O Projeto Comprova é uma iniciativa colaborativa e sem fins lucrativos liderada pela Abraji e que reúne jornalistas de 41 veículos de comunicação brasileiros para descobrir, investigar e desmascarar conteúdos suspeitos sobre políticas públicas, eleições, saúde e mudanças climáticas que foram compartilhadas nas redes sociais ou por aplicativos de mensagens.
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Política

Investigado por: 2023-05-25

Vídeo engana ao afirmar que Justiça autorizou invasões de domicílio no Brasil

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Enganoso
É enganoso o conteúdo de um vídeo que afirma que “comunistas travestidos de juízes” autorizaram a invasão de domicílios, mesmo com uso de arma de fogo, sem que isso configure crime. O comentário feito por uma influenciadora de direita distorce o sentido de uma decisão da 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) tomada em 2021. Na ocasião, os ministros julgaram um recurso do Ministério Público do Tocantins e decidiram que, no caso específico, a quebra de um cadeado e o arrombamento de uma fechadura não configuravam tentativa de roubo, e sim atos preparatórios. Embora não tenha sido condenado por tentativa de roubo, um dos acusados à época foi condenado por porte ilegal de arma de fogo.

Conteúdo investigado: Vídeo em que mulher diz que “comunistas travestidos de juízes” autorizaram a invasão de domicílios. Segundo ela, uma decisão do STJ definiu que não é crime invadir a casa de outra pessoa armado.

Onde foi publicado: Instagram, WhatsApp, TikTok e Facebook.

Conclusão do Comprova: É enganoso conteúdo de vídeo publicado no Instagram, e que viralizou em outras plataformas, no qual uma mulher afirma que o Poder Judiciário brasileiro autorizou a invasão de domicílios. No comentário, divulgado em 18 de maio deste ano, a autora, que se identifica como criadora de conteúdo digital e conservadora, afirma que a Justiça não irá mais condenar tentativas de invasão e que “a comunização, invasão preparatória da propriedade” não será mais passível de punição ou pena. Isso não é verdade.

Na realidade, a mulher desinforma ao distorcer uma decisão de outubro de 2021, da 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Na ocasião, os ministros julgaram um recurso do Ministério Público do Tocantins (MP-TO), que pedia a condenação de dois homens por tentativa de roubo após terem arrombado o cadeado e a fechadura de uma casa. Na primeira instância, o Tribunal de Justiça do Tocantins (TJ-TO) absolveu um dos réus por falta de provas e condenou o outro apenas por porte ilegal de arma de fogo. O STJ manteve a decisão e negou o recurso apresentado pelo MP-TO.

O argumento da acusação era de que os homens deveriam ser condenados por tentativa de roubo porque chegaram a arrombar o cadeado e a fechadura da residência, sendo flagrados por policiais militares na porta da casa da vítima e presos em seguida. O entendimento da 5ª Turma do STJ, contudo, foi de que a ação da dupla não configurou tentativa de roubo porque não houve início da execução do crime, ou seja, os dois não chegaram a iniciar o roubo de objetos da propriedade.

Conforme a decisão, que olha para o caso específico, o arrombamento do cadeado e da fechadura da casa corresponderam “a meros atos preparatórios impuníveis, por não iniciar o núcleo do verbo subtrair”. Isso não significa que o mesmo entendimento será aplicado de forma geral para qualquer decisão futura, já que não há jurisprudência dominante sobre o que configura ato preparatório e em que momento ele passa a ser uma tentativa de consumar um crime.

Também não significa que a invasão de propriedade está autorizada, e em momento algum a decisão sugere tal interpretação. Especialistas ouvidos pelo Comprova refutam as afirmações contidas na peça de desinformação e explicam que, a depender do caso, os réus poderiam ser punidos por crimes residuais, como destruição de obstáculo, dano e porte ilegal de arma – como, de fato, aconteceu com um dos réus, que estava armado.

O vídeo original foi republicado por outros usuários junto com a expressão “Faz o L” e menções ao PT, sugerindo que a decisão judicial tem relação com o governo de Luiz Inácio Lula da Silva, o que é mentira: a decisão do Poder Judiciário não tem ligação com o Executivo e aconteceu em 2021, antes da eleição de Lula para o terceiro mandato. Ainda que tivesse ocorrido durante o mandato do petista, não haveria relação entre o julgamento do STJ e a Presidência, já que o Judiciário é um poder independente e eventuais mudanças na tipificação de crimes cabem ao Legislativo, e não ao Executivo.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Até o dia 24 de maio de 2023, somente no TikTok, o post somava 209,8 mil visualizações, 10,2 mil curtidas e mais de 1 mil comentários. Além disso, o post original da autora do vídeo, no Instagram, somava 53,4 mil curtidas até a mesma data.

Como verificamos: O primeiro passo foi identificar o tema sobre o qual a autora falava no vídeo. O Comprova buscou no Google pelas palavras-chave “ato preparatório” e “tentativa de roubo” e localizou publicações em sites jurídicos – como o Conjur – a respeito de uma decisão do STJ de outubro de 2021. Também foi encontrada uma publicação no próprio site do Tribunal a respeito da decisão tomada pela 5ª Turma sobre um caso ocorrido no Tocantins.

Em seguida, foi feito contato com o STJ, a fim de esclarecer os termos da decisão. Também foram entrevistados dois especialistas no assunto: Aury Lopes Jr., advogado criminalista, doutor em Direito Processual Penal e professor do Programa de Pós-Graduação em Ciências Criminais da PUCRS, e Hélio Soares Júnior, defensor público da Bahia que atua na unidade que a Defensoria do Estado mantém em Brasília para acompanhar casos que são levados aos tribunais superiores, como STJ e Supremo Tribunal Federal (STF).

O Comprova acessou ainda o conteúdo na íntegra da decisão do STJ, que inclui parte da sentença do primeiro julgamento do caso pelo Tribunal de Justiça do Tocantins, e acionou o Ministério Público do Estado a fim de obter informações sobre o andamento e o desfecho do caso.

Por fim, foram enviadas mensagens à responsável pela publicação e ao perfil que compartilhou o conteúdo cujo post viralizou.

Decisão do STJ não autoriza invasão de domicílio

Por meio de nota enviada ao Comprova, o STJ ressalta que “a decisão em momento algum autoriza a invasão de domicílio” e que a peça de desinformação faz uma “distorção sensacionalista do conteúdo jurídico do julgamento”.

Consultado sobre o conteúdo da decisão, o advogado criminalista Aury Lopes Jr. foi taxativo: “Que fique claro: o STJ nunca disse que está liberado entrar na sua casa, ou que está liberado quebrar o cadeado da casa dos outros”.

Sobre o vídeo, acrescentou: “Isso é uma distorção, uma manipulação absurda da notícia para criar alarmismo sem nenhum fundamento. Está fazendo uma conversa de bar sobre um tema complexo que demanda conhecimento científico”.

Ele explica que esta se trata de uma decisão técnica sobre um tema do direito penal debatido no meio acadêmico há décadas, em que a discussão se concentra nas circunstâncias em que se pode punir alguém por tentativa de roubo. Há divergências dentro do próprio meio jurídico. Por isso, cabe aos tribunais fazer uma avaliação caso a caso e adotar uma teoria, o que foi feito pela 5ª Turma do STJ.

“A decisão adota teoria que tem fundamentação jurídica. Há divergência, e o relator seguiu uma linha. Você pode não concordar, porque segue outra teoria, isso é normal no direito penal”, completa.

STJ decide sobre ato que dá início à tentativa de roubo

Diferentemente do que afirma a autora do vídeo, a decisão do STJ não diz respeito à invasão de domicílio, e sim ao que configura a tentativa de roubo – mais especificamente ao momento em que o ato começa a ser considerado um crime tentado. O artigo 14 do Código Penal Brasileiro define que um crime é considerado tentado quando “iniciada a execução, não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente”.

Na decisão, o relator do caso no STJ, ministro Ribeiro Dantas, aponta que o texto da lei é muito aberto e não traz “maior clareza ou precisão a respeito de algo que concretamente possa indicar quando a execução de um crime é iniciada”.

Para o defensor público Hélio Soares Júnior, o tema é mesmo controverso no campo do Direito Penal, e há várias teorias que buscam estabelecer uma delimitação segura entre atos preparatórios e início de execução. “Há, em realidade, uma sensível e quase invisível diferença entre os atos preparatórios e o início da execução”, diz o defensor público.

Segundo ele, ao tomar a decisão, a 5ª Turma do STJ adotou a teoria objetivo-formal, que entende que os atos executórios são aqueles que iniciam a execução da ação. Ou seja, para considerar que houve uma tentativa de roubo, essa teoria entende que é preciso que os acusados tenham de fato começado a roubar algo, e que a ação tenha sido interrompida por alguma circunstância alheia à vontade deles.

Esse entendimento, porém, não é pacífico. “Parte da doutrina critica essa teoria, pois o Estado só puniria o sujeito quando estivesse muito próximo da consumação”, explica Hélio Soares Júnior. Em nota, o STJ disse que não há jurisprudência dominante a respeito dessa questão, mas que a 5ª Turma apontou um precedente do próprio STJ, em um julgamento da Terceira Seção: em julgamento anterior, o colegiado entendeu que “não se poderia imputar aos réus a prática de roubo circunstanciado tentado, pois em nenhum momento ocorreu o início da conduta tipificada no artigo 157 [roubo] do Código Penal”.

Especialistas ouvidos pelo Comprova explicaram que, em regra, esse tipo de decisão se esgota no STJ, que é o Tribunal que discute o alcance de uma lei – ao STF cabe julgar violações à Constituição. No caso aqui tratado, segundo o MP-TO, não houve apresentação de recurso ao STF e o processo transitou em julgado no dia 26 de outubro de 2021.

Isso não significa, contudo, que todas as decisões judiciais sobre tentativa de roubo seguirão a mesma decisão. “Essa decisão não significa que em outros casos não seja considerado tentativa, e que as pessoas não possam ser punidas por crimes residuais, ou seja, por outros crimes”, aponta o advogado Aury Lopes Jr. No caso analisado pelo STJ, inclusive, houve condenação de um dos réus.

Em nota, o STJ também disse que a decisão de 2021 não significa um entendimento definitivo sobre o tema. “O STJ é um tribunal de precedentes, o que significa que seus ministros tendem a seguir as posições já firmadas na Corte. No entanto, o julgamento em questão se deu em uma das Turmas de Direito Penal, sendo que há também a Sexta Turma que forma a Terceira Seção, responsável pela uniformização de teses neste ramo do Direito. Assim, não é seguro afirmar que se trate um entendimento definitivo”.

Arrombar um cadeado ou fechadura não é crime?

É, sim, e se enquadra como crime de dano, previsto no artigo 163 do Código Penal. Além de enganar sobre o teor da decisão do STJ, a autora do vídeo ainda sugere que pessoas que tentarem invadir uma residência sairiam totalmente impunes, o que não é verdade. O defensor público Hélio Soares Júnior explica que as ações consideradas como atos preparatórios só costumam ser punidas quando se configuram um tipo penal autônomo. No entanto, mesmo que o ato preparatório não seja considerado uma tentativa de roubo, os réus podem sim ser condenados pelos chamados crimes residuais.

O professor Aury Lopes Jr. cita que, após arrombar o cadeado, os reús poderiam vir a ser punidos, por exemplo, por “destruição de obstáculo, dano ou por porte ilegal de arma”. De fato, um dos réus no caso, que estava armado, foi condenado por isso – ele foi enquadrado no artigo 14 da Lei 10.826, que dispõe sobre registro, posse e comercialização de armas de fogo e munição. A pena é de reclusão de dois a quatro anos e multa.

O que explica, então, que o Ministério Público não tenha pedido a condenação dos dois por crime de dano? Hélio Soares Júnior afirma que, diferentemente do porte ilegal de arma, do roubo e da tentiva de roubo, o dano é considerado um tipo de crime de ação penal privada, ou seja, o pedido de condenação não caberia ao Ministério Público, mas ao dono da residência, que acionaria um advogado. De acordo com o Código Penal brasileiro, a pena para o crime de dano varia de um a seis meses de detenção, ou multa, podendo chegar a três anos, se o crime for de dano qualificado – com emprego de violência.

Legítima defesa

A autora do vídeo ainda engana sobre o direito de legítima defesa do dono de uma residência invadida. Ao usar o caso julgado em 2021 pelo STJ, ela afirma que o dono de uma casa invadida estaria cometendo um crime, caso reagisse à invasão, uma vez que “o meliante não é um criminoso”, mas isso não é verdade. A legislação brasileira assegura ao dono do imóvel o direito de legítima defesa, desde que o ato seja proporcional à agressão, como define o artigo 25 do Código Penal.

“A decisão [do STJ] nunca disse isso. Se alguém tentar invadir uma casa, e a pessoa reagir, desde que ela esteja se defendendo de uma maneira adequada, proporcional, é legítima defesa”, observa o advogado Aury Lopes Jr. Ele atenta, contudo, que há limites para a legítima defesa. “Você tem que reagir a uma agressão atual ou iminente, usando moderadamente dos meios necessários. Então, se estiverem invadindo a tua casa e você realmente se defender, a tua conduta está protegida e você não comete crime algum”, afirma.

O defensor público Hélio Soares Júnior exemplifica: “Se [os acusados] tivessem entrado armados na residência, o morador estaria vivendo numa situação de agressão iminente que daria ensejo à legítima defesa. O morador poderia usar os meios necessários para repelir a injusta agressão”, explica.

Já Aury Lopes Jr. fala de uma situação hipotética que, diferentemente da anterior, não se enquadraria em legítima defesa, poderia ser considerada um excesso, o que faria com que o dono da casa respondesse por seus atos. “Por exemplo, você tem alguém encostado na tua porta, e você, por medo, resolve atirar e matar alguém que está encostado na tua porta, você pode ter problemas, porque isso é um excesso, não é uma legítima defesa real, a pessoa não está te agredindo, não está fazendo nada”, explica.

O que diz o responsável pela publicação: O Comprova entrou em contato com a autora do vídeo, identificada como Eliane Benatti (@ebenatti), através do Instagram e com o perfil que compartilhou o conteúdo no TikTok.

A responsável pela gravação respondeu: “Prove que estou errada. Gostaria de se manifestar a respeito?” O Comprova, então, elencou as informações obtidas junto ao próprio Tribunal e a especialistas. Ela agradeceu, mas não informou se iria se retratar ou excluir a publicação enganosa.

Não houve retorno por parte do perfil procurado via TikTok.

O que podemos aprender com esta verificação: Apesar de citar a turma específica de um tribunal para conferir credibilidade ao conteúdo, a autora do vídeo não apresenta data, fontes ou links para notícia sobre a suposta autorização de invasão a domicílios por parte do Poder Judiciário. Se isso fosse verdade, dificilmente teria sido ignorado pela imprensa.

Ao se deparar com um conteúdo como esse, desconfie. Busque saber qual a data da decisão e o que exatamente ela estabelece. É comum que produtores de desinformação usem decisões ou fatos antigos como atuais para associá-los com o atual governo, por exemplo, ou façam interpretações equivocadas e simplistas de temas técnicos e complexos.

Pesquise por palavras-chave em buscadores e se informe por meio de veículos de comunicação profissionais sobre a pauta abordada. Neste caso, uma alternativa seria buscar informações divulgadas pelo próprio site do Tribunal, onde está disponível a decisão na íntegra para leitura.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: O mesmo conteúdo foi checado pela agência Aos Fatos.

O Comprova já checou outros conteúdos em que decisões do judiciário foram distorcidas ou atribuídas ao Poder Executivo e vice-versa. Já mostrou que um post enganava ao atribuir à esquerda decisões que cabiam ao Judiciário e ao Congresso Nacional, que era enganosa uma publicação que dizia que o governo havia liberado R$ 12 milhões para tratamento de uma criança e que um post enganava ao sugerir que o STF não quis agir contra João Doria sobre doses interditadas da CoronaVac, quando, na verdade, isso não era atribuição da Corte.

Política

Investigado por: 2023-05-24

Decisão da Suprema Corte americana não torna ilegal o PL 2630

  • Falso
Falso
A decisão da Suprema Corte dos Estados Unidos que isenta as plataformas Twitter e Google de responsabilidade por conteúdos terroristas compartilhados por usuários das redes sociais não se aplica ao Brasil. Diferentemente do que diz o deputado federal Gustavo Gayer (PL-GO) em vídeo publicado nas redes sociais, o entendimento da Justiça norte-americana não torna ilegais projetos de regulação das big techs, como o Projeto de Lei 2630/2020, porque o órgão não tem jurisdição em outros países. O entendimento também não se estende ao Supremo Tribunal Federal, que julga ações sobre o Marco Civil da Internet. É falso, ainda, que a mídia brasileira não tenha noticiado a decisão do judiciário estadunidense.

Conteúdo investigado: Um post no TikTok reproduz vídeo no qual o deputado federal Gustavo Gayer (PL-GO) afirma que a Suprema Corte dos Estados Unidos decidiu que a tentativa brasileira de aprovar o texto que ficou conhecido como “PL das Fake News” é ilegal. O político declara que a imprensa brasileira não divulgaria a decisão do Judiciário norte-americano. Uma legenda inserida pelo usuário do TikTok afirma que, na gravação, o deputado está comentando a “intervenção dos EUA no Brasil”.

Onde foi publicado: TikTok.

Conclusão do Comprova: É falso que uma decisão da Suprema Corte dos EUA em relação à moderação de conteúdo no Google e no Twitter possa interferir na tramitação no Congresso Nacional de projeto para regulamentar big techs no Brasil.

Da mesma forma, o entendimento não tem poder sobre o julgamento, pelo STF, de ações sobre o Marco Civil da Internet, previsto para a segunda quinzena de junho. Dois processos abordam o artigo 19, que estabelece que as empresas só podem ser responsabilizadas por conteúdos de usuários se não tomarem providências após ordem judicial. As outras duas ações questionam se aplicativos de mensagens – como Telegram e WhatsApp – podem ser suspensos caso não cumpram uma decisão da Justiça.

A decisão da Suprema Corte estadunidense, citada pelo deputado federal Gustavo Gayer (PL-GO) em vídeo, define que as vítimas de ataques terroristas não podem responsabilizar o Twitter e o Google por postagens de incentivo ao Estado Islâmico feitas em suas plataformas, ainda que tenham impulsionado o conteúdo. O processo foi movido por familiares de americanos vítimas de ataques terroristas na Turquia em 2017 e na França em 2015.

Essa decisão, contudo, não é válida no Brasil porque a Suprema Corte americana não tem jurisdição aqui. Ademais, as leis e demais regramentos que regulam as redes sociais nos Estados Unidos são diferentes daquelas que versam sobre o tema no Brasil.

Por isso, diferentemente do que diz o deputado no vídeo, uma decisão judicial americana, ainda que proferida pela Suprema Corte daquele país, não torna ilegal um projeto de lei no Brasil.

Também não é verdadeiro que a mídia brasileira tenha, deliberadamente, deixado de noticiar o fato. A decisão da Suprema Corte dos Estados Unidos foi divulgada por diversos veículos brasileiros, como Folha de S.Paulo, Jornal Nacional, Exame, UOL, O Tempo, Poder 360,

Além disso, não existe qualquer declaração do governo norte-americano sobre a intenção de intervir no Brasil por causa do projeto.

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma falsidade.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. No TikTok, o post verificado somou, até 24 de maio, 63,2 mil curtidas, 2,2 mil comentários e 11,2 mil compartilhamentos.

Como verificamos: O primeiro passo foi buscar informações sobre a decisão da Suprema Corte americana citada no vídeo, se ela foi divulgada no Brasil e sobre a regulamentação de redes sociais em outros países.

Em seguida, entrevistamos uma especialista em Direito Constitucional. Pesquisamos, ainda, no noticiário brasileiro e dos Estados Unidos, se houve posicionamento deste país sobre intervenção no Brasil. Por fim, tentamos contato com os autores do vídeo e do post no TikTok.

Decisões da Suprema Corte dos Estados Unidos não interferem no Brasil

No dia 18 de maio, a Suprema Corte dos Estados Unidos decidiu por unanimidade que as vítimas de ataques terroristas no país não poderiam responsabilizar o Twitter e o Google por postagens de incentivo ao Estado Islâmico que circulam nas plataformas.

Conforme explica o UOL, foram julgados dois casos de responsabilidade relacionados a vítimas de terrorismo em ataques na Turquia, em 2017, e em Paris, em 2015.

A Corte decidiu manter a Seção 230 da Lei de Decência nas Comunicações (Communications Decency Act, CDA na sigla em inglês), de 1996, na qual se baseia a regulação das redes sociais no país. Conforme a legislação, o Estado está isento de influência em atividades de empresas consideradas provedoras de serviços. Desta forma, as redes sociais podem ter regras próprias de moderação de conteúdo. As regras de uso do Twitter e do Google estão disponíveis nas plataformas.

A partir da decisão judicial, será mais difícil naquele país as empresas responderem a processos por conteúdos postados por usuários das plataformas. O caso foi divulgado pelos principais jornais dos Estados Unidos, como Washington Post e New York Times.

Ao Projeto Comprova, a professora adjunta de Direito Constitucional e Administrativo da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Carolina Cyrillo, explicou que a decisão tomada nos EUA em nada interfere na aprovação ou não do Projeto de Lei 2630/2020, em discussão na Câmara dos Deputados brasileira, isso porque a Suprema Corte dos EUA tem jurisdição exclusiva no país norte-americano.

“No Brasil exercem jurisdição em caráter nacional os tribunais superiores brasileiros. No caso de discussão sobre o PL 2630, se aprovado, poderá vir a ser eventualmente questionado na sua constitucionalidade no STF (Supremo Tribunal Federal)”, exemplifica.

Ela acrescenta que o texto não propõe a violação de nenhum direito fundamental e, por isso, não há ilegalidade. “O debate público e político faz parte de uma democracia deliberativa”, conclui.

O Brasil não é o primeiro país a regulamentar as redes sociais. No ano passado, 27 países da União Europeia adotaram a Lei de Serviços Digitais. O texto aborda o comércio e troca de bens ilegais, serviços e conteúdo online, além de sistemas algorítmicos que amplificam a disseminação da desinformação.

O Parlamento Europeu explicou que o objetivo é dar às pessoas maior controle sobre aquilo que consomem online. Desta forma, os usuários são informados, por exemplo, sobre os motivos pelos quais um determinado conteúdo é recomendado. Além disso, a publicidade dirigida aos menores é proibida, assim como a utilização de dados sensíveis, como a orientação sexual, a religião ou a etnia.

Ao afirmar que a imprensa brasileira não divulgaria a decisão da corte americana, Gayer também desinformou. O assunto foi noticiado no Brasil por diversos veículos, como Folha de S.Paulo, Jornal Nacional, Exame, Uol, O Tempo e Poder 360.

O que diz o responsável pela publicação: O Comprova procurou Gustavo Gayer por meio do gabinete dele na Câmara dos Deputados, mas não recebeu resposta. Não foi possível entrar em contato com o usuário @eltonsilva7, do TikTok, que afirmou se tratar de um vídeo comentando a intervenção dos Estados Unidos no Brasil. A plataforma só permite envio de mensagens entre contatos. Também não foi localizada nenhuma outra rede social em que ele tenha perfil.

O que podemos aprender com esta verificação: No vídeo aqui checado, o autor utilizou uma notícia internacional, cujo tema se aproxima daquilo que está em discussão no cenário político local, para desinformar e, desta forma, tentar ganhar a simpatia dos usuários de redes sociais para o ponto de vista defendido por ele.

O político também tenta alarmar ao sustentar que o país “se tornou um pária internacional” e que se tenta “instaurar o regime da censura no Brasil”. Essa abordagem pode assustar quem consome o conteúdo e a dica é sempre acender o alerta para publicações em tons alarmistas e de urgência, pesquisando sobre o assunto junto à imprensa profissional, institutos reconhecidos e órgãos de governo.

Neste caso, apesar de o deputado alegar que a mídia brasileira não noticiaria a decisão norte-americana, ela foi sim publicada por veículos do país que têm credibilidade. As reportagens em nenhum momento afirmam que a decisão em outra localidade tornaria ilegal a discussão nacional.

Por fim, caso os Estados Unidos ameaçassem uma intervenção no Brasil, dada a gravidade do assunto, ele estaria sendo amplamente divulgado pelo noticiário não só dos dois países, mas do mundo.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: O deputado Gustavo Gayer já foi desmentido em verificações anteriores do Comprova que demonstraram que, ao contrário do que ele afirmou, Lula não disse que vai implantar ditadura no Brasil, que vídeo dele engana ao mostrar resultado parcial de enquete com intenção de voto para presidente, que um documento não prova fraude nas eleições 2018, e que uma pesquisa brasileira não usou doses letais para matar pacientes e desacreditar o uso da cloroquina.

Comprova Explica

Investigado por: 2023-05-24

Entenda as políticas de preços da Petrobras

  • Comprova Explica
Comprova Explica
O Preço de Paridade de Importação (PPI) adotado em 2016 pela Petrobras chegou ao fim. Durante sete anos, o preço dos combustíveis acompanhou as oscilações do valor do barril de petróleo no mercado internacional, assim como a cotação do dólar. No período de vigência, o preço da gasolina subiu mais que a inflação, e a Petrobras obteve lucro recorde. Já o novo modelo anunciado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) considera também a demanda do mercado interno.

Conteúdo analisado: Conteúdos nas redes sociais afirmam que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) teria voltado a instaurar a mesma política de preços da Petrobras aplicada durante o governo Dilma Rousseff (PT).

Comprova Explica: A Petrobras anunciou em 16 de maio de 2023 o fim do Preço de Paridade de Importação (PPI), que durante sete anos manteve o preço dos combustíveis atrelado diretamente ao mercado internacional. Tanto o PPI quanto o novo modelo da política de preços, anunciado pelo presidente Lula, foram alvo de conteúdos de desinformação nos últimos anos.

O Comprova Explica reúne informações sobre como funcionou a política de preços da Petrobras durante os governos Dilma Rousseff (PT), Michel Temer (MDB) e Jair Bolsonaro (PL) e as mudanças implementadas no governo Lula, assim como as consequências para a população ao longo dos anos.

O que é a política de preços da Petrobras?

É a maneira como a Petrobras define as variações do preço dos derivados de petróleo vendidos nas refinarias. Em 2016, no governo Temer, houve uma mudança nessa política que atrelou o preço dos combustíveis ao valor do barril de petróleo praticado no mercado internacional, o PPI. Nesse cálculo entrava ainda a oscilação do dólar, os custos de importação e outros fatores. No entanto, a Petrobras não explica como exatamente é feito esse cálculo. A empresa alega que nas fórmulas são consideradas informações importantes para o negócio e que, por isso, não podem ser divulgadas.

Como era a política de preços antes do PPI?

Até o início dos anos 2000, havia monopólio da Petrobras na exploração e venda de petróleo no Brasil. Isso mudou com a Lei 9.478 (Lei do Petróleo), aprovada durante o governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB). A partir de então, qualquer empresa estrangeira, desde que constituída sob as leis brasileiras, passou a estar autorizada a realizar atividades de exploração, produção, transporte, refino, importação e exportação do petróleo.

Para aproximar o preço praticado pela Petrobras ao das empresas estrangeiras, o cálculo para os combustíveis passou a considerar o valor da commodity no mercado internacional. Os repasses relativos à oscilação dos preços eram feitos com periodicidade definida, por exemplo, a cada três meses.

Havia, porém, interferências da União na frequência desses repasses. No segundo mandato do governo Lula, os preços dos combustíveis chegaram a ficar congelados por dois anos e sete meses.

A ex-presidente Dilma adotou estratégia parecida. Ela foi acusada de usar a Petrobras para “postergar” os aumentos na gasolina e no diesel como manobra para conter a inflação. Em 2014, ano de eleições presidenciais, o governo Dilma chegou a congelar o preço dos combustíveis durante meses. A medida não se sustentou, levando a uma inflação de 10,76% no ano seguinte, em 2015. O movimento de Dilma foi criticado em 2022 por Lula durante debate eleitoral. Segundo ele, a ex-presidente “cometeu equívoco na questão da gasolina”.

Em qual contexto o PPI foi implementado?

O PPI foi implantado durante o governo do ex-presidente Michel Temer, em outubro de 2016. Dilma sofreu processo de impeachment naquele ano. A Petrobras estava no centro das investigações da Operação Lava Jato e vinha perdendo valor de mercado.

O engenheiro Pedro Parente, que tinha sido ministro da Casa Civil durante o governo de Fernando Henrique Cardoso, foi nomeado presidente da Petrobras e instituiu o Preço de Paridade de Importação. O objetivo, segundo ele, era dissociar os interesses da empresa dos interesses do governo.

Como funcionava o PPI?

O valor do barril do petróleo no mercado internacional era usado como referência principal para os reajustes de preços. Isso significava que as oscilações nos mercados, para cima ou para baixo, eram repassadas ao preço dos derivados de petróleo nas refinarias e, consequentemente, ao consumidor final. A periodicidade desses repasses não era fixa. Aumentos ou quedas no preço aconteciam sempre que havia variação na cotação do barril de petróleo, ainda que isso ocorresse diariamente.

Como a commodity é cotada em dólar, a alta da moeda americana nos últimos anos influenciou diretamente no aumento do preço da gasolina e do diesel no Brasil. Outros custos de produção, como fretes de navios, logística e taxas portuárias, também eram incorporados ao preço do combustível e repassados ao consumidor.

O que aconteceu com o preço dos combustíveis desde a implementação do PPI?

Desde que a mudança na política de preços dos combustíveis passou a ser adotada pela Petrobras, os preços da gasolina e do diesel foram alterados com mais frequência. A estatal disse, em 2017, que a ideia era ter de fato mais repasses para acomodar as flutuações do câmbio, do petróleo e, com isso, permitir “maior aderência dos preços do mercado doméstico ao mercado internacional no curto prazo”, dando condições de competir “de maneira mais ágil e eficiente”. Naquele ano, segundo o atual presidente da estatal, Jean Paul Prates, foram feitos 118 reajustes de preços.

Diante das altas sucessivas, em 21 de maio de 2018, estourou a greve dos caminhoneiros. Os trabalhadores reclamavam do preço do diesel, que, segundo eles, ficou alto demais e comprometeu o transporte de mercadorias no país. O movimento causou desabastecimento de comida e remédios em diversas cidades brasileiras. Em 30 de maio, a greve foi oficialmente encerrada. Dois dias depois, em 1º de junho, Pedro Parente, presidente da Petrobras que instituiu o PPI, pediu demissão da estatal.

Desde o PPI, a gasolina subiu mais que a inflação. O preço médio do litro da gasolina comum passou de R$ 3,66 em outubro de 2016 para R$ 5,51 em abril de 2023, uma alta de 50,5%, segundo levantamento da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis do Brasil (ANP). No mesmo período, a inflação medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) foi de 40,27%.

| Gráfico mostra evolução do preço médio da gasolina no Brasil. Fonte: ANP

Qual foi o lucro da Petrobras durante o PPI?

Durante o PPI, a Petrobras registrou lucros recordes três vezes. Em 2019, a estatal atingiu o recorde da sua história até então, com R$ 40,1 bilhões. Em 2021, atingiu novo valor máximo, com lucro de R$ 106,7 bilhões. Já no ano passado, a estatal teve lucro líquido de R$ 188,3 bilhões.

Veja os resultados da Petrobras desde a adoção do PPI (valores não corrigidos pela inflação):

2016 – prejuízo de R$ 14,8 bilhões;

2017 – prejuízo de R$ 446 milhões;

2018 – lucro R$ 25,8 bilhões;

2019 – lucro de R$ 40,1 bilhões;

2020 – lucro de R$ 7,1 bilhões;

2021 – lucro de R$ 106,7 bilhões;

2022 – lucro de R$ 188,3 bilhões.

Como funciona a nova política de preços da Petrobras, implementada em 2023?

Em 16 de maio de 2023, o presidente Lula anunciou mudanças na política de preços da estatal. Quando ainda estava em campanha, no final de 2022, ele havia criticado o PPI e dito que a política era “para agradar aos acionistas em detrimento de brasileiros“.

Segundo o comunicado feito pela empresa, a nova política passa a considerar, além do mercado internacional, o mercado nacional e as margens da companhia. Dessa forma, o PPI não foi abandonado por completo, mas ele não é mais o único critério.

O presidente da companhia, Jean Paul Prates, disse na coletiva após reunião com o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira: “Enfatizo que será mantida a referência de preço internacional”.

Também entram na conta os preços dos combustíveis vendidos pelas refinarias privadas e importadores, assim como os preços dos produtos substitutos, como o etanol hidratado, no caso da gasolina.

De acordo com a companhia, os reajustes continuarão sendo feitos sem periodicidade definida, porém, não será mais repassada para os preços internos a volatilidade das cotações internacionais e da taxa de câmbio.

No comunicado relativo à mudança de estratégia, a Petrobras disse que as decisões relativas à estratégia comercial seguem sendo feitas pela empresa através do Grupo Executivo de Mercado e Preço, composto pelo Presidente da companhia, o Diretor Executivo de Logística, Comercialização e Mercados e o Diretor Financeiro e de Relacionamento com Investidores. Segundo Prates, não haverá intervenção do governo.

Como verificamos: Buscamos informações em sites da imprensa profissional a respeito dos acontecimentos referentes à Petrobras e às alterações da política de preços. Também consultamos o site da estatal e da Agência Nacional do Petróleo (ANP).

Por que explicamos: A Petrobras e a política de preços, principalmente em referência à gasolina e ao diesel, são constantemente alvo de desinformação que vem tanto de pessoas que apoiam Lula quanto da oposição. Entender como funciona a formação do preço dos combustíveis e os critérios de aumento ou redução do preço de venda nas refinarias praticados pela Petrobras ajuda a formar repertório de conhecimento para lidar melhor com possíveis conteúdos de desinformação que possa encontrar.

Outras checagens sobre o tema: Em junho de 2022, o Comprova publicou que, ao contrário do que diziam publicações nas redes sociais, o Brasil é acionista majoritário e responsável pelo controle da Petrobras. Sobre o PPI, a Lupa já desmentiu que a política não foi implementada durante o governo Dilma.

Política

Investigado por: 2023-05-22

PF diz que investigação sobre joias sauditas não acabou, ao contrário do que afirmam postagens em redes sociais

  • Enganoso
Enganoso
É enganoso afirmar que o caso das joias sauditas trazidas ilegalmente para o país no governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) está encerrado. A Polícia Federal confirma que as investigações continuam após a Receita Federal informar sobre a não cobrança de imposto. Mesmo com a isenção, os objetos deveriam ter sido declarados.

Conteúdo investigado: Posts com captura de tela de reportagem do jornal O Globo intitulada “Joias sauditas dadas a Bolsonaro são isentas de cobrança de imposto, diz Receita Federal” e legendas afirmando que “ladrão é o outro”, e vídeos em que donos de perfis comentam a reportagem.

Onde foi publicado: TikTok, Twitter e Instagram.

Conclusão do Comprova: É enganoso que a investigação da Polícia Federal (PF) acerca das joias sauditas dadas ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) tenha sido finalizada, diferentemente do que sugerem posts nas redes.

Os conteúdos usam reportagem do jornal O Globo publicada em 16 de maio e intitulada “Joias sauditas dadas a Bolsonaro são isentas de cobrança de imposto, diz Receita Federal” para desinformar ao dizer que o ex-presidente não é mais investigado.

O caso ainda não foi encerrado. De fato, como informou O Globo, as joias que integrantes do governo anterior trouxeram ao Brasil são isentas de cobrança de imposto, segundo a Receita Federal. “Em resposta a uma investigação da Polícia Federal, o Fisco explicou que presentes destinados à Presidência da República deverão apenas ser informados à autoridade aduaneira na sua chegada e entregues à Aduana para armazenamento e posterior despacho”, detalha o texto. Ou seja, as peças não seriam taxadas, mas deveriam ter sido declaradas por quem as trouxe, o que não foi feito.

Mais do que desinformar acerca do caso da investigação, os posts verificados aqui possuem algumas semelhanças. Dizem que a mídia tradicional só falou sobre este assunto para macular a imagem de Bolsonaro e tirar o foco do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que seria o “verdadeiro ladrão”. Para isso, os autores dos posts – o ex-presidente é um deles – usam a hashtag “ladrãoéooutro”, referindo-se ao petista.

Dois vídeos com alta viralização usam a mesma estratégia: seus criadores dizem, primeiramente, acreditar que a notícia de O Globo seria mentira. “Será realmente que essa verdade não seria uma fake news? E aí fui me aprofundar para saber se, realmente, se era verdade, se podia trazer aqui para o meu perfil e, acreditem, é realmente verdade”, diz um dos desinformadores. Outra, afirma: “Eu vi o print da matéria circulando, eu achei que era fake news! Eu falei: deve ser um meme! Não é não! Não, era verdade”.

O mesmo conteúdo, em diferentes versões, também foi espalhado por perfis diversos relacionados a uma mesma pessoa. Uma delas posta em um perfil no TikTok um vídeo falando sobre a desinformação; em outro perfil na mesma rede, com nome completamente diferente, ela posta uma captura de tela com a reportagem de O Globo e uma legenda sobreposta. No Instagram, a mesma pessoa posta em outros diferentes perfis e formatos.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Até 22 de maio, o post no perfil de Bolsonaro no Instagram tinha recebido 937,8 mil interações. No Twitter, um dos posts verificados pela reportagem havia sido visualizado 37,2 mil vezes. No TikTok, quatro perfis que propagam o conteúdo investigado somavam 147,3 mil visualizações – um deles, sozinho, acumula 121,8 mil acessos, 22,8 mil curtidas e 442 comentários.

Como verificamos: No Google, buscamos notícias publicadas pela imprensa profissional sobre a cobertura do caso. Também entramos em contato com as assessorias de imprensa da Receita Federal e da Polícia Federal. Realizamos a descrição dos áudios dos posts por meio do programa Transkriptor, bem como comparamos os textos das falas dos envolvidos por meio de nuvens de palavras elaboradas no site WordClouds.com.

O que diz o responsável pela publicação: A reportagem procurou perfis que publicaram os conteúdos – tanto em vídeo como em captura de tela – e cujos posts viralizaram. Apenas o perfil @edinhos.news no TikTok respondeu até a publicação deste texto. Ele negou ter desinformado e afirmou que, com o conteúdo, quis mostrar o “quanto a mídia principal não deu muita atenção” para a história veiculada por O Globo.

O que podemos aprender com esta verificação: Os desinformadores usam uma notícia de um veículo profissional, o jornal O Globo, para criar uma mentira, tática comum entre eles. Por isso, é importante ler as reportagens, não apenas o título – em nenhum trecho a publicação informa que o caso foi encerrado, diferentemente do que sugerem os responsáveis pelos posts verificados aqui. Se não for possível ler por algum motivo, não compartilhe publicações sem ter certeza do que tratam seus conteúdos.

Além disso, outra técnica muito usada que aparece neste caso é o ineditismo do caso. Como informado acima, em dois vídeos verificados os autores dizem que viram uma notícia e duvidaram que ela fosse verdadeira, porque era muito incrível. Um deles inicia o post dizendo: “Você vai realmente ficar chocado ao saber dessa bomba que eu tenho pra você agora”. Ele não afirma que o caso foi encerrado e que não houve problema nenhum relacionado às joias sauditas, mas deixa isso subentendido. Se o caso tivesse sido encerrado, os veículos da imprensa profissional teriam noticiado. Então, já no primeiro momento, devemos nos perguntar por que não lemos sobre o assunto em nenhum outro veículo de comunicação. E já devemos ficar com o alerta ligado. Um próximo passo é pesquisar pelo conteúdo, para ver se nenhuma mídia profissional realmente publicou sobre a notícia.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: As joias sauditas foram alvo de outra checagem do Comprova, a de post que tira de contexto decisão do Tribunal de Contas da União sobre as peças. O Projeto também publicou texto na seção Comprova Explica detalhando a quem pertencem presentes ofertados a presidentes brasileiros.

Política

Investigado por: 2023-05-19

Post de deputado engana ao associar ocupação em Higienópolis, bairro nobre de São Paulo, a Boulos, MST e Lula

  • Enganoso
Enganoso
É enganosa uma postagem do deputado federal Ricardo Salles (PL-SP) que associa notícia sobre a ocupação de um imóvel no bairro de Higienópolis, em São Paulo, ao parlamentar Guilherme Boulos (PSOL-SP), ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e ao governo Lula (PT). O imóvel sobre o qual trata a reportagem, de propriedade da União, foi ocupado por mulheres e crianças ligadas à Frente de Luta por Moradia, não pelo MST. O governo federal nega a acusação de anuência feita por Salles e afirma que já encaminhou, inclusive, pedido de reintegração de posse. À prefeitura da capital paulista, o governo solicitou avaliação sobre possibilidade de atendimento emergencial aos mais vulneráveis.

Conteúdo investigado: Publicação na página do deputado federal Ricardo Salles (PL-SP) que exibe montagem com título de notícia da Folha de S.Paulo sobre a ocupação de um imóvel no Higienópolis, bairro nobre em São Paulo, acompanhada da frase “Boulos é o MST na porta da sua casa. É isso que São Paulo precisa?”. O post também inclui a seguinte legenda: “Com a permissão e a omissão do governo Lula, o MST deixa mais um estrago em São Paulo. Nossa cidade não precisa viver refém de invasões. Boulos é o MST na porta da sua casa. São Paulo merece mais”.

Onde foi publicado: Instagram, Facebook e Twitter.

Conclusão do Comprova: Postagem publicada pelo deputado federal Ricardo Salles (PL-SP) engana ao associar a ocupação de um imóvel no bairro Higienópolis, na capital paulista, noticiada pela Folha de S.Paulo, ao deputado Guilherme Boulos (PSOL-SP), ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O parlamentar afirma, equivocadamente, que a ação contou com a permissão e a omissão do governo federal.

Na verdade, a ocupação de uma residência na Rua Pernambuco, que começou no dia 8 de maio e se consolidou no dia 12, foi feita por mulheres da Frente de Luta por Moradia (FLM) – um coletivo de movimentos autônomos fundado no ano de 2004, em São Paulo, que atua na defesa do direito à cidade e à moradia.

Boulos é coordenador nacional do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), criado em 1997 e que luta pelo direito à moradia e à reforma urbana, sem qualquer vínculo com o MST. De acordo com a FLM, a ocupação no Higienópolis não tem qualquer relação com esses movimentos. A assessoria de Boulos também negou que o parlamentar esteja envolvido com a ocupação: “É outro movimento”.

Quanto ao imóvel, ele pertence à União e está sob responsabilidade da Secretaria do Patrimônio da União (SPU). O local era usado como Escritório de Representação em São Paulo do Ministério das Relações Exteriores (ERESP) e estava desocupado há mais de cinco anos, desde o dia 28 de novembro de 2017.

Ao Comprova, o Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos afirmou que a SPU soube da ocupação pela mídia e pelas redes sociais e esteve no local no dia 15 de maio, quando reuniu-se com a liderança da FLM, solicitando a desocupação imediata. “Tendo em vista a negativa da desocupação do imóvel, foi feito o encaminhamento de solicitação de reintegração de posse junto à Advocacia Geral da União (AGU)”, informa o ministério. O governo federal também solicitou à prefeitura de São Paulo que avaliasse a possibilidade de atendimento emergencial às famílias vulneráveis.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Até o dia 19 de maio, o post tinha quase 1 mil comentários no Instagram, 101 compartilhamentos no Facebook, e 4 mil visualizações e 239 compartilhamentos no Twitter.

Como verificamos: Buscamos pelo título da notícia usada na montagem no Google. Chegamos à matéria original, da Folha de S.Paulo. A reportagem citava que a ocupação era organizada pela FLM. Assim, entramos em contato com uma liderança do movimento, com quem conversamos por telefone, para entender mais sobre as partes envolvidas e os detalhes da ocupação.

Depois, fizemos contato com outros dois movimentos: o MST e o MTST. Procuramos também a assessoria de imprensa do parlamentar Guilherme Boulos, citado na peça de desinformação. Paralelamente, acionamos o governo federal e a prefeitura de São Paulo.

Buscamos ainda por palavras-chave como “ocupação, MST, Guilherme Boulos, Ricardo Salles”. A pesquisa retornou notícias sobre a recém-instaurada CPI do MST e a disputa de Boulos e Salles pela prefeitura de São Paulo nas próximas eleições (Folha, Metrópoles, Folha).

Imóvel é da União e estava desocupado desde 2017

O prédio ocupado fica na Rua Pernambuco, número 36, no Higienópolis, em São Paulo, considerado bairro nobre. De acordo com o Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, ele pertence à União desde 21 de dezembro de 2001, por força de uma carta de adjudicação, resultante de processo judicial, e foi utilizado pelo Escritório de Representação em São Paulo do Ministério das Relações Exteriores (ERESP) até 28 de novembro de 2017, quando ficou desocupado.

| Print do Google Maps feito em 18 de maio de 2023.

Vazio, o imóvel começou a receber, no dia 8 de maio deste ano, famílias ligadas à FLM. A bandeira do movimento foi estendida no local no dia 12 de maio. Conforme Josélia Martins Pereira, uma das coordenadoras do movimento, a maior parte das famílias é composta por mulheres e crianças que foram despejadas por ordens judiciais. Também há pessoas idosas e com deficiência no local. No total, são 20 famílias e aproximadamente 50 pessoas.

“Essas mulheres são mães-solo, a grande maioria são mulheres que foram despejadas, que sofreram reintegração de posse e não têm onde morar”, explica Josélia, acrescentando que alguns homens têm apoiado a ocupação.

Ela afirma que a ocupação é uma forma de expor a falta de políticas públicas de habitação e que ocupar não é um desejo das famílias, mas o último recurso de quem não tem onde morar. “A partir do momento em que um imóvel está abandonado, o imóvel não está cumprindo a função social da propriedade”, defende. “A gente sabe que está abandonado e ocupa, a gente não pode deixar na rua. Muitas famílias procuram o movimento, são vidas.”

Ocupação é da FLM, não do MST, e não está ligada a Boulos

A FLM classificou a publicação feita pelo deputado federal Ricardo Salles como “mentirosa”. A coordenadora do movimento nega que a ocupação no bairro Higienópolis tenha relação com o MST ou com o MTST. Ela enviou ao Comprova uma foto em que aparecem as bandeiras estendidas junto ao prédio ocupado. (Veja abaixo). Uma delas é da FLM, a outra, do MSTRN. Segundo Josélia, o MSTRN é um movimento filiado à FLM e sem vínculo com o MST ou com o MTST, o que foi confirmado também pelas assessorias dos demais movimentos.

| Foto: Divulgação (Frente de Luta por Moradia – FLM).

“As pessoas costumam associar toda e qualquer ocupação como se fosse do MTST. O problema da moradia no Brasil é grave e generalizado, sendo o MTST um dos muitos movimentos que organizam famílias em luta por um teto. Nesse caso em especial, pelas faixas expostas na foto, me parece claro não ser uma ocupação do MTST”, afirmou, em nota, a assessoria do movimento.

Coordenador nacional do MTST, o deputado federal Guilherme Boulos foi associado indevidamente à ocupação. Ao Comprova, a assessoria do parlamentar também negou qualquer relação dele ou do MTST com o caso: “É outro movimento”. Já a assessoria do MST informou que “reivindica a realização da Reforma Agrária, ou seja, no campo”.

Governo federal nega apoio à ocupação

Ao tomar conhecimento da ocupação, pela imprensa, redes sociais e inclusive por vizinhos, a Superintendência do Patrimônio da União em São Paulo (SPU/SP) afirmou que, no dia 15 de maio, solicitou à Secretaria Municipal de Habitação (SEHAB) da Prefeitura de São Paulo apoio para cadastramento social das famílias.

Também pediu, segundo nota enviada ao Comprova, que o governo municipal avaliasse a possibilidade de “prover atendimento emergencial aos mais vulneráveis e a inscrição junto aos programas habitacionais municipais e/ou desenvolvidos em parceria com a União”.

No mesmo dia, ainda conforme a nota, o Gabinete da SPU/SP, por meio de seu superintendente, reuniu-se com lideranças do movimento e solicitou a desocupação imediata do imóvel. As lideranças informaram que a ocupação era formada por mulheres vulneráveis que não tinham para onde ir e comprometeram-se a tentar buscar uma alternativa de moradia, mas não fixaram uma data para desocupação.

Sendo assim, foi feito encaminhamento de pedido de reintegração de posse junto à AGU. O governo federal ressalta que “não houve anuência ou apoio de qualquer órgão federal para tal ocupação” e acrescenta que a SPU está empenhada em reservar imóveis adequados para habitação de interesse social, para colaborar com o Ministério das Cidades na implementação do Programa Minha Casa Minha Vida e com outras políticas públicas do governo.

O que diz a Prefeitura de São Paulo

Já a Prefeitura de São Paulo, por meio da Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social (SMADS), informou ao Comprova que a equipe do Serviço Especializado de Abordagem Social (SEAS) Sé esteve no imóvel ocupado pela FLM no dia 19 de maio. O objetivo, segundo a pasta, foi prestar atendimento às famílias da ocupação, “porém nenhuma aceitou encaminhamento para os serviços da rede socioassistencial”.

A secretaria reforçou que as famílias podem solicitar atendimento a qualquer momento no Centro de Referência de Assistência Social (CRAS) ‘Sé’, como para realização de cadastros e atualizações no Cadastro Único (CadÚnico) para a entrada em programas de transferência de renda, como o Bolsa Família e o Renda Mínima, além dos encaminhamentos para serviços públicos e a entrega de cestas básicas aos moradores da ocupação, conforme demanda.

Eleições de 2024 e CPI do MST

A disputa pela Prefeitura de São Paulo é pano de fundo que tende a intensificar o embate entre Salles (PL-SP) e Guilherme Boulos (PSOL-SP). O ex-ministro do Meio Ambiente do governo Jair Bolsonaro (PL) tenta se viabilizar como o candidato do PL capaz de superar o nome psolista nas urnas em 2024.

Enquanto Boulos foi o deputado federal eleito com mais votos em São Paulo em 2022, Salles ficou na quarta posição. Agora, usa a vitrine como deputado para atacar o adversário.

Recentemente, Salles assumiu o papel de relator da CPI do MST, instalada na Câmara no dia 17 de maio para investigar a atuação do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra. A comissão, que deve se estender até setembro, é presidida pelo deputado Tenente Coronel Zucco (Republicanos-RS) e tem como vice-presidente Kim Kataguiri (União Brasil-SP).

Em entrevista à Folha, Salles disse que a CPI do MST pode chegar ao MTST de Boulos. A afirmação foi rebatida pelo político do PSOL, que o acusou de buscar “uso eleitoreiro da CPI”, e disse que eventuais excessos serão contidos pela própria Câmara dos Deputados e “pelo Judiciário”.

Conhecido por adotar discurso de “tolerância zero” nos conflitos no campo, o aliado do ex-presidente Jair Bolsonaro se apresenta nas redes sociais como advogado e fundador do Endireita Brasil, movimento apoiado por ruralistas. Na primeira vez em que tentou se eleger deputado, sem sucesso, Salles defendeu durante a campanha o uso de “munição de fuzil” contra movimentos sociais de esquerda e prometeu acabar com a “bandidagem no campo”. À época, ele era filiado ao partido Novo. Para solucionar os desafios envolvendo o meio rural, o candidato chegou a sugerir, em uma peça publicitária, uso de balas de “fuzil 3006”, em referência ao número registrado na Justiça para a disputa eleitoral.

O que diz o responsável pela publicação: A assessoria de imprensa do deputado federal Ricardo Salles foi procurada pelo Comprova pelo e-mail de seu gabinete e por mensagem no WhatsApp. Não houve retorno até o fechamento desta reportagem.

O que podemos aprender com esta verificação: A desinformação aqui checada usou a tática de reproduzir uma notícia verdadeira para conferir credibilidade ao conteúdo. Porém, ao utilizar apenas o print do título da reportagem original construiu narrativa própria sobre o tema. Neste caso, é preciso ficar atento e buscar a matéria publicada no veículo profissional para entender o assunto reportado.

A matéria, em nenhum momento, cita o deputado federal Guilherme Boulos, nem mesmo o MST ou o governo Lula, logo, as insinuações feitas pela postagem seriam resolvidas com a leitura da reportagem original. Além disso, o leitor deve pensar sobre o interesse do mensageiro em reproduzir a mensagem, o que demonstraria o interesse do deputado em criticar determinada ação de adversários políticos, como é o caso de Salles em relação a Boulos e Lula.

Outro ponto importante seria buscar conhecimento mais amplo sobre temas como direito à moradia e reforma urbana e como ambos são direitos constitucionais dos cidadãos. Assim como é necessário conhecer os diferentes movimentos sociais que atuam no Brasil e que possuem modelos de atuação próprios, como o MST, o MTST e a FLM.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: Em outubro de 2022, o jornal Plural já havia verificado informação falsa sobre um projeto atribuído ao governo federal e supostas invasões de casas pelo MST e MTST no Paraná.

O Comprova também já checou informações falsas sobre o MST e Lula quanto ao agronegócio e ataque a uma plantação de mamão no Espírito Santo. Outros conteúdos investigados pelo projeto envolveram o deputado Guilherme Boulos, acusado indevidamente de cobrar aluguel de moradores sem-teto e de ter dito que os paulistanos deveriam receber pessoas em situação de rua nas suas casas.

Comprova Explica

Investigado por: 2023-05-15

Saiba o que é e como funciona o Fundo Amazônia, alvo de desinformação nas redes

  • Comprova Explica
Comprova Explica
A seção Comprova Explica detalha o que é o Fundo Amazônia, mecanismo para captar recursos que são utilizados para a preservação da floresta. O tema, que costuma ser associado de forma enganosa a suposta “venda da Amazônia”, é frequentemente alvo de desinformação nas redes sociais.

Conteúdo analisado: Conteúdos publicados nas redes sociais que desinformam sobre o Fundo Amazônia.

Comprova Explica: O Fundo Amazônia foi criado em 2008, durante o segundo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), como um mecanismo de captação de doações para prevenir, monitorar e combater o desmatamento na região amazônica. A captação de recursos, que vêm da Noruega, Alemanha e da Petrobras, só ocorre se for comprovada a redução do desmatamento. 

Gerido pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), o Fundo já recebeu, desde sua criação, R$ 3,3 bilhões em doações. O primeiro repasse foi feito em 2009 pela Noruega – principal doadora do Fundo. Os rendimentos financeiros somam R$ 2,2 bilhões, totalizando um montante de R$ 5,5 bi arrecadados.

Em 2019, porém, o mecanismo foi abandonado pelo governo de Jair Bolsonaro (PL), e as destinações de recursos ao Fundo cessaram. À época, o então ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, afirmou ter encontrado “indicativos de disfuncionalidades” em contratos com ONGs. Três anos depois, em outubro de 2022, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que o Fundo deveria ser reativado em até 60 dias, o que ocorreu em 1º de janeiro de 2023, no primeiro dia do mandato de Lula em sua terceira gestão como presidente.

Diante do vai e vem e dos casos de desinformação que envolvem o Fundo, a seção Comprova Explica se propõe a detalhar o mecanismo.

Como verificamos: O Comprova consultou o site do próprio Fundo Amazônia e reportagens da imprensa nacional (Nexo, G1, Folha, CNN e Agência Brasil, UOL). Também entrou em contato com a assessoria do BNDES para solicitar dados de investimentos ao longo dos anos e outras informações.

O que é e quando foi criado o Fundo Amazônia?

O Fundo Amazônia é um mecanismo de captação de recursos para apoio a ações de prevenção, monitoramento e combate ao desmatamento, além de iniciativas de promoção do uso sustentável das florestas da Amazônia Legal – área que engloba nove Estados brasileiros (Acre, Amapá, Amazonas, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima, Tocantins e parte do Estado do Maranhão) e corresponde a 59% do território nacional.

Também podem ser apoiadas pelo fundo ações de controle do desmatamento desenvolvidas no restante do Brasil e em países tropicais. Esse investimento é limitado a 20% do total de recursos. Apenas um projeto internacional recebe apoio do Fundo, os beneficiários são países membros da OTCA (Bolívia, Colômbia, Equador, Guiana, Peru, Suriname, Venezuela, além do Brasil).

Proposto pelo governo brasileiro durante a Conferência Mundial do Clima em 2006 (COP-12), o Fundo foi criado, efetivamente, dois anos depois, em 1° de agosto de 2008, sob o governo Lula, por meio do decreto nº 6527.

O programa surgiu para arrecadar recursos financeiros junto a países considerados desenvolvidos no intuito de preservar a maior floresta tropical do mundo e, consequentemente, conter o avanço das mudanças climáticas.

Desde então, até 28 de fevereiro deste ano, o Fundo destinou R$ 1,5 bilhão a 102 projetos (concluídos ou em andamento), conforme o site oficial. O valor total contratado (já reservado para aplicação em ações) é de R$ 1,74 bilhão. A maioria das iniciativas é realizada em parceria com os Estados e com o terceiro setor (ONGs):

| Print do site oficial do Fundo Amazônia, feito em 12/05/2023.

Os projetos foram aprovados entre 2009 e 2018. A maior fatia do valor foi destinada ao terceiro setor, a segunda maior a projetos desenvolvidos com Estados, e a terceira, com a União.

Ao todo, conforme consta no site do Fundo Amazônia, são 384 instituições envolvidas, 195 unidades de conservação apoiadas, 59 mil indígenas diretamente beneficiados e 207 mil pessoas favorecidas com atividades sustentáveis.

Além disso, com recursos do mecanismo, foram promovidas 1,7 mil missões de fiscalização ambiental.

De acordo com a assessoria de imprensa do BNDES, apenas uma fatia dos recursos doados foi aplicada porque “o Fundo trabalha com projetos” e esses projetos “têm que ser selecionados, desenvolvidos e prestar contas”. Em entrevista recente à GloboNews, a diretora e integrante do Conselho de Administração do BNDES, Tereza Campello, classificou como “pulverizadas” as ações realizadas até então e acrescentou que “um salto” é necessário a partir de agora.

Quem são os financiadores?

O Fundo Amazônia recebe doações de três entidades: do governo da Noruega, da Alemanha e da Petrobras. Ao todo, desde que foi criado, o Fundo recebeu cerca de R$ 3,3 bilhões, sendo a maior parte, R$ 3,1 bilhões, repassada pela Noruega. Outros R$ 192 milhões foram doados pela Alemanha, e R$ 17 milhões, pela Petrobras.

De acordo com a assessoria de imprensa do BNDES, responsável pela gestão do Fundo, considerando os rendimentos financeiros, o valor total se aproxima de R$ 5,5 bilhões em doações.

A captação de recursos para o Fundo está condicionada à redução das emissões de gases de efeito estufa oriundas do desmatamento, ou seja, para obter recursos, é preciso comprovar a redução do desmatamento na Amazônia.

Com base na redução das emissões, calculadas pelo Ministério do Meio Ambiente e validadas pelo Comitê Técnico do Fundo Amazônia (CTFA), composto por cientistas, o BNDES fica autorizado a captar doações e emitir diplomas de reconhecimento à contribuição dos doadores.

Em cada diploma, são identificados o doador e a sua parcela de contribuição para o esforço de redução das emissões de gás carbônico. Os documentos são nominais, intransferíveis e não geram direitos ou créditos de nenhuma natureza aos doadores.

Período das doações

O governo da Noruega passou a apoiar o Fundo em 2009, um ano após sua criação, e seguiu fazendo doações até 2018 – ano anterior ao “revogaço” de conselhos federais pelo governo Jair Bolsonaro que acabou por inviabilizar os repasses de recursos a projetos ambientais.

Até 2023, os valores permaneceram congelados, por decisão dos países. Ao anunciar a decisão, em 2019, a ministra alemã do Meio Ambiente, Svenja Schulze, disse que “a política do governo brasileiro na Região Amazônica deixa dúvidas se ainda se persegue uma redução consistente das taxas de desmatamento” e afirmou que o financiamento poderia vir a ser retomado caso a questão fosse esclarecida.

Os recursos voltaram a ser disponibilizados somente este ano, com a posse de Lula.

Os desembolsos feitos pelo governo norueguês são efetuados anualmente, semestralmente, ou em menor tempo, mediante solicitação do BNDES. Já com a Petrobras, foram 29 contratos de doação entre 2011 e 2018. A Alemanha apoiou o Fundo Amazônia entre 2010 e 2017.

Atualmente, o mecanismo já está preparado para receber doações de governos estrangeiros e empresas nacionais e está se estruturando para receber doações de instituições multilaterais, ONGs e pessoas físicas.

Contribuições futuras

Em fevereiro deste ano, a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, afirmou que França, Espanha e União Europeia manifestaram interesse em doar recursos ao Fundo Amazônia. Mais recentemente, outros dois países fizeram anúncios no mesmo sentido: Estados Unidos e Reino Unido.

Em abril, o presidente norte-americano, Joe Biden, disse que, se houver aprovação do Congresso, o país deve destinar US$ 500 milhões ao mecanismo nos próximos cinco anos. Já o primeiro-ministro britânico, Rishi Sunak, antecipou em maio que o Reino Unido pretende contribuir com £ 80 milhões (R$ 500 milhões) para as iniciativas de combate ao desmatamento.

Como é a governança do fundo?

O Fundo Amazônia é gerido pelo BNDES, que conta com dois comitês e também se incumbe da captação de recursos, da contratação e do monitoramento dos projetos e ações apoiados.

O Comitê Orientador do Fundo (COFA) tem a atribuição de determinar suas diretrizes e acompanhar os resultados obtidos. Ele é composto por representantes do governo federal, dos Estados que compõem a Amazônia Legal e da sociedade civil.

Já o Comitê Técnico (CTFA), nomeado pelo Ministério do Meio Ambiente, tem o papel de atestar as emissões oriundas de desmatamentos na Amazônia. Ambos foram restabelecidos por meio do decreto nº 11.368, de 1º de janeiro de 2023.

O mecanismo passa, anualmente, por dois processos de auditoria. O primeiro refere-se à auditoria contábil, que ocorre no âmbito da auditoria externa dos demonstrativos financeiros do próprio BNDES, e o segundo, à auditoria de cumprimento, realizada por empresa de serviços especializados em auditoria externa independente. Os relatórios estão disponíveis no site do Fundo.

Quem recebe os recursos? E qual a contrapartida?

Como já informado, os recursos são destinados a projetos de prevenção, monitoramento e combate ao desmatamento, além de ações de conservação e uso sustentável do bioma amazônico. Até 20% dos recursos podem ser usados para outros biomas.

Os projetos apoiados pelo Fundo podem ser propostos pelos governos federal, estadual e municipal, por organizações sem fins lucrativos, associações civis, instituições multilaterais e por empresas.

Todas as propostas precisam observar as Diretrizes e Critérios do Fundo Amazônia e os focos de apoio estabelecidos pelo COFA, além das diretrizes do Plano de Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal (PPCDAM) e da Estratégia Nacional para REDD+ (ENREDD+).

Entre os projetos apoiados pelo Fundo, a maioria está voltada a terras indígenas e unidades de conservação, parte inclui o Cadastro Ambiental Rural (CAR), e outra parte envolve assentamentos e combate a incêndios e queimadas.

| Projeto “Bombeiros Florestais” do Corpo de Bombeiros Militar de Mato Grosso | Crédito: Divulgação/CBMMT

Uma iniciativa no Acre, já concluída, por exemplo, prevê o manejo e a produção agroflorestal em comunidades tradicionais e indígenas, o monitoramento e controle do território, e o fortalecimento da organização comunitária local. Outra, concluída nos estados do Pará e Amapá, promoveu a gestão territorial e ambiental sustentável em seis terras indígenas, visando contribuir para a redução do desmatamento nas regiões.

Ainda em andamento, um projeto apoiado pelo mecanismo pretende promover a produção e a disseminação de conhecimentos e tecnologias voltados para a recuperação, a conservação e o uso sustentável do bioma Amazônia, nos estados do Acre, Amapá, Amazonas, Maranhão, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins.

Outros projetos ainda incluem ações voltadas para a proteção das Unidades de Conservação (UCs) estaduais, consolidação do Cadastro Ambiental Rural e o fortalecimento da gestão ambiental municipal para contribuir no combate ao desmatamento e à degradação florestal em Rondônia; o fortalecimento do extrativismo e da agricultura familiar em comunidades quilombolas do Pará; e a aquisição de aeronaves, veículos e equipamentos de apoio para a Base de Operações Aéreas e Terrestres do Corpo de Bombeiros Militar de Mato Grosso, visando ações de monitoramento, prevenção e combate ao desmatamento decorrentes de incêndios florestais e queimadas não autorizadas.

Por que o fundo foi suspenso no governo Bolsonaro?

Em abril de 2019, cem dias depois de assumir a Presidência, Bolsonaro fez um “revogaço” de 250 decretos com o objetivo, segundo o governo, de simplificar a legislação e extinguir normas consideradas desnecessárias. Uma das medidas foi acabar com alguns conselhos federais e, entre eles, foram extintos o COFA e o CTFA. O congelamento dos recursos do Fundo fragilizou órgãos de fiscalização ambiental como o Ibama, mostrou a Pública.

A decisão foi tomada após o então ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, afirmar ter encontrado “indicativos de disfuncionalidades” em contratos de ONGs, como escreveu o UOL. “Entre as irregularidades elencadas por Salles estariam: alto percentual de contratos sem licitação, falta de comprovação das atividades, folhas de pagamento que consomem a maior parte do valor dos contratos, prestação de contas incompletas e contratos com entidades impedidas de fechar contratos com o estado”, informa a reportagem.

Ainda segundo o texto, a Embaixada da Alemanha e entidades ambientais negaram as acusações do ministro sobre o Fundo.

Mais de um ano depois, em outubro de 2020, Salles disse que a União não havia recriado o COFA porque os países europeus doadores rejeitaram mudanças no modelo de gestão dos recursos, como informou o G1. Uma das propostas do governo era extinguir a necessidade de decisão unânime no colegiado para uso do fundo.

O que mudou na gestão de Lula?

Em 27 de outubro de 2022, ainda na gestão Bolsonaro, o STF determinou que o governo federal deveria reativar, em até 60 dias, o Fundo. Como a Folha noticiou, a decisão foi resultado da análise pelo plenário de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO), protocolada no órgão pelos partidos PSB, PSOL, PT e Rede Sustentabilidade.

“Na ocasião, a maioria dos ministros concluiu pela inconstitucionalidade da extinção dos comitês, pois configuraria omissão do governo em seu dever de preservar a Amazônia”, informou a Agência Brasil.

Jair Bolsonaro deixou o governo sem reativar o Fundo, mas, em 1º de janeiro de 2023, cumprindo uma promessa de campanha, Lula editou no primeiro dia de seu mandato decretos ligados à política ambiental, retomando o Fundo Amazônia.

Ainda segundo a Folha, a ministra Marina Silva “aposta no uso de recursos do Fundo Amazônia para recompor o orçamento do controle ambiental do ministério” e a ministra dos Povos Indígenas, Sônia Guajajara, também já declarou que a pasta vai precisar de verbas do fundo.

Por que explicamos: O Comprova Explica tem a função de esclarecer temas importantes para que a população compreenda assuntos em discussão nas redes sociais que podem gerar desinformação, como o Fundo Amazônia. Criado em 2008, o mecanismo existe há cinco governos, mas já foi extinto e recentemente reativado. Por isso pode gerar dúvidas e tornar-se material para conteúdos enganosos ou falsos. Pensando nisso, a seção ajuda os leitores a formar opinião sobre o tema baseados em informações verdadeiras, apuradas com rigor jornalístico.

Outras checagens sobre o tema: Em checagens anteriores, o Comprova mostrou que vídeo engana ao dizer que Lula teria vendido a Amazônia a mineradora em troca de dinheiro para o Fundo Amazônia. Em 2019, verificação de um conteúdo semelhante comprovou que Lula não vendeu solo da Amazônia para empresa norueguesa em documento secreto. O Comprova demonstrou também que vídeo engana ao distorcer falas de Lula sobre Amazônia e sugerir ameaça à soberania nacional e que retirada de gado de áreas rurais tem a ver com desmatamento ilegal, e não com suposta venda da Amazônia.

Política

Investigado por: 2023-05-11

Post engana ao associar vídeo de 2022 a início de movimento contra Lula

  • Enganoso
Enganoso
Postagem enganosa compartilha vídeo antigo de manifestação golpista em frente ao Forte do Pinheirinho, em Curitiba (PR), como se fosse atual. As imagens que aparecem no vídeo exibem cenas de manifestações ocorridas entre 2 e 5 de novembro de 2022, após a divulgação da vitória de Lula. Em protesto contra o resultado das eleições presidenciais, bolsonaristas reuniram-se em acampamentos instalados em frente a quartéis do Exército.

Conteúdo investigado: Legenda de um vídeo que descreve manifestação de novembro de 2022 em frente ao Forte do Pinheirinho, em Curitiba (PR), como atual e motivada por um suposto novo movimento contra o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O autor do post, publicado em 3 de maio de 2023, escreveu “Começou o movimento Derruba Lula” e “Fora Lula ladrão” sobre as imagens do ato golpista.

Onde foi publicado: TikTok.

Conclusão do Comprova: É enganoso um post publicado no TikTok que apresenta vídeo de uma manifestação de novembro de 2022 como se fosse um evento atual. O protesto, realizado em frente ao Comando da 5ª Região Militar do Exército, o Forte do Pinheirinho, em Curitiba (PR), era contrário à eleição de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e a favor de um golpe de Estado que mantivesse o então presidente Jair Bolsonaro (PL) no poder. Atos semelhantes foram registrados em diversos municípios brasileiros e chegaram ao ápice com os eventos de 8 de janeiro em Brasília. O post investigado engana ao tirar de contexto o evento de novembro, descrevendo-o como se fosse parte de uma nova mobilização nomeada “Movimento Derruba Lula”.

As imagens mostram a fachada do quartel do Exército no Forte do Pinheirinho, um dos três que tiveram as proximidades ocupadas por acampamentos golpistas na capital paranaense. Todos eles foram desmobilizados no dia 9 de janeiro deste ano, após decisão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF).

De acordo com a Secretaria Municipal de Defesa Social e Trânsito de Curitiba, não há registro de manifestações recentes desta natureza em toda a capital paranaense. O quartel militar do Forte do Pinheirinho encontra-se sem qualquer acampamento ou ocupação. Isso confirma que o vídeo em questão foi filmado anteriormente, durante os atos ocorridos em 2022, sem se tratar de um novo movimento.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Até o dia 11 de maio, o vídeo publicado no TikTok tinha 664,9 mil visualizações no perfil, com 59,8 mil curtidas, cerca de 6,2 mil comentários e 16,5 mil compartilhamentos.

Como verificamos: O Comprova verificou as imagens do vídeo e o conteúdo do discurso em áudio que completa os registros. O primeiro passo foi identificar o local em que o vídeo havia sido gravado e a data da gravação ou mesmo o vídeo original utilizado para compor a peça de desinformação. Para isso, foram usados o Google Lens, o Invid e o Search by Image. Também foi feita a comparação com imagens de manifestações no local em datas diferentes, sobretudo com relação ao clima no dia e às faixas presentes no carro de some.

O Comprova, então, questionou a Prefeitura de Curitiba sobre a existência de ocupações no Forte Pinheirinho e se houve novas manifestações no local desde a desmobilização do acampamento em 9 de janeiro. Foi feita também pesquisa nas redes sociais e em sites de busca sobre algum movimento “Derruba Lula”, que não redundou em resultados positivos para tal.

Vídeo é de movimento golpista de 2022

O vídeo checado retrata uma multidão de pessoas, muitas empunhando bandeiras brasileiras e escutando um discurso. A narração afirma que as cidades de Brasília e Rio de Janeiro estão paradas e que o movimento estaria apenas começando. Um homem, que não foi identificado, diz que os movimentos “dão o recado necessário”, mas que não adiantaria apenas postar nas redes sociais, pois elas estariam bloqueadas. Nas faixas visualizadas nas imagens, estão escritos os dizeres “Intervenção Federal” e “SOS Forças Armadas – Todo poder emana do povo”.

O principal indicativo do local em que o vídeo foi gravado está na filmagem de uma fachada em que havia a palavra “Forte”. Além disso, a partir da presença das faixas sobre “Intervenção federal” e “SOS Forças Armadas”, motes que ditaram os acampamentos golpistas de 2022, e da vegetação do local, com a presença de araucárias, foi confirmado que a manifestação ocorreu nas proximidades do Comando da 5ª Região Militar do Exército – Forte Pinheirinho, em Curitiba (PR).

O acampamento no local começou no final das eleições presidenciais em 2022, no dia 30 de outubro, e foi desmobilizado na tarde de 9 de janeiro de 2023, após decisão do ministro do STF Alexandre de Moraes. Neste dia, inclusive, jornalistas foram agredidos por ocupantes do acampamento ao registrar a ação da Polícia Militar do Paraná na retirada das estruturas.

A comparação de imagens das manifestações no Forte do Pinheirinho levou ao entendimento de que o vídeo em questão foi filmado entre os dias 2, quando houve a primeira manifestação com a presença também de pessoas que não estavam acampadas, e 5 de novembro do ano passado.

Isso se dá ao comparar as faixas presentes no carro de som e as suas posições, já que as imagens gravadas em posições semelhantes a partir do dia 6 mostram uma faixa branca com dizeres em vermelho que não aparece no vídeo original, como pode ser visto em vídeos também divulgados no TikTok (aqui) e no Twitter (aqui). Gravações em dias seguintes, como no dia 15 e 21 de novembro, mantêm essa faixa.

As placas tem os dizeres: “O poder emana do povo! Pátria amada Brasil”, “SOS Forças Armadas / O poder emana do povo”, “Intervenção Federal! Contra o socialismo” e “Intervenção federal”. Todas elas também aparecem na gravação investigada, dando a entender que se trata, de fato, da mesma ocasião. Também foi verificada a presença de uma mesma banca de churros e pastéis no vídeo analisado e nas filmagens de novembro passado.

A Secretaria Municipal de Defesa Social e Trânsito de Curitiba informou ao Comprova que não há registro de manifestações recentes desta natureza na cidade. O Comando da 5ª Região Militar, com sede no Forte do Pinheirinho, confirmou que não houve registro de manifestações em frente ao local até o dia 11 de maio deste ano.

O que diz o responsável pela publicação: Contatado pelo Instagram, o autor do post desinformativo não respondeu até a conclusão desta matéria. Ele se identifica no perfil como integrante do exército brasileiro e segurança particular. Na rede social, ele também vende um curso que descreve como “antiterrorismo” – que, de acordo com o site de venda, foi recentemente liberado a civis. Outros vídeos em seu perfil também têm teor anti-Lula e pró-Bolsonaro.

O que podemos aprender com esta verificação: A utilização de vídeos antigos e fora do contexto é uma prática comum de desinformadores. Desconfie ao se deparar com uma gravação sem informações com relação à data da filmagem e localização. Procure saber, ao ver um vídeo, qual o contexto daquela gravação e, quando se tratar de uma manifestação grandiosa, pesquise na imprensa profissional se o movimento de fato existiu.

Normalmente, grandes movimentos populares geram notícias e informações sobre a quantidade de pessoas, o motivo do protesto e até mesmo se os atos causaram problemas no trânsito ou na vizinhança. O uso de legendas sensacionalistas e genéricas também são utilizadas para reforçar o discurso que o desinformador que passar a quem recebe o vídeo, o que também deve ser levado em consideração ao ver as filmagens.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: Em dezembro de 2022, o Comprova mostrou que, ao contrário do que diziam certos post, não é possível afirmar que os atos antidemocráticos contra resultado das eleições foram o maior protesto da História. Em abril de 2023, o Comprova mostrou que o FBI não está no Brasil para investigar os atos antidemocráticos de 8 de janeiro, diferentemente do que afirma um vídeo nas redes sociais.

Política

Investigado por: 2023-05-11

Janja não disse que “compra em libra” enquanto Michelle “fala libras”; post é sátira

  • Sátira
Sátira
A primeira-dama Rosângela Lula da Silva, a Janja, não disse que faz compras em libra (moeda estrangeira) enquanto a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro fala Libras (Língua Brasileira de Sinais). Post de perfil satírico no Twitter com essa afirmação está sendo entendido como verdadeiro, mas não há registro de fala de Janja nesse sentido. Memes sobre o assunto começaram a ser compartilhados após a primeira-dama ser vista fazendo compras em lojas de grife na Europa.

Conteúdo investigado: Tuíte traz uma foto de Janja com a seguinte legenda: “Elegância: Janja diz que enquanto Michelle Bolsonaro fala em Libras, ela faz compra em libras”.

Onde foi publicado: Twitter, TikTok, Facebook e Instagram.

Conclusão do Comprova: Um tuíte satírico do perfil Falha de S.Paulo no Twitter – que parodia o jornal Folha de S.Paulo – está sendo entendido como verdadeiro nas redes sociais (exemplos: 1, 2 e 3). Trata-se de post humorístico que foi mal compreendido por usuários. Na descrição, o perfil se identifica como “um jornal a serviço dos memes” e pede que os seguidores não levem a sério aquilo que leem na conta.

Os memes envolvendo compras de Janja começaram a se espalhar quando ela foi vista em uma loja de grife em Lisboa, Portugal, durante viagem presidencial ao país em abril deste ano. Na ocasião, veículos de comunicação como Estadão, Folha de S.Paulo e CNN divulgaram o fato.

A associação à libra, moeda oficial do Reino Unido, foi feita em maio, quando a primeira-dama acompanhou o presidente, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), em viagem a Londres, onde o casal participou da cerimônia de coroação do Rei Charles III.

Já a citação a Michelle Bolsonaro é feita porque a ex-primeira-dama é conhecida por dominar a Língua Brasileira de Sinais, Libras.

Não há qualquer registro em veículos de imprensa profissionais informando que Janja tenha feito afirmação semelhante à veiculada no post. A assessoria de imprensa da primeira-dama declarou ao Comprova que “não há registro algum, pois Janja nunca fez comentário sequer semelhante a este”.

O Comprova classifica como sátira memes, paródias e imitações publicadas com intuito de fazer humor e verifica conteúdos desta natureza quando percebe que há pessoas tomando-os por verdadeiros.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Até 11 de maio de 2023, o tuíte satírico tinha acumulado 609 mil visualizações e 12,9 mil curtidas.

Como verificamos: O primeiro passo foi buscar no Google se a primeira-dama havia feito qualquer afirmação semelhante à apresentada no tuíte. Em seguida, analisamos o perfil que fez a postagem e tentamos contato. Também pesquisamos notícias sobre Janja fazer compras no exterior e sobre Michelle discursar em Libras. Por fim, procuramos a assessoria de imprensa da primeira-dama.

O que diz o responsável pela publicação: O Comprova procurou a conta Falha de S.Paulo por meio de mensagem direta no Instagram, mas não obteve resposta até a conclusão da reportagem.

O que podemos aprender com esta verificação: É importante analisar a afirmação feita principalmente quando ela soa absurda. Neste caso, chamaria a atenção se Janja tivesse citado o nome da ex-primeira dama em tom de deboche ao assumir gastar dinheiro. Sendo ela uma representante pública, a notícia seria veiculada em diversos veículos de imprensa profissionais e a repercussão nas redes sociais seria imensa. Outra dica é verificar as informações fornecidas pelo perfil que fez a publicação. No caso aqui verificado, por exemplo, a conta explica na própria descrição que dissemina memes e faz paródia de sites de notícia.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: O Comprova já verificou outros conteúdos de humor que acabaram gerando desinformação. Recentemente, o projeto mostrou que um post satiriza deputado que votou contra igualdade salarial entre homem e mulher. No ano passado, demonstrou que“advogado do PT” em vídeo do Kwai é personagem de humor e que é sátira imagem da torcida do Liverpool atribuída a encontro do mesmo partido.

Política

Investigado por: 2023-05-10

Vídeo engana ao dizer que ministro Barroso quer socializar investimentos de brasileiros

  • Enganoso
Enganoso
É enganoso um vídeo no YouTube que afirma que o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luís Roberto Barroso quer socializar os investimentos dos brasileiros. O vídeo retira de contexto trechos de uma fala de Barroso durante sessão plenária no STF no dia 20 de abril, que votava uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) propondo a substituição do índice de correção do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). Barroso não propôs taxar os investimentos dos brasileiros para que eles financiem projetos sociais, e sim remunerar devidamente os trabalhadores pelo uso do FGTS no financiamento desses projetos de interesse coletivo.

Conteúdo investigado: Vídeo no qual um homem alega que o ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), sugere taxar investimentos dos brasileiros. No conteúdo, o responsável pela publicação comenta um trecho retirado do contexto original de um discurso do magistrado.

Onde foi publicado: YouTube e WhatsApp.

Conclusão do Comprova: É enganoso um vídeo que alega que o ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), propôs socializar os investimentos de pessoas físicas no mercado financeiro para que o Estado faça investimentos sociais. A peça de desinformação tira de contexto imagens do discurso feito pelo magistrado no dia 20 de abril de 2023, durante sessão plenária no STF que discutiu a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5090.

Requerida pelo partido Solidariedade em 2014, a ação no Supremo questiona o uso da Taxa Referencial (TR) como critério para o reajuste nos valores do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS). O valor do FGTS é corrigido anualmente pela TR acrescida de 3% ao ano.

Na prática, a ADI argumenta que o fato de o FGTS ser reajustado com base na TR + 3% faz com que haja perdas do benefício em relação à inflação. Como os recursos do Fundo são usados, a título de empréstimo, para financiar obras de interesse coletivo, Barroso disse em seu voto não considerar justo que o trabalhador receba uma remuneração baixa para financiar os projetos governamentais, e defendeu que o rendimento seja, no mínimo, igual ao da caderneta de poupança.

Ao citar a classe média alta, o ministro não propôs que os investimentos desse grupo fossem socializados, apenas fez uma comparação sobre as reações das pessoas caso essa regra aplicada ao FGTS impactasse aqueles que fazem altos investimentos: “O mundo ia cair”, disse Barroso, acrescentando que surgiriam acusações de “confisco, violação ao direito de propriedade e coletivismo”.

O Comprova classifica como enganoso todo conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. O vídeo investigado alcançou 7 mil visualizações no YouTube até a manhã de 10 de maio de 2023.

Como verificamos: Primeiramente, o Comprova buscou no Google os trechos da fala de Barroso usados no vídeo para entender quando e em que contexto as afirmações haviam sido feitas. Após identificar que a fala havia sido tirada de um discurso do ministro durante sessão plenária no dia 20 de abril de 2023, o Comprova localizou o vídeo original e transcreveu a fala dele na íntegra.

O que Barroso realmente disse

A fala do ministro Barroso aconteceu no segundo bloco da sessão plenária do STF, na tarde do dia 20 de abril de 2023, durante o julgamento de uma ADI que questionava os critérios para reajuste no valor do FGTS dos trabalhadores brasileiros. Após a abertura da segunda parte da sessão pela presidente do Supremo, ministra Rosa Weber, Barroso começa a apresentar seu voto e fala por cerca de 20 minutos, até chegar ao trecho que foi distorcido no vídeo investigado.

A fala na íntegra está disponível no canal oficial do STF no YouTube, e o trecho, a partir do ponto distorcido, está transcrito a seguir, começando no minuto 25:04 do vídeo:

“Aqui, eu pediria, presidente, às pessoas de classe média alta, uma gota de empatia, que não é difícil, nesse caso. Imagine a alta classe média brasileira, que investe em renda fixa, em fundos de ações, em fundos de multimercado e em câmbio e tem lá os seus investimentos, se de repente viesse uma regra que dissesse assim: todas essas suas aplicações terão uma rentabilidade pré-determinada abaixo da poupança porque o país está precisando fazer investimentos sociais importantes. O que que aconteceria se hoje se editasse esta norma dizendo isso? O mundo ia cair. ‘Confisco, violação ao direito de propriedade, coletivismo’, daí para baixo. Pois é exatamente isso que está acontecendo aqui, é exatamente isso que se faz aqui. Uma aplicação financeira compulsória muito semelhante à poupança em que os cotistas são forçados a aceitar uma remuneração extremamente baixa e inferior a qualquer outra aplicação de mercado sem ter liquidez. Porque a poupança, o titular da poupança pode tirar o dinheiro lá e colocar em ações, se ele quiser, colocar em câmbio, mas o titular do FGTS não pode. Portanto, o tomador desse dinheiro, seja a União, seja a Caixa que faz a gestão, não corre nenhum risco de saque desordenado, o dinheiro fica lá paradinho e a regra normalmente no mercado financeiro é: quanto maior… quanto menor a liquidez, maior a remuneração, e não ao contrário. Portanto, o que ocorre aqui, respeitando todas as posições contrárias, é uma funcionalização da propriedade privada dos trabalhadores – que também têm direito à propriedade privada – em circunstâncias que, a meu ver, ultrapassam o limite do que seria razoável, porque impõe a um grupo hipossuficiente o custo integral de uma política de interesse coletivo sem remuneração condizente com essa situação. (Confira aqui [PDF] a transcrição completa do trecho verificado pelo Comprova).

Classe média alta foi usada na fala para comparar reações

Diferentemente do que afirma o autor do vídeo, Barroso não propôs socializar os investimentos de pessoas físicas. O que o ministro defende em seu voto é que não é justo que o dinheiro do FGTS, uma propriedade privada do trabalhador, seja usado pela União para o financiamento de projetos de interesse público sem que o dono do dinheiro seja remunerado adequadamente. Ou seja, ele discorda que o FGTS possa ter um rendimento pré-determinado abaixo do rendimento da caderneta de poupança.

A classe média alta brasileira, que costuma fazer outros tipos de investimentos, é citada pelo ministro não para que socialize seus investimentos e passe a financiar projetos de interesse coletivo, mas para que se coloque no lugar do trabalhador e possa compreender o que está sendo proposto.

Para comparação, Barroso argumenta que se o dinheiro investido pela classe média em fundos de ações, renda fixa, ações de mercado e câmbio, por exemplo, passasse a ter rendimento pré-determinado abaixo da poupança, como ocorre com o FGTS do trabalhador, “o mundo ia cair”.

O ministro diz achar correto que o dinheiro do FGTS seja usado para o financiamento de projetos de interesse coletivo, mas defende uma remuneração, no mínimo, igual à da caderneta de poupança: “O que é errado é usar uma remuneração baixíssima, fazendo com que o trabalhador financie os projetos que são governamentais”, diz. “Simplesmente não é legítimo impor a um grupo social, e precisamente um grupo vulnerabilizado, o ônus de financiar com o seu dinheiro, porque isso não há dúvida, os projetos, as políticas públicas governamentais”, completa.

Guia de termos

Diante do debate em torno das perdas do FGTS em relação à inflação, o Comprova preparou um guia para esclarecer os significados das atuais taxas aplicadas ao fundo e de possíveis mudanças no benefício:

O que é FGTS

O Fundo Garantidor por Tempo de Serviço é um benefício criado em 1967 para proporcionar estabilidade ao trabalhador contratado pelo regime da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT). O FGTS é alimentado pelo empregador, que tem a obrigação de pagar mensalmente ao trabalhador o valor equivalente a 8% do salário acordado entre as partes. Esse recurso pode ser sacado pelo trabalhador em situações específicas, como nos casos de demissão sem justa causa, compra da casa própria e aposentadoria.

Taxa Referencial

Conhecida pela sigla TR, a Taxa Referencial corresponde a uma taxa de juros aplicada a algumas modalidades de investimentos, como a caderneta de poupança. A Taxa Referencial também é usada como reajuste do FGTS. A TR é calculada pelo Banco Central (BC). Em seu site, o BC disponibiliza ao cidadão uma calculadora para a correção de um valor pela TR.

Inflação

A palavra inflação pode ser definida por um cenário de alta de preços dos produtos. A inflação oficial – usada pelo governo – é calculada mensalmente pelo Instituto Geográfico Estatístico Brasileiro (IBGE) por meio do Índice de Preço ao Consumidor Amplo (IPCA+). Para realizar o cálculo da inflação, o IPCA considera uma cesta de 377 produtos e serviços analisada em 16 áreas urbanas.

Na cesta analisada para compor o IPCA, o IBGE analisa os preços em setores como alimentação e bebidas, habitação, artigos de residência, vestuário, transportes, saúde e cuidados pessoais, despesas pessoais, educação e comunicação. Na cesta do IBGE, cada área listada acima apresenta um peso diferente. Alimentação e bebidas, por exemplo, é o setor com maior peso (19,3%). Comunicação, menor (5,7%).

O que diz o responsável pela publicação: Uma mensagem foi enviada ao e-mail do proprietário do canal que difundiu a desinformação no YouTube, mas não houve resposta até o fechamento desta checagem.

O que podemos aprender com esta verificação: É comum que conteúdos desinformativos que buscam atacar autoridades façam uso da imagem e da voz da própria vítima da desinformação para tentar convencer o público de uma tese. Nestes casos, é importante ficar atento ao que aparece no conteúdo: em geral, são usados recortes com trechos curtos de uma fala, que não mostram o raciocínio completo da autoridade, apenas servem para confirmar o que o autor do conteúdo desinformativo deseja destacar.

Neste caso, uma busca simples por uma frase que aparece no vídeo leva ao conteúdo original e basta assisti-lo para compreender que a fala do ministro Barroso foi tirada de contexto.

Outra estratégia usada por disseminadores de desinformação é alegar que a imprensa não divulgou nada a respeito daquela suposta informação importantíssima – mais um indício de que o conteúdo é duvidoso. Afinal, se um ministro do STF tivesse proposto socializar investimentos, isso certamente seria notícia.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: O Projeto Comprova já desmentiu que o ministro Barroso tenha prometido atuar contra a reeleição de Bolsonaro, mostrou que um vídeo de 2021 foi editado para afirmar que ele era contra o PT; também já mostrou que era enganoso o vídeo que dizia que o STF queria barrar cristãos na política.

Política

Investigado por: 2023-05-09

Post satiriza deputado que votou contra igualdade salarial entre homem e mulher

  • Sátira
Sátira
Não há registro do deputado federal Deltan Dallagnol (Podemos-PR) ter falado que “mulheres devem se resignar em ganhar menos” porque “está na Bíblia" ao justificar seu voto contra a aprovação do projeto de lei que determina que homens e mulheres tenham igualdade salarial. Post satírico no Twitter foi interpretado como verdadeiro e reproduzido por diversos perfis nas redes sociais. Não há registro algum de que o deputado tenha se manifestado sobre o tema.

Conteúdo investigado: Postagem no Twitter diz que o deputado federal Deltan Dallagnol (Podemos-PR) justificou seu voto contra a igualdade salarial entre homens e mulheres dizendo que “não era de Deus”. Segundo o post, ele teria afirmado que “mulheres devem se resignar em ganhar menos. A submissão ao homem deve ser até na remuneração. Está na Bíblia.”

Onde foi publicado: Twitter

Conclusão do Comprova: Um texto satírico do perfil @GloboFakeNews envolvendo o deputado federal Deltan Dallagnol (Podemos-PR) está sendo interpretado como verdadeiro nas redes sociais (exemplo 1, exemplo 2). Nele, o autor diz que o parlamentar justificou seu voto contra a igualdade salarial entre homens e mulheres dizendo que “não era de Deus” e que mulheres “deveriam se resignar em ganhar menos”.

O tuíte faz referência ao Projeto de Lei 1085/23, do Poder Executivo, que equipara salários de homens e mulheres em cargos com a mesma função ou de igual valor. O texto foi aprovado na Câmara e segue para análise no Senado.

Apenas 36 parlamentares foram contra a aprovação na Câmara, e 325 foram favoráveis. Entre aqueles contrários, está o ex-procurador Deltan Dallagnol. Contudo, o Comprova não encontrou registro de que ele tenha justificado seu voto da forma como diz o tuíte ou de qualquer outra.

Tampouco foram encontradas postagens nas redes sociais de Dallagnol a respeito do projeto de lei. O registro da sessão do dia 4 de maio, quando ocorreu a aprovação, mostra que ele sequer discursou naquela ocasião. Ainda assim, o Comprova contatou a assessoria de imprensa do deputado, que confirmou que “o plenário foi virtual, então, ele nem falou na Tribuna”.

Uma análise do perfil @GloboFakeNews deixa evidente que trata-se de postagem com intenção satírica. O autor diz na bio do perfil que publica “a verdade revelada através da fake news”. Além disso, há diversos outros tuítes que têm como alvo políticos bolsonaristas e outras figuras conservadoras, como o pastor Silas Malafaia.

O Comprova identifica como sátira, os memes, paródias e imitações publicadas com intuito de fazer humor e verifica conteúdos satíricos quando percebe que há pessoas tomando-os por verdadeiros.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Até 9 de maio, o tuíte satírico havia sido compartilhado 425 vezes e recebido 1,2 mil curtidas. Um vídeo que publicou a história como se fosse verdadeira foi visualizado no YouTube 8,8 mil vezes até a mesma data.

Como verificamos: Inicialmente, fizemos uma busca no Google pelos termos Dallagnol + mulheres + salários, que retornou links para checagens do Boatos.Org e da agência Aos Fatos sobre o caso. Em seguida, buscamos informação sobre o PL que trata sobre a igualdade salarial entre homens e mulheres para saber como votou o deputado paranaense. Também foram feitas buscas nas redes sociais do parlamentar para saber se ele havia se manifestado sobre o assunto. O Comprova também consultou o registro escrito da sessão da Câmara dos Deputados do dia 4 de maio, quando o projeto de lei foi aprovado para saber se ele chegou a se manifestar naquela ocasião.

Foi feito contato ainda com o deputado Deltan Dallagnol.

O que diz o responsável pela publicação: O autor do perfil @GloboFakeNews foi contatado, mas não respondeu até a publicação deste texto.

O que podemos aprender com esta verificação: O perfil que publicou o conteúdo satírico que se espalhou como verdadeiro é @GloboFakeNews. Neste caso, pode-se gostar ou não da Rede Globo, mas o nome da página já deveria fazer com que o leitor ligasse o alerta e desconfiasse da informação. Uma rápida pesquisa na internet com o nome do deputado e termos usados no post já mostraria que nenhum veículo da imprensa profissional noticiou tal informação.

Também aprendemos que sátiras podem ser entendidas de diferentes formas e, quando tidas como verdades, podem ser perigosas, já que, como neste caso, causam desinformação.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: O site Boatos.org e a agência Aos Fatos também checaram o conteúdo verificado aqui. Além disso, Dallagnol já esteve no centro de outras checagens do Comprova. No tuíte verificado aqui, ele não é o autor da peça de desinformação, mas, recentemente, o projeto verificou post do deputado que enganava ao dizer que projeto de lei proíbe versículos bíblicos nas redes sociais.