O Projeto Comprova é uma iniciativa colaborativa e sem fins lucrativos liderada pela Abraji e que reúne jornalistas de 41 veículos de comunicação brasileiros para descobrir, investigar e desmascarar conteúdos suspeitos sobre políticas públicas, eleições, saúde e mudanças climáticas que foram compartilhadas nas redes sociais ou por aplicativos de mensagens.
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Investigado por: 2023-10-26

Lei que instituiu pau de arara como manifestação cultural não permite retorno do uso dos veículos

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Uma lei sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em agosto de 2023 reconheceu a tradição do uso do pau de arara em romarias religiosas como manifestação cultural e imaterial do Brasil. Esse tipo de veículo consistia na adaptação de caminhões para o transporte de pessoas, com a inclusão de bancos e toldos em carrocerias. Embora tradicional em cidades do interior do Nordeste, a utilização é proibida desde 2014 por resolução do Conselho Nacional de Trânsito (Contran). A lei sancionada não faz qualquer mudança quanto a isso.

Conteúdo investigado: Vídeo mostra trechos de uma solenidade do governo federal com a presença do presidente Lula e outras autoridades. O narrador do conteúdo diz que o povo nordestino “pode comemorar”, pois o “governo petista oficializou o pau de arara patrimônio cultural brasileiro”. O autor ainda cita supostos financiamentos para meios de transporte como ônibus e metrôs destinados a países como Cuba e Argentina, dando a entender que o governo estaria, ao mesmo tempo que financia obras no exterior, incentivando o transporte precário no Brasil. Na sequência, aparecem trechos de declarações de Lula, do deputado José Guimarães (PT) e do padre Cícero José da Silva, da Diocese do Crato, no Ceará, durante a cerimônia.

Onde foi publicado: Kwai e Telegram.

Contextualizando: Em 1º de agosto de 2023, o presidente Lula (PT) sancionou uma lei que torna a tradição do uso do pau de arara em romarias religiosas como manifestação cultural e imaterial do Brasil. No dia, foi realizada uma cerimônia em Brasília junto a lideranças políticas e religiosas do Ceará. Dentre os que aparecem nos registros fotográficos, estão os deputados federais José Guimarães (PT) e Yury do Paredão (sem partido), o atual prefeito de Juazeiro do Norte, Gledson Bezerra (Podemos) e o ex-gestor do município, Arnon Bezerra (PDT). O padre Cícero José da Silva, reitor da Basílica Santuário Nossa Senhora das Dores, da Diocese do Crato, também compareceu.

| Foto: Ricardo Stuckert/PR
 

No encontro, Guimarães, que é o autor da proposta, ressaltou que o transporte hoje mudou, mas ficaram “o legado e a cultura”. “Um projeto reconhecendo o transporte pau de arara como patrimônio cultural e imaterial do Brasil, essa é a natureza do projeto”, disse.

Em nota enviada ao Comprova, o deputado reiterou o posicionamento. Ele ressaltou que a lei não significa o retorno do veículo ou “qualquer tipo de regularização junto ao Código Brasileiro de Trânsito”, como enganam posts virais nas redes sociais. “Trata-se claramente de uma homenagem aos romeiros e romeiras que, por décadas, utilizaram esse transporte para o turismo religioso, criando assim uma tradição histórica que ultrapassa gerações”, afirmou. “Tentar distorcer esse fato configura, no mínimo, uma atitude de má fé e merece ser repudiada inclusive com medidas judiciais”, disse.

A Lei Nº 14.641 declara como “manifestação da cultura nacional a tradição do uso, em romarias religiosas, do transporte conhecido como “pau de arara”, como está disponibilizado no Diário Oficial de 2 de agosto deste ano. Não há qualquer menção a uma mudança no Código de Trânsito Brasileiro (CTB) ou invalidação de resoluções do Conselho Nacional de Trânsito.

Desde 2014, é proibido o transporte de pessoas em pau de arara, que é uma adaptação de carrocerias de caminhões usadas para comportar passageiros durante o deslocamento. Na resolução Nº 508 de novembro de 2014, o conselho instituiu os requisitos de segurança para a circulação, a título precário, de veículo de carga ou misto transportando passageiros no compartimento de cargas.

| Foto: Rozelia Costa/Basílica Nossa Senhora das Dores (via Agência Senado)
 

A resolução revogou uma determinação anterior, emitida em 1998, que permitia o uso dos veículos em algumas situações. Por meio de nota, o Ministério dos Transportes, pasta à qual o conselho é vinculado, destacou a obrigatoriedade dos bancos revestidos com espuma, presença de encosto de cabeça e cintos de segurança para todos os ocupantes, devidamente fixados na estrutura da carroceria, além de boa qualidade da carroceria, presença de barras de apoio, proteção lateral, entre outros.

“Deste modo, esta resolução é explícita quanto aos requisitos necessários para a possibilidade de utilização destes veículos, como é o caso do projeto sancionado pelo presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva”, apontou a pasta.

Ficou proibida, com a resolução, a utilização de veículos de carga tipo basculante e boiadeiro.

O descumprimento da medida, ou seja, o transporte de pessoas nesse tipo de veículo, acarreta ao proprietário ou condutor do veículo penalidades e medidas administrativas. Reportagem do UOL, publicada em 2022 mostrou que, apesar de proibido, o transporte ainda é usado em alguns locais.

Pau de arara faz parte da cultura de romeiros

Os veículos do tipo pau de arara eram tradicionalmente usados em diversas regiões do Nordeste e estão ligados especialmente ao êxodo rural e às romarias. Atualmente, mais de quatro milhões de pessoas utilizam todos os anos o transporte em romarias, como a de Padre Cícero, em Juazeiro do Norte, e de São Francisco das Chagas, em Canindé, ambas no Ceará, e a de Bom Jesus da Lapa, na Bahia. Diante da proibição, grupos de romeiros pedem ao Contran medidas mais simplificadas que garantam a segurança, sem descaracterizar este meio de transporte.

Padre Cícero José da Silva, reitor da Basílica Santuário Nossa Senhora das Dores, da Diocese do Crato, divulgou carta, quando houve a sanção da lei, e ressaltou o caráter cultural do transporte. “Trazemos na memória a coragem dos primeiros peregrinos que iam a Juazeiro do Norte nas carrocerias adaptadas dos caminhões e, através da experiência de fé, contribuíram para a construção da identidade religiosa e cultural da cidade, além do desenvolvimento econômico.”

A Diocese do Crato, inclusive, mantém, em seu site, registros de festas antigas que tinham o uso do transporte. “Como de costume os romeiros enfeitam os carros, ônibus, caminhões pau de arara. Colocam a imagem do padre Cícero, da Mãe das Dores, usam bandeirolas nas mais diversas cores para demonstrarem a alegria por estarem no Juazeiro do ‘Padim Ciço’. Os juazeirenses, por sua vez, ficam nas calçadas das ruas aguardando os bombons, pirulitos e pipocas jogados pelos romeiros que estão nos transportes”, escreve uma publicação de setembro de 2016.

Empréstimos e falta de água já foram esclarecidos pelo Comprova

O autor da publicação também faz alegações relacionadas a supostos financiamentos para meios de transporte como ônibus e metrôs destinados a países como Cuba e Argentina. Em janeiro deste, o presidente Lula afirmou que o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) voltará a financiar projetos de desenvolvimento e engenharia em países vizinhos. A fala aconteceu durante pronunciamento em Buenos Aires, na Argentina, ao lado do então presidente argentino, Alberto Fernández.

No mesmo dia, Lula disse que ele e empresários brasileiros estariam interessados na conclusão da rede de tubulação para transporte de gás natural argentino. Ele afirmou que iria criar condições para “ajudar” nas obras, com o BNDES atuando como financiador do empreendimento. No entanto, não houve nenhuma formalização para a retomada de financiamentos neste sentido.

A ligação entre empréstimos e financiamentos a países vizinhos com um suposto descaso com o Brasil é uma crítica comum aos governos do PT. O tema é comum em peças de desinformação. O Comprova já investigou vídeo que citava 20 operações que supostamente teriam sido financiadas pelo BNDES entre os anos de 2009 e 2014 (durante os governos petistas de Lula e Dilma Rousseff). A peça apresenta informações falsas referentes aos valores financiados, além de atribuir ao banco sete construções que não tiveram acesso a recursos de linhas de crédito do banco.

Em outro caso, foi mostrado que publicação misturava dados verdadeiros com números incorretos sobre financiamentos do BNDES nos governos do PT. Também foi mostrado este ano que é enganoso que o Brasil fará empréstimo à Argentina enquanto Lula bloqueia recursos da saúde e educação.

O fornecimento de água no Nordeste do país também tem sido um tema recorrente de desinformação em posts compartilhados nas redes sociais. No vídeo alvo desta checagem, o autor cita, sem dar detalhes, que “cortaram a água” do povo nordestino.

O Comprova já demonstrou, por exemplo, como é o funcionamento do processo de captação e bombeamento de água para estados do Brasil e que o governo federal não bloqueou água na região. Também mostrou que a polarização intensifica a desinformação sobre a transposição do Rio São Francisco, a maior obra de infraestrutura hídrica do Brasil, que atende estados nordestinos.

Os autores dos conteúdos também propagam informações fora de seu contexto original, para fazer alegações enganosas e falsas a respeito deste tema . Neste sentido, o Comprova mostrou, recentemente, que protesto na Bahia não foi motivado por falta de água, nem tem relação com Governo Lula.

Como o conteúdo pode ser interpretado fora do contexto original: A postagem analisada aqui, como foi veiculada sem a devida contextualização, dá a entender que o uso do veículo poderá ser retomado no Brasil. Além disso, ao mencionar investimento em outros países, o vídeo possibilita a interpretação que haveria uma ação direta do governo federal para desfavorecer a aplicação de recursos na região em comparação com países como Argentina e Cuba.

O que diz o responsável pela publicação: O Comprova tentou contato com o autor da publicação, mas não houve retorno até a publicação desta verificação.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Até o dia 26 de outubro, a publicação no Kwai acumulava mais de 106 mil visualizações, 10,5 mil curtidas e 3,4 mil comentários. O conteúdo também vem sendo disseminado no Telegram.

Como verificamos: A verificação buscou no Google pelos termos “Lula + pau de arara”, o que resultou em links de reportagens publicadas na imprensa e que tratam da solenidade que marcou a assinatura da lei que torna a tradição do uso do pau de arara em romarias religiosas como manifestação cultural e imaterial do Brasil, entre as quais, a do Correio Braziliense, Metrópoles e da própria agência de notícias do governo federal.

Pelos mesmos termos, mas em busca no YouTube, localizamos a transmissão da solenidade.

O Comprova também buscou a assessoria de imprensa do deputado federal José Guimarães, autor da lei sancionada, e com o Ministério dos Transportes.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: O conteúdo contextualizado pelo Comprova também já foi checado pelo Boatos.org, que mostrou ser falsa a volta do uso do pau de arara como meio de transporte. O governo federal e suas políticas são, constantemente, alvos de desinformação. O Comprova já verificou que o governo Lula assinou acordo de cooperação técnica com Autoridade Palestina, não com o Hamas; que Alckmin não sugeriu acabar com Bolsa Família; e que o presidente não instituiu banheiro unissex nas escolas.

 

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Investigado por: 2023-10-26

Entenda as acusações de antissemitismo contra Roger Waters e o uso de uniforme com referência ao nazismo em shows

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O músico britânico Roger Waters, que fez visita recente ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), já foi acusado de antissemitismo, que se caracteriza por atos de preconceito, hostilidade ou discriminação contra judeus. O artista diz se opor, na verdade, às violações que entende serem cometidas por Israel contra palestinos. Nos shows, o músico costuma vestir um uniforme alusivo à SS, a tropa de Hitler, quando interpreta o que diz ser um demagogo fascista desequilibrado, personagem presente na iconografia do Pink Floyd, do qual era integrante, desde os anos 1980. Além disso, não há registro de que ele tenha sido proibido de tocar nos Estados Unidos, como alega uma publicação.

Conteúdo investigado: Publicação em canal do Telegram compartilha notícia do G1 sobre uma visita do músico britânico Roger Waters ao presidente Lula no Palácio do Planalto. A postagem xinga o petista e diz que o ex-baixista do Pink Floyd é o mais famoso antissemita do mundo. O conteúdo alega ainda que Waters faz show com uniforme nazista e que foi proibido de se apresentar nos Estados Unidos por conta disso.

Onde foi publicado: Telegram.

Contextualizando: O músico Roger Waters visitou o presidente Lula (PT) em Brasília, em 23 de outubro, um dia antes de fazer show na cidade. O encontro foi divulgado pelo próprio presidente em publicações nas redes sociais. “Há cinco anos, @rogerwaters tentou me visitar em Curitiba e foi impedido. Hoje, quando ele retorna ao Brasil, nos encontramos no gabinete da presidência no Palácio do Planalto”, escreveu o petista em post no X (antigo Twitter).

Waters é um histórico apoiador do movimento BDS (Boicote, Desinvestimento e Sanções, em tradução do inglês), contra a expansão do Estado de Israel sobre territórios também reivindicados por palestinos na Cisjordânia e na Faixa de Gaza. Por conta disso, ele é recorrentemente acusado de antissemitismo por entidades judaicas. Para muitos judeus, o apoio ao BDS é uma forma de antissemitismo. Além disso, o músico foi acusado de usar termos ofensivos a judeus e criticado por usar a Estrela de Davi em um contexto negativo.

Waters afirma, no entanto, que não é nem nunca foi antissemita. Ele contesta que a definição de antissemitismo colocada sobre ele parte de pressupostos distorcidos de que toda crítica a Israel seja inerentemente antijudaica e de que o sionismo seja um elemento essencial da identidade judaica.

A alegação de que Waters veste uniforme nazista faz alusão à performance comum do músico em shows ao cantar “In the Flesh”. Nessas ocasiões, ele veste um sobretudo militar com uma braçadeira vermelha, conjunto parecido ao de militares da polícia nazista SS, e empunha uma metralhadora falsa contra os fãs.

O músico afirma que se trata, no entanto, da interpretação crítica de um personagem: o roqueiro fictício Pink, que acredita ser um ditador fascista. Ele aparece em shows e na iconografia do Pink Floyd desde os anos 1980, quando foi lançado o álbum conceitual “The Wall”, que conta com a canção “In the Flesh”.

Já sobre a alegação de que Roger Waters foi proibido de se apresentar nos Estados Unidos, não há registro que sustente isso. Um show dele em Frankfurt, na Alemanha, previsto para 28 de maio deste ano, chegou a ser cancelado provisoriamente por autoridades locais que acusavam o músico de antissemitismo. No entanto, a apresentação foi liberada posteriormente, por decisão da Justiça.

Como o conteúdo pode ser interpretado fora do contexto original: Diante do contexto da guerra entre Israel e o grupo extremista palestino Hamas, a publicação pode levar a crer que o encontro entre Lula e Roger Waters sinaliza um endosso do presidente à suposta posição antissemita do cantor.

O que diz o responsável pela publicação: O canal responsável pela publicação não disponibiliza qualquer informação que possibilite uma tentativa de contato, como endereço de e-mail ou telefone.

Alcance da publicação: A publicação compartilhada pelo canal do Telegram alcançou 4,2 mil visualizações até o dia 26 de outubro.

Como verificamos: O Comprova realizou buscas no Google pelos termos “Roger Waters faz apologia ao nazismo” e por “shows cancelados de Roger Waters”, a fim de, primeiramente, compreender o contexto da associação do artista ao antissemitismo.

Nas buscas realizadas, encontramos reportagens (G1, Veja, Agência Brasil, GZH) falando sobre o mesmo assunto: que Roger Waters utilizou um traje semelhante ao uniforme nazista em um show realizado em Berlim; e, em resposta a tal acusação, as reportagens mostram que o artista justificou o uso da roupa como protesto, e não apologia.

A equipe do Comprova também encontrou materiais publicados na página do próprio artista, nos quais ele negou seu apoio ou qualquer relação positiva com nazismo, e no canal dele no YouTube. Além disso, consultou produções acadêmicas sobre a obra de Roger Waters e do Pink Floyd (1, 2, 3).

Como Roger Waters passou a ser acusado de antissemitismo

As acusações de que Roger Waters seria antissemita são antigas. Em 2010, ele recebia as primeiras críticas após shows da turnê mundial “The Wall Live”, em que ele apresentou um cenário retratando bombas no formato da Estrela de Davi – um símbolo judaico – durante a música Goodbye Blue Sky.

 

| Print da transmissão de “Roger Waters Goodbye Blue Sky Live 2010”. Disponível aqui 

Em 2012, ele afirmou, em entrevista coletiva realizada no Brasil, que apoiava o movimento BDS e que não consumia produtos fabricados em Israel. No ano seguinte, em declaração dada nos Estados Unidos, ele afirmou que “o lobby judeu é extraordinariamente poderoso aqui e particularmente na indústria em que trabalho, a indústria da música”, fala que, na avaliação de quem o critica, reforça o imaginário antissemita do povo judeu como controlador do mundo, poderoso e conspiracionista.

Outra polêmica envolvendo o artista ocorreu em 2015, quando ele insistiu, por meio de uma carta aberta, para que Gilberto Gil e Caetano Veloso, à época em turnê conjunta, não realizassem show em Israel, pedido que não foi atendido. Além disso, ele já pediu para outros artistas que não se apresentassem no país, entre eles Neil Young, Robbie Williams e Lauryn Hill.

Em entrevista de 2017, Roger Waters disse não ter problemas com o povo judeu, mas, sim, com a atuação do Estado de Israel contra palestinos. Ele afirmou, na ocasião, ser “fundamentalmente contra a ideia de pessoas serem subjugadas e privadas de seus direitos. Expressei esse meu posicionamento, e aí sugeriram que eu fosse antissemita, o que não é verdade. Irei para o meu túmulo defendendo os direitos das pessoas comuns”, disse.

Em fevereiro de 2023, Polly Samsom, mulher de David Gilmour, guitarrista do Pink Floyd, tuitou que Waters é “antissemita até o seu núcleo podre”. Ela ainda afirmou na ocasião que o músico é mentiroso, ladrão, hipócrita, sonegador de impostos, dublador, misógino, doente de inveja, megalomaníaco e apologista de Vladimir Putin, presidente da Rússia.

A publicação ocorreu dias depois de Roger Waters ter dito que estava aberto a ouvir o que Putin teria a dizer, apesar de ter chamado ele antes de gangster, e que o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, também seria culpado pela guerra na Ucrânia. Gilmour republicou a postagem da esposa na ocasião afirmando que cada palavra dela era comprovadamente “verdadeira”.

Em posicionamento mais recente, Waters afirmou ser colocada sobre ele uma noção distorcida de antissemitismo, por não ser contrário ao povo judeu, mas se opor a violações de direitos humanos que entende terem sido cometidas por Israel contra palestinos.

“Sei que o povo judeu é um grupo diversificado, interessante e bastante complicado, tal como o resto da humanidade. Muitos são aliados na luta pela igualdade e justiça, em Israel, na Palestina e em todo o mundo”, escreveu ele em comunicado divulgado em 29 de setembro de 2023.

A manifestação foi publicada em resposta ao documentário “The Dark Side of Roger Waters”, da organização não governamental britânica Campaign Against Antisemitism (Campanha contra o Antissemitismo, em tradução do inglês).

O filme traz acusações de um produtor musical e de um saxofonista que trabalharam com Waters sobre declarações antissemitas dele na rotina pessoal. Por exemplo, ele é acusado de ter chamado seu agente de “judeu de merda”.

A produção também exibe trechos de e-mail atribuído ao ex-músico do Pink Floyd, de 2010, em que ele propõe lançar um porco inflável sobre a plateia nos shows com a Estrela de Davi e um termo antissemita em inglês extremamente ofensivo estampados, entre outros símbolos e expressões.

O assunto ainda retornou aos holofotes devido ao conflito protagonizado por Israel e Hamas, grupo extremista palestino que controla a Faixa de Gaza. O Hamas, sigla do árabe “Ḥarakah al-Muqawamah al-‘Islamiyyah”, significa Movimento de Resistência Islâmica.

Conforme já explicado anteriormente pelo Comprova, o grupo fundamentalista islâmico é considerado terrorista por países como Estados Unidos, Japão e as nações vinculadas à União Europeia. O Hamas foi criado durante a Primeira Intifada palestina, um movimento contra a ocupação israelense da Cisjordânia e da Faixa de Gaza. Em sua carta fundadora, de 1988, o grupo rechaça a existência do Estado de Israel.

Não há registro de apoio expresso de Roger Waters ao Hamas, mas, sim, ao povo palestino, que não é representado em sua totalidade pelo grupo extremista. Em 2020, contudo, ele concedeu entrevista à agência de notícias Shehab, afiliada ao Hamas, na qual afirmou que “o sionismo é uma mancha feia e que precisa ser gentilmente removida por nós”.

Em entrevista recente à TV Brasil, o músico britânico chamou de genocídio a contraofensiva de Israel sobre a Faixa de Gaza, termo que já havia utilizado em situações anteriores para tratar do conflito. Afirmou ainda que os ataques eram promovidos pelo governo de Israel, e não pelo povo israelense.

Suposto uniforme nazista retrata personagem dos anos 80

A performance de Waters com uniforme que remonta à SS, citada pela postagem verificada pelo Comprova, ocorre durante os shows do artista no momento em que ele canta a canção “In The Flesh”, que abre o álbum conceitual “The Wall”, do Pink Floyd, de 1979.

Todo o álbum conta a trajetória de uma estrela do rock chamada Pink e explora temas do existencialismo pós-guerra, como totalitarismo, liberdade, loucura e subversão. “In The Flesh”, especificamente, relata a ocasião em que o roqueiro fictício se torna um ditador fascista.

Esse personagem também aparece no filme “The Wall”, de 1982, com o mesmo uniforme preto alusivo à SS e com a braçadeira vermelha que exibe, em vez de uma suástica nazista, dois martelos cruzados. Desde o lançamento do longa-metragem, a figura de Pink é interpretada por Roger Waters em shows.

| Personagem Pink no filme “The Wall”, de 1982 (Foto: Reprodução)

Ao repetir a performance em um show em Berlim, na Alemanha, em 17 de maio deste ano, a polícia local abriu investigação por suspeita de incitação ao ódio público. Waters disse à época que as acusações de apologia ao nazismo usavam de má-fé e que os elementos de sua performance eram claramente uma declaração em oposição ao fascismo, injustiça e fanatismo em todas as suas formas.

“A representação de um demagogo fascista desequilibrado tem sido uma característica dos meus shows desde ‘The Wall’, do Pink Floyd, em 1980”, comunicou, em nota, na ocasião.

Waters não foi proibido de tocar nos EUA

A publicação investigada alega que Roger Waters foi proibido de fazer shows nos Estados Unidos após usar o traje semelhante ao uniforme de militares da polícia nazista. A afirmação, no entanto, não é verdadeira. O Departamento de Estado dos Estados Unidos chegou a fazer críticas ao cantor após a polêmica performance em Berlim.

O órgão classificou a apresentação como “profundamente ofensiva ao povo judeu”. Além disso, a embaixadora Deborah Lipstadt, enviada especial do país para monitorar e combater o antissemitismo, publicou um tuíte condenando a performance de Waters, que chamou de “desprezível distorção do Holocausto”.

Apesar das duras críticas que recebeu, não há qualquer registro sobre a suposta proibição aos shows do ex-baixista do Pink Floyd no país. A turnê “This Is Not a Drill” teria início em 2020, mas foi adiada por conta da pandemia. Na época, a Liga de Baseball dos Estados Unidos anunciou o cancelamento das publicidades dos shows em suas plataformas após sofrer críticas de organizações judaicas.

Mesmo com a polêmica, a turnê passou pelos Estados Unidos entre julho e outubro de 2022, ou seja, antes da apresentação que foi alvo de críticas, em Berlim.

Durante a passagem pela Europa, Waters chegou a ter um show cancelado em Frankfurt, na Alemanha. A apresentação estava prevista para acontecer em 28 de maio, no Festhalle, uma casa de eventos que, durante a Segunda Guerra Mundial, funcionou como centro de detenção do regime nazista.

O conselho da cidade, ao justificar o cancelamento, classificou o cantor como “um dos antissemitas mais conhecidos do mundo”. Outras cidades alemãs também consideraram suspender as apresentações.

No entanto, após o cantor recorrer, a Justiça decidiu manter o show em Frankfurt. O tribunal afirmou que, por questões contratuais, a cidade não poderia impedir o concerto de acontecer. Além disso, considerou que, apesar do uso de símbolos durante o show, não havia indícios de uso de propaganda nazista.

Na apresentação de Berlim naquele mesmo mês de maio, uma mensagem exibida em um telão minutos antes de o músico subir ao palco citou a decisão do tribunal de Frankfurt. “Apenas para ser claro, eu condeno o antissemitismo sem qualquer reserva”, dizia o texto, em tradução do inglês.

Também no show de Berlim, foi exibido no mesmo telão o nome de Anne Frank, adolescente alemã judia vítima do Holocausto, durante uma homenagem a ativistas políticos que foram vítimas de autoridades e governos que Roger Waters considera autoritários. A conta do governo de Israel no X publicou na ocasião que o músico teria profanado a memória da garota e dos 6 milhões de judeus mortes pelo regime nazista.

A homenagem de Waters em Berlim também fez menção, entre outros nomes, a Sophie Scholl, ativista anti-nazista morta por se opor ao regime de Hitler; Shireen Abu Akleh, jornalista palestino-americana morta pelo exército de Israel; Mahsa Amini, jovem morta pela polícia da moralidade do Irã; e George Floyd, afro-americano assassinado por estrangulamento por um policial branco nos Estados Unidos.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: Com a escalada do conflito entre o grupo extremista Hamas e Israel, começaram a surgir diversas peças de desinformação envolvendo a posição do Brasil na guerra. O Comprova já verificou que o ministro Silvio Almeida registrou reuniões com embaixador do Irã, país que apoia o grupo extremista, e diplomacia de mais 20 países; que vídeo mostra turistas estrangeiros no Ceará, não integrantes da facção no Brasil; que Biden não disse que Lula deveria se preocupar com comida para brasileiros em vez da guerra; e que o governo Lula assinou acordo de cooperação técnica com Autoridade Palestina, não com o grupo terrorista.

 

 

Política

Investigado por: 2023-10-24

Apreensão de R$ 3,2 milhões pela PF em sacos de lixo não tem relação com governo Lula

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Ação realizada pela Polícia Federal (PF), durante investigação de suposto esquema de propina em agosto de 2023, não mirou no governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT). A investida da PF teve como alvos uma empresa de engenharia e a Universidade Estadual de Roraima. Publicação engana ao criar uma relação entre a gestão atual e o caso usando imagens reais divulgadas pela corporação no momento da apreensão de R$ 3,2 milhões armazenados em sacos de lixo.

Conteúdo investigado: Publicação nas redes sociais relaciona ação da Polícia Federal (PF), que apreendeu R$ 3,2 milhões dentro de sacos de lixo, e o governo Lula (PT). O vídeo mostra imagens de agentes da corporação com bolos de dinheiro enquanto fazem buscas em um imóvel. “O governo do amor venceu. Não tem dinheiro para fazer nada pelo pobre, mas tem dinheiro para pagar propina”, alega o homem. O post também traz o trecho de uma reportagem sobre a operação exibida no Jornal Hoje, da TV Globo.

Onde foi publicado: Kwai e Instagram.

Conclusão do Comprova: A ação da PF que apreendeu R$ 3,2 milhões armazenados em sacos de lixo, que seriam destinados ao pagamento de propina, não tem relação com o governo Lula (PT), como sugere vídeo que viralizou no Kwai.

A apreensão ocorreu no âmbito de uma investigação que apurava um suposto esquema de corrupção envolvendo a Universidade Estadual de Roraima e a contratação de uma empresa de engenharia. A própria reportagem usada no vídeo traz esse contexto. As notícias que repercutiram a ação, e uma nota publicada pela Polícia Federal, não fazem qualquer menção ao governo federal.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Até 24 de outubro, o vídeo publicado no Kwai teve 21,2 mil visualizações, 3,1 mil curtidas e 257 comentários. No Instagram, foram 12,2 mil visualizações e mais de 400 compartilhamentos.

Como verificamos: Em uma busca pelas palavras-chave “apreensão”, “propina” e “R$ 3,2 milhões”, chegamos a notícias publicadas por diversos veículos (G1, Folha, UOL) sobre a operação da PF envolvendo a Universidade Estadual de Roraima. Ao identificar a data das publicações, pesquisamos pela edição exibida no mesmo dia pelo Jornal Hoje, da TV Globo, para chegar ao trecho da reportagem usada no vídeo (começa a partir de 49:19).

Solicitamos um posicionamento da Secretaria de Comunicação Social do governo federal, que encaminhou a demanda à Polícia Federal. A corporação enviou uma notícia sobre a operação publicada em seu site. Também buscamos o autor do vídeo em outras redes sociais e enviamos uma mensagem via Kwai.

Operação não tem relação com governo Lula

Em 17 de agosto de 2023, a Polícia Federal apreendeu R$ 3,2 milhões em dinheiro vivo, armazenados em sacos de lixo nos fundos de um imóvel em Boa Vista (RR). A ação investigava um suposto esquema de pagamento de propina envolvendo a Universidade Estadual de Roraima e uma empresa do ramo de engenharia. O montante foi encontrado em pilhas de notas de R$ 100 e de R$ 50, que estavam escondidas na casa do irmão de um empresário que estaria envolvido no caso.

As imagens usadas no vídeo que viralizou no Kwai foram publicadas em diversos veículos de imprensa (TV Band, UOL). As reportagens não fazem qualquer menção à participação de Lula ou membros do governo. O trecho da matéria do Jornal Hoje utilizado na montagem cita, inclusive, que os alvos da investigação seriam a instituição de ensino e a empresa de engenharia.

A UERR, por ser uma instituição de ensino estadual, se mantém com recursos que recebe do governo local, ao contrário das universidades federais, que são financiadas diretamente pelo governo federal.

Na época, a universidade se manifestou em nota e informou que “a instituição não recebeu nenhuma comunicação oficial da Polícia Federal ou da Justiça acerca das informações divulgadas, nem foi alvo de qualquer ação em todas as suas unidades administrativas e educacionais, mas adianta estar à disposição para colaborar no que for necessário para que todos os fatos sejam esclarecidos, no intuito de resguardar o interesse público.”

De acordo com a investigação, os R$ 3,2 milhões seriam destinados ao pagamento de propina relacionada a uma licitação, no valor de R$ 16 milhões, que teria como vencedora a empresa suspeita de integrar o esquema.

Em 31 de agosto, na segunda fase da operação que investiga o esquema, a PF cumpriu mandado de busca e apreensão na sede da universidade e em outro endereço de Boa Vista.

O que diz o responsável pela publicação: O Comprova entrou em contato com o responsável pela publicação, mas não obteve resposta.

O que podemos aprender com esta verificação: Uma tática comum entre os agentes de desinformação é o uso de informações verdadeiras junto a alegações que não têm relação com o contexto original. Neste caso, o narrador usa vídeos de uma operação que, de fato, ocorreu, mas associa a ação a uma suposta participação do governo Lula, o que não se sustenta. O corte de vídeo da reportagem do jornal não confirma o que diz o homem que aparece no post. A reportagem menciona o envolvimento de uma universidade estadual e não faz qualquer referência ao governo federal. Ao desconfiar da veracidade de uma informação publicada nas redes sociais, faça uma busca e consulte veículos de comunicação de sua confiança.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: O governo federal e suas políticas são, constantemente, alvos de desinformação. O Comprova já verificou que Lula não estava bêbado nem agarrou apoiadora como alegam publicações que usam vídeo manipulado; que o governo Lula assinou acordo de cooperação técnica com Autoridade Palestina, não com o Hamas; que Alckmin não sugeriu acabar com Bolsa Família; e que o presidente não instituiu banheiro unissex nas escolas.

Política

Investigado por: 2023-10-24

Ministro registrou reuniões com embaixador do Irã e diplomacia de mais 20 países

  • Enganoso
Enganoso
Publicação do deputado federal Marcel van Hattem (Novo-RS) engana ao afirmar que o ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania, Silvio Almeida, teve apenas cinco agendas bilaterais neste ano, entre as quais duas foram com o Irã. O ministro teve, de fato, dois encontros com o embaixador iraniano no Brasil, Houssein Gharibi, em 2023, mas também se encontrou com representantes de ao menos outros 20 países, em compromissos públicos registrados no e-Agendas.

Conteúdo investigado: Deputado federal Marcel van Hattem (Novo-RS) afirma, em uma série de tuítes, que o ministro Silvio Almeida recebeu a diplomacia do Irã, país que apoia o Hamas, em duas de cinco agendas bilaterais que teve no ano. “Qual o motivo de tamanho prestígio do Irã com o senhor ministro?”, escreve o parlamentar. Ele ainda pergunta se o encontro com o embaixador iraniano no Brasil está relacionado ao fato de Almeida não classificar o Hamas como uma organização terrorista em meio ao conflito com Israel.

Onde foi publicado: X (antigo Twitter).

Conclusão do Comprova: É enganoso que o ministro dos Direitos Humanos, Silvio Almeida, tenha tido apenas cinco encontros bilaterais neste ano, sendo dois com representante do Irã, conforme afirma o deputado Marcel van Hattem (Novo-RS) em uma série de tuítes em 16 de outubro de 2023.

De fato, o ministro se reuniu neste ano com o embaixador iraniano no Brasil, Houssein Gharibi, duas vezes, mas também registrou encontros deste tipo com representantes de outros 20 países. Todas essas reuniões constam no e-Agendas, plataforma de uso obrigatório para a divulgação de compromissos dos agentes públicos do Poder Executivo federal, segundo Decreto 10.889/2021. O decreto, no Art. 12, prevê ainda que “o compromisso público realizado sem agendamento prévio deverá ser registrado e publicado no e-Agendas ou no sistema próprio, […] no prazo de sete dias corridos, contado da data de sua realização”.

Ao Comprova, a assessoria do deputado comunicou que a alegação dele se baseou em consulta ao e-Agendas em 11 de outubro de 2023. Contudo, já constavam na plataforma agendas bilaterais do ministro com representantes de outros 15 países, registradas em data anterior à consulta do parlamentar. Depois disso, foram acrescidos encontros com mais cinco países.

Além do Irã, as diplomacias da China e dos Estados Unidos também tiveram dois encontros cada com o chefe do MDHC registrados no sistema. O Chile teve três compromissos, incluindo um jantar em visita do ministro ao país. Silvio Almeida ainda teve nove eventos com representantes de Angola, todos eles ocorridos em uma viagem de três dias ao país africano, entre 24 e 26 de agosto.

O deputado federal alegou que o ministro teria privilegiado o Irã para questionar o fato de Almeida não classificar o Hamas, que protagoniza conflito com Israel, como uma organização terrorista. O governo iraniano é aliado do grupo extremista palestino.

O ministro repete, contudo, o entendimento da diplomacia brasileira. O Itamaraty não considera o Hamas como um grupo terrorista atualmente, por entender que a adoção do termo deve ocorrer apenas se for assim acatada por resolução do Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU).

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. O primeiro da série de tuítes do deputado teve cerca de 79,2 mil visualizações, mil repostagens e 6,4 mil curtidas até 24 de outubro.

Como verificamos: O Comprova entrou em contato com a assessoria do Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania com pedido para que fosse cedida a agenda de reuniões bilaterais do ministro Silvio Almeida em 2023. Foi disponibilizado, em resposta, um arquivo com uma lista desses compromissos.

A reportagem verificou, então, se os eventos listados constavam também no e-Agendas, uma vez que, ao Comprova, a assessoria do deputado federal Marcel van Hattem justificou que as informações disponíveis na plataforma teriam baseado a publicação feita por ele.

Ao buscar no Google os termos “Silvio Almeida encontro bilaterais”, o Comprova também identificou notícias sobre reuniões do ministro com representantes de outros países em viagens ao exterior (Agência Brasil, Poder360).

Registros e ausências no e-Agendas

De acordo com registros do sistema eletrônico de agendas do Poder Executivo federal (e-Agendas), o ministro Silvio Almeida realizou encontros com representantes de outros 20 países, além do Irã, durante o ano de 2023.

Constam na plataforma online reuniões também com África do Sul, Angola, Azerbaijão, Barbados, Chile, China, Cuba, Estados Unidos, França, Luxemburgo, Malásia, Marrocos, Moçambique, Países Baixos, Peru, República Democrática do Congo, Reino Unido, Rússia, Suíça e Turquia. Os dados foram contabilizados de janeiro até a data da publicação deste texto (24 de outubro).

Um dos compromissos com os Estados Unidos e um outro com a República Democrática do Congo, de 24 de janeiro de 2023, contudo, aparecem vinculados ao antigo Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, denominação anterior da pasta. Os demais encontros têm registro atrelado ao atual Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania.

Há ainda registros que foram acrescidos ao e-Agendas apenas em 23 de outubro, após o Comprova questionar a ausência deles da plataforma: trata-se de compromissos em visita a Luanda, capital de Angola, no mês de agosto, em ida a Nova Iorque, nos Estados Unidos, em agenda de mobilização do Brasil por assento no Conselho de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU), e em viagem ao Chile para uma homenagem a brasileiros exilados durante a ditadura, em setembro.

Além disso, uma segunda agenda com a China, do dia 15 de maio, consta no sistema eletrônico, mas sem menção aos representantes estrangeiros presentes. Na plataforma, é informado apenas o local do jantar de cortesia, que teria sido realizado na Embaixada da China em território brasileiro. A primeira reunião com o mesmo país, feita em 2 de fevereiro, foi registrada no e-Agendas.

 

 

Ministro repete o Itamaraty sobre o Hamas

Ao alegar que o ministro privilegiou a diplomacia iraniana em sua agenda até aqui, o que não é verdade, o deputado federal Marcel van Hattem questiona se isso teria relação com o fato de Almeida não chamar o Hamas de organização terrorista. O governo iraniano é apoiador de grupos anti-Israel no Oriente Médio, entre eles o Hamas, que protagoniza conflito armado com Israel atualmente.

Em manifestações pelas redes sociais, Silvio Almeida endossou apelos do presidente Lula (PT) por um corredor humanitário na Faixa de Gaza e por um cessar-fogo em defesa das crianças israelenses e palestinas. Ele também destacou as operações de repatriação de brasileiros na região do conflito e classificou como “atentados”, em publicação do último dia 10, a ofensiva do Hamas em 7 de outubro que deu início ao atual conflito e que matou o brasileiro Ranani Nidejelski Glaze no Sul de Israel.

“O MDHC manifesta solidariedade à família e aos amigos de Ranani e reitera a manifestação do Estado brasileiro de repúdio a ataques contra a população civil”, escreveu Almeida na ocasião, sem classificar o Hamas como terrorista ou mesmo citar o nome do grupo extremista palestino.

O ministro repete uma abordagem da diplomacia brasileira. O Conselho de Segurança da ONU não classifica o Hamas como grupo terrorista, e o Itamaraty segue esta avaliação, bem como a maior parte dos países membros da ONU, entre eles Noruega, Suíça, México, Rússia e Colômbia, além do Brasil.

Apesar da definição da ONU, países como Estados Unidos, Reino Unido, Canadá, Austrália, Japão, integrantes da União Europeia e outras nações classificam o Hamas como uma organização terrorista.

“A prática brasileira, consistente com a Carta da ONU, habilita o país a contribuir, juntamente com outros países ou individualmente, para a resolução pacífica dos conflitos e na proteção de cidadãos brasileiros em zonas de conflito – a exemplo do que ocorreu, em 2007, na Conferência de Anápolis, EUA, com relação ao Oriente Médio”, diz nota do Itamaraty, publicada no dia 12 de outubro.

No último dia 20 de outubro, o presidente Lula tratou pela primeira vez como “terrorismo” os ataques do Hamas a Israel. O entendimento dele não foi repetido até aqui, contudo, pelo Itamaraty nem pelo ministro Silvio Almeida.

O que diz o responsável pela publicação: Por e-mail, a assessoria de Marcel van Hattem afirmou que ele havia obtido as informações dos encontros a partir de consulta ao e-Agendas em 11 de outubro. Mas, como afirmado acima, outros encontros já constavam na plataforma na data.

O que podemos aprender com esta verificação: Dados reais são frequentemente usados fora do contexto de maneira intencional para enganar e levar a uma interpretação diferente da verdadeira. No caso checado, o autor da publicação utiliza dados parciais e informações incompletas para inferir que o ministro estaria priorizando as relações com o Irã.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: Peças de desinformação que envolvem o conflito entre o Hamas e Israel têm sido recorrentes. O Comprova já verificou que um vídeo viral mostra turistas estrangeiros no Ceará, e não integrantes do grupo extremista no Brasil; que Joe Biden, presidente dos Estados Unidos, não disse que Lula deveria se preocupar com comida para brasileiros em vez da guerra; que o Brasil doou R$ 25 milhões à Autoridade Palestina para ajuda humanitária, e não ao Hamas; que o presidente brasileiro depositou flores no Museu do Holocausto, ao contrário do que alega vídeo; e que o governo assinou acordo com a Autoridade Palestina, e não com o Hamas.

O Comprova também mostrou recentemente que Silvio Almeida não pediu a anulação de eleições para conselhos tutelares porque “a direita venceu”.

 

Atualização 1: Para dar mais clareza a esta verificação, o conteúdo foi atualizado em 25 de outubro de 2023 para incluir duas tabelas que listam as reuniões realizadas pelo ministro Silvio Almeida, com as datas de realização e de registro no e-Agenda e link para os prints de cada um dos registros dessas reuniões na plataforma. 

Atualização 2: Esta verificação foi atualizada em 31 de outubro de 2023 para destacar o que diz o Art. 12 do Decreto 10.889/2021 sobre o prazo de registro e publicação no e-Agendas. 

Política

Investigado por: 2023-10-23

Policiais foram expulsos pelo MST de protesto em rodovia no PR, e não feitos reféns

  • Enganoso
Enganoso
Três policiais militares foram rendidos e expulsos por manifestantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST) de um protesto que bloqueou a rodovia PR-170 na altura de Guarapuava, no centro-sul do Paraná, em 19 de outubro. Diferentemente do que alega publicação no Telegram, eles não foram feitos reféns, o que foi negado pelo MST e pela própria Polícia Militar do Paraná (PMPR). O ato reivindicava a regularização fundiária de comunidades na região.

Conteúdo investigado: Vídeo publicado no Telegram traz a seguinte legenda: “Que absurdo, policiais são feitos de reféns por Terroristas MST [sic] em Guarapuava no Paraná”. O registro mostra ao menos dois policiais rendidos por várias pessoas que caminham com bandeiras do MST à beira de uma rodovia, no que parece ser um protesto. Há dois narradores no vídeo, que, aparentemente, gravam a cena de dentro de um carro que percorre a pista. “Pegaram a polícia… refém. Filma, filma”, diz um deles.

Onde foi publicado: Telegram e X (antigo Twitter).

Conclusão do Comprova: Manifestantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST) não fizeram policiais reféns à beira da rodovia PR-170 na altura de Guarapuava, diferentemente do que alega publicação em canal do Telegram. Três agentes foram rendidos em 19 de outubro e expulsos do trecho da estrada onde era feito bloqueio pela entidade em protesto pela regularização fundiária de comunidades na região.

A alegação sobre os policiais terem sido feitos reféns foi negada pelo MST e pela própria Polícia Militar do Paraná (PMPR), à qual os agentes rendidos são vinculados.

“Os policiais envolvidos na ocorrência passam bem, nenhum deles foi feito refém e já se encontram na sede do 16º BPM”, escreveu a corporação em nota ao Comprova.

A PMPR comunicou ainda que os manifestantes utilizaram “força e agressão” para retirar do local a equipe policial, que, ainda segundo a corporação, se deslocou de maneira pacífica para liberar a rodovia.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Até dia 23 de outubro, a publicação no Telegram havia tido 12,7 mil visualizações. No X, onde o vídeo aparentemente foi publicado primeiro, a publicação contava com 360 visualizações.

Como verificamos: O Comprova identificou notícias relacionadas ao vídeo ao buscar no Google pelos termos “Guarapuava Polícia MST refém”. Uma reportagem do G1 exibe o mesmo vídeo que circula no Telegram e contextualiza que os policiais foram rendidos por manifestantes do MST na ocasião.

A publicação do G1 relata que, em nota, a Polícia Militar paranaense negou que os policiais tivessem sido feitos reféns. O Comprova buscou, então, contato com a corporação, que reforçou o posicionamento. O MST também divulgou comunicado, no qual afirma ser falsa a acusação.

O Comprova também tentou contato com o canal do Telegram que fez a divulgação do vídeo, mas não obteve retorno até esta publicação. A reportagem identificou um dos autores que narram o registro, mas não conseguiu entrar em contato.

Rendição de PMs ocorreu após bloqueio em rodovia

A rendição dos três policiais militares ocorreu em meio a um protesto do MST na altura do km 390 da rodovia PR-170, em trecho que passa pelo município de Guarapuava.

Uma reportagem local do G1 PR noticiou que o protesto com bloqueio da rodovia teve início na quarta (18), mas depois foi interrompido. A manifestação foi retomada então na manhã de quinta, quando a via teve o trânsito paralisado por cerca de três horas. Foi nesse segundo momento de interdição em que houve o impasse do MST com os policiais militares, que acabaram rendidos.

“Uma equipe deslocou até local e de maneira pacífica pediu para que os manifestantes liberassem a via, que é a única estrada de acesso a cidade vizinha de União da Vitória, sendo repassado aos manifestantes que há uma Liminar de Interdito Proibitório emitida pela 1ª Vara da Fazenda Pública de Guarapuava proibindo o bloqueio da via”, escreveu a PMPR, em nota ao Comprova.

A corporação comunicou ainda que, por ocasião das agressões e ameaças proferidas contra os policiais que negociavam o desbloqueio da via, foram expedidos dois mandados de prisão e um mandado de busca e apreensão pela 3ª Vara Criminal de Guarapuava, para serem cumpridos nesta sexta (20) no Assentamento Nova Geração em Guarapuava, a partir de onde o MST mobilizou o protesto.

Foram abordadas cerca de 200 pessoas e dez delas foram conduzidas a uma delegacia da Polícia Civil, ainda de acordo com a PMPR. “Seis pessoas foram identificadas como envolvidas nas agressões aos policiais militares e estão sendo ouvidas pelo Delegado de Polícia que preside o Inquérito Policial.”

MST pede regularização fundiária de 14 comunidades na região

O MST divulgou, em nota, que os bloqueios reivindicam uma resposta da superintendência do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária no Paraná (Incra-PR) sobre pedidos de regularização fundiária de 14 comunidades da reforma agrária e de posseiros da região.

“As comunidades estão localizadas nos municípios de Inácio Martins, Pinhão, Reserva do Iguaçu e Guarapuava, em 75 mil hectares de terras griladas por grandes proprietários. Cerca de 2 mil famílias camponesas vivem nas comunidades, algumas há mais de 30 anos, à espera da formalização dos assentamentos”, comunicou o movimento social.

Ao Comprova, o Incra-PR comunicou ter se reunido com representantes de trabalhadores rurais acampados, dos assentados da região de Guarapuava (PR) e da Comissão de Conflitos Fundiários do Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR) no último dia 19 de outubro para tratar das reivindicações.

O órgão afirmou ainda ter firmado um compromisso de enviar, na segunda quinzena de novembro, uma equipe de técnicos por ações de supervisão e regularização ocupacional ao local.

“Também ficou acordado que, no mês de dezembro, será realizado o cadastramento de acampados e posseiros de Pinhão [município vizinho a Guarapuava] e região, por meio de um novo sistema informatizado, desenvolvido para esse fim”, escreveu o Incra-PR, em nota.

O que diz o responsável pela publicação: O Comprova tentou contato pelo e-mail cedido na descrição do canal “MSP – Movimento Sem Picanha”, mas não obteve retorno até esta publicação. Foi encontrado o primeiro perfil que compartilhou o vídeo no X – sem alegar sequestro –, mas a conta não permite o envio de mensagens e não foram encontrados perfis com correspondência.

O que podemos aprender com esta verificação: Uma das táticas mais utilizadas por desinformadores é o uso de informações reais de forma distorcida ou intencionalmente fora do contexto para enganar e levar a uma interpretação diferente da verdadeira. A publicação confunde ao afirmar que os policiais rendidos foram também feitos reféns pelos integrantes do movimento.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: O Comprova já verificou uma série de publicações envolvendo a atuação do MST. Recentemente, mostrou que post engana ao associar o grupo plantação de maconha na Bahia e que matança de bois no mesmo estado não tem relação com o movimento.

Política

Investigado por: 2023-10-20

Vídeo mostra turistas estrangeiros no Ceará, não integrantes do Hamas no Brasil

  • Falso
Falso
É falso que o grupo extremista Hamas tenha chegado ao Brasil, como alegam postagens nas redes sociais. Vídeos de cunho preconceituoso usam imagens de homens vestidos com trajes tradicionalmente usados por muçulmanos andando por uma cidade no interior do Ceará para afirmar que eles fariam parte do grupo palestino que atacou Israel em 7 de outubro deste ano.

Conteúdo investigado: Vídeo utiliza imagens recentes de homens em trajes tradicionais da religião muçulmana andando por uma cidade no interior do Ceará que foram sobrepostas com os dizeres “REBELDES DO HAMAS JÁ ESTÃO NO BRAZIL. NAVIL ESTA ANCORADO NO CIARÁ CIDADE DE CRATEUS” (sic). Na montagem, são incluídas ainda fotos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e da presidente nacional do PT, Gleisi Hoffmann, com Mohamad Sami El-Kadri, que hoje preside o Fórum Latino Palestino. Há ainda um print de um tuíte com uma ameaça do Estado Islâmico direcionada ao Brasil.

Onde foi publicado: X (antigo Twitter) e TikTok

Conclusão do Comprova: Postagem com imagens de homens em trajes tradiconais muçulmanos caminhando pela rua mente ao afirmar que o grupo extremista palestino Hamas teria chegado ao Brasil. O vídeo, de cunho preconceituoso, associa registros da passagem de turistas estrangeiros por cidades no Ceará com uma suposta chegada ao país do Hamas, movimento islamista que atacou Israel em 7 de outubro de 2023.

A postagem falsa diz que os supostos “rebeldes do Hamas” teriam chegado de navio, que estaria ancorado em Crateús. Porém, a cidade citada não fica no litoral do Ceará e está, na verdade, a cerca de 300 quilômetros do mar.

Segundo a prefeitura de Crateús, o grupo, de cerca de 10 estrangeiros, esteve hospedado na casa de uma moradora da cidade por volta de uma semana atrás, mas já partiu. Não há informações precisas sobre a origem dos turistas.

O Comprova consultou o diretor do Centro Islâmico do Ceará, Yahya Simões, que afirmou que pelas vestimentas – que são, de fato, islâmicas – os homens aparentam ser do Paquistão ou da Índia.

O vídeo desinformativo traz ainda uma montagem com fotos de Lula e da presidente nacional do PT, Gleisi Hoffmann, ao lado de Mohamad Sami El-Kadri, que hoje preside o Fórum Latino Palestino, e do presidente brasileiro ao lado do presidente do Irã, Ebrahim Raisi. Nesta última, Raisi é identificado como “o chefe do Hamas”, o que não é verdade.

O conteúdo engana também ao mostrar um tuíte em francês com uma ameaça ao Brasil. A postagem é de novembro de 2015 de uma conta relacionada ao Estado Islâmico, sem relação alguma com o atual conflito entre Israel e Hamas.

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma falsidade.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. O post no X teve 181 mil visualizações até 18 de outubro. Ele foi apagado posteriormente.

Como verificamos: O Comprova buscou pelos termos “árabes”, “muçulmanos” e “Ceará” e encontrou vídeos similares aos utilizados na postagem enganosa com a indicação de que teriam sido filmados em Crateús e Tianguá, no Ceará. Foi feito contato com ambas as prefeituras.

Para encontrar as pessoas fotografadas com o presidente Lula e com Gleisi Hoffmann, foram utilizadas as ferramentas de busca reversa PimEyes e InVID. Mais pistas de quem poderiam ser as pessoas nas imagens foram encontradas nos próprios comentários no vídeo verificado aqui. Uma vez identificados, bastou pesquisar os nomes ‘Mohamad Sami El-Kadri’ e ‘Ebrahim Raisi’ para obter mais informações sobre quem são e quando teriam se encontrado com os petistas.

Por fim, para checar o tuíte com ameaça ao Brasil, o Comprova pesquisou o nome do usuário revelado pelo próprio vídeo e rapidamente encontrou notícias de 2016 sobre o assunto. Isso mostrou que a postagem era real, porém sem conexão alguma com o atual conflito entre Israel e Hamas.

Postagem preconceituosa

O conteúdo checado faz uma montagem de imagens de diversas fontes, recentes e antigas, com o objetivo de desinformar.

A primeira parte mostra homens com vestes geralmente utilizadas por muçulmanos andando pelas ruas de alguma cidade brasileira (as placas das lojas estão em português).

Ao Comprova, os assessores de comunicação das cidades de Crateús e de Tianguá confirmaram que os vídeos foram gravados nesses locais. Segundo eles, trata-se de um grupo de turistas que estaria hospedado na casa de uma mulher em Crateús e que viajou para Tianguá.

Postagens nas redes sociais mostram que a passagem dos estrangeiros causou comoção nos dois municípios. Há diversos vídeos em que eles aparecem jogando futebol e caminhando pela rua. Não há informações concretas, contudo, sobre a nacionalidade dos turistas.

O diretor do Centro Islâmico do Ceará, com sede em Fortaleza, Yahya Simões, confirmou que as vestimentas estão relacionadas à religião muçulmana e condenou o preconceito presente nas publicações.

“Pelos comentários no vídeo, você vê o imenso preconceito que existe contra os muçulmanos. Esse vídeo nada mais é do que falsa propaganda querendo manchar a índole e a imagem dos muçulmanos, seja no Ceará, seja no Brasil, seja no mundo. Deve-se ter em mente que os muçulmanos que praticam a religião da maneira correta são contra qualquer tipo de ato de extremismo, qualquer tipo de ato de injustiça”, afirma.

Montagem de fotos fora de contexto

A segunda parte do vídeo traz fotos de Lula e de Gleisi Hoffman com dois homens. Um deles, que o desinformador acusa ser “o chefe do Hamas”, na verdade, é o presidente do Irã, Ebrahim Raisi.

A foto é do dia 24 de outubro de 2023 e foi tirada em Joanesburgo, na África do Sul, no contexto da Cúpula do BRICS. Os dois presidentes tiveram uma reunião bilateral naquele dia, após o Irã ser confirmado como novo membro do BRICS – como consta em publicação oficial do Planalto.

A imagem original está no Flickr oficial do Planalto e também no Instagram do presidente Lula.

A outra pessoa é o brasileiro Mohamad Sami El-Kadri, que hoje preside o Fórum Latino Palestino. Em 2018, ele foi candidato a deputado estadual de São Paulo pelo PT. Também há registros na internet mostrando que ele foi presidente da Associação Islâmica de São Paulo, em 2005, e coordenador do Comitê de Apoio à Luta e Revolução do Povo Sírio, em 2012. À Lupa, El-Kadri informou que a foto com o presidente Lula foi tirada quando o petista saiu da prisão, em novembro de 2019, enquanto a foto com Gleisi Hoffmann foi feita quando ele presenteou a parlamentar com a hata, o lenço palestino.

A última parte do vídeo verificado exibe um print de um tuíte em francês com uma ameaça ao Brasil.

A publicação é de novembro de 2015, sem relação alguma com o atual conflito entre Israel e Hamas. Na época, uma conta vinculada ao membro do Estado Islâmico (EI) Norman Maxime Hauchard de fato publicou “Brasil, vocês são nosso próximo alvo”. Isso foi após os ataques terroristas do dia 13 de novembro daquele ano em Paris, alguns meses antes dos Jogos Olímpicos Rio 2016.

O que diz o responsável pela publicação: O perfil no X que publicou o vídeo não permite envio de mensagens diretas. Ele não foi identificado em outras redes sociais.

O que podemos aprender com esta verificação: Muitas publicações desinformativas estão aparecendo em meio ao conflito entre Israel e Hamas. Inclusive, postagens de cunho preconceituoso, como o vídeo verificado aqui. Diante de um assunto de grande evidência, é especialmente importante tentar pesquisar a origem das alegações que surgem nas redes sociais. A partir daí, é possível filtrar se determinada postagem é verossímil quando há notícias ou notas oficiais do governo corroborando o que foi dito, ou se a alegação foi simplesmente inventada.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: O conteúdo verificado aqui também já foi desmentido pelo Boatos.org e pela própria Secom do governo federal. Alegações falsas acrescentadas à fotografia do presidente Lula com Mohamad El-Kadri também já foram investigadas pela Lupa e pelo Estadão Verifica. A fotografia do petista ao lado do presidente do Irã, Ebrahim Raisi, já foi verificada por veículos como Lupa, Aos Fatos e AFP Checamos.

Política

Investigado por: 2023-10-20

Vídeo tira imagens de contexto para mentir sobre desapropriações no AM e PA

  • Falso
Falso
Vídeo publicado no TikTok faz montagem com gravações de eventos distintos para afirmar que seriam operações de desapropriação no Pará e no Amazonas. Um dos vídeos foi filmado em Porto Seguro, na Bahia, em outubro de 2023, durante uma ação de reintegração de posse após decisão judicial. O outro registro foi feito durante um incêndio acidental no município de Anapu, sudoeste do Pará, em 15 de agosto de 2023, e não tem relação com a alegação do vídeo.

Conteúdo investigado: Vídeo exibe trechos de uma ação ostensiva da Polícia Militar em uma área rural e de incêndios em locais distintos, como uma oficina automotiva e um acampamento em uma área de mata. Há uma mensagem sobreposta ao conteúdo: “Desapropriações de terra seguem a todo vapor no Pará e Amazonas”. Na parte final do registro, um narrador alega que aquilo seria um trabalho da Polícia Federal junto da Força Nacional. “Tudo pegando fogo aqui, tudo aqui. Agora a gente só tem que pegar e ir embora, pegar as coisas e ir embora aqui da região, aqui”, afirma.

Onde foi publicado: TikTok.

Conclusão do Comprova: Vídeo descontextualiza imagens de situações distintas para espalhar a alegação falsa de que há operações de desapropriação de terra nos estados do Pará e do Amazonas.

O Comprova conseguiu identificar que a foto que abre o vídeo foi feita no território Yanomami, em Roraima, em operação do Ibama contra o garimpo ilegal. Já o primeiro vídeo exibido na postagem foi feito na Bahia, no município de Porto Seguro. Um segundo vídeo, de uma oficina automotiva em chamas, mostra, na verdade, um incêndio acidental em comércios de Anapu, no Pará.

A reportagem não conseguiu confirmar a origem do último trecho do vídeo, que exibe um incêndio em um acampamento em uma área de mata, com um maquinário também em chamas. Um narrador que fala nesta parte do registro, contudo, faz menção a uma ação da Polícia Federal (PF) e da Força Nacional, que costumam fazer operaçõesconjuntas de combate ao garimpo ilegal na Amazônia.

O próprio narrador dá a entender que se trata de área de garimpo, ao fazer menção ao fato de que os ocupantes do local teriam “gasto dinheiro à toa” com PLG, sigla para Permissão de Lavra Garimpeira. Não é possível atestar, no entanto, que a narração é original deste último recorte do vídeo.

O Comprova questionou o Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP) se reconhece as imagens do terceiro vídeo como sendo de alguma operação da PF contra o garimpo ilegal, mas não obteve retorno até esta publicação.

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma falsidade.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Até o dia 20 de outubro, foram mais de 85,2 mil visualizações, 3 mil curtidas e 978 comentários no TikTtok.

Como verificamos: O Comprova fez uso de diferentes técnicas para tentar identificar o contexto de cada parte do vídeo. Foi feita uma busca reversa de imagens usando Yandex, Google Imagens e TinEye, sem sucesso. Também foram selecionados elementos que ajudassem na identificação dos locais em que cada trecho foi gravado, como placas de carros, fachadas de comércios e fardas de autoridades.

As imagens foram comparadas com notícias divulgadas em diferentes locais do país, como da TV Bahia, afiliada Globo no estado, do G1 no Pará e do SBT Altamira. A Polícia Federal e as polícias militares do Pará e da Bahia foram consultadas. O Comprova entrevistou a Central Estadual de Associações das Comunidades Tradicionais da Agricultura Familiar e Campesina da Bahia (Cecaf/BA) e o dono da oficina automotiva em Anapu. Por fim, tentamos contato com o autor da publicação.

Foto é de operação contra garimpo ilegal

A fotografia que abre o vídeo exibe um barracão em chamas sob os olhares de um agente com farda do Ibama, órgão que costuma queimar o aparato de criminosos em ações contra o garimpo ilegal. Ao fazer uma busca simples no Google pelos termos “ibama operação garimpo”, a reportagem encontrou a imagem original, que era maior, mas foi recortada para ser incluída no vídeo enganoso.

Trata-se de uma foto de uma operação contra o garimpo ilegal no território Yanomami, em Roraima, em 6 de fevereiro de 2023. A imagem foi divulgada dois dias depois pelo governo federal. Na ocasião, foram destruídos um helicóptero, um avião, um trator de esteira e estruturas de apoio logístico ao garimpo. Além disso, a ação apreendeu duas armas de fogo e três barcos com cerca de 5 mil litros de combustível.

Reintegração de posse em Porto Seguro

O Comprova checou notícias divulgadas em diferentes locais do país e concluiu que os primeiros trechos da postagem desinformativa dizem respeito à reintegração de posse ocorrida na manhã do dia 3 de outubro, em Porto Seguro, na Bahia. O episódio ocorreu em uma localidade conhecida como Gleba Fazenda Roça do Povo/Mangabeira.

De acordo com notícia veiculada na TV Bahia, afiliada Globo no estado, a ação retirou da área centenas de famílias ligadas à Associação dos Produtores do Novo Horizonte. A sede da entidade de trabalhadores rurais funcionava no local e foi destruída. Outras dezenas de imóveis também foram derrubados no lugar.

A área tem 44 hectares e foi requerida na Justiça pelo proprietário. O pedido de posse da área foi feito em 2017 e uma sentença reconheceu a propriedade das terras. A partir disso, foi expedido mandado de reintegração de posse.

A Central Estadual de Associações das Comunidades Tradicionais da Agricultura Familiar e Campesina da Bahia (Cecaf/BA) confirmou ao Comprova a ação e afirmou que as famílias expulsas do lugar moravam e produziam a própria alimentação desde o início dos anos 2000. Até a retomada do terreno, a entidade diz que o espaço era dividido entre seis associações.

Na data da gravação, dia 3 de outubro, um oficial de justiça foi ao local acompanhado de homens da Polícia Militar e, com o documento de reintegração em mãos, cumpriu a decisão. Houve resistência, confusão e prisão de algumas pessoas. A PM informou à reportagem que não ocorreu confronto com os moradores, mas detenções aconteceram por causa de desobediência e de incitação à violência.

A Secretaria de Assistência Social do Estado cadastrou moradores despejados para tentar reduzir o impacto da reintegração através de ações sociais.

A defesa do dono das terras informou à TV Bahia que o proprietário do terreno estava disposto a garantir aluguel social para as famílias por pelo menos 6 meses. No entanto, nem todas as famílias aceitaram.

O Comprova tentou contato com a PM do estado, mas não recebeu resposta até aqui. A Secretaria de Desenvolvimento Regional do Estado também foi consultada sobre o caso, mas não houve retorno.

A postagem investigada afirma que as imagens teriam sido feitas no Pará e no Amazonas, mas a Polícia Militar paraense negou que nos registros apareçam agentes da corporação.

| Fotos – Reprodução/TikTok/Globoplay
 

Na imagem da esquerda (acima), o vídeo enganoso mostra a reintegração de posse em Porto Seguro como sendo desapropriações de terra no Pará e no Amazonas. A imagem da direita é do telejornal BA Meio-Dia e veicula imagens e informações reais sobre a reintegração de posse. Nas duas imagens é possível observar a mesma casa na cor cinza com a frente em formato diagonal.

É possível perceber também o fardamento dos agentes da Polícia Militar. Em ambos os registros os policiais usam roupas marrons claras, com peças nas pernas na cor preta e a inscrição de “Polícia Militar” nas costas. Também é possível ver, nas imagens abaixo, o momento em que um oficial de Justiça, de cabelos brancos e blusa preta, tenta conversar com a população. Em ambos os registros, esse momento é gravado.

 

Incêndio acidental em Anapu

Para identificar o local da cena exibida no segundo vídeo usado, de um incêndio em uma oficina automotiva, o Comprova buscou pelo sistema Sinesp Cidadão, do Ministério da Justiça e Segurança Pública, as placas dos carros que estão legíveis no vídeo, para verificar o local de registro dos veículos.

Um dos carros, um Volkswagen Gol preto (abaixo), tem placa de Anapu, no Pará. O DDD do município é 91, o mesmo que aparece nos números de telefone indicados na fachada da oficina (também abaixo).

 

Ao buscar por “autopeças são trindade anapu” no Google, o Comprova encontrou então à beira da Rodovia Transamazônica em Anapu um comércio parecido ao que foi incendiado, mas com um banner diferente. A imagem do local no Google Street View (abaixo) exibe, no entanto, uma outra placa na fachada do local com os dizeres “Barbudo calços de borracha”, que também aparece no vídeo do TikTok.

Já ao pesquisar “incêndio oficina anapu” no Google, o Comprova encontrou reportagens do G1 no Pará (abaixo) e do SBT Altamira que tratam do episódio, ocorrido em 15 de agosto deste ano. As chamas se espalharam por quatro estabelecimentos à beira da rodovia, incluindo a oficina automotiva. Segundo informações dos veículos locais, o incidente começou de maneira acidental, após ter sido colocado fogo em um terreno baldio vizinho.

A versão foi reforçada pelo proprietário da loja automotiva. O Comprova ainda fez contato por WhatsApp com o telefone indicado no registro de CNPJ da Autopeças São Trindade. Um homem que responde pelo número afirmou ser dono da oficina e disse que o incêndio ocorreu acidentalmente, sem qualquer relação com desapropriação de terra. Ao menos até a publicação deste texto, ele não autorizou sua identificação.

No conteúdo enganoso, um homem afirma que o incêndio teria sido causado pela Polícia Federal (PF). Por meio da nota, a corporação negou ter feito qualquer operação de desapropriação em Anapu.

O que diz o responsável pela publicação: O Comprova não conseguiu contato com o responsável pela publicação.

O que podemos aprender com esta verificação: Desinformadores costumam utilizar montagens com registros de situações reais, mas fora do contexto original, para fazer alegações enganosas ou falsas a respeito de um assunto amplamente comentado ou de interesse público. Outra tática é não identificar os autores dos registros, além de omitir quando e onde foram gravados. Nesses casos, é importante buscar veículos de comunicação de sua confiança para verificar se a alegação é verdadeira ou não.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: Recentemente, o Comprova mostrou que o governo federal não estava expulsando famílias de assentamento no município de São Félix do Xingu, no Pará. As pessoas retiradas eram consideradas invasoras pela Justiça e ocupavam território indígena homologado há anos. Também foi mostrado que era enganoso vídeo que relacionava protestos em Pernambuco a Lula e à transposição do rio São Francisco e que vídeo de hidrelétrica transbordando era antigo e não tem relação com desligamento de bombas do São Francisco.

Política

Investigado por: 2023-10-20

Biden não disse que Lula deveria se preocupar com comida para brasileiros em vez da guerra

  • Enganoso
Enganoso
Post engana ao afirmar que Joe Biden, presidente dos Estados Unidos, teria dito ao presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que ele deveria se preocupar em colocar comida nas mesas dos brasileiros, em vez de se preocupar com a guerra. A mensagem viralizou durante os embates entre os dois líderes a respeito da guerra entre Hamas e Israel. Há uma afirmação parecida, feita por um conselheiro de Biden em abril deste ano, no contexto da guerra entre Rússia e Ucrânia.

Conteúdo investigado: Vídeo no TikTok traz uma foto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e do presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, com os dizeres “Biden manda indireta para Lula e diz que ao invés dele se preocupar com a guerra ele deveria era se preocupar em por comida na mesa dos brasileiros”.

Onde foi publicado:TikTok, Instagram e YouTube.

Conclusão do Comprova: Um vídeo que viralizou após o início da guerra entre o grupo palestino Hamas e Israel engana ao afirmar que o presidente americano, Joe Biden, teria dito a Lula para se preocupar em colocar comida nas mesas dos brasileiros, e não com a guerra.

Houve um pronunciamento similar feito por um conselheiro do chefe de Estado americano em abril de 2023, mas tratava-se de uma resposta ao posicionamento de Lula a respeito da guerra na Ucrânia. Na ocasião, Juan Gonzalez, diretor sênior de Hemisfério Ocidental do Conselho de Segurança Nacional da Casa Branca, disse: “se perguntar a um brasileiro na rua qual é a opinião dele sobre a Ucrânia, ele diria que está pensando mais em colocar comida na mesa, nas chances de educação e oportunidades econômicas, do que no que alguns deles veem como um conflito na Europa que ocorre há 300 anos”.

A busca no Google pelas palavras-chave citadas na postagem, como “comida” e “guerra”, associadas aos nomes dos dois presidentes, não retornou qualquer resultado que confirmasse uma alegação recente a esse respeito. O resultado mais próximo a esse sentido é uma reportagem da Folha de S.Paulo, de abril de 2023, citando a fala de Juan Gonzalez.

As palavras-chave também foram pesquisadas em inglês e o retorno mais substancial da busca é sobre um encontro entre os dois presidentes, em 20 de setembro, em Nova York, quando ambos evitaram falar da guerra entre Rússia e Ucrânia e quando o ataque a Israel ainda não havia ocorrido.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. O post aqui verificado teve até 20 de outubro 724 mil visualizações no TikTok, 17,4 mil curtidas, além de receber 2,6 mil comentários e ser compartilhado mais de 3,8 mil vezes. No Instagram, a postagem teve mais 255 reações. No YouTube, foram 80 mil visualizações, 1 mil curtidas e 199 comentários.

Como verificamos: Utilizando o Google, buscamos combinações das palavras-chave supostamente ditas por Joe Biden, junto do nome dele e do presidente Lula. Enviamos e-mail para a Casa Branca, para a Embaixada dos Estados Unidos no Brasil e para o Ministério das Relações Exteriores brasileiro. Consultamos notícias relacionadas ao conflito entre Hamas e Israel e ao posicionamento do governo brasileiro sobre ele. Também buscamos o perfil responsável pela publicação em outras redes e encontramos contas no Kwai, Instagram e YouTube. Por fim, entramos em contato com o autor.

Biden não disse que Lula deveria se preocupar em pôr comida na mesa dos brasileiros

Uma busca no Google com as palavras-chave “guerra” e “comida”, associadas aos nomes dos presidentes Joe Biden e Lula, em português, não localizou qualquer notícia relacionada à alegação feita no post. O resultado mais próximo encontrado é uma reportagem da Folha de S.Paulo, de abril de 2023, quando uma declaração do presidente Lula a respeito de um suposto interesse dos Estados Unidos em incentivar a guerra entre Rússia e Ucrânia repercutiu no país norteamericano.

Na ocasião, o diretor sênior de Hemisfério Ocidental do Conselho de Segurança Nacional da Casa Branca, Juan Gonzalez, um dos principais conselheiros do presidente americano, Joe Biden, disse que países como o Brasil estão longe do conflito e, portanto, essa não era uma preocupação prioritária de seus cidadãos. Conforme ele, “se perguntar a um brasileiro na rua qual é a opinião dele sobre a Ucrânia, ele diria que está pensando mais em colocar comida na mesa, nas chances de educação e oportunidades econômicas, do que no que alguns deles veem como um conflito na Europa que ocorre há 300 anos”.

Gonzalez acrescentou que todos que assinaram a Carta da ONU têm responsabilidades e que países como o Brasil, que desempenham um papel de liderança pela paz, são bem-vindos, mas que a ideia de que os EUA não apoiam a paz ou têm algo a ver com o início da guerra não tem relação com os fatos. “Passamos todo o ano de 2021 tentando evitar que a guerra acontecesse e temos apoiado a paz”, declarou.

A mesma pesquisa por palavras-chave, mas feita em inglês, também não retorna declaração do presidente norte-americano no sentido alegado nas redes sociais. Os resultados mais recentes estão relacionados à notícia do encontro entre os presidentes, em 20 de setembro, em Nova York, durante a Assembleia Geral das Nações Unidas (ONU). Na ocasião, os dois evitaram falar sobre as diferenças entre os posicionamentos de ambos acerca da guerra entre Rússia e Ucrânia (PBS, AP News e ABC News). O conflito entre Hamas e Israel ainda não havia iniciado.

O Comprova procurou a Casa Branca, a Embaixada dos Estados Unidos no Brasil e o Ministério das Relações Exteriores, mas não recebeu respostas até o momento.

Como o Brasil se posiciona em relação ao conflito na Faixa de Gaza

O conteúdo aqui checado circula amplamente durante o conflito entre Hamas e Israel, dando a entender que Biden poderia ter criticado Lula sobre este assunto. O governo brasileiro, que apoia a criação de um estado palestino e a manutenção de Israel, estabelecido em 1948, tem defendido que as partes cessem ataques e que seja retomada uma negociação de paz.

Como presidente do Conselho de Segurança da ONU, o país já convocou mais de uma reunião sobre o assunto e tenta aprovar uma proposta que minimize a crise humanitária na região da Faixa de Gaza. Em 18 de outubro, foi votada a primeira, que defendeu pontos como a libertação imediata e incondicional dos reféns israelenses, a proteção de civis e da infraestrutura, a criação de um corredor humanitário, a saída segura de civis e a proteção de pessoal de assistência humanitária, além de condenar todas as formas de violência contra civis, incluindo os atos do Hamas.

A proposta recebeu 12 votos favoráveis, mas acabou vetada pelos Estados Unidos, um dos integrantes permanentes do conselho.

Conforme a embaixadora norte-americana, Linda Thomas-Greenfield, o motivo foi a resolução não mencionar claramente o direito de Israel de se defender. Já o embaixador do Brasil na ONU, Sergio Danese, disse que houve um esforço para acomodar posições diferentes e até opostas, com foco na situação humanitária. A partir disso, o ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, afirmou que é preciso aguardar a evolução dos fatos e ver se há condição de apresentar nova proposta, diferente da atual.

No dia dos ataques do Hamas a Israel, em 7 de outubro, o governo brasileiro publicou nota condenando os atos e manifestando solidariedade ao povo de Israel, reiterando o compromisso com a solução de dois Estados, com Palestina e Israel convivendo em paz e segurança, dentro de fronteiras mutuamente acordadas e internacionalmente reconhecidas.

No mesmo dia, no X (antigo Twitter), Lula disse ter ficado chocado com os ataques terroristas, expressou condolências aos familiares das vítimas e reafirmou o repúdio ao terrorismo em qualquer de suas formas. Ele defendeu, ainda, a retomada das negociações que conduzam a uma solução ao conflito e que garanta a existência de um Estado Palestino economicamente viável, convivendo pacificamente com Israel.

No dia 11, Lula publicou na mesma plataforma uma carta aberta ao secretário-geral da ONU, António Guterres, e à comunidade internacional, na qual fez um apelo em defesa das crianças palestinas e israelenses. No post, ele diz ser preciso que o Hamas liberte crianças israelenses sequestradas e que Israel cesse o bombardeio para que as crianças palestinas e suas mães deixem a Faixa de Gaza.

Após a oposição criticar a postura do governo brasileiro, que não classifica o Hamas como grupo terrorista, Mauro Vieira disse, em 18 de outubro, que não adotará a classificação até que a ONU o faça, posicionamento acatado historicamente pelo Brasil em relação a assuntos dessa natureza.

O que diz o responsável pela publicação: O Comprova entrou em contato com o autor da publicação via mensagem no Instagram, mas não obteve resposta.

O que podemos aprender com esta verificação: Uma tática usada pelos agentes de desinformação é o uso de declarações de autoridades sem a indicação da fonte. Neste caso, uma declaração com esse teor teria grande repercussão na mídia. É preciso sempre consultar veículos de comunicação de sua confiança e órgãos oficiais para atestar a veracidade da informação.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: Recentemente, o debate em torno da guerra entre Hamas e Israel, e o papel do Brasil no conflito, tem gerado desinformação. O Comprova já verificou que Lula depositou flores no Museu do Holocausto, ao contrário do que alega vídeo, que o Brasil doou R$ 25 milhões à Autoridade Palestina para ajuda humanitária, e não ao grupo terrorista e que o governo brasileiro assinou acordo de cooperação técnica com Autoridade Palestina, não com o Hamas. As relações diplomáticas do governo Lula também são constantemente alvo de desinformação. O Comprova checou que é falso que Lula não tenha sido convidado para evento de líderes promovido por Biden e que vídeo de projeção em prédio de Nova York com frase de apoio a Lula é de 2022.

Política

Investigado por: 2023-10-19

Governo Lula assinou acordo de cooperação técnica com Autoridade Palestina, não com o Hamas

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Enganoso
O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) não assinou, em setembro de 2023, um acordo de cooperação técnica com o grupo Hamas. O termo em questão foi celebrado com a Organização para a Libertação da Palestina (OLP), em nome da Autoridade Nacional Palestina (ANP), não tendo qualquer relação com o grupo extremista.

Conteúdo investigado: Vídeo com trecho de discurso do deputado federal Giovani Cherini (PL-RS), em sessão na Câmara dos Deputados, em que o parlamentar afirma que o Brasil está em cooperação técnica com o grupo extremista Hamas. O vídeo exibe o print de um decreto de setembro de 2023 que promulga acordo entre o governo federal e a Organização para Libertação da Palestina — a qual ele trata como “Autoridade de Libertação da Palestina”. Ele alega que o Hamas integra a organização.

Onde foi publicado: Kwai, Instagram e WhatsApp.

Conclusão do Comprova: O governo federal não firmou acordo de cooperação técnica com o Hamas, diferentemente do que alega um deputado federal. O parlamentar afirma ainda que o vínculo teria sido assinado com a “Autoridade de Libertação da Palestina”, entidade que sequer existe.

O decreto nº 11.695, de 11 de setembro de 2023, exibido pelo parlamentar em sua publicação, determina, na verdade, um acordo técnico do Brasil com a Organização para a Libertação da Palestina (OLP), em nome da Autoridade Nacional Palestina (ANP). A entidade é controlada pelo Fatah, um partido que é considerado o principal rival político do Hamas, pelo qual foi expulso da Faixa de Gaza em 2006.

Promulgado neste ano, o acordo foi aprovado também pela Câmara dos Deputados, em 8 de novembro de 2012, quando Cherini já era deputado. O parlamentar esteve presente, inclusive, na sessão em que houve aval ao texto. A votação na ocasião foi simbólica, sem registro da relação de votantes. Contudo, o partido dele à época, o PDT, encaminhou voto favorável. Além disso, ele não manifestou contrariedade ao acordo na data.

O parlamentar afirma no discurso que viralizou que a população judaica diminuiu desde que “foi criado, provisoriamente, a Palestina”. No entanto, o número de judeus no mundo aumentou desde a Segunda Guerra Mundial.

O acordo em questão pretende promover cooperação técnica em áreas consideradas prioritárias às duas partes, sem especificar quais são elas. Seriam feitas reuniões por via diplomática para estabelecer isso.

A Agência Brasileira de Cooperação (ABC), vinculada ao Ministério das Relações Exteriores, afirma que acordos desse tipo viabilizam o compartilhamento de conhecimentos, experiências e boas práticas entre países, com benefícios econômicos e sociais às duas partes. Atualmente, o Brasil tem parcerias bilaterais semelhantes à que assinou com a Autoridade Palestina com outros 80 países, incluindo Israel.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Até o dia 19 de outubro, a publicação no Kwai acumulava 3,5 mil curtidas e mais de 1,9 mil compartilhamentos. Na mesma data, a postagem no Instagram tinha 5,8 mil curtidas e havia sido compartilhada mais de 800 vezes. O conteúdo também vem sendo disseminado no WhatsApp.

Como verificamos: A verificação buscou no Google a afirmação “Brasil está em cooperação técnica com o Hamas”, o que resultou em links de checagens feitas por outros veículos (Aos Fatos, Estadão Verifica)

Também encontramos nas redes sociais do deputado federal Giovani Cherini a mesma alegação de existência do acordo entre Brasil e Hamas, feita durante pronunciamento em sessão na Câmara dos Deputados, do dia 10 de outubro.

O vídeo original do pronunciamento do parlamentar foi publicado em seu perfil oficial no Instagram. Em 18 de outubro, o deputado divulgou novo vídeo reafirmando a desinformação.

O Comprovou buscou também, via Google, o decreto nº 11.695, de 11 de setembro de 2023, que aparece como print no vídeo compartilhado nas plataformas Kwai, Instagram e WhatsApp. O documento está disponível no Diário Oficial da União, publicado em 12 de setembro de 2023.

Além disso, entramos em contato com o deputado e buscamos eventuais checagens anteriores que tratassem de conteúdos divulgados por ele.

Um levantamento da Agência Lupa de 2022 revelou que Giovani Cherini foi o parlamentar que mais disseminou desinformação sobre o coronavírus em discursos no plenário da Câmara dos Deputados ao longo de 2021. Também no primeiro ano de pandemia, o deputado afirmou, sem qualquer embasamento científico ou plausibilidade biológica, que o câncer do ex-prefeito de São Paulo Bruno Covas (PSDB), já falecido, teria sido agravado pelo uso de máscara, “porque as células precisam de respiração”.

OLP, Autoridade Palestina e Hamas não são a mesma coisa

Por ser um tema em evidência e que vem sendo utilizado por desinformadores para espalhar alegações falsas ou enganosas, o Comprova já detalhou que a Autoridade Palestina não é comandada pelo Hamas.

O deputado Giovani Cherini faz confusão ao citar a existência da suposta “Autoridade de Libertação da Palestina”, que incluiria o Hamas. O acordo técnico foi assinado, conforme destaca o decreto, com a Organização para a Libertação da Palestina (OLP), em nome da Autoridade Nacional Palestina (ANP), também conhecida apenas por Autoridade Palestina.

A OLP é um movimento político fundado em 2 de junho de 1964 por um grupo de palestinos no exílio em defesa da causa nacional palestina. Vários partidos integram a organização, entre eles o Fatah, principal líder da OLP, considerado mais moderado e com divergências históricas frente ao Hamas.

A OLP foi criada com o apoio da Liga Árabe, uma organização internacional que representa os países árabes, que dão suporte ainda hoje à causa palestina.

Já a ANP é uma autoridade que surgiu em 1994 como consequência dos Acordos de Oslo, firmados entre Israel e palestinos a contragosto do Hamas. A Autoridade tem poderes investidos pela OLP para atuar como um governo autônomo em territórios do que viria a ser o Estado da Palestina enquanto as negociações pela paz entre os dois grupos se desenvolviam.

Os Acordos de Oslo foram firmados à época com atuação de Yasser Arafat, que foi líder do Fatah, chefe da OLP em um primeiro momento e depois presidente da ANP até 2004, quando morreu.

Apesar de ter surgido com caráter provisório, por um período de cinco anos, a ANP permanece ativa até hoje, enquanto o Estado da Palestina não é reconhecido por toda a comunidade internacional. Atualmente, a ANP é comandada pelo presidente Mahmoud Abbas, também do Fatah. Ou seja, na contramão do que os posts levam a crer, a OLP, a ANP e o Hamas não são a mesma coisa.

A ANP deveria atuar como órgão interino de autogoverno em áreas da Cisjordânia e da Faixa de Gaza, conforme estabeleceram os Acordos de Oslo. Contudo, a autoridade administra hoje apenas a Cisjordânia. Já a Faixa de Gaza está sob controle do Hamas, que expulsou violentamente o Fatah da região em 2006, ao fundar um governo independente da ANP.

O grupo fundamentalista islâmico Hamas é considerado terrorista por países como Estados Unidos, Japão e as nações vinculadas à União Europeia. Já o Brasil, seguindo a classificação da ONU, não reconhece o Hamas como uma organização terrorista. Apesar do posicionamento neutro do país sobre o tema, Lula classificou os ataques recentes do grupo a Israel como “terroristas”.

O Hamas foi criado durante a Primeira Intifada palestina, um movimento contra a ocupação israelense da Cisjordânia e da Faixa de Gaza. Em sua carta fundadora, de 1988, o grupo rechaça a existência do Estado de Israel.

Deputado participou de aprovação do acordo

O decreto do governo federal que promulgou o acordo, exibido pelo deputado Giovani Cherini, menciona que o texto já havia sido aprovado pelo Congresso Nacional com o decreto legislativo nº 586, de 2012.

Esse decreto legislativo teve tramitação iniciada pela Câmara dos Deputados, com o Projeto de Decreto Legislativo (PDL) 44/2011, que foi aprovado em 8 de novembro de 2012. Na ocasião, Cherini era deputado federal e marcou presença na sessão extraordinária que tratou do texto, entre 385 parlamentares.

O portal da Câmara não exibe a lista de votantes na ocasião, uma vez que a votação foi simbólica. Neste tipo de votação, o presidente da sessão pede que os deputados que aprovam o projeto permaneçam como estão, conforme prevê o Regimento Interno da Casa.

Não há vídeos da sessão disponíveis no portal da Câmara. Há registro, contudo, de que o PDT, partido de Cherini à época, encaminhou voto favorável ao acordo. Apenas um deputado se inscreveu na ocasião como orador para falar do assunto, o delegado Protógenes (PCdoB-SP), que endossou a aprovação.

Deputado cita dados errados sobre população judaica

Giovani Cherini afirma, ainda em seu discurso sobre o suposto acordo do Brasil com o Hamas, que a população judia teria diminuído desde que “foi criado, provisoriamente, a Palestina”.

Ele não esclarece, contudo, qual o marco temporal que entende ser o de criação provisória da Palestina, definição que não tem consenso entre a comunidade internacional. Um movimento significativo mais recente sobre o tema é de 29 de novembro de 2012, quando a Organização das Nações Unidas (ONU) concedeu status de Estado observador não membro à Palestina. Israel e Estados Unidos foram contrários e até hoje mantêm a posição de não reconhecimento da existência de um Estado da Palestina.

Além disso, Cherini não cita a origem dos dados populacionais sobre os quais faz menção. Ele afirma que o número de judeus teria caído de 18 milhões para 15 milhões. A Biblioteca Virtual Judia adota estimativa mais recente, de 2022, de que há ao menos 15.253.500 judeus no mundo, maior número desde o fim da Segunda Guerra Mundial, em 1945, quando foram vítimas do Holocausto.

O que diz o responsável pela publicação: O Comprova tentou contato pelo e-mail do gabinete do deputado federal Giovani Cherini, mas não obteve retorno até esta publicação.

O que podemos aprender com esta verificação: Uma das táticas mais utilizadas por desinformadores é o uso de informações reais de forma distorcida ou intencionalmente fora do contexto para enganar e levar a uma interpretação diferente da verdadeira. A citação do Decreto 11.695/2023 gera uma suposta credibilidade. Nesses casos, é importante buscar fontes confiáveis e seguras para entender o que, de fato, está sendo informado, além de verificar se a alegação é verdadeira ou não.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: A informação de que o decreto citado no vídeo alvo desta checagem seria um acordo entre o Brasil e o Hamas já foi desmentida por Aos Fatos, Estadão e Terra. O Comprova também já mostrou que o Brasil doou R$ 25 milhões à Autoridade Palestina para ajuda humanitária, e não ao Hamas, ao verificar peça de desinformação que faz confusão semelhante entre os grupos.

 

Política

Investigado por: 2023-10-18

É enganoso vídeo que relaciona protestos em Pernambuco a Lula e à transposição do rio São Francisco

  • Enganoso
Enganoso
É enganoso que o presidente Lula (PT) tenha fechado bombas da transposição do rio São Francisco que enviam água para reassentados do Sistema Itaparica, em Pernambuco. O sistema de irrigação não tem ligação com a obra da transposição – ele recebe água diretamente do Velho Chico. Além disso, o que ocorreu foi que o fornecimento de energia da região foi cortado – impedindo que as bombas enviassem água para a população e a agricultura – por um desentendimento entre a Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf) e a Eletrobras Chesf (Companhia Hidro Elétrica do São Francisco), que jogam a responsabilidade do desabastecimento uma para a outra.

Conteúdo investigado: Vídeo que circula nas redes sociais mostra diversos veículos parados em uma rodovia. O homem aparentemente responsável pela filmagem afirma que foi “fechada a estrada que passa por baixo da transposição, que acabou a água e fecharam as bombas”. Sobre a imagem, foi inserido o seguinte texto: “Acabou a água, fecharam as bomba [sic]. O amor venceu, pede água para papai do amor”. Na legenda da publicação, estão presentes hashtags como #forapt, #foralulacomunista e #foralulamentiroso.

Onde foi publicado: TikTok, Telegram e Whatsapp.

Conclusão do Comprova: Publicações relacionam, de forma enganosa, protestos realizados em Pernambuco, no dia 4 de outubro, com a transposição do rio São Francisco e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Os conteúdos investigados têm como base protestos realizados na BR-316, entre Petrolândia e Floresta, no sertão pernambucano. Sobre os vídeos, desinformadores imputaram, por meio de textos e legendas, que a razão dos protestos seriam ações de Lula, que teria supostamente fechado as bombas da transposição do rio São Francisco.

Na realidade, o protesto foi realizado por reassentados do Sistema Itaparica e teve por objetivo chamar a atenção do governo federal para a situação de desabastecimento de água nos Perímetros Irrigados da região após corte de energia elétrica no dia anterior, o que impediu o bombeamento da água.

O post já desinforma ao afirmar que o protesto tem a ver com a transposição do rio São Francisco, uma vez que o sistema não faz parte do Pisf (Projeto de Integração do São Francisco).

Além disso, como informou o G1, a energia foi cortada porque, segundo trabalhadores da região, a Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf) e a Eletrobras Chesf (Companhia Hidro Elétrica do São Francisco) não cumpriram um acordo.

Até 2014, quem administrava o Sistema Itaparica eram a Codevasf e a Chesf, mas esta última cessou a parceria. Então, quatro anos depois, a Codevasf ficou como única responsável até que, em setembro deste ano, a Codevasf determinou que a Chesf voltasse a assumir os gastos. Sobre o desabastecimento ocorrido no início de outubro, ficou um toma lá, dá cá: ao Comprova, a Codevasf afirmou que a responsabilidade pelas despesas de operação, manutenção e energia elétrica do sistema é da Chesf. Também ao Comprova, a Chesf afirmou que a responsabilidade é da Codevasf.

Então, embora a Codevasf seja uma empresa pública, do governo federal, não é possível afirmar que Lula mandou desligar a bomba.

Os reassentados permaneceram três dias sem energia nem água, quando o serviço foi restabelecido. Posteriormente, no dia 11, foi realizada uma audiência pública na Câmara dos Deputados para debater as dificuldades enfrentadas pelo Sistema Itaparica.

Nela, segundo o deputado federal Josias Gomes (PT-BA), vice-líder do PT na Câmara, ficou garantido que o Sistema Itaparica vai operar até o fim do ano e que serão discutidos os recursos para 2024.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. No TikTok, o vídeo tem 10 mil visualizações, mil curtidas e 118 comentários.

Como verificamos: Um outro post que usa trechos do mesmo vídeo da publicação verificada aqui continha outra gravação, do mesmo local, em que um homem discursava no protesto. No boné deste homem foi possível ler o nome “Rogério Novaes” e, a partir de uma busca no Google com as palavras “Rogério Novaes” e “protesto”, descobriu tratar-se do vice-prefeito de Petrolândia, em Pernambuco.

Com isso, a reportagem conseguiu concluir que a manifestação era na região de Petrolândia e encontrou notícias sobre o ato em sites locais e no G1.

O próximo passo foi mais uma busca no Google, desta vez por “sindicato”, “Petrolândia” e “protesto”. Alguns sites informavam que o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Petrolândia estava envolvido no protesto e, então, a partir de telefone informado no perfil do Instagram do órgão, a reportagem entrevistou Natanael Caetano da Silva, seu diretor-presidente.

A Codevasf e a Chesf também foram contatadas, por e-mail.

Onde e quando o vídeo foi gravado?

O vídeo foi gravado na BR-316, na altura do canal da transposição do Rio São Francisco, durante um protesto realizado por moradores dos perímetros irrigados do Sistema Itaparica, um conjunto de dez projetos de irrigação entre Pernambuco e Bahia. O sistema foi implantado pela Chesf no final da década de 1980, como compensação pelo deslocamento das populações rurais da região do lago da Usina Hidrelétrica Luiz Gonzaga.

Ao buscar o local no Google Maps, pode-se reconhecer que se trata do mesmo lugar mostrado na filmagem. Os moradores também realizaram protestos no Trevo do Ibó, no km 82 da BR-116.

Os protestos não eram contra o presidente Lula

O vídeo investigado é narrado pelo homem que realiza a filmagem. Em nenhum momento o presidente é mencionado pelo homem. No Instagram do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Petrolândia, é possível encontrar outros vídeos feitos durante os protestos, e legendas indicam que o protesto é contra a Chesf e a Codevasf, pela falta de pagamento da energia elétrica que ocasionou nos problemas enfrentados pelos moradores do Sistema.

Em entrevista ao Comprova, o presidente do sindicato, Natanael Caetano da Silva, reiterou que as manifestações foram realizadas em protesto às empresas e para pedir intervenção do governo federal na situação. “Após acontecer tudo isso, [o governo federal] paralisou duas obras da Codevasf e colocou R$ 25 milhões à disposição da Codevasf para pagar as contas de energia e fechar o resto do ano”, afirma o presidente.

“O que viralizou foi algumas falas fora de contexto de pessoas que estavam lá, e fizeram vídeos culpando o governo”, esclarece Silva.

A água utilizada nos perímetros irrigáveis é do Rio São Francisco, mas não vem da transposição. Como o nome indica, o Sistema Itaparica está ligado à antiga barragem de Itaparica, que posteriormente passou a se chamar Luiz Gonzaga. As famílias que antes habitavam a região onde hoje se encontra a barragem foram reassentadas nos projetos entre 1987 e 1988, enquanto a construção dos projetos de irrigação foi iniciada em 1994, muito antes do início da transposição do rio, que começou em 2007.

O que diz o responsável pela publicação: A reportagem tentou contato por meio de mensagem privada no TikTok, mas não obteve retorno até a publicação deste texto.

O que podemos aprender com esta verificação: Uma das táticas utilizadas por desinformadores é o uso de episódios reais, mas propagados fora do contexto original, para fazer alegações enganosas e falsas a respeito de um assunto de interesse público. Os vídeos acabam ganhando uma falsa credibilidade. Nesses casos, é importante buscar fontes confiáveis e seguras para entender o que, de fato, está sendo informado, além de verificar se a alegação é verdadeira ou não.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: A transposição do São Francisco é alvo frequente dos desinformadores. Este mês, mostramos que o protesto de garimpeiros na Bahia não foi motivado por falta de água, nem tem relação com governo Lula. Em maio, o Comprova mostrou que Bolsonaro não concluiu 84% das obras da transposição, como alegava vídeo. Anteriormente, explicamos o que é a transposição e por que ela gera dúvidas.