O Projeto Comprova é uma iniciativa colaborativa e sem fins lucrativos liderada pela Abraji e que reúne jornalistas de 42 veículos de comunicação brasileiros para descobrir, investigar e desmascarar conteúdos suspeitos sobre políticas públicas, eleições, saúde e mudanças climáticas que foram compartilhados nas redes sociais ou por aplicativos de mensagens.
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Saúde

Investigado por: 2021-01-19

Revisão de estudo publicado no site do MS não garante eficácia da hidroxicloroquina no tratamento preventivo contra covid-19

  • Enganoso
Enganoso
O artigo que fala sobre o uso da hidroxicloroquina como tratamento precoce para a covid-19 foi publicado em agosto de 2020 e foi apenas revisado em janeiro de 2021. E não comprova a eficácia do tratamento.
  • Conteúdo verificado: Postagem no Twitter que cobra do Ministério da Saúde a adoção do uso precoce de hidroxicloroquina no combate da covid-19 baseado em publicação do The American Journal of Medicine. O mesmo conteúdo foi publicado no site do Ministério da Saúde.

É enganosa uma série de postagens no Twitter que faz referência a um estudo do The American Journal of Medicine publicado em 1º de janeiro deste ano e que recomendaria o uso precoce da hidroxicloroquina na prevenção da covid-19. O mesmo estudo foi citado em uma matéria no site do Ministério da Saúde e em uma coluna de vídeo do jornalista Alexandre Garcia, posteriormente republicada pelo presidente Jair Bolsonaro.

O site do Ministério da Saúde diz que na primeira edição de 2021 o jornal americano traz um estudo que “comprova a eficácia do tratamento precoce na evolução da covid-19”. No entanto, o artigo que fala sobre o uso da hidroxicloroquina como tratamento precoce para a covid-19 foi publicado em agosto de 2020 e foi apenas revisado em janeiro deste ano.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) afirma em seu site, em referência ao uso da hidroxicloroquina, que “não há evidência científica até o momento de que esses medicamentos sejam eficazes e seguros no tratamento da doença”.

Em conversa com o Comprova, o pesquisador do Laboratório de Imunologia Aplicada da Universidade Federal de Santa Catarina Douglas Bardini afirma que o trabalho acadêmico que embasou a notícia publicada no site do Ministério da Saúde não passa de um “artigo de opinião”, visto que tem como referência uma série de artigos científicos sem evidências conclusivas.

O Comprova entrou em contato com um dos autores do estudo, Peter A. McCullough, professor de Medicina na Universidade de Baylor, no Texas (EUA). Ele respondeu informando que as atualizações realizadas no artigo inseridas no mês de janeiro referiam-se a algumas mudanças na pesquisa e nos aumentos de estudos sobre o tratamento precoce em alguns países.

Como verificamos?

O Comprova buscou a pesquisa na íntegra e entrou em contato com o pesquisador Peter A. McCullough, um dos autores do artigo. Verificamos a autoria e as datas de publicação e atualização do artigo no site do The American Journal of Medicine.

Consultamos também o pesquisador Douglas Bardini, cientista do Laboratório de Imunologia Aplicada da Universidade Federal de Santa Catarina, sobre as atualizações do artigo. Em consulta ao site da Organização Mundial de Saúde, coletamos informações sobre a eficácia do uso de hidroxicloroquina para tratamento da covid-19.

O Comprova ainda consultou Guilherme Werneck, médico e professor de Epidemiologia da UERJ, e vice-presidente da Associação Brasileira de Saúde Coletiva – ABRASCO. Ele analisou para o Comprova a resposta do autor do estudo.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 19 de Janeiro de 2020.

Verificação

O estudo comprova a eficácia da cloroquina?

O artigo foi publicado pelo “The American Journal of Medicine”, o jornal oficial da “Alliance for Academic Internal Medicine”. O artigo, conforme descrito no site, foi publicado no dia 6 de agosto e revisado em 1º de janeiro de 2021, diferentemente de como publicado na página do Ministério da Saúde, que menciona apenas a data da revisão do estudo.

Conforme o pesquisador do Laboratório de Imunologia Aplicada da Universidade Federal de Santa Catarina Douglas Bardini, a revisão do artigo é chefiada pelo médico americano Harvey Risch, professor na Universidade de Yale, e foi publicada no The American Journal of Medicine, que tem um fator de Impacto de 4,5 (método bibliométrico para qualificar a importância de periódicos científicos em suas respectivas áreas), o que pode ser considerado baixo/modesto.

Ele avalia que o trabalho acadêmico que embasou a notícia publicada no site do Ministério da Saúde não passa de um “artigo de opinião”, pois tem como referência uma série de artigos científicos sem evidências conclusivas.

Douglas aponta que a revisão leva em conta somente as partes dos estudos de observação que convém aos autores para embasar a utilidade do medicamento no tratamento da covid-19. “Aqui, o principal problema que eu vejo é considerar somente a parte da evidência científica que corrobora a opinião dos autores, principalmente quanto à eficácia da hidroxicloroquina”, completa o pesquisador.

Bardini ainda relata que o artigo deixou de levar em consideração estudos com outras metodologias, que têm maior relevância científica e que já comprovaram a ineficiência da hidroxicloroquina no tratamento da covid-19. Para Bardini, “nessa revisão, os autores citam alguns estudos observacionais, mas desconsideram ensaios clínicos randomizados, que teriam uma ‘força metodológica’ maior”. Em meados de agosto, data em que a revisão foi publicada em “acesso aberto”, ensaios com maior peso de evidência já atestavam a ineficiência da hidroxicloroquina. Essa ineficiência hoje é um consenso na comunidade científica.

O estudo chega a citar a interrupção dos testes clínicos com a hidroxicloroquina que foram realizados pelo “National Institutes of Health – NIH” (Centros de pesquisa que formam a agência governamental de pesquisa biomédica do departamento de Saúde e Serviços Humanos dos Estados Unidos). No site do NIH é possível encontrar um texto publicado no mês de outubro de 2020 que menciona o resultado dos testes e argumenta que “em outro ensaio clínico randomizado conduzido no Brasil, nem a hidroxicloroquina isolada nem a hidroxicloroquina associada à azitromicina melhoraram os desfechos clínicos entre pacientes hospitalizados com covid-19 leve a moderado”.

O que diz um dos autores do estudo

Em resposta ao e-mail do Comprova, Peter A. McCullough, esclareceu que as atualizações realizadas no artigo, inseridas no mês de janeiro, referiam-se a algumas mudanças na pesquisa e no aumento de estudos sobre o tratamento precoce em alguns países.

As maiores mudanças, segundo ele, foram a adição de estudos sobre a proteína spike, que é usada pelo coronavírus para penetrar nas células, e sobre aumento de dosagens de ivermectina em tratamentos da covid-19. Ele diz também que de agosto a janeiro houve um grande aumento no volume de estudos de suporte para poliquimioterapia, uma combinação de medicamentos, sequenciada para covid-19.

Para Guilherme Werneck, médico e professor de Epidemiologia da UERJ, e vice-presidente da Associação Brasileira de Saúde Coletiva – ABRASCO, a revisão feita em janeiro foi de cunho narrativo, alterando apenas sugestão de ‘escolha terapêutica’. “É que essa é uma revisão chamada de revisão narrativa na área científica – não tem método. A pessoa lê, incorpora o que acha relevante, junta evidências na base da experiência e chega às conclusões. No campo científico, as revisões narrativas caíram em grande desuso”, explica o professor.

Ele entende que o artigo, bem como sua revisão, expressa a concepção do autor, que lê cada um dos medicamentos e argumenta favoravelmente ao que considera justificativas para usar o medicamento.

“Basicamente, a revisão introduziu uma nova escolha terapêutica, que são os anticorpos monoclonais – são subconjunto de anticorpos mais específicos, mais potentes para finalidade de ‘inativar’ o vírus da covid-19 – via injetável. É uma visão particular do autor”, finaliza.

O que a ciência diz atualmente a respeito do “tratamento precoce” com cloroquina?

A Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) e a Organização Mundial da Saúde (OMS) enfatizam em seu site que o uso da cloroquina e hidroxicloroquina “têm pouco ou nenhum efeito na prevenção de mortes ou na redução de tempo que a pessoa passa hospitalizada. para tratamento contra covid-19. Acrescentam que “a maioria das pesquisas até agora sugere que não há benefício e já foram emitidos alertas sobre efeitos colaterais do medicamento. Por isso, enquanto não haja evidências científicas de melhor qualidade sobre a eficácia e segurança desses medicamentos, a OPAS recomenda que eles sejam usados apenas no contexto de estudos devidamente registrados, aprovados e eticamente aceitáveis”, argumentam as organizações.

Quem é o autor do tuíte investigado pelo Comprova?

A postagem viralizou no Twitter através da conta de Alessandro Loiola, que apareceu em outras 4 verificações feitas anteriormente pelo Comprova. A primeira em Outubro de 2020 quando o médico tirou de contexto dados de estudo para sugerir que máscaras são ineficientes. Em dezembro um vídeo publicado por deputado no Facebook no qual Alessandro afirma que as vacinas em desenvolvimento para a covid-19 e que utilizam as tecnologias de vetor viral, vacina de DNA e vacina de RNA mensageiro podem provocar danos genéticos potenciais em quem se imunizar. Ainda em dezembro durante uma entrevista ao programa Coliseum o médico e empresarios enganam ao desqualificar medidas protetivas e culpa China pela pandemia. Em Janeiro de 2021 ele descontextualiza manual da Pfizer para sugerir alteração genética pela vacina.

Alessandro Lemos Passos Loiola nasceu em 1971, é médico formado pela Escola de Medicina da Santa Casa, no Espírito Santo, e possui dois registros ativos em conselhos regionais de medicina no Brasil: Minas Gerais e São Paulo. Isso é comum porque um médico precisa ter registro em cada estado em que atua.

Alessandro Loiola foi também coordenador da Secretaria Especial de Cultura do governo federal. A nomeação para o cargo foi publicada no Diário Oficial da União de 27 de novembro de 2019. Ele foi nomeado pelo ministro do Turismo, Marcelo Henrique Teixeira Dias, para exercer o cargo de Coordenador-Geral de Empreendedorismo e Inovação, do Departamento de Empreendedorismo Cultural, da Secretaria da Economia Criativa, da Secretaria Especial da Cultura.

Menos de dois meses depois, no dia 24 de janeiro, ele foi exonerado do cargo também pelo ministro. A exoneração foi publicada no Diário Oficial da União no dia 27 de janeiro de 2020

Por que investigamos?

Em sua terceira fase, o Comprova investiga conteúdos duvidosos relacionados às políticas públicas do governo federal e à pandemia do novo coronavírus.

A repercussão da postagem foi de 7,4 mil curtidas e 2,9 mil compartilhamentos até o fechamento deste texto, além de trazer consigo link da página do Ministério da Saúde. Por se tratar de um portal com conteúdo oficial do governo federal, além da repercussão, acreditamos que a postagem pode ser perigosa, uma vez que vários outros estudos e debates acerca do uso da hidroxicloroquina para tratamento da covid-19 apontam em sentido contrário. O tweet também incentiva que o governo federal faça divulgação desse uso do medicamento na imprensa, o que pode ser prejudicial para os tratamentos.

O UOL Confere também apurou a respeito do estudo, após um tweet de Jair Bolsonaro, que continha um vídeo do jornalista Alexandre Garcia falando sobre a mesma publicação. Segundo a investigação, o Ministério da Saúde também defendeu o estudo em nota no dia 2 de janeiro. Na segunda-feira (18), a coluna de Lauro Jardim em O Globo informou que a revista que publicou o estudo usado por Bolsonaro para defender a cloroquina desmentiu o presidente.

No fim de semana, o próprio Twitter lançou alerta sobre post feito pela conta do Ministério da Saúde, conforme publicou o site G1. O órgão sugeria urgência na realização de tratamento precoce para quem tiver sintomas da covid-19. Tal tratamento inclui o uso de hidroxicloroquina.

O Comprova já verificou outros conteúdos envolvendo a pandemia da covid-19, vários deles a respeito de uma suposta eficácia da hidroxicloroquina no tratamento da covid-19, como um texto enganoso afirmando que a cloroquina seria capaz de curar em 98.7% dos pacientes com a doença, uma fala de Bolsonaro defendendo que o medicamento teria salvado 100 mil vidas no Brasil, e desmentindo um post no Facebook que afirmava que o uso de cloroquina em Porto Feliz (SP) evitou mortes.

Enganoso, para o Comprova, é conteúdo que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Saúde

Investigado por: 2021-01-19

É falso que enfermeira que recebeu a primeira dose da CoronaVac já estivesse imunizada

  • Falso
Falso
Mônica Calazans participou como voluntária dos estudos clínicos feitos no Brasil da vacina CoronaVac, mas ela estava no grupo que recebeu placebo, substância sem efeito, e não as doses do imunizante.
  • Conteúdo verificado: Publicações de deputado paulista questionam a razão pela qual a enfermeira Mônica Calazans recebeu a primeira dose da CoronaVac se ela já estaria imunizada por ter participado dos testes da vacina do Butantan.

É falso que a enfermeira Mônica Calazans, primeira pessoa a receber a vacina contra a covid-19 no Brasil, já estivesse imunizada por ter participado dos testes da vacina do Butantan, como diz o deputado paulista Gil Diniz (sem partido) em postagens no Facebook e Twitter.

De fato, Mônica participou como voluntária dos estudos clínicos feitos no Brasil da vacina CoronaVac, desenvolvida pelo Instituto Butantan em parceria com o laboratório chinês Sinovac. Ela recebeu duas aplicações dos testes entre julho e agosto de 2020. No entanto, no dia 17 de janeiro, ela foi informada que estava no grupo que recebeu placebo e não as doses do imunizante.

Durante o processo de pesquisa, um grupo recebia a vacina e outro grupo recebia placebo. Nenhum dos participantes sabia de qual grupo fazia parte. Apenas após a conclusão das pesquisas é divulgado quem faz parte de cada grupo.

A enfermeira, além de integrar a linha de frente, faz parte do grupo de risco para o coronavírus – é obesa, hipertensa e diabética. Mônica foi auxiliar de enfermagem por 25 anos e se graduou em Enfermagem aos 47 anos. Segundo reportagem da CNN Brasil, Mônica foi aprovada em concurso público para a área da saúde em fevereiro de 2015 e foi chamada em regime de emergência no início da pandemia pelo governo de São Paulo.

A postagem ainda afirma que a própria enfermeira postou em suas redes sociais que estava na praia no final do ano. A foto foi postada no Facebook pessoal de Mônica. Em entrevista ao programa Encontro com Fátima, da TV Globo, ela disse que às vezes vai à praia, mas que não participa de aglomerações. Ela defendeu que “o fato de uma pessoa sair, andar na praia, entendo que não é aglomeração”.

Como verificamos?

Procuramos Mônica Calazans para esclarecer sua participação nos testes da vacina em julho e agosto de 2020. Confirmamos ser dela o perfil no Facebook onde foi publicada em 19 de dezembro de 2020 uma foto de Mônica, com duas amigas na praia. Esta imagem foi reproduzida no post de Diniz.

Na publicação do deputado também consta a imagem de uma notícia veiculada no último dia 8 de janeiro, no site do Conselho Regional de Enfermagem de São Paulo (Coren-SP). Nela, há relatos de profissionais da área da saúde sobre a vacinação. O depoimento da enfermeira Mônica Calazans está entre eles.

Realizamos buscas no Google por outras reportagens sobre Mônica.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 18 de Janeiro de 2020.

Verificação

A participação de Mônica Calazans nos testes da CoronaVac

Mônica Calazans tem 54 anos e é enfermeira da Unidade de Terapia Intensiva (UTI) do Hospital Emílio Ribas, em São Paulo. Ela realmente participou como voluntária dos estudos clínicos feitos no Brasil da vacina CoronaVac, desenvolvida pelo Instituto Butantan em parceria com o laboratório chinês Sinovac. No entanto, estava no grupo que recebeu placebo, substância sem efeito, e não as doses do imunizante.

Em contato com o Comprova, a enfermeira confirmou que tomou as duas aplicações dos testes entre julho e agosto de 2020. Apesar disso, somente no último domingo, dia 17 de janeiro, ela foi informada que estava no grupo que recebeu placebo, e que havia sido escolhida para desta vez receber a vacina, se tornando a primeira brasileira a ser imunizada contra a covid-19.

Quem é Mônica Calazans e por que ela foi escolhida para receber a primeira dose da vacina?

Mônica Aparecida Calazans, 54 anos, moradora de Itaquera, Zona Leste de São Paulo (SP), é enfermeira na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) do Instituto de Infectologia Emílio Ribas, em São Paulo. Além de fazer parte da linha de frente, ela também faz parte do grupo de risco para o coronavírus, é obesa, hipertensa e diabética.

Mônica foi auxiliar de enfermagem por 25 anos e se graduou em Enfermagem aos 47 anos. Segundo reportagem da CNN Brasil, Mônica foi aprovada em concurso público para a área da saúde em fevereiro de 2015 e foi chamada em regime de emergência no início da pandemia pelo governo de São Paulo.

Mônica foi escolhida para ser a primeira brasileira vacinada por ser trabalhadora de saúde e atuar na linha de frente da covid-19, e também por pertencer ao grupo de risco. Também ficou conhecida depois que foi personagem de reportagens na imprensa e venceu o prêmio Notáveis CNN, premiação do canal de notícias que contemplou pessoas que lutam contra o novo coronavírus. Ela foi a vencedora na categoria Heroína do Ano e representou os profissionais da saúde que atuam durante a pandemia.

“É toda uma história de vida. Diante dos prêmios e toda minha trajetória profissional e principalmente na pandemia, eu fui a escolhida. Havia outros 100 profissionais lá”, afirma. Sobre o como foi o procedimento para receber o imunizante, Mônica conta que as pessoas que fazem parte do grupo que participou da pesquisa recebem um telefonema semanalmente para saber o estado de saúde de cada um. “Eu tive todo um aparato dos profissionais para qualquer problema que eu tivesse poderia fazer contato, eu tive um respaldo e isso sempre me deixou muito tranquila”.

As imagens usadas no post do deputado

O deputado Gil Diniz reproduziu duas imagens na publicação investigada pelo Comprova. São capturas de tela de uma notícia e de uma postagem da enfermeira feita em seu perfil no Facebook.

A primeira imagem é a reprodução de uma notícia veiculada no dia 8 de janeiro de 2021 no site do Conselho Regional de Enfermagem de São Paulo (Coren-SP). A matéria, intitulada “Covid-19: profissionais de enfermagem contam experiência como voluntários nos testes da vacina”, traz o relato de três profissionais da área da saúde, incluindo a enfermeira Mônica Calazans. Eles contam como foi o processo de vacinação e de monitoramento após receberem as doses. A reportagem informa que que os voluntários não sabem se receberam vacina ou um placebo.

A segunda imagem publicada pelo deputado, a reprodução de um post feito por Mônica em seu perfil de Facebook, mostra a enfermeira na praia ao lado de duas mulheres, com a legenda “Oiii, vcs [vocês] que lutem”, em registro de 19 de dezembro de 2020.

Ao Comprova, Mônica disse que a foto é de um dia de folga com outras duas amigas também profissionais da saúde na Praia Grande, estadi de São Paulo. “Eu tenho um apartamento na praia, por isso eu fui. Acho que um banho de mar tinha o direito de tomar e foi o que eu fiz”. Ela também reforça que optou por um horário com pouco movimento, pois não participa de aglomerações e disse acreditar que o maior risco são baladas, encontros com muitas pessoas e festas clandestinas que desrespeitam as normas de distanciamento social.

O perfil no Facebook divulgado no tuíte do deputado é a conta pessoal da enfermeira. Desde o domingo, no entanto, Mônica relata que foram criadas diversas contas e postagens falsas em redes sociais com o nome dela.

Quem é Gil Diniz?

Gildevanio Ilso dos Santos Diniz, conhecido também como Gil Diniz, é deputado estadual de São Paulo (sem partido). Foi filiado ao Partido Social Cristão (PSC) de 2015 a 2018. Após sua saída do PSC, foi filiado ao Partido Social Liberal (PSL), até ser expulso em 2020 por disseminação de notícias falsas e ataques a instituições democráticas, como o Supremo Tribunal Federal (STF). Antes de ingressar na carreira política, Gil trabalhava nos Correios, como carteiro na zona leste de São Paulo.

Gil Diniz tem ligação com Eduardo e Carlos Bolsonaro desde 2014. No período em que esteve filiado ao partido PSC, Diniz foi assessor da equipe de Eduardo Bolsonaro. Em 2018, foi eleito deputado estadual pelo PSL em São Paulo com 214.037 votos.

Por que investigamos?

Em sua terceira fase, o Comprova investiga conteúdos duvidosos relacionados às políticas públicas do governo federal e à pandemia do novo coronavírus que tenham grande alcance nas redes sociais. O conteúdo que motivou esta verificação teve, até o fechamento desta reportagem, 4,1 mil compartilhamentos no Twitter e 19 mil no Facebook.

Após muita repercussão sobre a eficácia da vacina e estudos e testes na preparação da Coronavac no Brasil, o post é problemático pois põe dúvida na efetividade do plano de imunização contra a covid-19. Além disso, usa de informações pessoais de Mônica Calazans – como a foto na praia, por exemplo – para validar seu argumento.

O G1 – Fato ou Fake publicou na segunda-feira (18) uma verificação a respeito de mensagem nas redes sociais afirmando que a enfermeira Mônica já havia tomado anteriormente a dose da vacina, e que portanto não precisaria de outra dose. A Agência Lupa, também fez checagem da postagem de Diniz.

Falso, para o Comprova é, conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.

Saúde

Investigado por: 2021-01-18

São enganosas as postagens que dizem que os vacinados pela CoronaVac estarão protegidos pela metade

  • Enganoso
Enganoso
A imunização é uma estratégia coletiva para proteger a sociedade como um todo e os dados da vacina desenvolvida pela Sinovac e pelo Instituto Butantan indicam que ela é capaz de atenuar a crise de saúde pública no Brasil
  • Conteúdo verificado: Tuíte questiona a taxa de eficácia de 50, 38% da vacina CoronaVac, anunciada pelo Instituto Butantan. O autor compara a eficácia da imunização e a possibilidade de diagnóstico positivo da covid-19 com um jogo de cara ou coroa.

É enganoso um tuíte de Filipe Martins, assessor especial para assuntos internacionais do presidente Jair Bolsonaro, em que ele compara a CoronaVac, vacina desenvolvida pela companhia chinesa Sinovac e pelo Instituto Butantan, em São Paulo, a um jogo de cara ou coroa, por conta da taxa de eficácia global de 50,38% do imunizante. No tuíte, em uma tentativa de minimizar a possível contribuição da CoronaVac, Martins ignora que as estatísticas apresentadas pela vacina demonstram que ela pode, sim, ajudar a atenuar o problema de saúde pública pelo qual passa o Brasil devido à pandemia de covid-19.

No tuíte, Martins afirma: “Como você se sentiria se um médico lhe dissesse que ele pode descobrir se você tem coronavírus com base em um jogo de cara-ou-coroa? (sic) Isso é mais ou menos o que vai acontecer com sua imunização, se você optar por tomar a vacina xing ling de 50,38% de eficácia do João Dória”. Como mostra esta verificação, o comentário não tem sentido, e portanto engana, uma vez que a imunização é uma estratégia coletiva para proteger a sociedade como um todo e não um procedimento realizado para proteger cada indivíduo isoladamente.

O conteúdo foi publicado no dia 12 de janeiro e posteriormente apagado pelo autor, mas ainda circula em outros perfis e páginas em várias redes sociais. O Projeto Comprova entrou em contato com a assessoria do governo federal, mas não obteve retorno até o momento da publicação desta reportagem.

Como verificamos?

Inicialmente, o Comprova buscou esclarecimentos a respeito das estatísticas da CoronaVac com o Instituto Butantan, responsável pelo desenvolvimento da vacina.

Em seguida, ouvimos o médico sanitarista e vice-presidente da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), Reinaldo Guimarães, para averiguar e contextualizar quais são os conceitos necessários para avaliar as taxas de eficácia de vacinas.

Também buscamos Jesem Orellana, epidemiologista da Fiocruz/Amazônia, que explicou como funciona a eficácia de imunização e como a CoronaVac se aplica ao contexto atual, alertando para a urgência da situação pandêmica no país.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 18 de Janeiro de 2021.

Verificação

A eficácia global da CoronaVac

A pesquisa com a CoronaVac contou com 12,5 mil voluntários em 16 centros científicos no Brasil. Todos os voluntários eram profissionais de saúde, com risco muito alto e contínuo de exposição ao coronavírus. Eles receberam duas doses da vacina, com intervalos de duas semanas entre cada aplicação. A pesquisa demonstrou, em primeiro lugar, que o imunizante é seguro. Nenhuma reação adversa grave foi registrada entre os participantes.

O segundo passo necessário diz respeito à eficácia da vacina. A CoronaVac se baseia na inativação do vírus Sars-CoV-2 para induzir o sistema imunológico humano a reagir contra o agente causador da covid-19. A tecnologia é similar à de outras vacinas produzidas pelo Butantan. Em 12 de janeiro, o instituto informou que a CoronaVac obteve 50,38% de eficácia global no estudo clínico desenvolvido no Brasil. Este número é superior ao patamar de 50% recomendado pela Organização Mundial de Saúde para que a CoronaVac seja utilizada no Plano Nacional de Imunização (PNI).

Esse número se refere ao contágio da doença e inclui, portanto, os pacientes assintomáticos. É o que explica Reinaldo Guimarães, da Abrasco. “O número de 50,3% diz respeito a casos leves e assintomáticos que só souberam que estavam infectados porque fizeram um teste de PCR durante o ensaio fase 3 dos testes”, afirmou ele ao Comprova.

O número de 50,38% não significa, portanto, que metade das pessoas estará imunizada e a outra metade necessariamente vai pegar o vírus. O número significa que a probabilidade de pegar o vírus diminui em 50,38%. Por exemplo, se em um grupo qualquer, em um cenário sem vacina, dez pessoas fossem pegar o vírus, num cenário com a vacina esse número cairia para cinco.

A eficácia de 78% da CoronaVac

A eficácia global da CoronaVac não é o único número relevante, no entanto. “O que realmente importa é a capacidade da vacina em prevenir casos graves, que exijam internação, UTI e que costumam levar à óbito. Para esses casos, a eficácia da vacina é de quase 100%”, afirma Guimarães, da Abrasco.

Além da eficácia global, as estatísticas do Butantan trouxeram os resultados da vacina para casos leves e para casos moderados e graves. No primeiro critério, de casos leves, designados como aqueles em que o paciente precisa de algum tipo de assistência médica, o nível de proteção é de 78%. Ou seja, quem tomar a vacina possui, além de 50% menos risco de ser contaminado pela covid-19, 78% menos risco de ser contaminado e desenvolver sintomas leves.

Nos testes da CoronaVac, casos moderados foram considerados aqueles em que o paciente é hospitalizado e casos graves os que os pacientes são hospitalizados e precisam de UTI. Neste critério, a eficácia divulgada foi de 100% – ou seja, nenhuma das pessoas do grupo das vacinadas foi parar na UTI – mas este resultado ainda precisa de mais estudos, pois o número de casos graves na pesquisa foi muito baixo para ter significância estatística, como afirmou Ricardo Palacios, diretor médico de pesquisa do Instituto Butantan.

Jesem Orellana, epidemiologista da Fiocruz/Amazônia, explica que a eficácia de uma vacina é a capacidade que esse imunizante tem de proteger as pessoas. Então, quando é atestado que uma vacina é 100% eficaz contra a covid-19, isso significa que a cada 100 pessoas vacinadas, provavelmente nenhuma delas vai adoecer. “Quando você diz que a eficácia é de 70%, é o mesmo raciocínio: de 100 pessoas expostas, 70 serão protegidas, e assim por diante”, afirma.

Orellana destaca que as estatísticas da CoronaVac indicam que ela pode ajudar o Brasil a reduzir significativamente o problema de saúde pública pelo qual passa. “Quando estou pensando como um gestor de saúde pública, alguém preocupado, por exemplo, com a pressão que uma doença como a covid-19, emergente e nova, pode causar sobre as unidades básicas de saúde, sobre os hospitais, sobre as demandas por internação em leito de UTI e, principalmente, de mortes, eu não fico tão preocupado com uma vacina que seja super potente e eficaz”, afirma.

Segundo ele, o mais importante nesse momento é poupar vidas. “Algumas vacinas que não têm uma taxa de eficácia global tão grande, como a vacina da AstraZeneca e, principalmente, a CoronaVac, são muito úteis para a saúde pública”, diz. “Embora não evitem, digamos, 90% dos casos gerais de covid-19, vão evitar a maior parte dos casos graves e, muito provavelmente, quase todas as mortes por covid-19. Isso é o mais importante, esse é o papel de uma vacina. A taxa de eficácia tem que ser interpretada dessa maneira”, afirma.

Na visão do epidemiologista, a afirmação de Martins é essencialmente política e não tem base em conhecimentos sanitários, imunológicos e epidemiológicos. Em suas palavras, trata-se de “uma afirmação vazia, com finalidade política e que desconsidera completamente a interpretação dos resultados específicos da CoronaVac, por exemplo, para proteção de doenças graves, que levaria a internações, gastos milionários com internações por dias e semanas, sejam em leitos clínicos ou leitos de UTI, e principalmente a morte.”

Orellana destaca ainda que as análises sobre a CoronaVac precisam ser feitas tendo como pano de fundo a realidade brasileira. “Estamos em momento de emergência sanitária e não temos opções, sejam elas financeiras, operacionais, logísticas, ou de acesso à vacina com eficácia melhor”, afirma ele. “O que temos que fazer nesse momento é ser realistas, olhar para nossa realidade, contexto e infraestrutura e ver o que há disponível nesse momento. Não adianta dizer que a eficácia global da CoronaVac é baixa se você não tem outra proposta viável para proporcionar a imunização de brasileiros em curto espaço de tempo”, conclui.

A importância das vacinas

Conforme já verificado pelo Comprova em outras checagens, o corpo humano tem um sistema imunológico capaz de identificar células estranhas, reagindo a fungos, bactérias, vírus e parasitas. A resposta biológica e natural é um processo inflamatório que desencadeia uma série de reações às doenças existentes. Por isso, as vacinas são meios eficazes, pois aumentam a imunidade adquirida e evitam o contato com a doença. Além disso, a alta cobertura vacinal protege aqueles que não podem se vacinar, como pessoas mais velhas e com doenças pré-existentes, por cessar ou diminuir drasticamente a circulação de microorganismos. Atualmente, as vacinas protegem milhões de pessoas em todo mundo.

É o caso da vacina contra varíola, que erradicou completamente a doença no mundo em 1980. Segundo Tedros Adhanom Ghebreyesus, dietor-geral da OMS, a doença foi erradicada devido a um esforço global, que uniu solidariedade, ciência e uma vacina segura e eficaz. Após a erradicação da varíola, a OMS e o UNICEF lançaram o Programa Expandido de Imunização, no qual 85% das crianças do mundo foram vacinadas e protegidas de doenças debilitantes.

Por que investigamos?

Em sua terceira fase, o Comprova investiga conteúdos duvidosos relacionados às políticas públicas do governo federal e à pandemia do novo coronavírus. Conteúdos falsos sobre vacinação prejudicam o trabalho dos pesquisadores e diminuem a confiança das pessoas na ciência e em medidas de benefício geral.

O post de Filipe Martins teve 1,1 mil curtidas no Twitter até o dia 12/01. Mesmo tendo sido apagado no mesmo dia, o tweet teve uma visualização expressiva e continua sendo compartilhado em forma de prints e cópia do texto. Consideramos que esse tipo de postagem é perigosa na medida em que coloca sob suspeita a imunização e sua eficácia no combate e tratamento ao coronavírus. Esta solução, segundo os especialistas entrevistados pelo Comprova nesta e em outras verificações sobre a vacina, vem sendo enfaticamente recomendada pela comunidade científica e organismos internacionais de saúde.

O Comprova tem desmentido diversas correntes que abordam a vacinação, como a que tira de contexto dados sobre sintomas da vacina da Pfizer, a que afirmava ser possível deixar de vacinar pessoas já diagnosticadas com covid-19; e que a China não usará suas próprias vacinas.

Enganoso, para o Comprova é o conteúdo que usa dados imprecisos ou que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Saúde

Investigado por: 2021-01-18

Segundas doses servem de reforço e são comuns em programas de vacinação

  • Enganoso
Enganoso
Doses escalonadas são comuns em programas de vacinação e servem para reforçar a primeira dose. A taxa de eficácia global da CoronaVac, de 50,38%, não indica que metade dos vacinados vai pegar a doença e a outra metade, não.
  • Conteúdo verificado: Postagem do deputado federal Eduardo Bolsonaro sobre a eficácia global da vacina CoronaVac e a necessidade de duas doses do imunizante.

É enganoso o tuíte do deputado federal Eduardo Bolsonaro em que ele relaciona a necessidade de aplicação de uma segunda dose da vacina CoronaVac à taxa de eficácia global do imunizante no Brasil, de 50,38%. A segunda dose serve para garantir o índice de eficácia e não para duplicá-lo. Doses escalonadas são comuns em programas de vacinação e servem para reforçar a primeira dose, o que é previsto na cartilha de vacinação do Ministério da Saúde inclusive para imunizantes contra doenças como a febre amarela e a gripe. As vacinas desenvolvidas pelo laboratório Pfizer e pela Universidade de Oxford, em parceria com a Fiocruz, também necessitam de duas doses para a imunização total.

Segundo dois especialistas ouvidos pelo Comprova, a taxa de eficácia de 50,38% é muito boa na prevenção de novos casos da doença e para diminuir os casos graves de covid-19. A taxa de eficácia indica a chance que uma pessoa imunizada tem de não contrair a doença. E não significa que metade dos vacinados vai pegar a doença e metade, não. Na verdade, o imunizante diminui em 50,38% a probabilidade de apresentar covid-19. O mínimo estabelecido pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) é de 50% – a CoronaVac, portanto, tem grau de proteção satisfatório. Além disso, segundo os especialistas, a taxa de eficácia ajuda a determinar a meta de cobertura vacinal, ou seja, quanto menor a eficácia, mais ampla a vacinação deverá ser.

Entramos em contato por e-mail com o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), mas não tivemos resposta até a publicação desta verificação.

Como verificamos?

Questionamos o Instituto Butantan sobre os dados divulgados quanto à eficácia global da vacina e também sobre um comentário feito na semana passada pelo do ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, sobre a estratégia de priorizar a imunização do maior número de pessoas, antes de pensar na aplicação da segunda dose.

Conversamos com os professores e pesquisadores do Instituto de Patologia Tropical e Saúde Pública (IPTSP) da Universidade Federal de Goiás (UFG), João Bosco e Moara Borges. Consultamos os estudos e pesquisas sobre as vacinas produzidas no Brasil e as recomendações da Organização Mundial de Saúde sobre as medidas de segurança no período de vacinação.

Verificação

Estudos científicos da CoronaVac

O Instituto Butantan anunciou em 12 de janeiro que a vacina CoronaVac, produzida em parceria com o laboratório chinês Sinovac, obteve 50,38% de eficácia global no estudo clínico desenvolvido no Brasil, além de proteção de 78% em casos leves e 100% contra casos moderados e graves da covid-19.

Em nota enviada ao Comprova, o Butantan afirmou que “todos os índices são superiores ao patamar de 50% exigido pela OMS (Organização Mundial de Saúde). Os dados deixam claro a importância do impacto para a saúde pública com o imunizante que impede que a forma grave ou moderada da doença”.

Os ensaios clínicos da CoronaVac incluíram a aplicação de duas doses do imunizante com intervalo de 14 dias e, de acordo com o instituto, esse reforço não pode ultrapassar o período de 28 dias entre as aplicações.

Segunda dose é reforço da primeira

A Organização Mundial de Saúde (OMS), em declarações recentes, diz que as vacinações que já começaram em alguns países não tiveram impacto na diminuição da transmissão de covid-19. A professora Moara Borges lembrou que “para a vacina ter uma efetividade precisa de pelo menos de 10 a 14 dias depois da segunda dose para considerar essa proteção total que foi avaliada pelo Butantan”. Portanto, a recomendação da OMS é que as pessoas mantenham o uso de máscara e o isolamento social.

O professor João Bosco, do Instituto de Patologia Tropical e Saúde Pública da UFG, afirma que a segunda dose existe para reforçar os efeitos da primeira dose. “Essa lógica de reforço existe para múltiplas vacinas, agora a expectativa para imunizar um indivíduo uma vacina com mais de 50% de eficácia ela já pode ter uma repercussão muito grande e muito boa na prevenção de novos casos da doença”, afirma.

A professora do mesmo instituto da UFG, Moara Borges, afirma que o ideal é que aconteça um reforço com a segunda dose da vacina para que o organismo se especialize mais em se defender do vírus.

Para a professora, com as duas doses da vacina o organismo “produz anticorpos mais rápido” e “faz identificar esse vírus mais rápido”. Dessa forma, o corpo consegue produzir a melhor resposta para combater o Sars CoV-2. Além da CoronaVac, as vacinas desenvolvidas pelo laboratório Pfizer e pela Universidade de Oxford, em parceria com a Fiocruz, necessitam de duas doses para a imunização total.

As vacinas foram o principal mecanismo de redução da mortalidade por doenças infecciosas no último século. Segundo a professora Moara Borges, é um erro grave acreditar que com uma única dose as pessoas estarão protegidas e não serão capazes de infectar outras pessoas. Ela foi enfática ao afirmar que o objetivo da vacina é diminuir os casos graves. E lembrou que a vacina tem uma grande importância na questão de saúde pública, diminuição da lotação nos hospitais e o número de mortes.

Plano do governo para a vacinação contra a covid-19

De acordo com o Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a covid-19, publicado em 21 de dezembro de 2020 pelo Ministério da Saúde, a CoronaVac era uma das 13 vacinas em fase 3 de pesquisa clínica, etapa que avalia a segurança e a eficácia do imunizante. A partir dos dados levantados nesse estágio é que é possível submeter uma vacina ao registro e à aprovação para uso. Contudo, no dia 17 de janeiro, em uma reunião da equipe técnica e diretoria da Anvisa, o uso emergencial da CoronaVac foi aprovado por unanimidade.

No mesmo documento, o Ministério da Saúde destaca que o esquema vacinal da CoronaVac, assim como a maior parte das vacinas candidatas, exige a aplicação de duas doses, no intervalo de 14 dias. Entretanto, o ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, disse durante uma coletiva de imprensa realizada na cidade de Manaus (AM), em 11 de janeiro de 2019, que o programa de vacinação contra a covid-19 que será implementado pelo governo pretende priorizar a aplicação da primeira dose no maior número possível de pessoas, antes de iniciar a aplicação da segunda dose. No dia 18 de janeiro, o Ministério da Saúde começou a distribuição de doses da CoronaVac pelo Brasil.

Em nota, o Instituto Butantan informou que “os ensaios clínicos contemplaram a aplicação de duas doses do imunizante com intervalo de 14 dias, podendo chegar até 28 dias entre as aplicações, não sendo recomendado o ultrapassar o prazo previsto para que os números se assemelham aos apresentados nos testes”.

O Instituto disse ainda que o estudo da CoronaVac foi submetido e aprovado por um comitê internacional independente, e apresentado à Anvisa conforme as normas estabelecidas pela Organização Mundial da Saúde. “Os resultados não teriam sido enviados à Anvisa se o índice mínimo de eficácia global não tivesse sido atingido. Quem põe em dúvida o resultado apresentado especula contra a ciência e só favorece teorias conspiratórias”, finaliza a nota.

Taxa de eficácia não funciona sozinha

Para o professor João Bosco, do IPTSP/UFG, a utilização de qualquer imunizante, independentemente da taxa de eficácia, precisa ser combinada a uma ampla cobertura vacinal. Segundo ele, quanto mais baixa a eficácia, mais ampla deve ser a vacinação para alcançar um impacto similar ao da vacina com eficácia mais alta – e uma cobertura vacinal ampla diminui o surgimento de novos casos.

A taxa da eficácia da CoronaVac foi de 50,38%, significa que a cada 100 pessoas vacinadas que tiveram contato com o vírus, 50,38 não vão manifestar sintomas da doença por conta do efeito imunizante da vacina.

A eficácia é a taxa calculada a partir da incidência dos casos de covid-19 em pessoas que foram vacinadas em uma pesquisa clínica e a incidência de casos da doença no grupo controle, que recebeu a aplicação de um placebo. A taxa de eficácia serve para o governo planejar a meta de vacinação e chegar à imunidade de rebanho. Contudo, a OMS já declarou que a imunidade coletiva não será alcançada em 2021. O ideal, neste momento da pandemia, é vacinar o maior número de pessoas e diminuir a gravidade da covid-19.

A Sociedade Brasileira de Imunizações emitiu nota no dia 13 de janeiro avaliando os estudos científicos das vacinas, e explicando que eles possuem métodos e abordagens diferentes entre si. Por isso, as taxas de eficácia não são comparáveis.

A CoronaVac alcançou 78% de eficácia em casos leves e nenhum dos participantes que receberam as doses da vacina apresentou casos graves e moderados. A taxa de eficácia de 50,38% inclui todos os participantes que ficaram doentes independente da gravidade.

Por que investigamos?

Em sua terceira fase, o Comprova investiga conteúdos duvidosos relacionados às políticas públicas do governo federal e à pandemia do novo coronavírus. Conteúdos falsos sobre vacinação prejudicam o trabalho dos pesquisadores e diminuem a confiança sobre a necessidade da vacinação.

A postagem do deputado Eduardo Bolsonaro alcançou 9,8 mil curtidas e 1,3 mil compartilhamentos até a publicação desta verificação. Ao fazer uma ironia usando um cifrão na pergunta que publicou – “Será que precisaríamos então de duas doses da vacina? $erá?” – levou leitores a acreditar que a segunda dose seria necessária para alcançar a eficácia total de 100% do imunizante, já outros entenderam que a eficácia divulgada serviria para justificar a compra de mais vacinas, fazendo com que o governo gastasse mais dinheiro.

Essa não é a primeira vez que o Comprova verifica uma publicação do deputado. No final de julho de 2020, Eduardo Bolsonaro postou o trecho de um vídeo, que retirava de contexto o uso da cloroquina nos hospitais para tratamento de Covid-19.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Correção

Alertado por um leitor, o Comprova corrigiu a redação do título desta verificação em 22 de junho de 2021. A versão anterior da checagem trazia como título “Segunda dose da CoronaVac não está relacionada à taxa de eficácia da vacina”.

Saúde

Investigado por: 2021-01-15

Distribuição em massa de ivermectina não está ligada aos números da covid-19 na África

  • Enganoso
Enganoso
Impacto moderado do novo coronavírus é explicado por experiência com epidemias, pela baixa idade média das populações e pelo fato de a circulação de pessoas entre o continente e o resto do mundo não ser tão significativa
  • Conteúdo verificado: Tuíte do Presidente Jair Bolsonaro sugere que a distribuição de ivermectina em países africanos, por meio de um programa da OMS para o tratamento de Oncocercose, estaria relacionado ao menor número relativo de casos de covid-19 nos países do continente.

É enganoso relacionar a incidência relativamente baixa da covid-19 em alguns países africanos com a distribuição de ivermectina para o tratamento de doenças causadas por parasitas. A sugestão foi feita pelo presidente Jair Bolsonaro em um tuíte, no dia 5 de janeiro.

Apesar dos números relativamente mais baixos de casos de coronavírus nos países do continente africano – sobretudo na comparação com os registros na Europa e nas Américas -, especialistas descartam qualquer relação com o uso de ivermectina. Para a própria Organização Mundial da Saúde, os resultados positivos no combate à pandemia podem ser atribuídos às medidas de distanciamento físico e social e à ampliação da capacidade do sistema de saúde.

Outros fatores, como a experiência com epidemias, o fato da circulação de pessoas entre o continente e outras partes do mundo ser menor e a idade média mais baixa da população, também são apontados como possíveis influenciadores nos níveis da covid-19. Além disso, em vários países africanos, há a possibilidade de subnotificação dos casos do novo coronavírus.

O Programa Africano para Controle da Oncocercose (APOC, na sigla em inglês), de fato distribuiu milhões de doses de ivermectina para o tratamento da doença também conhecida como “cegueira do rio” em alguns países africanos, mas a iniciativa, mencionada na postagem, foi interrompida em 2015. No ano seguinte, outro programa da Organização Mundial da Saúde (OMS), o Projeto Especial Expandido para Eliminação de Doenças Tropicais Negligenciadas, passou a distribuir a ivermectina e outros medicamentos para o combate a outras doenças comuns no continente e em outras partes do mundo. Em 2019, ano anterior à pandemia da covid-19, 152,9 milhões de pessoas receberam tratamento com ivermectina em países da África – em meio a uma população de mais de 1,3 bilhões de pessoas. A droga, porém, não tem eficácia comprovada contra o novo coronavírus. A própria OMS não recomenda a utilização do medicamento para o tratamento da infecção pelo Sars-CoV-2.

Como verificamos?

O primeiro passo da verificação foi checar os números da covid-19 no continente africano, especificamente nos países listados no tuíte. Para isso, utilizamos os dados disponibilizados pela própria Organização Mundial da Saúde.

Em seguida, buscamos reportagens e publicações científicas que tentam explicar o motivo para a incidência relativamente mais baixa da covid-19 na África.

Sobre a distribuição de ivermectina, consultamos os registros da OMS relativos ao Programa Africano para Controle de Oncocercose e ao Projeto Especial Expandido para Eliminação de Doenças Tropicais Negligenciadas. Em boletins semanais, a Organização divulgou o número de comprimidos de ivermectina distribuídos globalmente e em países da África.

Em uma última etapa, buscamos informações sobre a eficácia da ivermectina no tratamento da covid-19. Consultamos o posicionamento divulgado por órgãos como a OMS, a Anvisa e a FDA, além de entrevistas anteriores feitas pelo Projeto Comprova com diversos especialistas.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 13 de janeiro de 2021.

Verificação

A covid-19 no continente africano

É verdade que os números de óbitos em decorrência da infecção pelo novo coronavírus nos países africanos listados por Bolsonaro são menores do que os registrados no Brasil. Porém, os dados apresentados na tabela anexada ao tuíte não refletem exatamente os dados de covid-19 do dia 4 de janeiro. Os dados atualizados pelo site oficial utilizado pela OMS mostram números superiores já no relatório do dia 3 de janeiro. Segue relação de infectados/vítimas fatais dos países selecionados pelo presidente:

PAÍS CASOS CONFIRMADOS MORTES
Angola 17.642 408
Camarões 26.848 448
República do Congo 17.997 596
Etiópia 125.622 1.948
Moçambique 19.309 169
Nigéria 90.080 1.311
Quênia 96.802 1.685
África Central 4.963 63
Ruanda 8.676 101

Fonte:Organização Mundial da Saúde| dados de 03/01/2021

Inicialmente, a expectativa de especialistas e analistas de todo o mundo era de que o número de mortes pelo novo coronavírus e as taxas de infecção pela doença no continente africano fossem altas, em função do alto índice de populações vivendo em condição de vulnerabilidade. A dificuldade de acesso aos equipamentos de proteção e higiene supostamente sustentava essas previsões. Porém, os números são outros e não há ainda uma confirmação científica sobre a causa dos números baixos nesta região.

Além da possibilidade de subnotificação dos casos e mortes pelo novo coronavírus em vários países da África, apontada desde os primeiros meses de 2020, especialistas também levantam outras hipóteses para a incidência da doença no continente.

Em maio, em uma entrevista à BBC, o especialista em saúde global e emergências sanitárias no Centro de Genebra para Educação e Pesquisa em Ação Humanitária, Karl Blanchet, também destacou o fato da população de vários países africanos já ter lidado com outras epidemias graves no passado. Na mesma reportagem, o especialista africano em saúde pública da equipe de medicina tropical e humanitária do Hospital Universitário de Genebra, Frederique Jacquerioz, aponta a “baixa circulação existente entre os países do continente e o resto do mundo”.

A capacidade de resposta a pandemias, a imunidade da população, já afetada por outras doenças e a média etária mais baixa – já que o continente possui a população mais jovem do mundo – também são apontadas pelo pesquisador do Centro de Relações Internacionais em Saúde da Fundação Oswaldo Cruz, Augusto Paulo Silva, ouvido em outubro pela Agência Brasil.

Uma matéria da revista Época que analisa este mesmo tuíte de Bolsonaro relembra que em junho de 2020, a diretora regional da OMS na África, Matshidiso Moeti, atribuiu o bom desempenho destes países na pandemia às medidas de isolamento implementadas e melhorias realizadas no sistema de saúde.

“O que o Brasil pode aprender? Os países da África, desde muito cedo, implementaram medidas muito significativas de distanciamento social e físico. Isso nos deu um tempo a mais. Ao mesmo tempo, esses países trabalharam duro para ampliar a capacidade do sistema de saúde”, afirmou Moeti.

O Programa Africano para Controle de Oncocercose

A tabela publicada no tuíte do presidente menciona a distribuição em massa de ivermectina feita pelo Programa Africano para Controle de Oncocercose (Apoc, na sigla em inglês), voltado ao combate da doença, também chamada de “cegueira do rio”, por meio da aplicação de ivermectina. No entanto, o programa foi encerrado em 2015, após 20 anos de ações. Os últimos dados disponíveis na página do programa no site da OMS apontam que 100,8 milhões de pessoas nos países que integravam a iniciativa recebiam tratamento regular até o fim de 2012.

A partir de 2016, outra iniciativa teve início para suceder o programa – o Projeto Especial Expandido para Eliminação de Doenças Tropicais Negligenciadas (Espen, na sigla em inglês). Este plano também prevê a distribuição de ivermectina, mas também de outros medicamentos para combater outras doenças comuns no continente além da oncocercose, como filariose linfática e esquistossomose.

Em 2019, 152,9 milhões de pessoas receberam tratamento com ivermectina em países da África, conforme registro epidemiológico da primeira semana de novembro de 2020, disponível no site da OMS. Nos nove países citados por Bolsonaro na postagem, 105,4 milhões de pessoas receberam a medicação em massa com ivermectina. No entanto, três desses países não tiveram nenhuma pessoa submetida ao tratamento em 2019 porque, segundo o relatório, ele não era mais considerado necessário. São eles: Moçambique, Quênia e Ruanda.

O número de pessoas tratadas preventivamente corresponde a uma cobertura de 70,4% do total de 217,2 milhões que requerem tratamento preventivo contra a doença oncocercose. Foi o segundo maior número desde 2011, atrás apenas de 2018, quando o alcance atingiu a marca de 160 milhões de pessoas tratadas.

A Nigéria e a República Democrática do Congo foram os países com mais pessoas submetidas à medicação em massa, com 40,7 milhões e 39,8 milhões, respectivamente. Segundo dados de 14 de janeiro de 2021 da OMS, esses países tinham respectivamente o 14º e 15º menor número de mortes por milhão de habitantes por coronavírus na África, com 6,7 e 6,8 óbitos por grupo de 1 milhão. Entre os nove países citados por Bolsonaro, apenas Moçambique aparecia com número proporcionalmente menor de óbitos por covid-19.

A ivermectina e a covid-19

O uso de ivermectina como suposto tratamento ou prevenção ao novo coronavírus foi alvo de outras checagens do Comprova. Uma delas, em dezembro do ano passado, mostrou serem enganosas afirmações do pastor Silas Malafaia sobre o medicamento como medida preventiva à covid-19. Nesta verificação, o médico veterinário Marcelo Beltrão Molento, professor e pesquisador na Universidade Federal do Paraná (UFPR) que estuda a ivermectina há mais de 20 anos e é consultor da OMS, definiu como “uma desinformação gigantesca” dizer que o remédio impede a transmissão do vírus. Ele apontou problemas em alguns estudos conduzidos sobre a droga e possível papel de combater a forma grave de infecção pelo Sars CoV-2, como falta de grupo de controle, disse que comparar cidades de dinâmicas diferentes, como ocorreu em um estudo citado pelo pastor, era um tipo de erro que “enfraquece a credibilidade dos estudos”.

Molento ainda avaliou um estudo laboratorial australiano, que identificou potencial da ivermectina para inibir a reprodução do novo coronavírus em culturas de células de primatas. Ele afirmou que “o fato de ser antiviral in vitro [em laboratório] não prova em absoluto o mecanismo de ação dela em humanos”, já que estudos laboratoriais ocorrem em condições controladas que não podem ser reproduzidas no corpo humano.

Na mesma checagem, a microbiologista clínica e professora da Universidade de Brasília (UnB) Fabiana Brandão, afirmou ao Comprova que muitos dos ensaios clínicos da ivermectina ainda são pré-publicações e precisam passar por revisão por pares. Ela defendeu a necessidade de mais estudos sobre a droga e disse que algumas pesquisas precisam de “metodologias melhor delineadas”.

A OMS e a OPAS “aconselham fortemente contra o uso de ivermectina para quaisquer outros propósitos diferentes daqueles para os quais seu uso está devidamente autorizado”. A Organização Pan-Americana de Saúde chegou a analisar a possível eficácia da ivermectina no tratamento da covid-19 com base em estudos publicados entre janeiro e maio de 2020, e concluiu que nenhum deles – nem os realizados em laboratório, in vitro, nem os que chegaram à fase clínica, comprovavam a eficácia da medicação.

A agência reguladora dos Estados Unidos, Food and Drug Administration (FDA), afirma em seu site que o uso de ivermectina como prevenção à covid-19 deve ser evitado “uma vez que os seus benefícios e segurança para estes fins não foram estabelecidos.”. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) também se posicionou em nota divulgada em julho de 2020 sobre o fármaco afirmando que “até o momento, não existem medicamentos aprovados para prevenção ou tratamento da Covid-19 no Brasil. Nesse sentido, as indicações aprovadas para a ivermectina são aquelas constantes da bula do medicamento”

Por que investigamos?

Em sua terceira fase, o Comprova investiga conteúdos duvidosos relacionados às políticas públicas do governo federal e à pandemia do novo coronavírus. Postagens imprecisas podem ser um risco adicional no contexto da pandemia, que já provocou a morte de quase dois milhões de pessoas no mundo.

O tuíte enganoso do presidente Jair Bolsonaro, do dia 5 de janeiro, teve mais de 38 mil interações, entre retuítes, comentários e curtidas. Em julho do ano passado, o Comprova já havia desmentido vídeos que relacionavam os números da pandemia da covid-19 na África ao uso em massa da ivermectina.

A Revista Época também publicou, no começo do mês, uma matéria que questionava a afirmação feita pelo presidente Bolsonaro.

Enganoso, para o Comprova, é conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Saúde

Investigado por: 2021-01-12

Médico descontextualiza manual da Pfizer para sugerir alterações genéticas pela vacina

  • Enganoso
Enganoso
A farmacêutica explicou ao Comprova que a recomendação não é feita para evitar mutações genéticas, mas porque os estudos dessa vacina - como de qualquer outra - não incluem gestantes. Especialistas descartam totalmente que uma vacina para covid-19 seja capaz de causar alterações genéticas nos seres humanos.
  • Conteúdo verificado: Postagem de médico fala sobre orientação de sexo protegido em manual de vacina e engana ao sugerir que isso teria relação com supostas alterações genéticas causadas pelo imunizante.

Um médico fez uma postagem enganosa ao sugerir, em seu perfil no Twitter, que a vacina da Pfizer/BioNTech provoca “alterações genéticas” com base em uma ressalva do manual de testes do imunizante voltado aos voluntários. O documento elaborado pela farmacêutica cita um período de 28 dias para que voluntários homens não doem esperma e não façam sexo sem preservativo por um possível “risco de segurança reprodutiva”. Voluntárias mulheres com potencial para engravidar devem manter método contraceptivo. O material está em inglês.

Ao Comprova, a farmacêutica explicou que a recomendação não é feita para evitar mutações genéticas, mas porque os estudos dessa vacina – como de qualquer outra – não incluem gestantes. O objetivo, diz a Pfizer, é poupar o feto de qualquer possível efeito que a vacina possa causar – visto que é fase de testes. Apesar disso, os dados disponíveis da pesquisa não indicam preocupações de segurança ou risco à gravidez, segundo a empresa.

Especialistas também negaram a questão. Para médicos ouvidos pelo Comprova, a ressalva feita pelo manual tem o objetivo de evitar a exposição de gestantes e fetos a possíveis efeitos da vacina em teste e descartaram totalmente que uma vacina para covid-19 seja capaz de causar alterações genéticas nos seres humanos.

Como verificamos?

Primeiro, procuramos a Pfizer para esclarecer sobre o que se refere o manual e o que significa o risco indicado na página 132. A farmacêutica respondeu em troca de e-mails e, por fim, enviou um documento consolidando as respostas.

Também procuramos o doutor em biologia molecular e especialista em desenvolvimento de vacinas de DNA pela Fiocruz, Rafael Dhalia, e o virologista da Universidade Federal de Minas Gerais e do Centro de Tecnologia em Vacinas da UFMG, Flávio Fonseca, que responderam por mensagens e áudios no WhatsApp sobre as afirmações feitas pelo autor da publicação. O Comprova tentou contato com o autor da postagem, o médico Alessandro Loiola, que já teve outros conteúdos checados pela equipe, mas não obteve sucesso até o fechamento da verificação.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 12 de janeiro de 2020.

Verificação

Manual da Pfizer e o “risco de segurança reprodutiva”

A página do documento mencionado por Loiola apresenta a expressão “risco de segurança reprodutiva”, mas não se refere a risco de alteração genética – suposto efeito do imunizante de alterar o material genético (DNA) das pessoas, possibilidade rechaçada pela farmacêutica e por especialistas. Os critérios do estudo exigem que o voluntário se abstenha de relações sexuais por um período de 28 dias, assim como da doação de esperma. Como alternativa, no caso de uma relação sexual, o uso do preservativo é indispensável. No caso de gravidez, a gestação terá acompanhamento médico.

Ao Comprova, a Pfizer garantiu, em troca de e-mails, que “não há qualquer registro de infertilidade ou de problemas relacionados à reprodução entre os voluntários” e informou que as recomendações são feitas não por apresentar risco de fertilidade, mas simplesmente porque o estudo não tem participação de mulheres grávidas.

“Em qualquer estudo clínico que não prevê a participação de população grávida, há recomendações para prevenção e sexo seguro. Estudos de vacinas e medicamentos, geralmente, não incluem grávidas, o que foi o caso da vacina da Pfizer e Biontech contra a covid-19”, disse a fabricante.

Por comunicado, a Pfizer explicou ainda que, “embora os dados disponíveis não indiquem quaisquer preocupações de segurança ou danos à gravidez”, não há, atualmente, “evidências suficientes para recomendar o uso de vacinas contra a COVID-19 durante a gestação”.

Por isso, “o uso de métodos eficazes de contracepção deve ser aplicado para homens e mulheres em idade reprodutiva”. “O objetivo é preservar o feto em todas as fases, desde a sua formação, de qualquer eventual efeito que um medicamento ou uma vacina em estudo possam causar”, afirma a fabricante, que não fala em momento algum de alterações genéticas.

“Caso ocorra uma gravidez durante o estudo (seja da participante ou da parceria de um participante) a gestação será acompanhada até o nascimento do bebê”, completa a Pfizer.

Risco em caso de gravidez

A postagem verificada pelo Comprova, que cita a recomendação para não praticar sexo desprotegido nos 28 dias após a segunda dose da vacina da Pfizer-BioNTech, sugere uma relação dessa orientação a possíveis alterações genéticas causadas pelo imunizante. No entanto, segundo especialistas ouvidos pelo Comprova, a vacina não provoca alterações genéticas e a medida é uma cautela usual em vacinas e medicamentos em fase de desenvolvimento. Além disso, não é possível afirmar que haveria risco de danos ao futuro feto em uma possível gestação.

O doutor em biologia molecular e especialista em desenvolvimento de vacinas de DNA pela Fiocruz, Rafael Dhalia, afirma que a orientação de uso de métodos contraceptivos durante um determinado período de avaliação é uma medida recorrente e faz parte das normas de boas práticas clínicas no desenvolvimento de novos medicamentos e vacinas.

Segundo ele, a recomendação não é exclusividade da vacina da Pfizer e ocorre como precaução. Vacinas mais conhecidas, que já têm mais estudos concluídos, podem possuir contraindicações para gestantes, enquanto outras são até mesmo recomendadas para esse público. No caso de vacinas novas, de acordo com ele, seria “melhor pecar pelo excesso”.

“Por cautela, não se recomenda engravidar nesse período [de 28 dias após a segunda dose], considerado mais crítico, embora não seja possível afirmar que causará algum dano ao futuro feto”, aponta o especialista, frisando que a vacina não provoca alterações genéticas.

O prazo em que não é recomendado aos voluntários do estudo engravidar varia conforme o tipo de vacina em desenvolvimento, segundo o pesquisador. No caso de vacinas de vírus atenuado, que possuem o vírus vivo, mas enfraquecido, o período recomendado costuma ser de 21 dias, que é o tempo de replicação do agente no organismo – vale frisar que não há imunizantes deste tipo contra covid-19 nas fases mais avançadas de estudos clínicos. No caso de vírus inativado (que por estar “morto”, não se replica no corpo), o intervalo em que costuma ser recomendado não engravidar é de 14 dias.

Vacina com vírus inativado é a técnica usada por exemplo pela vacina CoronaVac, desenvolvida pela farmacêutica chinesa Sinovac em parceria com o Instituto Butantan, de São Paulo. O protocolo de pesquisa divulgado em outubro no repositório do instituto também afirma que o médico responsável pelo estudo poderia iniciar ou manter método contraceptivo para mulheres com potencial de engravidar nos 28 dias posteriores à última vacinação. A medida não seria obrigatória para mulheres que se declararem sem risco de engravidar ou que não pretendam ter prática sexual com fins reprodutivos nas quatro semanas seguintes à aplicação da dose.

Segundo checagem do Estadão Verifica, que investigou o mesmo tuíte, protocolos das vacinas da AstraZeneca e Universidade de Oxford, Moderna e Janssen também incluem nos critério para adesão de voluntários o uso de métodos contraceptivos ou a abstinência para mulheres com potencial de gravidez.

No caso das vacinas de RNA, como a da Pfizer-BioNTech, o período de 28 dias orientado no manual da farmacêutica equivale ao tempo em que há maior expressão das moléculas de RNA no organismo, para produzir a proteína spike, que vai estimular o sistema imune a desenvolver anticorpos contra o novo coronavírus.

Alterações genéticas

A postagem verificada também sugere que a vacina da Pfizer-BioNTech provocaria supostas alterações genéticas. O assunto já foi alvo de outras verificações do Comprova, que mostraram que as vacinas não causam câncer, danos genéticos ou homossexualidade e que as vacinas não modificam o DNA. Nessas verificações, especialistas apontaram que o material genético fica protegido no núcleo da célula, com enzimas que protegem o DNA de possíveis mutações, o que impediria modificações a partir das vacinas atuais.

O especialista ouvido nesta checagem pelo Comprova, Rafael Dhalia, também desmente a afirmação e diz que ela “mostra um desconhecimento básico de biologia molecular”.

Segundo ele, as vacinas são de RNA, que são moléculas compostas de cadeias ou fitas simples, enquanto o genoma humano é formado pelo DNA, de cadeias ou fitas duplas. Por conta disso, uma molécula de RNA não poderia se integrar em uma de DNA para modificá-la, como sugerem teorias antivacinas.

Para obter resultados de testes PCR, por exemplo, de acordo com o pesquisador, é preciso usar uma enzima chamada de “transcriptase reversa” para transformar o RNA em DNA e obter o resultado do exame por meio de uma reação. No entanto, essa enzima não existe no corpo humano.

Ainda que existisse, para uma suposta integração ao DNA ocorrer seria preciso que o paciente fosse infectado, por exemplo, por um retrovírus, que possui a enzima transcriptase reversa, e sofresse em seguida um fenômeno pouco frequente, chamado de “recombinação homóloga sítio-dirigida” – uma chance raríssima de acontecer, com risco praticamente inexistente a partir de uma vacina com base em RNA, segundo o especialista da Fiocruz.

Ainda sobre o risco de segurança reprodutiva, o virologista da UFMG, Flávio Fonseca, aponta que o processo de testes da vacina não levanta dúvidas quanto ao risco de segurança reprodutiva. Ele relembra que o vírus da covid-19 não tem transmissão sexual, e que para que uma modificação genética aconteça e seja transmissível, é necessário que a alteração ocorra nas células germinativas da pessoa, e não em uma célula qualquer – o que não acontece no caso de uma vacina (a menos que seja específica para esse tipo de célula).

O que é o manual

O manual de testes da vacina se resume no caderno de diretrizes do estudo. O seu uso é importante, uma vez que reúne informações e dados de toda a pesquisa que incidem no processo da imunização de participantes do estudo. Além disso, o manual de testes reúne resultados atualizados sobre efeitos observados em voluntários.

A Biblioteca Virtual da Saúde, vinculada ao Ministério da Saúde, disponibiliza um Manual de Normas e Procedimentos para Vacinação. Mesmo que diferente de um manual de testes, o documento segue os mesmos parâmetros que se estendem à preservação de vacina em ambientes refrigerados, fatores relacionados à pessoas vacinadas e organização e processo de vacinação em áreas médicas.

Os manuais medicinais de imunização cumprem o papel de divulgação de informações sobre a vacina, com a missão de contribuição para saúde e para o conhecimento geral da população quanto a processos, dados, testes e finalização.

Quem é o autor

O médico Alessandro Loiola é clínico-geral em São José dos Campos (SP), em um consultório particular. Loiola apareceu em outra verificação recente do Comprova, que apontou que ele também é registrado como profissional no Conselho Federal de Medicina em Minas Gerais, nas áreas de cirurgia geral e proctologia. O médico tem dezenas de milhares de seguidores no Twitter e no Instagram, onde já fez diversas postagens relacionadas à pandemia de covid-19, falando em “riscos da vacina” e contra o uso de máscaras.

O médico não tem um currículo cadastrado na plataforma Lattes. Em novembro de 2019, ele foi nomeado pelo então secretário de cultura, Roberto Alvim, como Coordenador-Geral de Empreendedorismo e Inovação, do Departamento de Empreendedorismo Cultural, da Secretaria da Economia Criativa. Ele foi exonerado menos de dois meses depois, em janeiro de 2020, após a saída de Alvim da chefia da pasta.

Loiola não atendeu a nosso pedido de esclarecimentos.

Por que investigamos?

Em sua terceira fase, o Comprova investiga conteúdos duvidosos relacionados às políticas públicas do governo federal e à pandemia do novo coronavírus. Conteúdos falsos sobre vacinação prejudicam o trabalho dos pesquisadores e diminuem a confiança das pessoas na ciência e em medidas de benefício geral. A postagem, retuitada mais de 2,4 mil vezes, cria suspeitas sobre uma das vacinas que já estão sendo aplicadas globalmente – como fez, aliás, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido).

O Comprova tem desmentido diversas correntes que abordam vacinação, como a que tira de contexto dados sobre sintomas da vacina da Pfizer, a que um imunizante australiano infectou pessoas com HIV e que a China não usará suas próprias vacinas, como a CoronaVac, uma das candidatas aqui no Brasil.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Saúde

Investigado por: 2021-01-11

Estudo sobre plasma equino está em fase inicial e não prova que é a cura para covid-19

  • Enganoso
Enganoso
O Instituto Vital Brazil de fato iniciou estudo em maio de 2020 para produzir anticorpos contra a covid-19 a partir de soro obtido de experimento em cavalos. Embora os resultados dos testes in vitro tenham sido promissores, o tratamento não pode ser considerado como a cura para a covid-19 pois os testes em humanos ainda não foram realizados.
  • Conteúdo verificado: Tuíte que afirma que o Instituto Vital Brasil achou a cura da Covid com um tratamento que usa plasma equino para produzir anticorpos mais potentes do que o humano.

É enganosa a mensagem que circula pelo Whatsapp e pelo Twitter afirmando que o Instituto Vital Brazil teria encontrado a “cura” para a covid-19. No Twitter, o texto é acompanhado por um trecho de reportagem da GloboNews, e cita produção de anticorpos “100 vezes mais potentes do que o humano”. A publicação também questiona o que será feito com as vacinas, como se as mesmas não tivessem mais utilidade.

O Instituto Vital Brazil, localizado no Rio de Janeiro, de fato iniciou estudo em maio de 2020 para produzir anticorpos contra a covid-19 a partir de soro obtido de experimento em cavalos. Os resultados dos testes in vitro apontam que os animais inoculados apresentaram de 20 a 100 vezes mais anticorpos neutralizantes contra o novo coronavírus do que os plasmas de pessoas que tiveram o vírus.

Mas ainda não há qualquer dado sobre a eficácia no tratamento em humanos, já que os ensaios clínicos, aqueles realizados em pessoas, ainda não foram iniciados. Para que isso aconteça, a Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep) e a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) estão trabalhando para aprovar os protocolos que vão embasar os testes clínicos em 41 voluntários já selecionados pelo instituto.

Como verificamos?

Inicialmente, fizemos contato com o Instituto Vital Brazil, para saber mais sobre a pesquisa que é desenvolvida pelo laboratório. Em nota, a assessoria esclareceu sobre a soroterapia, o procedimento para realizar os testes em humanos e a sua eficácia.

Realizamos pesquisas sobre o instituto para saber mais sobre sua história, o trabalho do laboratório e as pesquisas já desenvolvidas por ele.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 11 de janeiro de de 2021.

Verificação

Resultado dos estudos

O tratamento desenvolvido pelo Vital Brazil replicou a técnica dos estudos sobre “plasma convalescente”. Os pesquisadores inocularam cinco cavalos com a proteína S, recombinante do coronavírus, produzida no Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa em Engenharia, a Coppe da UFRJ.

Na biologia, uma proteína recombinante é obtida a partir de um código genético, nesse caso, o do SARS-CoV-2. Elas são extraídas e modificadas em laboratório, para que sejam utilizadas com a finalidade de capturar anticorpos do organismo em que serão injetadas.

O estudo revelou que os plasmas de quatro dos cinco animais apresentaram de 20 a 100 vezes mais anticorpos neutralizantes contra o novo vírus do que os plasmas de pessoas que contraíram a covid-19.

Apesar do sucesso do estudo in-vitro, realizado apenas no ambiente controlado do laboratório, não há certeza sobre a eficácia da soroterapia contra a doença. Os ensaios clínicos que testam o tratamento em voluntários humanos ainda não foram iniciados.

O plasma equino com os anticorpos não é injetado diretamente no corpo humano. Ele passa por diversos processos de purificação, filtragem e diluição até virar o soro. Somente depois desse processo é que o soro pode ser aplicado em pacientes, sendo feita a injeção intravenosa em ambiente hospitalar.

Segundo o instituto, o estudo se encontra em fase de delineamento dos protocolos clínicos, que consiste na uniformização do tratamento, na criação de um documento cujo objetivo é orientar decisões e critérios relacionados ao diagnóstico, gerenciamento e tratamento em áreas específicas da saúde. Esse documento está sendo criado junto à Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep) e Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para iniciar a etapa de testes em 41 voluntários.

Tratamento não pode ser considerado “cura”

Ao contrário do que afirma a publicação, o tratamento não pode ser considerado como a cura para a covid-19. A eficácia do tratamento em humanos não foi comprovada, pois os testes ainda não foram realizados.

Além disso, há diferença entre o tratamento com soro e a vacina. A soroterapia tenta neutralizar o agente causador da a covid-19, o vírus Sars-CoV-2, sendo eficaz somente nos pacientes que estão passando pela infecção. Em contrapartida, a vacina é uma medida que previne que as pessoas sejam contaminadas pelo coronavírus.

O que é o Instituto Vital Brazil?

É um laboratório que atende o setor público, com a produção de soros, vacinas e medicamentos de uso humano. O instituto realiza estudos e pesquisas no campo farmacêutico, biológico, econômico e social. O Instituto Vital Brazil é um dos 21 laboratórios oficiais brasileiros, um dos quatro fornecedores de soros contra o veneno de animais peçonhentos e produtor de medicamentos estratégicos para o Ministério da Saúde. Desde sua criação fabricava produtos veterinários, biológicos – como soros e vacinas – e farmacêuticos. Também baseou as atividades em pesquisa e formação.

Foi fundado em 3 de junho de 1919 em Niterói, no Rio de Janeiro, pelo cientista Vital Brazil Mineiro da Campanha, que integrou a primeira diretoria do Instituto Butantan, em São Paulo. Na década de 30, tornou-se uma propriedade privada, mas manteve o vínculo com o Governo do Estado do Rio de Janeiro. Em 1957, a empresa voltou a ser majoritariamente do Governo do Estado. O processo de venda de parte da instituição só ocorreu após ser firmado um compromisso de que o Instituto manteria, por toda a sua existência, o modelo idealizado pelo fundador.

Por que investigamos?

Em sua terceira fase, o Comprova investiga conteúdos duvidosos relacionados às políticas públicas do governo federal e à pandemia do novo coronavírus.

A postagem feita no Twitter possui mais de 7 mil interações. O conteúdo engana e traz falsas esperanças em relação à cura da covid-19. Ao questionar as vacinas em estudo, o post também invalida a importância e utilidade dos imunizantes desenvolvidos para proteção contra a contaminação pelo vírus.

Enganoso, para o Comprova, é conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Saúde

Investigado por: 2021-01-11

Reportagem da Globo que indica não usar máscaras é de março de 2020; recomendação mudou

  • Enganoso
Enganoso
Post engana ao divulgar como atual uma reportagem que foi levada ao ar no início da pandemia de covid-19, quando as recomendações da OMS eram diferentes
  • Conteúdo verificado: Postagem na rede social Facebook em que o autor compartilha um trecho de uma reportagem de uma TV local da Rede Globo sobre o uso de máscaras na pandemia da covid-19, onde se fala que o uso só é necessário para profissionais de saúde.

É enganosa a publicação no Facebook que utiliza uma reportagem antiga de um jornal regional da Globo para insinuar que máscaras só devem ser usadas por pessoas doentes e profissionais de saúde. A informação de fato foi veiculada, mas em março do ano passado, quando esta era a recomendação da Organização Mundial de Saúde (OMS). Novos estudos, no entanto, fizeram com que a OMS ampliasse os critérios para o uso de máscaras.

O vídeo foi compartilhado no perfil de Adriano Reis, candidato a vereador de Ribeirão Preto (SP) em 2020 pelo Partido Social Liberal (PSL), com a legenda “Meu Deusssss A globo falando a verdade sobre as máscaras. 2020 ta estranho mesmo (sic)”. No entanto, ao contrário do que a legenda insinua, a recomendação não é atual, mas do começo da pandemia.

A Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS) ampliou as recomendações para o uso das máscaras para o público em geral, sendo as de tecido indicadas para as pessoas com idade inferior a 60 anos, deixando as máscaras cirúrgicas disponíveis para o grupo de risco e profissionais de saúde.

O Comprova buscou conversar com o repórter Wellington Hanna, que aparece no vídeo, para confirmar o período em que a reportagem foi ao ar. O autor da publicação também foi procurado.

Como verificamos?

Primeiramente, observamos os elementos no vídeo que poderiam nos ajudar a identificar onde a reportagem havia sido feita. Primeiro, ao fundo da imagem, aparece o Congresso Nacional. No canto inferior esquerdo, a sigla DF, ao lado da logomarca do jornal. Foram os primeiros indícios de que a reportagem havia sido transmitida de Brasília, para o Distrito Federal.

Na sequência do vídeo, aparece na imagem o nome do repórter, Wellington Hanna, e o local onde ele gravou a passagem, a Asa Norte, um bairro de Brasília.

Logo depois, se inicia a entrevista com a médica infectologista Eliana Bicudo. Não há elementos na tela que remetam a uma localização, mas uma busca no Google pelo nome da médica leva a pelo menos três sites que apontam que ela trabalha na capital federal: o site oficial do Clidip – Hospital-Dia, Infectologia e Vacinas, onde ela faz parte do corpo clínico; o site do Hospital Home, também em Brasília, onde ela também trabalha; além do site Doctoralia, que lista a médica como infectologista em Brasília.

O próximo passo foi procurar pela Globo Brasília, a fim de confirmar se a reportagem de fato havia sido feita por eles e veiculada lá, além do repórter Wellington Hanna. Conversamos com o repórter Gabriel Palma, da Globo Brasília, que disse ter quase certeza de que a matéria tinha ido ao ar no início da pandemia e que, depois de viralizar, o DFTV deu uma explicação aos telespectadores, afirmando que o material tinha ido ao ar no mês de março.

Gabriel, então, nos colocou em contato com Wellington Hanna para que ele próprio desse mais detalhes sobre o ocorrido. Hanna nos enviou um link do material publicado pelo Fato ou Fake, do G1, mostrando que a reportagem tinha ido ao ar em 18 de março e, já em outubro, vinha viralizando como se tivesse informações atualizadas.

Entramos em contato, por e-mail, com a Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS) e, por fim, buscamos informações sobre o dono do perfil que compartilhou o vídeo e entramos em contato com ele, mas não recebemos resposta até a publicação desta verificação.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 11 de janeiro de 2021.

Verificação

Reportagem foi feita em março de 2020

A reportagem compartilhada no perfil do Facebook é real. Ela foi veiculada no jornal Bom Dia DF, da TV Globo em Brasília, mas não agora e sim há dez meses. Quando foi ao ar, em março do ano passado, a Organização Mundial de Saúde (OMS) recomendava o uso de máscaras somente para pessoas doentes e para profissionais de saúde, o que mudou nos meses seguintes.

Ao Comprova, o repórter Wellington Hanna, responsável pela reportagem, nos enviou, através do WhatsApp, um material publicado pelo Fato ou Fake, do G1, no dia 14 de outubro do ano passado, explicando que a reportagem tinha ido ao ar em 18 de março e, diferentemente do que diziam postagens que viralizaram ainda em outubro passado, não representava uma recomendação atual sobre o uso de máscaras durante a pandemia.

A infectologista Eliana Bicudo, ouvida pela reportagem em março passado, também passou a ser questionada por pacientes depois que o vídeo viralizou, meses depois de ter ido ao ar. À Globo Brasília, ela disse que a situação hoje é muito diferente daquela conhecida em março do ano passado, quando se entendia que só pessoas com sintomas respiratórios ou febre transmitiam a covid-19.

“Já em abril, com a detecção de que o paciente assintomático pode transmitir o vírus e a doença também pode evoluir de maneira leve ou até assintomática, isso mudou completamente o discurso e foi máscara para todos”, explicou ela ao Fato ou Fake.

OMS atualizou recomendações com base em novos estudos

Quando a reportagem foi ao ar, em 18 de março de 2020, a recomendação da Organização Mundial de Saúde (OMS) era de que as máscaras fossem usadas apenas por pessoas doentes, responsáveis por cuidar delas e por profissionais de saúde. Na época, o órgão chegou a recomendar que as pessoas parassem de comprar máscaras cirúrgicas. A grande demanda pelas máscaras, assim como a escassez delas, provavelmente prejudicariam o combate ao coronavírus, informou a OMS, na época.

Em 6 de abril de 2020, a OMS fez uma nova recomendação em relação ao uso de máscaras: eles mantiveram a recomendação apenas para doentes e profissionais de saúde, mas admitiram que o uso de máscara por pacientes sintomáticos e pré-sintomáticos ajudava a limitar a transmissão do vírus. Tanto o Ministério da Saúde quanto o Centro de Controle de Doenças (CDC), dos Estados Unidos, já tinham recomendado o uso irrestrito de máscaras caseiras, diante de estudo publicado na Nature Medicine em abril de 2020, que afirmava que o uso de máscaras freava a transmissão pelo SARS-CoV-2.

No dia 5 de junho deste ano, a OMS divulgou novamente outras recomendações para o uso de máscaras. Desta vez, além dos doentes e profissionais de saúde, o uso foi ampliado para pessoas em grupos de risco e para a população em geral em áreas onde já havia transmissão comunitária da doença – ou seja, quando não era mais possível dizer qual a origem da contaminação, o que indicava que o vírus já circulava por uma região. Na mesma ocasião, a OMS indicou os tipos de tecido recomendados para a produção de máscaras caseiras.

Atualmente, a OMS recomenda o uso de máscaras como medida fundamental para suprimir a transmissão do vírus: “Devem ser usadas como parte de uma abordagem abrangente de ‘Faça tudo’, incluindo manter distanciamento físico de um metro ou mais de outras pessoas, evitar locais com aglomeração e contato próximo, garantir boa ventilação, limpar frequentemente as mãos e cobrir o espirro e a tosse com o cotovelo dobrado”, diz um trecho da recomendação no site oficial da Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS), braço da OMS para as Américas.

As recomendações mais atuais são do dia 1º de dezembro de 2020. A OMS trata a orientação como provisória, já que é uma atualização das recomendações do dia 5 de junho de 2020 com base em novas evidências científicas sobre o uso de máscaras.

A Agência Lupa e o Fato ou Fake também verificaram este conteúdo.

O autor da publicação

Adriano de Pádua dos Reis foi candidato a vereador em Ribeirão Preto (SP) pelo Partido Social Liberal (PSL), mas não foi eleito. Ele também foi candidato ao mesmo posto na eleição de 2016 pelo Partido Republicano da Ordem Social (PROS), quando chegou a ser eleito suplente. Em seu perfil na rede social Facebook, Adriano se diz empresário e “um cidadão de direita, conservador nos costumes e liberais na economia”.

O Comprova tentou contato com o autor, mas não obteve resposta até o momento da publicação deste artigo.

Por que investigamos?

Em sua terceira fase, o Comprova investiga conteúdos duvidosos relacionados às políticas públicas do governo federal e à pandemia do novo coronavírus. A postagem publicada no Facebook por Adriano de Pádua dos Reis, dia 24 de dezembro de 2020, teve mais de 5,2 mil comentários e 14 mil curtidas. Em janeiro de 2021, o Comprova verificou o vídeo publicado, pois o conteúdo enganoso, com 136 mil compartilhamentos, já havia viralizado na rede social. Veiculada no jornal Bom Dia DF, da TV Globo em Brasília, a reportagem não recomenda a não utilização de máscaras.

Enganoso, para o Comprova, é conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Saúde

Investigado por: 2020-12-28

Informações sobre ivermectina divulgadas por Silas Malafaia são enganosas

  • Enganoso
Enganoso
Especialistas afirmam que as evidências apresentadas por um médico em vídeo compartilhado pelo pastor são insuficientes para promover o uso preventivo ou terapêutico da droga. Além disso, agências reguladoras dos Estados Unidos e do Brasil mantêm recomendações contrárias à aplicação do medicamento para tratar ou prevenir o novo coronavírus.
  • Conteúdo verificado: Vídeo do médico pneumologista norte-americano Pierre Kory, divulgado pelo pastor Silas Malafaia, apresenta informações enganosas sobre a prescrição em larga escala da ivermectina para prevenção da covid-19.

São enganosas as informações contidas no vídeo divulgado pelo pastor Silas Malafaia em que o médico pneumologista norte-americano Pierre Kory recomenda a prescrição de ivermectina para a prevenção da covid-19, durante audiência no Senado nos Estados Unidos. Malafaia afirma que o vídeo “pode salvar vidas” e sugere que seus seguidores peçam a um médico orientação sobre a quantidade de remédio a ser ingerida.

O líder religioso compartilhou uma versão legendada em português de um discurso de Kory em que ele se refere ao medicamento como uma “droga milagrosa” com potencial de prevenir e tratar pacientes com a doença.

Especialistas consultados pelo Comprova, no entanto, afirmam que as evidências expostas nos documentos apresentados pelo médico são insuficientes e não têm qualidade científica para promover o uso preventivo ou terapêutico da droga.

Agências reguladoras e organizações da sociedade civil da área de medicina dos Estados Unidos e do Brasil também mantêm recomendações contrárias à aplicação do medicamento para tratar ou prevenir o novo coronavírus.

Como verificamos?

Para analisar os argumentos científicos apresentados pelo médico Pierre Kory, o Comprova entrevistou o médico veterinário Marcelo Beltrão Molento, professor e pesquisador na Universidade Federal do Paraná (UFPR), que pesquisa sobre a ivermectina (IVM) desde 1994 e que publicou em dezembro um artigo com um alerta para o uso de larga escala do composto. Também foram entrevistadas Fabiana Brandão, especialista em microbiologia clínica e professora do departamento de Farmácia da Universidade Brasília (UNB); e Raquel Stucchi, médica infectologista, professora da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e consultora da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI).

O Comprova consultou os comunicados oficiais sobre a ivermectina divulgados nos sites da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), da agência federal de alimentos e medicamentos (FDA, na sigla em inglês) e do Instituto Nacional de Saúde (NIH, também na sigla em inglês), ambos dos Estados Unidos.

Para esta verificação também foi feito contato com o pastor Silas Malafaia e com o médico Pierre Kory por e-mail, mas até o fechamento desta verificação o Comprova não obteve retorno.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 28 de dezembro de 2020.

Verificação

Não há comprovação dos efeitos da ivermectina na prevenção da covid-19

No discurso capturado em vídeo, Kory aponta que a ivermectina é “milagrosa” na prevenção e no tratamento da covid-19 diz que há “montanhas” de dados e estudos que comprovam essa afirmação. Ele diz estar embasado em uma revisão contendo dados de quase 30 estudos assinada por ele e outros profissionais de saúde, que indicaria a eficácia do remédio contra a doença.

O médico diz ainda que o relatório mostra que o medicamento basicamente “oblitera a transmissão desse vírus” e que se uma pessoa tomar a ivermectina ela não ficará doente.

Para Marcelo Molento, que estuda a ivermectina há mais de 20 anos e é consultor da Organização Mundial da Saúde, é “uma desinformação gigantesca” dizer que o remédio impede a transmissão do vírus. Ele pontua que a revisão de Kory e os estudos que baseiam o artigo pecam gravemente na condução e no desenho dos ensaios clínicos, assim como na compilação de dados e na interpretação dos resultados.

“Há estudos que nem sequer têm grupo de controle”, diz o especialista. Molento ainda ressalta que alguns trabalhos não fizeram um acompanhamento adequado dos pacientes durante os testes e se baseiam somente em boletins médicos.

O cientista critica ainda um levantamento presente no estudo que compara a curva de mortes e infecções de municípios comuns com cidades que implementaram programas massivos de distribuição da ivermectina. “Não dá pra comparar cidades de dinâmicas diferentes (comportamento social, localização geográfica e clima). Este tipo de erro enfraquece a credibilidade dos estudos”, afirma.

Falta rigor nos estudos feitos até o momento

A microbiologista clínica e professora da Universidade de Brasília (UnB) Fabiana Brandão afirmou ao Comprova que muitos dos ensaios clínicos da ivermectina ainda são pré-publicações e precisam passar por revisão por pares. As próprias plataformas de preprint (que reúnem esse material) dizem que os artigos ali publicados não devem ser usados para guiar procedimentos clínicos.

A pesquisadora diz que é a favor de mais estudos com o medicamento. Ela afirma, no entanto, que o discurso de Pierre Kory de que o medicamento tem efeitos milagrosos não tem sustentação. “Não é verdade que se as pessoas tomarem ivermectina podem sair às ruas que nada vai acontecer. Isso gera um risco tremendo das pessoas se exporem mais ao confiar num tratamento que pode não ser eficaz”, pontuou.

Um levantamento da professora no site de pesquisas clínicas Clinical Trials identificou que há pelo menos 45 experimentos registrados para testar a eficácia da ivermectina, dos quais 13 já foram concluídos. Ela explica, no entanto, que os estudos apresentam um número de pacientes muito reduzido e que não têm “força estatística suficiente” para responder se a ivermectina é de fato eficaz.

Outro ponto destacado por Brandão é que as pesquisas carecem de metodologias científicas rigorosas que eliminem os vieses das investigações. “Muitos estudos combinam medicamentos. Você vê uma discordância muito grande entre as pesquisas. Ainda faltam estudos com metodologias melhor delineadas”, diz a cientista.

Brandão explica que até 80% dos pacientes com covid-19 se recupera sem nenhum tratamento medicamentoso específico. Isso dificulta ainda mais entender quando um fármaco teve ou não teve efeito sobre a doença.

Estudo in vitro não comprova resultado em humanos

No vídeo, Kory também cita um estudo laboratorial conduzido pela Universidade Monash, na Austrália, que identificou o potencial da ivermectina de inibir a reprodução do novo coronavírus em culturas de células de primatas.

Os próprios autores, assim como a instituição de ensino, alertaram porém que a ivermectina não deveria ser recomendada contra a covid-19 “até que sejam concluídos mais testes e ensaios clínicos para estabelecer a eficácia do fármaco a níveis seguros para a dosagem humana.” A universidade também apontou riscos da automedicação.

“O fato de ser antiviral in vitro não prova em absoluto o mecanismo de ação dela em humanos”, afirmou Marcelo Molento ao Comprova. Isso acontece porque os estudos laboratoriais ocorrem em condições controladas que não podem ser reproduzidas no corpo humano.

“O corpo humano é mais complexo. Você tem mecanismos que influenciam na doença que não se resumem apenas à ação da droga sobre o vírus, como no laboratório.”, explica a consultora da Sociedade Brasileira de Infectologia Raquel Stucchi. “A cloroquina, por exemplo, apresentou bons resultados em laboratórios, mas até agora não se provou eficaz nos ensaios clínicos.”.

Outro ponto de alerta é que as dosagens de ivermectina aplicadas no estudo da Universidade de Monash são maiores do que o recomendado para o tratamento de parasitas em humanos. Identificar uma dose viável do medicamento é, inclusive, um dos desafios ressaltados pelos autores e outros cientistas.

De acordo com Brandão, trata-se de uma investigação delicada. “A ivermectina é um fármaco com mais de 50 anos e tem um efeito muito bom para enfrentar algumas doenças e parasitas. Mas a dosagem usada para tratamento parasitário é muito inferior à usada nos estudos para a covid-19. Essas doses elevadas podem ter um risco muito grande de atingir o sistema nervoso central.”, pontua a cientista.

O que dizem as agências reguladoras

Diante da ausência de dados confiáveis sobre a eficácia da ivermectina, diversas organizações da área da saúde desaconselham o uso do medicamento para combater a covid-19.

A Food and Drug Administration (FDA), agência sanitária dos Estados Unidos, afirma que “a utilização de ivermectina para a prevenção ou tratamento da COVID-19 deve ser evitada, uma vez que os seus benefícios e segurança para estes fins não foram estabelecidos.”.

O Instituto Nacional de Saúde americano (NIH) e o Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) também se opõem ao uso indiscriminado do medicamento contra a covid-19. No Brasil, um informe da Sociedade Brasileira de Infectologia reforça que não há comprovação científica que ateste a eficácia da ivermectina ou qualquer outro medicamento no tratamento precoce da doença.

Já a Anvisa ressalta que “até o momento, não existem medicamentos aprovados para prevenção ou tratamento da Covid-19 no Brasil. Nesse sentido, as indicações aprovadas para a ivermectina são aquelas constantes da bula do medicamento”.

Uso indiscriminado tem risco de aumentar resistência de parasitas

Segundo artigo publicado por Marcelo Molento, a ivermectina (IVM) é um derivado da bactéria Streptomyces avermitilis introduzida comercialmente em 1981. Poderia ser colocada entre as drogas asmorfina (1827), aspirina (1899) e penicilina (1942), devido os seus benefícios vitais para os humanos e saúde animal. A IVM faz parte da família exclusiva dos endectocidas (avermectinas e milbemicinas), junto com a moxidectina, abamectina, doramectina, entre outras. Esta família de drogas tem a característica de ter alta eficácia contra a maioria dos parasitas mais importantes, sendo utilizada na região central da África.

Em 2015, Satoshi Ômura e William Campbell ganharam o Prêmio Nobel de Medicina 2015 pela descoberta da ivermectina e seu uso mundial no combate a doenças parasitárias. Em algumas regiões, ela é essencial para o controle de doenças parasitárias, tendo status de vacina, devido ao seu amplo uso. Ganhou popularidade pela sua importância na medicina veterinária e humana. Até a chegada do coronavírus, era reservada para a área de parasitologia.

Em artigo, Molento adverte quanto aos efeitos neurológicos adversos do medicamento em pacientes, como confusão, tremores, convulsão, inchaço local e vômitos, que podem durar até uma semana. No caso de animais, a utilização em intervalos curtos criou resistência aos parasitas. A seleção de parasitas para combater essa resistência tornou-se um dos fatores mais perigosos para a falha da droga.

O tratamento em massa também é praticado para controlar parasitas humanos, e a resistência aos medicamentos é uma das principais preocupações para a continuação dos programas de erradicação de parasitas em grande escala, conforme explica Molento.

De acordo com Molento, a IVM tem a reputação de ter efeitos antivirais, no caso da dengue, e é bem aceito na prática médica. Com a covid-19 voltou a ser manchete internacional a partir de evidências de suas atividades in vitro contra o vírus. O pesquisador alerta que apesar do medicamento ser conhecido por sua margem de segurança, esse fato não é suficiente para o seu uso regular. “O risco também pode ser potencializado por interações medicamentosas desconhecidas, que podem afetar a fisiologia do sistema nervoso central (barreira hematoencefálica), tornando potenciais efeitos nocivos à saúde”, explica em seu artigo. A recomendação do pesquisador é cautela, especialmente para o uso da IVM.

Quem é o médico que aparece no vídeo?

O homem que figura no vídeo publicado pelo pastor é o médico Pierre Kory, presidente da organização Frontline Covid-19 Critical Care Alliance (FCCCA, na sigla em inglês). Ele se identifica como pneumologista e especialista em cuidados intensivos.

De acordo com o site da St. George’s University, em Granada, ele se graduou na instituição de ensino em 2002 e hoje trabalha no centro acadêmico de medicina da Universidade de Wisconsin, nos Estados Unidos.

Na página da FCCCA consta que o grupo é uma organização formada por dez médicos que tem o objetivo de revisar trabalhos e estudos publicados sobre remédios já existentes no combate ao vírus e publicar protocolos. Há dois tipos disponíveis no site, um para pacientes hospitalizados e outro para profilaxia da doença. Esse último inclui a ivermectina, mas também recomenda uso de máscara e distanciamento social.

No dia 8 de dezembro, Kory foi ouvido na Comissão de Segurança Interna e Assuntos Governamentais do Senado americano,que realizou uma audiência com o tema “Tratamento ambulatorial precoce: parte essencial de uma solução para a covid-19”.

Quem é Silas Malafaia?

Silas Malafaia, 62 anos, é pastor e presidente da igreja Assembleia de Deus Vitória em Cristo (ADVEC) no Rio de Janeiro, desde 2010. É graduado em psicologia e fundador da Associação Vitória em Cristo (AVEC), criada em 1982 com a finalidade de arrecadar fundos para o programa de TV Vitória em Cristo.

Nas mídias sociais, seus perfis reúnem mais de 3 milhões de seguidores.

Em março de 2020, logo no início da pandemia de covid-19, o coletivo Bereia publicou uma verificação sobre os posts e vídeos enganosos acerca do novo coronavírus postados pelo pastor. Em um dos posts, ele minimiza a gravidade da covid-19 comparando-a com a gripe H1N1 e ataca a ampla cobertura da imprensa sobre a doença. Sua postura em relação à pandemia está alinhada com a do presidente Jair Bolsonaro. Em suas postagens, é comum temas como acusações contra a China, a Organização Mundial da Saúde (OMS), a defesa do uso da hidroxicloroquina e da ivermectina e questionamentos sobre a vacinação contra a covid-19.

Em abril, o Facebook, o Instagram e o Youtube apagaram um vídeo publicado pelo pastor, no qual afirmava que a quarentena era “uma farsa”.

Por que investigamos?

Em sua terceira fase, o Comprova investiga conteúdos duvidosos relacionados às políticas públicas do governo federal e à pandemia do novo coronavírus. Conteúdos falsos prejudicam o trabalho dos pesquisadores e diminuem a confiança das pessoas nas autoridades. A postagem no Facebook, publicada em 18 de dezembro, tinha 98,9 mil visualizações em sete dias, até o dia 24 do mesmo mês. Em 22 de dezembro, o Comprova também publicou uma verificação com conteúdos enganosos sobre ivermectina e vacina chinesa do pastor Silas.

Enganoso, para o Comprova, é conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Saúde

Investigado por: 2020-12-28

Mensagem tira de contexto dados sobre sintomas adversos da vacina Pfizer

  • Enganoso
Enganoso
Mensagem que circula no WhatsApp usa informações descontextualizadas de um aplicativo para monitoramento de sintomas adversos que registra dados dos próprios pacientes e que ainda não foram checados pelo Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) americano.
  • Conteúdo verificado: Mensagem que circula no WhatsApp e afirma que vacina da Pfizer/BioNTech causou efeitos colaterais em 5% dos vacinados e reações graves em 1%.

Não é verdade que a vacina da Pfizer/BioNTech tenha causado efeitos colaterais em 5% e reações graves em 1% das pessoas vacinadas nos EUA, ao contrário do que afirma uma mensagem que circula no WhatsApp e nas redes sociais. A mensagem tira de contexto dados divulgados pelo Centro de Controle e Prevenção de Doenças americano (CDC). No sábado (19), o órgão divulgou que 112 mil pessoas que se vacinaram se cadastraram em um aplicativo do governo para monitoramento de sintomas adversos após a aplicação da 1ª dose. Desse total, 3.150 (2,7%) disseram ter tido algum tipo de efeito que atrapalhou o trabalho ou atividades diárias.

O médico Tom Clark, que apresentou esses dados ao Comitê Consultivo em Práticas de Imunização (ACIP) do CDC, disse que o órgão está estudando os relatos de sintomas para obter mais detalhes. Clark afirmou ainda que a maioria não requer cuidados médicos. Foram identificados também seis casos de anafilaxia, uma reação alérgica severa, mas o CDC ainda avalia se há relação com o imunizante.

O CDC desenvolveu a ferramenta V-Safe para que pessoas que tomaram vacinas contra covid-19 façam check-ups diários sobre sua saúde. Como o próprio paciente relata seus sintomas, as estatísticas ainda necessitam de confirmação. Uma reportagem do jornal The Washington Post do início deste mês questionou a segurança do app, que segundo o texto poderia ser manipulado pelo movimento anti-vacina ou outros atores maliciosos.

O governo americano tem outros dois sistemas de monitoramento de reações adversas após vacinas: o Vaccine Adverse Event Reporting System (VAERS) e o Vaccine Safety Datalink (VSD), que usam dados enviados pelas unidades de saúde.

Como verificamos?

Acessamos documentos do CDC sobre o V-Safe e sobre a vacinação contra covid-19. Também procuramos reportagens na imprensa que ajudassem a contextualizar a imunização nos EUA.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 28 de dezembro de 2020.

Verificação

De onde são os números citados na mensagem?

A mensagem afirma que, em três dias de vacinação nos EUA, foram “272.000 doses aplicadas até o dia 19/12. 112.800 relatos de efeitos colaterais. Mais de 3.000 ficaram incapacitados de realizar atividades diárias. Com 5% de efeitos colaterais, sendo 1% de efeitos graves, talvez mande tanta gente quanto o vírus para os hospitais.” No entanto, os números estão apresentados de forma equivocada e fora de contexto.

Os dados estão em um documento, parte de uma apresentação em slides utilizada em uma reunião emergencial do Comitê Consultivo em Práticas de Imunização (ACIP), ligado ao CDC. Os encontros foram realizados nos dias 19 e 20 de dezembro. O PDF que está incluído no texto que viralizou trata, especificamente, das informações sobre os casos de anafilaxia (uma reação alérgica grave) em pacientes vacinados com os imunizantes que usam tecnologia de RNA mensageiro (dos laboratórios Pfizer/BioNTech e Moderna). Os slides são assinados pelo médico Thomas Clark, que faz parte do corpo técnico do CDC.

Os números que aparecem no texto são desta tabela, que está no documento, mas foi interpretada de maneira equivocada:

O que a tabela registra são os dados colhidos por meio de um aplicativo, lançado pelo governo norte-americano para monitorar de forma ativa quem tomou a vacina. Pelo chamado V-Safe, as pessoas que receberam as doses podem registrar qualquer tipo de efeito colateral que tenham sentido. O número que o texto menciona, 112.807, trata-se, na verdade, do número de pessoas que baixaram e se registraram no aplicativo até o dia 18 de dezembro, após receberem a primeira dose da vacina.

Segundo a mesma tabela, entre esse total, o número de casos registrados por meio do aplicativo de pessoas com algum impacto na saúde foi de 3.150, ou 2,7% — sendo que esses efeitos não têm indicação de gravidade, e podem ser o impedimento para realizar algum tipo de atividade do dia a dia, ter que faltar ao trabalho ou precisar se consultar com um médico ou profissional de saúde. O texto que viralizou fala em mais de 3 mil casos de pessoas “incapacitadas de realizar atividades diárias”, mas o número, na verdade, se refere a qualquer tipo de consequência.

O mesmo documento também informa que, até o dia 18 de dezembro, o CDC havia identificado seis casos de anafilaxia em pacientes que receberam as doses da Pfizer-BioNTech. Todos ainda serão analisados pelos órgãos competentes dos EUA.

Até o dia 21 de dezembro foram aplicadas 614.117 doses do imunizante Pfizer/BioNTech. Ou seja, o número de reações graves registradas até agora representa 0,0009% dos vacinados.

Quais as reações adversas mais comuns ao imunizante Pfizer/BioNTech?

Segundo o CDC, as reações adversas mais frequentes são dor, inchaço e vermelhidão no local de aplicação da vacina, além de calafrios, cansaço e dor de cabeça. São considerados efeitos leves, parecidos com uma gripe. O órgão americano diz que os sintomas podem começar em até dois dias após a primeira dose e podem atrapalhar o trabalho ou atividades diárias.

De acordo com a Pfizer, o porcentual de pessoas que tiveram esses sintomas durante os ensaios clínicos foi: dor local (84.1%), cansaço (62.9%), dor de cabeça (55.1%), dor muscular (38.3%), calafrios (31.9%), dor articular (23.6%), febre (14.2%), inchaço local (10.5%), vermelhidão local (9.5%), náusea (1.1%), mal-estar (0.5%), e linfonodos aumentados (0.3%).

Autoridades britânicas e americanas recomendam que a vacina não seja administrada a pessoas com histórico de anafilaxia. Mas essa reação é raríssima. O The New York Times informa que uma a cada 1 milhão de pessoas vacinadas nos EUA tem reação anafilática. Um documento do Food and Drug Administration (FDA), agência análoga à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), informa que 0,63% dos participantes do ensaio clínico da Pfizer que receberam a vacina tiveram alguma reação alérgica, comparado a 0,51% de reação no grupo de placebo. Na fase três dos testes, um dos 18.801 participantes que recebeu o imunizante teve anafilaxia.

Reação alérgica grave foi causada pela vacina?

Isso ainda não foi confirmado. O Instituto Nacional de Saúde dos EUA (NIH) vai fazer um estudo para descobrir por que algumas raras pessoas desenvolvem reação anafilática. De acordo com o The Washington Post, pesquisadores vão analisar se algum componente da vacina causa a alergia e esperam ter resultados em algumas semanas. No entanto, a pesquisa é de difícil realização pois é preciso recrutar participantes extremamente alérgicos.

O principal suspeito para os cientistas é o Polietilenoglicol, uma substância largamente utilizada em remédios e cosméticos. As reações alérgicas graves a esse composto são extremamente raras.

Os especialistas ouvidos pelo Post afirmam que as reações anafiláticas registradas não devem impedir as pessoas de tomarem a vacina. Americanos que tomarem a primeira dose são instruídos a esperar 15 a 30 minutos antes de ir para casa, no caso improvável de uma reação desse tipo. A anafilaxia é facilmente revertida com doses de epinefrina e outros remédios.

Por que investigamos?

Em sua terceira fase, o Comprova investiga conteúdos duvidosos relacionados às políticas públicas do governo federal e à pandemia do novo coronavírus. Informações falsas sobre as vacinas em desenvolvimento contra a covid-19 podem interferir na confiança das pessoas para serem submetidas aos imunizantes quando eles estiverem disponíveis no país, o que por consequência pode atrapalhar a estratégia de usar as vacinas para conter a disseminação do SARS-CoV-2 e reduzir os efeitos da pandemia. O texto verificado foi compartilhado em um tuíte com seis mil interações.

O Comprova já verificou outros conteúdos falsos sobre vacinas contra covid-19 em fase de desenvolvimento, como a verificação que apontou que testes de um imunizante contra o coronavírus na Austrália não infectaram os voluntários com HIV, que não há comprovação de que a vacina da Pfizer tenha causado paralisia de Bell em voluntários e a que as vacinas para covid-19 não são capazes de provocar danos genéticos.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.