como as vacinas da Pfizer e da Moderna. No Brasil, apenas a primeira possui autorização para uso pela Anvisa, que emitiu alerta.

De acordo com a imunologista Fernanda Grassi, existem sim riscos de miocardite e pericardite pós-vacinal, mas os benefícios da vacinação são muito superiores aos riscos. “É claro que vacinar crianças de 5 a 11 anos é uma situação que você vai precisar acompanhar, mas o que tudo indica nesse momento é que os benefícios são muitos superiores aos riscos”, diz.

Ela ressalta que os casos de miocardite são extremamente raros, de pouca gravidade e autolimitados, ou seja, se curam sozinhos.

“Não existe na comunidade científica nenhuma barreira, nenhuma limitação, restrição a vacinar crianças. Pelo contrário: agora, cada vez mais, a gente está vendo a necessidade de vacinar essa faixa etária, porque os casos graves que estão diminuindo nas populações adultas estão se tornando mais graves em crianças. E isso é o que acontece quando a gente não vacina uma faixa etária. Sem contar que a criança pode servir até como reservatório para novas variantes”, pontua.

Dados comprovam segurança da vacina

O FDA explica que os dados de eficácia para apoiar a vacinação são baseados em um estudo randomizado controlado por placebo em andamento que envolveu aproximadamente 4.700 crianças de 5 a 12 anos de idade. O estudo está sendo conduzido nos Estados Unidos, Finlândia, Polônia e Espanha.

As crianças no grupo da vacina receberam duas doses da vacina Pfizer-BioNTech covid-19 contendo 10 microgramas de RNA mensageiro por dose. O FDA analisou dados que compararam a resposta imune de 264 participantes deste estudo com 253 participantes de 16 a 25 anos que receberam duas doses mais altas da vacina em um estudo anterior que determinou que a vacina era eficaz na prevenção de covid-19. As respostas imunológicas dos participantes mais jovens foram comparáveis ​​às dos participantes mais velhos.

O FDA também conduziu uma análise preliminar dos casos de covid-19 que ocorreram sete dias após a segunda dose. Nesta análise, entre os participantes sem evidência de infecção anterior com SARS-CoV-2, três casos de covid-19 ocorreram entre 1.305 receptores da vacina e 16 casos de covid-19 ocorreram entre 663 receptores de placebo; a vacina foi 90,7% eficaz na prevenção de covid-19.

O que diz a Pfizer

Procurada pelo Comprova, a farmacêutica encaminhou extensa nota sobre o assunto afirmando que a Pfizer e BioNTech desenharam um estudo de fase 1/2/3 na população pediátrica entre 6 meses de 11 anos de idade, que vem sendo conduzido por centros de pesquisa especializados e seguindo todos os critérios e regulamentações pertinentes à condução de pesquisa em seres humanos.

Em relação à análise preliminar dos dados da vacina em crianças de 5 a 11 anos, afirma que o regime de duas doses de 10 mcg da vacina se mostrou segura e capaz de gerar altos títulos de anticorpos, acrescentando que, além do FDA já ter aprovado o uso emergencial para a faixa etária, a Agência Europeia de Medicamentos (EMA) está em processo de análise dos dados.

Conforme a farmacêutica, é realizado habitualmente o acompanhamento de relatos de eventos adversos de seus produtos e o registro destes são fundamentais para que se mantenha uma análise criteriosa da relação risco-benefício de um determinado medicamento ou vacina. “Até o momento, especificamente sobre a vacina ComiRNAty, não há qualquer alerta de segurança ou preocupação, de modo que o benefício da vacinação segue estabelecido”, sustenta.

A nota afirma, ainda, que a farmacêutica atende à exigência das agências reguladoras de que os fabricantes conduzam estudos de farmacovigilância pós-aprovação, com relatórios regulares para as autoridades de saúde. “A Pfizer tem um plano robusto de farmacovigilância que foi aprovado pelas agências reguladoras; atualmente, esse plano de farmacovigilância inclui 6 estudos pós-aprovação da Pfizer, aceitos pelo FDA, em adultos, adolescentes e crianças para monitorar a segurança da vacina e identificar efeitos colaterais potencialmente raros. Isso é feito para todas as vacinas e medicamentos”.

Por fim, a Pfizer afirma que espera ainda neste ano apresentar os dados de segurança e imunogenicidade da vacina na população entre 6 meses a menores de 5 anos.

O que diz a Anvisa sobre uso da vacina em crianças e adolescentes

A Anvisa informou, ao ser procurada pelo Comprova, que a Pfizer ainda não solicitou a indicação de sua vacina para crianças menores de 12 anos no Brasil. “A análise da Anvisa tem início a partir do momento em que o pedido é feito, com a apresentação dos dados e resultados de estudos que sustentem a indicação de faixa etária”, explicou a o órgão, acrescentando que irá comunicar o recebimento deste pedido tão logo dê entrada na agência.

Ainda segundo a nota encaminhado à reportagem, a solicitação para a inclusão de uma nova indicação de faixa etária na bula de uma vacina depende de protocolo a ser realizado pela empresa/instituição detentora do registro ou da autorização de uso emergencial, com a apresentação de dados clínicos e científicos que sustentem a segurança e eficácia da vacina para o público infantil.

“Como agência reguladora, a Anvisa somente pode aprovar novas indicações de qualquer medicamento ou vacina diante da apresentação de dados técnicos sólidos e mediante um pedido objetivo dos desenvolvedores de cada vacina. Por isso, o pedido de nova indicação deve ser feito pelo laboratório farmacêutico responsável pela vacina”, sustenta..

A Pfizer deve pedir a aprovação do uso de imunizantes contra a covid-19 em crianças entre 5 a 11 anos. A previsão é que o pedido seja encaminhado à Anvisa ainda no mês de novembro.

O governo de São Paulo solicitou à Anvisa urgência na autorização de uso das imunizações para estes grupos etários. João Doria (PSDB) afirmou durante uma coletiva de imprensa que membros da equipe de saúde do estado integraram uma reunião técnica com profissionais do Conass (Conselho Nacional de Secretários de Saúde). Segundo o governador, São Paulo tem condições técnicas para iniciar a vacinação assim que a Anvisa liberar a aplicação no país.

Quem é o autor

O autor das postagens é o médico Paulo Macio Porto de Melo, inscrito no Conselho Regional de Medicina de São Paulo desde 1998 com áreas de atuação em neurocirurgia e neurologia.

Procurado pelo Comprova, ele afirma ter lido todo o documento e informado a fonte das informações na sequência de postagens, além de ter disponibilizado toda a página sobre os riscos.

Questionado se o conteúdo poderia desincentivar a vacinação, ele afirma que a postagem não se trata disso, e sim “das pessoas terem o direito de saber que o próprio fabricante diz que os riscos só serão conhecidos após cinco anos do início da vacinação”, acrescentando acreditar que isso é “inédito e absurdo”.

Por fim, afirmou ter se vacinado e não ser contra as vacinas, mas “ser contra essa vacina específica, neste grupo etário e sem estudos de segurança adequados”.

O médico já foi ouvido no Senado, onde defendeu o tratamento precoce com o uso de medicamentos sem comprovação científica contra a covid-19. Ele chegou a ser convocado para a CPI da Covid, mas o depoimento foi cancelado.

Ao longo da pandemia, Paulo Porto de Melo foi alvo de verificações por diferentes agências de checagem brasileiras por declarações falsas e enganosas sobre outra vacina contra a covid-19, a CoronaVac. As checagens foram publicadas por Aos Fatos, Lupa e Estadão Verifica.

Por que investigamos?

Em sua quarta fase, o Comprova verifica conteúdos suspeitos que tenham viralizado sobre políticas públicas do governo federal, eleições e a pandemia, como este aqui checado, que teve até o dia 9 de novembro mais de 7,9 mil interações no Twitter e 2,4 mil no Instagram. Os números foram contabilizados com base nos comentários, compartilhamentos e curtidas nas postagens.

Ao afirmar de forma enganosa que as vacinas contra a covid-19 podem causar efeitos adversos, a longo prazo, em crianças e adolescentes, a publicação confunde e assusta os cidadãos, que podem se tornar aversos a aplicação dos imunizantes no público de 5 a 12 anos, ainda que eles sejam comprovadamente seguros.

Isso fica claro em algumas respostas de usuários ao fio compartilhado no Twitter, como a que diz estar sofrendo por não tomar a “picadinha” e nem aplicar no filho de 17 anos: “não posso ir à missa, alguns lugares já não entro mais, minha família me critica me chamando de louca… mas algo me diz no fundo do coração que não tome, então não tomo”.

Ou o que afirma não querer levar os filhos para tomarem sequer as vacinas contra outras doenças, por medo “Não estou nem afim de levar meu filho de 3 pra 4 anos para tomar as habituais e antigas e já exigidas por medo, e por lembrar do que ele já passou antes das reações. Imagina esta MERDA se eu irei dar…”

As vacinas contra o coronavírus, principal mecanismo de combate à doença, têm sido alvo frequente de alegações falsas compartilhadas nas redes sociais. Sobre os imunizantes, o Comprova já identificou ser falso que a Polônia usava órfãos em experimentos de vacinas a Pfizer e da Moderna, como também o documento da Suprema Corte dos Estados Unidos que afirma falsamente que as vacinas transformam os cidadãos em ‘trasumanos’.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Eleições

Investigado por: 2021-11-09

Tabela sobre pagamento de Bolsa Família é editada e retirada de contexto para favorecer Bolsonaro

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Enganoso
É enganoso que o programa Bolsa Família tenha atendido a um número maior de famílias no governo de Jair Bolsonaro (sem partido), com menos recursos e parcelas maiores do que na gestão de Dilma Rousseff (PT). A postagem contém uma tabela incompleta que retira de contexto dados sobre o benefício.
  • Conteúdo verificado: Postagem no Facebook apresenta uma tabela com valores que teriam sido aplicados pelo governo federal em programas sociais, comparando as gestões do PT (Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff), do MDB (Michel Temer) e de Jair Bolsonaro (sem partido).

É enganoso que, durante o governo de Jair Bolsonaro (sem partido), o programa Bolsa Família tenha passado a atender a um número maior de famílias, com um volume menor de recursos do que o empenhado durante o governo de Dilma Rousseff (PT).

Uma postagem no Facebook apresenta uma tabela com os valores do orçamento do Bolsa Família, entre 2003 e 2021, além do número de famílias atendidas e a média do benefício, alegando que, nos últimos anos, foi possível atender mais pessoas com um orçamento menor.

A tabela, na verdade, está incompleta e foi retirada de uma reportagem do Poder360, onde foi publicada com o título “Bolsa Família teve maior valor real pago em 2014”. A postagem omite o recorte principal, deixando de mostrar a coluna com a “média real por família”, que corrige o valor do benefício de acordo com o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) que é o índice que mede a inflação e variação dos preços, produtos e serviços consumidos pelas famílias brasileiras e permite uma comparação mais adequada entre os anos.

A publicação ainda afirma que o Renda Brasil vai pagar R$ 400 mensais aos beneficiários, com direito a 13º salário. O novo programa social, chamado Auxílio Brasil, prevê reajuste de 20% no valor pago pelo Bolsa Família, e, de fato, com alguns benefícios transitórios programados até dezembro do ano que vem, a transferência de renda pode chegar a R$ 400. Mas este não é um valor definitivo.

No entanto, o governo federal ainda não possui a confirmação do pagamento do novo benefício em novembro, pois depende que o Congresso aprove um projeto de lei que transfere R$ 9,3 bilhões do orçamento de um programa para o outro. O funcionamento do programa também não está claro.

Além disso, no contexto de criação do Auxílio Brasil, foi suspenso o auxílio emergencial, criado para atendimento da população mais vulnerável durante a pandemia, deixando um grupo de pessoas desassistidas, uma vez que nem todas terão direito ao novo benefício.

Procurado pelo Comprova, o autor da postagem não respondeu ao pedido de esclarecimentos. O Comprova considerou o conteúdo enganoso porque usa dados imprecisos na postagem.

Como verificamos?

O Comprova analisou a formatação da tabela e notou que o estilo de fonte e diagramação parecia com o padrão adotado pelo site Poder360. Em uma busca no Google, pelos termos “média nominal por família, bolsa família, Poder360”, fomos direcionados para o link com a reportagem onde consta a informação original, que tem o título “Bolsa Família teve seu valor máximo em 2014, ano de reeleição da Dilma”.

A reportagem comparou, então, as informações da tabela presente na postagem verificada e as da matéria original e checou a veracidade das alegações do autor do post no Facebook.

A equipe ainda fez contato com o economista e professor de finanças públicas da Universidade de Brasília (UnB) Roberto Piscitelli.

Além disso, o Comprova procurou o autor da postagem no Facebook por e-mail e também por mensagem instantânea disponíveis na página da empresa em que ele se apresenta como “desenhista principal”, mas não tivemos retorno até a publicação da verificação.

Verificação

Tabela fora de contexto

A tabela que consta na postagem foi retirada de uma reportagem do site Poder360, publicada em 22 de outubro com o título “Bolsa Família teve seu valor máximo em 2014, ano de reeleição da Dilma”. No Facebook, porém, o autor omitiu o título da própria tabela (“Bolsa Família teve maior valor real pago em 2014”), algumas observações e, sobretudo, a última coluna, que mostra a “média real por família” do benefício, a cada ano.

Na tabela original, “média real por família” é o valor do benefício atualizado pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), o indicador que mede a inflação no país. Quanto mais alta é a inflação, menor é o poder de compra das famílias. A maior variação mensal de IPCA foi em março de 1990, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

 

| A tabela original está publicada no site Poder360, e inclui informações sobre os valores pagos por Lula, Dilma, Temer e Bolsonaro. O quadro revela que o valor mais alto do Bolsa Família foi em 2014.

Na publicação original, esta última coluna é o destaque, já que é na média real que o valor pago em 2014 se sobressai em relação aos demais anos. Segundo dados na própria tabela, a média real considera os valores nominais corrigidos pela inflação, resultando no montante que seria recebido se a mesma média de empenho orçamentário e número de beneficiados fosse mantida hoje.

Na postagem, o autor do conteúdo verificado alega que “Bolsa Família no governo Lula não passava de 100 reais” e que “no governo Dilma não passava de 164 reais”. Apesar de encontrarem respaldo na comparação do valor nominal, as afirmações não se sustentam na avaliação efetiva entre o valor pago a cada ano pelo benefício, já que é preciso considerar a correção monetária.

Dessa forma, considerando a média real, o valor mais baixo pago pelo governo Lula, por família, foi de R$ 110,80, em 2006. Já no governo Dilma, como é ressaltado no título da matéria, houve pagamento de até R$ 245,10 por família – o maior já registrado, em valores reais, desde a implementação do benefício.

Na legenda da publicação verificada, o autor ainda diz que “as famílias atendidas aumentaram nesse governo e foi gasto bem menos do que no ano do governo de Dilma”. A afirmação também não se sustenta, porque os valores na coluna de “orçamento” consideram a correção monetária pelo IPCA e, portanto, a comparação com o valor pago a cada família deve levar em conta, igualmente, o valor corrigido.

A tabela não especifica esta correção dos valores orçamentários, mas o Comprova fez o caminho matemático inverso do cálculo da média real do benefício por família, e encontrou as quantias destacadas na primeira coluna: por exemplo, em 2014, a média do benefício (R$ 245,10) foi paga a 14 milhões de famílias, por um período de 12 meses – o que resulta num gasto de R$ 41,1 bilhões (245,10 x 12 x 14.000.000 = 41.176.800.00).

Bolsa Família

O Bolsa Família começou a ser pago em outubro de 2003, quando o programa foi instituído pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), e apresenta três eixos principais: complemento da renda; acesso a direitos; e articulação com outras ações de modo a estimular o desenvolvimento das famílias. Apesar de ter iniciado em 2003, os levantamentos do Ministério da Cidadania começaram em 2004.

O valor que cada família recebe do Bolsa Família depende de vários fatores, como o número de pessoas, a idade de cada um e condições como a gravidez, por exemplo. Depende também da renda per capita.

O pico dos gastos com o Programa Bolsa Família foi atingido em 2013, quando totalizou R$ 38,4 bilhões, segundo os dados oficiais. Já em 2019, um ano antes da pandemia, foram gastos R$ 33,5 bilhões e, em 2020, apenas R$ 10,1 bilhões, já que os beneficiários receberam parte do valor por meio do auxílio emergencial.

Em 2020, o programa englobava 41 milhões de pessoas, cerca de 13 milhões de famílias. Neste ano, eram 14,7 milhões de famílias beneficiadas pelo programa. O Bolsa Família era destinado às famílias com renda por pessoa de até R$ 89 mensais, e também às famílias com renda por pessoa entre R$ 89,01 e R$ 178 mensais, desde que tivessem crianças ou adolescentes de zero a 17 anos.

A última parcela do Bolsa Família foi paga em outubro aos beneficiários, ainda sem a confirmação do pagamento do Auxílio Brasil em novembro. O governo federal ainda depende que o Congresso aprove um projeto de lei que transfere R$ 9,3 bilhões do orçamento de um para o outro.

O programa Auxílio Brasil

Na postagem verificada, o autor afirma que o Renda Brasil terá o valor de R$400.

O benefício a que o autor do post se refere como Renda Brasil, na verdade, foi batizado de Auxílio Brasil. Quando a proposta foi apresentada em junho do ano passado, era Renda Cidadã, e mudou de nome duas vezes até chegar à denominação atual.

A previsão é que comece a ser pago em novembro deste ano (mês em que são pagas as últimas parcelas do auxílio emergencial criado na pandemia), numa composição de benefícios que vai alcançar o valor de R$ 400. O pagamento está previsto até dezembro de 2022, ano eleitoral e que deverá ter Bolsonaro na disputa à reeleição.

O interesse nas eleições presidenciais é apontado como motivação para as mudanças propostas e há uma discussão jurídica se o dinheiro extra para o auxílio pode, inclusive, ser considerado crime eleitoral.

O programa social, divulgado pelo governo federal como substituto do Bolsa Família, traz a novidade no nome, mas, na prática, o novo sistema de transferência de renda também exige inscrição no Cadastro Único (CadÚnico) – o mesmo usado para definir quem ganha atualmente a bolsa.

Assim, quem já está no Bolsa Família deve receber automaticamente o Auxílio Brasil. Para se encaixar como beneficiário, além de se inscrever no CadÚnico, é preciso seguir uma série de regras, entre as quais viver na extrema pobreza. Famílias em situação de pobreza também poderão ser atendidas, desde que tenham gestantes ou pessoas com menos de 21 anos.

Mas o valor de R$ 400 não é definitivo. A remuneração atual vai ter reajuste, estimado em 20%, e a esse resultado serão somados benefícios transitórios até o limite definido para o Auxílio Brasil. Assim, após dezembro de 2022, se não houver mudanças, os beneficiários do programa social voltarão a receber o equivalente ao que é pago hoje no Bolsa Família, acrescido do reajuste.

Diante de um custo de vida elevado, mesmo com reajuste e complementos, os R$ 400 não compram uma cesta básica nas capitais do país.

Além disso, o programa social não alcança todas as pessoas que, atualmente, recebem o auxílio emergencial. A previsão é que mais de 22 milhões de brasileiros fiquem sem o benefício a partir de novembro. A forma como o Auxílio Brasil está sendo apresentado também é alvo de críticas pela insegurança gerada nos beneficiários do Bolsa Família.

Consultado sobre o tema, o economista Roberto Piscitelli pontuou que, a princípio, não se deve comparar o Bolsa Família com o Auxílio Emergencial, pois as finalidades e circunstâncias são absolutamente diversas. E o auxílio não tem contrapartida.

Piscitelli cita um estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), divulgado em 2013, segundo o qual o Bolsa Família beneficiava 13,8 milhões de famílias. “Estes números, como se vê, estão próximos dos números mais recentes, 8 anos depois, quando se estima algo em torno de 14,4 milhões. Comparando-se com o aumento da população no período, esse acréscimo está aquém da relação que se poderia estabelecer, levando em conta justamente essa variável (população), e muito aquém do aumento dos números do desemprego, do subemprego e da informalidade”.

Quem é o autor do post investigado?

O perfil que publicou a planilha é de Bruno Guetä, que se identifica como desenhista no Facebook.

No início da verificação, o Comprova encontrou os perfis de Bruno também no Linkedin e Twitter, fez contato com o autor por e-mail disponibilizado no Linkedin e enviou mensagem instantânea para a página da empresa em que ele diz atuar como “desenhista principal”.

No entanto, após o contato da reportagem, o jovem excluiu os perfis no Linkedin e Twitter, mantendo apenas a conta no Facebook. Apesar de não ter respondido o contato do Comprova, Bruno saiu do grupo Bolsonaro 2022 🇧🇷, onde fez o post verificado.

Até a publicação desta matéria não houve resposta.

Por que investigamos?

Conteúdos suspeitos sobre políticas públicas do governo federal, como o Bolsa Família, fazem parte do escopo do Comprova, nesta quarta fase do Projeto – assim como postagens que tratam das eleições ou da pandemia.

A postagem verificada teve mais de 13,7 mil interações no Facebook, segundo a plataforma CrowdTangle, e usa dados falsos para criar uma impressão incorreta sobre a atuação do governo Bolsonaro. A extinção do Bolsa Família, em prol da criação de um novo benefício, com características ainda incertas, é alvo de diversas críticas.

O Comprova já verificou postagens que também atribuíam méritos ao governo federal de forma incorreta, como o vídeo falso que afirmava que Bolsonaro estaria doando máquinas agrícolas aos estados, uma publicação sobre investimentos na ciência e um vídeo sobre obras de infraestrutura.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; ou ainda aquele que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Eleições

Investigado por: 2021-11-05

Post inventa que Lula é acionista da Folha

  • Falso
Falso
São falsos posts de 2018 que voltaram a circular no Facebook afirmando que o ex-presidente Lula (PT) é dono do jornal Folha de S.Paulo. O veículo pertence à família Frias.
  • Conteúdo verificado: Posts no Facebook inventam que Lula (PT) detém 52% das ações da Folha.

É falso o post de 2018 que voltou a circular no Facebook dizendo que o ex-presidente Lula (PT) seria “dono” de 52% das ações do jornal Folha de S.Paulo. Como informado em seu site, o veículo pertence à família Frias desde 1992.

Na legenda, um dos perfis que compartilhou o post alega que isso explicaria o fato de “a Folha de S.Paulo ser contra Bolsonaro”, o que também é falso. O jornal, como é explicado em seu site, é pautado pelo apartidarismo e pela desvinculação a “governos, oposições e doutrinas”.

A reportagem tentou contatar três perfis que publicaram o post com o mesmo conteúdo, mas não obteve retorno até a publicação deste texto. A postagem foi considerada falsa porque usa informações inventadas.

Como verificamos?

O primeiro passo foi confirmar, por meio de notícias no site da Folha, que Lula não tem nenhuma participação no grupo do qual o jornal faz parte. Ao pesquisar as informações no Google, foi verificado que o post com conteúdo falso havia circulado inicialmente em 2018 – e que a Folha e agências como Lupa, Boatos.org e Aos Fatos já haviam checado as afirmações na época.

A reportagem também entrou em contato com a Junta Comercial do Estado de São Paulo (Jucesp), que informou que os dados da Folha só podem ser acessados por representantes legais, já que se trata de uma sociedade anônima.

Outro passo foi buscar a reportagem que aparece como print de tela no conteúdo, intitulada “Jornal espanhol corrige declaração de Lula com crítica a Dilma”. Referia-se a uma matéria do veículo “El Mundo”, de 22 de outubro de 2017.

Em seguida, o Comprova analisou o mais recente projeto editorial da Folha para averiguar o posicionamento sobre manifestações partidárias, incluindo participação de políticos na empresa.

Por último, tentamos contato via mensagem no Facebook com os perfis ​​Bolsonaro 2022, Plaster Mãozinhas e Alverindo Pommer, que publicaram os posts.

Verificação

Família Frias

Em 2018, quando o post circulou pela primeira vez, a Folha desmentiu as alegações de que Lula seria dono de ações da empresa. “A Folha é editada pela Empresa Folha da Manhã S.A., que pertence 100% à família Frias de Oliveira”, diz a nota. Também lembra que o jornal foi comprado “em 1962 pelos empresários Octavio Frias de Oliveira e Carlos Caldeira Filho” e que, “em 1991, os dois sócios se separaram, e a família Frias tornou-se a única proprietária da empresa”.

Desde novembro de 2020, como informou nota no jornal, o publisher Luiz Frias, filho de Octavio Frias de Oliveira, se tornou o acionista majoritário da holding Folha Participações S.A., controladora da empresa à qual o jornal Folha de S.Paulo pertence.

I Nota publicada na versão impressa da Folha em 20 de novembro de 2020

Folha e Bolsonaro

Como informa seu projeto editorial mais recente, de 2019, a Folha atua com o princípio do apartidarismo – ou seja, ao contrário do que desinforma o post verificado aqui, ela não trabalha a favor ou contra nenhum político.

“Sob o pressuposto de que a difusão de informações confiáveis e opiniões qualificadas estimula o exercício da cidadania e contribui para o desenvolvimento das ideias e da sociedade”, a Folha coloca como um de seus princípios: “Manter atitude apartidária, desatrelada de governos, oposições, doutrinas, conglomerados econômicos e grupos de pressão”.

Já o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) ataca a imprensa e, especificamente, a Folha, com frequência. Em 5 de maio do ano passado, por exemplo, chamou o jornal de “canalha”, “patife” e “mentiroso”. Na mesma ocasião, mandou um repórter “calar a boca”; a Folha se manifestou em nota dizendo que, “mais uma vez o presidente Jair Bolsonaro desrespeita a liberdade de expressão e insulta o jornalismo profissional” e que o jornal ia seguir “cobrindo os atos desta administração com isenção e independência, como fizemos em todos os governos”.

A notícia reproduzida na postagem

O título da reportagem da Folha exposto no conteúdo falso diz: “Jornal espanhol corrige declaração de Lula com crítica a Dilma”. A notícia, de 23 de outubro de 2017, conta que o “El Mundo” havia alterado uma declaração do petista dada em entrevista.

A mudança ocorreu após o ex-presidente afirmar, em seu Twitter, que a Folha e o UOL haviam divulgado uma declaração que ele não teria dado ao veículo espanhol – os veículos brasileiros haviam se baseado na reportagem do El Mundo.

Na primeira versão, o espanhol publicou que Lula disse que a ex-presidente Dilma Rousseff (PT) “traiu seu eleitorado”. Posteriormente, o trecho foi corrigido, afirmando que Lula declarou que o “eleitorado se sentiu traído” com o ajuste fiscal promovido pela colega de partido.

Por que investigamos?

Em sua quarta fase, o Comprova verifica conteúdos suspeitos que tenham viralizado sobre pandemia, políticas públicas do governo federal e eleições, como este checado aqui, que teve ao menos 16 mil visualizações até 4 de novembro.

Ao associar o nome de Lula ao comando da Folha, o post tenta descredibilizar tanto o político quanto o jornal – ambos são alvos de ataques frequentes de Bolsonaro. Descredibiliza também o Datafolha, instituto que, em sua última pesquisa, publicada em 17 de setembro, mostrou Lula à frente de Bolsonaro tanto no primeiro quanto no segundo turno do pleito presidencial de 2022. Os cidadãos têm o direito de apoiar o candidato que quiserem, mas é perigoso para a democracia quando a opinião é formada com base em conteúdos falsos, como estes.

Como já informado, esse conteúdo já foi checado pela Folha e por agências como Lupa, Boatos.org, Aos Fatos e Observador.

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.

Saúde

Investigado por: 2021-11-05

É falso que pessoas imunizadas com a vacina da Pfizer se tornem rastreáveis

  • Falso
Falso
Diferentemente do que afirma um homem em um vídeo compartilhado no Telegram, a Pfizer não patenteou um sistema de rastreamento de pessoas vacinadas; e não há grafeno na formulação das vacinas contra a covid-19.
  • Conteúdo verificado: Vídeo publicado em um canal no Telegram afirma que a Pfizer patenteou um sistema de rastreamento de pessoas imunizadas contra a covid-19 e que teria grafeno na composição da vacina.

A Pfizer não patenteou, no dia 31 de agosto de 2021, qualquer sistema de rastreamento de pessoas vacinadas com o imunizante desenvolvido por ela contra a covid-19, como afirma um jornalista em vídeo publicado no Telegram.

Na verdade, existe uma patente emitida nesta data, nos Estados Unidos, que trata do uso de contato digital para aplicação de medidas profiláticas contra doenças infecciosas propagadas pelo ar, mas ela pertence a dois advogados israelenses sem ligação com a Pfizer. Na prática, o sistema utilizaria sinal de Bluetooth para identificar as pessoas que mais interagem socialmente e priorizá-las na aplicação de medicamentos ou vacinas – este método, segundo os proprietários, resultariam num melhor desempenho epidemiológico.

As demais afirmações feitas ao longo do vídeo também são falsas, como a de que seria possível o rastreamento de pessoas vacinadas por meio de óxido de grafeno “mantido nos tecidos adiposos de todas as pessoas que receberam a injeção”. Nem a vacina da Pfizer e nem qualquer outra contra a covid-19 possui essa substância na composição.

Além disso, especialistas ouvidos pelo Comprova afirmam que não é possível rastrear pessoas por meio das nanopartículas de grafeno.

O Comprova também conversou diretamente com a Pfizer, que afirmou ser falso o conteúdo do vídeo, mesma afirmação feita pelas agências reguladoras americana e brasileira, a Food and Drug Administration (FDA) e a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), respectivamente.

Procurado, o autor do vídeo não respondeu ao Comprova, que identificou o conteúdo como falso por ser inventado.

Como verificamos?

A reportagem, inicialmente, foi em busca de informações sobre a composição dos imunizantes desenvolvidos pela Pfizer para combater a covid-19, por meio de consulta da bula do fármaco, disponível no site da Anvisa. O documento não cita, em qualquer circunstância, a presença de grafeno em sua composição.

Na sequência, entramos em contato com a Universidade Federal de Pelotas em busca do contato de um especialista em vacinas, capaz de explicar se é comum ou não a presença da substância citada no vídeo em imunizantes. A instituição nos encaminhou o telefone do professor e vacinologista Odir Dellagostin.

A reportagem também procurou a FDA, onde a vacina foi patenteada, e a Anvisa.

Contatamos, ainda, os donos da patente citada no vídeo, que não pertence à Pfizer, mas sim a dois advogados israelenses — Gal Ehrlich e Maier Fenster —, sócios do escritório Ehrlich & Fenster, especializado em marcas e patentes nas áreas de biotecnologia, dispositivos médicos, física, química, farmacêutica, softwares e sistemas de informação.

Por fim, o Comprova encaminhou mensagem para o autor do vídeo, com o objetivo de saber quais eram as fontes das informações que ele cita na publicação. Até a publicação deste texto, não houve retorno.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 4 de novembro de 2021.

Verificação

O que é a patente e o que dizem os proprietários?

No vídeo, o autor do conteúdo cita que uma suposta patente da Pfizer foi aprovada no dia 31 de agosto de 2021, e que se trataria de um sistema capaz de rastrear os seres humanos que receberam a vacina contra a covid-19. Existe uma patente aprovada nesta data, que trata do uso de contato digital para aplicação de medidas profiláticas contra doenças infecciosas propagadas pelo ar. Contudo, ela não pertence à Pfizer e nem a nenhuma farmacêutica.

Os donos da patente são dois advogados israelenses — Gal Ehrlich e Maier Fenster —, sócios do escritório Ehrlich & Fenster, especializado em marcas e patentes nas áreas de biotecnologia, dispositivos médicos, física, química, farmacêutica, softwares e sistemas de informação.

A patente, intitulada “Métodos e sistemas de priorização de tratamentos, vacinação teste e/ou atividades protegendo a privacidade dos indivíduos” (tradução livre), não mantém relação com o rastreio de pessoas vacinadas, nem com o uso de grafeno para localizar essas pessoas por meio de vestígios presentes no tecido adiposo de seres humanos.

A ideia inicial foi concebida, segundo um dos autores, Gal Ehrlich, entre abril e maio de 2020, quando não havia nenhuma vacina disponível contra a covid-19, mas quando já era visível a super-disseminação do Sars-CoV-2.

A proposta é aplicar medidas profiláticas contra doenças infecciosas que se disseminam pelo ar, primeiro, em pessoas que praticam mais interações sociais, a fim de obter um desempenho epidemiológico melhor dessas medidas. Para encontrar essas pessoas, o sistema criado pelos dois advogados utilizaria os sinais de interações por Bluetooth entre celulares das pessoas com mais interações sociais.

“Nossa invenção estipula que medidas profiláticas (incluindo, por exemplo, o uso de medicamentos ou vacinas) para combater uma doença infecciosa nascida em gotícula/ar, nos casos em que as medidas estão em escassez, teriam um desempenho epidemiológico superior se administradas primeiro àqueles que praticam mais interações sociais em comparação com aqueles que estão em risco (por exemplo, idosos, doentes) como é atualmente recomendado pela OMS para as vacinas contra a covid-19, e praticado por todos os governos”, afirma Gal Ehrlich, um dos donos da patente, em e-mail ao Comprova.

Ehrlich nega que a invenção tenha relação com a Pfizer ou com qualquer outra farmacêutica. Na verdade, ninguém se interessou ainda em aplicar o modelo desenvolvido pela dupla. “Infelizmente, nem a Pfizer nem ninguém, até agora, manifestou qualquer interesse nesta invenção/patente”, disse ao Comprova.

O que dizem a Pfizer e as agências de regulação

A reportagem entrou em contato com a Pfizer para solicitar esclarecimentos sobre como foi elaborada a fórmula da vacina, se o grafeno integra sua composição e também de que maneira foi realizada a patente do imunizante contra a covid-19.

A farmacêutica afirmou que em nenhum momento patenteou qualquer sistema de rastreamento, como afirma a publicação compartilhada no Telegram.

“Com relação às informações que têm circulado em redes sociais e aplicativos de mensagens sobre a vacina ComiRNAty, esclarecemos: a Pfizer não confirma registro de patente e nenhum componente que faça o rastreamento dos vacinados”, disse a empresa, em nota.

Também procurada, a FDA respondeu que “essas afirmações são completamente falsas” e que nenhuma vacina aprovada pelo órgão contém os materiais citados nas alegações feitas no vídeo. Acrescentou que a lista de ingredientes nas vacinas pode ser encontrada na Folha de Dados para Destinatários e Cuidadores.

Ainda de acordo com a agência, as orientações para o desenvolvimento da vacina descrevem as recomendações da FDA para medidas de controle de qualidade (aqui e aqui).

Há, ainda, o memorando de autorização de uso de emergência para um produto não aprovado, que inclui informações sobre química, fabricação e controles da vacina, bem como informações sobre a condução de ensaio clínico. Essas mesmas informações, acrescenta, estão disponíveis para a vacina da Pfizer.

Para os imunizantes aprovados há informações mais extensas sobre medidas de controle de qualidade, segundo explica o órgão.

Por fim, a agência indica uma entrevista em áudio postada no YouTube, em agosto deste ano, na qual o médico Peter Marks, diretor do Centro de Avaliação e Pesquisa Biológica (CBER) do FDA, fala sobre a desinformação que circula em torno das vacinas, a partir de 9 minutos e 47 segundos.

Segundo ele, um dos maiores desafios para vacinar o público tem sido a quantidade esmagadora de afirmações falsas que circulam sobre vacinas. Marks cita, como exemplos, boatos de que os imunizantes causam infertilidade, que contêm microchips e que podem causar a própria covid-19. “E pior, ouvimos falsas alegações de que milhares de pessoas morreram por causa da vacina. Deixe-me esclarecer que essas afirmações simplesmente não são verdadeiras”, declara.

No Brasil, foi procurada a Anvisa, que também informou que a vacina da Pfizer não inclui substâncias como o grafeno e que a composição consta na bula do produto. “É importante destacar que a regulamentação de produtos estéreis é bastante rigorosa em relação à presença de impurezas, inclusive aquelas que possam ser resultantes do processo de produção de medicamentos e vacinas”, diz a nota encaminhada ao Comprova.

A bula do imunizante foi registrada na Anvisa no dia 23 de fevereiro de 2021. Diferentemente do que afirma o vídeo, em nenhuma parte do documento a farmacêutica ou a agência reguladora de saúde citam o grafeno como um dos compostos presentes nos imunizantes.

Segundo o documento, cada dose da vacina diluída contém um composto de RNA mensageiro, de cadeia simples, altamente purificado e produzido usando transcrição in vitro, a partir dos modelos de DNA correspondentes. A função dessa fórmula é codificar a proteína S — spike — do SARS-Cov-2 e combatê-lo.

O mesmo imunizante também é composto por excipientes — ingredientes diluídos, de poder terapêutico, utilizados para assegurar a estabilidade dos fármacos —, que incluem sacarose, cloreto de sódio, cloreto de potássio, fosfato de sódio dibásico di-hidratado, fosfato de potássio monobásico e água para injetáveis.

Afinal, o que é o grafeno?

Mencionado como o material que está revolucionando a tecnologia, o grafeno é uma das formas do carbono, extremamente fino, resistente, transparente e leve, além de ser capaz de conduzir correntes elétricas. O foco neste elemento se assemelha à revolução associada às descobertas do plástico e do silício.

Formado por carbono puro — também presente no diamante —, o material é obtido por meio da extração do grafite, um dos materiais mais abundantes da Terra.

Presente desde o lápis até painéis fotovoltaicos, o uso do grafeno rendeu o Nobel da Física de 2010 ao cientista russo-britânico Konstantin Novoselov e ao cientista neerlandês Andre Geim, ambos da Universidade de Manchester, na Inglaterra.

De acordo com o vacinologista e professor da UFPel, Odir Dellagostin, o grafeno é uma das formas cristalinas do carbono, com inúmeras aplicações, que vão desde a indústria têxtil, até a área de construção civil, passando por novos materiais.

“O óxido de grafeno é uma nanopartícula que vem sendo estudada como aditivo em fármacos e até mesmo como adjuvante de vacinas, tendo demonstrado resultados promissores. Porém, o grafeno não está presente nas vacinas contra a covid-19”, explica Dellagostin, ao comentar sobre as afirmações falsas do vídeo aqui verificado.

Além disso, a nanopartícula presente nas vacinas da farmacêutica Pfizer é composta de lipídio, não de grafeno, segundo informações presentes na bula dos medicamentos e confirmadas pelo professor.

O vacinologista afirma ainda que, por não estar presente na composição dos imunizantes contra o coronavírus, não é possível detectar o grafeno em um organismo vacinado.

“Grafeno é uma nanopartícula, que vem sendo testada como adjuvante — espécie de auxiliar — de vacina, mas que não está presente ainda em nenhuma vacina. Não há como detectar grafeno no organismo vacinado”.

O especialista desmente o vídeo do suposto jornalista que afirma ser possível rastrear pessoas por meio das nanopartículas de grafeno. “Não há nenhuma forma de ‘rastrear’ pessoas por meio destas nanopartículas. Creio que o boato surgiu pelo fato de que estas vacinas têm nanopartículas lipídicas na sua composição”.

Essas nanopartículas são pedaços microscópicos de gordura, que contêm um RNA mensageiro, fragmento genético com instruções para que células do corpo humano produzam a proteína Spike do SARS-CoV-2, vírus que causa a covid-19. A mesma explicação sobre a composição de imunizantes foi dada em uma verificação da Agência Lupa.

De acordo com o professor, estudos conduzidos pela UFPel têm testado nanotubos de carbono — um derivado do grafeno — como adjuvante das vacinas. Os resultados foram promissores, mas Dellagostin ressalta que para ser possível chegar a um produto comercial e seguro, serão necessários mais estudos.

“Há ainda uma preocupação com os riscos que estas partículas nanométricas podem ter no organismo. Esta é a única preocupação”.

Patentes para medicamentos nos Estados Unidos

O FDA explica que as patentes são um direito de propriedade concedido pelo Escritório de Patentes e Marcas Registradas dos Estados Unidos (Upsto) a qualquer momento durante o desenvolvimento de um medicamento e pode abranger uma ampla gama de reivindicações.

As informações relacionadas às patentes de medicamentos devem ser submetidas via formulários para que sejam indexadas no Orange Book, uma base de dados que contém informações sobre medicamentos coletadas desde 2013.

No caso das vacinas, como a ComiRNAty, as informações são depositadas em outro banco de dados, identificado como Purple Book, que reúne os produtos biológicos licenciados pela FDA, incluindo produtos biossimilares e intercambiáveis ​​licenciados e seus produtos de referência.

Sobre o autor

O autor do vídeo é o jornalista Claudio Lessa, que passou por diversos veículos de comunicação até o início dos anos 2000, quando foi aprovado em um concurso para a Câmara dos Deputados.

Conteúdo postado por ele anteriormente já foi alvo de verificação do Comprova. A reportagem tentou entrar em contato com Lessa, pelo Facebook, mas ele não respondeu até esta publicação.

Por que investigamos?

Em sua quarta fase, o Comprova verifica conteúdos suspeitos sobre pandemia, políticas públicas do governo federal e eleições. O vídeo aqui verificado teve 16 mil visualizações até o dia 4 de novembro de 2021.

Conteúdos falsos referentes à segurança das vacinas cientificamente comprovadas como o principal método contra o novo coronavírus podem causar pânico na comunidade e desencorajar a vacinação.

Postagens semelhantes a esta foram verificadas pelas agências Boatos.org, Factual AFP e Reuters.

Sobre imunizantes, o Comprova já identificou ser falso que órfãos da Polônia são usados em experimentos de vacina da Pfizer e Moderna, que tuíte engana ao dizer que vacina da Pfizer tem partículas contaminantes e que é falso que documento da Suprema Corte dos EUA afirme que vacinados contra a covid-19 se tornam transumanos.

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.

Política

Investigado por: 2021-11-01

É falso que Bolsonaro está distribuindo aos estados máquinas que Dilma doaria a países africanos

  • Falso
Falso
Não foram encontradas notícias de que Dilma Rousseff já tenha feito doações de maquinário a países africanos como afirma vídeo compartilhado nas redes sociais; máquinas que aparecem em vídeo no TikTok e WhatsApp têm logo de programa federal que fez as compras com dinheiro de emenda parlamentar.
  • Conteúdo verificado: Vídeo que circula no TikTok e no WhatsApp exibe máquinas agrícolas e diz que os equipamentos teriam sido comprados pelo governo de Dilma Rousseff (PT) para uma doação aos países da África. Além disso, o mesmo post afirma que a entrega não teria sido feita, e agora o governo Bolsonaro (sem partido) estaria distribuindo as máquinas pelo Brasil.

É falso que a ex-presidente Dilma Rousseff (PT) tenha organizado uma doação frustrada de máquinas pesadas a países da África e que agora o governo de Jair Bolsonaro (sem partido) estaria direcionando os equipamentos para cidades brasileiras. Estas alegações são ditas por um homem em um vídeo no qual aparece um maquinário sendo transportado em caminhões.

Não há nenhuma notícia na imprensa profissional de que Dilma teria planejado doar máquinas para o continente africano durante sua gestão. Também não há informações de que a gestão Bolsonaro tenha encontrado máquinas disponíveis para distribuir aos municípios.

O Ministério do Desenvolvimento Regional tem um programa que fornece máquinas pesadas a municípios de baixa e média renda. As máquinas são compradas com dinheiro de emendas parlamentares. A tática ganhou força no governo Bolsonaro como forma de ganhar apoio de congressistas em votações importantes e é alvo de apurações dos órgãos de controle do Executivo federal.

Tentamos contato com o usuário que compartilhou o vídeo, porém, não tivemos resposta. Não foi possível identificar quem fez a gravação.

O Comprova considerou o conteúdo falso por ter sido inventado que as máquinas foram compradas no governo Dilma e que seriam doadas para países africanos.

Como verificamos?

O primeiro passo foi pesquisar no Google pelas palavras-chave “Dilma”, “máquinas” e “África”, que não trouxe nenhum resultado na mídia profissional. Encontramos algumas matérias que falam sobre parcerias para vendas de máquinas à Nigéria, tanto no governo Dilma quanto no de Temer (MDB).

A partir disso, pesquisamos por “máquinas” e “nordeste”. O resultado mostrou um programa do governo Bolsonaro chamado Máquinas do Desenvolvimento. Na sequência, comparamos as máquinas que aparecem nas fotos do programa com as que são mostradas no vídeo viral e foi possível ver as semelhanças, tais como a logotipia do programa, o nome da empresa e o logotipo do governo federal.

Para ter certeza de que essas máquinas não foram compradas durante o governo Dilma, o Comprova procurou no Diário Oficial da União, no Painel de Compras do Ministério da Economia e no Portal da Transparência por compras pelo governo de produtos da XCMG.

Também tentamos contato com a XCMG, com o Ministério do Desenvolvimento Regional e com a Controladoria-Geral da União, mas não obtivemos retorno.

Por fim, tentamos contato com o autor da postagem no Tiktok por meio do perfil dele no Linkedin. Também tentamos contato com a secretaria municipal de Maurilândia, onde a pessoa trabalha, mas não fomos atendidos.

Verificação

Dilma Rousseff doou máquinas para a África?

Ao procurar pelas palavras-chave “Dilma”, “máquinas” e “África”, não foi possível localizar nenhuma reportagem que informasse que o governo federal teria doado máquinas para o continente africano. Este já era um indicativo de que o conteúdo pudesse ser falso, pois uma política pública como essa seria amplamente noticiada em veículos da imprensa profissional.

Algumas reportagens falam em parcerias de venda de máquinas — e não doação — para a África. Em fevereiro de 2013, o jornal Extra informou que a então presidente Dilma, durante viagem à Nigéria, anunciou cooperação em pesquisa na agricultura. Também buscava parcerias na comercialização de máquinas e equipamentos agrícolas.

Em 2016, a gestão de Michel Temer (MDB) também mirou parcerias com o governo nigeriano. Como mostrou o jornal Valor Econômico, o governo federal planejava abrir uma linha de crédito de US$ 1,1 bilhão para financiar a venda de máquinas e equipamentos agrícolas. O plano era fazer frente à influência chinesa no continente africano. As negociações ainda envolviam a venda de fertilizantes, sementes, pesticidas e marketing.

Máquinas possuem logo de programa federal

Ao procurar pelas palavras-chave “máquinas” e “nordeste” no Google, é possível encontrar uma notícia no site do governo federal sobre a entrega de máquinas pesadas na Paraíba. A ação faz parte do programa Máquinas do Desenvolvimento, do Ministério do Desenvolvimento Regional, que oferece maquinário de infraestrutura para municípios de baixa e média renda. A iniciativa não é exclusividade da gestão Bolsonaro, como mostra esta notícia da Agência Brasil, de 2014.

A informação sobre a entrega do maquinário na Paraíba possui uma foto das máquinas. Elas têm um logotipo que é semelhante ao que aparece no início do vídeo viral:

Mais adiante no vídeo, outra máquina aparece com um adesivo diferente. Ele possui o logotipo do governo Bolsonaro, “Pátria Amada Brasil”, e setas verdes apontando para cima. Este padrão também aparece na foto publicada pelo Ministério do Desenvolvimento Regional:

Entramos em contato com o Ministério do Desenvolvimento Regional para questionar se a pasta reconhece as máquinas como sendo do programa e se as informações da postagem viral seriam verídicas, mas não obtivemos resposta.

Em seu site, o ministério informa que as máquinas foram adquiridas por meio de emendas parlamentares. Como revelou o jornal Estadão, o governo Bolsonaro liberou bilhões de reais a um grupo de deputados e senadores aliados que determinaram o que fazer com o dinheiro com pouco critério técnico ou transparência. Muitos equipamentos são comprados com valores acima do valor de referência estipulado pela administração pública.

O caso ficou conhecido como “tratoraço”, pois grande parte dos valores foi direcionada pelos parlamentares para a compra de tratores e outras máquinas em suas bases eleitorais. Os principais órgãos utilizados para direcionar os recursos são o Ministério do Desenvolvimento Regional e a empresa estatal vinculada Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf).

O Tribunal de Contas da União já solicitou acesso aos documentos do Palácio do Planalto para apurar o esquema. A área técnica do Tribunal afirma ter encontrado indícios de irregularidades envolvendo a transparência e os critérios para a distribuição dos recursos.

Compras do governo federal com a empresa

Assim como as máquinas do programa Máquinas do Desenvolvimento, as do vídeo viral também foram fabricadas pela empresa XCMG, como é possível ver nos logos.

Com essa informação, buscamos por compras que o governo poderia ter feito da empresa. O Ministério da Economia sugeriu que a consulta fosse feita pelo Painel de Compras, porém a ferramenta só tem dados a partir de 2017. A pasta também disse que as informações podem ser consultadas pela API de Dados Abertos — com informações referentes até 2001. Na ferramenta só constam contratos da empresa com o governo desde 2017, ou seja, quando Dilma não era mais presidente.

Também fizemos a busca pelo Portal da Transparência. O resultado mostrou duas compras em 2016, porém elas foram realizadas em novembro e dezembro, quando Dilma não estava mais na presidência, e ambas se referem à aquisição de somente uma pá carregadeira sobre rodas, no valor de R$ 216.999.

A Controladoria-Geral da União apontou um sobrepreço de até R$ 130 milhões no edital 22/2020, feito pelo Ministério do Desenvolvimento Regional para concentrar a compra das máquinas. Deste total, R$ 101 milhões seriam de um contrato com a XCMG para a compra de 1.544 motoniveladoras.

Tentamos entrar em contato com a XCMG para confirmar se a empresa vendeu algo para o governo Dilma, mas nenhum e-mail foi respondido e ninguém atendeu os telefones.

Quem é o autor

O vídeo foi postado no Tiktok pelo perfil @edsonmelo787. Em seu perfil na rede social, ele diz que é de Maurilândia, no Tocantins, e que trabalha com gestão pública. No Linkedin, Melo informa que é secretário Municipal de Controle Interno na Prefeitura Municipal de Maurilândia. Apesar disso, o site da prefeitura informa que o cargo é ocupado por Neilson Monteiro de Castro.

Procurado, não respondeu.

Por que investigamos?

Em sua quarta fase, o Comprova checa conteúdos sobre políticas públicas que atinjam alto grau de viralização nas redes sociais. Este vídeo foi compartilhado em diversas plataformas.

Obras públicas são uma das principais formas pelas quais o presidente Jair Bolsonaro faz promoção de seu governo. Isso faz com que muitos conteúdos sobre o tema viralizem nas redes sociais e isso abre espaço para a desinformação. Já mostramos ser falso que o asfalto que cedeu em trecho da BR-319 fosse obra do atual governo. Também comprovamos que não era verdade que o governador da Bahia, Rui Costa (PT), estivesse desfazendo uma obra do governo federal no estado.

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.

Eleições

Investigado por: 2021-10-29

Publicações falsas inventam que jogadores de times europeus dedicaram gols a Bolsonaro

  • Falso
Falso
São falsas duas publicações virais no Facebook que falam que jogadores internacionais homenagearam Jair Bolsonaro (sem partido). Não existem registros de que Mohamad Salah, do Liverpool, e Ciro Immobile, da Lazio, tenham se manifestado a favor do presidente brasileiro.
  • Conteúdo verificado: Post inventa que Mohamed Salah, atacante egípcio do Liverpool, dedicou três gols a Jair Bolsonaro (sem partido). Publicação semelhante que começou a circular antes cita outro jogador internacional, o italiano Ciro Immobile, da Lazio.

São inventadas as informações de posts virais no Facebook com homenagens de jogadores de futebol internacionais ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido) após gols e vitórias de suas equipes.

Na publicação mais recente aparece o egípcio Mohamed Salah, atacante do time inglês Liverpool, com uma frase falsa enaltecendo Bolsonaro após supostamente ter ouvido boas referências de brasileiros companheiros de clube. Na semana passada, circulava uma montagem semelhante com foto do atleta italiano Ciro Immobile, que joga na equipe também italiana do Lazio.

Apontado como fonte de uma das histórias, o jornalista Jorge Nicola não fez publicação sobre a suposta homenagem de Salah a Bolsonaro. “Não escrevi nada daquilo”, ele afirmou ao Comprova.

No post com Immobile, a alegação é que a origem da história seria um jornal esportivo italiano, mas não há nenhuma reportagem com esse conteúdo.

A reportagem escreveu para as páginas que publicaram os conteúdos. O perfil Bolsonaro Presidente no Facebook não respondeu até a publicação deste texto. Já o grupo Bolsonaro 2022 BR não foi possível contatar porque não há opção de envio de mensagem.

O Comprova considerou os conteúdos falsos porque foram inventados.

Como verificamos?

Para verificar o caso de Salah, a reportagem checou o blog e todas as redes sociais de Jorge Nicola, jornalista citado como fonte da história, e não encontrou nenhuma referência ao caso no YouTube, Twitter, Facebook e Instagram. Houve contato com o próprio Nicola por mensagens no WhatsApp e ele negou ter publicado o conteúdo.

O Comprova também fez contato com o assessor de imprensa de Alisson Becker, um dos jogadores brasileiros citados em um dos posts.

Sobre o caso que circulou na semana anterior, de Immobile, a equipe entrou em contato com a assessoria de imprensa do jogador pelo Instagram e LinkedIn e fez buscas em sites de jornais esportivos da Itália, para verificar se algum deles seria a fonte citada no post, e não havia nenhuma informação sobre a homenagem. Também foram checadas as redes sociais do jogador italiano e não havia nenhuma manifestação sobre Bolsonaro. Até o momento, a assessoria do jogador não respondeu às mensagens.

Verificação

Mohamed Salah

No dia 24 de outubro, o Liverpool goleou o rival Manchester United por 5 a 0, com três gols de Mohamed Salah, um dos 30 melhores jogadores do mundo na atualidade, segundo lista do prêmio Bola de Ouro da revista francesa France Football. Tentando aproveitar a popularidade do egípcio, um post afirma falsamente que ele admira Jair Bolsonaro pelo que escuta em conversas com jogadores brasileiros do clube, como o goleiro Alisson, o volante Fabinho e o atacante Roberto Firmino.

A assessoria de imprensa do goleiro Alisson Becker afirmou que a situação narrada na postagem é falsa.

A fonte citada na publicação é “Jorge Nicolas”, grafia errada do nome do jornalista Jorge Nicola, que mantém blog no Yahoo e negou que tenha feito qualquer reportagem sobre o tema. “Nunca”, foi o que respondeu categoricamente ao ser questionado se já divulgou entrevista com esse conteúdo.

Ciro Immobile

A fonte citada no post sobre Immobile é “Jornal esportivo italiano”, sem especificar qual veículo de imprensa teria feito reportagem sobre o assunto.

No La Gazzeta dello Sport, nenhuma matéria foi publicada com os nomes de Immobile e Bolsonaro no mesmo texto.

No Corriere dello Sport, houve uma história com os dois envolvidos, mas não está relacionada ao assunto. A reportagem é 26 de março de 2020 e repercute a entrevista que Lucas Leiva, jogador brasileiro da Lazio, deu ao Globo Esporte com alerta para sua terra natal sobre o perigo do coronavírus. Até aquele dia, a covid-19 tinha matado 77 pessoas no Brasil, mas já afetava com maior intensidade a Itália, onde haviam falecido 8.215 cidadãos. Leiva relatava a rotina da quarentena no país. A matéria fala da postura negacionista do presidente brasileiro que desdenhava do perigo e descartava a necessidade de isolamento.

O nome de Immobile aparece na página em galeria de fotos que mostra jogadores que publicaram em redes sociais com a hashtag em italiano “iostoacasa”, que, em português, significa “eu fico em casa”, postura diferente da que foi defendida por Bolsonaro desde o início da pandemia.

O jogador italiano usou a mesma hashtag ou semelhantes em outras publicações. Ele também doou uma camisa de futebol para leilão com a renda revertida para um hospital que tratava vítimas da covid-19. Quando recebeu agradecimento pelo gesto, retribuiu chamando os profissionais da saúde de “verdadeiros campeões”.

Por que investigamos?

Em sua quarta fase, o Comprova verifica conteúdos suspeitos sobre pandemia, políticas públicas do governo federal e eleições. O post falso sobre homenagens de Salah a Bolsonaro teve cerca de 3,9 mil reações e mais de 1,7 mil compartilhamentos até não poder ser mais visualizado no Facebook. A publicação com Immobile teve 2 mil reações e mais de 500 compartilhamentos até 28 de outubro, quando também foi bloqueada.

Qualquer cidadão tem o direito de apoiar o político que quiser, mas é perigoso para a democracia quando a opinião é formada com base em conteúdos falsos, como estes verificados aqui.

Conteúdos iguais ou similares foram considerados falsos pelas agências de checagem Estadão Verifica, LupaAos Fatos e Boatos.org.

O Comprova já classificou como falso outros conteúdos que associavam os nomes de atletas a apoio a Bolsonaro, como o que inventava que o surfista Italo Ferreira teria pedido a prisão do ex-presidente Lula (PT) durante as Olimpíadas de Tóquio e o que dizia que a trilha usada em apresentação da ginasta Rebeca Andrade no mesmo evento seria uma homenagem a Bolsonaro.

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.

Saúde

Investigado por: 2021-10-29

CDC não disse que imunidade natural é superior à das vacinas, como sugere empresário indiciado pela CPI

  • Falso
Falso
É falso que o Centro de Controle de Doenças (CDC) dos Estados Unidos tenha admitido que a imunidade de quem já foi infectado pela covid-19 seja superior a de quem se vacinou. Tuíte de um empresário brasileiro reproduz o conteúdo de uma publicação em inglês escrita após uma troca de emails com o CDC. Embora o autor insista que a “imunidade natural” é superior aos imunizantes, o órgão americano não sustenta essa tese nas mensagens. Na verdade, o CDC defende que mesmo quem já teve a doença deve se imunizar, para evitar reinfecções. Um estudo publicado pelo órgão diz ainda que as vacinas melhoram resposta imune em pessoas que tiveram a doença.
  • Conteúdo verificado: Tuíte afirma que o “CDC americano teve que admitir, em uma troca formal de emails, que a imunidade natural é superior à imunidade da vacina”. O link que acompanha o tuíte mostra uma troca de emails entre um escritório de advocacia e integrantes do CDC, mas, em nenhum momento, o CDC faz tal admissão.

É falso um tuíte do empresário Otávio Fakhoury segundo o qual o CDC, órgão de controle de doenças americano, teria admitido que a imunidade de quem já teve covid-19 é superior a de quem se vacinou. Ele se baseia em uma publicação em inglês que trocou emails com o CDC. Nas mensagens publicadas em anexo pelo site, o CDC, na verdade, reitera sua política de que mesmo as pessoas que já se recuperaram do novo coronavírus devem buscar ser imunizadas.

Além disso, no site da instituição, há um estudo defendendo que as vacinas melhoram a resposta imune em pessoas que já tiveram a doença.

Autoridades de saúde do Brasil, como a Anvisa, a Sociedade Brasileira de Imunizações, a Fiocruz e o Instituto Butantan também defendem que mesmo os recuperados devem buscar se vacinar para se proteger contra novas variantes e porque a imunidade natural tende a cair com o tempo.

Essa necessidade de reforço dos anticorpos também foi explicada ao Comprova pelo imunologista João Bosco, do Hospital Albert Einstein. Após analisar o conteúdo original, o médico ainda criticou o fato de o estudo citado pelo site em inglês, no qual Fakhoury se baseou, estar em um repositório de pré-publicações e, portanto, nunca ter tido seus resultados revisados por outros cientistas.

Indiciado pela CPI da Pandemia por supostamente financiar sites que difundem desinformação sobre a covid-19, o empresário disse ao Comprova, por telefone, que apenas reproduziu em português o que estava dito na página em inglês, não emitindo nenhuma opinião nova e, por isso, não deveria ser alvo de uma verificação.

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.

Como verificamos?

Inicialmente, o Comprova contatou o CDC questionando se a troca de e-mails é real e aguardamos um retorno. Além disso, foram realizadas buscas na internet para saber quem é Otávio Fakhoury.

Verificamos que ele atua como líder do PTB em São Paulo e foi indiciado por incitação ao crime (artigo 286 do Código Penal) pela CPI da Covid, no Senado Federal, que apura as ações e omissões do governo federal e seus aliados no combate à pandemia.

Encaminhamos um e-mail ao diretório estadual da sigla em que ele atua para saber se ele gostaria de se manifestar sobre o posicionamento compartilhado no Twitter. Em retorno, a assessoria política do PTB informou que Fakhoury estava disponível para esclarecer pontos via ligação.

Na sequência, a reportagem foi em busca de estudos do próprio órgão de saúde norte-americano que mostrassem seu posicionamento científico a respeito da imunidade contra a covid-19. Encontramos pesquisas que asseguram que a vacina é a melhor alternativa contra o vírus por reduzir as chances de reinfecção e desenvolvimento de quadros graves da doença.

Através dos sites dessas instituições, também consultamos a posição da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e do Instituto Butantan sobre a necessidade de imunizar pessoas que já se recuperaram da covid-19.

A reportagem contatou ainda o médico imunologista João Bosco, diretor de genética do Hospital Albert Einstein, em São Paulo, que analisou o conteúdo da publicação.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 29 de outubro de 2021.

Verificação

Vacinas melhoram resposta imune em pessoas que tiveram a doença, sugere estudo do CDC

Diferentemente do que sugere a publicação compartilhada no Twitter, o CDC afirma em um estudo divulgado em agosto deste ano que as vacinas trazem uma proteção maior a pessoas que tiveram infecção prévia por covid-19. A pesquisa desenvolvida em Kentucky, nos Estados Unidos, avaliou a imunidade de pessoas que já tinham sido infectadas com o Sars-COV-2.

Centenas de moradores da região, que haviam contraído o vírus até junho de 2021 e não foram vacinados, tiveram 2,34 vezes mais chances de reinfecção em comparação com os totalmente imunizados.

Segundo o CDC, os resultados sugerem que, entre as pessoas que tiveram covid-19 anteriormente, a vacinação completa fornece proteção adicional contra a reinfecção.

As vacinas também evitaram hospitalizações ligadas à covid-19 entre os grupos de maior risco, como idosos acima dos 65 anos e pessoas com comorbidades. “À medida que os casos, hospitalizações e mortes aumentam, os dados do relatório semanal sobre a doença reforçam que as vacinas são a melhor forma de prevenir a covid-19″, explica o CDC.

O autor da publicação em inglês na qual o tuíte se baseou apresentou uma petição ao CDC pedindo que revisse a política de vacinação de quem já teve a covid-19. O pedido foi rejeitado por uma questão formal. Ainda assim, o órgão faz questão de reiterar a necessidade de vacinação para quem já foi infectado, como uma forma de prevenir a reinfecção pelo novo coronavírus. O CDC argumenta que os dados atuais mostram que contrair novamente a doença é mais provável para quem não recebeu os imunizantes.

No email, o CDC diz ainda que não vai oferecer uma resposta detalhada a todas as “incorreções” presentes no email. O autor, então, diz que o órgão “falhou em rebater de forma clara, consistente e irrefutável” os argumentos. Ao contrário do que afirma o post em inglês e, em seguida, o tuíte do empresário brasileiro, no entanto, o CDC nunca admitiu que a “imunidade natural” é superior à conquistada pelas vacinas.

Categorias de imunidade contra a covid-19

O centro de monitoramento de doenças norte-americano detalha quais são os tipos de imunidades geradas contra a covid-19 e pontua que existem dois grupos: o de imunidade ativa e outro de imunidade passiva.

O primeiro ocorre quando há a exposição ao vírus e o sistema imunológico precisa reagir com a produção de anticorpos contra a doença, o que pode ocorrer por imunidade natural — quando há um quadro infeccioso — ou por imunidade induzida pela vacina.

Já os casos de imunidade passiva ocorrem quando um bebê recém-nascido adquire anticorpos por meio da placenta ou do leite materno.

“A principal vantagem da imunidade passiva é a proteção ser imediata, enquanto a imunidade ativa leva tempo (geralmente várias semanas) para se desenvolver”, detalha o CDC.

Autoridades no Brasil

Como o Comprova mostrou recentemente, a Anvisa já argumentou que testes de anticorpos não substituem a imunização e servem tão somente para indicar se as pessoas já foram infectadas pelo Sars-CoV-2.

“Não existe, até o momento, a definição da quantidade mínima de anticorpos neutralizantes necessária para conferir proteção imunológica contra a infecção pelo Sars-CoV-2, uma reinfecção, as formas graves da doença e nem contra as novas variantes circulantes”, diz a agência brasileira, na nota técnica 33/2021.

A Sociedade Brasileira de Imunizações também defende que pessoas que já tiveram a doença devem se vacinar. “Como a duração da proteção natural gerada pela própria doença é desconhecida e por existir a possibilidade de reinfecção, ainda que pouco frequente, a vacinação é indicada, independentemente de histórico de covid-19”, argumenta a entidade. A única recomendação é esperar quatro semanas após o início dos sintomas para se vacinar ou, no caso de assintomáticos, após receber o resultado positivo no teste de RT-PCR.

A mesma posição é defendida pela Fiocruz e pelo Instituto Butantan, centros de pesquisa responsáveis pela produção da AstraZeneca e da CoronaVac. “Mesmo quem já teve covid-19 deve ser imunizado”, defende a Fiocruz.

“Isso porque, mesmo com anticorpos, nem sempre o organismo cria a chamada ‘memória imunológica’, que é a capacidade de reconhecer e se proteger contra uma segunda invasão. E uma pessoa pode contrair novamente a covid-19, ainda mais por conta das variantes que circulam por aí”, explica o Butantan.

Especialista reforça que mesmo quem teve covid deve se vacinar

A pedido do Comprova, o imunologista João Bosco analisou o conteúdo verificado. Segundo ele, mesmo quem já foi infectado pelo coronavírus deve se vacinar.

“A gente sabe que a infecção natural claramente induz proteção. Ninguém está dizendo que não. Quem teve infecção passada está mais protegido do que quem nunca se vacinou ou nunca foi infectado. Porque o nosso organismo produz anticorpos. Só que os níveis de proteção alcançados pela infecção natural são inferiores a quem toma duas doses de uma boa vacina. Principalmente agora que muitos de nós estão tomando uma dose extra de reforço”, afirmou.

Segundo ele, isso acontece porque os imunizantes estimulam mais produção de anticorpos do que no caso de uma infecção comum. “A gente já sabe que quanto mais anticorpos, mais difícil é de você ser infectado ou que essa infecção seja mais grave”, lembra o médico. Além disso, o especialista afirma que, para quem já se recuperou da covid-19, a vacinação pode funcionar como uma dose de reforço dessa imunidade.

“Independente de como você adquirir a proteção, pelo que a gente tem visto da covid, o nível dessa proteção tende a cair com o tempo. Inclusive por causa do surgimento de novas variantes. Tanto que nós já estamos trabalhando com uma janela de aplicação de uma dose de reforço do imunizante de seis a oito meses em alguns grupos mais vulneráveis. É possível que a gente entre num ciclo como o influenza, o vírus da gripe, que todo ano a gente tem uma vacina nova por causa do surgimento de novas variantes. Por isso eu me vacino mesmo depois de ter sido infectado”, projeta o imunologista.

Ele lembra ainda que a imunização ajuda a proteger outras pessoas, como crianças, que não puderam se proteger e, com menos vírus circulando, a chance de surgirem novas variantes diminui.

Por fim, Bosco questiona o artigo citado como argumento pela publicação, dizendo ser errado afirmar que os anticorpos produzidos por uma infecção natural não permitem a transmissão do vírus. “Tanto o vacinado quanto quem foi infectado podem ter infecção por Delta, por exemplo”, afirma. Ele cita que o texto está disponível apenas num repositório de pré-publicação e, portanto, não foi sequer revisado e confirmado pela comunidade acadêmica.

O autor

Otávio Fakhoury é um empresário que se descreve em sua conta verificada no Twitter como “conservador, antiglobalista, anticomunista”, além de presidente do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) em São Paulo. Essa informação pode ser confirmada no site do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Ele foi indiciado por incitação ao crime (artigo 286 do Código Penal) pela CPI da Covid no Senado Federal por suspeita de disseminar fake news. Segundo o relatório final, ele teria financiado diversos grupos e sites que propagaram desinformação durante a pandemia, investindo mais de R$ 310,2 mil ao longo dos anos de 2020 e 2021, além de transferências financeiras para o blogueiro Allan dos Santos.

Ainda de acordo com o documento, ele também teria feito postagens em suas próprias redes sociais com críticas à vacinação e defendendo o uso de medicamentos sem eficácia para tratar a covid-19.

“Com essa conduta, Otávio Fakhoury contribuiu para que um número significativo de brasileiros não aceitasse a vacinação com a CoronaVac”, afirma o relatório.

Fakhoury depôs à CPI no dia 30 de setembro. Disse que suas conclusões seriam uma opinião pessoal e que a emitiu com base no direito à liberdade de expressão.

O que diz Fakhoury

Em entrevista ao Comprova via ligação pelo WhatsApp, na presença do assessor de comunicação, Otávio Fakhoury afirmou que a postagem do Twitter não tinha cunho opinativo, com exceção da última linha, em que ele escreveu: “Leia a troca formal com o CDC e julgue você mesmo”.

De acordo com ele, o restante do tuíte seria uma transcrição resumida do que havia na suposta troca de mensagens entre o colunista norte-americano e o CDC.

“No meu texto deixei claro ali [que não opinei]. Até escrevi que não emiti opinião minha. Coloquei no final que gostaria que todo mundo formasse a sua opinião”, disse o líder do PTB. Fakhoury também disse não ser apto a debater sobre a imunização e que apenas leu o “texto inteiro” e achou “a troca de emails interessante”.

O líder do PTB alega não ser contra a vacinação, mas declara abertamente que não concorda com o uso obrigatório dos imunizantes contra a covid-19 e o passaporte vacinal.

“Eu até coloquei num segundo tuíte agora, como você está falando comigo, onde eu digo: (sic) ‘Antes q qquer um venha taxar o tweet acima de ‘fake news’, já deixo claro q o q escrevi foi um resumo em português do q foi escrito nos parágrafos iniciais pelo autor do artigo. Não sou jornalista, não faço notícias, e o q compartilho são matérias q podem ser de interesse geral'”.

Por telefone, o político disse que o texto é apenas uma tradução e que a veracidade do texto deve ser checada com o autor do mesmo. Mais uma vez, ele voltou a afirmar que apenas “reproduziu a tradução”.

“Eu não sou técnico, mas gosto de ler coisas de gente técnica. Cresço quando assisto gente técnica debater, a gente não cresce vendo senador debater. Sou leigo, então como posso formar uma opinião? Vendo os técnicos falarem, vendo o CDC falar”, reforçou.

Ao ser questionado sobre a leitura de um estudo recente do centro de controle da saúde norte-americana, que aponta para a melhor resposta imune em pessoas já tiveram covid-19 e se vacinaram, Fakhoury afirmou não saber da existência dele.

Por que investigamos?

Em sua quarta fase, o Comprova verifica conteúdos suspeitos que tenham viralizado sobre a pandemia, as políticas públicas do governo federal e as eleições. O tuíte em questão teve mais de 3 mil interações.

Publicações que envolvem a covid-19, especialmente as vacinas, são importantes de serem verificadas porque podem afetar a confiança da população nos imunizantes que, até aqui, são a principal arma defendida por autoridades de saúde para combater a doença. Além disso, pessoas desinformadas sobre a pandemia podem colocar suas vidas em risco.

Recentemente, o Comprova mostrou que os testes de anticorpos não devem substituir a vacina contra a covid-19, como sugeria um deputado do Paraná; que uma deputada distorceu entrevista de uma diretora do CDC para criticar as vacinas e a adoção de “passaportes sanitários”; e que um infectologista fez uma publicação enganosa ao comparar a imunidade gerada por doenças como sarampo, febre amarela e hepatite B àquela gerada pela covid-19.

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.

Saúde

Investigado por: 2021-10-29

É falso que órfãos da Polônia são usados em experimentos de vacina da Pfizer e Moderna

  • Falso
Falso
São falsas as afirmações compartilhadas por uma apresentadora brasileira que vive nos Estados Unidos sobre médicos poloneses terem denunciado a utilização de bebês órfãos em experimentos ilegais de “vacinas de engenharia genética” contra a covid-19, desenvolvidas pela Pfizer e Moderna. A partir de mentiras, a publicação nociva induz a população a evitar os imunizantes, ainda que os insumos sejam comprovadamente eficazes e seguros, de acordo com órgãos nacionais e internacionais de vigilância em saúde.
  • Conteúdo verificado: Texto que circula nas redes sociais diz que médicos poloneses denunciaram supostos “experimentos ilegais realizados com bebês órfãos na Polônia, Espanha, Finlândia e Estados Unidos”. Os experimentos, diz o texto, visam “testar suas novas vacinas de engenharia genética“.

É falso que médicos poloneses denunciaram a utilização de bebês órfãos em experimentos ilegais de “vacinas de engenharia genética” contra a covid-19. A autora da postagem é Karina Michelin, já verificada em checagens anteriores do Comprova, e na publicação verificada utiliza argumentos sem comprovação, desmentidos pelo Ministério da Saúde polonês e pela fabricante dos imunizantes.

Procurada pelo Comprova, a primeira conselheira de Missão da Embaixada da República da Polônia em Brasília, Renata Siuda-Ambroziak, afirmou que todos os estudos sobre o imunizante contra o coronavírus obtiveram autorização legal exigida pelas entidades de saúde e ética locais.

Além disso, um infectologista e professor da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) esclareceu que “engenharia genética” é o antigo nome dado à biologia molecular, utilizada tanto na fabricação de vacinas quanto de medicações, como a insulina.

Diferentemente da indução que o texto de Karina Michelin faz sobre o uso dessa técnica ser algo prejudicial, o especialista afirma que ela é utilizada por mais de 50 anos, sem prejuízos aos usuários dos fármacos.

A reportagem contatou a autora da postagem, para saber quais eram suas fontes e verificar a procedência das informações. Até o momento, não houve retorno.

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.

Como verificamos?

O Comprova contactou as farmacêuticas Pfizer e Moderna para checar se as informações citadas na publicação verificada procediam. Apenas a primeira retornou até o momento, com explicações sobre a não procedência das informações.

Em seguida, pesquisamos na internet sobre quem é Grzegorz Braun, o político citado na postagem. O Comprova pesquisou o perfil de Braun no Twitter para descobrir se, realmente, ele compartilhou informações a respeito de supostos experimentos ilegais com crianças órfãs polonesas, como divulgaram Karina Michelin, em sua página, e o grupo Médicos pela Vida, pelo Telegram.

Na sequência, a reportagem recorreu às checagens anteriores sobre publicações feitas por Michelin, para consultar as informações que haviam sido levantadas sobre ela. Buscas na internet também foram realizadas para conseguir dados sobre quem seria a jornalista e apresentadora, além do contato com ela. Até o momento, não houve retorno.

Depois, fez contato com o político Grzegorz Braun por meio do perfil dele no Twitter, na página pessoal que ele mantém na internet e, também, com o partido que ele diz presidir.

O passo seguinte consistiu em buscar respostas junto ao governo polonês procurando a Embaixada da Polônia em Brasília, a fim de confirmar a existência de tal pesquisa e saber se ela estaria sendo feita com crianças órfãs da covid-19 no país.

Por último, foi consultado Daniel Mansur, infectologista e professor da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), para que uma explicação científica sobre o assunto pudesse contextualizar e dizer se procedia ou não o uso de “engenharia genética” para a produção de vacinas.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 29 de outubro de 2021.

Verificação

O que diz o governo polonês

A equipe do Comprova contatou o Ministério da Saúde da Polônia, e também a Embaixada da Polônia em Brasília. Nos dois casos, enviamos o link do post do político Grzegorz Braun sobre a pesquisa realizada no país com crianças, e também o da postagem de Karina Michelin.

Em resposta, Renata Siuda-Ambroziak, primeira conselheira/vice-chefe da Missão da Embaixada da República da Polônia em Brasília confirmou que um ensaio clínico patrocinado pela BioNTech com a vacina Comirnaty está em andamento no país e que todos os protocolos legais foram cumpridos.

“O estudo é justificado cientificamente, descrito no protocolo do ensaio clínico e conduzido por pesquisadores – médicos com qualificação profissional adequada, conhecimento científico e experiência no trabalho com pacientes”. Além disso, o pesquisador é responsável pela obtenção do consentimento consciente de cada participante do estudo.

A vice-chefe da missão acrescentou que, em abril deste ano, “o estudo obteve a autorização legalmente exigida junto ao Gabinete de Registo do PLWMiPB e o parecer favorável da comissão de ética, após cumprir os requisitos estabelecidos no regulamento que rege os ensaios clínicos de medicamentos”.

A pesquisa tem três fases e o objetivo é determinar a dose e avaliar a segurança, a tolerabilidade e a imunogenicidade. O estudo de fase II/III é cego para observador controlado por placebo para determinar a segurança, a tolerabilidade e a imunogenicidade da vacina candidata de RNA Sars-CoV-2 contra covid-19 em crianças saudáveis ​menores de 12 anos. Siuda-Ambroziak ressalta que a fase I da pesquisa já foi realizada nos Estados Unidos.

Quanto ao procedimento adotado para as pesquisas com crianças, a chefe da Missão explica que, os regulamentos poloneses preveem a necessidade de consentimento do representante legal da criança menor de 13 anos.

Quanto ao questionamento se Grzegorz Braun oficializou alguma denúncia, a representante da embaixada da Polônia em Brasília informou que, “até ao momento, o Gabinete não recebeu qualquer informação sobre quaisquer irregularidades a este respeito. (…) Braun emitiu perguntas e notificações oficiais. Na opinião do Instituto, as dúvidas decorrem do desconhecimento das disposições legais sobre ensaios clínicos de medicamentos.”

Quem é Grzegorz Braun?

Grzegorz Michał Braun é um político conservador do Sejm, a Câmara baixa do parlamento polonês. Concorreu nas eleições municipais de Gdansk, logo após o assassinato do então prefeito Pawel Adamowicz, ocorrido em 2019. Segundo reportagem da RFI, a plataforma de Braun foi “a defesa da Polônia da invasão migratória e das ordens da União Europeia”.

No site que leva seu nome, ele diz ser graduado em Estudos Poloneses pela Universidade de Wrocław, onde também foi professor de jornalismo até 2007. Em 2015, concorreu ao cargo de presidente da República da Polônia.

No que consiste a denúncia?

O Comprova pesquisou o perfil de Grzegorz Michał Braun no Twitter para descobrir se, realmente, ele tuitou sobre supostos experimentos ilegais com crianças órfãs polonesas, como divulgaram Karina Michelin e o grupo Médicos pela Vida.

Localizamos o post e, usando a ferramenta do Google Tradutor, identificamos que, o post, ele publica a imagem de um documento e cita o presidente do Escritório de Registro de Medicamentos, Dispositivos Médicos e Produtos Biocidas, Grzegorz Cessak, afirmando que, desde 27 de de abril, havia uma decisão do órgão “que permite a vacinação experimental ‘anti covid’ de crianças e bebês saudáveis — a sentença de “partes” é suficiente para toda a justificativa”.

Após encontrar o documento postado pelo político, o Comprova recorreu ao Google Tradutor para descobrir como se escreve “crianças órfãs”, “órfãs” ou “órfãos” em polonês e encontrou os seguintes termos: “osierocone dzieci”, “sierota” e “sieroty”. Não há nenhuma dessas palavras no post de Braun nem no documento postado por ele. Há, tão somente, a afirmação de que as autoridades autorizaram “a vacinação experimental anti covid de crianças e bebês saudáveis”.

O Comprova quis saber de Braun qual era a crítica dele à pesquisa e se o documento postado fazia menção a crianças órfãs da covid. Os contatos foram feitos por meio de mensagens enviadas em seu perfil do Twitter e também para o Kon Federacja, partido do qual ele se apresenta como presidente. Além disso, nossa equipe enviou e-mail para a seção “contato” da página que ele mantém na internet. Até o fechamento desta matéria não houve retorno.

O que diz o infectologista

Diante da confirmação do governo polonês sobre a existência da pesquisa de vacina contra a covid-19 com crianças menores de 12 anos, o Comprova quis saber de um infectologista como são os protocolos de testes.

Daniel Mansur explica que é fundamental apresentar evidências dos ensaios de segurança durante o pedido de uso emergencial de vacina, capazes de assegurar que os imunizantes são seguros e eficazes.

O cientista descreveu ainda que esses mesmos ensaios costumam ser testados em grupos diversos de pessoas, iniciando a testagem — em linhas gerais — em pessoas a partir dos 18 anos e, à medida em que se apresentam indícios seguros e eficientes, outra faixa de idade é testada.

Ao ser questionado se era possível que crianças órfãs estejam sendo submetidas aos testes, como afirma a publicação de Karina Michelin, o infectologista afirma que a ação, caso estivesse de fato ocorrendo, não seria ética.

Terapia de “engenharia genética”

Diante dos questionamentos feitos na publicação sobre os imunizantes, o professor da UFSC disse que as vacinas são seguras e que, até agora, os efeitos colaterais que aparecem na maioria das pessoas são rápidos.

A engenharia genética faz parte da constituição de diversas vacinas, segundo explica o infectologista. Mansur diz ainda que este termo foi substituído por “biologia molecular”.

“Pessoas mais de antigamente chamariam isso de engenharia genética [esse método de produzir imunizantes]. Isso não quer dizer que existe um problema. É uma técnica estabelecida há 40, 50 anos. Então, sim, a maioria delas é feita por engenharia genética, mas não existe nenhum problema relacionado”.

A insulina e os anticorpos utilizados para tratar o câncer são exemplos que ilustram a utilização da biologia molecular no cotidiano, de acordo com o infectologista.

Quem é a autora do post verificado

A autora do post, replicado também no grupo do Telegram ‘Médicos pela Vida’, se apresenta no Linkedin como produtora e apresentadora de um programa de TV na Flórida, voltado para brasileiros interessados em compras e baladas em Miami.

Outras publicações de Karina já foram alvos de checagens do Comprova. No caso do vídeo postado por ela para dizer que a imprensa dá destaque para pesquisadores irrelevantes. Além de usar o índice-H — métrica que avalia a quantidade de citações de artigos científicos de um determinado pesquisador — de cientistas que estudam o novo coronavírus de forma equivocada, ela errou ao dizer que pesquisadores da Organização Mundial de Saúde (OMS) não têm citações acadêmicas.

O Comprova contatou a autora da postagem, para saber quais eram suas fontes e verificar a procedência das informações. Até o momento, não houve retorno.

Por que investigamos?

Em sua quarta fase, o Comprova verifica conteúdos suspeitos sobre pandemia, políticas públicas do governo federal e eleições. O post verificado alcançou 1.500 curtidas e mais de 500 compartilhamentos no Twitter.

Publicações falsas, como a que foi aqui verificada, colocam a saúde da população em risco ao afirmar que a vacinação contra a covid-19 voltada para crianças é dispensável. Já foi comprovada em estudos de órgãos nacionais a eficácia das vacinas disponíveis atualmente contra a doença.

Isso fica claro na reação dos seguidores de Karina Michelin ao comentarem o post. “Querem destruir a todo custo quem não tem como se defender… literalmente”, tuitou uma mulher que se apresenta como pastora.

Outro seguidor escreve: “Eugenia in progress”, com o emoji da lupa.

O Comprova já verificou outros boatos como esse relacionados à vacina, como um tuíte que engana ao dizer que a vacina da Pfizer tem partículas contaminantes e a publicação que engana ao dizer que dados oficiais sobre a covid-19 em 2020 e 2021 apresentados pelo G1 comprovam a ineficácia das vacinas

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.

Saúde

Investigado por: 2021-10-27

Frase de Nobel de Medicina, de 2007, é tirada de contexto para defender “tratamento precoce”

  • Enganoso
Enganoso
Post viral no Facebook engana ao associar comentário do vencedor do prêmio Nobel de Medicina de 1993, Richard J. Roberts, ao "tratamento precoce" contra a covid-19, comprovadamente ineficaz. O post sugere que não há interesse da indústria farmacêutica em produzir medicamentos para tratamento de doenças, mas a frase foi tirada de contexto. Ao Comprova, Roberts desmentiu a relação entre a frase que disse em 2007 e a pandemia.
  • Conteúdo verificado: Post no Facebook usa foto e comentário de Richard J. Roberts, vencedor do prêmio Nobel de Medicina de 1993, fora de contexto para promover o “tratamento precoce” contra a covid-19.

É enganosa a publicação viral no Facebook que usa uma fala de Richard J. Roberts, vencedor do Prêmio Nobel de Medicina, para promover o “tratamento precoce” contra a covid-19.

O autor do post usa a seguinte frase creditada a Roberts, acompanhada de foto do cientista: “Medicamentos que curam não são rentáveis, portanto, não são produzidos. A indústria farmacêutica, na realidade, não quer curar ninguém, e por um motivo muito simples e direto: a cura é menos rentável que a doença”. Na legenda, o autor do post enganoso escreve: “Por isso não queriam autorizar o tratamento precoce”, associando a reputação de um conceituado cientista a um tratamento sem eficácia comprovada.

O comentário foi feito por Roberts em 2007, mas nada tinha a ver com o novo coronavírus, que estava longe de ser descoberto. Ao Comprova, o cientista afirmou ter dado a declaração sobre “antibióticos e em relação à motivação do lucro que impulsiona a indústria farmacêutica” e descartou relação com a pandemia.

A reportagem contatou o perfil do grupo Bolsonaro 2022, um dos primeiros a publicar o conteúdo, mas não recebeu resposta. O Comprova considerou enganoso o conteúdo porque a frase foi tirada do contexto original e usada para induzir a uma interpretação diferente da intenção de seu autor.

Como verificamos?

A reportagem buscou informações sobre Richard J. Roberts e sobre seu trabalho com biologia molecular no processamento de genes que lhe rendeu o Nobel. Por meio de pesquisa no Google, verificou-se que o comentário dele sobre a indústria farmacêutica foi feito em entrevista publicada na página 64 da edição de 27 de julho de 2007 do jornal La Vanguardia, da Espanha.

Em seguida, o Comprova procurou também a Associação Brasileira de Ciências Farmacêuticas e o Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos no Estado de São Paulo para comentarem a alegação de que não haveria interesse em produzir medicamentos contra a covid-19, o que foi refutado por ambas as instituições.

O próximo passo foi contatar o cientista pelo e-mail informado na página da Universidade Northeastern, onde ele aparece como docente. Para saber mais sobre a pesquisa de novos medicamentos, a reportagem entrevistou, por WhatsApp, Lucindo Quintanas, diretor da Associação Brasileira de Ciências Farmacêuticas (ABCF) e pró-reitor de pós-graduação e pesquisa da Universidade Federal de Sergipe, além de representantes do Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos (Sindusfarma).

A equipe também procurou o autor de uma das primeiras publicações feitas utilizando a montagem no Facebook e o usuário que compartilhou o post relacionando-o ao “tratamento precoce”, mas eles não responderam até a publicação deste texto.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 27 de outubro de 2021.

Verificação

A origem da frase

A fala de Roberts é verdadeira, mas foi tirada de contexto. A afirmação é de 27 de julho de 2007, portanto 13 anos antes da pandemia, e está publicada no jornal espanhol La Vanguardia.

“Os antibióticos foram interrompidos porque eles são muito eficazes e curam completamente. Como nenhum novo antibiótico foi desenvolvido, os microrganismos infecciosos se tornaram resistentes e, hoje, a tuberculose, que havia sido derrotada na minha infância, está ressurgindo e matou 1 milhão de pessoas no ano passado”, diz o cientista no texto.

Questionado pelo jornalista do La Vanguardia se estaria se referindo ao Terceiro Mundo, Richard responde: “Esse é outro triste capítulo: apenas se investigam as doenças do Terceiro Mundo, mas os medicamentos que as combateriam não são rentáveis. Mas estou te falando do nosso Primeiro Mundo: o medicamento que cura completamente não é rentável e por isso não o pesquisam”.

Nenhuma referência à covid-19

O Comprova entrou em contato com Richard J. Roberts para esclarecer o contexto em que a fala sobre a indústria farmacêutica foi dita e questionou se ele mantém o mesmo entendimento quando trata-se da busca por novos medicamentos para a covid-19.

O cientista afirmou ter feito a declaração usada no post verificado aqui, “mas no contexto dos antibióticos e em relação à motivação do lucro que impulsiona a indústria farmacêutica”. À reportagem, ele explicou: “A premissa é simples. Se eu comprar um medicamento que me cura, só preciso de uma dose. Se eu comprar um medicamento que apenas atenua os sintomas temporariamente, preciso continuar a tomá-lo regularmente, talvez pelo resto da minha vida. Os lucros do último excedem em muito os do primeiro, mesmo que o custo de uma dose seja bastante alto”.

Quando questionado se a frase usada no post poderia ser aplicada em relação à pesquisa e ao desenvolvimento de remédios contra a covid-19, Richard afirmou que a situação é diferente também por aspectos econômicos. “É muito diferente. Em parte, devido ao número de casos em todo o mundo e à probabilidade de se tornar endêmica como a gripe. Em um caso como este, as consequências econômicas da doença são muito diferentes das de uma infecção bacteriana que ocorre com pouca frequência.”

Além do posicionamento enviado ao Comprova, Richard já havia se manifestado a favor da Ciência em outras ocasiões. Em um bate-papo com o pesquisador Johan Rockström e com a vice-presidente de Ciência e Programa do Museu do Prêmio Nobel, Anna Sjöström, publicado no canal oficial do Prêmio Nobel no YouTube, há sete meses, ele disse: “Sinto que os países que se saíram melhor na crise da covid foram aqueles nos quais os políticos realmente reconheceram que os cientistas eram as pessoas que precisavam fazer a comunicação, e não eles”. Na ocasião, o Nobel também afirmou que “o valor da Ciência realmente cresceu muito dentro de um ano nesta terrível pandemia” e defendeu os imunizantes, que costumam ser criticados por quem apoia o “tratamento precoce”. “A vacina foi desenvolvida em tempo recorde, o que foi realmente bom”, disse.

Sem comprovação científica

Desde os primeiros meses da pandemia, o governo federal defendia o uso de medicamentos sem comprovação científica para o tratamento da doença, algo que o presidente continua fazendo. Em 20 de maio de 2020, foi publicado documento com orientações para o manuseio de medicamentos incluídos no chamado “tratamento precoce” contra a covid-19.

Há menções ao tratamento precoce em boletins informativos disponibilizados no site do poder executivo entre 2020 e 2021, sendo que a última menção clara foi feita no dia 11 de janeiro de 2021, nos posts “Em visita a Manaus, ministro Pazuello diz que programa de vacinação do Brasil será ‘o maior do mundo’” e “Ministério da Saúde levanta situação da atenção primária em Manaus”.

No dia 25 do mesmo mês, a Folha noticiou que a Saúde apagou um texto que orientava o ‘tratamento’ de seu site oficial. Em maio, conforme a Piauí, a recomendação para o uso de cloroquina também foi deletada do site do Ministério da Saúde, às vésperas do início da CPI da Pandemia.

Sem nenhuma comprovação científica contra a covid e não recomendado por autoridades de saúde, o ‘tratamento’ continua sendo defendido por Jair Bolsonaro (sem partido), aliados e seguidores como uma forma de enfrentamento da pandemia. As ações do presidente em relação aos medicamentos foram alvo de investigação da CPI da Pandemia no Senado.

No relatório final da CPI consta trecho de uma nota técnica enviada pelo Ministério de Saúde com entendimento de que os medicamentos defendidos não têm eficácia comprovada e não devem ser usados no tratamento da doença. “Alguns medicamentos foram testados e não mostraram benefícios clínicos na população de pacientes hospitalizados, não devendo ser utilizados, sendo eles: hidroxicloroquina ou cloroquina, azitromicina, lopinavir/ritonavir, colchicina e plasma convalescente. A ivermectina e a associação de casirivimabe + imdevimabe não possuem evidência que justifiquem seu uso em pacientes hospitalizados, não devendo ser utilizados nessa população”, descreve o documento.

Entretanto, o presidente Jair Bolsonaro continua defendendo o tratamento precoce. Em 21 de setembro, quando participou da 76ª Conferência da Organização das Nações Unidas (ONU), ele disse que “desde o início da pandemia, apoiamos a autonomia do médico na busca do ‘tratamento precoce‘”.

Novos medicamentos

Lucindo Quintanas, diretor da Associação Brasileira de Ciências Farmacêuticas, reforçou que a aspa destacada no post verificado aqui foi tirada de contexto. “Em nenhum momento ele (Richards) afirma que o setor farmacêutico esteja trabalhando para o não desenvolvimento de drogas contra a covid-19. Pelo contrário, indústrias de biotecnologia, startups e o setor farmacêutico, chamado de big pharma, têm trabalhado incansavelmente no desenvolvimento das vacinas”, afirmou.

Segundo Quintanas, “algumas medicações estão sendo desenvolvidas para pacientes que vão ter a covid-19, alguns já estão na fase 3 de testes, e o setor farmacêutico é um grande parceiro e financiador de parte deste trabalho”.

Ele destacou ainda que “nesse momento, a covid é uma das áreas de maior interesse para o setor, que tem investido muito para desenvolver tratamentos de eficácia clínica para os pacientes e imunizantes para reduzir a possibilidade de que as pessoas cheguem a desenvolver as formas graves da doença”.

Em nota oficial enviada à reportagem, o Sindusfarma também destacou o empenho do setor para o desenvolvimento de imunizantes e de medicações. “A pandemia reafirmou o papel fundamental da indústria farmacêutica para a prevenção e a cura de doenças. Até a manhã do dia 22 de outubro, mais de 3,8 bilhões de pessoas – 50% da população mundial – foram vacinadas e protegidas. Uma grande conquista da indústria farmacêutica em benefício da Humanidade”, afirmou a entidade.

Quem é Richard J. Roberts?

Um dos vencedores do prêmio Nobel de Medicina de 1993, Richard J. Roberts é formado em Química e doutor em Química Orgânica pela Universidade de Sheffield, na Inglaterra. Atualmente, é diretor científico da New England Biolabs, empresa que trabalha na descoberta e produção de enzimas para aplicações em biologia molecular. Também está no quadro de docentes da Universidade Northeastern, em Boston, nos Estados Unidos.

Por que investigamos?

Em sua quarta fase, o Comprova verifica conteúdos suspeitos sobre pandemia, políticas públicas do governo federal e eleições. O post que associa a fala de Richard Roberts ao tratamento precoce teve mais de 2,6 mil compartilhamentos e 3,8 mil curtidas no Facebook até 27 de outubro.

Comentários na postagem, como “Sim, muitas doenças já têm cura e outras são provocadas pelos medicamentos contínuos que nos oferecem, quando lemos a bula vemos os interesses exclusos (sic). A vacina também é um jeito de deixá-los mais ricos do que já são” e “Fizemos aqui em casa o tratamento precoce e estamos todos bem, queremos saber também sobre as pessoas que tomaram a segunda dose da vacina e morreram de covid. Exemplo Tarcísio Meira e outros”, reforçam a ideia de que medicamentos e vacinas com segurança e eficácia comprovadas cientificamente não funcionam, contribuindo para a desinformação.

Outros conteúdos que tentam questionar a segurança das vacinas contra o coronavírus já foram publicados recentemente pelo Comprova, como a comparação enganosa entre a imunidade gerada pelas vacinas contra o sarampo, a febre amarela e a hepatite B com a da covid-19, a associação, também enganosa, entre partículas contaminantes e a vacina da Pfizer, e a suposição de que vacinados estariam se tornando transumanos.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; ou ainda aquele que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.