O Projeto Comprova é uma iniciativa colaborativa e sem fins lucrativos liderada pela Abraji e que reúne jornalistas de 41 veículos de comunicação brasileiros para descobrir, investigar e desmascarar conteúdos suspeitos sobre políticas públicas, eleições, saúde e mudanças climáticas que foram compartilhadas nas redes sociais ou por aplicativos de mensagens.
Filtro:

Saúde

Investigado por: 2021-01-11

Reportagem da Globo que indica não usar máscaras é de março de 2020; recomendação mudou

  • Enganoso
Enganoso
Post engana ao divulgar como atual uma reportagem que foi levada ao ar no início da pandemia de covid-19, quando as recomendações da OMS eram diferentes
  • Conteúdo verificado: Postagem na rede social Facebook em que o autor compartilha um trecho de uma reportagem de uma TV local da Rede Globo sobre o uso de máscaras na pandemia da covid-19, onde se fala que o uso só é necessário para profissionais de saúde.

É enganosa a publicação no Facebook que utiliza uma reportagem antiga de um jornal regional da Globo para insinuar que máscaras só devem ser usadas por pessoas doentes e profissionais de saúde. A informação de fato foi veiculada, mas em março do ano passado, quando esta era a recomendação da Organização Mundial de Saúde (OMS). Novos estudos, no entanto, fizeram com que a OMS ampliasse os critérios para o uso de máscaras.

O vídeo foi compartilhado no perfil de Adriano Reis, candidato a vereador de Ribeirão Preto (SP) em 2020 pelo Partido Social Liberal (PSL), com a legenda “Meu Deusssss A globo falando a verdade sobre as máscaras. 2020 ta estranho mesmo (sic)”. No entanto, ao contrário do que a legenda insinua, a recomendação não é atual, mas do começo da pandemia.

A Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS) ampliou as recomendações para o uso das máscaras para o público em geral, sendo as de tecido indicadas para as pessoas com idade inferior a 60 anos, deixando as máscaras cirúrgicas disponíveis para o grupo de risco e profissionais de saúde.

O Comprova buscou conversar com o repórter Wellington Hanna, que aparece no vídeo, para confirmar o período em que a reportagem foi ao ar. O autor da publicação também foi procurado.

Como verificamos?

Primeiramente, observamos os elementos no vídeo que poderiam nos ajudar a identificar onde a reportagem havia sido feita. Primeiro, ao fundo da imagem, aparece o Congresso Nacional. No canto inferior esquerdo, a sigla DF, ao lado da logomarca do jornal. Foram os primeiros indícios de que a reportagem havia sido transmitida de Brasília, para o Distrito Federal.

Na sequência do vídeo, aparece na imagem o nome do repórter, Wellington Hanna, e o local onde ele gravou a passagem, a Asa Norte, um bairro de Brasília.

Logo depois, se inicia a entrevista com a médica infectologista Eliana Bicudo. Não há elementos na tela que remetam a uma localização, mas uma busca no Google pelo nome da médica leva a pelo menos três sites que apontam que ela trabalha na capital federal: o site oficial do Clidip – Hospital-Dia, Infectologia e Vacinas, onde ela faz parte do corpo clínico; o site do Hospital Home, também em Brasília, onde ela também trabalha; além do site Doctoralia, que lista a médica como infectologista em Brasília.

O próximo passo foi procurar pela Globo Brasília, a fim de confirmar se a reportagem de fato havia sido feita por eles e veiculada lá, além do repórter Wellington Hanna. Conversamos com o repórter Gabriel Palma, da Globo Brasília, que disse ter quase certeza de que a matéria tinha ido ao ar no início da pandemia e que, depois de viralizar, o DFTV deu uma explicação aos telespectadores, afirmando que o material tinha ido ao ar no mês de março.

Gabriel, então, nos colocou em contato com Wellington Hanna para que ele próprio desse mais detalhes sobre o ocorrido. Hanna nos enviou um link do material publicado pelo Fato ou Fake, do G1, mostrando que a reportagem tinha ido ao ar em 18 de março e, já em outubro, vinha viralizando como se tivesse informações atualizadas.

Entramos em contato, por e-mail, com a Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS) e, por fim, buscamos informações sobre o dono do perfil que compartilhou o vídeo e entramos em contato com ele, mas não recebemos resposta até a publicação desta verificação.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 11 de janeiro de 2021.

Verificação

Reportagem foi feita em março de 2020

A reportagem compartilhada no perfil do Facebook é real. Ela foi veiculada no jornal Bom Dia DF, da TV Globo em Brasília, mas não agora e sim há dez meses. Quando foi ao ar, em março do ano passado, a Organização Mundial de Saúde (OMS) recomendava o uso de máscaras somente para pessoas doentes e para profissionais de saúde, o que mudou nos meses seguintes.

Ao Comprova, o repórter Wellington Hanna, responsável pela reportagem, nos enviou, através do WhatsApp, um material publicado pelo Fato ou Fake, do G1, no dia 14 de outubro do ano passado, explicando que a reportagem tinha ido ao ar em 18 de março e, diferentemente do que diziam postagens que viralizaram ainda em outubro passado, não representava uma recomendação atual sobre o uso de máscaras durante a pandemia.

A infectologista Eliana Bicudo, ouvida pela reportagem em março passado, também passou a ser questionada por pacientes depois que o vídeo viralizou, meses depois de ter ido ao ar. À Globo Brasília, ela disse que a situação hoje é muito diferente daquela conhecida em março do ano passado, quando se entendia que só pessoas com sintomas respiratórios ou febre transmitiam a covid-19.

“Já em abril, com a detecção de que o paciente assintomático pode transmitir o vírus e a doença também pode evoluir de maneira leve ou até assintomática, isso mudou completamente o discurso e foi máscara para todos”, explicou ela ao Fato ou Fake.

OMS atualizou recomendações com base em novos estudos

Quando a reportagem foi ao ar, em 18 de março de 2020, a recomendação da Organização Mundial de Saúde (OMS) era de que as máscaras fossem usadas apenas por pessoas doentes, responsáveis por cuidar delas e por profissionais de saúde. Na época, o órgão chegou a recomendar que as pessoas parassem de comprar máscaras cirúrgicas. A grande demanda pelas máscaras, assim como a escassez delas, provavelmente prejudicariam o combate ao coronavírus, informou a OMS, na época.

Em 6 de abril de 2020, a OMS fez uma nova recomendação em relação ao uso de máscaras: eles mantiveram a recomendação apenas para doentes e profissionais de saúde, mas admitiram que o uso de máscara por pacientes sintomáticos e pré-sintomáticos ajudava a limitar a transmissão do vírus. Tanto o Ministério da Saúde quanto o Centro de Controle de Doenças (CDC), dos Estados Unidos, já tinham recomendado o uso irrestrito de máscaras caseiras, diante de estudo publicado na Nature Medicine em abril de 2020, que afirmava que o uso de máscaras freava a transmissão pelo SARS-CoV-2.

No dia 5 de junho deste ano, a OMS divulgou novamente outras recomendações para o uso de máscaras. Desta vez, além dos doentes e profissionais de saúde, o uso foi ampliado para pessoas em grupos de risco e para a população em geral em áreas onde já havia transmissão comunitária da doença – ou seja, quando não era mais possível dizer qual a origem da contaminação, o que indicava que o vírus já circulava por uma região. Na mesma ocasião, a OMS indicou os tipos de tecido recomendados para a produção de máscaras caseiras.

Atualmente, a OMS recomenda o uso de máscaras como medida fundamental para suprimir a transmissão do vírus: “Devem ser usadas como parte de uma abordagem abrangente de ‘Faça tudo’, incluindo manter distanciamento físico de um metro ou mais de outras pessoas, evitar locais com aglomeração e contato próximo, garantir boa ventilação, limpar frequentemente as mãos e cobrir o espirro e a tosse com o cotovelo dobrado”, diz um trecho da recomendação no site oficial da Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS), braço da OMS para as Américas.

As recomendações mais atuais são do dia 1º de dezembro de 2020. A OMS trata a orientação como provisória, já que é uma atualização das recomendações do dia 5 de junho de 2020 com base em novas evidências científicas sobre o uso de máscaras.

A Agência Lupa e o Fato ou Fake também verificaram este conteúdo.

O autor da publicação

Adriano de Pádua dos Reis foi candidato a vereador em Ribeirão Preto (SP) pelo Partido Social Liberal (PSL), mas não foi eleito. Ele também foi candidato ao mesmo posto na eleição de 2016 pelo Partido Republicano da Ordem Social (PROS), quando chegou a ser eleito suplente. Em seu perfil na rede social Facebook, Adriano se diz empresário e “um cidadão de direita, conservador nos costumes e liberais na economia”.

O Comprova tentou contato com o autor, mas não obteve resposta até o momento da publicação deste artigo.

Por que investigamos?

Em sua terceira fase, o Comprova investiga conteúdos duvidosos relacionados às políticas públicas do governo federal e à pandemia do novo coronavírus. A postagem publicada no Facebook por Adriano de Pádua dos Reis, dia 24 de dezembro de 2020, teve mais de 5,2 mil comentários e 14 mil curtidas. Em janeiro de 2021, o Comprova verificou o vídeo publicado, pois o conteúdo enganoso, com 136 mil compartilhamentos, já havia viralizado na rede social. Veiculada no jornal Bom Dia DF, da TV Globo em Brasília, a reportagem não recomenda a não utilização de máscaras.

Enganoso, para o Comprova, é conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Política

Investigado por: 2021-01-05

É falso que a escultura “Diva” foi feita com dinheiro público e patrocínio do Sebrae

  • Falso
Falso
Sebrae informou ao Comprova que não houve nenhum auxílio financeiro para a realização da obra. Tanto o Serviço quanto a Usina da Arte, entidade que financiou a obra, informaram que existe sim uma parceria entre os dois desde 2017, mas apenas de formação e apoio a empreendedores de comunidades vizinhas. 
  • Conteúdo verificado: Um artigo de opinião veiculado no Jornal da Cidade Online afirma que a obra intitulada “Diva”, da artista Juliana Notari, foi feita com dinheiro público, através do patrocínio do Sebrae.

É falso que a obra “Diva”, da artista visual Juliana Notari, tenha sido financiada com dinheiro público, através de patrocínio do Sebrae, conforme afirma um artigo de opinião veiculado no site Jornal da Cidade Online. Tanto o Sebrae quanto a Usina de Arte – instituição onde a obra foi produzida e a verdadeira responsável por financiá-la – negaram a existência de qualquer apoio financeiro do Sebrae ou de recursos públicos à obra de arte, instalada em uma usina desativada em Pernambuco.

Em resposta ao Comprova, o Sebrae e a Usina da Arte informaram que existe sim uma parceria entre os dois desde 2017, mas apenas de formação e apoio a empreendedores de comunidades vizinhas. Eles acrescentaram que não houve nenhum auxílio financeiro para a realização da obra “Diva”, o que foi confirmado pela artista Juliana Notari.

Vale salientar que o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) é uma entidade privada, embora seja financiada, assim como as outras entidades do chamado Sistema S, com contribuições compulsórias de empresas brasileiras.

O Comprova tentou contato por e-mail com o Jornal da Cidade Online, mas não obteve retorno até a publicação. O post foi retirado do ar. Na segunda-feira, 4 de janeiro, mesmo dia da postagem, havia 3,8 mil interações. No Instagram, uma conta chamada União Patriótica Brasil usou a mesma montagem de imagens publicadas no Jornal da Cidade Online (a artista ao lado da obra) para repetir as acusações feitas pelo artigo verificado. O post tinha 585 curtidas até a tarde de terça-feira (5).

Como verificamos?

Primeiro, fizemos contato com o Sebrae e com a Usina da Arte para entender se, de fato, havia sido feito algum repasse para a realização da obra “Diva”. Questionamos se existia esse patrocínio do Sebrae e, se sim, qual teria sido o investimento para a obra em questão.

Também pesquisamos como funciona o sistema S, do qual o Sebrae faz parte. As entidades que fazem parte desse sistema são privadas e administradas por federações ou confederações independentes de empresas brasileiras.

Procuramos a artista Juliana Notari, que frisou que a obra “Diva” não teve financiamento do Sebrae, apenas da Usina da Arte, que é uma instituição privada. Ainda sobre os argumentos de que a obra seria criticada por movimentos sociais por não representar mulheres pretas, Juliana afirmou que a cor vermelha foi utilizada para remeter a uma ferida aberta, ao sangue, uma característica importante de seu trabalho.

Procuramos também o Jornal da Cidade Online, que não retornou nosso e-mail. Nele, questionamos a fonte das informações sobre o patrocínio do Sebrae para a obra.

Verificação

“Diva” não foi financiada com dinheiro público

Embora o texto publicado pelo Jornal da Cidade Online seja um artigo de opinião, o autor utiliza uma informação falsa para sustentar sua argumentação: a de que a obra, criticada por ele, recebeu dinheiro público em seu financiamento, através do Sebrae. A informação é falsa por dois motivos – primeiro, porque a obra não recebeu financiamento público.

Segundo, porque não recebeu patrocínio do Sebrae.

A obra é descrita pela autora, Juliana Notari, como “uma enorme escavação em formato de vulva/ferida medindo 33 metros de altura, por 16 metros de largura e 6 metros de profundidade, recoberta por concreto armado e resina”. O trabalho foi executado ao longo de mais de 11 meses e é fruto da residência artística de Juliana na Usina de Arte, em convênio com o Museu de Arte Moderna Aloisio Magalhães (Mamam), que é parceiro da Usina, em Pernambuco. O Mamam foi responsável por convidar a artista para o Programa de Residência Artística, mas todo o financiamento ficou a cargo da Usina de Arte.

Segundo Juliana Notari, em e-mail ao Comprova, “o financiamento e viabilização da obra são de responsabilidade da Usina de Arte, que é um espaço privado”. Ela afirmou que o Sebrae, mesmo sendo parceiro da Usina, não teve nenhuma participação no processo de Residência Artística, “nem financeiramente, nem de nenhuma outra ordem”.

A Usina de Arte é descrita por seus responsáveis como um “parque artístico botânico” que vem sendo administrado por uma entidade sem fins lucrativos – a Associação Socioambiental e Cultural Jacuípe. O parque fica numa antiga usina de açúcar localizada no quilômetro 10 da rodovia PE-99, em Água Preta (PE). Em resposta ao Comprova, a Usina de Arte informou que, no espaço, encontram-se instaladas mais de 30 obras de arte de diversos artistas e que “nenhum dinheiro público foi recebido para construção / implantação do jardim nem das obras de arte”.

Nos agradecimentos à realização da obra de Land Art – um movimento que funde arte e natureza -, em sua conta no Instagram, a artista Juliana Notari menciona diretamente seis pessoas, ligadas à realização da obra e à administração da Usina de Arte e do Mamam.

A obra

“Diva” foi a primeira obra a tomar forma na segunda edição do Projeto de Residências Artísticas da Usina de Arte, fruto de um convênio firmado com o Mamam. Ela foi iniciada ainda em janeiro de 2019, mas, segundo a própria Usina, houve uma longa pausa em sua execução por conta do processo de isolamento social demandado pela pandemia da covid-19. No final de dezembro de 2020 foi, finalmente, concluída e inaugurada num antigo canavial, que faz parte da área da hoje Usina de Arte.

Em 30 de dezembro, ao postar imagens da obra concluída em seu Instagram, a artista Juliana Notari, indicada como 1ª residente pela Usina de Arte, escreveu um texto sobre o significado da obra. Ela afirma que usa a arte para dialogar, a partir de uma perspectiva feminina, com questões de gênero e com questionamentos da relação entre a cultura e a natureza, numa sociedade ocidental falocêntrica (que põe o órgão sexual masculino como superior) e antropocêntrica (que considera a humanidade superior às demais espécies). “Atualmente essas questões têm se tornado cada vez mais urgentes. Afinal, será através da mudança de perspectiva da nossa relação entre humanos e entre humano e não-humano, que permitirá com que vivamos mais tempo nesse planeta e numa sociedade menos desigual e catastrófica”, afirma.

A Usina de Arte também postou, em sua conta oficial no Instagram, imagens da obra de Juliana. “Diva” passou a ser a imagem de perfil da Usina na rede social e uma série de stories defendendo a obra foram repostados pela conta da entidade após uma enxurrada de críticas à produção.

“Neste momento o Mamam e a Usina de Arte reiteram sua política de respeito à liberdade artística que é condição inerente a qualquer forma de criação. A escolha de caminhos livres para o exercício da atividade artística é, e sempre foi, caminho norteador das atividades do Mamam. O Museu sempre foi, e será, a ponte de ligação entre as muitas vozes geradoras da(s) História(s), e as discussões transformadoras de uma sociedade democrática e evolutiva”, diz o post feito no dia 3 de janeiro.

‘Toda ferida profunda sangra’

O artigo de opinião verificado afirma que a cor da obra foi problematizado por “coletivos raciais”: o autor diz que, por ela ser rosa, não representaria a mulher preta, embora sejam majoritariamente negros os profissionais que executaram o projeto.

Por e-mail, Juliana Notari falou sobre a cor da obra. “Diva é uma ferida. Como toda ferida profunda, sangra”, aponta Juliana. “A intervenção em um dos morros da usina foi pintada de vermelho. Um vermelho vivo que remete a uma ferida aberta, ao sangue, que é um dado importante no trabalho, e fez parte de minha trajetória em outras obras realizadas antes desta – na performance Dra. Diva (2003-2008), na vídeo performance Amuamas (2018), e em outros trabalhos anteriores”, completa. A Folha de S.Paulo publicou uma reportagem com um perfil da artista.

Há mais duas polêmicas geradas em torno da obra e citadas no texto do Jornal da Cidade – um possível impacto ambiental gerado pela escavação da montanha e uma exclusão da comunidade trans de uma representatividade a partir da vagina. Juliana respondeu às duas, em entrevista ao jornal O Globo. Para ela, a questão da vagina não se trata de uma disputa. “Ela não anula o pênis ou as pessoas que não têm vulva”. Segundo ela, a vulva é apenas uma das várias potências do corpo humano e sua obra dialoga com as pessoas que vivenciam a força do órgão.

Também ao Globo, a artista falou sobre as críticas de impacto ambiental. Ela explicou que o local escolhido para a obra é uma terra já seca e castigada pelo fogo, já que servia de monocultura para a cana. “Aquele lugar ali tinha apenas barro, com mato ainda crescendo”. Juliana acrescentou que a obra não acumula água, pois há um sistema interno de canalização, e que “a acusação de poluição chega a ser um pouco hipócrita”.

A Usina de Arte também falou ao Comprova sobre a cor da pele dos trabalhadores envolvidos na execução de Diva. “Sobre os trabalhadores, eram brasileiros comuns, com suas variações de etnias conforme nossa tão conhecida miscigenação”, respondeu, através de mensagem direta no Instagram.

Sebrae é parceiro da Usina de Arte, não patrocinador

O Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas) é parceiro da Usina de Arte desde 2017 – a logomarca do Serviço aparece no site da Usina -, mas não se configura como patrocinador do parque artístico.

Por e-mail, o Sebrae-Pernambuco tratou como falsa a informação de que teria patrocinado a obra Diva. “Diante de notícia falsa veiculada na segunda-feira (4), o Sebrae esclarece que não concedeu qualquer apoio financeiro à obra de arte instalada em Pernambuco. De fato existe parceria com a Usina, mas de formação e apoio para empreendedores de comunidades vizinhas”, diz o e-mail.

A Usina de Arte informou que a parceria firmada com o Sebrae desde 2017 é “exclusivamente voltada para ações educativas e de empreendedorismo” e que a informação de que haveria um financiamento público para a obra foi usada de forma “inconsequente e leviana”.

Como funciona o Sistema S?

Em seu próprio site oficial, o Sebrae se identifica como uma “entidade privada que promove a competitividade e o desenvolvimento sustentável dos empreendimentos de micro e pequenas empresas”. Assim como outras entidades do Sistema S, é financiado com contribuições compulsórias de empresas brasileiras. Elas pagam essa contribuição ao governo, que as repassa ao Sistema S. No entanto, esta não é a única forma de financiamento, uma vez que as entidades promovem cursos, alguns deles pagos, como mostrou esta reportagem do UOL.

O Sebrae foi criado em 1964 por iniciativa do então Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico (BNDE) – atual BNDES. Como entidade, o Sebrae existe desde 1972 e faz parte do chamado Sistema S, um “termo que define o conjunto de organizações das entidades corporativas voltadas para o treinamento profissional, assistência social, consultoria, pesquisa e assistência técnica, que além de terem seu nome iniciado com a letra S, têm raízes comuns e características organizacionais similares”, conforme consta no Glossário Legislativo da Agência Senado.

As nove instituições são prestadoras de serviços e são administradas de forma independente por federações e confederações empresariais dos principais setores da economia. Apesar de prestarem serviços de interesse público, essas entidades não são ligadas a nenhuma das esferas de governo, conforme este texto publicado pela Agência Brasil.

Por que investigamos?

Em sua terceira fase, o Comprova investiga conteúdos duvidosos relacionados às políticas públicas do governo federal e à pandemia do novo coronavírus. Apesar de o texto verificado ser um artigo de opinião, ele utiliza informações falsas para influenciar a opinião pública de forma negativa a respeito de uma obra de arte.

O financiamento público para a arte é legal e pode ser obtido por meio de editais públicos com critérios diversos, mas não foi o caso da obra executada em Pernambuco. A informação de que há dinheiro público no trabalho, além de ser falsa, dá a entender que a obra, em função de seu conteúdo, não poderia receber financiamento. O texto no site do Jornal da Cidade Online, publicado em 4 de janeiro, tinha 3,8 mil interações, mas foi retirado do ar. Uma conta no Instagram utilizou as mesmas imagens e informações e tinha, até a tarde desta terça-feira (5), 585 curtidas.

No ano passado, o Comprova verificou que publicações enganavam ao associar Bolsonaro à aprovação de verba para um filme sobre sua eleição. Em 2019, mostrou que um filme de Carlos Vereza não havia usado recursos da Lei Rouanet, mas também não se enquadrava nos critérios.

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.

Saúde

Investigado por: 2020-12-28

Informações sobre ivermectina divulgadas por Silas Malafaia são enganosas

  • Enganoso
Enganoso
Especialistas afirmam que as evidências apresentadas por um médico em vídeo compartilhado pelo pastor são insuficientes para promover o uso preventivo ou terapêutico da droga. Além disso, agências reguladoras dos Estados Unidos e do Brasil mantêm recomendações contrárias à aplicação do medicamento para tratar ou prevenir o novo coronavírus.
  • Conteúdo verificado: Vídeo do médico pneumologista norte-americano Pierre Kory, divulgado pelo pastor Silas Malafaia, apresenta informações enganosas sobre a prescrição em larga escala da ivermectina para prevenção da covid-19.

São enganosas as informações contidas no vídeo divulgado pelo pastor Silas Malafaia em que o médico pneumologista norte-americano Pierre Kory recomenda a prescrição de ivermectina para a prevenção da covid-19, durante audiência no Senado nos Estados Unidos. Malafaia afirma que o vídeo “pode salvar vidas” e sugere que seus seguidores peçam a um médico orientação sobre a quantidade de remédio a ser ingerida.

O líder religioso compartilhou uma versão legendada em português de um discurso de Kory em que ele se refere ao medicamento como uma “droga milagrosa” com potencial de prevenir e tratar pacientes com a doença.

Especialistas consultados pelo Comprova, no entanto, afirmam que as evidências expostas nos documentos apresentados pelo médico são insuficientes e não têm qualidade científica para promover o uso preventivo ou terapêutico da droga.

Agências reguladoras e organizações da sociedade civil da área de medicina dos Estados Unidos e do Brasil também mantêm recomendações contrárias à aplicação do medicamento para tratar ou prevenir o novo coronavírus.

Como verificamos?

Para analisar os argumentos científicos apresentados pelo médico Pierre Kory, o Comprova entrevistou o médico veterinário Marcelo Beltrão Molento, professor e pesquisador na Universidade Federal do Paraná (UFPR), que pesquisa sobre a ivermectina (IVM) desde 1994 e que publicou em dezembro um artigo com um alerta para o uso de larga escala do composto. Também foram entrevistadas Fabiana Brandão, especialista em microbiologia clínica e professora do departamento de Farmácia da Universidade Brasília (UNB); e Raquel Stucchi, médica infectologista, professora da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e consultora da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI).

O Comprova consultou os comunicados oficiais sobre a ivermectina divulgados nos sites da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), da agência federal de alimentos e medicamentos (FDA, na sigla em inglês) e do Instituto Nacional de Saúde (NIH, também na sigla em inglês), ambos dos Estados Unidos.

Para esta verificação também foi feito contato com o pastor Silas Malafaia e com o médico Pierre Kory por e-mail, mas até o fechamento desta verificação o Comprova não obteve retorno.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 28 de dezembro de 2020.

Verificação

Não há comprovação dos efeitos da ivermectina na prevenção da covid-19

No discurso capturado em vídeo, Kory aponta que a ivermectina é “milagrosa” na prevenção e no tratamento da covid-19 diz que há “montanhas” de dados e estudos que comprovam essa afirmação. Ele diz estar embasado em uma revisão contendo dados de quase 30 estudos assinada por ele e outros profissionais de saúde, que indicaria a eficácia do remédio contra a doença.

O médico diz ainda que o relatório mostra que o medicamento basicamente “oblitera a transmissão desse vírus” e que se uma pessoa tomar a ivermectina ela não ficará doente.

Para Marcelo Molento, que estuda a ivermectina há mais de 20 anos e é consultor da Organização Mundial da Saúde, é “uma desinformação gigantesca” dizer que o remédio impede a transmissão do vírus. Ele pontua que a revisão de Kory e os estudos que baseiam o artigo pecam gravemente na condução e no desenho dos ensaios clínicos, assim como na compilação de dados e na interpretação dos resultados.

“Há estudos que nem sequer têm grupo de controle”, diz o especialista. Molento ainda ressalta que alguns trabalhos não fizeram um acompanhamento adequado dos pacientes durante os testes e se baseiam somente em boletins médicos.

O cientista critica ainda um levantamento presente no estudo que compara a curva de mortes e infecções de municípios comuns com cidades que implementaram programas massivos de distribuição da ivermectina. “Não dá pra comparar cidades de dinâmicas diferentes (comportamento social, localização geográfica e clima). Este tipo de erro enfraquece a credibilidade dos estudos”, afirma.

Falta rigor nos estudos feitos até o momento

A microbiologista clínica e professora da Universidade de Brasília (UnB) Fabiana Brandão afirmou ao Comprova que muitos dos ensaios clínicos da ivermectina ainda são pré-publicações e precisam passar por revisão por pares. As próprias plataformas de preprint (que reúnem esse material) dizem que os artigos ali publicados não devem ser usados para guiar procedimentos clínicos.

A pesquisadora diz que é a favor de mais estudos com o medicamento. Ela afirma, no entanto, que o discurso de Pierre Kory de que o medicamento tem efeitos milagrosos não tem sustentação. “Não é verdade que se as pessoas tomarem ivermectina podem sair às ruas que nada vai acontecer. Isso gera um risco tremendo das pessoas se exporem mais ao confiar num tratamento que pode não ser eficaz”, pontuou.

Um levantamento da professora no site de pesquisas clínicas Clinical Trials identificou que há pelo menos 45 experimentos registrados para testar a eficácia da ivermectina, dos quais 13 já foram concluídos. Ela explica, no entanto, que os estudos apresentam um número de pacientes muito reduzido e que não têm “força estatística suficiente” para responder se a ivermectina é de fato eficaz.

Outro ponto destacado por Brandão é que as pesquisas carecem de metodologias científicas rigorosas que eliminem os vieses das investigações. “Muitos estudos combinam medicamentos. Você vê uma discordância muito grande entre as pesquisas. Ainda faltam estudos com metodologias melhor delineadas”, diz a cientista.

Brandão explica que até 80% dos pacientes com covid-19 se recupera sem nenhum tratamento medicamentoso específico. Isso dificulta ainda mais entender quando um fármaco teve ou não teve efeito sobre a doença.

Estudo in vitro não comprova resultado em humanos

No vídeo, Kory também cita um estudo laboratorial conduzido pela Universidade Monash, na Austrália, que identificou o potencial da ivermectina de inibir a reprodução do novo coronavírus em culturas de células de primatas.

Os próprios autores, assim como a instituição de ensino, alertaram porém que a ivermectina não deveria ser recomendada contra a covid-19 “até que sejam concluídos mais testes e ensaios clínicos para estabelecer a eficácia do fármaco a níveis seguros para a dosagem humana.” A universidade também apontou riscos da automedicação.

“O fato de ser antiviral in vitro não prova em absoluto o mecanismo de ação dela em humanos”, afirmou Marcelo Molento ao Comprova. Isso acontece porque os estudos laboratoriais ocorrem em condições controladas que não podem ser reproduzidas no corpo humano.

“O corpo humano é mais complexo. Você tem mecanismos que influenciam na doença que não se resumem apenas à ação da droga sobre o vírus, como no laboratório.”, explica a consultora da Sociedade Brasileira de Infectologia Raquel Stucchi. “A cloroquina, por exemplo, apresentou bons resultados em laboratórios, mas até agora não se provou eficaz nos ensaios clínicos.”.

Outro ponto de alerta é que as dosagens de ivermectina aplicadas no estudo da Universidade de Monash são maiores do que o recomendado para o tratamento de parasitas em humanos. Identificar uma dose viável do medicamento é, inclusive, um dos desafios ressaltados pelos autores e outros cientistas.

De acordo com Brandão, trata-se de uma investigação delicada. “A ivermectina é um fármaco com mais de 50 anos e tem um efeito muito bom para enfrentar algumas doenças e parasitas. Mas a dosagem usada para tratamento parasitário é muito inferior à usada nos estudos para a covid-19. Essas doses elevadas podem ter um risco muito grande de atingir o sistema nervoso central.”, pontua a cientista.

O que dizem as agências reguladoras

Diante da ausência de dados confiáveis sobre a eficácia da ivermectina, diversas organizações da área da saúde desaconselham o uso do medicamento para combater a covid-19.

A Food and Drug Administration (FDA), agência sanitária dos Estados Unidos, afirma que “a utilização de ivermectina para a prevenção ou tratamento da COVID-19 deve ser evitada, uma vez que os seus benefícios e segurança para estes fins não foram estabelecidos.”.

O Instituto Nacional de Saúde americano (NIH) e o Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) também se opõem ao uso indiscriminado do medicamento contra a covid-19. No Brasil, um informe da Sociedade Brasileira de Infectologia reforça que não há comprovação científica que ateste a eficácia da ivermectina ou qualquer outro medicamento no tratamento precoce da doença.

Já a Anvisa ressalta que “até o momento, não existem medicamentos aprovados para prevenção ou tratamento da Covid-19 no Brasil. Nesse sentido, as indicações aprovadas para a ivermectina são aquelas constantes da bula do medicamento”.

Uso indiscriminado tem risco de aumentar resistência de parasitas

Segundo artigo publicado por Marcelo Molento, a ivermectina (IVM) é um derivado da bactéria Streptomyces avermitilis introduzida comercialmente em 1981. Poderia ser colocada entre as drogas asmorfina (1827), aspirina (1899) e penicilina (1942), devido os seus benefícios vitais para os humanos e saúde animal. A IVM faz parte da família exclusiva dos endectocidas (avermectinas e milbemicinas), junto com a moxidectina, abamectina, doramectina, entre outras. Esta família de drogas tem a característica de ter alta eficácia contra a maioria dos parasitas mais importantes, sendo utilizada na região central da África.

Em 2015, Satoshi Ômura e William Campbell ganharam o Prêmio Nobel de Medicina 2015 pela descoberta da ivermectina e seu uso mundial no combate a doenças parasitárias. Em algumas regiões, ela é essencial para o controle de doenças parasitárias, tendo status de vacina, devido ao seu amplo uso. Ganhou popularidade pela sua importância na medicina veterinária e humana. Até a chegada do coronavírus, era reservada para a área de parasitologia.

Em artigo, Molento adverte quanto aos efeitos neurológicos adversos do medicamento em pacientes, como confusão, tremores, convulsão, inchaço local e vômitos, que podem durar até uma semana. No caso de animais, a utilização em intervalos curtos criou resistência aos parasitas. A seleção de parasitas para combater essa resistência tornou-se um dos fatores mais perigosos para a falha da droga.

O tratamento em massa também é praticado para controlar parasitas humanos, e a resistência aos medicamentos é uma das principais preocupações para a continuação dos programas de erradicação de parasitas em grande escala, conforme explica Molento.

De acordo com Molento, a IVM tem a reputação de ter efeitos antivirais, no caso da dengue, e é bem aceito na prática médica. Com a covid-19 voltou a ser manchete internacional a partir de evidências de suas atividades in vitro contra o vírus. O pesquisador alerta que apesar do medicamento ser conhecido por sua margem de segurança, esse fato não é suficiente para o seu uso regular. “O risco também pode ser potencializado por interações medicamentosas desconhecidas, que podem afetar a fisiologia do sistema nervoso central (barreira hematoencefálica), tornando potenciais efeitos nocivos à saúde”, explica em seu artigo. A recomendação do pesquisador é cautela, especialmente para o uso da IVM.

Quem é o médico que aparece no vídeo?

O homem que figura no vídeo publicado pelo pastor é o médico Pierre Kory, presidente da organização Frontline Covid-19 Critical Care Alliance (FCCCA, na sigla em inglês). Ele se identifica como pneumologista e especialista em cuidados intensivos.

De acordo com o site da St. George’s University, em Granada, ele se graduou na instituição de ensino em 2002 e hoje trabalha no centro acadêmico de medicina da Universidade de Wisconsin, nos Estados Unidos.

Na página da FCCCA consta que o grupo é uma organização formada por dez médicos que tem o objetivo de revisar trabalhos e estudos publicados sobre remédios já existentes no combate ao vírus e publicar protocolos. Há dois tipos disponíveis no site, um para pacientes hospitalizados e outro para profilaxia da doença. Esse último inclui a ivermectina, mas também recomenda uso de máscara e distanciamento social.

No dia 8 de dezembro, Kory foi ouvido na Comissão de Segurança Interna e Assuntos Governamentais do Senado americano,que realizou uma audiência com o tema “Tratamento ambulatorial precoce: parte essencial de uma solução para a covid-19”.

Quem é Silas Malafaia?

Silas Malafaia, 62 anos, é pastor e presidente da igreja Assembleia de Deus Vitória em Cristo (ADVEC) no Rio de Janeiro, desde 2010. É graduado em psicologia e fundador da Associação Vitória em Cristo (AVEC), criada em 1982 com a finalidade de arrecadar fundos para o programa de TV Vitória em Cristo.

Nas mídias sociais, seus perfis reúnem mais de 3 milhões de seguidores.

Em março de 2020, logo no início da pandemia de covid-19, o coletivo Bereia publicou uma verificação sobre os posts e vídeos enganosos acerca do novo coronavírus postados pelo pastor. Em um dos posts, ele minimiza a gravidade da covid-19 comparando-a com a gripe H1N1 e ataca a ampla cobertura da imprensa sobre a doença. Sua postura em relação à pandemia está alinhada com a do presidente Jair Bolsonaro. Em suas postagens, é comum temas como acusações contra a China, a Organização Mundial da Saúde (OMS), a defesa do uso da hidroxicloroquina e da ivermectina e questionamentos sobre a vacinação contra a covid-19.

Em abril, o Facebook, o Instagram e o Youtube apagaram um vídeo publicado pelo pastor, no qual afirmava que a quarentena era “uma farsa”.

Por que investigamos?

Em sua terceira fase, o Comprova investiga conteúdos duvidosos relacionados às políticas públicas do governo federal e à pandemia do novo coronavírus. Conteúdos falsos prejudicam o trabalho dos pesquisadores e diminuem a confiança das pessoas nas autoridades. A postagem no Facebook, publicada em 18 de dezembro, tinha 98,9 mil visualizações em sete dias, até o dia 24 do mesmo mês. Em 22 de dezembro, o Comprova também publicou uma verificação com conteúdos enganosos sobre ivermectina e vacina chinesa do pastor Silas.

Enganoso, para o Comprova, é conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Saúde

Investigado por: 2020-12-28

Mensagem tira de contexto dados sobre sintomas adversos da vacina Pfizer

  • Enganoso
Enganoso
Mensagem que circula no WhatsApp usa informações descontextualizadas de um aplicativo para monitoramento de sintomas adversos que registra dados dos próprios pacientes e que ainda não foram checados pelo Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) americano.
  • Conteúdo verificado: Mensagem que circula no WhatsApp e afirma que vacina da Pfizer/BioNTech causou efeitos colaterais em 5% dos vacinados e reações graves em 1%.

Não é verdade que a vacina da Pfizer/BioNTech tenha causado efeitos colaterais em 5% e reações graves em 1% das pessoas vacinadas nos EUA, ao contrário do que afirma uma mensagem que circula no WhatsApp e nas redes sociais. A mensagem tira de contexto dados divulgados pelo Centro de Controle e Prevenção de Doenças americano (CDC). No sábado (19), o órgão divulgou que 112 mil pessoas que se vacinaram se cadastraram em um aplicativo do governo para monitoramento de sintomas adversos após a aplicação da 1ª dose. Desse total, 3.150 (2,7%) disseram ter tido algum tipo de efeito que atrapalhou o trabalho ou atividades diárias.

O médico Tom Clark, que apresentou esses dados ao Comitê Consultivo em Práticas de Imunização (ACIP) do CDC, disse que o órgão está estudando os relatos de sintomas para obter mais detalhes. Clark afirmou ainda que a maioria não requer cuidados médicos. Foram identificados também seis casos de anafilaxia, uma reação alérgica severa, mas o CDC ainda avalia se há relação com o imunizante.

O CDC desenvolveu a ferramenta V-Safe para que pessoas que tomaram vacinas contra covid-19 façam check-ups diários sobre sua saúde. Como o próprio paciente relata seus sintomas, as estatísticas ainda necessitam de confirmação. Uma reportagem do jornal The Washington Post do início deste mês questionou a segurança do app, que segundo o texto poderia ser manipulado pelo movimento anti-vacina ou outros atores maliciosos.

O governo americano tem outros dois sistemas de monitoramento de reações adversas após vacinas: o Vaccine Adverse Event Reporting System (VAERS) e o Vaccine Safety Datalink (VSD), que usam dados enviados pelas unidades de saúde.

Como verificamos?

Acessamos documentos do CDC sobre o V-Safe e sobre a vacinação contra covid-19. Também procuramos reportagens na imprensa que ajudassem a contextualizar a imunização nos EUA.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 28 de dezembro de 2020.

Verificação

De onde são os números citados na mensagem?

A mensagem afirma que, em três dias de vacinação nos EUA, foram “272.000 doses aplicadas até o dia 19/12. 112.800 relatos de efeitos colaterais. Mais de 3.000 ficaram incapacitados de realizar atividades diárias. Com 5% de efeitos colaterais, sendo 1% de efeitos graves, talvez mande tanta gente quanto o vírus para os hospitais.” No entanto, os números estão apresentados de forma equivocada e fora de contexto.

Os dados estão em um documento, parte de uma apresentação em slides utilizada em uma reunião emergencial do Comitê Consultivo em Práticas de Imunização (ACIP), ligado ao CDC. Os encontros foram realizados nos dias 19 e 20 de dezembro. O PDF que está incluído no texto que viralizou trata, especificamente, das informações sobre os casos de anafilaxia (uma reação alérgica grave) em pacientes vacinados com os imunizantes que usam tecnologia de RNA mensageiro (dos laboratórios Pfizer/BioNTech e Moderna). Os slides são assinados pelo médico Thomas Clark, que faz parte do corpo técnico do CDC.

Os números que aparecem no texto são desta tabela, que está no documento, mas foi interpretada de maneira equivocada:

O que a tabela registra são os dados colhidos por meio de um aplicativo, lançado pelo governo norte-americano para monitorar de forma ativa quem tomou a vacina. Pelo chamado V-Safe, as pessoas que receberam as doses podem registrar qualquer tipo de efeito colateral que tenham sentido. O número que o texto menciona, 112.807, trata-se, na verdade, do número de pessoas que baixaram e se registraram no aplicativo até o dia 18 de dezembro, após receberem a primeira dose da vacina.

Segundo a mesma tabela, entre esse total, o número de casos registrados por meio do aplicativo de pessoas com algum impacto na saúde foi de 3.150, ou 2,7% — sendo que esses efeitos não têm indicação de gravidade, e podem ser o impedimento para realizar algum tipo de atividade do dia a dia, ter que faltar ao trabalho ou precisar se consultar com um médico ou profissional de saúde. O texto que viralizou fala em mais de 3 mil casos de pessoas “incapacitadas de realizar atividades diárias”, mas o número, na verdade, se refere a qualquer tipo de consequência.

O mesmo documento também informa que, até o dia 18 de dezembro, o CDC havia identificado seis casos de anafilaxia em pacientes que receberam as doses da Pfizer-BioNTech. Todos ainda serão analisados pelos órgãos competentes dos EUA.

Até o dia 21 de dezembro foram aplicadas 614.117 doses do imunizante Pfizer/BioNTech. Ou seja, o número de reações graves registradas até agora representa 0,0009% dos vacinados.

Quais as reações adversas mais comuns ao imunizante Pfizer/BioNTech?

Segundo o CDC, as reações adversas mais frequentes são dor, inchaço e vermelhidão no local de aplicação da vacina, além de calafrios, cansaço e dor de cabeça. São considerados efeitos leves, parecidos com uma gripe. O órgão americano diz que os sintomas podem começar em até dois dias após a primeira dose e podem atrapalhar o trabalho ou atividades diárias.

De acordo com a Pfizer, o porcentual de pessoas que tiveram esses sintomas durante os ensaios clínicos foi: dor local (84.1%), cansaço (62.9%), dor de cabeça (55.1%), dor muscular (38.3%), calafrios (31.9%), dor articular (23.6%), febre (14.2%), inchaço local (10.5%), vermelhidão local (9.5%), náusea (1.1%), mal-estar (0.5%), e linfonodos aumentados (0.3%).

Autoridades britânicas e americanas recomendam que a vacina não seja administrada a pessoas com histórico de anafilaxia. Mas essa reação é raríssima. O The New York Times informa que uma a cada 1 milhão de pessoas vacinadas nos EUA tem reação anafilática. Um documento do Food and Drug Administration (FDA), agência análoga à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), informa que 0,63% dos participantes do ensaio clínico da Pfizer que receberam a vacina tiveram alguma reação alérgica, comparado a 0,51% de reação no grupo de placebo. Na fase três dos testes, um dos 18.801 participantes que recebeu o imunizante teve anafilaxia.

Reação alérgica grave foi causada pela vacina?

Isso ainda não foi confirmado. O Instituto Nacional de Saúde dos EUA (NIH) vai fazer um estudo para descobrir por que algumas raras pessoas desenvolvem reação anafilática. De acordo com o The Washington Post, pesquisadores vão analisar se algum componente da vacina causa a alergia e esperam ter resultados em algumas semanas. No entanto, a pesquisa é de difícil realização pois é preciso recrutar participantes extremamente alérgicos.

O principal suspeito para os cientistas é o Polietilenoglicol, uma substância largamente utilizada em remédios e cosméticos. As reações alérgicas graves a esse composto são extremamente raras.

Os especialistas ouvidos pelo Post afirmam que as reações anafiláticas registradas não devem impedir as pessoas de tomarem a vacina. Americanos que tomarem a primeira dose são instruídos a esperar 15 a 30 minutos antes de ir para casa, no caso improvável de uma reação desse tipo. A anafilaxia é facilmente revertida com doses de epinefrina e outros remédios.

Por que investigamos?

Em sua terceira fase, o Comprova investiga conteúdos duvidosos relacionados às políticas públicas do governo federal e à pandemia do novo coronavírus. Informações falsas sobre as vacinas em desenvolvimento contra a covid-19 podem interferir na confiança das pessoas para serem submetidas aos imunizantes quando eles estiverem disponíveis no país, o que por consequência pode atrapalhar a estratégia de usar as vacinas para conter a disseminação do SARS-CoV-2 e reduzir os efeitos da pandemia. O texto verificado foi compartilhado em um tuíte com seis mil interações.

O Comprova já verificou outros conteúdos falsos sobre vacinas contra covid-19 em fase de desenvolvimento, como a verificação que apontou que testes de um imunizante contra o coronavírus na Austrália não infectaram os voluntários com HIV, que não há comprovação de que a vacina da Pfizer tenha causado paralisia de Bell em voluntários e a que as vacinas para covid-19 não são capazes de provocar danos genéticos.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Saúde

Investigado por: 2020-12-23

É falso que vacina australiana tenha infectado pessoas com HIV; voluntários tiveram falso-positivo

  • Falso
Falso
Resultado ocorreu porque a pesquisa feita pela empresa CSL em parceria com a Universidade de Queensland utilizou uma proteína do vírus da Aids. Ao contrário do que diz o homem no vídeo verificado, essa técnica não pode contaminar uma pessoa com o HIV
  • Conteúdo verificado: em um vídeo no Youtube, homem cita testes feitos na Austrália e afirma que pessoas que tomaram a vacina testaram positivo para HIV.

É falso que os voluntários que passaram por testes de uma vacina contra o coronavírus na Austrália tenham contraído HIV, como afirma um homem em um vídeo compartilhado no domingo (20) em um canal no YouTube. Alguns dos voluntários que participaram da fase 1 de testes da vacina produzida em parceria entre a empresa de biotecnologia CSL e a Universidade de Queensland registraram falso-positivos para HIV, mas isso não significa que eles foram infectados com a doença.

Segundo os desenvolvedores, a presença de anticorpos para HIV já era esperada e os voluntários estavam cientes disso, uma vez que uma proteína presente no vírus causador da Aids foi utilizada na produção da vacina contra o coronavírus. Em alguns voluntários, a quantidade de anticorpos foi maior do que a esperada, o que interferiu nos exames. Nenhum dos voluntários, no entanto, foi contaminado com o HIV.

Também não é verdade que o resultado tenha acometido todas as pessoas que tomaram a vacina no país, como afirma o homem. Após falso-positivos em alguns dos 216 voluntários que receberam a vacina australiana, os testes foram suspensos a fim de evitar que uma eventual aplicação em massa gerasse problemas de ansiedade por conta do temor por uma contaminação por HIV.

Como verificamos?

Primeiro, buscamos as reportagens citadas pelo homem no vídeo que, supostamente, dariam suporte às afirmações de que os voluntários que receberam a vacina australiana testaram positivo para HIV. Foram encontradas publicações do CanalTech, revista Exame e, ainda, da CNN (versões em português e em inglês), mas nenhuma delas afirmava que os pacientes tiveram resultados positivos para HIV, e sim falso-positivos.

Em seguida, acessamos entrevistas de especialistas em canais de TV australianos que explicassem como se deram os resultados falso-positivos em alguns dos voluntários. Também acessamos a nota oficial divulgada no dia 11 de dezembro pelos desenvolvedores da vacina australiana — a empresa de biotecnologia CSL e a Universidade de Queensland — sobre os resultados obtidos.

Procuramos por registros das declarações feitas pelo virologista francês Luc Montagnier, citado no vídeo, sobre a origem do coronavírus e a repercussão que sua teoria teve na comunidade científica. Por fim, buscamos informações sobre o autor da gravação e o canal em que ele foi postado no Youtube. Contatamos a empresa Hidrogênio Global e o autor do vídeo, mas até o fechamento desta verificação eles não retornaram.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 22 de dezembro de 2020.

Verificação

Falso-positivos

Alguns dos 216 pacientes que participaram da fase 1 de testes para a vacina desenvolvida numa parceria entre a empresa de biotecnologia CSL e a Universidade de Queensland, na Austrália, apresentaram resultados falso-positivos para HIV. Os resultados foram comunicados no dia 11 de dezembro pelos desenvolvedores do imunizante, que afirmaram que “não há possibilidade de a vacina causar infecção e os testes de acompanhamento de rotina confirmaram que não há presença do vírus HIV”.

Apesar disso, os testes com o imunizante foram, de fato, suspensos diante do temor de que uma eventual aplicação da vacina causasse problemas de ansiedade e receio de contaminação pelo HIV. O primeiro-ministro da Austrália, Scott Morrison, informou que 51 milhões de doses seriam compradas do consórcio, mas que agora elas serão divididas entre a AstraZeneca e Novavax, que também desenvolvem vacinas contra o SARS-CoV-2.

O homem que aparece no vídeo verificado mostra imagens de reportagens sobre os falso-positivos para HIV na Austrália -— na tela aparecem textos publicados pelo CanalTech e pela revista Exame — e usa o argumento de que, pelo fato de o assunto ter sido noticiado pela grande mídia, mais gente irá acreditar nele. No entanto, nenhuma das matérias utilizadas por ele como fonte fala em casos positivos para HIV — como ele afirma —, e sim em falso-positivos. As publicações também não falam que os resultados acometeram todas as pessoas que tomaram a vacina em teste, diferente do que diz o título do vídeo postado.

Proteína do vírus HIV

Na nota divulgada no dia 11 de dezembro, os desenvolvedores do imunizante australiano explicam os falso-positivos para HIV: “Os dados da fase 1 também mostraram a geração de anticorpos direcionados a fragmentos de uma proteína (gp41), componente utilizado para estabilizar a vacina. Os participantes do ensaio foram totalmente informados da possibilidade de uma resposta imunológica parcial a este componente, mas foi inesperado que os níveis induzidos interferissem com alguns testes de HIV”.

Ou seja, os cientistas já esperam que a proteína, presente no vírus HIV e utilizada no desenvolvimento do imunizante, fizesse com que o sistema imunológico criasse anticorpos para combater o vírus, mesmo ele não existindo. O que eles não esperavam eram níveis tão elevados de anticorpos que gerassem interferência em exames de HIV.

A professora Sarah Palmer, especialista em estudos do HIV/Aids do Instituto Westmead de Pesquisas Médicas, explicou para afiliada australiana da rede de TV SkyNews que o problema foi causado porque os cientistas da Universidade de Queensland usaram um segmento do vírus HIV como molécula “clamp”, ou seja, para estabilizar a proteína do coronavírus na vacina experimental e torná-la um alvo “atraente” para o sistema imunológico do ser humano.

A tecnologia é considerada inovadora pela professora Palmer, mas não deu certo: o sistema imunológico dos voluntários realmente gerou uma boa resposta ao coronavírus, que provoca a covid-19, mas também ao próprio HIV, fazendo com que os testes de HIV nos voluntários desse positivo para Aids.

“Infelizmente, como esse grampo molecular foi feito de uma proteína do HIV, não só o corpo respondeu desenvolvendo anticorpos para a proteína spike do coronavírus, o que é muito positivo, mas também desenvolveu anticorpos para a proteína do HIV. Isso fez com que as pessoas tivessem testes de HIV positivos, embora não estivessem infectadas com o HIV”, explicou a cientista.

Os testes, então, foram suspensos. Para os desenvolvedores, se ela fosse amplamente aplicada na população, poderia causar um problema na saúde pública do país pelo alto índice de resultados falso-positivos para HIV.

A Austrália descartou o uso desse imunizante, que já estava na fase 3 dos testes. A Universidade de Queensland deverá reiniciar a pesquisa e a vacina poderá vir a ser usada “no futuro”. O próprio Instituto Westmead está desenvolvendo uma vacina para a covid-19 a ser usada especificamente em idosos.

Coronavac, China e a origem do vírus

O homem que aparece no vídeo afirma que não apenas a vacina “que vem da China” pode infectar as pessoas com o HIV, mas todas as outras. Para isso, usa o argumento do virologista francês Luc Montagnier, vencedor do Nobel de Medicina em 2008 por ter descoberto o vírus HIV na década de 1980, de que o coronavírus teria sido fabricado em laboratório durante uma possível tentativa de descoberta de vacina contra a Aids. No entanto, as melhores evidências científicas disponíveis até o momento indicam que o SARS-CoV-2 tem origem natural.

As afirmações do homem no vídeo verificado não têm sustentação. Em primeiro lugar, porque o caso relatado por ele diz respeito a uma vacina em testes na Austrália, que nada tem a ver com a China. A Coronavac, uma das vacinas desenvolvidas na China e feita em parceria, no Brasil, com o Instituto Butantan, não foi a vacina que provocou os resultados falso-positivos de HIV para os testes de alguns dos voluntários australianos. A vacina chinesa sequer foi testada na Austrália.

Luc Montagnier realmente disse em abril que a responsabilidade pela ‘criação’ do vírus é de um laboratório em Wuhan, na China. Mas os comentários do cientista francês foram fortemente criticados e refutados pela comunidade científica.

Montagnier disse ter analisado a sequência de RNA do novo coronavírus junto com o colega matemático Jean-Claude Perrez e, com base nisso, afirmou que não há motivos para acreditar que o coronavírus tenha vindo de um mercado de peixes. Para ele, essa versão é “história da carochinha”, já que, segundo ele, o vírus tem mutações que só podem ser feitas artificialmente. Montagnier também afirmou que o vírus foi fabricado acidentalmente em um laboratório de Wuhan, na China, alegando que o laboratório é especialista em coronavírus, trabalha com ele desde os anos 2000, e que, na tentativa de desenvolver uma vacina contra a Aids, os chineses acabaram criando o vírus. As declarações foram feitas para a Rádio Frequénce Medicale e para o site “Pourquoi doctor?”, ambos franceses.

Ainda em abril, a Agência Lupa e o Estadão mostraram que estudos científicos refutavam as declarações do virologista francês. Um dos estudos, publicado na revista científica Nature Medicine, apontou que a estrutura central do SARS-CoV-2 é muito semelhante a um tipo de vírus que infecta morcegos — 96% de similaridade com o vírus dos morcegos e de 85,5% a 92,4% com um que afeta pangolins, animais que são vendidos ilegalmente na China por conta de sua carne.

Se um vírus para afetar humanos fosse produzido em laboratório, ele deveria ser feito com a estrutura central mais próxima de um que já afetasse humanos, e não morcegos. Este estudo, dos pesquisadores Kristian G. Andersen, Andrew Rambaut, W. Ian Lipkin, Edward C. Holmes e Robert F. Garry, foi publicado em 17 de março deste ano, um mês antes de as declarações de Luc Montagnier ganharem o mundo. Como mostrou o Comprova em abril, a pesquisa concluiu que o novo coronavírus não é uma construção artificial ou que tenha sido manipulado por humanos.

No final de março, outro artigo publicado na mesma revista, desta vez de autoria dos pesquisadores Tommy Tsan-Yuk Lam, Na Jia e Wu-Chun Cao, seguiu na mesma linha do anterior e tratou os pangolins como possíveis hospedeiros intermediários do vírus que chegou aos humanos.

No final de abril, a Organização Mundial de Saúde (OMS) descartou a possibilidade de que o vírus tenha sido criado em um laboratório. Em seu site oficial, a OMS mantém uma página sobre mutações e acompanhamento da evolução do vírus.

O canal

O canal Hidrogênio Global foi fundado em 2013, tem 168 mil inscritos e 9,1 milhões de visualizações até 22 de dezembro, segundo o YouTube. O autor, Julio Fuertes, exibe vídeos voltados à venda de produtos como um gerador de hidrogênio para produção de água hidrogenada, com alegação de benefícios para a saúde, e de kit para uso de hidrogênio como combustível veicular. No entanto, nos últimos sete meses o canal passou a publicar majoritariamente vídeos de apoio ao presidente Jair Bolsonaro e alinhados com a direita. Há publicações com comentários sobre assuntos da pauta política do país, críticas ao governador de São Paulo, João Doria (PSDB), a ministros do STF e outros. Há também críticas a medidas de isolamento social e às vacinas como estratégias para conter a pandemia de covid-19.

Por que investigamos?

Em sua terceira fase, o Comprova investiga conteúdos duvidosos relacionados às políticas públicas do governo federal e à pandemia do novo coronavírus. Informações falsas sobre as vacinas em desenvolvimento contra a covid-19 podem interferir na confiança das pessoas para serem submetidas aos imunizantes quando eles estiverem disponíveis no país, o que por consequência pode atrapalhar a estratégia de usar as vacinas para conter a disseminação do SARS-CoV-2 e reduzir os efeitos da pandemia. O vídeo verificado teve 55,8 mil visualizações e 12 mil curtidas nos três primeiros dias.

O Comprova já verificou outros conteúdos falsos sobre vacinas contra covid-19 em fase de desenvolvimento, como a verificação que apontou que não há comprovação de que a vacina da Pfizer tenha causado paralisia de Bell em voluntários e a que as vacinas para covid-19 não são capazes de provocar danos genéticos.

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.

Saúde

Investigado por: 2020-12-23

Vídeo de médicos estrangeiros é coletânea de informações falsas sobre a pandemia

  • Enganoso
Enganoso
O vídeo que circula pelas redes foi produzido por uma entidade que congrega médicos negacionistas da pandemia de covid-19 em todo o mundo
  • Conteúdo verificado: Vídeo publicado no Facebook e compartilhado em aplicativos de mensagem que conta com a presença de médicos que afirmam que a pandemia é uma farsa, além de outras alegações sobre a covid-19.

Não são verdadeiras as afirmações apresentadas em um vídeo que circula pelas redes sociais no qual médicos de diversos países dizem que a epidemia do novo coronavírus é uma farsa. O vídeo foi produzido pela Oracle Films, equipe de mídia da “World Freedom Alliance” (Aliança Mundial pela Liberdade), que reúne organizações internacionais negacionistas da pandemia de covid-19. No vídeo, médicos afirmam, sem apresentar provas, que “a vacina pode causar mudanças no DNA e não passou por testes em animais, sendo os humanos os primeiros a serem testados”.

Como já verificado pelo Comprova, é inverídico que a pandemia seja uma farsa. Segundo dados divulgados pela Organização Mundial de Saúde, já são mais de um 1,7 milhão de mortes causadas pelo coronavírus no mundo. Ao contrário do que é dito no vídeo, as vacinas passam por diversos testes clinicos, entre eles o teste em animais que antecede o teste em humanos. O Comprova também já ouviu especialistas que desmentiram os boatos que vacinas podem causar alterações no DNA.

Nesta verificação, a professora do Departamento de Microbiologia do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Viviane de Souza Alves, reafirma que nenhuma vacina já produzida ou em teste e liberada para a covid-19 tem a capacidade de alterar o DNA.

Como verificamos?

O Comprova procurou informações sobre todos os médicos que aparecem no vídeo e acessou perfis profissionais, sites pessoais e institucionais, além de matérias de veículos de comunicação para confirmar se as pessoas que apareciam no vídeo eram de fato profissionais da saúde. Checou também informações sobre a “Aliança Mundial pela Liberdade” e qual a relação dos profissionais com ela.

Além de buscar informações sobre a origem do vídeo e quem o produziu, o Comprova entrou em contato com a administração da página que publicou o conteúdo no Facebook e divulgou o vídeo no aplicativo de mensagens Telegram após a publicação ter sido classificada como “falsa” pelo Facebook e retirada da rede social.

Em paralelo, foram ouvidos especialistas que poderiam auxiliar com os depoimentos reproduzidos no vídeo, pontuando as alegações que foram mais abordadas, como a de que a pandemia da covid-19 seria uma farsa.

Foram consultadas outras checagens realizadas pelo Comprova nas quais foram verificados boatos sobre a segurança das vacinas, alterações genéticas e a pandemia. Ouvimos também a professora do Departamento de Microbiologia do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Viviane de Souza Alves, para entender novamente os possíveis efeitos colaterais da vacina e a realidade da pandemia.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 22 de Dezembro de 2020.

Verificação

O vídeo foi divulgado originalmente em 7 de dezembro, por uma página chamada “Oracle Films”, que se identifica como “o time de mídia oficial” da World Freedom Alliance ou “Aliança Mundial pela Liberdade”. Essa aliança se propõe a ser um grupo “guarda-chuva” para abarcar organizações internacionais negacionistas da pandemia de covid-19.

A presidente da organização é a médica irlandesa Dolores Cahill, da University College Dublin. Cahill é diretora do Partido da Liberdade Irlandês, uma sigla nacionalista de direita fundada em 2018 e que, atualmente, não tem representação parlamentar.

Ao longo dos últimos meses, Cahill fez várias alegações falsas, com conteúdos semelhantes aos que circulam em redes de desinformação no Brasil, como as afirmações de que distanciamento social é inútil contra a pandemia e de que as pessoas que se recuperam têm imunidade por toda a vida.

Em maio, Cahill defendeu que a hidroxicloroquina seria eficaz como prevenção para a covid-19, uma afirmação que também não tem respaldo científico e que foi classificada como “sem base” pela iniciativa de verificação de fatos científicos Health Feedback. Em junho, 130 estudantes da University College Dublin, a maioria da escola de Medicina, publicaram uma carta aberta contra Cahill e a direção da instituição se distanciou das afirmações da professora. O Comitê Científico da Iniciativa de Medicamentos Inovadores, uma parceria entre a Comissão Europeia e a indústria farmacêutica em que Cahill era vice-presidente, solicitou sua renúncia.

O vice-presidente da “Aliança Mundial pela Liberdade” é o alemão Heiko Shöning, idealizador de outra organização negacionista, conhecida em inglês como Doctors-for-Enlightenment e, em espanhol, como Médicos por la Verdad. Em agosto, o Comprova classificou como enganosas as afirmações feitas por um médico brasileiro que gravou um vídeo inspirado em um manifesto dos Médicos por la Verdad segundo o qual a pandemia era uma farsa.

O vídeo foi publicado em uma plataforma de vídeos chamada “Brand New Tube” em 7 de dezembro de 2020 e postado já com as legendas em português na página no Facebook “Revelações”, e em um grupo no aplicativo Telegram no dia 14 de dezembro. O Comprova entrou em contato por email com a administração da página do Facebook mas não obteve retorno até a publicação desta matéria.

O vídeo foi removido do Facebook na quarta-feira, 16, com a informação de que a postagem não era verdadeira. O conteúdo, no entanto, passou a circular no aplicativo de mensagens Telegram.

Quem são os médicos do vídeo?

Além da médica irlandesa Dolores Cahill, aparecem no vídeo os médicos Johan Dennis (homeopata), Anne Fierlafijn (clínica geral) e Hilde De Smet (clínica geral), da Bélgica; Carrie Madej (osteopata), Rashid Buttar (emergencista) e Sherri Tenpenny (osteopata e escritora), dos Estados Unidos; Kevin Corbett (enfermeiro aposentado e pesquisador independente), do Reino Unido; Piotr Rubas (clínico geral), polonês residente na Alemanha; Mikael Nordfors (clínico e escritor), da Suécia, e Elke F. de Klerk (clínica geral), da Holanda.

Todos aparecem em outros vídeos e artigos divulgados pela “Aliança Mundial pela Liberdade”.

O médico Johan Denis já havia afirmado anteriormente que as vacinas não são seguras, alteram o DNA humano e controlam pessoas pelo 5G (internet móvel). Nenhuma dessas afirmações é verdadeira. O vídeo em que ele faz comentários enganosos foi traduzido e viralizou no Brasil há algumas semanas. A Boatos.org escreveu uma matéria desmentindo os principais tópicos abordados pelo médico. No vídeo analisado pelo Comprova, ele afirma que não há emergência médica causada pelo novo coronavírus e que a pandemia é falsa.

Anne Fierlafijn assina conteúdos na internet questionando a eficiência das máscaras no combate a covid-19 e afirmando que a única maneira de pegar o novo coronavírus seria por meio de transfusão de sangue e tomando vacinas, o que não é verdade.

Hilde De Smet escreve textos e grava vídeos afirmando que a vacina causa mutação genética e aconselha o consumo de alho, orégano e chá verde para fortalecer o sistema imunológico e evitar a infecção pelo novo coronavírus. Isso também não é verdade.

Carrie Madej gravou um vídeo afirmando que vacinas para a covid-19 podem criar seres geneticamente modificados que poderiam dar origem a uma nova espécie que destruiria a raça humana. A publicação foi desmentida em checagem da BBC Reality Check mas acabou viralizando no Brasil. A Fato ou Fake também fez uma apuração.

Mikael Nordfors já teve o registro suspenso na Noruega, Suécia e Dinamarca por causa de uma série de maus-tratos a pacientes, entre outros crimes. Também foi advertido pelo uso de tratamentos sem eficácia comprovada. No vídeo, ele nega que haja uma pandemia, que as crianças sejam infectadas pela covid-19 e que “nunca haverá uma vacina tão segura quanto a vitamina D”, o que não é verdade.

O enfermeiro aposentado Kevin Corbett possui um site no qual escreve textos sobre o que chama de “coronahisteria” e “novela do corona”, evidenciando a descrença de que haja uma pandemia em curso no mundo e criticando as medidas de distanciamento social.

No vídeo analisado pelo Comprova, Elke F. de Klerk diz que a vacina pode tornar meninas e mulheres inférteis e alterar o código genético, crença compartilhada por Sherri Tempenny, médica e autora de alguns livros com argumentos contra todas as vacinas existentes. Não há evidências dessas afirmações. Já Piotr Rubas acredita que a taxa de mortalidade da covid-19 é similar à da gripe e que, por isso, não seria necessário se expor a uma vacina desenvolvida em caráter emergencial.

A pandemia não é uma farsa

O Projeto Comprova consultou a professora do Departamento de Microbiologia do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Viviane de Souza Alves, que explica que a pandemia não é uma farsa.

“Estamos vendo milhares de casos e óbitos em vários países do mundo simultaneamente pela covid-19, alguns países estão vivendo a segunda onda. Não há a menor possibilidade de ser uma doença inventada e não há interesse algum em disseminar pânico. O que estamos vivendo é real e se continuarmos relaxados, perto do momento em que as vacinas chegarem, a pandemia não terá fim em breve”.

A especialista também explica que não há registro de vacinas já produzidas para outras doenças ou em testes para a covid-19 que tenham a capacidade de causar alteração no DNA. Esses rumores giram em torno das vacinas que utilizam uma técnica conhecida como mRNA. As vacinas de mRNA têm pedaços do código genético do vírus, o RNA. Entre os imunizantes que estão em estágio mais avançado, os da Moderna e da Pfizer/BioNTech usam esse sistema. Viviane Alves explica como funciona o processo após esse tipo de vacina ser introduzida no corpo humano.

“As vacinas genéticas introduzem no corpo uma pequena sequência que vai codificar apenas a proteína do coronavírus. Nosso corpo enxerga a proteína e sabe que não nos pertence, o que faz com que anticorpos sejam produzidos para eliminar esse invasor. Ao mesmo tempo, o corpo cria células de memória que reconhecem o invasor. Quando nos encontrarmos com o vírus real, depois da vacina, o corpo já tem anticorpos para eliminar a infecção e assim não adoecemos”, afirma.

Viviane Alves ressalta que são falsas afirmações sobre máscaras e isolamento social serem desnecessárias. Ela relembra que, desde a pandemia da gripe espanhola (1918),sabemos que as mesmas medidas são fundamentais para limitar a disseminação de vírus. “São medidas que devem estar associadas. Não adianta usar máscara e aglomerar, a máscara é uma barreira que só funciona com distanciamento de dois metros. O vírus pode ficar viável por mais de quatro horas em ambientes fechados. Por isso a recomendação é que mesmo de máscara, ambientes fechados sejam evitados e jamais tocar na máscara sem higienizar as mãos”, alerta a especialista.

Por que investigamos?

Em sua terceira fase, o Projeto Comprova verifica conteúdos duvidosos relacionados às políticas públicas do governo federal e à pandemia do novo coronavírus. Combater a desinformação de assuntos relacionados a covid-19 tornou-se necessário e urgente, notícias como essa servem apenas para causar pânico e insegurança na população.

A postagem no facebook chegou a ter 7,5 mil interações antes de ser removida da rede social, segundo a plataforma de monitoramento CrowdTangle. No canal da página no Telegram, a mensagem foi vista por cerca de 1.300 pessoas. Não existem motivos para acreditar que a pandemia seja uma farsa, e propagar esse tipo de material é ignorar as milhares de mortes que ocorrem todos os dias no mundo.

O Comprova já verificou outros conteúdos que contribuem para a desinformação sobre a covid-19, como o tuíte que usou de afirmações falsas de médico canadense para negar a pandemia, o projeto checou também ser impossível que vacina cause alterações genéticas, segundo especialistas.

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.

Saúde

Investigado por: 2020-12-22

Vídeo do pastor Silas Malafaia engana sobre eficácia da ivermectina contra covid-19 na África

  • Enganoso
Enganoso
Ao contrário do que diz o pastor evangélico, não há como atribuir os números de covid-19 na África à distribuição de ivermectina no continente
  • Conteúdo verificado: Vídeo divulgado por pastor Silas Malafaia afirma que os números de covid-19 na África são baixos por conta da ivermectina

É enganoso um vídeo publicado pelo pastor Silas Malafaia no qual ele defende o uso da ivermectina na prevenção da covid-19 e faz comentários a respeito da Coronavac, vacina desenvolvida pela companhia chinesa Sinovac e que vem sendo testada no Brasil. No vídeo, o pastor alega de maneira equivocada que a distribuição em massa de ivermectina na África estaria relacionada aos números relativamente baixos de mortes pelo novo coronavírus no continente.

Malafaia questiona ainda a Coronavac afirmando que o Brasil será o primeiro a se vacinar com a “vacina em parceria com a China”, antes que a China o faça. Ainda não é possível fazer tal afirmação, pois a vacinação não teve início no Brasil. Na China, a Coronavac recebeu autorização para uso emergencial. A fase 3 de testes do imunizante está sendo realizada, além do Brasil, no Chile, na Indonésia e na Turquia.

Especialistas consultados pelo Comprova ressaltam que não há, até o momento, comprovação científica da eficácia do uso de ivermectina na prevenção ou tratamento da doença provocada pelo novo coronavírus. Eles alertam também que os dados epidemiológicos em alguns países africanos não são confiáveis, pois o sistema de vigilância não é bem estruturado.

Como verificamos?

Para elucidar as questões sobre a capacidade da ivermectina de prevenir ou tratar o novo coronavírus, entramos em contato com Alberto Chebabo, diretor médico do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). A coordenadora de pesquisa clínica na UFRJ, Valéria Viana, esclareceu pontos relacionados à vacina Coronavac.

O Comprova buscou ainda informações para identificar o médico americano citado pelo pastor, que “quase chorou” em audiência no Senado americano enquanto falava da suposta eficácia do medicamento em protocolos profiláticos.

Já para checar os dados de casos e mortes por covid-19 nos países africanos citados pelo pastor, foi acessado o painel de monitoramento de casos e mortes de covid-19 da Universidade Johns Hopkins.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 21 de dezembro de 2020.

Verificação

Covid na África e a ivermectina

O pastor também cita o número relativamente baixo de mortes provocadas pela covid-19 em países africanos como Nigéria, Angola e Moçambique. Segundo Malafaia, o uso em massa da ivermectina para tratamento de verminoses seria a causa dessa baixa mortalidade.

De acordo com o painel de monitoramento de casos e mortes de covid-19 da Universidade Johns Hopkins, dos Estados Unidos, os dados apresentados pelo pastor no vídeo são compatíveis com aqueles relatados pelos países africanos.

Porém, especialistas afirmam que não é possível relacionar os números de covid-19 na África com o uso da Ivermectina. Além disso, eles chamam a atenção para a má qualidade das informações de vigilância em muitos países africanos.

“O que se usou muito na África para prevenção e tratamento de verminoses foi o mebendazol e não a ivermectina. E os dados que ele coloca não são confiáveis, a gente tem poucos dados confiáveis da África. A vigilância epidemiológica é muito ruim para todas as doenças. Não dá para relacionar o uso de qualquer droga com essa mortalidade descrita na África”, pontua o diretor médico do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho da UFRJ, Alberto Chebabo.

Um artigo da BBC aponta ainda outras variáveis que podem ter influenciado o número de casos e mortes por coronavírus no continente. Especialistas citam as inúmeras experiências com pandemias em anos recentes, um contato menor com outros países e até características demográficas (uma população bem mais jovem que na Europa, por exemplo).

Em julho, o Comprova classificou como falso um vídeo segundo o qual a pandemia estaria controlada na África por conta da ivermectina. Em agosto, mostramos também ser falso outro vídeo que fazia a mesma alegação a respeito da Austrália.

Ivermectina não tem comprovação “in vivo”

Segundo Chebabo, não há recomendação para o uso de ivermectina na prevenção da covid-19 devido à ausência de estudos científicos publicados que deem embasamento para essa indicação. “Só temos dados in vitro de atividade da ivermectina na inibição do Sars-Cov-2 em culturas de células. A atividade in vitro não significa que a droga terá atividade in vivo”, explica o diretor que integra o Grupo de Trabalho Multidisciplinar para Enfrentamento da covid-19 da UFRJ.

Ainda segundo Chebabo, de cada 100 moléculas testadas com atividade in vitro, apenas uma chega na fase clínica com eficácia. O especialista destaca que não há pesquisa clínica que mostre a real eficácia da ivermectina. “Alguns [estudos] são observacionais ou com muita baixa qualidade e que não suportam a recomendação do uso da ivermectina tanto para prevenção quanto para tratamento”, completa o pesquisador. Portanto, não há evidência científica para a indicação do medicamento.

O médico lembra ainda que a cloroquina também passou por essa fase de recomendação por conta da atividade in vitro, mas os estudos clínicos controlados não demonstraram a eficácia da droga contra a covid-19, e a utilização não é recomendada por entidades como a Organização Mundial da Saúde e a Sociedade Brasileira de Infectologia. “Ninguém mais fala em usar cloroquina a não ser alguns grupos aqui no Brasil. A gente aguarda resultados de estudos randomizados que estão sendo realizados com a ivermectina para avaliar se ela realmente tem ou não eficácia para ser recomendada como indicação de tratamento para covid-19”, explica.

Contraindicação

Em relação ao fato de a ivermectina não ter contraindicações, como assegura o pastor, Chebabo afirma que qualquer droga as possui, apesar desse medicamento específico ser seguro, com poucos efeitos colaterais. Ele explica que, quando o remédio é ingerido sem indicação, o paciente não só deixa de se beneficiar, já que não há eficácia comprovada, como passa a ter somente as desvantagens de um possível efeito adverso.

Chebabo é enfático ao reiterar que não há nenhuma justificativa para se indicar a ivermectina. Em relação ao vídeo de Malafaia, ele chama a atenção para o fato de que o pastor recomendou o uso de um medicamento e que isso se configura em um exercício ilegal da medicina.

De acordo com o Conselho Federal de Medicina (CFM), as sanções e punições só são cabíveis para o profissional médico ou estabelecimentos de saúde. O conselho só tem alcance com a população médica. Por isso, nesse caso, o pastor não poderia ser responsabilizado. A apuração sobre suspeitas de ilegalidade deve ser feita pelo Ministério Público e pela polícia.

De qual médico americano ele fala no vídeo?

Malafaia afirma no vídeo que um médico, “representando 2 mil médicos e cientistas que estão na linha de frente de combate à covid […] diante da comissão do Senado americano quase chorou clamando ‘por que não dar ivermectina pro povo como preventivo?’”

Ele não cita nominalmente o especialista. Contudo, o Comprova apurou que o médico em questão é Pierre Kory, presidente da organização Frontline Covid-19 Critical Care Alliance (FCCCA). No último dia 8 de dezembro, ele foi ouvido na Comissão de Segurança Interna e Assuntos Governamentais do Senado americano – que realizou uma audiência sobre “Tratamento ambulatorial precoce: parte essencial de uma solução para a covid-19”.

No vídeo, Kory aponta que a Ivermectina é “milagrosa” na prevenção e no tratamento da doença e que há “montanhas” de dados e estudos que comprovam essa afirmação. Segundo o site da FCCCA, eles são uma organização formada por dez médicos que tem o objetivo de revisar trabalhos e estudos publicados sobre remédios já existentes no combate ao vírus e publicar protocolos. Há dois tipos disponíveis no site, um para pacientes hospitalizados e outro para profilaxia da doença. Esse último inclui a ivermectina, mas também recomenda uso de máscara e distanciamento social.

Brasil vai se vacinar com a Coronavac antes dos chineses?

O pastor começa o vídeo questionando o porquê de o Brasil ser o primeiro país a se vacinar com a Coronavac, imunizante desenvolvido em parceria com a China, antes que o país asiático tenha vacinado a própria população.

A vacinação no Brasil não teve início, no entanto. A Coronavac encontra-se, atualmente, na fase final de testes, que no Brasil é realizada em parceria com o Instituto Butantan, em São Paulo.

Na China, a Coronavac ainda não foi oficialmente registrada, mas é uma das diversas vacinas de companhias chinesas que receberam autorização do governo de Pequim para uso emergencial.

Malafaia aponta ainda que as nações “do primeiro mundo” não estão utilizando a vacina chinesa. De fato, além do Brasil, apenas países como Turquia, Indonésia e Chile fizeram compras de doses da vacina através de acordo com a Sinovac e realizam atualmente a fase 3 de testes com o imunizante.

Segundo informações até 17 de dezembro da Organização Mundial da Saúde (OMS), há atualmente 56 vacinas candidatas em ensaio clínico (sendo testadas em humanos). Entre elas, ao menos 13 foram desenvolvidas por companhias chinesas ou institutos de pesquisa da China. Uma, a Coronavac, tem acordo para distribuição no Brasil por ter sido feita em parceria com o Butantan.

Quem é Silas Malafaia?

Silas Malafaia, de 62 anos, é pastor e presidente da igreja Assembleia de Deus Vitória em Cristo (ADVEC) no Rio de Janeiro. Desde 2010, assumiu a liderança da igreja, que possui 35 mil membros, 118 templos no Brasil e três igrejas em Portugal, segundo informações no site da ADEVEC. É graduado em psicologia, autor de diversos livros e fundador da Associação Vitória em Cristo (AVEC), criada em 1982 com a finalidade de arrecadar fundos para o programa de TV Vitória em Cristo, lançado no mesmo ano. O programa é transmitido semanalmente pela Rede TV em rede nacional, e aos sábados em emissoras locais da Band, na Bahia e Espírito Santo.

A AVEC possui uma rede de doadores que contribuem regularmente com quantias a partir de R$ 30 para manutenção do programa e de projetos sociais. Para essa rede, é produzida uma revista exclusiva chamada Fiel, ou seja, mais um canal de comunicação direto com seu público. Suas outras atuações estratégicas no campo da comunicação incluem a gravadora Central Gospel Music, uma das principais do segmento no país, e a Central Gospel, que já foi considerada segunda maior editora gospel do Brasil, mas em 2019 entrou com pedido de recuperação judicial no valor de quase R$ 16 milhões. Nas mídias sociais, seus perfis reúnem mais de 3 milhões de seguidores.

Em março de 2020, logo no início da pandemia de covid-19, o coletivo Bereia publicou uma verificação sobre os posts e vídeos enganosos acerca do novo coronavírus postados pelo pastor. Em um dos posts, ele minimiza a gravidade da covid-19 comparando-a com a gripe H1N1 e ataca a ampla cobertura da imprensa sobre a doença. Sua postura em relação à pandemia está alinhada com a do presidente Jair Bolsonaro. Em suas postagens, é comum temas como acusações contra a China, a Organização Mundial da Saúde (OMS), a defesa do uso da hidroxicloroquina e da ivermectina e questionamentos sobre a vacinação contra a covid-19.

Em abril, o Facebook, o Instagram e o Youtube apagaram um vídeo publicado pelo pastor, no qual afirmava que a quarentena era “uma farsa”.

Por que investigamos?

Em sua terceira fase, o Comprova investiga conteúdos duvidosos relacionados às políticas públicas do governo federal e à pandemia do novo coronavírus. Conteúdos falsos prejudicam o trabalho dos pesquisadores e diminuem a confiança das pessoas nas autoridades. A postagem no Facebook, publicada em 14 de dezembro, tinha 711 mil visualizações até o dia 16 de dezembro. No mesmo dia, o pastor publicou um tuíte com conteúdo similar. Até o dia 21 de dezembro, tinha 57 mil compartilhamentos.

Enganoso, para o Comprova, é conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Saúde

Investigado por: 2020-12-22

Médico e empresários enganam ao desqualificar medidas protetivas e culpar China pela pandemia

  • Enganoso
Enganoso
Em vídeo compartilhado pela deputada Bia Kicis, o médico Alessandro Loiola e os empresários Fabrizio Fasano Jr e Marcos Bellizia fazem afirmações sem sustentação a respeito de temas como máscaras e distanciamento social
  • Conteúdo verificado: Vídeo publicado no Instagram por deputada federal com alegações sobre a pandemia.

Existe justificativa científica que explique o período de isolamento por 14 dias para pessoas infectadas por covid-19, ao contrário do que afirma o médico Alessandro Loiola em um vídeo que circula pelas redes sociais. A definição sobre o tempo de isolamento para uma pessoa contaminada pelo novo coronavírus se baseia em estudos sobre o tempo de incubação do vírus, ou seja, o período do início da infecção até a carga viral se tornar alta o suficiente para retransmissão e manifestação de sintomas.

No trecho do vídeo, que foi compartilhado pela deputada federal Bia Kicis (PSL-DF), no Instagram, o médico é entrevistado pelo empresário Fabrizio Fasano Jr., apresentador do programa “Coliseum” no YouTube. Outro empresário, Marcos Bellizia, também participa da conversa.

No programa, Loiola também afirma, de forma equivocada, que crianças são menos suscetíveis à contaminação pela covid-19 e que não são fontes de transmissão da doença. De acordo com informações disponíveis no site da Sociedade Brasileira de Pediatria, as crianças são tão propensas quanto os adultos a contrair covid-19, porém têm uma probabilidade menor de complicações graves e menos risco de morte, por isso não fazem parte do grupo de risco.

No programa, Loiola também diz que a China estava preparada para a pandemia e que foi o país que mais lucrou com a crise sanitária – afirmações que são enganosas. De acordo com o relatório da Organização Mundial do Comércio, entidade que supervisiona as relações comerciais entre os países, a China já era o principal exportador de equipamentos de proteção individual, como máscaras e luvas, entre 2017 e 2019. Além disso, o PIB da China não cresceu 10%, como os participantes do programa afirmam, mas 4,9% no terceiro trimestre do ano em relação ao mesmo período de 2019, como mostra esta reportagem do Valor Econômico publicada em outubro.

Como verificamos?

O Comprova procurou as recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS) quanto ao uso de máscaras e período de isolamento, bem como a análise de especialistas e estudos científicos na área. Também consultamos os boletins epidemiológicos do Ministério da Saúde para entender como a covid-19 afeta diferentes faixas etárias no Brasil.

Entrevistamos o PhD em Microbiologia, na área de Genética de Bactérias pelo Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo, ICB-USP, Luiz Almeida, e o professor da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) e diretor do Laboratório de Imunologia do Instituto do Coração (Incor), Jorge Kalil.

Procuramos a Sinovac e a embaixada da China para comentar as alegações e insinuações feitas no vídeo, sobre a vacina desenvolvida contra a covid-19 e sobre supostos ganhos econômicos com a pandemia, mas, até o fechamento desta reportagem, não recebemos nenhuma resposta.

Por fim, questionamos o médico Alessandro Lemos Passos Loiola, que aparece no vídeo verificado sobre o embasamento de suas afirmações. Não houve resposta até a publicação desta checagem.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 18 de dezembro de 2020.

Verificação

Como ocorre a transmissão?

O período de isolamento necessário para uma pessoa com covid-19 se baseia em estudos sobre a dinâmica de transmissão do novo coronavírus. Luiz Almeida, PhD em Microbiologia, na área de Genética de Bactérias pelo Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo, ICB-USP, explica que há um período em que a probabilidade de passar covid-19 para outra pessoa é maior: “Quando somos infectados, o vírus começa a se reproduzir em nosso corpo e leva alguns dias até que ele exista em quantidade suficiente para ser retransmitido. A probabilidade de transmissão é maior nos períodos em que a carga viral está elevada”. É neste momento, afirma Almeida, que os sintomas têm uma maior probabilidade de se manifestarem.

O tempo de incubação é o período do início da infecção até a carga viral se tornar alta o suficiente para retransmissão do vírus e manifestação de sintomas. Cientistas estudaram especificamente o tempo de incubação do novo coronavírus.

De acordo com Almeida, “este tempo de replicação viral, em média, é de quatro a oito dias após a infecção, sendo que temos relatos de alta carga viral em até 14 dias. Portanto, existe uma maior probabilidade de transmitir o vírus em até 14 dias após o início da infecção”.

O biólogo ressalta que o tempo de incubação foi averiguado já no início da pandemia. Ele cita como exemplo este estudo publicado do The New England Journal of Medicine. O painel “A” da tabela abaixo detalha o tempo de incubação do SARS-CoV-2 (nome científico do novo coronavírus).

Além do tempo de incubação, é importante entender o mecanismo de transmissão em si. A covid-19 é uma doença respiratória, como explica o professor da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) e diretor do Laboratório de Imunologia do Instituto do Coração (Incor), Jorge Kalil. “Se uma pessoa estiver com a doença respiratória, ela fundamentalmente transmite através de gotículas de saliva ou por secreção nasal. Por isso é importante usar a máscara e o distanciamento”, acrescenta o professor.

Assintomáticos transmitem?

Os dois especialistas consultados pelo Comprova afirmam que uma pessoa sem sintomas ainda é capaz de transmitir covid-19. Kalil explica que “assintomáticos também podem transmitir a doença, porque eles têm o vírus nas fossas nasais e na garganta. Inclusive, a pessoa pode começar a transmitir o vírus dois dias antes de manifestar os sintomas”.

De acordo com Almeida, a transmissão sempre depende do tempo de incubação, “que em média é o mesmo para pessoas com sintomas e sem sintomas”. O biólogo afirma que a principal diferença é o local do organismo onde o vírus se propaga. “Em assintomáticos, a gente vê mais em vias aéreas superiores, então não causa tantos sintomas severos quanto nos casos graves de covid-19, que acabam infectando o pulmão, as vias aéreas inferiores. Mas o tempo de transmissão, em hipótese, deve ser o mesmo”, esclarece Almeida.

Isolamento e máscara de proteção

O isolamento está relacionado ao tempo de incubação. A pessoa diagnosticada evita contato com outras pessoas pelo período em que há mais probabilidade de transmitir o vírus –ou seja, 14 dias a partir do momento em que ela própria contraiu o novo coronavírus. Como não é possível determinar o momento exato da contaminação, o prazo começa a contar a partir do diagnóstico positivo.

Kalil lembra que “medicina não é matemática” e que cada caso é um caso. O fim das duas semanas não significa, necessariamente, que a pessoa deixou de transmitir o vírus. Se ela ainda manifesta sintomas, por exemplo, é provável que a carga viral ainda esteja alta o suficiente para infectar outras pessoas.

Já o PhD em Microbiologia Luiz Almeida alerta que “em um mundo ideal, pessoas diagnosticadas com o vírus deveriam ficar internadas nos hospitais para acompanhar a evolução da doença e serem liberadas após o diagnóstico médico de que elas não são mais capazes de transmitir o vírus”.

“Como não temos leito médico para todas as pessoas infectadas, quem for diagnosticado com o vírus deve evitar ao máximo o contato com familiares e parentes”, completa.

Há recomendações específicas para o isolamento domiciliar –quando a pessoa diagnosticada com covid-19 precisa continuar na mesma casa que seus familiares durante o período de isolamento, como explica este guia do governo paranaense.

Já a máscara de proteção funciona como uma barreira mecânica contra as gotículas que carregam o novo coronavírus. Ela é importante porque nem todas as pessoas infectadas manifestam os sintomas e, como Kalil afirmou, a transmissão pode começar antes mesmo dos primeiros sinais da doença.

Segundo Luiz Almeida, “as máscaras impedem que parte das gotículas que carregam o coronavírus se dispersem no ar. Está muito bem documentado que uma nova infecção está relacionada e é diretamente proporcional à quantidade de partículas virais que ela é exposta”. Quanto maior for o número de partículas virais que você for exposto, maior a probabilidade de a transmissão ocorrer” aponta o biólogo.

A proteção é proporcional ao tempo de uso da máscara. Quanto mais tempo usar, menor a probabilidade de contágio. Uma pessoa que remove a máscara só para comer em locais públicos estará mais protegida que aquela que não usa máscara em nenhum momento. A eficácia da máscara também está relacionada ao seu uso adequado.

Crianças transmitem?

Conforme informações do Departamento Científico de Infectologia, disponíveis no site da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), as crianças são tão propensas quanto os adultos a contrair covid-19, porém apresentam menos sintomas ou risco de desenvolver doença grave. Quer dizer que pessoas de todas as faixas etárias estão suscetíveis à doença.

No entanto, como crianças têm uma probabilidade menor de complicações graves e menos risco de morte, não estão dentro do grupo de risco. Além disso, costumam apresentar poucos ou nenhum sintoma, o que não as impede de transmitir a doença. Na verdade, elas podem representar um importante vetor de transmissão. O risco é que a criança com covid-19 acabe contaminando outras pessoas de forma silenciosa, já que não chega a ser diagnosticada com o novo coronavírus.

Estudo da Fiocruz ainda afirma que a “covid-19 sobre a saúde de crianças e adolescentes no Brasil, assim como em outros países da América Latina, tem potencial muito mais negativo do que o que vem sendo relatado em países da Europa e América do Norte”.

Como a maioria das crianças infectadas não apresenta sintomas ou os sintomas são menos graves, o teste diagnóstico geralmente não é realizado na maioria dos casos, fazendo com que o número real de crianças infectadas seja menor. Ainda é incerto o papel das crianças no elo de transmissão do vírus.

De acordo com o Boletim Epidemiológico do Ministério da Saúde, que apresenta a análise referente ao período de 26 de fevereiro a 05 de dezembro de 2020, do total de 974.032 casos de Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) hospitalizados com início de sintomas, 54,4% (529.549) foram confirmados para covid-19. Desse total, 13.276 (2,51%) são da faixa etária de 0 a 19 anos. Nesse intervalo, 10.448 (1,97%) casos ainda estão em investigação.

Sinovac tem acordo assinado em pelo menos cinco países

No vídeo, o empresário Marcos Bellizia diz que a vacina produzida pelo laboratório chinês Sinovac Biotech em parceria com o Instituto Butantan estaria sendo negociada apenas por “outros dois pequenos países”. Porém, além de já estar sendo aplicada na China em caráter emergencial, a Sinovac tem acordo com pelo menos outros três países, além do Brasil.

No início deste mês, o ministro da saúde da Turquia, Fahrettin Koca, anunciou o início da vacinação com a CoronaVac. De acordo com a agência Associated Press, o acordo entre o governo da Turquia e a Sinovac Biotech prevê a aquisição de 50 milhões de doses da vacina.

Em outubro, o governo chileno anunciou o acordo com a Sinovac para a compra de 20 milhões de doses caso o desenvolvimento seja bem-sucedido. De acordo com nota oficial, os estudos estão na fase três e mais de 400 voluntários já participaram do ensaio clínico da CoronaVac.

No final de agosto, a Sinovac divulgou outros dois acordos com a PT Bio Farma, líder biofarmacêutica da Indonésia, para o fornecimento, produção local e licenciamento da tecnologia da CoronaVac. O acordo prevê o fornecimento da matéria-prima da vacina a granel para a produção de pelo menos 40 milhões de doses da CoronaVac até março de 2021; após o mês de março a Sinovac continuará fornecendo a quantidade necessária da vacina a granel até o final de 2021.

A China e a pandemia

No vídeo, os participantes do programa questionam a venda de equipamentos de proteção individual (EPIs) pela China durante a pandemia. Fabrizio Fasano, o apresentador, diz que o país asiático estava “misteriosamente, preparadíssimo”. E Loiola afirma que, no período da crise sanitária global, a China “conseguiu faturar mais vendendo máscaras do que o Brasil com a venda de soja, açúcar e frango”.

De fato, a maior parte dos equipamentos de proteção individual usados em todo o mundo no contexto da pandemia – máscaras e luvas, por exemplo – foi produzida na China. Nenhum dos participantes do programa menciona, porém, que a China já realizava a maior parte das exportações de EPIs antes mesmo da pandemia.

Um relatório da Organização Mundial do Comércio, entidade que supervisiona as relações comerciais entre os países, aponta que a China já era o principal exportador de equipamentos de proteção individual, como máscaras e luvas, entre 2017 e 2019. De acordo com o documento, de abril deste ano, as exportações realizadas pela China, Alemanha e Estados Unidos representaram mais de 40% do total. Se consideradas só as máscaras vendidas para outros países em 2019, a China foi responsável por um quarto da produção.

Esta reportagem do New York Times explica que o governo chinês realizou diversos incentivos para produzir nacionalmente uma gama de produtos essenciais – e, provavelmente, deve dominar o mercado de EPIs mais uma vez, caso ocorra uma nova pandemia.

Neste ano, de fato, somente a venda de máscaras pela China somou mais de US$ 40 bilhões, enquanto o Brasil exportou US$ 23,8 bilhões em soja, US$ 4,2 bilhões em carne bovina in natura e US$ 3,5 bilhões em açúcar bruto, alguns dos principais produtos brasileiros no mercado internacional.

Mesmo com a grande participação dos produtos chineses no fornecimento, o aumento da demanda impactou o setor como um todo. Em 2020, o mercado brasileiro de EPIs hospitalares também cresceu. Os indicadores da Associação Nacional da Indústria de Material de Segurança e Proteção ao Trabalho (Animaseg) mostram que a expectativa de evolução do mercado nacional de máscaras descartáveis, por exemplo, é de um aumento de 278%, em relação ao ano passado. Para os representantes do setor, só não houve um crescimento maior, especialmente em dólares, porque o governo proibiu a exportação dos EPIs voltados para a área hospitalar, para garantir o atendimento à demanda interna.

Além disso, é importante ressaltar que a China não estava “preparadíssima” para atender à demanda que disparou com a pandemia. No primeiro semestre, a própria Organização Mundial de Saúde alertou para a falta de equipamentos de proteção individual em vários países. No Brasil, boa parte dos profissionais de saúde denunciou a falta de EPIs nos primeiros meses da pandemia. Um levantamento da Associação Médica Brasileira mostra que houve registro de falta de máscaras, óculos, luvas, entre outros.

Durante a entrevista, Alessandro Loiola fala sobre o aumento das fortunas dos que já eram ricos no Brasil e nos Estados Unidos e diz que, durante a pandemia, os bilionários chineses ficaram 40% mais ricos, ao mesmo tempo em que o PIB do país cresceu 10%. E completa, se dirigindo aos entrevistadores: “Você acha que esse pessoal que tem dinheiro e poder quer que isso pare?”.

O PIB da China não cresceu 10%, mas 4,9% ao ano, no terceiro trimestre do ano, na comparação com o mesmo período do ano passado, como mostra esta reportagem do Valor Econômico publicada em outubro. Procuramos a Embaixada da China no Brasil para falar sobre as insinuações feitas durante a entrevista, mas não obtivemos resposta aos e-mails enviados nos dias 10 e 14 de dezembro.

Sobre o crescimento da economia chinesa durante a epidemia, o UOL publicou uma reportagem em março mostrando o impacto desta e de outras epidemias no país ao longo dos anos. O texto mostra que a economia chinesa de fato cresceu durante as epidemias, mas não só nelas: o PIB chinês não sofre uma queda desde 1976, de acordo com dados do Banco Mundial. Naquele ano, a economia encolheu 1,57%. Por isso, não é possível afirmar que o crescimento chinês esteja ligado às epidemias de H1N1 (2009), gripe aviária (2013), peste suína africana (2019) e coronavírus.

Em abril deste ano, o então ministro da Educação Abraham Weintraub usou as redes sociais para ironizar a China e insinuar que o país sairia fortalecido da crise. A Embaixada da China no Brasil usou a conta oficial no Twitter para rebater a postagem de Weintraub, dizendo que “tais declarações são completamente absurdas e desprezíveis, que têm cunho fortemente racista e objetivos indizíveis, tendo causado influências negativas no desenvolvimento saudável das relações bilaterais China-Brasil”.

Quem participa do vídeo?

O médico Alessandro Loiola é natural de Vitória, no Espírito Santo, e atua como clínico-geral em São José dos Campos, em um consultório particular. Loiola apareceu em outra verificação recente do Comprova, que apontou que ele também é registrado como profissional no Conselho Federal de Medicina em Minas Gerais, nas áreas de cirurgia geral e proctologia. O médico tem dezenas de milhares de seguidores no Twitter e no Instagram, onde já fez diversas postagens relacionadas à pandemia de covid-19, falando em “riscos da vacina” e contra o uso de máscaras.

O médico não tem um currículo cadastrado na plataforma Lattes.

Em novembro do ano passado, Alessandro Loiola foi nomeado pelo então secretário de cultura, Roberto Alvim, como Coordenador-Geral de Empreendedorismo e Inovação, do Departamento de Empreendedorismo Cultural, da Secretaria da Economia Criativa. Ele foi exonerado menos de dois meses depois, em janeiro de 2020, após a saída de Alvim da chefia da pasta.

Além de desmentir que as vacinas sejam capazes de provocar danos genéticos, o Comprova também já classificou como enganosas outras afirmações dele sobre a eficácia das máscaras.

O Programa Coliseum é apresentado no YouTube pelo empresário do ramo da gastronomia Fabrizio Fasano Jr. Membro da família Fasano, famosa pelos hotéis e restaurantes no país, Fabrizio já participou de reality shows culinários na TV aberta e fechada. Nas redes sociais, já se desentendeu com o apresentador Danilo Gentili, e já realizou várias postagens em apoio ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e questionando a gravidade da pandemia da covid-19.

O terceiro participante do programa é o empresário Marcos Bellizia, empresário sócio da SG Consulting, de gestão empresarial. Ele aparece na lista de empresários apoiadores de Bolsonaro investigados no “inquérito da fake news”, do Supremo Tribunal Federal (STF). Contra Bellizia, foram cumpridos mandados de busca e apreensão pela Polícia Federal, por suspeita de financiar a organização de atos antidemocráticos e a divulgação de fake news, além de promover ataques virtuais contra o STF. Segundo matéria do Estadão, Marcos Bellizia também é “Ex-líder do movimento Nas Ruas, fundado pela deputada Carla Zambelli (PSL-SP), ajudou a organizar e a encorpar atos pró-Bolsonaro”.

Por que investigamos?

Em sua terceira fase, o Comprova verifica conteúdos suspeitos que viralizaram na internet sobre as eleições, as políticas públicas do governo federal e a pandemia da covid-19.

Afirmações falsas ou fora de contexto, como as feitas por Alessandro Loiola no vídeo, são um risco para a população, que precisa de informações precisas para se proteger e diminuir as chances de contágio pelo novo coronavírus, por meio de medidas como o uso de máscaras. Acusações e insinuações sobre a China, no contexto da pandemia, também desviam o foco sobre a gravidade da doença, que já matou mais de um milhão e seiscentas mil pessoas no mundo, segundo dados da Universidade Johns Hopkins.

O trecho do programa Coliseum publicado pela deputada Bia Kicis no Instagram teve mais de 200 mil visualizações, e o programa completo, no YouTube, foi visto mais de 87 mil vezes.

Enganoso, para o Comprova, é conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Saúde

Investigado por: 2020-12-21

Não há conhecimento suficiente sobre imunidade para deixar de vacinar quem já teve covid-19

  • Enganoso
Enganoso
As respostas imunes causadas pelas infecções do novo coronavírus variam conforme diversos fatores e o real nível de imunidade de cada pessoa só pode ser descoberto por exames muito específicos e caros
  • Conteúdo verificado: Tuítes sugerem que quem já teve covid-19 não deveria se vacinar e que técnicas usadas nas vacinas e resultados são desconhecidos

É enganoso que quem já teve covid-19 possua imunidade celular e por isso não deveria tomar a vacina contra o novo coronavírus, como afirma uma sequência de tuítes publicada por uma pesquisadora. Segundo especialistas ouvidos pelo Comprova, as respostas imunes causadas pelas infecções do SARS CoV-2 são muito variadas e apenas exames específicos de anticorpos neutralizantes e de células do sistema imunológico podem revelar o nível de proteção obtida pela infecção natural. Também não há qualquer evidência de que quem já teve a doença poderia ter uma “tempestade de citocinas” se tomar a vacina.

A sequência de postagens também afirma que só existiriam dois tipos de vacina, o que não é verdade, já que, até o momento,10 técnicas diferentes estão sendo adotadas no desenvolvimento de imunizantes contra a covid-19, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). As mensagens ainda questionam se o leitor sabe qual o tipo de cada vacina, em uma aparente sugestão de que esses dados seriam desconhecidos, quando na verdade essas informações são repassadas pelos desenvolvedores e pela OMS.

A autora também afirma que os resultados das vacinas não foram apresentados, o que não procede – quatro empresas já divulgaram os dados de eficácia de seus imunizantes.

Como verificamos?

Iniciamos a verificação pesquisando dados sobre os tipos de vacina em desenvolvimento contra a covid-19. Consultamos reportagens, sites de instituições como a Fiocruz, o Plano Nacional de Vacinação e a lista de imunizantes em fase clínica de estudos no site da OMS.

Também buscamos informações em matérias jornalísticas sobre os testes do novo coronavírus e artigos científicos sobre os resultados de eficácia das vacinas até aqui.

Entrevistamos o médico imunologista e professor da Universidade Federal de Santa Catarina, André Báfica, o virologista da Universidade Federal de Minas Gerais e do Centro de Tecnologia em Vacinas da UFMG, Flávio Fonseca, e o especialista em microbiologia, virologia e desenvolvimento de vacinas de DNA vírus pela Fiocruz, Rafael Dhalia, para questionar pontos como a possível imunidade celular de quem já teve covid-19 e possíveis reações em caso de aplicação de vacinas.

Pesquisamos informações sobre a autora das postagens em sites de busca e na Plataforma Lattes. Também consultamos a Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP) para confirmar o vínculo da pesquisadora com a instituição.

Tentamos contato por e-mail com a autora das postagens, mas até a publicação desta checagem não tivemos retorno.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 21 de dezembro de 2020.

Verificação

Quem teve covid-19 não precisa de vacina?

Na primeira mensagem publicada, a autora afirma que já teve covid-19 e, por isso, teria imunidade celular contra a doença, sugerindo que não haveria necessidade de se vacinar. No entanto, o conhecimento sobre essa proteção gerada pela infecção ainda é um ponto incerto nos estudos sobre o novo coronavírus. Especialistas têm defendido que mesmo quem já teve a doença tome a vacina quando ela estiver disponível.

O médico imunologista e professor da UFSC André Báfica, que também atua no desenvolvimento de uma vacina contra o novo coronavírus com base na bactéria usada na BCG, esclarece que para a infecção pelo SARS CoV-2 ainda não se sabe qual o índice de proteção que a infecção natural promove.

Ele explica que em algumas situações, como da pneumonia causada pela bactéria Pneumococo, a vacina protege mais do que a infecção natural. Em outros casos, como a caxumba, a imunização pela infecção é mais duradoura do que a da vacina – embora desenvolver a doença ofereça risco de infertilidade para homens. No caso da covid-19, o professor esclarece que há muita variação na resposta imune causada pelas infecções. E saber quem eventualmente já teria obtido proteção natural não é tarefa fácil.

Os testes rápidos detectam apenas quem já teve contato com o vírus. Para saber a proteção real que a pessoa tem contra o SARS CoV-2, é preciso identificar se essa exposição gerou a criação de anticorpos neutralizantes, aqueles que são capazes de impedir o vírus de ingressar na célula humana, ou mesmo se há presença de células T (ou linfócitos T) específicas, mencionadas pela autora na postagem. Essas células T fazem parte do sistema imunológico, ajudam na resposta antiviral e são também associadas à imunidade contra a covid-19 porque alguns pacientes podem produzir pouco ou nenhum anticorpo, mas alcançaram imunidade por meio das células T. No entanto, identificar o nível dessas duas formas de proteção em cada pessoa só é possível com exames mais elaborados e complexos.

“Tem maneiras de a gente saber, mas essas maneiras são muito caras, feitas em laboratório altamente especializado, para medir o nível de resposta imunológica das células T e o nível de anticorpos neutralizantes. Isso custa caro, muito mais caro que uma dose de vacina”, afirma o professor Báfica.

Assim, se a eficácia de uma vacina for de 90%, explica Báfica, a cada 100 pessoas que receberem as doses, 90 estarão imunizadas, ao passo que pela infecção natural não se sabe a proporção de pessoas que estariam protegidas. Por conta disso, a recomendação de especialistas de saúde pública é para que todos tomem a vacina, para garantir a máxima imunização. A padronização na resposta imune proporcionada pela vacina é outra vantagem indicada.

“Há uma chance de que quem teve a doença não precise ser vacinado? Tem uma chance? Nesse momento tem. Dá pra falar que essa pessoa não precisa de vacina? Não, não podemos falar isso. Até o momento, vai ser muito mais barato as pessoas tomarem a vacina, que a gente sabe que é segura, do que fazer um teste para saber se você vai ou não precisar dela”, explica.

O virologista da Universidade Federal de Minas Gerais e do Centro de Tecnologia em Vacinas da UFMG, Flávio Fonseca, explica que a mecânica da imunização gerada pela infecção citada no tuíte é correta, mas confirma que uma das grandes lacunas de informação que se tem hoje é sobre a longevidade dessa resposta imune e o quão eficaz ela é. Um exemplo disso são os casos de reinfecção que vêm sendo registrados. Segundo ele, assegurar que todos que tiveram covid-19 possuem essa proteção desconsidera até mesmo a grande variabilidade de resposta imune de uma pessoa para outra.

“Se a gente tivesse uma resposta clara de que a pessoa que se infectou está protegida, igual na catapora, ótimo. Não é o caso, a ciência ainda não conseguiu arregimentar essas informações, então é irresponsável da parte de uma pessoa vir publicamente informar isso”, aponta.

Procurado pelo Comprova, o especialista em desenvolvimento de vacinas de DNA vírus pela Fiocruz, Rafael Dhalia, confirma que estudos mostram queda abrupta de anticorpos após três meses de infecção e que, embora a resposta celular ocorra com a infecção, “se a imunidade celular por si só conferisse total proteção, não existiriam casos de reinfecção pelo SARS CoV-2”.

Tempestade de citocinas

A autora também sugere que, caso quem já teve covid-19 tome a vacina, poderia ter uma tempestade de citocinas ao entrar em contato com o vírus ou partículas do vírus que pudessem estar presentes nas doses, e que isso poderia levar até a morte, a depender da intensidade. O médico infectologista e professor da UFSC diz que não há nenhum dado de nenhuma vacina que confirme esta afirmação.

Tempestade de citocinas é o nome dado a uma espécie de desequilíbrio na resposta imune, quando o sistema inflamatório do corpo não consegue parar de atuar e acaba causando danos ao próprio organismo. Estudos analisam possível relação desse fenômeno com a alta mortalidade decorrente de covid-19. Báfica explica que as tempestades de citocinas só têm sido vistas em parte dos pacientes que precisam ir para a UTI, na forma grave da doença. Em geral, pessoas com doença prévias e que representariam menos de 20% do total de casos.

Além disso, muitas das vacinas em desenvolvimento, como a da farmacêutica norte-americana Pfizer em parceria com o laboratório alemão BioNTech, que usa método de RNA mensageiro, não utilizam partes do vírus na composição, apenas um código genético que induz as células a produzirem uma proteína característica do coronavírus.

Flávio Fonseca, da UFMG, também diz que essa relação entre vacina e possível risco a quem já se infectou é incorreta. Ele explica que o mecanismo imune gerado pela vacina é diferente do que é desencadeado pela infecção, situação em que o vírus pode inclusive alterar a capacidade de resposta imunológica do corpo.

“A resposta ao vírus é uma coisa, a resposta à vacina é completamente diferente. Nenhuma das vacinas é composta pelo vírus vivo. Ou é uma vacina de RNA, ou de adenovírus, ou de vírus morto ou que contém uma proteína do SARS CoV-2. Então, a circunstância da vacinação é outra. Ela gera anticorpos e células de defesa contra o coronavírus, mas num ambiente global de resposta imune completamente diferente da resposta ao coronavírus”, detalha.

Rafael Dhalia, da Fiocruz, diverge e diz que há possibilidade de uma resposta exacerbada (a tempestade de citocinas) quando alguém já infectado entrar em contato com o vírus, mas diz que isso pode ocorrer também em caso de sucessivas infecções naturais ou por vírus relacionados (outros coronavírus). Segundo ele, o fenômeno, chamado de ADE, é comum com a dengue e vem sendo estudado no caso da covid-19. Sobre essa ocorrência no contato com as vacinas, ele cita que a vacina da Sinopharm, por exemplo, já foi aplicada de forma emergencial em mais de 1 milhão de chineses e que até o momento não há relatos dessa resposta exacerbada ou tempestade de citocinas em imunizados.

“Não tomar nenhuma vacina não parece ser uma boa opção, até porque tudo indica que a infecção por SARS-CoV-2 não confira imunidade protetora duradoura, o que significa que não atingiremos a imunidade de rebanho pela simples infecção natural pelo vírus”, afirma.

Dez tipos de vacina

Ao contrário do que diz a autora das postagens, não há apenas dois tipos de vacina. As vacinas atenuadas, que contêm o vírus vivo, mas enfraquecido, e as inativadas, feitas com o vírus morto ou inativado por processo químico, são citadas por ela e são duas das formas mais conhecidas de imunizantes em geral, mas há outras tecnologias sendo empregadas no desenvolvimento de imunizantes contra a covid-19.

Segundo a relação de vacinas em fase clínica de estudos da Organização Mundial da Saúde (OMS), há 10 estratégias diferentes em utilização pelos desenvolvedores das 56 vacinas candidatas até 17 de dezembro, nas fases 1, 2 e 3 de estudos clínicos. Dessas, apenas uma usa o método com o vírus vivo atenuado.

Um desses 10 métodos usados são as chamadas vacinas de subunidades, que em vez de trabalhar com o vírus inteiro, atenuado ou inativado, utilizam apenas uma parte dele, como uma proteína, para ativar a produção de anticorpos por meio dos imunizantes. O site da Fiocruz traz explicações sobre esses três tipos de vacinas.

Outra estratégia em uso são as vacinas de vetor viral não replicante, em que outro vírus incapaz de se reproduzir no organismo, em muitos casos um adenovírus, é utilizado como vetor, para “transportar” o gene da proteína spike do SARS-CoV 2, responsável por permitir a entrada do coronavírus nas células humanas. É dessa forma que esse método de imunizante induz a produção de anticorpos.

Além disso, a corrida pela vacina também acelerou as pesquisas das chamadas vacinas gênicas. Em vez de utilizarem o vírus ou parte dele, essa modalidade faz uso apenas de um código genético que é capaz de fazer as próprias células do corpo humano produzirem a proteína spike, existente no coronavírus. A partir daí, o organismo é acionado para desenvolver anticorpos contra essa substância, e em caso de uma futura infecção, o corpo já saberá como se proteger. É o caso das vacinas de mRNA, ou RNA mensageiro, como os imunizantes da norte-americana Moderna e da parceria Pfizer/BioNtech. Esta última foi a primeira a ser autorizada para uso em massa em um país ocidental e que já vem sendo aplicada no Reino Unido e nos Estados Unidos.

No total, os 10 tipos de vacinas em teste, segundo a OMS, são: vírus vivo atenuado, vírus inativado, subunidade proteica, vetor viral não replicante, vetor viral replicante, DNA, RNA, VLP, além de outros dois tipos de vetor viral que combinam o uso de células de apresentação de antígenos. Publicação da Agência Brasil e edição de julho da revista da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) explicam diferenças entre algumas das estratégias usadas na busca por vacinas contra a Covid-19. O Plano Nacional de Vacinação, apresentado esta semana pelo governo federal, também detalha esses métodos.

Técnica de cada vacina é conhecida

Também não é verdade que a população desconhece qual a tecnologia empregada no desenvolvimento de cada vacina, conforme sugerido na sequência de tuítes ao questionar “Vcs sabem qual delas está sendo produzida? Eu não!!!!”. Entre os quatro imunizantes com testes da fase 3 autorizados no Brasil, há três métodos diferentes. A vacina da Pfizer/BioNTech, como já dito, usa a plataforma de RNA. A CoronaVac, do laboratório chinês Sinovac com o Instituto Butantan, é de vírus inativado. As vacinas da farmacêutica AstraZeneca com a Universidade de Oxford, da Inglaterra, e da Janssen usam a técnica de vetor viral não replicante.

Segundo a lista da OMS, das 14 vacinas que estão na fase 3 dos estudos em todo o mundo, há seis métodos principais. Em quatro, os laboratórios utilizam o vírus inativado – Sinovac, Bahrat Biotech e dois imunizantes da Sinopharm. Duas, da Moderna e da Pfizer/BioNTech, utilizam tecnologia de mRNA e uma (Inovio) tem estratégia similar, de DNA. Outras quatro vacinas utilizam vetor viral não replicante (AstraZeneca/Oxford, Instituto Gamaleya, Janssen e Cansino), duas usam plataforma de subunidade proteica (Novavax e Anhui Zhifei Longcom) e uma (Medicago) usa plataforma com partículas semelhantes ao vírus, chamada de VLP (Virus Like Particle).

Índice de erro nos testes

A pesquisadora afirma nos tuítes que os testes apresentam de 20% a 70% de erros.

Segundo o Conselho Nacional da Saúde, dois testes são mais recomendados para a detecção do novo coronavírus, o RT-PCR e os exames sorológicos IGG e anticorpos totais.

Os testes do tipo RT-PCR são os mais recomendados pela OMS e identificam a presença do material genético do vírus no organismo a partir de amostras de secreções do nariz ou da garganta. Esse tipo de teste deve ser realizado entre o terceiro e sétimo dia de sintomas; fora deste prazo há uma maior chance de falso-negativo. Segundo artigo da Johns Hopkins Medicine, a porcentagem de falsos-negativos em testes RT-PCR é de pelo menos 20%, podendo variar de acordo com o tempo desde a infecção. Os cientistas ressaltam, entretanto, que o estudo possui limitações, como o fato de terem utilizado diferentes tipos de RT-PCR, e recomendam que mais estudos sejam feitos para identificar a precisão dos testes.

Os exames sorológicos IGG e anticorpos totais identificam se a pessoa já produziu anticorpos contra o coronavírus, ou seja, indicam se já teve contato com o vírus.

O resultado também depende do tempo desde a infecção, visto que o organismo pode levar alguns dias para produzir anticorpos, sendo na maioria das vezes entre o dia 10 e o dia 21 após a infecção. Segundo o Ministério da Saúde, os testes IGG utilizados no Brasil apresentaram de 95% a 100% de sensibilidade.

Os chamados “testes rápidos” (IGA e IGM) estão sendo descartados pela comunidade científica e a OMS por conta da baixa eficácia nos resultados. Esse tipo de teste pode chegar a 75% de falsos-negativos.

O diagnóstico da covid-19, no entanto, não deve levar em conta somente o teste, mas a análise de sintomas e, se possível, a utilização de testes conjuntamente.

Tempo de desenvolvimento

Em outro trecho do vídeo, a pesquisadora afirma que as vacinas levam tempo para serem produzidas, que “um estudo robusto leva em torno de 5 anos” e que “as vacinas atuais levaram um mês”.

O Comprova já mostrou em outra verificação que tanto a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) quanto a Food and Drug Administration (FDA), órgão regulatório dos Estados Unidos, não estabelecem tempo mínimo para desenvolvimento de vacinas a serem aprovadas. O fundamental é que passem por estudos com três fases, comprovando segurança e eficácia.

O médico imunologista e professor da UFSC acrescenta que novos desenvolvimentos de vacinas aproveitam o conhecimento acumulado de mais de 100 anos da ciência na fabricação de imunizantes. Além disso, os impactos da pandemia contribuíram para acelerar algumas etapas, como as análises de algumas agências regulatórias, sem deixar de garantir a segurança.

Além disso, os testes das vacinas atuais não duraram um mês. A Pfizer, por exemplo, que teve autorizações recentes no Reino Unido e Estados Unidos, informa como 29 de abril a data de início dos estudos da fase 1 e anunciou a conclusão da fase 3 de estudos em novembro, o que corresponde a um intervalo de seis meses e meio.

Duração da imunização

A duração da proteção contra o novo coronavírus oferecida pela vacina, também citada pela autora da postagem, é de fato uma das principais dúvidas até o momento. Apesar disso, um estudo publicado no jornal The New England Journal of Medicine já revelou que voluntários da fase 1 da vacina da norte-americana Moderna continuaram registrando altos índices de anticorpos neutralizantes 119 dias após a vacinação – 90 dias após receberem a segunda dose. Os voluntários continuam sendo acompanhados para identificar a durabilidade da resposta imune. A notícia de que o imunizante proporciona pelo menos três meses de imunização foi repercutida por veículos como G1 e El País.

Outras vacinas como a da Pfizer/BioNTech ainda não tiveram os dados de durabilidade divulgados. A tendência, segundo o médico imunologista e professor da UFSC, André Báfica, é de que só seja possível avaliar a longevidade da proteção das vacinas com o decorrer do tempo, em que os voluntários continuarão a ser avaliados.

Rafael Dhalia, da Fiocruz, confirma que o tempo de proteção das vacinas em testes ainda não é conhecido e que isso requer que transcorra o tempo de estudo.

“Agora, deixar esse tempo passar sem se vacinar e contar com a infecção do vírus como parâmetro de proteção individual com certeza não é uma boa avaliação da situação diante da escalada desenfreada do número de contaminações e mortes” aponta.

Autora da postagem

Em seu currículo Lattes, Cintia Tóquio Reis Gonçalves informa que é fisioterapeuta e doutora em patologia pulmonar pela Faculdade de Medicina da USP. A instituição confirmou por email que Cintia teve vínculo com a USP até 2019, nos cursos de doutorado e pós-doutorado.

Entramos em contato com a autora, que não respondeu até a data da publicação.

Por que investigamos?

Em sua terceira fase, o Comprova investiga conteúdos duvidosos relacionados às políticas públicas do governo federal e à pandemia do novo Coronavírus.

Peças de desinformação sobre vacinas são prejudiciais porque diminuem a confiança da população nas autoridades e em campanhas de imunização, consideradas fundamentais para diminuir a mortalidade da covid-19 e desafogar o sistema de saúde. O conteúdo analisado teve mais de 15 mil interações, juntando todos os tweets.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Saúde

Investigado por: 2020-12-18

É falso que China não usará suas próprias vacinas

  • Falso
Falso
A China já usa suas próprias vacinas em grupos de profissionais em alto risco e há ao menos 13 imunizantes em desenvolvimento no país. Além disso, chineses aguardam os resultados da fase 3 da Coronavac que, no Brasil, estão sendo realizados pelo Instituto Butantan.
  • Conteúdo verificado: post afirma que China comprou 1 bilhão de doses de vacinas da Austrália e que não usará vacinas de seu próprio país.

É falso que a China tenha comprado um bilhão de vacinas contra a covid-19 em desenvolvimento na Austrália e não vá usar nenhum dos imunizantes produzidos por seus laboratórios e universidades. As afirmações foram feitas originalmente em uma postagem do Facebook que atingiu mais de 22 mil compartilhamentos desde o último dia 17 de dezembro. Nesta semana outras páginas e perfis replicaram as informações falsas.

Há ao menos 13 vacinas em desenvolvimento no país e o conteúdo verificado desconsidera que a China concedeu, desde novembro, autorização especial para que as vacinas da Sinovac e da Sinopharm – ambas desenvolvidas lá – sejam aplicadas na população do país considerada de alto risco, caso dos médicos e profissionais de saúde. Segundo a NPR, o processo se intensificou em novembro deste ano com a vacina da Sinopharm. Segundo a CNN, desde julho a Sinopharm está sendo aplicada em alguns trabalhadores de profissões de “alto risco”. A Coronavac teve parte de sua fase 3 realizada no Brasil, devido a um acordo entre o governo chinês e o Instituto Butantan. Segundo o governo do estado de São Paulo, o país asiático aguarda os resultados dos testes de eficácia e segurança realizados aqui, assim como Chile, Turquia e Indonésia.

Na Austrália, uma parceria entre a empresa de biotecnologia CSL e a Universidade de Queensland, no norte do país, produziria milhões de doses da vacina. Porém, um efeito adverso nos testes freou o ensaio clínico e o governo australiano anunciou que irá reformular o plano de vacinação. A Austrália, então, encomendou mais doses da AstraZeneca, laboratório que desenvolve a vacina de Oxford e da Novovax, empresa de biotecnologia dos EUA.

Como verificamos?

Procuramos pela ferramenta de análise de redes Crowdtangle quando foram publicadas as primeiras postagens nas redes sociais – em português ou outros idiomas – com o boato. A primeira publicação é de 10 de dezembro no Facebook, de um paulistano, sem profissão identificada, chamado Diogo Oliveira Tão. Diogo não possui outras redes sociais públicas associadas ao seu perfil no Facebook.

Entramos em contato com Diogo e procuramos informações sobre as vacinas em produção na Austrália, a partir de reportagens locais e dos sites das empresas biofarmacêuticas envolvidas com imunizantes para covid-19.

Também buscamos na lista da Organização Mundial da Saúde (OMS) todas as vacinas contra o novo coronavírus que já estão em estágio de ensaio clínico. Procuramos os sites dessas companhias ou entidades listadas para saber quais delas eram chinesas e se tinham relações conhecidas com o governo chinês.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 17 de dezembro de 2020.

Verificação

Vacinas produzidas pela China

Segundo o levantamento da Organização Mundial da Saúde (OMS), atualizado no dia 17 de dezembro, há atualmente 56 vacinas candidatas em ensaio clínico (sendo testadas em humanos), enquanto 166 estão em estágio pré-clínico. Entre as vacinas que já estão em teste clínico, ao menos 13 foram desenvolvidas por companhias chinesas ou institutos de pesquisa da China.

Apenas uma das vacinas desenvolvidas por chineses tem acordo para distribuição no Brasil: a CoronaVac, da Sinovac Biotech. O acordo com o governo de São Paulo prevê a importação e produção de 60 milhões de doses, e a tecnologia será transferida para o Instituto Butantan, que começou a produzir a vacina no início deste mês. Até março, o estado pretende ter 9 milhões de doses da CoronaVac, entre importadas da China e produzidas aqui.

Além do Brasil, Indonésia, Turquia, Chile e a própria China pretendem usar a vacina. A China inclusive já concedeu autorização especial para que as vacinas da Sinovac e da Sinopharm – ambas desenvolvidas lá – sejam aplicadas na população do país considerada de alto risco, caso dos médicos e profissionais de saúde.

Segundo o governo do estado de São Paulo, em coletivas de imprensa recentes, a China aguarda os resultados da fase 3 de testes para iniciar autorizações. Também segundo o governo paulista, o envio desses dados será feito no próximo dia 23.

A China realizou as fases 1 e 2 dos testes da coronavac. Parte do acordo entre Instituto Butantan e a Sinovac Biotech incluiu que, uma vez que a fase 3 foi feita pelo governo de São Paulo, o preço pago por dose da vacina foi substancialmente abaixo em relação ao mercado internacional.

[CORREÇÃO: Em 21 de dezembro de 2020, esse texto foi atualizado para corrigir a informação a respeito de onde são realizados os testes da fase 3 da Coronavac. Ao contrário do informado na versão original, que afirmava que os testes eram feitos apenas no Brasil, eles estão sendo realizados também no Chile, na Indonésia e na Turquia.]

Vacinas da Austrália

Uma das vacinas em fase de teste na Austrália foi desenvolvida pela empresa Commonwealth Serum Laboratories (CSL) em parceria com a Universidade de Queensland. O ensaio clínico envolvendo participantes começou em julho deste ano. Em setembro, o governo fez um acordo inicial para a produção da vacina quando estivesse pronta. No entanto, segundo a CSL, os anticorpos gerados pela vacina interferiram em resultados de exames.

Em nota, o laboratório afirmou que não houve nenhuma reação adversa mais grave nos 216 participantes. Entretanto, os dados mostraram a geração de anticorpos direcionados a uma proteína da vacina e o sistema imunológico respondeu esses anticorpos alterando resultados como se fossem “falsos positivos”. Em conversa com o governo australiano, o laboratório decidiu suspender os testes.

Autor da postagem

Entramos em contato com o autor do post, ele alegou engano, no entanto, não deletou o conteúdo. Também não encontramos outras redes sociais do autor.

Por que investigamos?

Em sua terceira fase, o Comprova investiga conteúdos duvidosos relacionados às políticas públicas do governo federal e à pandemia do novo Coronavírus. Conteúdos falsos prejudicam o trabalho dos pesquisadores e diminuem a confiança das pessoas nas autoridades. A postagem no Facebook teve 13 mil compartilhamentos em menos de uma semana e surgiram novas postagens com o mesmo conteúdo falso durante o crescimento da viralização.

O Comprova já checou uma postagem que insinuava que a China não usará a própria vacina.

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.