O Projeto Comprova é uma iniciativa colaborativa e sem fins lucrativos liderada pela Abraji e que reúne jornalistas de 42 veículos de comunicação brasileiros para descobrir, investigar e desmascarar conteúdos suspeitos sobre políticas públicas, eleições, saúde e mudanças climáticas que foram compartilhados nas redes sociais ou por aplicativos de mensagens.
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Saúde

Investigado por: 2023-06-09

É enganoso relacionar indenização britânica por danos causados por vacinas às mortes pela covid

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Enganoso
Texto e post do site Brasil sem Medo (BSM) enganam ao relacionar indenização paga pelo governo britânico por danos causados por qualquer vacina a número de mortos por covid-19, afirmando, de maneira distorcida, que números oficiais mostram que pessoas vacinadas são as que mais morreram pela doença. A indenização é paga pelo menos desde 1997 para "casos extremamente raros" e que envolvam qualquer uma das vacinas em uso no Reino Unido. O conteúdo verificado tenta descredibilizar os imunizantes contra a covid-19, mas o órgão de saúde britânico os defende no texto que o BSM usa como fonte – o site omite esta informação. Além disso, o relatório usado pela página considera números de óbitos absolutos para fazer comparações, o que não é a maneira correta. É natural que haja mais mortes entre vacinados em uma população que já foi majoritariamente imunizada, informou a autoridade de saúde do Reino Unido ao Comprova.

Conteúdo investigado: Texto intitulado “Governo britânico anuncia indenização de 120 mil euros para vítimas de vacinas” que diz que “em março deste ano, um relatório publicado pela Agência de Saúde do Reino Unido apontou que os vacinados são maioria entre as mortes por covid-19”. O conteúdo foi replicado no Twitter.

Onde foi publicado: Site Brasil sem Medo, Instagram e Twitter.

Conclusão do Comprova: É enganoso post que relaciona o fato de o governo britânico ter publicado em seu blog informações sobre o esquema de pagamento por danos causados ​​por vacinas a um relatório da UK Health Security Agency (UKHSA), a autoridade de saúde britânica, segundo o qual “os vacinados são maioria entre as mortes por covid-19”. O post desinforma ao sugerir que as vacinas contra o novo coronavírus não são seguras. A indenização existe pelo menos desde 1997 (muito antes da pandemia) e não foi anunciada recentemente, como algumas pessoas que compartilharam a desinformação acreditaram.

O texto leva a uma interpretação errada dos dados ao dar destaque a número mais alto de mortes entre vacinados quando a maior parte da população já se imunizou. “Não é que as pessoas vacinadas tenham maior probabilidade de morrer, é porque há mais pessoas vacinadas do que não vacinadas. Sempre haverá algumas infecções que levam à morte porque nenhuma vacina é 100% eficaz, mas uma pequena proporção de uma população muito grande (vacinada) é geralmente maior do que uma proporção maior de uma população menor (não vacinada)”, explicou a UKHSA ao Comprova.

Conteúdos fazendo esta afirmação enganosa – a de que os vacinados morreram mais do que os não vacinados – circulam desde o ano passado e um deles já foi verificado pelo Comprova.

Enganoso, para o Comprova, é todo conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Publicado pelo site Brasil sem Medo, o post foi visualizado mais de 13,8 mil vezes no Twitter e compartilhado 178 vezes até 9 de junho. Um dos perfis que compartilhou o conteúdo enganoso no Instagram teve mais de 19,4 mil interações até a data.

Como verificamos: Utilizando o Google, fizemos uma pesquisa pela principal alegação do post (Reino Unido anunciou pagamento de indenizações por danos causados por vacina) e localizamos uma publicação recente sobre o modelo de pagamento por danos causados ​​por vacinas. Em seguida, buscamos saber como funciona a política e desde quando ela existe. O próximo passo foi descobrir quando o imunizante contra a covid-19 foi inserido no sistema. Partimos então para a segunda alegação (dados de março apontam que maioria dos mortos por covid no país é vacinada) e consultamos os relatórios recentes da UK Health Security Agency sobre vacinação. Também entramos em contato com a agência, via e-mail, para solicitar mais detalhes sobre os dois assuntos. Por fim, procuramos os autores dos posts.

Reino Unido já pagava a indenização antes da covid-19

Apesar de ter sido publicado um comunicado recente sobre como funciona o esquema de pagamento por danos causados por vacinas no blog do Departamento de Saúde e Assistência Social, a política não é uma novidade para os britânicos. Existe notícia de 2005 informando os pagamentos a pacientes incapacitados por vacinas pelo menos desde 1997.

O comunicado ao qual os posts verificados se referem explica que é fornecido um pagamento único, isento de impostos, no valor de 120 mil libras, em “ocasiões muito raras” de uma vacina ter causado uma incapacidade grave. Logo no início do informativo é destacado que todas as vacinas usadas no país passaram por testes clínicos robustos e atenderam aos rígidos padrões de segurança, eficácia e qualidade da Agência Reguladora de Medicamentos e Produtos de Saúde (MHRA, na sigla em inglês) .

Isso inclui a vacina contra a covid-19, acrescentada ao programa em dezembro de 2020, antes mesmo de o uso ser aprovado no país. À época, o governo informou que os imunizantes só seriam implantados quando atendessem a padrões rígidos de segurança, eficácia e qualidade e fossem aprovados pelo órgão regulador.

O governo britânico mantém duas páginas oficiais (1 e 2) sobre os pagamentos, informando, inclusive, que eles podem ser feitos para danos causados por outras 18 vacinas, além da que combate o coronavírus. Entre elas, estão imunizantes comumente aplicados ao longo da vida das pessoas, como os que previnem contra influenza, sarampo, poliomielite, varíola e tétano.

Morrem mais vacinados porque o número de imunizados é maior

O texto compartilhado no Twitter cita que um relatório publicado pela Agência de Saúde do Reino Unido apontou que os vacinados são maioria entre as mortes ocorridas por covid-19 durante o mês de março deste ano. A publicação acrescenta que o período analisado foi de 28 de fevereiro até 27 de março, mas essa afirmação é incorreta.

A agência informou ao Comprova que desde o relatório publicado em 6 de abril – que traz dados do mês anterior – não é mais incluída a seção com registros sobre status vacinal dos casos, mortes e hospitalizações com covid-19. O órgão explicou que isso ocorre porque em 1º de abril de 2022 o governo do Reino Unido encerrou o fornecimento de testes gratuitos para o público em geral e a mudança afetou a capacidade de monitorar de forma robusta os casos de covid por status de vacinação.

Um comunicado sobre o assunto foi postado no blog da agência. Nele, é informado que os dados dos relatórios anteriores mostram que as taxas de hospitalização e mortes são substancialmente mais baixas em pessoas totalmente vacinadas, em todas as faixas etárias, sendo claro que as vacinas fornecem alto nível de proteção contra efeitos mais graves da doença.

A reportagem consultou o relatório publicado em abril e confirmou a informação fornecida pela agência. O documento cita dados coletados entre 27 de fevereiro e 26 de março – data próxima à citada pelo site –, porém eles não são referentes a mortes de pessoas com covid, mas sim a taxas de hospitalização pela doença entre pessoas vacinadas.

A agência britânica destacou que, no contexto da cobertura vacinal muito alta na população, mesmo com uma vacina altamente eficaz, é natural que uma grande proporção de casos, internações e mortes ocorra em indivíduos vacinados, isso porque é maior a proporção da população vacinada.

Onde a desinformação surgiu

O perfil que disseminou a desinformação nas redes foi o do site Brasil sem Medo. A página conservadora publicou em 5 de junho um texto intitulado “Governo britânico anuncia indenização de 120 mil euros para vítimas de vacinas”. A desinformação começa no título, pois o valor é de 120 mil libras, e não euros.

Ao compartilhar o texto no Twitter, o perfil relacionou a indenização à vacinação contra a covid-19 ao incluir a legenda “Em março deste ano, um relatório publicado pela Agência de Saúde do Reino Unido apontou que os vacinados são maioria entre as mortes por covid-19”. Aqui, novamente, há outro erro: o texto linkado sobre as mortes é do próprio Brasil sem Medo, de 14 de abril de 2022, e não deste ano.

Não é a primeira vez que o site espalha desinformação. O Comprova já verificou outros cinco conteúdos disseminados por eles (1, 2, 3, 4 e 5) – destes, quatro negam medidas comprovadamente eficazes contra a disseminação da covid-19.

Na aba “Sobre” do site, cujo logo é Novo BSM, não há nenhuma informação a respeito da publicação. Em verificação de 2021, o Comprova afirmou que a plataforma se identificava como “o maior jornal conservador do Brasil”. Em redes como Twitter e Instagram, a página se define como “o único streaming de notícias e análises sobre política e cultura, declaradamente conservador”.

Ainda no site, na aba “Autores” aparece o nome de Olavo de Carvalho, que ficou conhecido como guru bolsonarista e morreu no ano passado. O site republica textos antigos dele.

O que diz o responsável pela publicação: O Brasil Sem Medo foi procurado, mas não respondeu até a publicação desta verificação. Um perfil no Instagram que usou o material e viralizou também não retornou o contato.

O que podemos aprender com esta verificação: É possível observar indícios de desinformação quando um texto parece evitar apresentar detalhes do assunto abordado. No caso aqui verificado, o conteúdo não contextualiza as informações referentes às políticas britânicas de vacinação e no âmbito da covid-19.

Primeiro, o site causa alarde ao noticiar que o Reino Unido divulgou estar indenizando vítimas de efeitos colaterais causados por vacinas e ao associar essa informação às mortes causadas pelo novo coronavírus. O texto omite que esses pagamentos existem há pelo menos 20 anos e são disponibilizados também para outros imunizantes. O texto também ignora a informação da agência de saúde britânica de que os casos de efeitos colaterais graves são raros.

Em seguida, o autor da publicação cita dados sobre mortes entre vacinados ignorando a orientação da fonte das informações de que eles devem ser lidos respeitada a proporcionalidade entre vacinados e não vacinados no país.

Desde o início da pandemia de covid-19, tanto a doença quanto as vacinas desenvolvidas para o combate a ela têm sido alvos de desinformação, portanto, é importante redobrar a atenção para conteúdos que abordem esses dois temas. Informações seguras podem ser consultadas junto às agências reguladoras, órgãos de saúde e imprensa profissional.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: O Comprova já checou diversas alegações que tentam descredibilizar a eficácia das vacinas contra a covid-19, associando-as a mortes. Já foi demonstrado, por exemplo, que a proporção de óbitos pela doença é maior entre não vacinados no Reino Unido, diferentemente do que insinua post, que site engana leitores ao usar título sensacionalista sobre morte de imunizados e ser enganoso que imunizante contra a covid-19 tenha provocado aumento de mortes entre crianças.

Saúde

Investigado por: 2023-06-08

Anvisa não retirou alerta sobre vacina da Pfizer para prejudicar Bolsonaro

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Enganoso
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) não retirou do ar um alerta sobre possíveis efeitos colaterais da vacina da Pfizer contra a covid-19. Um vídeo no Instagram diz, de forma enganosa, que a informação teria sido despublicada para prejudicar a reeleição do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). A nota técnica sobre o assunto nunca foi retirada do ar. Já a matéria que trata do tema foi ocultada do site da Anvisa em 1º de julho de 2022, por conta do período de defeso eleitoral – medida prevista em lei desde 1997 para impedir que quem está no poder utilize a máquina pública de comunicação para fazer campanha –, mas voltou para o site em 8 de agosto, a pedido da área técnica da agência.

Conteúdo investigado: Post em que um homem reage a um vídeo no qual uma moça alega que, para prejudicar o então candidato à presidência da República Jair Bolsonaro (PL), a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) retirou do ar, durante o período eleitoral de 2022, o alerta sobre os riscos de miocardite e pericardite pós-vacinação do imunizante produzido pela Pfizer.

Onde foi publicado: Instagram.

Conclusão do Comprova: Um vídeo no Instagram engana ao dizer que um alerta da Anvisa a respeito de efeitos colaterais associados à vacina da Pfizer contra a covid-19 foi retirado do ar para prejudicar a reeleição do então presidente Jair Bolsonaro (PL), em 2022. Durante o período de defeso eleitoral, medida prevista em lei desde 1997 para impedir que quem está no poder utilize a máquina pública de comunicação para fazer campanha, a agência retirou do ar a notícia que falava sobre registros de caso de miocardite e pericardite em vacinados com imunizantes do tipo mRNA, mas o documento técnico sobre o assunto, de 2 de julho de 2021, seguiu publicado.

Em 2022, o defeso eleitoral foi de 2 de julho a 30 de outubro, por causa do segundo turno, e foi aplicado a todos os canais de comunicação do governo, inclusive perfis em redes sociais.

O site da Anvisa chegou a publicar uma nota no dia 1º de julho de 2022 alertando que os textos sairiam do ar durante aquele período, mesmo aqueles publicados antes do defeso. O texto sobre a vacina da Pfizer foi ocultado naquela ocasião, mas voltou ao site em 8 de agosto, por “decisão da área técnica”, segundo informou a agência.

O Comprova encontrou 12 registros da página em questão na ferramenta Wayback Machine entre os dias 8 de agosto e 30 de outubro, ou seja, dentro do período de defeso eleitoral, inclusive dentro do período de campanha. A ferramenta captura e armazena páginas de sites conforme elas estão em determinada data.

A autora do vídeo enganoso interpreta de maneira equivocada uma atualização feita na nota da agência. No dia 7 de dezembro de 2022, a Anvisa acrescentou uma explicação sobre o defeso eleitoral ao texto de 2021 sobre a Pfizer esclarecendo o porquê de ele ter sido tirado do ar. Por isso, a “data de atualização” que aparece no alto do texto foi alterada para 7 de dezembro, dando a entender que ele só voltou ao ar nesta data.

Enganoso, para o Comprova, é todo conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Um usuário que gravou a si mesmo assistindo ao vídeo com as alegações enganosas obteve desde o dia em que a publicação foi postada, em 25 de abril, até 8 de junho, 526 mil visualizações. O Comprova não encontrou o vídeo original no perfil da autora.

Como verificamos: A equipe do Comprova entrou em contato com a Anvisa para saber se o conteúdo tinha sido removido do site durante o período de defeso eleitoral, procurou versões da nota arquivadas ao longo do tempo no site Wayback Machine e entrou em contato com as pessoas que aparecem na peça de desinformação. A autora do conteúdo foi reconhecida, porque outro conteúdo publicado por ela já tinha sido alvo de checagem pelo Comprova.

O vídeo

A criadora de conteúdo digital Cristiane Luz alega que o alerta da Anvisa sobre risco de miocardite e pericardite pós-vacinação da Pfizer, publicado em 9 de julho de 2021, “foi retirado do site e republicado no dia 7 de dezembro de 2022, após o resultado do segundo turno das eleições”. Ela chega a essa conclusão porque lê um informe que foi acrescentado à nota no dia 7 de dezembro sobre o período de defeso eleitoral. A imagem abaixo mostra o alerta da agência atualizado com a informação sobre o defeso (quadro cinza):

| Captura de tela do alerta da Anvisa. O texto dentro do retângulo cinza explica sobre o período de defeso eleitoral, ele foi acrescentado no dia 7 de dezembro de 2022. Foto: Reprodução.

Mais adiante, a autora do vídeo conclui: “eles retiraram uma informação importantíssima para a população para não beneficiar o candidato Jair Messias Bolsonaro. Ou seja, eles politizaram a pandemia. Eles politizaram medicamentos”.

No Wayback Machine, há registros da nota durante o defeso eleitoral, o que comprova que o conteúdo estava disponível ao público nesse período.

O que é o Wayback Machine

O Wayback Machine é um site que permite arquivar páginas da internet. Isso é especialmente útil quando se pretende verificar diferentes versões de um mesmo conteúdo ao longo do tempo. Por exemplo, é possível ver como era a página principal do YouTube na época em que o site surgiu, em 2005, e as mudanças que ocorreram de lá pra cá. A título de curiosidade, de 28 de abril de 2005 a 8 de junho de 2023, a URL www.youtube.com foi salva mais de 17 milhões de vezes.

Os criadores do Wayback Machine explicam que o objetivo é construir uma biblioteca digital. Eles estimam que possuem 735 bilhões de páginas arquivadas. Desse total, 103 arquivos são capturas de tela da nota da Anvisa. A imagem a seguir mostra o resultado exibido pela ferramenta quando a URL da nota é inserida no campo de pesquisa:

| Ao colocar a URL da nota da Anvisa na caixa de pesquisa do Wayback Machine, o site informa as capturas de tela que foram feitas do conteúdo. Foto: Reprodução.

Wayback Machine mostra que a nota estava no ar em período eleitoral

A nota da Anvisa foi publicada em 9 de julho de 2021. Desse dia até 11 de abril de 2023, o site Wayback Machine registrou 103 capturas de tela da nota, 12 delas ocorreram no período de defeso eleitoral, de 2 de julho a 30 de outubro. Isso significa que o conteúdo da nota estava disponível ao público nos dias que antecederam as eleições. A imagem a seguir mostra em quais dias de 2022 a nota foi salva na ferramenta:

| No ano de 2022, a nota da Anvisa só não foi salva nos meses de abril, julho e julho. O tamanho do círculo indica a quantidade de capturas que foram feitas. Em 1º de fevereiro foi o recorde de 2022, a página foi salva 4 vezes ao longo do dia. Foto: Reprodução.

A imagem acima permite constatar que não há registros da nota entre 2 de julho e 8 de agosto, período em que a Anvisa diz ter retirado o conteúdo do ar. Mas há acessos posteriores, nos dias 12, 13, 14 e 19 de agosto, 10 e 26 de setembro e 23 e 28 de outubro. Isso desmente a alegação da autora do vídeo de que o conteúdo só teria voltado ao ar em dezembro.

Os arquivamentos da nota feitos do dia 8 de dezembro de 2022 em diante diferem dos anteriores em um aspecto: a inserção da explicação sobre o período de defeso eleitoral. Ao comparar, por exemplo, a captura feita no dia 28 de outubro com a do dia 8 de dezembro percebe-se que o conteúdo do alerta não mudou e que a diferença entre as duas versões está no aviso em cinza inserido entre o título e o texto.

Covid-19 e miocardite

A miocardite é a inflamação do músculo cardíaco e a pericardite é a inflamação do revestimento externo do coração. Em ambos os casos, o sistema imunológico do organismo causa uma inflamação em resposta a uma infecção ou algum outro fator. Os sintomas podem incluir dor no peito, falta de ar ou palpitações.

Essas duas condições podem ocorrer como efeitos colaterais raros em pessoas que tomaram vacinas de RNA mensageiro (mRNA), como as da Pfizer e da Moderna.

Segundo dados do Programa Nacional de Imunizações (PNI), disponíveis no site da Anvisa, até 31 de dezembro de 2022 foram administradas 501.573.962 doses de vacinas contra a covid-19 no país. Nesse período, foram notificados 154 casos de miocardite, definidos segundo critérios da Brighton Collaboration (rede global de pesquisa de segurança de vacinas sem fins lucrativos para profissionais de saúde), ocorridos após as vacinas. Isso corresponde a uma incidência de 3 a cada 1 milhão de doses aplicadas.

A Anvisa destaca, contudo, que a proteção da vacina contra a covid-19 supera o possível risco. A taxa de miocardite em pessoas acometidas pela covid-19 é de 30 casos por milhão para a população em geral.

O que diz o responsável pela publicação: Uma mensagem privada foi enviada para o perfil do Instagram da autora do conteúdo e do usuário que compartilhou o vídeo. Até o dia 8 de junho, a equipe do Comprova não recebeu retorno.

O que podemos aprender com esta verificação: A distorção de informações verdadeiras ou omissão de detalhes importantes sobre um determinado fato são táticas utilizadas por muitos desinformadores e também prática comum nas publicações que não utilizam critérios jornalísticos para investigar informações. Por isso, é importante desconfiar de pessoas que fazem alegações conspiracionistas, buscar a fonte original da informação e pesquisar sobre o assunto falado em sites confiáveis.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: A covid e a miocardite já foram alvo de outras verificações do Comprova, como a que mostrou que um jogador do Bayern de Munique não teve a doença no coração por conta da vacina e que a proteção oferecida pelo imunizante supera o risco de miocardite, ao contrário do que disse um site e um médico.

Saúde

Investigado por: 2023-06-08

É falso que criação de vírus da covid-19 em laboratório esteja comprovada

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Falso
Não há evidências científicas de que o SARS-Cov-2, vírus causador da covid-19, tenha sido criado propositadamente em laboratório com o objetivo de emplacar um modelo universal de vacina, diferentemente do que diz postagem no Twitter. O post cita a frase “Criamos o vírus SARS propositadamente” como sendo de um doutor chamado Dave Martin, que fala em vídeo cuja legenda é “Nós projetamos o vírus SARS propositadamente”. No entanto, não há definição científica sobre a origem do vírus da covid-19.

Conteúdo investigado: Postagem no Twitter com as citações “Criamos o vírus SARS propositadamente” e “A intenção era levar o mundo a aceitar um modelo universal de vacina, e o coronavírus foi a forma para lá chegar” atribuídas a Dr. Dave Martin em uma palestra no Parlamento Europeu, com um vídeo de parte da fala do homem.

Onde foi publicado: Twitter.

Conclusão do Comprova: Não há evidência científica de que o novo coronavírus tenha sido criado propositadamente para levar “o mundo a aceitar um modelo universal de vacina”. A origem do vírus ainda está sendo pesquisada e as evidências até o momento apontam que o coronavírus teve origem em morcegos. As alegações sobre a origem do SARS-CoV-2 foram feitas por David E. Martin, um empresário norte-americano, em palestra no Parlamento Europeu que já foi alvo de verificação do Comprova – o evento não reuniu os maiores cientistas do mundo, diferentemente do que havia sido anunciado pelos organizadores, que foram cinco dos 705 deputados.

Em sua fala no evento, Martin alega, sem qualquer comprovação, que o vírus causador da Síndrome Respiratória Aguda Grave (SARS) seria resultado de uma pesquisa laboratorial que criou um vírus para inoculação em humanos. Ele faz a ilação com base na existência de patentes para a manipulação do SARS-CoV, pedidas em 2003, e em um estudo que avaliou a inoculação do vírus em humanos em 2015. Com isso, ele conclui que o vírus da covid-19 já vinha sendo trabalhado há anos em laboratórios.

O estudo de 2015 foi publicado pela revista Nature; em 2020 o periódico científico anexou nota sobre o uso equivocado da pesquisa. “Estamos cientes de que este artigo está sendo usado como base para teorias não verificadas de que o novo coronavírus que causa a covid-19 foi projetado. Não há evidências de que isso seja verdade; os cientistas acreditam que um animal é a fonte mais provável do coronavírus”, informa o texto.

O SARS-CoV foi descoberto em 2002, com a epidemia de Sars que se originou na China. Em 2004, um estudo em cooperação entre a China e o Reino Unido identificou evidências de origem animal do SARS-CoV. Pesquisas posteriores mostraram que os morcegos são o reservatório natural deste vírus (2013 e 2016).

Sobre o Sars-CoV-2, causador da covid-19, a Organização Mundial da Saúde (OMS) criou uma comissão internacional em 2020 para pesquisar sua origem, mas ainda não divulgou o relatório final. Um documento preliminar concluiu que a hipótese mais provável é que o vírus tenha surgido a partir de morcegos na província de Wuhan, na China. A forma como ele se espalhou para os humanos ainda é incerta, mas há duas possibilidades principais: a de que ocorreu naturalmente ou a de que ele infectou alguém envolvido em pesquisas, dentro de um laboratório – nenhuma das teorias fala que o vírus foi disseminado de forma intencional.

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma falsidade.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Até o dia 7 de junho, a publicação no Twitter tinha 361,2 mil visualizações, com 9,7 mil curtidas, 4,3 mil retweets e 346 comentários.

Como verificamos: Primeiramente, buscamos a origem do vídeo postado no Twitter, a partir do Search By Image, para verificar a identidade do homem mostrado e em qual ocasião a fala foi proferida. Ao confirmar que se trata de uma participação no Third International Covid Summit (ICS3), ocorrido em maio no Parlamento Europeu, foi possível identificar que se tratava do empresário David E. Martin.

O Comprova pesquisou sobre a biografia de Martin e os estudos mencionados por ele na sua apresentação. Além disso, consultou a OMS para verificar o andamento do estudo internacional sobre a origem da covid-19.

Origem do vírus da covid-19 ainda é indefinida

A comissão de especialistas formada pela OMS para pesquisar a origem do SARS-CoV-2 ainda não emitiu um parecer final sobre o surgimento da doença. O relatório inicial, publicado em março de 2021, apontou que o coronavírus teria surgido a partir de morcegos na província de Wuhan, na China, passado para uma espécie intermediária e então chegado aos humanos.

O documento classificou ainda como ‘’altamente improvável” que o vírus tenha escapado de um laboratório na China. Estudos científicos já apontaram a relação entre os morcegos e os vírus do tipo SARS e, por isso, a maior parte da comunidade científica mundial considera a tese do surgimento com a participação dos morcegos como a mais provável, e que uma espécie intermediária teria passado o vírus aos humanos no Mercado de Frutos do Mar de Huanan, em Wuhan.

Essa relação entre coronavírus e morcegos foi descrita a partir das pesquisas com o SARS-CoV iniciadas durante a pandemia de Síndrome Respiratória Aguda Grave (SARS, em inglês), ocorrida entre 2002 e 2004, especialmente na Ásia. O vírus causador da SARS, embora seja diferente, é da mesma família da covid-19 e da Síndrome Respiratória do Oriente Médio (MERS, em inglês), cujo primeiro caso registrado foi em 2012.

Ainda assim, não foi descartada qualquer hipótese e segue a análise de que o vírus possa ter chegado aos humanos após um acidente em laboratório. No final de maio, o professor George Gao, vice-presidente da Fundação Nacional de Ciências Naturais da China, que atuou no Centro de Controle de Doenças (CDC) da China até 2022, falou de forma geral sobre o assunto e disse que no âmbito científico todas as hipóteses devem ser analisadas.

Em janeiro deste ano, foi divulgado o material genético dos primeiros casos de covid-19, que ocorreram ainda no final de 2019 na China, e o resultado constatou a presença de DNA animal. Isso configura uma evidência de origem zoonótica (animal) do vírus. Depois disso, a OMS chegou a pedir publicamente que a China desse transparência a todos os dados que possui sobre o vírus.

O governo chinês rebateu o posicionamento da entidade e garantiu que todos os dados da pesquisa que busca a origem do novo coronavírus estão sendo disponibilizados de forma científica. A China pediu ainda que a organização não “politizasse” a questão.

Quem é David E. Martin

David E. Martin é empresário e responsável pela fundação de diversas empresas do ramo comercial, de tecnologia e finanças. Atualmente, é o CEO fundador da M∙CAM Inc, que atua no gerenciamento de risco financeiro baseado em propriedade intelectual, ou seja, trabalha com a auditoria de qualidade de patentes para entidades públicas e privadas. Ele também foi consultor de políticas públicas do Congresso dos Estados Unidos e do Estado da Virgínia, ambos na área de direito de propriedade intelectual.

Em seu site pessoal, se descreve como “empresário, professor, autor, contador de histórias, inventor, consultor prospectivo global, pai, amigo”. Afirma ainda que “sua primeira invenção foi um sistema integrado a laser para direcionar e tratar tumores inoperáveis”. No perfil do LinkedIn apontado como sendo de Martin, há informação de que ele realizou uma pós-graduação em fisiologia na Universidade de Ball State e o PhD na Universidade de Virgínia, na área de fisiologia e medicina esportiva.

Os estudos com o nome de David E. Martin enquanto esteve associado à Universidade de Virgínia são relacionados a diagnósticos de doenças e tratamentos, sobretudo de ligamentos cruzados dos joelhos. Ainda em seu site, ele afirma que sua “matemática ajudou a desvendar a forma como o corpo humano processa os hormônios e levou à detecção e tratamento de muitas doenças”.

Desde 2020, com o início da pandemia, Martin tem se destacado entre os negacionistas com o uso de sua teoria conspiratória de que o vírus responsável pela covid teria sido uma criação em laboratório, usado como arma humana e para o benefício de laboratórios em busca de uma vacina.

Em agosto de 2020, Martin participou do documentário conspiratório Plandemic: Indoctornation, vídeo que foi banido de plataformas como YouTube e Facebook, por divulgar afirmações falsas. No documentário – que faz afirmações classificadas como falsas pelo Comprova –, Martin é creditado, dentre outras funções, como analista de inteligência nacional e fundador do IQ100 Index (que se trata de um índice responsável por medir o crescimento de empresas que usam tecnologia patenteada).

Na sua participação, ele afirma que o desenvolvimento da covid-19 se dá a partir de uma pesquisa entre institutos de saúde dos Estados Unidos e o Instituto de Virologia de Wuhan, algo semelhante ao que foi dito na apresentação feita no Parlamento Europeu. “Os Estados Unidos podem dizer que foi a China (que teria criado o vírus). A China poderia dizer que os Estados Unidos fizeram isso”, conclui ele no documentário.

A afirmação é baseada no fato de que o Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos EUA possui a patente do vírus SARS-CoV, assim como outras instituições e empresas. Em 2007, ano de obtenção da patente, o CDC informou que o interesse era poder conceder as informações sobre a SARS de forma pública. Ou seja, o CDC obteve a patente para que a pesquisa e a comunicação pública sobre o vírus não fossem prejudicadas por empresas comerciais, que buscavam o controle privado exclusivo das informações sobre o SARS-CoV.

No Parlamento Europeu, no início de maio, Martin foi creditado como especialista em patentes e atuante no rastreamento das aprovações de direito de propriedade intelectual para verificar se existem atividades suspeitas nos pedidos de patentes com os interesses dos institutos ou empresas. Ele desenvolve sua apresentação com base na tese de que a covid-19 é resultado do desenvolvimento patogênico do coronavírus por laboratórios, mas não mostra qualquer evidência científica.

Qual é a diferença entre SARS-CoV-2 e covid-19

A Síndrome Respiratória Aguda Grave (SARS) é uma doença respiratória causada por um vírus da família dos coronavírus denominado SARS-CoV.

Covid-19 é a doença causada em humanos infectados pelo SARS-CoV-2, outro vírus da família dos coronavírus. O SARS-CoV-2 ficou conhecido, no início da pandemia, como “novo coronavírus”.

Clique aqui para saber mais.

O que diz o responsável pela publicação: O Comprova procurou um dos perfis que publicou o conteúdo falso, mas não obteve resposta até a publicação deste texto.

O que podemos aprender com esta verificação: É preciso ficar atento com o uso de personagens estrangeiros e, a princípio, desconhecidos da maior parte da população como autoridades em determinado assunto.

Há a necessidade de pesquisar sobre os palestrantes ou entrevistados e o contexto da fala reverberada nas redes sociais. Além disso, teorias conspiracionistas, tal qual a ideia de que institutos ou empresas criaram uma doença em busca de lucro, devem ser questionadas, sobretudo quando não são apresentadas as provas.

A verificação mostra ainda a necessidade de se informar pela imprensa profissional e buscar mais informações junto aos órgãos oficiais e de controle, como em relação à origem das doenças e seus transmissores.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: A pandemia é tema frequente de verificações do Comprova, que, recentemente, checou, por exemplo, que as vacinas contra a covid-19 não foram proibidas, que deputado repete alegações enganosas sobre ineficácia dos imunizantes e que vídeo descontextualiza trechos antigos de telejornais para enganar sobre cloroquina.

Política

Investigado por: 2023-06-06

Carta a ministro do STF foi inventada por comentarista, não escrita por traficante

  • Enganoso
Enganoso
Post engana ao retirar de contexto o áudio de um comentarista de TV lendo o que seria uma carta de um chefe do tráfico de drogas com agradecimentos a um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF). Na verdade, a carta foi criada pelo próprio comentarista como crítica ao STF. Essa informação, que consta no vídeo original, foi omitida da publicação que circula de forma descontextualizada nas redes sociais.

Conteúdo investigado: Post com áudio do comentarista Caio Coppolla lendo suposta carta de um traficante ao ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Edson Fachin. A publicação exibe uma imagem de Coppolla e o seguinte texto: “Vergonha nacional. Áudio do chefe do tráfico enviado para ministro do STF.”

Onde foi publicado: TikTok e Facebook.

Conclusão do Comprova: É enganoso um post que circula nas redes sociais com áudio do comentarista Caio Coppolla lendo uma carta supostamente escrita por um chefe do tráfico de drogas e endereçada ao ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Edson Fachin. Na verdade, a carta, em que o suposto traficante agradece a “sensibilidade com a classe criminosa”, foi inventada pelo próprio comentarista como crítica a uma decisão de Fachin.

A informação consta no vídeo original, da JP News, de 2022. No quadro Boletim Coppolla, antes de fazer a leitura do texto, o comentarista explica à audiência que foi ele próprio quem o escreveu. Este trecho, porém, foi omitido das peças de desinformação que circulam com a frase “vergonha nacional” em referência ao STF. Nos comentários, as pessoas questionam “será verdade?”.

A carta escrita por Coppolla com elogios do suposto traficante ao ministro buscava criticar, de forma irônica, decisões tomadas pelo Supremo durante a pandemia da covid-19, envolvendo ações da Polícia Militar (PM) nas favelas do Rio de Janeiro e a situação de presos pertencentes a grupos de risco do coronavírus e mantidos em presídios superlotados.

O Comprova classifica como enganoso todo conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Até o dia 5 de junho de 2023, o post acumulava 375,7 mil visualizações no TikTok e 137 mil no Facebook. Os vídeos foram excluídos posteriormente das plataformas.

Como verificamos: Fizemos uma busca no Google pelas palavras-chave “carta”, “traficante” e “ministro do STF”. O vídeo com o comentário original apareceu no topo da página de resultados. Na sequência, assistimos ao vídeo, por meio do qual é possível entender que se trata de uma carta inventada pelo próprio comentarista.

Também fizemos buscas por conteúdos relacionados às decisões judiciais citadas na abertura do comentário e, por fim, entramos em contato com os responsáveis pelos posts enganosos.

Carta é invenção de comentarista

A carta do suposto traficante endereçada ao ministro foi, na verdade, inventada por Caio Coppolla. Em 31 de maio de 2022 foi ao ar uma edição do quadro Boletim Coppolla, da JP News, em que o comentarista critica decisões do Supremo, sobretudo do ministro Edson Fachin, no âmbito da segurança pública do Rio de Janeiro.

Antes de fazer a leitura da carta, no minuto 2:22 do vídeo, Coppolla confirma a autoria do texto. “Eu confesso que o meu apreço pelos bons modos e acima de tudo o meu respeito pela nossa seleta audiência me impedem de criticar a postura de certas autoridades com a devida ênfase. Por isso, hoje eu optei por dar vazão à minha indignação de uma outra forma, imaginando como seria a carta de um chefe do tráfico para o ministro Edson Fachin do STF”.

As decisões do STF

Na carta inventada, Coppolla faz referência a diversas decisões do STF no âmbito da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 635, conhecida como “ADPF das Favelas”. Movida em novembro de 2019 pelo PSB, a ação questiona a política de segurança pública no Rio de Janeiro.

Logo no início da leitura da carta, o comentarista diz: “Enquanto certos juristas diziam que covid não era habeas corpus, vossa excelência teve sensibilidade com a classe criminosa e fez a coisa certa. Desencarcerou geral com habeas corpus coletivo.”

Coppolla se refere a uma decisão do ministro Edson Fachin que, em dezembro de 2020, determinou que presos do grupo de risco da covid-19 que cumpriam pena no regime semiaberto fossem transferidos para prisão domiciliar. A decisão de Fachin, na época, atendeu parcialmente a um pedido da Defensoria Pública da União (DPU), que solicitou a concessão de um habeas corpus a favor de todas as pessoas presas em locais acima da sua capacidade, que fossem integrantes de grupos de risco da covid e que não tivessem praticado crimes com violência ou grave ameaça.

Em seguida, Coppolla afirma que leu todas as 11 sugestões de Fachin “para reduzir a letalidade policial nas comunidades dominadas pelos meus colegas aqui no Rio de Janeiro”, em referência a uma decisão liminar do ministro de junho de 2020, que restringiu as operações em comunidades do Rio durante a pandemia. As operações passaram a ser permitidas apenas em casos excepcionais, com a comunicação imediata ao Ministério Público. Dois meses depois, o STF formou maioria e confirmou a decisão, que permanece em vigor.

Em fevereiro de 2022, o STF ​esclareceu os limites para operações policiais em comunidades fluminenses durante a pandemia e determinou que o governo do Rio encaminhasse ao Supremo, em até 90 dias, um plano com medidas para reduzir a letalidade policial e controlar as violações de direitos humanos pelas forças de segurança. O Supremo também estabeleceu, entre outras medidas, a criação de um observatório judicial sobre polícia cidadã, no âmbito do Conselho Nacional de Justiça (CNJ); a priorização de investigações de incidentes que tenham como vítimas crianças e adolescentes; a instalação de equipamentos de GPS e sistemas de gravação de áudio e vídeo nas viaturas e fardas dos agentes; e a proibição da utilização de domicílio ou imóvel privado como base operacional das forças de segurança.

Fachin chegou a se reunir, em abril deste ano, com o procurador-geral da República, Augusto Aras, e com a vice-procuradora-geral da República, Lindôra Araújo, para informar à PGR sobre os últimos desdobramentos da ADPF e esclarecer a demora do governo do Rio de Janeiro em instalar as câmeras corporais nos agentes de segurança.

Quem é Caio Coppolla

Coppolla é um comentarista político conhecido por seu posicionamento conservador e alinhado à política do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

Ele trabalhou na JP News até 2019, quando passou a integrar a equipe da CNN Brasil no programa Liberdade de Opinião. Durante o período na CNN, Coppolla fez mobilizações pelo impeachment do ministro do STF e presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Alexandre de Moraes.

Dois anos depois, Coppolla foi demitido e retornou à Jovem Pan para comandar o quadro Boletim Coppolla, que, conforme o site do veículo, trata sobre política, economia, justiça, educação, cultura, saúde e comportamento. Ele foi demitido novamente da JP News em outubro de 2022, após a eleição de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Atualmente, Coppolla integra o quadro fixo do programa diário O Grande Debate e comanda o Boletim Coppolla na CNN Brasil. No programa, ele fala sobre “os bastidores do poder, as principais decisões do governo e do Congresso Nacional, além de trazer outras análises sobre política, economia e justiça”, segundo o site da CNN.

O que diz o responsável pela publicação: O Comprova entrou em contato com o perfil que postou o vídeo pelo Facebook e pelo Instagram, mas não obteve retorno até a publicação desta checagem. Não foi possível contatar @antoniocosta1962, que fez a postagem enganosa no TikTok, porque a plataforma não permite o envio de mensagens entre contas que não se seguem. A busca pelo nome da conta em outras redes sociais retornou alguns resultados, mas como o perfil no TikTok não possui foto ou vídeo que identifique o responsável, não foi possível encontrar contas correspondentes.

O que podemos aprender com esta verificação: Ao se deparar com publicações alarmistas que utilizam expressões como “vergonha nacional” sem mencionar a fonte da informação, desconfie. É possível também questionar: “Se um chefe do tráfico tivesse encaminhado uma carta a um ministro do Supremo, a imprensa profissional não teria noticiado o caso?”

No caso do post verificado pelo Comprova, bastaria uma pesquisa no Google com palavras-chave relacionadas ao tema para encontrar o vídeo original e entender o contexto da gravação, que foi omitido do conteúdo desinformativo.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: O mesmo conteúdo foi verificado pela agência Aos Fatos. O Comprova já checou outras publicações envolvendo decisões judiciais e ministros brasileiros. Anteriormente, por exemplo, mostrou que vídeo engana ao afirmar que Justiça autorizou invasões de domicílio no Brasil; que vídeo engana ao dizer que ministro Barroso quer socializar investimentos de brasileiros; e que post tira de contexto decisão do TCU sobre joias recebidas por Bolsonaro.

Saúde

Investigado por: 2023-06-05

Não há indícios de que Amish tenham tido menos mortes por covid-19

  • Falso
Falso
É falso que a comunidade Amish, nos Estados Unidos, tenha registrado “30 vezes menos” mortes por covid-19 mesmo não seguindo recomendações das autoridades sanitárias, como a vacinação. Pesquisa feita com uma das comunidades indica que a tendência de morte por covid entre os Amish foi a mesma do resto dos Estados Unidos. Apesar de avessos à imunização, os Amish seguiram outras recomendações da Organização Mundial de Saúde (OMS), como o distanciamento social.

Conteúdo investigado: Tuíte dizendo que os Amish “rejeitaram vacinas, bloqueios e máscaras da covid” e que teriam sofrido “30 vezes menos mortes” pela doença acompanha link para site desinformativo com o mesmo conteúdo.

Onde foi publicado: Twitter e site.

Conclusão do Comprova: Não há indícios de que comunidades Amish tenham tido “30 vezes menos” mortes por covid-19 do que o restante da população por não seguir as recomendações das autoridades sanitárias, como o distanciamento social, o uso de máscara e a vacinação contra a doença.

As comunidades Amish são avessas à vacinação e também à tecnologia de forma geral, o que significa que foram menos testadas para a doença. Por conta disso, não há dados conclusivos a respeito da pandemia entre integrantes desse grupo. Contudo, estudo do Center for Disease Control and Prevention (CDC) dos Estados Unidos confirmou que o vírus chegou e se espalhou nessa população, deixando pessoas doentes.

Como não existem dados de mortalidade por covid-19 agregados por grupo religioso, não há como saber exatamente quantos Amish morreram nos Estados Unidos. Um estudo feito com base em obituários publicados na imprensa, no entanto, indica que a mortalidade em algumas comunidades desse tipo seguiu a mesma tendência que o resto do país.

Embora não tenham procurado a vacina, reportagens publicadas na imprensa tradicional mostram que, no período mais crítico da pandemia, os Amish seguiram outras medidas de prevenção, como o distanciamento social.

Além disso, o post, aqui analisado, fala que os Amish teriam registrado 30 vezes menos mortes por covid-19 do que o resto dos Estados Unidos. No entanto, há um problema matemático nesta construção, uma vez que um objeto uma vez menor do que ele próprio já significa zero.

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma falsidade.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Até o dia 5 de junho, o tuíte analisado já tinha mais de 112 mil visualizações, 6 mil curtidas e 1,8 mil compartilhamentos.

Como verificamos: O primeiro passo foi pesquisar por notícias relacionadas aos Amish e à pandemia de covid-19. O site do CDC também foi consultado para saber se existiam dados específicos sobre os Amish e o coronavírus. Por fim, a autora do tuíte e o site Tribuna Nacional foram procurados.

Verificação

Os Amish são um grupo cristão que busca viver isolado da sociedade moderna. A ideia é recriar o modo de vida do século 17, quando a Igreja Menonita foi criada pelo suíço Jakob Amman. Dessa forma, eles evitam o uso de tecnologias, inclusive de smartphones, televisões e carros. Os Amish vivem, principalmente, em comunidades isoladas nos Estados Unidos e no Canadá.

Estima-se que haja cerca de 360 mil pessoas vivendo em comunidades Amish nos Estados Unidos, a maior parte está nos estados da Pensilvânia, Ohio e Indiana.

Os Amish e a covid-19

Não há dados estatísticos oficiais sobre casos e mortes por covid-19 em comunidades religiosas. Da mesma forma, não há dados oficiais sobre a vacinação desses grupos.

Mas, de acordo com um estudo feito pelo Departamento de Sociologia e Antropologia da Universidade de West Virgínia, revisado por pares e publicado na revista Journal of Religion and Health, mortes nas comunidades Amish por covid-19 seguiram as mesmas tendências que o resto dos Estados Unidos. Os pesquisadores apontam que, como os grupos Amish são avessos à tecnologia, a tendência é que eles tenham sido menos testados para a covid-19. No entanto, usando obituários publicados em jornais, o estudo foi capaz de detectar um aumento de 125% no número médio de mortes entre os Amish durante a pandemia. A tendência é similar à do resto dos Estados Unidos.

Em maio de 2022, a Al-Jazeera fez uma matéria sobre uma comunidade Amish que fica em Ohio. De acordo com a reportagem, as autoridades do distrito de saúde do condado de Holmes se recusaram a falar com a publicação, porém, o número total de mortes relatadas em 2020 e 2021 no condado aumentou quase um terço em comparação com 2019. Segundo a matéria, como em outras comunidades, esse aumento provavelmente é atribuído ao covid-19.

Já de acordo com matéria de junho de 2021 da Associated Press, durante os primeiros meses da pandemia, os Amish seguiram as diretrizes de distanciamento social e pararam de se reunir em igrejas e funerais.

Ainda segundo o mesmo texto, em 2021, os casos caíram. “Contar com a possível imunidade coletiva quando poucos testes foram realizados entre os Amish é arriscado”, disse Esther Chernak, diretora do Centro de Prontidão e Comunicação em Saúde Pública da Universidade Drexel, na Filadélfia.

No entanto, a comunidade enfrenta resistência para se vacinar contra a doença. A maioria diz que já teve o vírus e não vê necessidade de ser vacinado, disse Mark Raber, que é Amish e membro de um assentamento no condado de Daviess, Indiana, que tem uma das taxas de vacinação mais baixas do estado.

Em abril de 2020, uma pesquisa foi feita avaliando padrões e crenças de vacinação em famílias Amish. O questionário foi enviado a 1 mil famílias Amish.

A taxa de resposta foi de 39%. Entre 391 entrevistados, 59% não vacinaram seus filhos. Os amish ultraconservadores rejeitaram as vacinas com mais frequência. Pesquisa feita uma década antes na mesma comunidade havia revelado que 14% recusavam todas as vacinas.

A pesquisa feita em 2020 também constatou que crianças Amish com alguma deficiência eram mais propensas a receber vacinas do que crianças Amish sem deficiência. Entre os entrevistados, 75% responderam que rejeitariam uma vacina covid-19. O medo de efeitos adversos foi o motivo mais comum para a rejeição.

Famílias que aceitavam vacinas eram mais propensas a citar um profissional de saúde como a principal influência para se vacinar. As esposas eram mais propensas a citar o cônjuge como a principal razão para se imunizar.

De acordo com dados atuais do CDC, 65% da população de Ohio, onde essa comunidade Amish está, recebeu pelo menos uma dose da vacina contra a covid-19 e 60% se vacinou com duas doses.

Vacinas são a melhor forma de proteção

De acordo com a OMS, é preferível se vacinar contra a covid-19 do que se infectar com a doença. Isso porque “as vacinas constroem imunidade sem os efeitos prejudiciais que a doença pode ter, incluindo os efeitos a longo prazo e a morte. Permitir que a doença se propague poderia causar milhões de mortes e ainda mais pessoas vivendo com os efeitos a longo prazo do vírus”.

Segundo a Organização Pan-Americana de Saúde (Opas), nas quatro semanas após a infecção, entre 90% e 99% dos indivíduos infectados pelo vírus SARS-CoV-2 desenvolvem anticorpos neutralizantes detectáveis. No entanto, a duração desta resposta imune pode variar de três meses a cinco anos, ou seja, há possibilidade de reinfecção ou de o paciente contrair outra cepa do vírus contra a qual ainda não desenvolveu imunidade.

O que diz o responsável pela publicação: A autora do tuíte foi procurada por mensagem privada e o site Tribuna Nacional por e-mail. Nenhum dos dois respondeu até a publicação dessa verificação.

O que podemos aprender com esta verificação: Conteúdos como este visam descredibilizar governos, organizações de saúde pública e pesquisadores insinuando que os esforços de prevenção contra a covid-19 e de imunização teriam sido em vão, o que não é verdade.

Neste caso, busca-se utilizar um dado inventado (“30 vezes menos mortes”) de uma população isolada e sobre a qual não se tem muita informação (os Amish) para dar ar de legitimidade ao argumento de que teria havido um “pânico fabricado” a respeito da pandemia. Como em muitas outras teorias conspiracionistas, essa suposta trama enganosa seria promovida por empresas farmacêuticas e governantes para controlar a população.

Ao se deparar com conteúdos suspeitos sobre a pandemia ou sobre vacinação de modo geral, é importante conferir a veracidade das afirmações junto aos órgãos sanitários e de Saúde, como a OMS, a Opas e o Ministério da Saúde.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: O Comprova já checou diversas informações falsas ou enganosas a respeito da covid-19 e das vacinas utilizadas para combater o vírus. Já foi comprovado que a pandemia não foi inventada, que expor a população ao risco de contrair o vírus não é melhor do que promover a vacinação, que o FBI não confirmou a origem do coronavírus e que o Parlamento Europeu não classificou os imunizantes contra a covid-19 como armas biológicas.

Comprova Explica

Investigado por: 2023-06-02

Entenda por que o nome de George Soros aparece em diversas teorias da conspiração

  • Comprova Explica
Comprova Explica
George Soros, 92 anos, é um bilionário norte-americano de origem húngara que fez fortuna no mercado de capitais. Ele é o criador da Fundação Open Society, que financia causas ligadas ao meio ambiente, direitos humanos e manutenção da democracia. Em 2021, a organização diz ter fornecido US$ 1,5 bilhão em doações para grupos ligados a essas causas. Soros é, ainda, um dos principais financiadores do Partido Democrata dos Estados Unidos.

Conteúdo analisado: O bilionário George Soros tem o nome frequentemente envolvido em teorias conspiracionistas, principalmente produzidas pela extrema-direita. Ele já foi acusado de ser um ex-nazista, de liderar o movimento Black Lives Matter, de financiar o Psol, de promover a crise migratória na Europa e nos Estados Unidos e de “odiar a humanidade”.

Comprova Explica: Um dos homens mais ricos do mundo, o megainvestidor húngaro-americano George Soros tem com frequência seu nome envolvido em casos de desinformação. Muitos dos conteúdos são teorias conspiratórias e têm fundo antissemita.

Posts já mentiram afirmando que ele foi preso nos Estados Unidos, acusado de interferir nas eleições presidenciais, que ele seria um ex-nazista e que ele seria o líder por trás de movimentos sociais como o Black Lives Matter. A teoria mais recente é a de que ele comanda decisões do governo brasileiro relacionadas à Amazônia.

Este Comprova Explica esclarece sobre a vida e o trabalho de George Soros, assim como os investimentos que o bilionário faz em organizações e causas diversas.

Quem é George Soros

Bilionário de 92 anos, Soros nasceu em 1930 em Budapeste, capital da Hungria. De família judia, sobreviveu à ocupação nazista no seu país de origem. Aos 17 anos, mudou-se para a Inglaterra, onde fez faculdade e, depois, pós-graduação, na London School of Economics.

Emigrou para os Estados Unidos em 1956 e, em 1970, criou um fundo de investimentos que ficou conhecido por suas especulações de curto prazo no mercado financeiro. O fundo de investimentos fez de Soros um dos homens mais ricos do mundo. Ele figura atualmente na lista dos bilionários da Forbes, com fortuna estimada em US$ 6,7 bilhões.

Soros ficou conhecido em 1992 como o “homem que quebrou o banco da Inglaterra.” Naquele ano, ele apostou contra a libra esterlina, uma das moedas mais importantes do mundo. Ele pegou um empréstimo de US$ 5 bilhões na divisa e vendeu. Depois, recomprou a mesma quantidade da moeda, já desvalorizada, lucrando US$ 1 bilhão com a operação.

Soros é acusado ainda de provocar uma crise financeira na Ásia em 1997 ao vender as moedas tailandesa e malaia, sinalizando ao mercado que elas estariam supervalorizadas. As repercussões da crise tiveram consequências no Brasil.

Foi por conta desse fato que o mecanismo de circuit breaker, que interrompe as negociações na bolsa de valores quando há queda de 10% no índice acionário, foi implementado pela Bovespa (atual B3).

Soros e a Fundação Open Society

O trabalho de filantropia de George Soros é principalmente feito através da Fundação Open Society, criada por ele no fim da década de 1970. Segundo o site da organização, a fundação é “o maior financiador privado do mundo de grupos independentes que trabalham pela justiça, governança democrática e direitos humanos”.

Os primeiros trabalhos da organização consistiam em financiar bolsas de estudo para estudantes negros durante o período do apartheid na África do Sul. Após o fim da Guerra Fria, o trabalho da Open Society foi expandido para outros continentes e chega hoje a 120 países, incluindo o Brasil.

A fundação critica a guerra contra as drogas como “indiscutivelmente mais prejudicial do que o próprio problema das drogas” e ajudou a dar o pontapé no movimento pró-maconha medicinal nos Estados Unidos. No início dos anos 2000, defendeu o casamento entre pessoas do mesmo sexo.

Em 2021, dado mais recente disponível no site da instituição, a Open Society afirma ter investido US$ 1,5 bilhão em causas diversas pelo mundo. Ao todo, diz já ter distribuído US$ 18 bilhões em doações e financiamentos.

Em que empresas e organizações Soros investe

Soros fez fortuna com especulação financeira e muito se fala sobre seus investimentos, mas a maioria de suas ações não está em empresas muito conhecidas, como afirma o Valor Econômico. Entre os megainvestimentos mais recentes do fundo de George Soros estão as empresas Horizon Therapeutics, da área biofarmacêutica, e First Horizon National Corporation, uma holding de bancos, segundo a Reuters. Só do primeiro grupo foram comprados 2,9 milhões de ações, o equivalente a US$ 325,3 milhões em valores atualizados, de fevereiro deste ano.

O documento 13F, protocolado pelo investidor na Securities and Exchange Commission (SEC, o órgão regulador do mercado financeiro norte-americano), mostra os investimentos de Soros em 31 de março deste ano. Uma das empresas onde ele mais tem ações é a montadora de veículos elétricos Rivian Automotive, conhecida por fornecer vans elétricas à Amazon.

Em alguns conteúdos de desinformação, seu nome aparece ligado à Petrobras, mas, como o Comprova já verificou, afirmar que ele tem controle sobre a companhia é enganoso. De fato, Soros possuía ações da Petrobras, mas ele as vendeu e não tem mais nenhuma desde 2016.

Com sua rede internacional de filantropia, Soros é um dos principais financiadores do Partido Democrata norte-americano. Nas eleições de 2022, ele transferiu de sua fortuna pessoal US$ 170 milhões para candidatos democratas, segundo apurou o jornal estadunidense CNBC através do imposto de renda do magnata. De acordo com a mesma publicação, ele fez outras doações para organizações não-governamentais que promovem o cadastramento de eleitores, principalmente oriundos de minorias, para as eleições, o que é uma bandeira do partido Democrata. No Brasil, apoia projetos como a Agência Pública e o Instituto Sou da Paz. No site da organização, é possível acessar a lista completa de instituições e iniciativas beneficiadas com doações.

As teorias conspiracionistas associadas a Soros

O bilionário tem o nome frequentemente associado a teorias conspiracionistas em todo o mundo, principalmente promovidas pela extrema-direita e, em geral, de cunho antissemita. Soros já foi acusado incorretamente de promover a “crise” migratória na Europa e nos Estados Unidos, de ser um ex-combatente nazista e de participar de grupos como os Maçons e os Illuminati.

No Brasil, circulou um boato de que Soros financiaria o Psol. A peça de desinformação foi compartilhada pelo ex-ministro Ciro Gomes (PDT), na época candidato à presidência, durante um debate em 2022. Após decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Ciro foi obrigado a apagar o vídeo em que ele fazia tal afirmação.

Em 2018, também durante a campanha presidencial, circulou a informação falsa de que Soros estaria financiando o movimento #EleNão, contrário ao então candidato Jair Bolsonaro (PL), através da Mídia Ninja. O Comprova demonstrou que a informação era falsa.

Em maio deste ano, Soros foi atacado por Elon Musk dias depois de vender sua participação na Tesla. Musk comparou Soros ao vilão Magneto (da Marvel), que sobreviveu ao Holocausto, segundo os quadrinhos. “Ele quer corroer o próprio tecido da civilização. Soros odeia a humanidade”, respondeu Musk a um usuário no Twitter.

Pontos de atenção

Pesquisadora na área de desinformação e doutora em Comunicação, a professora da Unisinos Taís Seibt explica que é uma característica de algumas teorias conspiracionistas mencionar supostos planos secretos financiados por pessoas com muito dinheiro.

No caso de Soros, assim como o de Bill Gates, a execução do projeto “secreto” seria possível porque eles são bilionários. “As duas figuras representam esse poder econômico que seria capaz, usando um termo bem conspiratório, de comprar o sistema para ter o resultado que quiserem”, diz ela. Durante sua campanha presidencial em 2016, Donald Trump e seus apoiadores denunciaram múltiplas vezes o “globalismo”, suposta união sombria entre poderosos, imprensa, bancos e governos contra o povo e em proveito próprio.

Seibt esclarece que um dos perigos das teorias conspiratórias é que elas mexem com paixões e sensações, como o medo de alguma ameaça desconhecida. “Elas trazem uma questão polarizada, que faz com que os conteúdos sejam impulsionados nas redes sociais dentro das chamadas bolhas. Quanto mais se frequenta aquele espaço, mais vão sendo recomendados conteúdos daquele tipo, fazendo com que haja, além da viralização, uma reverberação que acaba fortalecendo grupos mais afeitos a certos pensamentos.”

Uma dica da pesquisadora para não cair em teorias conspiratórias é desconfiar de conteúdos muito alarmistas. “Há uma armadilha aqui, porque essas teorias se apoiam em descredibilizar a imprensa e as instituições, dizendo que tem algo acontecendo e não estão mostrando isso. Mas comece por aí: se a publicação vai por esse caminho, de que a imprensa manipula, desconfie”, orienta.

Como verificamos: Buscamos em sites da imprensa profissional do Brasil e do exterior a respeito da vida e da trajetória de George Soros. Também buscamos informações no site do empresário e da fundação criada por ele. Entrevistamos ainda a doutora em Comunicação Taís Seibt, que é pesquisadora na agência Fiquem Sabendo.

Por que explicamos: George Soros está constantemente no centro de teorias conspiratórias, notadamente divulgadas por grupos de extrema direita e com características antissemitas. O desconhecimento sobre a vida e a atuação de Soros e da Fundação Open Society leva a falsos julgamentos, e, independentemente do que a pessoa acredita, as opiniões devem ser emitidas com base em informações corretas, e não em desinformação.

Outras checagens sobre o tema: O Comprova já fez checagens diversas relacionadas ao nome de George Soros. Uma delas desmentiu que o bilionário fosse responsável por financiar o movimento #EleNão, contra a eleição do ex-presidente Jair Bolsonaro em 2018, e que tenha conspirado com outros candidatos para derrubá-lo da corrida eleitoral. Soros também não emprega o ex-presidente do Partido Novo, João Amoêdo, nem é acionista majoritário da Petrobras.

Saúde

Investigado por: 2023-06-02

Vacinas contra a covid-19 não foram proibidas, ao contrário do que diz post

  • Falso
Falso
Não é verdade que o Ministério da Saúde tenha proibido a aplicação de vacinas contra a covid-19 nem que tenha alertado sobre perigos envolvendo-as. Posts usam trecho de vídeo em que o jornalista Alexandre Garcia faz tais afirmações, mas o órgão apenas alterou a indicação da Astrazeneca para pessoas a partir dos 40 anos. A mudança foi por conta de novas evidências científicas que relacionam o imunizante a casos raros de trombose. Em nenhum momento o ministério parou de recomendar que as pessoas se vacinem – pelo contrário, em seus comunicados, a entidade sempre reforça a segurança e eficácia das vacinas.

Conteúdo investigado: Vídeo que alega que as vacinas foram proibidas. A gravação mostra Alexandre Garcia afirmando que somente agora o Ministério da Saúde estaria avisando sobre riscos de trombose decorrentes das vacinas da Janssen e Astrazeneca e que esta última teria tido a produção suspensa no Brasil. Sobre o vídeo foi colocada a mensagem alarmista: “Proibiram as vacinas, e agora? E quem já tomou?”.

Onde foi publicado: TikTok e Kwai.

Conclusão do Comprova: É falso post com um trecho de vídeo em que o jornalista Alexandre Garcia afirma que o Ministério da Saúde “está avisando agora que há perigo de trombose em vacinas Janssen e Astrazeneca” e que a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) parou de produzir esta última. Uma das publicações que circula com a gravação usa a legenda “Proibiram as vacinas agora? E quem já tomou?”. Nem mesmo Garcia fala sobre uma suposta “proibição”, como fez o autor do post.

O jornalista tira informação de contexto ao dizer que o ministério alertou tardiamente sobre o “perigo” de os imunizantes causarem trombose. O órgão sempre defendeu o uso das vacinas e nunca as relacionou com “perigo”. O que ocorreu foi que, já em abril de 2021 – e não agora –, o ministério publicou nota técnica sobre possíveis casos de Síndrome de Trombose e Trombocitopenia (STT) associados à vacina. Mais recentemente, em dezembro do ano passado, considerando raros casos da doença no exterior, o Ministério da Saúde alterou a recomendação da Astrazeneca, produzida pela Fiocruz, e da Janssen, passando a indicá-las para pessoas a partir dos 40 anos. De acordo com o documento, a incidência de ocorrência da STT é bastante variável entre os diferentes países, com estimativas entre 0,2 até 3,8 casos por 100 mil doses aplicadas

A mudança não significa que a vacina não seja segura, o que o órgão reforçou em nota de abril deste ano, em que garante a segurança e eficácia da Astrazeneca e destaca que ela foi aprovada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e pela Organização Mundial da Saúde (OMS).

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma falsidade.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Um usuário do TikTok que compartilhou o vídeo no dia 29 de maio obteve, em 24 horas, 18,7 mil curtidas e 16,7 mil compartilhamentos. No Kwai, não há publicações recentes do vídeo, mas uma delas, feita no dia 14 de abril, tinha sido assistida, até 2 de junho, 91,5 mil vezes.

Como verificamos: O Comprova fez uma busca no Google por informações sobre a suposta proibição das vacinas e encontrou uma nota da Anvisa explicando que nenhum dos imunizantes aprovados pela agência teve o uso desautorizado.

Por meio das Notas Técnicas e Boletins Epidemiológicos emitidos pelo Ministério da Saúde checamos as informações sobre eventos supostamente atribuídos às vacinas.

Também consultamos matérias que saíram em veículos de imprensa profissional e em agências de checagem sobre a mudança da recomendação do uso das vacinas Astrazeneca e Janssen.

Verificação

 

O vídeo

Conteúdos semelhantes ao investigado aqui já haviam circulado em abril. Os posts de agora usam trecho de um vídeo publicado no canal do YouTube de Alexandre Garcia no dia 13 de abril, quando o Ministério da Saúde publicou recomendação garantindo a segurança e eficácia da Astrazeneca e reforçando que ela foi aprovada pela Anvisa e pela OMS.

Intitulado “Lula não sabe por que dólar é moeda padrão”, o vídeo, de 14 minutos e 16 segundos, trata de outros assuntos, como economia, Bolsa Família e o julgamento de André do Rap. A partir de 12 minutos e 17 segundos, desinforma sobre as vacinas contra a covid.

Vacinas não foram proibidas

A Anvisa explicou em nota, publicada no dia 13 de abril, que nenhuma das vacinas contra a covid-19 aprovadas pela autarquia foi proibida ou desautorizada.

O documento informa que a agência é “responsável por analisar os pedidos apresentados pelas empresas farmacêuticas a fim de verificar se os dados e informações técnicas garantem a eficácia, segurança e qualidade das vacinas”.

A Anvisa aprovou os imunizantes produzidos pela Pfizer, Butantan, Janssen e Fiocruz/AstraZeneca e concedeu autorização para exportação excepcional do imunizante da Sputnik. Ou seja, a mensagem inserida no vídeo (“Proibiram as vacinas, e agora? E quem já tomou?”) não é verdadeira.

A Fiocruz não parou de produzir as vacinas

No dia 14 de abril, a Fiocruz, responsável pela produção do imunizante da Astrazeneca no país, emitiu uma nota explicando que a fabricação não tinha sido paralisada, que a vacina é segura e eficaz e que os “possíveis efeitos adversos graves, como a síndrome de trombose com trombocitopenia, são extremamente raros”.

De acordo com Boletim Epidemiológico, publicado pelo Ministério da Saúde, do dia 18 de janeiro de 2021 a 18 de junho de 2022 foram registrados 16 óbitos decorrentes de Eventos Supostamente Atribuíveis à Vacinação ou Imunização (ESAVI) cuja causa foi a vacina aplicada (12 pela Astrazeneca/Fiocruz e 4 pela Janssen). “Ressalta-se que os 16 óbitos com relação causal confirmada correspondem a 1 caso a cada 20 milhões de doses aplicadas”, explica o documento.

Mesmo com o registro desses casos raros, a Anvisa manteve a recomendação da continuidade da vacinação com as vacinas da Astrazeneca e da Janssen, por compreender que os benefícios dos produtos superam seus riscos.

Houve, porém, em dezembro de 2022, uma sugestão do Ministério da Saúde para que tais imunizantes fossem aplicados preferencialmente em pessoas acima de 40 anos.

Ministério da Saúde acompanha casos adversos de pós-vacina

No vídeo alvo desta checagem, Alexandre Garcia acusa o Ministério da Saúde de estar avisando somente agora (referindo-se a abril de 2023) que as vacinas supostamente causaram trombose. Isso não é verdade. Pelo menos desde abril de 2021, o Ministério da Saúde orienta sobre a identificação, investigação e manejo da Síndrome de Trombose e Trombocitopenia (TTS) no contexto da vacinação contra a covid-19 no Brasil.

Em 22 de abril de 2021, a pasta emitiu a Nota Técnica nº 441/2021 sobre o assunto. As recomendações foram atualizadas em 4 de agosto de 2021 com a publicação da Nota Técnica nº 933.

Mais recentemente, em 31 de dezembro de 2022, considerando os raros eventos em países da Europa e na Austrália e nos Estados Unidos da TTS após a vacinação, o Ministério da Saúde atualizou as recomendações de uso da Astrazeneca e Janssen. As duas são fabricadas a partir de uma tecnologia conhecida como vetor viral e, de acordo com o documento, o indicado seria que elas fossem aplicadas para uma determinada faixa etária.

No item 3.7 da nota está escrito: “As vacinas de vetor viral estão indicadas para uso na população a partir de 40 anos de idade e; em pessoas de 18 a 39 anos de idade, devem ser administradas preferencialmente vacinas COVID-19 da plataforma de RNAm, entretanto, nos locais de difícil acesso ou na indisponibilidade do imunizante dessa plataforma, poderão ser utilizadas as vacinas de vetor viral (Astrazeneca e Janssen)”.

Ainda sobre os monitoramentos feitos pelo Ministério da Saúde, cabe destacar que em fevereiro de 2021, a Anvisa, órgão responsável por monitorar os eventos relacionados ao uso das vacinas e medicamentos, publicou o painel de Farmacovigilância sobre eventos adversos. Os Eventos Supostamente Atribuíveis à Vacinação ou Imunização (ESAVI) são monitorados pelo Programa Nacional de Imunizações (PNI). O sistema de informação utilizado pelo PNI para o monitoramento de eventos pós-vacinação é o e-SUS notifica.

Vacinas não são experimentais

Alexandre Garcia diz que as vacinas contra covid-19 estavam em teste quando foram aplicadas na população. Alegações semelhantes que buscavam disseminar medo sobre os imunizantes foram frequentemente desmentidas ao longo da pandemia.

Em agosto de 2021, por exemplo, o Comprova mostrou que uma médica enganava ao dizer que vacinas contra covid eram experimentais. A matéria explica que todas as substâncias utilizadas no Brasil foram autorizadas pela Anvisa após terem eficácia e segurança comprovadas ao serem aplicadas em milhares de voluntários durante os testes.

As vacinas usadas para combater o coronavírus passaram por todas as etapas de testes necessárias.

O que diz o responsável pela publicação: Não foi possível conversar com o responsável pela publicação, porque o conteúdo alvo desta checagem foi postado no TikTok e Kwai por usuários que não permitem o envio de mensagem privada de quem eles não eram seguidores. A reportagem tentou contato, via Instagram, com Alexandre Garcia, mas não houve resposta até a publicação deste texto.

O que podemos aprender com esta verificação: Uma das táticas dos desinformadores é se comunicar de forma alarmista para chamar a atenção de quem os vê. E é isso o que fazem os autores dos posts ao acrescentarem sobre o vídeo, que em si já era enganoso, a afirmação de que as vacinas foram proibidas. Eles sugerem que os imunizantes poderiam causar problemas de saúde ao disseminar o medo.

Ao se deparar com conteúdos assim, reflita. Órgãos de saúde do mundo todo recomendam os imunizantes; após o início da campanha, os casos de óbitos começaram a cair e foi graças à vacinação que a OMS pôde declarar o fim da emergência de saúde da pandemia. Considerando isso, fazem sentido conteúdos antivacina?

Também é importante buscar em sites da imprensa profissional reportagens sobre o assunto. Ao pesquisar, seria possível perceber se tratar de desinformação, já que o Ministério da Saúde defende a vacina, garantindo sua segurança e eficácia.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: O Comprova publicou na seção Comprova Explica uma reportagem em que detalha a nota do Ministério da Saúde e o motivo pelo qual a recomendação de uso da vacina Astrazeneca ter mudado. A Lupa mostrou que, desde 2021, a pasta acompanha supostos casos de trombose em pessoas que tomaram as vacinas da Janssen e Astrazeneca. O UOL Confere mostrou que é falso que a Fiocruz tenha parado de produzir o imunizante.

Política

Investigado por: 2023-06-02

Fila de pacientes em unidade de saúde em Natal não tem relação com Bolsa Família

  • Enganoso
Enganoso
É enganoso post que associa imagens de pessoas enfileiradas na rua a um suposto cancelamento do Auxílio Brasil pelo governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O vídeo mostra pacientes aguardando atendimento em uma Unidade Básica de Saúde (UBS) administrada pela prefeitura de Natal (RN), não pelo governo federal. A fila não tem relação com o benefício social.

Conteúdo investigado: Vídeo de pessoas em uma fila na calçada acompanhado da seguinte frase: “Que maldade que o governo Lula está fazendo, deixando o povo em grandes filas pegando sol e cancelando o Auxílio Brasil. Você acha que o governo está agindo correto (sic) com a população?”

Onde foi publicado: Telegram e Twitter.

Conclusão do Comprova: É enganoso o post que associa imagens de uma fila na rua ao governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e ao cancelamento de programa social. A publicação, que tira vídeo de contexto, cita que a atual administração federal estaria “deixando o povo em grandes filas pegando sol e cancelando o Auxílio Brasil”.

O vídeo original, gravado em maio deste ano e exibido pela Inter TV, afiliada da Rede Globo no Rio Grande do Norte, mostra pacientes aguardando atendimento em uma Unidade Básica de Saúde (UBS) da cidade de Natal, capital potiguar. A fila foi gerada pela demora na emissão de senhas e, segundo nota da prefeitura enviada ao telejornal, por uma redução no número de médicos em atuação naquele dia na unidade. O espaço é de responsabilidade do município — administrado por Álvaro Dias (Republicanos) —, não da União.

O atual governo de fato bloqueou o pagamento do Bolsa Família (que substitui o Auxílio Brasil) de parte dos beneficiários por indícios de irregularidades e provocou filas ao exigir o recadastramento de outra parte. Mas isso não tem relação com a fila registrada em frente à UBS, como sugere o post enganoso.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Até o dia 1º de junho, o post no Twitter acumulava 159,5 mil visualizações, 4,4 mil curtidas, mais de 900 compartilhamentos e 179 comentários.

Como verificamos: Primeiramente, buscamos pistas no próprio vídeo. Nas imagens, é possível ler nos letreiros instalados na fachada do prédio que se trata de uma UBS. Como recentemente houve uma greve na cidade de Natal, buscamos por imagens de unidades de saúde da capital potiguar e encontramos uma edificação compatível.

| Print do vídeo usado no post enganoso / Print do Google Maps da fachada da UBS Bela Vista, em Natal

Ao identificar a UBS em frente à qual o vídeo foi gravado, procuramos no Google por denúncias de problemas no local, envolvendo fila ou demora no atendimento. A pesquisa retornou reportagens jornalísticas, sendo que uma delas usava, no contexto original, o vídeo que ganhou outro sentido no post enganoso. Fizemos contato com a emissora para obter mais informações sobre a origem das imagens.

Também pesquisamos por palavras-chave no Google como “Auxílio Brasil”, “Bolsa Família” e “governo Lula”.

Enviamos questionamentos à Secretaria Municipal de Saúde (SMS) de Natal, onde fica a UBS, e ao Ministério do Desenvolvimento Social (MDS). Por fim, contatamos o perfil no Twitter que fez a publicação enganosa.

Vídeo foi gravado em frente a UBS

A fila na calçada que aparece no post enganoso foi registrada na manhã de 18 de maio em frente à UBS Bela Vista, no bairro de Igapó, zona norte de Natal. A gestão do espaço é feita pela prefeitura, comandada por Álvaro Dias (Republicanos). As imagens foram exibidas pelo telejornal RN TV 1ª Edição, da Inter TV RN, afiliada da Rede Globo no Rio Grande do Norte.

O programa informa ter recebido diversos vídeos de pacientes que reclamavam da demora no atendimento no local. Neles, moradores relatam que chegaram à unidade de madrugada e que o posto informou que as fichas para atendimento seriam distribuídas somente a partir das 9 horas. “Todos os postos de saúde entregam às 7 horas, menos aqui”, reclama uma senhora. “Muitos idosos, teve uma que já passou mal e foi para casa. E aí?”, questiona outra. A demora para o início da distribuição das fichas fez com que uma longa fila se formasse.

Quando, finalmente, as senhas foram entregues, parte do grupo que aguardava ficou sem atendimento. Ao RN TV, a Secretaria Municipal de Saúde de Natal informou que a escala médica desta unidade é composta por três médicos clínicos, um pediatra e um ginecologista, mas que um clínico estava de licença em virtude de uma cirurgia e, por isso, houve redução de atendimentos médicos.

Ainda ao RN TV, a SMS informou, na ocasião, que foram realizadas 150 marcações de consultas e acrescentou que ainda existem 59 UBSs na capital potiguar, onde os usuários podem procurar atendimento sem a necessidade de chegar antes do horário de funcionamento, que se inicia às 8 horas.

Bolsa Família: cancelamento e recadastramento

O post enganoso também cita o cancelamento do Auxílio Brasil. O benefício social, que no atual governo voltou a se chamar Bolsa Família, concede valor mínimo de R$ 600 a famílias de baixa renda. De fato, o governo Lula cancelou o pagamento da bolsa a parte dos beneficiários por indícios de irregularidades. Conforme disse o ministro do Desenvolvimento e Assistência Social, Wellington Dias, em março deste ano, 1,4 milhão de famílias foram excluídas do programa. Em contrapartida, outras 700 mil famílias foram incluídas.

Em abril, por suspeita de fraude, houve bloqueio do Bolsa Família para 1,2 milhão de “famílias de uma pessoa só”, o que provocou longas filas nos postos de atendimento de prefeituras. O aumento na procura por recadastramento após a suspensão foi registrado em capitais como Rio de Janeiro e Salvador. O grupo tinha 60 dias para demonstrar que, de fato, atendia os requisitos para acessar o benefício.

O objetivo da medida é combater fraudes e conceder a bolsa a quem realmente precisa, de acordo com o governo. Em maio deste ano, segundo dados do governo, 21,2 milhões de famílias foram beneficiadas.

O Bolsa Família é voltado para pessoas em situação de vulnerabilidade econômica e social. Para serem contempladas, elas precisam apresentar renda classificada como situação de pobreza ou de extrema pobreza. Com a nova legislação, têm acesso ao programa as famílias com renda de até R$ 218 por pessoa. Os dados precisam estar atualizados junto ao Cadastro Único (CADÚnico).

A seleção considera a estimativa de pobreza, a quantidade de famílias atendidas em cada município e o limite orçamentário.

Bolsa Família e UBS

Segundo as regras do Bolsa Família, alguns beneficiários devem comparecer duas vezes ao ano, sendo uma a cada semestre, às UBSs de seus municípios para comprovar ao governo federal que fazem o acompanhamento de saúde. No entanto, essa necessidade atinge apenas as pessoas grávidas, puérperas e crianças menores de 7 anos.

A ida à UBS consiste em realizar o monitoramento da situação vacinal das crianças e a medição de peso e altura, além do pré-natal das gestantes. Cada município deve nomear um responsável técnico pelo programa Bolsa Família na secretaria de saúde municipal. Ele deve acessar uma plataforma online e verificar quais famílias beneficiadas precisam do acompanhamento de saúde e se ele está sendo realizado.

Há risco de perder o benefício em caso de não realização do acompanhamento. Em abril, uma portaria do governo federal definiu que a repercussão pelo acompanhamento das condicionalidades será retomada a partir de julho, com aplicação de advertência aos beneficiários que descumprirem qualquer critério. Neste caso, o benefício ainda é mantido, mas trata-se de um sinal de alerta.

Regra semelhante existe na educação, em que é necessário ter frequência escolar mensal mínima de 60% para os beneficiários de 4 a 6 anos incompletos de idade; e frequência escolar mensal mínima de 75% para os beneficiários de 6 a 18 anos incompletos que não tenham concluído a educação básica.

O que diz o responsável pela publicação: O Comprova entrou em contato pelo Twitter com a conta @mspbra, responsável pelo post verificado. Na bio, o perfil se apresenta como um espaço de “notícias, humor, paródia, ironia e sátira”. Não houve retorno até a publicação desta checagem.

O que podemos aprender com esta verificação: Ao se deparar com uma publicação que usa imagens sem mencionar data, local, ou mesmo crédito, desconfie. Olhe o vídeo com atenção e busque pistas que ajudem na contextualização. Neste caso, o letreiro, por exemplo, e a própria estrutura do prédio, indicava se tratar de uma unidade de saúde.

Antes de compartilhar um post, pesquise sobre o tema abordado e procure fazer questionamentos. Em relação à publicação em questão, houve mesmo cancelamento de auxílio? Quando, em qual contexto e por qual motivo? Esse cancelamento tem gerado filas? Qual a eventual relação do benefício social com uma UBS? Notícias provavelmente o ajudarão a compreender o cenário.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: O Comprova já desmentiu outras peças de desinformação envolvendo Lula. Recentemente, mostrou ser falso que ele tenha reconduzido Nestor Cerveró a cargo na Petrobras e que o petista esteja implementando banheiros unissex no país.

Política

Investigado por: 2023-06-01

É falso que Biden tenha convocado Congresso por falas de Lula em apoio à Venezuela

  • Falso
Falso
É falso que o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, tenha convocado o Congresso para discutir sanções ao Brasil após falas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em apoio à Venezuela. Até o momento, não há nenhum registro de um posicionamento oficial da Casa Branca em relação às declarações do petista.

Conteúdo investigado: Postagens segundo as quais o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, convocou o Congresso para impor sanções ao Brasil após as declarações do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sobre a situação da Venezuela.

Onde foi publicado: TikTok.

Conclusão do Comprova: É falso que o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, tenha convocado o Congresso para discutir a imposição de sanções ao Brasil após as falas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sobre o cenário político venezuelano.

Nesta segunda-feira (29), Lula recebeu o presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, no Palácio do Planalto. Em um pronunciamento, Lula disse que o autoritarismo no país vizinho seria apenas uma “narrativa” e atribuiu os problemas socioeconômicos da Venezuela apenas às sanções impostas pelos Estados Unidos, cuja existência seria “inexplicável”, segundo ele.

“É culpa dos Estados Unidos, que fizeram um bloqueio extremamente exagerado. Eu sempre acho que bloqueio é pior do que a guerra, porque a guerra mata soldados em batalha. O bloqueio mata crianças, mulheres, pessoas que não têm nada a ver com a disputa ideológica em jogo”, afirmou Lula.

Os comentários do brasileiro foram rebatidos pelos presidentes do Uruguai e do Chile, mas não há no noticiário, seja no Brasil ou nos Estados Unidos, qualquer registro de um posicionamento oficial da Casa Branca ou do Congresso norte-americano em relação às declarações de Lula.

Se houvesse, este seria um fato de extrema importância e estaria estampado nos noticiários tanto do Brasil quanto dos Estados Unidos, o que não é o caso. Um dos vídeos investigados chega a inventar uma declaração de Biden, segundo a qual ele teria dito que “não perdoaria” as declarações de Lula. Não há nenhum registro dessa suposta afirmação.

O Comprova entrou em contato com a Embaixada dos Estados Unidos no Brasil, mas não obteve resposta até o encerramento desta verificação.

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e tenha sido divulgado de modo deliberado para espalhar uma falsidade.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Até o dia 1º de junho, os vídeos publicados no TikTok já somavam mais de 500 mil visualizações e 22 mil curtidas.

Como verificamos: Primeiramente, buscamos notícias sobre o discurso de Lula após o encontro com Maduro no Palácio do Planalto, em Brasília. A pesquisa retornou reportagens que noticiaram o evento e as declarações feitas pelo presidente brasileiro em relação às sanções internacionais ao regime ditatorial do país vizinho.

Em sequência, entramos em contato com a Embaixada dos Estados Unidos no Brasil e buscamos o posicionamento da Casa Branca sobre as falas de Lula. Por meio das palavras-chave “Biden”, “Congresso”, “Brasil” e “Venezuela”, pesquisamos por notícias que informassem uma suposta convocação do Congresso norte-americano para impor sanções ao Brasil. A pesquisa também foi feita inglês, com intuito de buscar informações em noticiários locais. No entanto, não encontramos nenhum registro em veículos de imprensa nacionais e/ou internacionais.

Declarações de Lula sobre a Venezuela

Nicolás Maduro chegou ao Brasil na noite de domingo (28) para participar da cúpula dos países sul-americanos, realizada nesta terça-feira (30), em Brasília. Maduro não vinha ao Brasil desde 2015, quando a presidente era Dilma Rousseff (PT).

Na segunda-feira (29), Lula recebeu Maduro no Palácio do Planalto, onde tiveram uma reunião privada. Em sequência, os líderes realizaram um encontro ampliado com membros da comitiva venezuelana e do governo brasileiro. Em discurso, o petista condenou as sanções contra o país vizinho e afirmou que a Venezuela precisa divulgar sua própria “narrativa” como contraponto ao que ele chamou de “narrativas” construídas por opositores no cenário internacional.

Lula ainda disse que os “adversários” terão que “pedir desculpa pelo estrago que fizeram na Venezuela”. O chefe do Executivo também criticou o preconceito contra o país vizinho e afirmou que o distanciamento entre as duas nações ocorreu por “ignorância, contingências políticas e equívocos”.

Durante a reunião, Maduro reclamou de perseguição e afirmou que o país sofreu ameaças de invasão militar dos Estados Unidos. O chavista também disse que pediria aos demais presidentes sul-americanos “a suspensão de todas as sanções e todas as medidas coercitivas contra a Venezuela e contra os países que sofrem esse tipo de sanção” no continente.

Sanções ao governo de Nicolás Maduro

Em 2017, o governo dos Estados Unidos impôs sanções econômicas diretas contra Maduro, entre elas o congelamento de ativos sob jurisdição americana. A medida foi anunciada pelo Departamento do Tesouro dos Estados Unidos um dia após a eleição da Assembleia Nacional Constituinte na Venezuela. Já em 2018, o Departamento anunciou novas sanções contra a cúpula do regime chavista. A punição incluía Cilia Flores, primeira-dama do país, e a vice-presidente Delcy Rodríguez.

Desde que Biden assumiu a presidência do país, Washington vem sinalizando uma possibilidade de reaproximação com a Venezuela em troca de uma abertura democrática. Em maio deste ano, em entrevista exclusiva ao Estadão, o secretário do Departamento de Estado, Brian A. Nichols, afirmou que a Casa Branca está disposta a rever a política de sanções se o chavista normalizar o processo eleitoral no país.

Em 2022, os Estados Unidos retiraram parcialmente sanções ao país latino-americano para promover um diálogo político. O governo norte-americano voltou a permitir, por exemplo, que a petroleira americana Chevron negociasse com a estatal venezuelana PDVSA. De acordo com a imprensa local, os Estados Unidos também afirmaram que iriam retirar de sua lista de sanções Carlos Erik Malpica Flores, sobrinho da primeira-dama da Venezuela e ex-funcionário do alto escalão da PDVSA.

O que diz o responsável pela publicação: O Comprova entrou em contato com o perfil @isac.faris por meio do Instagram no dia 31 de maio. Até a conclusão desta checagem, não recebeu retorno.

O que podemos aprender com esta verificação: A peça de desinformação utiliza um fato recente e amplamente noticiado – o encontro de Lula com Nicolás Maduro – para inventar uma alegação alarmante e sem base factual.

Sempre desconfie quando o responsável pela autoria do conteúdo fizer uma acusação sem citar fontes. Faça uma busca no Google por palavras-chave relacionadas ao tema e procure resultados em veículos de comunicação profissionais. Se o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, realmente tivesse convocado o Congresso para discutir sanções ao Brasil, a informação certamente seria destacada em diversos jornais do país.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: Em 2022, o Comprova checou uma suposta notícia do G1 sobre uma fala de Lula em apoio à Venezuela durante a campanha presidencial.

Recentemente, também verificou conteúdos falsos relacionados ao presidente da República, como o boato de que Lula reconduziu Nestor Cerveró ao cargo que ocupava na diretoria da Petrobras e o suposto projeto do governo federal para implementação de banheiros unissex no país.

Política

Investigado por: 2023-05-30

É falso que Lula tenha reconduzido Nestor Cerveró a cargo na Petrobras

  • Falso
Falso
É falso que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tenha reconduzido o ex-diretor da Área Internacional da Petrobras Nestor Cerveró ao mesmo posto na empresa. O cargo em questão foi extinto em 2014, e a petroleira negou que haja qualquer vínculo de Cerveró com a estatal atualmente.

Conteúdo investigado: Publicações afirmam que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), em seu terceiro mandato, reconduziu Nestor Cerveró ao cargo que ocupava na diretoria da Petrobras, na Área Internacional da estatal.

Onde foi publicado: Twitter e Telegram.

Conclusão do Comprova: É falso que o engenheiro químico Nestor Cuñat Cerveró, 71 anos, tenha sido reconduzido ao cargo de diretor da Área Internacional da Petrobras pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Isso não seria possível a começar pelo fato de que o cargo que ele ocupava foi extinto do quadro da estatal.

Além de condenado em 2016 pela Justiça Federal em segunda instância, Cerveró também foi responsabilizado pelo Tribunal de Contas da União (TCU), no ano seguinte, pela compra da refinaria de Pasadena, nos Estados Unidos, pela Petrobras em 2006, o que o impede de exercer cargo público em comissão por oito anos.

Em 14 de maio, o colunista Lauro Jardim, do jornal O Globo informou que o advogado e ex-sócio de Cerveró em uma empresa offshore, Marcelo de Oliveira Mello, foi nomeado para chefiar o departamento jurídico da Petrobras. A matéria não diz nada, no entanto, a respeito da suposta nomeação de Cerveró para a petroleira.

A Petrobras, em nota ao Comprova, informou que Nestor Cerveró não possui vínculo com a empresa.

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma falsidade.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Até 29 de maio, a publicação no Twitter tinha 376 compartilhamentos, 2,5 mil curtidas e 117 mil visualizações. No Telegram, até esta mesma data, o conteúdo havia sido visualizado 7,1 mil vezes.

Como verificamos: O primeiro passo foi pesquisar na imprensa notícias sobre a indicação de Nestor Cerveró à Petrobras e, depois, sobre a composição atual da diretoria da empresa e o modelo de contratação dos diretores. Também pesquisamos qual a relação de Cerveró com a empresa, quais cargos assumiu, como foi sua carreira e como se deu a saída da estatal.

Contatamos a Petrobras para saber se Cerveró faz parte do quadro de diretores ou foi indicado recentemente para compor a diretoria. Também questionamos qual seria o atual envolvimento dele com a empresa.

O Supremo Tribunal Federal (STF) e a Justiça Federal do Paraná também foram contatados sobre a situação dos processos a que ele responde em decorrência da Operação Lava Jato. O Comprova ainda buscou a defesa do ex-diretor da Petrobras para esclarecer a atual situação jurídica de Cerveró. Entretanto, não obteve retorno até a publicação desta checagem.

Diretoria foi extinta em 2014

Em decorrência dos casos de corrupção investigados a partir de 2014 na Operação Lava Jato, a Petrobras realizou uma mudança no organograma da empresa e extinguiu a então diretoria da Área Internacional, substituindo-a, em novembro daquele ano, pela diretoria de Governança, Risco e Conformidade. O primeiro diretor nomeado foi João Adalberto Elek Júnior, em janeiro de 2015, após um processo seletivo conduzido pela empresa Korn Ferry. Hoje, o posto é ocupado por Mário Spinelli.

Em 2020, o Conselho Administrativo da Petrobras aprovou outra alteração no organograma, com a criação da diretoria de Logística e a extinção da diretoria de Assuntos Corporativos, que teve suas atividades realocadas para outras diretorias da empresa. Neste ano, em abril, uma nova mudança organizacional foi aprovada, mas manteve o quantitativo de oito diretorias, além da presidência.

Atualmente, o corpo diretivo da Petrobras é composto por:

  • Jean Paul Terra Prates – Presidente;
  • Carlos José do Nascimento Travassos – Diretor Executivo de Engenharia, Tecnologia e Inovação;
  • Clarice Coppetti – Diretora Executiva de Assuntos Corporativos;
  • Claudio Romeo Schlosser – Diretor Executivo de Logística, Comercialização e Mercados;
  • Joelson Falcão Mendes – Diretor Executivo de Exploração e Produção;
  • Mário Spinelli – Diretor Executivo de Governança e Conformidade;
  • Mauricio Tolmasquim – Diretor Executivo de Transição Energética e Sustentabilidade;
  • Sergio Caetano Leite – Diretor Executivo Financeiro e de Relacionamento com Investidores; e
  • William França da Silva – Diretor Executivo de Processos Industriais e Produtos.

Além disso, a diretoria da Petrobras é formada em um processo de eleição definido pelo Conselho de Administração da companhia. O Conselho é formado atualmente por 11 membros eleitos em Assembleia Geral de Acionistas para um mandato de até dois anos, admitidas três reeleições consecutivas. Seis dos membros são indicados pelo acionista controlador (governo federal), quatro pelos acionistas minoritários e um eleito pelos empregados.

Entre os membros da Diretoria Executiva, somente o presidente da companhia pode integrar o Conselho de Administração. No entanto, o presidente, atualmente Jean Paul Prates, não pode exercer a presidência do Conselho, comandada por Pietro Adamo Sampaio Mendes. É possível, porém, que se tenha indicações políticas para a composição da diretoria, mesmo que seja necessária a aprovação do Conselho para o exercício do cargo.

Quem é Nestor Cerveró

Nestor Cuñat Cerveró, de 71 anos, é um engenheiro químico que atuou como diretor da Área Internacional na Petrobras entre 2003 e 2008. Ele era funcionário de carreira da petroleira desde 1975.

Ainda em 2008, passou a ser diretor financeiro da BR Distribuidora, que era uma subsidiária da estatal até 2017, quando começou a ser privatizada em um processo finalizado em 2021, passando a se chamar Vibra Energia. Cerveró esteve no cargo indicado pelo então presidente Lula e permaneceu até 2014.

O ex-diretor se tornou conhecido ao virar alvo das investigações da Operação Lava Jato, com o objetivo de desvendar casos de corrupção envolvendo a Petrobras, que culminou em sua exoneração do cargo na BR Distribuidora. Ele foi preso em janeiro de 2015 assim que pousou no Aeroporto do Galeão, no Rio de Janeiro, ao voltar de Londres (Inglaterra) por suspeita de corrupção e lavagem de dinheiro. Por esses crimes, o ex-diretor foi condenado a cinco anos de prisão em regime fechado meses depois.

Cerveró também é conhecido por ter sido o responsável pelo relatório, em 2006, sobre a compra da refinaria de petróleo de Pasadena, nos Estados Unidos, que gerou prejuízo para a Petrobras. Na época, a estatal pagou US$ 360 milhões por 50% da refinaria, valor muito superior ao que foi pago um ano antes pela belga Astra Oil pela refinaria inteira (US$ 42,5 milhões).

A ex-presidente Dilma Rousseff (PT) era a presidente do Conselho de Administração da Petrobras na ocasião da compra da refinaria e afirmou, em depoimento à Procuradoria-Geral da República (PGR), em 2014, que foi a favor da aquisição por não saber os detalhes do contrato que seria firmado.

Em 2016, Cerveró fechou um acordo de delação premiada em que disse que a ex-presidente teria conhecimento de detalhes da negociação relativas à compra de Pasadena.

Em 2017, o Tribunal de Contas da União condenou o ex-diretor e o ex-presidente da Petrobras José Sérgio Gabrielli pelo envolvimento no negócio que envolveu a refinaria, enquanto Dilma e o Conselho foram inocentados. Cerveró e Gabrielli também ficaram inabilitados de exercer qualquer cargo público em comissão por oito anos.

A delação de Cerveró foi alvo de outras polêmicas, pois houve a acusação de que ele teria sido parte passiva em um processo de obstrução de Justiça, de modo que um grupo teria tentado comprar o seu silêncio. Na denúncia, eram apontados como integrantes desse grupo o presidente Lula e o ex-senador Delcídio do Amaral (PT-MS).

A ação se baseou também em depoimento de Bernardo Cerveró, ator e filho de Nestor, que gravou um encontro com o ex-senador, no qual ele teria lhe prometido ajuda financeira. Eles foram absolvidos no processo em 2018.

Processos

Pelo crime de lavagem de dinheiro, Nestor Cerveró foi condenado à prisão, em regime inicialmente fechado, por cinco anos em decisão do então juiz federal, hoje senador, Sergio Moro (União Brasil-PR), em maio de 2015.

A decisão se refere à compra de um apartamento de luxo no bairro de Ipanema, Rio de Janeiro, para uso próprio, mas em nome de uma empresa, com dinheiro que recebeu como propina da Petrobras. Essa foi a primeira condenação do ex-diretor da empresa estatal, que ficou preso em Curitiba (PR).

Em agosto do mesmo ano, a partir de um processo penal, Cerveró foi condenado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro a 12 anos e 3 meses de prisão, além de ter de devolver R$ 17 milhões à Petrobras. O processo se referia à contratação pela Petrobras da Samsung Heavy Industries para o fornecimento dos navios-sonda para perfuração de águas profundas.

Em junho de 2016, após acordo de delação premiada com o Ministério Público Federal (MPF) e homologado pelo STF, ele passou a cumprir prisão domiciliar na casa da família em Itaipava (RJ), monitorado por tornozeleira eletrônica e sem poder sair do país.

No final daquele ano, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) aumentou a pena de Cerveró para 27 anos e quatro meses de reclusão.

Em 2022, em maio, Cerveró retomou o direito de sair do país. Ofício da 12ª Vara Federal de Curitiba informou que ele já cumpriu “as penas privativas de liberdade e restritivas de direitos previstas no seu Acordo de Colaboração Premiada“.

O que diz o responsável pela publicação: O Comprova entrou em contato com o perfil @mspbra por meio do Facebook e de e-mail em 30 de maio. Até a conclusão desta checagem, não recebeu retorno.

O que podemos aprender com esta verificação: O conteúdo de desinformação em questão resgata um nome envolvido em processos judiciais e famoso por casos de corrupção e o vincula a uma nomeação a uma estatal. Neste caso, uma pesquisa junto à imprensa seria eficaz para verificar que não houve a nomeação de Nestor Cerveró a uma diretoria da Petrobras, visto que se trata de um personagem conhecido e seu retorno a um cargo público seria amplamente noticiado.

É preciso estar atento aos alardes provocados por desinformadores ao citar esses nomes. Ao se deparar com mensagens sobre a vinculação de uma pessoa a um cargo nos governos, busque notícias e também acesse canais oficiais, como o Diário Oficial da União (DOU), dos estados ou municípios, ou mesmo os sites das empresas estatais ou ministérios, onde estão os organogramas dos órgãos ou entidades.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: A Petrobras e a Operação Lava Jato frequentemente são alvos de desinformação. O Comprova já realizou verificações como a que classifica como falso vídeo que tenta ligar filho de Lula a Petrobras e a aumento de combustíveis, além de ter produzido o conteúdo explicativo O que foi a Operação Lava Jato.