O Projeto Comprova é uma iniciativa colaborativa e sem fins lucrativos liderada pela Abraji e que reúne jornalistas de 42 veículos de comunicação brasileiros para descobrir, investigar e desmascarar conteúdos suspeitos sobre políticas públicas, eleições, saúde e mudanças climáticas que foram compartilhados nas redes sociais ou por aplicativos de mensagens.
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Saúde

Investigado por: 2021-08-05

Ministério da Saúde de Israel nega que seus dados permitam concluir sobre imunidade de infectados

  • Enganoso
Enganoso
Postagens em site e redes sociais enganam ao afirmar que, segundo o Ministério da Saúde de Israel, pessoas que foram infectadas pelo novo coronavírus ficam sete vezes mais protegidas do que aquelas que tomaram a vacina da Pfizer.
  • Conteúdo verificado: Posts afirmam que, de acordo com números do governo israelense, quem teve covid-19 tem imunidade mais forte do que pessoas que não se infectaram e se vacinaram.

São enganosas as postagens em um site e em redes sociais que declaram, com base em supostos dados do Ministério de Saúde de Israel, que pessoas infectadas pela covid-19 estão sete vezes mais protegidas do que aquelas que não tiveram a doença e foram imunizadas com a vacina da Pfizer.

Contatado pela reportagem, o órgão do governo israelense respondeu que os dados disponíveis até agora não permitem apoiar ou rejeitar essa afirmação. Questionado se seria correto dizer que os anticorpos advindos da infecção natural são mais fortes do que os criados pela vacina, o ministério declarou que essa informação “não é conhecida no momento”. A pasta ainda reforçou a importância da vacinação e que ela já se mostrou eficaz em prevenir casos graves e hospitalizações.

O site Frontliner, citado como fonte de informação nos posts, foi procurado pela reportagem, mas não respondeu até a publicação deste texto.

Como verificamos?

Inicialmente, pesquisamos informações sobre a situação da campanha de vacinação em Israel e a eficácia das vacinas em reportagens nacionais e internacionais. O segundo passo foi contatar, por e-mail, o Ministério da Saúde daquele país.

Por mensagens de WhatsApp, falamos com o médico Roberto Zeballos, que postou este conteúdo em seu perfil no Instagram. Tentamos contato, por e-mail, com o site Frontliner, responsável pelo texto, e com o deputado federal Osmar Terra (MDB-RS), que publicou um tuíte sobre o assunto. Em ambos os casos, não houve resposta.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 5 de agosto de 2021.

Verificação

Que dados são esses?

Ao contrário do que afirmam textos verificados aqui, os dados sobre contaminação divulgados pelo ministério israelense não foram obtidos por meio de estudo, mas, sim, via monitoramento epidemiológico realizado pela pasta.

Por e-mail, o Ministério da Saúde de Israel informou que a mais recente onda de contaminações começou em meados de junho. Do dia 15 daquele mês até 27 de julho, foram diagnosticadas 24.348 novas infecções.

Destes casos, 163 (0,66%) ocorreram em pessoas que já haviam sido diagnosticadas anteriormente com a covid-19. Nesta conta entram diagnósticos feitos ao menos 90 dias depois do primeiro resultado positivo. Quarenta e sete destas pessoas também já estavam totalmente vacinadas.

Outros 12.511 (51,3%) novos casos no mesmo período foram observados em pessoas que já haviam recebido a vacinação completa e acabaram infectadas pela primeira vez.

A doença gera melhor imunidade que a vacinação?

O ministério isralense respondeu que “os dados disponíveis atualmente não permitem confirmar ou negar” que a imunidade das pessoas que entraram em contato com o vírus seja mais forte do que a imunidade conferida por vacinas. “O Ministério da Saúde avalia que o aumento no número de contágios se dá em parte por causa da diminuição na proteção das pessoas vacinadas em janeiro e fevereiro”, disse o órgão israelense.

Por fim, o ministério informou que seus dados “claramente mostram” que a vacinação protege contra casos graves de covid-19 e sugerem que o grau de imunidade pode diminuir quando em contato com a variante Delta e de acordo com o tempo passado após a segunda dose da vacina. Com base nisso, o órgão passou a recomendar uma terceira dose para os idosos. O primeiro a receber a dose de reforço foi o presidente, Isaac Herzog.

Apesar disso, não há estudos conclusivos que indiquem benefício na medida, disse a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), do Brasil, em recente posicionamento. No país, dois testes clínicos sobre o tema estão sendo conduzidos pelos laboratórios AstraZeneca e Pfizer/BioNTech.

Já a Agência de Medicamentos Europeia (EMA) informa que, até o momento, não se sabe quanto tempo dura a imunidade das vacinas e que é preciso aguardar a conclusão dos estudos atualmente em desenvolvimento. Alguns deles monitoram o impacto das vacinas na vida real, o que deverá subsidiar estratégias futuras de vacinação. O órgão recomenda que todas as pessoas elegíveis se vacinem.

Eficácia da Pfizer

Em sua resposta, o ministério cita um estudo publicado na Lancet sobre o impacto e a eficácia da Pfizer realizado em Israel entre 24 de janeiro e 3 de abril com pessoas com 16 anos ou mais.

O levantamento conclui que duas doses da vacina “são altamente eficazes em todas as faixas etárias na prevenção de infecções sintomáticas e assintomáticas por Sars-CoV-2 e hospitalizações relacionadas à covid-19, doença grave e morte”, incluindo contra a variante alfa. Ainda de acordo com o estudo, “essas descobertas sugerem que a vacinação pode ajudar a controlar a pandemia”.

Em 7 de julho, o Ministério da Saúde havia anunciado que os dados epidemiológicos mais recentes até então mostravam que a taxa de eficácia da vacina em prevenir o contágio e a contaminação sintomática havia caído para 64%. O órgão ressaltou que essa observação se deu simultaneamente com o aumento de contágios pela variante Delta.

No mesmo pronunciamento, o ministério observou que a eficácia em prevenir casos graves e hospitalizações estava em 93%, muito próximo da eficácia anunciada pela Pfizer nos testes clínicos, de 95%.

O site

O site Frontliner afirma, na aba “Quem somos” da seção sobre “princípios editoriais”, que defende “a independência do nosso jornalismo, a primazia da realidade – fatos em primeiro lugar, respeito pelas opiniões e aqueles que as expressam, e o direito de cada indivíduo formar suas opiniões”.

Também afirma que suas publicações trazem “fatos verificados” e entregam “elementos fidedignos à fonte”.

O site já apareceu em outras verificações. Em outubro do ano passado, o Comprova classificou como enganoso um texto que retirava frase de enviado da OMS de contexto para sugerir que a entidade condenava o lockdown. Texto semelhante foi verificado também pelo Estadão Verifica em março deste ano.

O Comprova enviou mensagem por e-mail e pelo “fale conosco” do site, mas não recebeu retorno até a conclusão deste texto.

O texto do site Frontliner ganhou visibilidade ao ser compartilhado por pessoas influentes nas redes sociais. Um deles foi o deputado federal Osmar Terra (MDB-RS), que escreveu no Twitter que “Vacina é feita com o vírus da covid, inativado, ou partes dele. Seu objetivo é provocar a produção de anticorpos que irão proteger o organismo de uma infecção com vírus ativo. Igual, quem já teve infecção do vírus ativo produz anticorpos, que protegerão bem o organismo!”

Médico de formação, Osmar Terra foi ministro da Cidadania no primeiro ano do governo Bolsonaro. Ele já fez alegações enganosas sobre a pandemia no Rio Grande do Sul e sobre a eficácia das medidas de distanciamento social, checadas pelo Projeto Comprova. Ele também é investigado pela CPI da Covid, no Senado, por supostamente integrar um gabinete paralelo de aconselhamento do presidente Bolsonaro sobre a condução da pandemia. Procurado pelo Comprova, não respondeu.

Outro post que deu visibilidade ao texto do Frontliner foi um vídeo no Instagram do médico Roberto Zeballos. Na postagem, ele diz que “Estudo de Israel revela que quem venceu a doença tem imunidade SETE vezes melhor do que qualquer vacina!”. Ele também nota que “As vacinas estão mostrando proteção também!” e que “Obviamente não vale o risco de pegar a doença”.

Ao Comprova, ele afirmou que “isso é imunologia básica” e que quem se infecta acaba desenvolvendo resposta imunológica a todas as partes do vírus, não só a uma proteína dele, referindo-se à tecnologia utilizada em algumas das vacinas atualmente utilizadas. Ele disse se basear no estudo do ministério isralense e que suas falas se comprovam “em estudos e resultados com números, nunca especulações”.

Ao ser contestado com a resposta do órgão israelense, respondeu que falou em “estudo” mas que quis dizer os dados de monitoramento. “E quando faz a conta, vê os números e quem teve infecção realmente ficou mais protegido. Não pode ser considerado um estudo, mas tem vários estudos que mostram que quem pegou a doença, tem uma imunidade longa e mais eficaz”, sustentou.

Há estudos mostrando que a imunidade conferida pela infecção seria duradoura. No entanto, os principais órgãos reguladores consideram que os resultados dos estudos até o momento são insuficientes para dizer que a infecção forneceria imunidade maior ou que duraria mais. O Centro de Controle de Doenças (CDC), dos Estados Unidos, ressalta que especialistas “estão pesquisando para entender mais sobre a imunidade tanto pela infecção quanto pela vacinação” e que estudos apontam que as vacinas oferecem um reforço na proteção de quem já foi infectado. A Anvisa reitera isso, dizendo que “pesquisas apontam que a vacina pode proporcionar uma imunidade mais duradoura à covid-19 e fortalecer a imunidade natural à doença”. Ambos recomendam que qualquer pessoa elegível, mesmo quem já teve a doença, se vacine.

Zeballos já foi alvo de duas checagens do Comprova no começo da pandemia. Em uma delas, uma entrevista sua foi tirada de contexto. Ele dava seu relato sobre experiências com medicamentos corticoides no tratamento da covid-19. À época, como ele próprio explicou ao Comprova, os resultados não haviam sido publicados. Atualmente já se possui estudos robustos que comprovam o benefício destes remédios para pacientes infectados.

A outra checagem foi feita sobre um áudio no qual ele replicava alegações de um médico francês de que o Sars-CoV-2 teria escapado de um laboratório em Wuhan, na China. Até hoje essa hipótese não foi comprovada, e as evidências mais robustas apontam que o coronavírus teria sido transmitido naturalmente de um animal selvagem para o ser humano.

Por que investigamos?

Em sua quarta fase, o Comprova verifica conteúdos suspeitos sobre pandemia, políticas públicas do governo federal e eleições que viralizam nas redes. O texto do site Frontliner foi compartilhado 726 vezes no Facebook e teve 5.729 interações. Já o vídeo do médico Roberto Zeballos foi visualizado mais de 180 mil vezes e o tuíte do deputado federal Osmar Terra (MDB-RS) teve 3.824 reações.

Conteúdos enganosos sobre vacinas ou tratamentos contra a covid-19 podem induzir a população a recusar medidas de prevenção, como a imunização, e se expor a riscos durante a pandemia.

O Comprova já mostrou, por exemplo, que exames sorológicos não servem para provar grau de proteção das vacinas, que o diagnóstico positivo de Doria não indica ineficácia da Coronavac, que a Infecção de Rodrigo Faro não prova ineficácia da vacina e que os imunizantes usados no Brasil passaram por testes de segurança e eficácia.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações ou que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor.

Eleições

Investigado por: 2021-08-04

Pesquisa antiga é usada para sugerir que Bolsonaro é aprovado por metade da população

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Enganoso
É enganosa a postagem apontando que metade da população brasileira aprova a maneira de governar do presidente Jair Bolsonaro (sem partido). A pesquisa, na verdade, foi feita em setembro do ano passado, e não reflete a avaliação atual do governo.
  • Conteúdo verificado: Post no Instagram, publicado no fim de julho, traz uma reportagem do portal R7 sobre uma pesquisa encomendada pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) ao Ibope, afirmando que 50% da população brasileira aprova a maneira de governar de Jair Bolsonaro e que a avaliação do governo alcançou o maior porcentual desde o início do mandato.

É enganosa a publicação feita no Instagram com a imagem de uma reportagem do portal R7 apontando que, segundo pesquisa CNI/Ibope, metade dos brasileiros aprova a maneira de governar de Jair Bolsonaro. O levantamento, na verdade, foi feito em setembro do ano passado. À época, a pesquisa apontou que 50% dos entrevistados aprovavam a maneira de governar do presidente, revertendo uma tendência de queda – em dezembro de 2019, eram 41%.

Em dezembro, outra pesquisa encomendada pela CNI – a última feita em parceria com o Ibope – apontou uma queda nos índices de aprovação do presidente e do próprio governo. Segundo o levantamento, em dezembro, 46% aprovavam a maneira de Jair Bolsonaro governar. A desaprovação passou de 45% para 49%.

Em março deste ano, a Confederação Nacional da Indústria anunciou que deixaria de produzir os chamados indicadores de sentimentos do consumidor e avaliação do governo, devido ao fim do contrato e ao encerramento das atividades do Ibope Inteligência. Portanto, não há levantamentos encomendados pela CNI em 2021.

Pesquisas do Datafolha, PoderData e Ipespe consultadas pelo Comprova também apontam que o período entre setembro e outubro de 2020 foi marcado por uma alta na aprovação do governo. Por outro lado, os levantamentos mais recentes desses institutos mostram o pior momento na avaliação do presidente, com recorde no percentual de ruim e péssimo. Além disso, as duas pesquisas já feitas em 2021 pelo Ipec, empresa formada por ex-executivos do Ibope, também apontam uma desaprovação elevada do governo.

Como verificamos?

Primeiramente, o Comprova procurou no Google a reportagem do portal R7 publicada pelo perfil @jairmessiasbolsonaro3.0 no Instagram. Depois, buscou quando a pesquisa foi feita e a publicação original no Portal da Indústria, da CNI. A equipe pesquisou, ainda no site da CNI, o último levantamento realizado pela instituição em parceria com o Ibope e encontramos um de dezembro. Depois disso, segundo notícia publicada no portal da CNI, não houve mais pesquisas em decorrência do fim do contrato com o Ibope.

O Comprova ainda buscou outros levantamentos mais recentes de outros quatro institutos para ver se a pesquisa publicada em setembro reflete a realidade atual. Procurado por meio do Instagram, o perfil @jairmessiasbolsonaro3.0 não respondeu até a publicação deste texto.

Verificação

Pesquisas feita pela CNI em parceria com o Ibope

A Confederação Nacional da Indústria encerrou o contrato com o Ibope em março deste ano – ou seja, não há pesquisas realizadas pela parceria em 2021. A última foi em dezembro de 2020 e apontou que 46% aprovavam a maneira de Bolsonaro governar, caindo 4 pontos porcentuais em relação à realizada dois meses antes, em setembro. A margem de erro é de 2 pontos porcentuais.

Por outro lado, a avaliação positiva do governo caiu em dezembro na comparação com setembro. O porcentual de brasileiros que avaliavam o governo como ótimo ou bom caiu de 40% para 35%. Os que classificavam como regular passaram de 29% para 30% e os que avaliavam como ruim ou péssimo, de 29% para 33%.

As duas pesquisas ouviram 2 mil pessoas em mais de 120 municípios brasileiros.

Outras pesquisas

Datafolha

O Datafolha não fez pesquisa em setembro de 2020. Mas os números de agosto e dezembro do ano passado também mostram o melhor desempenho do presidente desde o início do mandato. Em ambas as pesquisas, ele teve 37% de ótimo e bom. Ruim e péssimo eram 34% em agosto e 32% no final do ano.

Desde então, os números pioraram. Nos dois últimos levantamentos, em maio e julho de 2021, o Datafolha mostrou os piores resultados de ótimo e bom para o presidente desde o início da gestão, com 24%. A reprovação a Bolsonaro (ruim ou péssimo) também teve os índices mais altos: 45% em maio e 51% em julho.

PoderData

Pesquisa do PoderData, empresa de pesquisas do Poder 360, aponta o melhor momento para o presidente no último ano entre 12 e 14 de outubro de 2020, quando o percentual de ótimo e bom do governo bateu seu auge, em 40%. Em setembro, mês em que a pesquisa do Ibope foi realizada, a empresa fez três pesquisas. O governo aparece com 39% de ótimo e bom no levantamento entre 31 de agosto e 2 de setembro. Depois, marcou 38% nas duas pesquisas feitas nos períodos de 14 a 16 e de 28 a 30 de setembro.

O instituto também mostra que houve uma redução na aprovação do governo e um aumento da rejeição desde então. O menor índice de ótimo e bom foi registrado entre 15 e 17 de março de 2021: 24%. O maior percentual de rejeição (ruim e péssimo), porém, aparece no último levantamento, feito entre 19 e 21 de julho deste ano: 56%.

Ipespe

O Ipespe realiza pesquisa em parceria com a XP Investimentos. Na série histórica do instituto, os meses em que Bolsonaro teve o melhor resultado de ótimo e bom para seu governo foram em janeiro e fevereiro de 2019, logo no início do mandato, ambos com 40%. Mas, o instituto também aponta o período entre setembro e outubro de 2020 como muito favorável para o presidente. Nos dois levantamentos feitos nesses meses, ele aparece com 39% de ótimo e bom, ante 36% (set) e 31% (out) de ruim e péssimo.

O levantamento mais recente, de julho de 2021, mostra o pior resultado para o presidente da série histórica do Ipespe. Ele aparece com 52% de ruim e péssimo (valor mais alto) e com apenas 21% de ótimo e bom (valor mais baixo).

Ipec

O Ipec é o instituto formado pela equipe que dirigia o Ibope. Por ter surgido após a extinção do Ibope, não tem dados anteriores a 2021. Mas, neste ano, o Ipec já fez duas pesquisas de avaliação do governo. Na primeira, em fevereiro, Bolsonaro tinha 39% de ruim e péssimo, contra 28% de ótimo e bom e outros 31% de regular.

Na mais recente, de junho, o ruim e péssimo cresceu para 49%, enquanto ótimo e bom recuou para 24% e o regular ficou em 26%.

Por que investigamos?

Em sua quarta fase, o Comprova verifica conteúdos suspeitos sobre políticas públicas e pandemia de covid-19 que tenham atingido alto grau de viralização. Em julho de 2021, os participantes decidiram também iniciar a verificação da desinformação envolvendo possíveis candidatos à presidência da República. Desde então, o projeto tem monitorado nomes que vêm sendo incluídos em pesquisas dos principais institutos.

A postagem verificada aqui se encaixa nesse contexto porque ela pode levar o internauta a uma interpretação equivocada do cenário político e eleitoral, com base em uma pesquisa que é real, mas que foi feita para aferir o comportamento do eleitor há quase um ano. A publicação no Instagram teve mais de 34,5 mil curtidas.

É comum a aprovação e a reprovação de governos oscilarem ao longo do tempo, dependendo do contexto político, econômico e social. Por isso, é importante se referir sempre aos levantamentos mais atuais.

O Comprova já mostrou recentemente que uma enquete em um site não indica quem está na frente das pesquisas eleitorais e que é enganoso afirmar que resultado de enquete sobre o voto impresso reflete a opinião da população.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; ou o conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Política

Investigado por: 2021-08-03

Vídeo engana ao atribuir obra no RN apenas à gestão de Bolsonaro

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São enganosas as afirmações feitas por um apoiador do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), em um vídeo publicado no TikTok sobre obras executadas na Reta Tabajara, trecho da Rodovia BR-304, no Rio Grande do Norte. Ele parabeniza a gestão e afirma que governos anteriores nada fizeram no local. A obra, entretanto, teve início na administração de Dilma Rousseff (PT) e continuou no governo de Michel Temer (MDB). Ele ainda faz comparação infundada sobre pavimentos usados nas obras atuais e nas anteriores. Conteúdo semelhante foi compartilhado no Twitter.
  • Conteúdo verificado: Apoiador do governo federal, em vídeo gravado no que seria a Reta Tabajara, na BR-304, no Rio Grande do Norte, elogia uma obra e afirma que “o governo do PT, os governos anteriores, não fizeram nada, só prometeram e não arrumaram nada”. Ele mostra uma estrutura de concreto e elogia o atual ministro de Infraestrutura, Tarcísio de Freitas, e o presidente Jair Bolsonaro.

As obras de duplicação e outros serviços na Reta Tabajara, entre os quilômetros 281 e 308 da Rodovia BR-304, na zona metropolitana de Natal (RN), não são fruto apenas da gestão do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e do atual ministro da Infraestrutura, Tarcísio Gomes de Freitas, conforme afirma apoiador do governo federal em vídeo publicado no TikTok e no Twitter.

Os serviços foram iniciados ainda em 2014, no governo de Dilma Rousseff (PT), e ocorreram também durante a gestão Michel Temer (MDB). As obras se arrastam há sete anos e chegaram a ser paralisadas totalmente por quatro meses pelo Tribunal de Contas da União (TCU) e tendo liberação parcial por quase dois anos até retornar à execução realizada atualmente.

Na publicação, o apoiador também elogia a obra, comparando a estrutura de concreto “mais grossa”, que atribui ao atual governo, ao asfalto do lado, ao qual atribui pior qualidade por ter sido feito por gestões anteriores.

Não foi possível provar de qual governo é cada estrutura porque o Comprova não localizou o ponto exato onde o vídeo foi gravado, contudo, também não se pode afirmar qual pavimento é o mais adequado apenas visualmente. A escolha, inclusive, deve levar em conta tipos de solo, situações climáticas, carga e custos.

A reportagem procurou o responsável pelas publicações, mas não obteve retorno.

Como verificamos?

Como se trata de uma obra em rodovia federal, o ponto de partida foi entrar em contato com o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT) – órgão responsável por intervenções nessas vias – para saber o que foi executado no trecho citado na verificação, o período de realização e os valores aplicados.

O Comprova também pesquisou conteúdos publicados em sites do governo e na imprensa sobre a rodovia, e constatou que a obra foi iniciada no governo Dilma. A informação foi confirmada por meio de consulta ao Painel do Orçamento Federal.

A reportagem tentou identificar o ponto exato da gravação, utilizando de forma combinada as ferramentas InVid e Google Street View, o que não foi possível devido aos ângulos fechados do vídeo e à paisagem com características uniformes ao longo do trecho. Além disso, as imagens captadas pelo serviço do Google são de 2019.

Foram consultadas as engenheiras civis Lidiane Santana Silveira e Fernanda Gadler para falar sobre o material utilizado na pavimentação e explicar a diferença dos pavimentos adotados nas obras da BR-304. A mesma demanda foi solicitada à Associação Brasileira de Cimento Portland (ABCP). Por fim, a equipe fez contato com o autor da postagem, por mensagem enviada no Instagram, uma vez que não havia canal de comunicação aberto nas redes que usou para divulgar o conteúdo verificado. Ele não respondeu até a publicação da verificação.

Verificação

Governos anteriores realizaram obras na Reta Tabajara

O DNIT informou ao Comprova que as obras no trecho conhecido como Reta Tabajara, entre os quilômetros 281 e 308 da BR-304, foram iniciadas em fevereiro de 2014, no governo Dilma, e compreendem terraplenagem, soluções especiais de aterro, drenagem, pavimentação rígida e flexível, restauração de revestimento asfáltico, sinalização vertical e horizontal, obras de arte correntes, obras de arte especiais, obras complementares, iluminação pública, desapropriação e um novo posto da Polícia Rodoviária Federal (PRF).

O órgão afirma que desde quando foram iniciadas existiram “impedimentos construtivos e outros fatores que impediram o bom andamento das obras”, acrescentando ter ocorrido paralisação dos serviços e, consequentemente, a rescisão do contrato da primeira construtora, em dezembro de 2015.

A obra foi retomada em janeiro de 2016, ainda no governo petista, desta vez com a segunda colocada na licitação. De acordo com o DNIT, pouco mais de um ano depois, em abril de 2017, quando Michel Temer era o presidente, os serviços foram novamente suspensos por determinação do TCU, fundamentado por indícios de irregularidades constatados em relatório de auditoria.

Na época, o órgão identificou a apresentação de projeto executivo deficiente, com adoção de pavimento rígido em área de solo mole e utilização de base de brita de custo elevado. O DNIT explica que, em junho de 2019, no governo Bolsonaro, foi aprovada a 2º Revisão de Projetos em Fase de Obras (RPFO) e os serviços suspensos foram liberados para execução, permanecendo as atividades até a presente data.

O departamento informou que a execução da obra é da ordem de 47,67% até o momento. A vigência do contrato é até março de 2022 e o custo da obra atualmente está em R$160,5 milhões, somando os valores pagos às duas empresas que atuaram. A previsão até a entrega é de aplicação de R$ 349 milhões.

Publicações na página do DNIT e na imprensa também comprovam que o trecho recebe obras desde o governo de Dilma, passando pelo governo Temer e tendo continuidade no governo Bolsonaro.

Uma consulta do Comprova ao Painel do Orçamento Federal demonstra que desde 2014 a adequação do trecho rodoviário da BR-304 recebe recursos. Nos últimos sete anos foram empenhados R$ 413.576.446 para as obras, conforme o sistema.

Comparação entre pavimentos é inadequada

No vídeo, o rapaz diz “olha o tamanho desse concreto, irmão” e “olha a grossura disso aqui”, comparando com o outro pavimento por onde os carros passam: “olha a diferença do asfalto aqui, construído na época dos outros governos”.

De acordo com Lidiane Santana Silveira, engenheira civil e pesquisadora colaboradora na Escola Politécnica da USP, a estrutura a que ele se refere no vídeo, elogiando e dizendo ser “mais grossa”, é um tipo de pavimento chamado de pavimento rígido em concreto armado. Já o que ele insinua ser de menor qualidade e construído nos governos anteriores é o pavimento flexível feito com asfalto. Entretanto, o edital de licitação para a contratação de empresas para a execução das obras na Reta Tabajara já previa, em 2013, no governo de Dilma Rousseff, a construção do pavimento rígido em placa de concreto de cimento portland.

A engenheira explicou ao Comprova que o pavimento flexível é o tipo mais comum executado no Brasil e utiliza material asfáltico/betuminoso na camada de revestimento, sendo composto por uma mistura de ligante asfáltico e agregados.

Já o pavimento rígido, menos usado no Brasil por ter um custo maior, utiliza concreto como revestimento, sendo que este concreto pode ser armado (conter armações feitas de barras de aço – vergalhões) ou não (concreto simples ou com outro tipo de reforço, como fibras). “A espessura da camada de revestimento irá depender do dimensionamento do projeto, da carga que será recebida”, explica.

Um documento da CNT (Confederação Nacional de Transporte) traz a informação de que 99% da malha rodoviária brasileira pavimentada é de pavimento flexível. A imagem abaixo traz uma ilustração da diferença entre os dois:

 

Lidiane ressalta que a insinuação feita no vídeo sobre a qualidade do asfalto não leva em conta as características desse tipo de pavimento. “A decisão sobre qual tipo de pavimento deverá ser projetado e executado depende de uma série de fatores, como custo, vida útil, manutenção e tráfego”, afirma.

Uma apresentação feita em um evento realizado pelo Instituto Brasileiro do Concreto (Ibracon) traz um estudo comparativo entre os pavimentos. A conclusão é de que “os dois tipos de pavimentos atendem às características de segurança, de conforto e de economia (manutenção, operação e segurança)” e “num país tão grande e com condições adversas, como os diferentes tipos de solo e situações climáticas, além de cargas que passam pelas estradas de formas diferentes, é muito difícil dar uma única solução”.

Fernanda Gadler, doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Transportes da Escola Politécnica da USP e mestre em Engenharia de Construção Civil pela Universidade Federal do Paraná (UFPR), aponta que comparar uma estrutura de pavimento flexível e uma rígida sem saber dados importantes e particularidades do projeto, como período de projeto, carga a que o pavimento estará submetido, local de aplicação — principalmente no que diz respeito à necessidade e facilidade de manutenção periódica — e até mesmo de limitações orçamentárias, pode gerar conclusões equivocadas.

“Além disso, como não sabemos as espessuras de cada uma das estruturas, essa comparação se torna ainda mais inadequada. O pavimento flexível e o pavimento rígido são duas estruturas muito diferentes, que possuem vantagens e desvantagens, e a adoção de um ou de outro deve levar em conta muitos fatores como necessidade de manutenção, período de projeto, tipo de carga solicitante, investimento inicial disponível, entre outros”, reforça.

Segundo ela, o pavimento de concreto, por exemplo, suporta maiores solicitações de carga sem se deformar, tem maior vida útil com menor necessidade de manutenção periódica, além de boa refletividade devido à cor clara, minimizando a formação de ilhas de calor urbano. No entanto, esse tipo de pavimento tem um custo inicial muito superior ao do pavimento asfáltico e também necessita de uma mão de obra especializada para aplicação.

Sendo assim, ele é indicado para locais onde essas vantagens sejam primordiais, como em vias com altas solicitações de carga de tráfego, em corredores de ônibus — onde as deformações são excessivas — e em praças de pedágio, onde a necessidade de maior frequência de manutenções periódicas, mais comuns no pavimento flexível, pode trazer problemas para a concessionária, como longas filas e prejuízo financeiro.

Fernanda explica que, no caso do pavimento asfáltico, a flexibilidade traz vantagens, além da facilidade de aplicação e do custo inferior. O revestimento asfáltico permite muitas combinações com outros materiais, como borracha de pneus moídos, polímeros e até a reutilização do próprio material fresado das pistas, o que torna esse tipo de material muito versátil.

“A decisão do projetista em adotar uma solução ou outra deve levar em conta muitos fatores e particularidades da obra em questão, sendo que existem aplicações mais apropriadas para pavimento rígido e outras onde o pavimento flexível é mais adequado”, completa.

A ABCP disse ao Comprova que o Brasil possui 6,8 mil quilômetros de vias pavimentadas com concreto, sendo que sua presença duplicou na última década, passando de 2% para 4% da malha viária brasileira. ”No que diz respeito ao pavimento de concreto, houve um barateamento relativo de custos das matérias-primas. Os preços do cimento e do concreto, ao contrário do preço do asfalto, são formados em mercados com maior nível de concorrência entre fabricantes. No caso do cimento, o preço também sofre alguma influência dos preços externos, visto que é possível a importação do produto em grandes lotes”, afirmou por meio de nota.

Segundo a Associação, entre 2007 e 2014, houve um crescimento nos preços do cimento e do concreto em torno de 6% ao ano. No entanto, as quedas de demanda observadas a partir de 2014 levaram a uma acomodação dos preços.

Quem é o autor do vídeo?

Maicon Sulivan é um ativista de direita que nas redes sociais se diz cristão, evangelista, armamentista e “anti-mimimi”. Além disso, se identifica como “Black Power do Bolsonaro”, fazendo menção ao episódio pelo qual o Ministério Público Federal (MPF) e a Defensoria Pública da União (DPU) ajuizaram ação civil pública contra a União e contra o presidente por prática de racismo.

Em 6 de maio, durante uma conversa do presidente com simpatizantes na saída do Palácio do Planalto, ele cumprimenta o apoiador chamando-o de “cabeludo” e fala sobre “piolho” e “barata”, referindo-se ao cabelo black power do homem, que não aparece no vídeo. No mesmo dia, Maicon publicou vídeo no Instagram defendendo o presidente, afirmando se tratar de brincadeira e que processaria uma emissora de televisão por reportagem apontando racismo.

Pouco mais de dois meses depois, em 8 de julho, Bolsonaro convidou Maicon para participar de uma transmissão nas redes sociais. Na ocasião, negou ter sido racista e voltou a associar o cabelo de Maicon a um criadouro de baratas, além de dizer que ele possui piolhos. O presidente declarou se tratar de brincadeira e o apoiador negou ter se sentido ofendido pelo comentário.

Por que investigamos?

Em sua quarta fase, o Comprova verifica conteúdos suspeitos sobre políticas públicas e pandemia de covid-19 que tenham atingido alto grau de viralização. Em julho de 2021, os participantes decidiram também iniciar a verificação da desinformação envolvendo possíveis candidatos à presidência da República. Desde então, o projeto tem monitorado nomes que vêm sendo incluídos em pesquisas dos principais institutos.

É o caso deste conteúdo, considerando que o autor cita Jair Bolsonaro, possível candidato à reeleição, e também refere-se a uma obra pública. E não é a primeira vez que o Comprova verifica publicações enganosas para exaltar o presidente, como o vídeo que ignorava que a transposição do rio São Francisco é obra de diversos governos; ou as postagens que fizeram comparações enganosas sobre o mesmo projeto de transposição; e ainda site que omite que pesquisa com vantagem de Bolsonaro foi feita apenas em Santa Catarina.

O conteúdo verificado teve mais de 5,4 mil curtidas no Twitter e pelo menos 866 retuítes até o dia 3 de agosto e, no TikTok, outras 602 curtidas.

Para o Comprova, enganoso é o conteúdo que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; ou ainda que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Política

Investigado por: 2021-07-30

É falso que Italo Ferreira tenha pedido prisão de Lula na entrega da medalha em Tóquio

  • Falso
Falso
É falso que o surfista brasileiro Italo Ferreira, medalhista de ouro nos Jogos Olímpicos de Tóquio, tenha pedido a prisão do ex-presidente Lula (PT) em uma entrevista ao The New York Times. A assessoria do atleta negou qualquer fala nesse sentido, e o jornal americano não publicou nenhuma matéria com essa declaração.
  • Conteúdo verificado: Postagem no Facebook tem foto do surfista Italo Ferreira e a inscrição “Fico feliz pela medalha mais (sic) fico triste pela corrupção em nosso país. Meu maior prêmio seria ver Lula na cadeia”. Segundo o post, a declaração teria sido dada ao jornal The New York Times.

É falso que o surfista Italo Ferreira, campeão olímpico nos Jogos de Tóquio, tenha pedido a prisão do ex-presidente Lula (PT) em uma entrevista ao jornal The New York Times.

Uma postagem no Facebook, com a foto do medalhista de ouro, atribui a ele uma declaração falsa, que menciona a corrupção no Brasil e o petista, dizendo que a prisão de Lula seria um “prêmio” maior do que a conquista olímpica.

O Comprova procurou a assessoria do atleta, que disse que a frase não foi dita por Italo e que nenhuma publicação do tipo foi feita pelo jornal norte-americano.

O The New York Times mencionou a vitória do surfista em duas matérias publicadas no site, mas nenhuma delas trata de qualquer posicionamento político dele.

Na comemoração da vitória, o surfista fez um símbolo com uma das mãos, que foi entendido por alguns usuários do Twitter como um “L”, em homenagem ao ex-presidente petista. A assessoria de Italo, porém, disse ao Comprova que se trata do número 1.

Nós entramos em contato com o autor da postagem falsa, mas não tivemos resposta até a publicação desta checagem.

Como verificamos?

Primeiramente, entramos em contato com a IF15 Sports, descrita na conta oficial do atleta no Twitter como “o canal oficial do campeão Italo Ferreira”. Tivemos resposta por e-mail.

Buscamos, no Google, pelas palavras-chave “New York Times” e “Italo Ferreira”, e encontramos, além de outras verificações sobre o tema, duas reportagens do jornal americano que mencionam o campeão brasileiro. Procuramos também por entrevistas concedidas por Italo a outros veículos, após a conquista da medalha de ouro.

Por fim, buscamos, no Twitter e outras redes sociais, postagens que relacionam o medalhista olímpico ao ex-presidente Lula, ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido) ou a qualquer outra declaração de cunho político-partidário.

O Comprova ainda entrou em contato com o responsável pela postagem no Facebook, mas não recebeu resposta.

Verificação

Declarações após o título

A assessoria de Italo negou que ele tenha feito qualquer declaração sobre corrupção ou o ex-presidente Lula em entrevista ao The New York Times. “Trata-se de fake news. O atleta não deu essa declaração e nem o NYT fez a publicação”, afirmou

Nas reportagens e vídeos de veículos brasileiros, publicados após a conquista do ouro olímpico, há menção a uma entrevista coletiva e a outras conversas que o atleta teve com jornalistas, mas nenhuma delas menciona qualquer declaração política feita pelo surfista.

Italo Ferreira no NYT

Desde o início das Olimpíadas, há duas matérias do jornal americano The New York Times que citam Italo, ambas publicadas no dia 27 de julho, data da vitória do potiguar no surfe.

A primeira é assinada pelo jornalista John Branch, que reporta as medalhas de ouro de Italo e da americana Carissa Moore. Nela, só há uma fala do surfista brasileiro: “For me, that was a long day. But it was a dream come true.” (“Para mim, foi um dia longo. Mas um sonho virando realidade”, em tradução livre). A publicação americana deu muito mais destaque ao japonês nascido nos Estados Unidos, Kanoa Igarashi, que levou a prata.

A outra matéria em que Italo é citado consiste apenas em um resumo do que aconteceu de mais importante naquele dia nos jogos olímpicos. Não há falas do atleta, apenas a notícia de seu ouro. Nenhuma das duas publicações faz referência a posicionamentos políticos do surfista.

Símbolo em comemoração

No dia da conquista da medalha de ouro, Italo saiu da água, após a prova final, e fez um sinal com a mão, que foi interpretado por várias pessoas na internet como um “L”. A assessoria do atleta, porém, disse ao Comprova que não foi isso. “Ele não fez um L. E sim um sinal de número 1, de comemoração”, afirma.

Foto: Miriam Jeske/COB
Italo Ferreira. Foto: Miriam Jeske/COB

O símbolo do “L”, também é usado por torcedores do Vasco da Gama, em homenagem ao atacante Germán Cano. O jogador costuma comemorar os gols dessa forma, em homenagem ao filho, Lorenzo. O Vasco, inclusive, parabenizou Italo pela conquista da medalha, no Twitter, mencionando a forma de comemoração.

No Twitter de Italo não há qualquer postagem que mencione o ex-presidente Lula ou o presidente Bolsonaro, mas há um tuíte, de janeiro, que relaciona a corrupção nos estados brasileiros à pandemia do novo coronavírus – em discurso parecido com o adotado pelo atual chefe do executivo: “Corrupção nos estados, (sic) mata mais que qualquer vírus. Triste realidade”. 

Por que investigamos?

Em sua quarta fase, o Comprova checa conteúdos suspeitos sobre políticas públicas, eleições e pandemia de covid-19 que tenham atingido alto grau de viralização. Em julho de 2021, os participantes decidiram também iniciar a verificação da desinformação envolvendo possíveis candidatos à presidência da República. Desde então, o projeto tem monitorado nomes que vêm sendo incluídos em pesquisas dos principais institutos.

É o caso deste conteúdo, que alega que um atleta campeão olímpico teria se posicionado contra o pré-candidato Lula em meio à realização dos Jogos Olímpicos, que recebem a atenção dos brasileiros no momento. O Comprova já checou outras publicações nesse mesmo sentido, como uma postagem falsa que afirmava que a trilha sonora usada por Rebeca Andrade, ginasta medalhista de prata, era uma homenagem a Bolsonaro; e o tuíte enganoso que dizia que o presidente vai acabar com o programa Bolsa-Atleta.

A postagem soma quase 10 mil curtidas e 2,7 mil compartilhamentos até 30 de julho apenas no Facebook. Também verificaram o conteúdo as publicações Aos Fatos, Lupa, Boatos.org e E-Farsas.

Falso, para o Comprova, é conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.

Eleições

Investigado por: 2021-07-29

Frase de Cármen Lúcia de 2018 é tirada de contexto para afirmar que Lula não poderá se candidatar em 2022

  • Enganoso
Enganoso
Montagem engana ao trazer parte de uma frase dita pela ministra do STF (Supremo Tribunal Federal) Cármen Lúcia, em 2018, sobre a Lei da Ficha Limpa, e descontextualiza ao indicar que o ex-presidente Lula (PT) não poderia ser candidato em 2022.
  • Conteúdo verificado: Montagem que está circulando no Facebook traz uma foto da ministra Cármen Lúcia e uma suposta fala dela: “Lei não permite registro de candidato condenado em segunda instância” junto com a frase “Lula não será candidato!”.

Montagem engana ao descontextualizar frase dita pela ministra do Supremo Tribunal Federal (STF) Cármen Lúcia em 2018, quando ela se referia à Lei Complementar 135/2010, conhecida como Lei da Ficha Limpa. Na época, o ex-presidente Lula (PT) estava preso depois de ser condenado em segunda instância na Operação Lava Jato.

No entanto, atualmente, Lula é considerado elegível para 2022. As condenações do ex-presidente no âmbito da Lava Jato foram anuladas pelo ministro Edson Fachin em 8 de março deste ano. Na decisão monocrática, o ministro entendeu que a 13ª Vara Federal de Curitiba não tinha competência para julgar o ex-presidente.

No dia 15 de abril, por oito votos a três, o plenário da Suprema Corte manteve a anulação das condenações. Cármen Lúcia votou pela anulação. Portanto, o ex-presidente se tornou elegível novamente. O petista lidera a corrida presidencial com 46%, segundo a pesquisa mais recente feita pelo instituto Datafolha.

Como verificamos?

O Comprova consultou os processos que envolvem o ex-presidente Lula, notícias relacionadas e comunicados oficiais do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), STF e Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4). Procurou o advogado de Lula, Cristiano Zanin Martins, e a advogada Marilda Silveira, especialista em Direito Eleitoral.

Além disso, tentamos contato com a autora do conteúdo enganoso e com a assessoria de imprensa do STF, mas não tivemos uma resposta.

Verificação

Frase de Cármen Lúcia é de 2018

A frase citada pelo conteúdo que viralizou é real, mas ocorreu em outro contexto. Ela foi proferida por Cármen Lúcia em 29 de maio de 2018. Na época, Lula estava preso depois de ser condenado em segunda instância na Operação Lava Jato.

A frase completa da ministra foi: “O direito brasileiro não permite que haja, pela Lei da Ficha Limpa, o registro válido daquele que tenha sido condenado a partir de um órgão colegiado. Juridicamente, é isso que se tem no Brasil”.

Cármen Lúcia se referia à Lei Complementar 135/2010, conhecida como Lei da Ficha Limpa, que proíbe a candidatura daqueles “condenados, em decisão transitada em julgado ou proferida por órgão judicial colegiado”, por uma série de crimes, entre os quais os cometidos contra a administração pública. O impedimento vale “desde a condenação até o transcurso do prazo de 8 (oito) anos após o cumprimento da pena”. A legislação foi sancionada pelo próprio Lula, quando presidente, em 4 de junho de 2010.

A declaração da ministra ocorreu durante um evento da revista Veja, chamado Amarelas ao Vivo. A ideia era fazer, com plateia, uma entrevista similar às que são publicadas na seção “Páginas amarelas” do veículo impresso. Além de Cármen Lúcia, naquela edição foram entrevistadas outras dez pessoas, entre as quais o historiador Leandro Karnal e o youtuber Iberê Thenório.

Em razão da greve dos caminhoneiros, a ministra não esteve presencialmente no auditório do evento, mas falou por videochamada. A revista registrou a frase dela quando questionada sobre a candidatura de Lula no mesmo dia em que a entrevista foi realizada.

O Comprova procurou a assessoria de imprensa do STF, mas o órgão não retornou até a publicação da matéria.

Lula se mantém elegível

A primeira condenação de Lula no âmbito da Lava Jato ocorreu em 12 de julho de 2017. O ex-juiz Sérgio Moro decretou a sentença de nove anos e seis meses de prisão no caso em que ele era acusado de ter recebido benesses de uma construtora em um apartamento triplex no Guarujá. O ex-presidente nega ser proprietário do imóvel. No dia 24 de janeiro de 2018, o TRF-4 confirmou, por unanimidade, a condenação e aumentou a pena para 12 anos e um mês de reclusão.

Como o TRF-4 é um órgão colegiado, o TSE indeferiu o registro de candidatura de Lula a presidente da República no dia 1º de setembro de 2018. Ele estava preso desde o dia 7 de abril daquele ano em uma cela especial na Superintendência da Polícia Federal em Curitiba.

Em 6 de fevereiro de 2019, o ex-presidente foi condenado uma segunda vez, pela juíza federal Gabriela Hardt, a 12 anos e 11 meses de prisão por supostamente receber propinas através de um sítio em Atibaia, no interior de São Paulo. O petista também afirma não ser dono do imóvel. Novamente, o TRF-4 manteve a condenação e aumentou a pena de Lula, desta vez para 17 anos, um mês e dez dias, em 27 de novembro de 2019.

Poucas semanas antes, em 8 de novembro, Lula havia deixado o cárcere. Ele se beneficiou do fato de o STF ter mudado seu entendimento e passado a determinar que o cumprimento da pena deve começar apenas após o trânsito em julgado do processo, momento em que se esgotam todas as possibilidades de recursos.

As condenações do ex-presidente no âmbito da Lava Jato foram anuladas pelo ministro Edson Fachin em 8 de março deste ano. Na decisão monocrática, o ministro entendeu que a 13ª Vara Federal de Curitiba não tinha competência para julgá-lo.

A decisão foi remetida para o plenário do STF quatro dias depois, para que a Corte desse uma decisão unânime sobre o caso. No dia 15 de abril, por oito votos a três, o plenário da Suprema Corte manteve a anulação das condenações de Lula. Cármen Lúcia votou pela anulação.

Com isso, o ex-presidente se tornou elegível novamente. O petista lidera a corrida presidencial com 46%, segundo a pesquisa mais recente feita pelo instituto Datafolha.

Processos abertos contra Lula

O ex-presidente já foi alvo de 18 procedimentos na Justiça. Destes, três processos ainda estão abertos, quatro foram anulados pelo STF e enviados para serem julgados novamente no Distrito Federal, como explicitado anteriormente, e dos 11 restantes, em quatro ele foi absolvido, em três a denúncia foi rejeitada, três foram arquivados e um foi trancado pelo TRF-1.

As três ações abertas na Justiça Federal ainda estão em primeira instância e não há sentença. Os processos podem ser consultados pelo sistema PJE:

Procurado pelo Comprova, o advogado de Lula, Cristiano Zanin Martins, disse, por meio de assessoria de imprensa, que os casos dos caças Gripen e do BNDES na Angola estão com petições pendentes de análise na Justiça Federal de Brasília.

“Nessas petições mostramos que os processos estão utilizando de forma ampla o material produzido pela Lava Jato de Curitiba, que foram declarados nulos, de forma irremediável, pelo STF. O caso da ‘Guiné’ está na mesma situação e o TRF-3 suspendeu a marcha processual até o exame final pela Turma Julgadora”, explicou.

Segundo ele, os quatro da “Lava Jato de Curitiba” sequer configuram processos atualmente. “Não há ainda acusações recebidas pela Justiça”, afirmou.

Lula é considerado elegível atualmente. Os três processos em aberto, assim como os quatro anulados pelo STF, teriam que ser julgados em segunda instância e Lula ser condenado para afetar a candidatura do ex-presidente em 2022.

De acordo com Marilda Silveira, especialista em Direito Eleitoral e ex-assessora Jurídica de Ministros e da Presidência do TSE, como esses sete processos criminais encontram-se em primeira instância, a não ser que tenham decisão e a parte perca o prazo de recurso, não interferem em nada na elegibilidade.

“Para que decorra inelegibilidade destes sete processos, seria preciso que houvesse condenação do órgão colegiado do TRF, mantendo sentença condenatória ou afastando absolvição, em um dos crimes dolosos listados no artigo 1, inciso I, alínea e da LC 64/90, com pena superior a 2 anos”, explica.

A LC 64/90, citada por Marilda, teve alguns trechos alterados pela Lei da Ficha Limpa, que proíbe a candidatura daqueles “condenados, em decisão transitada em julgado ou proferida por órgão judicial colegiado”, por uma série de crimes, como de lavagem e ocultação de bens.

Dessa forma, segundo ela, é muito difícil dizer se Lula poderá se tornar inelegível novamente porque depende de uma série de fatores como tempo do judiciário, dos recursos das partes, do que está prescrito, das provas a produzir, etc. “O fato é que uma decisão condenatória atrativa da inelegibilidade – pela jurisprudência atual – teria que existir até a diplomação em dezembro de 2022 ou até a decisão definitiva do registro de candidatura, que é antes”, comenta.

Quem é a autora?

O perfil @lidice.nascimento.98, que postou o conteúdo, foi procurado via Facebook, mas não respondeu às tentativas de contato. Na rede social, ela se descreve como estudante de direito, armamentista, patriota, cristã, conservadora, bolsonarista e de ultradireita. Na imagem de capa do perfil, ela publicou uma montagem com fotos de dois caixões com bonecos representando os ex-presidentes petistas Lula e Dilma Rousseff, além da expressão “Bolsonaro 2022”.

Por que investigamos?

Atualmente em sua quarta fase, o Comprova verifica conteúdos suspeitos sobre políticas públicas do governo federal, eleições e a pandemia de covid-19 que tenham viralizado nas redes sociais. Em julho de 2021, os participantes decidiram também iniciar a verificação da desinformação envolvendo possíveis candidatos à presidência da República. Desde então, o projeto tem monitorado nomes que vêm sendo incluídos em pesquisas dos principais institutos. É o caso dessa verificação que menciona pré-candidato que tem liderado as pesquisas.

A publicação verificada aqui teve mais de 13,5 mil interações no Facebook.

O mesmo conteúdo foi checado pelo Estadão Verifica, que o considerou fora de contexto, e pelo Aos Fatos, que o classificou como distorcido.

Recentemente, o Comprova mostrou que vídeo que circulou nas redes sociais não é de fazenda de filho de Lula e mostra ovelhas, não bois; que outro vídeo não prova que houve fraude nas eleições de 2014; e que a Constituição brasileira não permite a revogação de mandato político por assinatura.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; ou ainda, aquele que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Saúde

Investigado por: 2021-07-29

Site engana ao afirmar que Anvisa ‘confessa ineficácia de máscaras’ contra a covid

  • Enganoso
Enganoso
É enganosa a publicação em um site conservador brasileiro afirmando que “Anvisa confessa ineficácia de máscaras e diz se basear apenas na OMS”. O texto se baseou em um ofício do órgão que trata de máscaras de tecido e que foi descontextualizado. Além disso, publicações da agência utilizam outras fontes, além da OMS, como referência desde o início da pandemia do novo coronavírus.
  • Conteúdo verificado: Texto em site afirma que a Anvisa confessou ineficácia de máscaras e disse se basear apenas na OMS para recomendar o equipamento, sem levar a ciência em conta.

É enganoso que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) tenha “confessado” que máscaras sejam ineficazes para a proteção contra a covid-19, segundo afirma o título e o subtítulo de texto publicado em um site conservador brasileiro e fechado para não assinantes, que foi compartilhado em redes sociais. Outro artigo, veiculado no dia seguinte e sem bloqueio, muda levemente o tom, afirmando que a Anvisa confessou falta de evidências de eficácia de máscaras.

No Twitter, onde o link postado teve grande interação, pessoas comentaram a postagem fazendo coro à afirmação que consta no título e concordando com ela. Como o conteúdo é liberado apenas para assinantes, muitos usuários da rede social não tiveram acesso ao texto completo.

Em ofício utilizado como base para o conteúdo, a chefe de gabinete da agência, Karin Schuck Hemesath Mendes, afirma ter sido mantida, em nota técnica do órgão, a recomendação para o uso da proteção “apesar de não existir evidências robustas sobre a eficácia do uso de máscaras de tecido como controle de fonte para a transmissão da covid-19”.

O documento diz, ainda, que a recomendação é baseada no princípio da precaução e alinhada com as orientações da Organização Mundial da Saúde (OMS).

O ofício trata apenas de máscaras de tecido e em nenhum momento a funcionária da Anvisa diz que elas são ineficazes. O título do texto verificado, entretanto, não faz essa identificação dos equipamentos e leva à interpretação de que nenhum deles protege contra o vírus.

Diversos documentos consultados pelo Comprova demonstram que a Anvisa recomenda a utilização das máscaras para a proteção desde 2020, assim como estudos, médicos e outros órgãos de saúde. A agência também utiliza outras fontes, além da OMS, para as orientações.

A reportagem entrou em contato com o site que publicou o conteúdo e a equipe afirmou ter construído o título de forma a resumir o conteúdo da publicação e chamar a atenção, alegando ser impossível inserir nele todas as informações do texto. Justificou, ainda, que o trecho do ofício em que se baseou está na abertura e que o parágrafo seguinte esclarece que se tratam de máscaras de pano.

Como verificamos?

O Comprova acessou e leu o ofício citado no conteúdo publicado no site. Em seguida, consultou diversas publicações da Anvisa desde o início da pandemia do novo coronavírus e entrou em contato com o órgão, por e-mail.

Também consultou estudos relacionados ao uso de máscaras na proteção contra a covid-19 e entrevistou o clínico geral Vitor Key Assada, que atende na linha de frente contra a covid-19 no Hospital Santa Casa de Londrina.

Por fim, entrou em contato com os responsáveis pela publicação verificada.

O Comprova fez esta verificação baseada em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 29 de julho de 2021.

Verificação

Anvisa não “confessa a ineficácia de máscaras” contra a covid-19

O texto publicado afirma que a Anvisa confessou a ineficácia de máscaras e que se baseia apenas na OMS, não levando em conta a ciência para recomendar o uso do equipamento. O conteúdo foi baseado em um ofício assinado por Karin Schuck Hemesath Mendes, chefe de gabinete da Anvisa, no dia 7 de abril de 2021, em resposta a questionamentos do defensor público federal João Frederico Bertran Wirth Chaibub, que atua em Goiânia (GO).

No documento, ela esclarece que as orientações para prevenção e controle da disseminação de doenças na população em geral, incluindo a recomendação do uso de máscara facial de tecido, competem ao Ministério da Saúde e que cabe à Gerência Geral de Tecnologia em Serviços de Saúde (GGTES) da Anvisa emitir orientações sobre prevenção e controle da disseminação da covid-19 apenas dentro dos serviços de saúde.

Destaca, ainda, que para este público o órgão atualiza frequentemente notas técnicas levando em consideração a situação epidemiológica do país e a disponibilização de novas evidências nacionais e internacionais.

Neste contexto, a chefe de gabinete afirma que “apesar de não existir evidências robustas sobre a eficácia do uso de máscaras de tecido como controle de fonte para a transmissão da covid-19, considerando o cenário epidemiológico atual, com vasta disseminação do vírus, incluindo cepas com tendência de maior transmissibilidade e virulência, pelo princípio da precaução e alinhado com as orientações da Organização Mundial da Saúde, a GGTES manteve na última atualização da nota técnica Nº 04/2020 (25/02/2021), a orientação para o uso de máscara de tecido para o controle de fonte por: pacientes, acompanhantes e visitantes (se estiverem assintomáticos) e profissionais do serviço de saúde que executam atividades exclusivamente administrativas e não tem nenhum contato com pacientes ou áreas de internação de pacientes”.

O ofício, entretanto, trata apenas de máscaras de tecido e, em nenhum momento, Karin diz que elas são ineficazes, ao contrário do que afirma um segundo texto publicado no site, que só cita se tratar de máscaras de tecido quando reproduz literalmente, entre aspas, trechos do documento.

Procurada pelo Comprova, a assessoria de comunicação da agência encaminhou posicionamento afirmando que o trecho sobre não existirem “evidências robustas” foi retirado de contexto. “O fragmento deve ser lido à luz do conhecimento científico produzido no transcorrer do enfrentamento à pandemia no Brasil e no mundo”, diz a nota. O Comprova verificou que, por não terem padronização na fabricação, a eficácia de máscaras de tecido varia. Já outros modelos, como o cirúrgico e o PFF2, têm eficácia comprovada em impedir a transmissão.

A agência acrescenta que a nota técnica a que se refere o ofício elenca entre as medidas de prevenção e controle de novos casos de infecção pelo Sars-CoV-2 o uso de máscaras adequadas pelos profissionais que atuam nos serviços de saúde. “Com o avanço da pandemia e considerando o acúmulo de evidências sobre a transmissão do novo coronavírus, a Anvisa vem implementando diversas atualizações em suas publicações. Em todas elas o uso de máscaras faciais adequadas às necessidades e aos profissionais de saúde foi reforçado”, afirma.

Assim como consta no ofício, a assessoria de comunicação afirma que as definições sobre o uso de máscaras pela população devem partir do Ministério da Saúde, mas explicou que a agência elaborou diversas orientações sobre máscaras faciais para uso não profissional com a finalidade de apoiar as ações para a saúde pública.

“Máscaras faciais não hospitalares não oferecem total proteção contra infecções, mas reduzem sua incidência. Especialistas apontam que mesmo pequenas medidas para reduzir transmissões têm grande impacto na atual pandemia, especialmente quando combinadas com medidas preventivas adicionais. Por esse motivo, a Agência sempre reforçou que máscaras de tecido íntegras, limpas, secas e usadas de forma correta são eficazes para evitar que gotículas contaminadas sejam expelidas sobre produtos, equipamentos e outras pessoas”.

O vírus pode se espalhar pela boca ou nariz de uma pessoa infectada, ao tossir, espirrar, falar, cantar ou respirar, por gotículas respiratórias maiores e aerossóis menores. A evidência atual sugere que a doença se espalha principalmente entre pessoas que estão em contato próximo umas com as outras, normalmente dentro de um metro. Uma pessoa pode ser infectada quando aerossóis ou gotículas contendo o vírus são inalados ou entram em contato direto com os olhos, nariz ou boca.

O que a Anvisa diz sobre o uso de máscaras?

Em janeiro deste ano, a Anvisa publicou um longo material em texto esclarecendo dúvidas sobre o uso de máscaras faciais e alertando as pessoas para que não se deixem “enganar pelas fake news”. O conteúdo, em formato de perguntas e respostas, explica, por exemplo, quais são os diferentes tipos de máscaras, para que servem e quais tipos de equipamentos têm sido utilizados pela população e pelos profissionais de saúde.

Em uma questão específica, afirma que as máscaras de proteção de uso não profissional são aquelas confeccionadas artesanalmente com tecidos e utilizadas para cobrir o nariz e a boca em espaços públicos durante a pandemia. “Essas máscaras atuam como barreiras físicas, reduzindo a propagação do vírus e, consequentemente, a exposição e o risco de infecções”, diz o texto.

Em seguida, o material educativo destaca que a utilização é uma importante medida de saúde pública que as pessoas devem adotar no combate à covid-19, além do distanciamento social e da limpeza frequente das mãos.

Em março deste ano, o órgão também publicou um documento de perguntas e respostas sobre o uso de máscaras de proteção facial em aeroportos e aeronaves, esclarecendo quais os tipos permitidos nesses locais, como usá-las e em quais situações é permitido retirá-las.

Em maio, uma nota técnica atualizou as medidas sanitárias a serem adotadas em portos e embarcações para resposta à Emergência de Saúde Pública de Importância Nacional (ESPIN) e Internacional (ESPII) pelo novo coronavírus, também reforçando a obrigatoriedade do uso das máscaras. “Entre as exigências aos viajantes, a Anvisa determinou que as máscaras de tecido confeccionadas artesanal ou industrialmente com material como algodão e tricoline devem possuir mais de uma camada de proteção e ajuste adequado ao rosto”, disse o órgão em nota encaminhada ao Comprova.

No início da pandemia no Brasil, em abril de 2020, a Anvisa já havia lançado uma cartilha com as orientações gerais relacionadas às máscaras faciais de uso não profissional. Nas referências, consta que o órgão se baseou em orientações do Centers for Disease Control and Prevention (CDC) – o Centro de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos; da Association Française de Normalisation (AFNOR) – conjunto de normas francesas, como a ABNT no Brasil; da National Center for Biotechnology Information (NBCI) – que é o Centro Nacional de Informação Biotecnológica, uma seção da Biblioteca Nacional de Medicina dos Estados Unidos; em artigos científicos, entre outras.

Na ocasião, a OMS somente foi citada com a recomendação de que se respeitasse a distância entre as pessoas preconizada pela entidade e pelo Ministério da Saúde.

No dia 23 de julho de 2021, há menos de uma semana, a Anvisa publicou uma revisão da nota técnica nº 07/2020 com orientações para prevenção e vigilância epidemiológica das infecções por Sars-CoV-2 dentro dos serviços de saúde. Nela, o órgão destaca que a vacinação protege o indivíduo de infecção ou da forma grave da infecção, mas esta proteção não é absoluta e que estudos mais recentes relatam eficácia reduzida das vacinas contra a infecção por variantes do vírus.

Desta forma, o órgão orienta que mesmo o profissional do serviço de saúde totalmente vacinado – que recebeu a segunda dose em uma série de duas doses há mais de duas semanas ou uma dose de uma vacina de dose única há mais de duas semanas – deve continuar a usar os equipamentos de proteção individual, incluindo a máscara.

O texto também distribui orientações para pacientes, acompanhantes e visitantes, destacando que pessoas assintomáticas devem fazer uso de máscara de tecido e sintomáticas de máscara cirúrgica durante toda a permanência no serviço de saúde.

“Ressalta-se que por ainda estarmos com elevada transmissão comunitária do Sars-CoV-2 e que a vacinação não reduz 100% a possibilidade de infecção por esse vírus, todos dentro do serviços de saúde (profissionais, pacientes, visitantes e acompanhantes) devem continuar utilizando máscara facial como controle de fonte, independente de já estarem vacinados contra covid-19 ou não”, diz a nota técnica.

Conforme a Anvisa informou ao Comprova, nos primeiros meses da pandemia, diante de um possível cenário de desabastecimento de máscaras profissionais no mercado nacional, que poderia atingir trabalhadores que atuam na linha de frente com pacientes com covid-19, o órgão publicou material com orientações sobre confecção e uso de máscaras artesanais. “O objetivo era estimular a população a buscar uma solução de baixo custo e de mais fácil acesso para reforçar a proteção”.

A agência também lembra que, embora o uso de máscara de proteção facial seja uma medida fundamental no combate à propagação do novo coronavírus, para que haja prevenção efetiva o equipamento precisa fazer parte de um conjunto de medidas que inclui distanciamento social e higiene das mãos com água e sabonete ou preparações alcoólicas. Além disso, é necessário evitar aglomerações e permanecer em locais limpos e bem ventilados.

Estudos comprovam a eficácia do equipamento de proteção

Estudos científicos comprovam a eficácia das máscaras na proteção contra a contaminação pelo novo coronavírus. Em maio deste ano, por exemplo, a Agência Brasil publicou o resultado de um estudo conduzido por pesquisadores do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (USP) e do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen), que constatou que máscaras de algodão, as mais comumente usadas pela população na prevenção da covid-19, têm eficiência de filtração de 20% a 60%. A pesquisa foi publicada na revista Aerosol Science & Technology e analisou 300 máscaras usadas pela população brasileira.

Em abril de 2020, uma reportagem do UOL já citava outra pesquisa científica que atestou a eficácia de máscaras cirúrgicas contra a disseminação do coronavírus. O estudo publicado na revista Nature Medicine comprovou que o aparato reduz a quantidade do agente infeccioso no ar expirado por pessoas contaminadas com coronavírus sazonais, que integram a família do Sars-CoV-2, causador da pandemia, ou com o vírus da influenza, que provoca a gripe.

Em 5 de julho de 2021, especialistas em medicina, baseados em evidências científicas, divulgaram a carta “Choosing Wisely” na revista Nature Medicine, com 10 dicas para enfrentamento da covid-19. Dentre elas, a primeira é usar máscaras sempre que estiver em público. De acordo com os especialistas, uma revisão sistemática e meta-análise de 10 estudos observacionais ajustados e 29 não ajustados mostraram que o risco de infecção foi significativamente reduzido com o uso de máscaras faciais. As máscaras N95 (PFF2 no Brasil) foram citadas como as que mais protegem.

Em março deste ano, no momento mais grave da pandemia no Brasil, a Associação Médica Brasileira chegou a divulgar carta pedindo vacinas, isolamento e uso de máscaras para combater pandemia: “Nosso diagnóstico é de que apenas a obediência às regras de proteção – como confinamento, uso de máscara e outras –, as iniciativas contínuas de testagem e rastreio de contactantes, juntamente com a vacinação em larga escala, são capazes de oferecer melhor prognóstico à população brasileira”.

Em dezembro de 2020, um ano após o início da pandemia, o diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, gravou uma mensagem na qual afirmava que a vacinação de todos contra a covid-19 levaria tempo e a população deveria “continuar a aderir às medidas testadas e comprovadas que mantêm todos e cada um de nós seguros”, o que significa, destacou, “manter distância física, usar máscaras faciais, praticar a higiene das mãos e respiratória, evitar locais fechados lotados e encontrar pessoas em ambientes abertos”.

Em junho deste ano, Mariângela Simão, diretora-geral assistente da OMS, elogiou a produção de vacinas no Brasil, mas destacou que a vacinação por si só não é suficiente no país e reforçou a importância do uso da máscara. “Eu sei que há uma controvérsia recente no Brasil sobre o uso consistente de máscaras. Continua sendo uma orientação da OMS o uso consistente de máscaras onde não há possibilidade de distanciamento social, a higienização das mãos, etiqueta respiratória, ambientes ventilados, evitar aglomerações”, afirmou.

A Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), braço da OMS nas Américas, mantém uma folha informativa sobre a covid-19 com as orientações das duas entidades sobre o uso de máscaras, afirmando que as evidências científicas mais recentes mostram que elas são uma medida fundamental para suprimir a transmissão da doença e salvar vidas. O texto orienta a utilização das máscaras de tecido, especificamente, pelo público em geral com idade inferior a 60 anos e que não apresente problemas de saúde subjacentes.

Tipos de máscara e a eficácia

O Comprova entrevistou o clínico geral Vitor Key Assada, que atende na linha de frente contra a covid-19 no Hospital Santa Casa de Londrina. O profissional ressaltou a importância do uso das máscaras para evitar a propagação do vírus. “Essas postagens afirmando que [as máscaras] são ineficazes são completamente errôneas. São várias publicações desde o início da pandemia que confirmam a eficácia do uso das máscaras. Quando a gente coloca a máscara, entendemos subjetivamente que estamos nos protegendo, que vamos colocar a máscara para não nos contaminar, mas não é só isso. Muitos artigos evidenciam o quanto a máscara, principalmente para os assintomáticos, ajuda a não transmitir o vírus para outras pessoas”, esclarece.

Ele destaca a existência de três modelos principais de máscara: as de pano, as cirúrgicas e aquelas com modelos “bico de pato”, como N95 e PFF2. As duas últimas, afirma, são as mais recomendadas para quem está em ambientes com alta carga viral, como hospitais, apresentando eficácia maior que 90%.

Quanto às máscaras de tecido, ele observa haver alguns problemas. “Não quer dizer que todas são ineficazes, mas não há um padrão. Por mais que a OMS cite que elas devem ter pelo menos dois tecidos, que seriam as camadas da máscara, sabemos que as empresas estão mais ligadas em estética e conforto do que propriamente na filtragem das partículas. Os estudos apontam uma variabilidade de eficácia muito grande de proteção [das máscaras de tecido], justamente porque não há controle de qualidade”.

Em relação às cirúrgicas, afirma que possuem proteção de 80% para cima. “Obviamente, cada uma delas tem um período de uso, ou seja, você tem que estar trocando elas e conservá-las. Tudo isso pode afetar diretamente a eficácia das máscaras”.

Por fim, o profissional opina pela manutenção do uso das máscaras mesmo diante do avanço da vacinação. “Como sabemos, a vacina por si só não significa que estamos acabando com a doença de uma hora para outra, ainda mais que nenhuma vacina tem proteção de 100%. Não dá para falar: olha, temos 70% da população vacinada, abre a porteira, todo mundo está livre do uso de máscara. Eu acho que não é por aí. Acho que é muito importante continuar usando a máscara mesmo com o avanço da vacinação. A vacina não significa que não podemos pegar e nem transmitir para quem não foi vacinado”.

Quem publicou o texto

O texto com título e subtítulo enganosos foi publicado no site Brasil sem Medo, que se identifica como “o maior jornal conservador do Brasil” e tem, entre os colunistas, o escritor bolsonarista Olavo de Carvalho.

Procurada, a equipe do site afirmou que “o título é construído de forma a resumir o conteúdo da publicação e, também, chamar a atenção, sendo impossível inserir nele todas as informações do texto”, acrescentando que aqueles que leram a matéria completa “sabem que esse trecho do ofício está no próprio lead e que, no parágrafo seguinte, também é esclarecido que se tratam de máscaras de pano, que são as utilizadas pela maior parte da população”.

Declarou, também, que a intenção do site ao publicar o texto foi “informar a população sobre um aspecto importante da pandemia, que é a possível ineficácia das máscaras de pano”, acrescentando que a imprensa tradicional não o faz “por razões ideológicas e financeiras”.

Dentre os colunistas do site também está Bernardo P. Kuster, que se apresenta como jornalista, palestrante, tradutor e diretor de opinião do Brasil sem Medo. O link com o conteúdo que ele compartilhou nas próprias redes sociais gerou, apenas no Twitter, 6.892 interações. Ele foi procurado, mas não respondeu.

No Instagram, ele teve o conteúdo publicado no dia 26 de julho removido sob alegação, por parte da plataforma, de ir contra as diretrizes da comunidade. No dia seguinte, 27 de julho, foi publicado novo artigo sobre o assunto no site, desta vez liberado para a leitura de não assinantes, acusando o Instagram de censura. O site ainda aproveitou o teor postado em uma coluna que faz “giro de notícias”.

Por que investigamos?

Em sua quarta fase, o Comprova checa conteúdos suspeitos sobre políticas públicas, eleições e pandemia que tenham atingido alto grau de viralização. Em julho de 2021, os participantes decidiram também iniciar a verificação da desinformação envolvendo possíveis candidatos à presidência da República. Desde então, o projeto tem monitorado nomes que vêm sendo incluídos em pesquisas dos principais institutos.

O compartilhamento da primeira publicação aqui verificada teve 8.822 interações apenas no Twitter, segundo a ferramenta CrowdTangle. Uma conta do Instagram que postou o print da coluna do site onde foi utilizado o teor do texto somou mais de 700 curtidas na plataforma.

O uso de máscaras faciais é apontado como uma das medidas de prevenção à covid-19, sendo incentivado pela Organização Mundial da Saúde desde o ano passado, somado a outras ações, como a higienização frequente das mãos e o distanciamento social.

Enquanto não há medicamentos eficazes contra o vírus e sem a cobertura vacinal adequada, esta segue sendo a recomendação, principalmente no Brasil, onde já foram registradas mais de 550 mil mortes pela doença. O país tem hoje pouco mais de 38,04 milhões de pessoas completamente vacinadas, o que equivale a 18,6% da população brasileira.

Desde o ano passado, o uso de máscaras faciais têm sido alvo de afirmações falsas ou enganosas. O Comprova já verificou, por exemplo, que um estudo não comprova a ineficácia do uso do equipamento; que as máscaras são eficientes no combate ao novo coronavírus; que o uso correto delas reduz as chances de contaminação e não torna o sangue ácido; e que as elas não causam acúmulo de líquido nos pulmões, tampouco intoxicação.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; bem como aquele que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

 

Política

Investigado por: 2021-07-29

É enganoso o tuíte que acusa Bolsonaro de acabar com o Bolsa Atleta

  • Enganoso
Enganoso
É enganosa postagem que aponta para o fim do programa Bolsa Atleta no governo Bolsonaro em 2020. No ano passado, não foi lançado edital para seleção de novos atletas para receber o benefício – segundo o governo, por conta da pandemia –, mas o programa está vigente. Tanto que a mesma postagem afirma, corretamente, que 80% dos atletas na Olimpíada usufruíram da bolsa criada na gestão de Lula.
  • Conteúdo verificado: Post publicado no Twitter afirma que o governo Bolsonaro acabou com o Bolsa Atleta e que a maioria dos atletas que estão em Tóquio usufruíram do programa.

É enganosa a postagem sugerindo que o governo de Jair Bolsonaro (sem partido) acabou com o Bolsa Atleta, um programa de apoio à prática esportiva de alto rendimento. No ano passado, não foi lançado o edital para seleção de novos atletas para receber o benefício, porém o auxílio não deixou de existir para quem já havia sido selecionado no programa de 2019. Segundo o governo federal, a decisão de não lançar edital em 2020 se deu por conta da pandemia e da suspensão de campeonatos em decorrência da covid-19.

No mesmo post publicado no Twitter, o autor ressalta, de maneira correta, que 80% dos atletas que participam das Olimpíadas de Tóquio são beneficiados pelo programa, criado em 2004, quando Luiz Inácio Lula da Silva (PT) era o presidente.

O benefício alcança hoje 7.531 atletas em seis categorias, segundo o Ministério da Cidadania, ao qual está vinculada a Secretaria Especial do Esporte e, portanto, o Bolsa Atleta. Do grupo de 302 esportistas convocados para os Jogos Olímpicos no Japão, 242 (80%) são atendidos atualmente pelo programa.

O atual orçamento para o programa é de R$ 145,2 milhões e contempla 7.531 atletas. Dados obtidos através da Lei de Acesso à Informação (LAI) pelo Estadão revelam uma redução de 17% no orçamento total do ciclo olímpico (2017/2021).

A informação sobre o suposto encerramento do Bolsa Atleta por Bolsonaro foi publicada pela primeira vez pelo perfil @ThiagoResiste no Twitter. A reportagem o procurou, mas não obteve retorno até a publicação deste texto.

Como verificamos?

Para saber se o Bolsa Atleta havia acabado, o Comprova fez pesquisas em sites do governo federal e logo foi possível constatar, na página do Ministério da Cidadania, que o programa está ativo.

Também pesquisamos publicações sobre o assunto e descobrimos que, em 2020, o governo não lançou edital para seleção de novos atletas, justificando a medida com a pandemia da covid-19.

Foram consultados dados orçamentários sobre o programa, disponíveis publicamente no Siga Brasil (na ação orçamentária 09HW – Concessão de Bolsa a Atletas) e também publicados pelo Estadão.

Entramos em contato com o Ministério da Cidadania, por e-mail, para saber se o programa havia passado por reformulações no governo Bolsonaro, se houve cortes e por que não havia sido lançado o edital no ano passado.

Para a checagem, ainda foi feito contato, por e-mail, com o Comitê Olímpico Brasileiro (COB). O autor do tuíte também foi procurado, em mensagem direta no Twitter, mas não se manifestou.

Verificação

O Bolsa Atleta é um programa, na definição do Ministério da Cidadania, que visa garantir a manutenção pessoal aos atletas de alto rendimento que não têm patrocínio.

O programa é dividido em seis categorias: Atleta de Base (R$ 370); Estudantil (R$ 370); Nacional (R$ 925); Internacional (R$ 1.850); Olímpico/Paralímpico (R$ 3.100) e Pódio (R$ 5 mil a R$ 15 mil). Os valores pagos são mensais.

Para as cinco primeiras, a seleção é feita por chamada pública e é preciso atender a uma série de pré-requisitos, como idade e vinculação a entidade desportiva.

O Ministério da Cidadania aponta que na categoria Pódio, a mais alta do programa, são apoiados os atletas que estão entre os 20 primeiros do ranking mundial de sua modalidade ou prova específica e que atendam aos critérios estabelecidos pela legislação. “Os atletas elegíveis nessa categoria de bolsa são avaliados por um grupo de trabalho composto por representantes da Secretaria Especial do Esporte, das Entidades Nacionais de Administração do Desporto e dos Comitês Olímpico e Paralímpico”, afirma o órgão federal, em nota.

Suspensão do edital

O autor da postagem no Twitter afirma que o governo federal acabou com o Bolsa Atleta em 2020. No ano passado, entretanto, houve a suspensão do edital do programa. O lançamento foi adiado para 2021, segundo o Ministério da Cidadania, devido ao período de excepcionalidade imposto pela pandemia da covid-19.

O órgão federal assegura que não houve interrupção do pagamento do benefício aos atletas que haviam sido contemplados no edital de 2019. Entre os desportistas da categoria Pódio, houve renovação automática dos 274 que continuaram atendendo aos critérios para receber a bolsa.

Em janeiro deste ano, foi lançado o edital para seleção de esportistas para o Bolsa Atleta e, em maio, publicada a lista com os contemplados nas cinco categorias da chamada pública.

O COB foi questionado sobre a execução do programa, mas, em e-mail da assessoria de comunicação, informou que não tem porta-voz para falar do assunto.

Redução da verba

O atual orçamento para o programa é de R$ 145,2 milhões e contempla 7.531 atletas, dos quais 334 são da categoria Pódio. Apesar de o governo não admitir cortes e afirmar que o valor é o maior desde 2014, dados obtidos através da Lei de Acesso à Informação (LAI) do Ministério da Cidadania pelo Estadão revelam uma redução de 17% no orçamento total do ciclo olímpico (2017/2021) – maior parte do período sob a gestão de Jair Bolsonaro na presidência.

Conforme os dados disponibilizados pela LAI, o ciclo olímpico de Tóquio – com um ano a mais devido ao adiamento dos jogos – teve R$ 530,4 milhões destinados ao programa, enquanto o ciclo do Rio recebeu R$ 641,1 milhões.

Segundo dados do Siga Brasil – ferramenta do Senado para análise do Orçamento Federal –, o governo Bolsonaro desembolsou, em média, R$ 124,1 milhões por ano entre 2019 e 2020 com o pagamento de bolsas a atletas, em números já atualizados pela inflação. O valor é 5,4% superior à média registrada entre 2016 e 2018, durante o governo de Michel Temer.

Atletas em Tóquio

Entre os 302 atletas convocados para a Olimpíada, 242 integram o Bolsa Atleta. Nos Jogos Paralímpicos, 222 dos 232 convocados são contemplados pelo programa.

O governo federal mantém uma página na internet para divulgação do desempenho dos brasileiros nas competições.

Até o dia 28 de julho, dos cinco primeiros medalhistas no Brasil, apenas a skatista Rayssa Leal não é beneficiada – ela não tem a idade mínima, de 14 anos, para se candidatar ao programa.

Por que investigamos?

Em sua quarta fase, o Comprova checa conteúdos suspeitos sobre políticas públicas, eleições e pandemia que tenham atingido alto grau de viralização. Em julho de 2021, os participantes decidiram também iniciar a verificação da desinformação envolvendo possíveis candidatos à presidência da República. Desde então, o projeto tem monitorado nomes que vêm sendo incluídos em pesquisas dos principais institutos.

Nesta verificação, o nome de Jair Bolsonaro, que é provável candidato à reeleição, foi associado à suspensão de um programa federal, bastante em evidência no momento devido aos Jogos Olímpicos de Tóquio. O evento, inclusive, já foi pauta de outra checagem do Comprova ao relacionar falsamente a trilha sonora da ginasta Rebeca Andrade a uma homenagem ao presidente.

Somente no Twitter, até o dia 29 de julho, a postagem sobre o Bolsa Atleta já havia recebido 1,4 mil curtidas e outros 418 retuítes.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Política

Investigado por: 2021-07-27

É falso que trilha sonora da ginasta Rebeca Andrade na Olimpíada seja homenagem a Bolsonaro

  • Falso
Falso
São falsas postagens afirmando que a música utilizada pela ginasta Rebeca Andrade na classificatória da ginástica artística da Olimpíada de Tóquio, na modalidade solo, seja o “Funk do Bolsonaro”. Na verdade, a trilha mistura "Toccata and Fugue", de Johann Sebastian Bach, com "Baile de Favela", do MC João.
  • Conteúdo verificado: Postagens em site e em contas do Instagram e do YouTube afirmam que a ginasta olímpica Rebeca Andrade utilizou o “Funk do Bolsonaro”, uma paródia de “Baile de Favela”, como trilha para a apresentação.

É falso que a trilha sonora da apresentação da ginasta brasileira Rebeca Andrade durante os Jogos Olímpicos de Tóquio 2020, no Japão, seja uma homenagem ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido), conforme afirmam postagens de apoiadores do presidente no Instagram, no YouTube e em um site.

A trilha sonora tem como base o funk “Baile de Favela”, composto por MC João, e não uma paródia feita em 2018, pelo MC Reaça, que ficou conhecida como “Funk de Bolsonaro”. Um vídeo com a paródia chegou a ser publicado no dia 11 de abril daquele ano no Facebook do senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ), um dos filhos do presidente.

Responsável por fazer a trilha usada pela atleta desde 2018, o músico Misael Passos Junior negou ao Comprova que haja motivação política na escolha da base. Ele também postou em sua conta oficial no Instagram o áudio completo da trilha e informou, na legenda, se tratar de uma mistura da música “Baile de Favela” com o compositor alemão Johann Sebastian Bach, cuja peça utilizada foi “Toccata and Fugue”.

Ao ser procurado pela reportagem, Misael disse desconhecer “qualquer motivação política na escolha das músicas”. “O foco sempre foi o resultado musical oferecer o que a atleta precisa para uma boa performance, nada mais”, falou por meio de mensagem no Instagram.

O responsável pelas relações públicas da atleta, Felipe Paulino, respondeu ao Comprova por e-mail que a música e a série de solo de Rebeca “fazem referência unicamente à cultura do funk brasileiro”.

Em entrevista após a classificação para três finais nos Jogos Olímpicos de Tóquio, Rebeca afirmou que a música tinha sido uma escolha do coreógrafo, Rhony Ferreira. Procurado, ele também negou politização da apresentação. “É um absurdo isso que as pessoas ficam falando, não tem nada a ver com Bolsonaro”. Em 2018, ela comentou sobre a escolha de “Baile de Favela” para a nova coreografia: “Vou botar os japoneses para dançar funk”. Ela também agradeceu em um post feito pelo compositor do funk, MC João, no qual ele afirma que a ginasta fez um baile de favela em Tóquio.

O Comprova procurou cinco contas que postaram o conteúdo falso, mas apenas o site Terra Notícias Brasil respondeu, afirmando ter mudado o título da postagem após o contato. Sustentou, ainda, que a música foi apresentada de forma instrumental, cabendo“ à atleta atestar para qual versão ela se apresentou”, e afirmou que “cada um interpreta a música como conhece”.

Atualização: Esta verificação foi atualizada em 3o de julho para incorporar uma resposta do coreógrafo Rhony Ferreira recebida após a primeira publicação.

Como verificamos?

Inicialmente, buscamos no Google pelo termo “Funk de Bolsonaro”. Os resultados levaram a vídeos em diversas plataformas de uma paródia feita pelo MC Reaça da música “Baile de Favela”, de autoria do MC João. A postagem mais antiga encontrada foi do dia 11 de abril de 2018, no Facebook do senador Flávio Bolsonaro.

Em seguida, procuramos por notícias que relacionassem a trilha sonora da apresentação da ginasta Rebeca Andrade nas Olimpíadas de Tóquio com a paródia, mas os resultados faziam referência direta à escolha pelo funk “Baile de Favela”, sem mencionar o presidente.

Algumas delas falavam sobre o fato de o autor da música, MC João, estar comemorando o funk nas Olimpíadas. Buscamos por postagens no Instagram oficial do artista e encontramos um vídeo da apresentação de Rebeca com uma legenda a parabenizando e exaltando o uso da música nos jogos, enquanto ela o agradece.

Uma publicação no site do jornal Lance! incluiu um vídeo de uma entrevista de Rebeca na qual ela afirmava que a escolha tinha sido feita pelo coreógrafo dela.

Então, passamos a pesquisar quem era o coreógrafo da atleta e chegamos ao nome de Rhony Ferreira. Em sua conta pessoal do Instagram, há duas postagens feitas no dia 25 de julho de 2021 (aqui e aqui), uma delas ao lado de Rebeca, na qual ele afirma que a atleta está fazendo história. Uma busca no feed do coreógrafo levou a uma postagem, também ao lado de Rebeca, no dia 7 de abril de 2018, em que ele afirma ter finalizado a nova coreografia dela.

Também acessamos os stories de Rhony, onde encontramos a repostagem de uma publicação do músico Misael Passos Junior, responsável pela trilha. Na legenda da postagem, Misael afirma que a trilha é uma mistura de (Johann Sebastian) Bach com “Baile de Favela”. Então, o procuramos por mensagem direta e ele disse não haver qualquer motivação política na escolha da música.

Procuramos, ainda, os responsáveis pela comunicação oficial de Rebeca Andrade, além dos autores das publicações que ligam a apresentação dela a Bolsonaro.

Verificação

Trilha é mistura de “Baile de Favela” com Johann Sebastian Bach

A apresentação de Rebeca nas Olimpíadas reacendeu a empolgação pela escolha da trilha sonora, baseada no funk “Baile de Favela”, do MC João. Mas esta não é necessariamente uma novidade, já que a coreografia foi montada em 2018, mesma época da escolha da trilha.

Em entrevista após a apresentação em Tóquio, Rebeca afirmou que o “Baile de Favela” foi uma surpresa do coreógrafo, Rhony Ferreira. Antes, em 2016, a ginasta se apresentava ao som de Beyoncé. “Ele chegou com essa música, no começo eu até estranhei um pouco, porque eu estava saindo da Beyoncé para ir para um funk, mas depois, gente… a música é a minha cara, né? Não tem como… é a cara do Brasil. Então, eu fiquei muito empolgada e depois eu comecei a amar a música”, disse. A entrevista em vídeo aparece numa matéria sobre a repercussão do uso da música, feita pelo Lance!.

Rebeca já fala sobre a escolha do funk desde 2018. No dia 7 de abril daquele ano, o coreógrafo Rhony Ferreira postou uma foto no Instagram ao lado da ginasta. Na legenda, dizia que havia acabado de finalizar a nova coreografia dela. Ele não fez menção ao nome da música. O Comprova o procurou, mas ele não respondeu até a publicação dessa verificação.

O Comprova o procurou pelo Instagram e, em áudio, o coreógrafo esclareceu que a música é Toccata and Fugue, de Bach, com Baile de Favela, além de classificar como absurdas e mentirosas as associações feitas com o presidente. “Não tem nada a ver com Bolsonaro, inclusive, quando eu descobri essa música, em 2016, eu nem conhecia o Bolsonaro, nem sabia quem era e que viria a ser presidente da República”, declarou.

Ele acrescenta ter escolhido a música pelo ritmo ao ver as pessoas a cantarem nas arquibancadas durante a Olimpíada do Rio, em 2016. “Não tem nada a ver com Bolsonaro e com partido político nenhum. É uma mentira e só escolhi a música pela música, pela batida, pelo ritmo, pela vibração que ela faz e porque combinava com Tocatta and Fugue, de Bach”.

Já o produtor e músico Misael Passos Junior, responsável pela trilha, confirmou ao Comprova que a trilha é mesmo do início de abril de 2018. Em novembro daquele ano, uma nota do jornal O Globo já trazia uma fala de Rebeca sobre o uso do funk e a expectativa de levá-lo à Olimpíada: “Vou botar os japoneses para dançar funk”, disse.

A trilha também foi usada no mês passado, no Pan-Americano de Ginástica, no Rio de Janeiro, onde Rebeca se classificou para a Olimpíada. No dia 8 de junho, a cantora Margareth Menezes fez um post no Instagram mencionando o uso do funk.

Sem motivação política

Misael Passos Junior foi questionado pelo Comprova se havia alguma motivação política ou homenagem a Bolsonaro. Em resposta, o músico afirmou que desconhece qualquer motivação política na escolha.

“Trabalhei no arranjo para a trilha da Rebeca sob a direção do coreógrafo Rhony e a diretora Angela Monteni. Desconheço qualquer motivação política na escolha das músicas. Ficamos muito tempo juntos em estúdio produzindo, pois trabalhamos juntos em trilhas para ginastas desde o Brasileirinho da Daiane dos Santos, e o foco sempre foi o resultado musical oferecer o que a atleta precisa para uma boa performance, nada mais”, escreveu.

Também questionado sobre uma eventual intenção de homenagear Bolsonaro, o responsável pelas relações públicas da atleta, Felipe Paulino, declarou por e-mail que a trilha e a série de Rebeca no solo da Olimpíada “fazem referência unicamente à cultura do funk brasileiro”.

Autor do funk comemorou

O autor de “Baile de Favela”, MC João, comemorou o fato de a música ter sido ouvida nos Jogos Olímpicos de Tóquio e parabenizou Rebeca Andrade. Ele postou em sua conta no Instagram um vídeo da apresentação da ginasta ao som de sua composição. “Parabéns pela conquista @rebecaandrade vc vem ostentando superação e hoje fez um baile de favela em tokio… Que apresentação foda só luz… pra mim você já é uma vencedora (sic)”, diz a legenda.

Nos comentários do post de MC João há um agradecimento de Rebeca: “Gratidão!”.

Quem disseminou o conteúdo falso?

O conteúdo falso começou a circular ainda no domingo, dia 25 de julho, quando a ginasta se classificou na prova. Na data, a conta bolsonaroraiz postou no Instagram vídeo da apresentação com uma inscrição sobre as imagens: “Bolsonaro capitão da reserva”.

A mesma montagem foi postada pelo deputado estadual Anderson Moraes (PSL-RJ), com a legenda “ginasta usa rap do Bolsonaro em competição! A esquerdalha vai a loucura, chora mais que tá pouco (sic)”, e pela página direita.conservadora.oficial, que já foi alvo de verificação anterior do Comprova. Esta página retornou o contato feito pelos verificadores, dizendo apenas “repórter de” e marcando outra conta do Instagram que também postou o conteúdo, dando a entender que compartilhou de lá.

Ainda no dia 25, mas no YouTube, o “Canal ponto de ignição” postou um vídeo no qual o responsável pela conta, Junior Almeida, diz que a trilha utilizada por Rebeca Andrade parece ser o som utilizado na paródia a favor de Bolsonaro. Em seguida, ele toca a paródia.

Na segunda-feira, dia 26, a conta bolsonaroraiz voltou a tratar do assunto, postando vídeo da apresentação da ginasta afirmando que ela dançou ao som da música que ficou conhecida como “Funk de Bolsonaro”. O vídeo tem uma inscrição na qual se lê “ginasta brasileira se apresenta com música de apoio a bolsonaro e TV Globo é obrigada a transmitir”.

No mesmo dia, o site “Terra Notícias Brasil”, que também já foi alvo de verificações anteriores, publicou texto sustentando a mesma afirmação: “A música em questão é a versão pró-Bolsonaro que fez enorme sucesso durante as eleições de 2018, feita como paródia à canção ‘Baile de Favela’”, afirma o texto.

Até o Comprova entrar em contato com o site, o título afirmava que a ginasta brasileira se apresentou com música de apoio a Bolsonaro. A chamada, entretanto, foi modificada.

Em resposta à reportagem, o responsável pela publicação, que não se identificou, afirmou acreditar que o título tenha sido o único equívoco, alegando ter informado no corpo tratar-se de uma paródia. Sustentou, ainda, que a música foi apresentada de forma apenas instrumental e que “cabe à atleta atestar para qual versão ela se apresentou”, acrescentando que “cada um interpreta a música como conhece”.

Por que investigamos?

Em sua quarta fase, o Comprova checa conteúdos suspeitos sobre políticas públicas, eleições e pandemia de covid-19 que tenham atingido alto grau de viralização. Em julho de 2021, os participantes decidiram também iniciar a verificação da desinformação envolvendo possíveis candidatos à presidência da República. Desde então, o projeto tem monitorado nomes que vêm sendo incluídos em pesquisas dos principais institutos.

O conteúdo em questão foi compartilhado no momento em que a atenção dos brasileiros está voltada para a Olimpíada e envolve uma atleta de destaque na modalidade em que compete. A associação da ginasta ao presidente pode induzir as pessoas a crerem que ela está se posicionando a favor do atual governo ou que a apresentação tenha motivação política.

Apenas no Instagram as postagens somaram 144.404 visualizações até 27 de julho, dois dias após a apresentação da ginasta. No YouTube foram mais 23.691. A partir do site, o conteúdo falso foi compartilhado também em contas do Facebook e do Twitter.

Falso, para o Comprova, é conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.

Eleições

Investigado por: 2021-07-23

É falso que áudio mostre Luana Piovani defendendo Jair Bolsonaro

  • Falso
Falso
São falsos posts virais no Facebook e no TikTok com áudio em que supostamente a atriz Luana Piovani estaria defendendo que acreditaria em urnas fraudadas caso Jair Bolsonaro não fosse eleito em primeiro turno. A atriz negou a autoria da gravação em seu perfil no Instagram.
  • Conteúdo verificado: Posts no Facebook e no TikTok utilizam uma foto da atriz Luana Piovani e atribuem a ela uma fala segundo a qual a fraude nas eleições presidenciais estaria comprovada caso Jair Bolsonaro não fosse eleito em primeiro turno. Na fala, a pessoa ainda diz que não gostaria de ter filhas homossexuais.

É falso o áudio atribuído à atriz Luana Piovani em que ela teria dito acreditar na possibilidade de urnas burladas caso Jair Bolsonaro não ganhasse no primeiro turno. Os posts, que viralizaram no Facebook e no TikTok e já circulavam desde 2018, trazem a inscrição “Nossa, finalmente, uma atriz lúcida” e, na gravação, a voz ainda diz não querer que “filhas fossem sapatas”.

Ao ouvir o áudio com atenção, é possível perceber que não é a atriz falando. De qualquer forma, o Comprova procurou a assessoria de imprensa de Piovani, que negou a autoria do conteúdo. Em seguida, ainda na sexta-feira (23), Luana, que está em viagem na Turquia, gravou stories no seu Instagram também desmentindo ser ela no áudio. “Gente, eu não sou a favor do Bolsonaro, sou anti-Bolsonaro, esse áudio não sou eu, não é a minha voz”, disse ela.

Como verificamos?

O primeiro passo do Comprova foi verificar se o áudio vinculado à imagem de Luana Piovani havia sido gravado pela atriz. Entramos em contato com a assessoria da artista no Brasil, por e-mail e por telefone, para que pudesse informar se a voz registrada na postagem era da Luana.

Também buscamos contato diretamente com a atriz, com mensagem por e-mail e telefone para sua assessoria de imprensa e para seu perfil no Instagram, canal pelo qual Luana acabou se manifestando posteriormente, em stories.

Por fim, acionamos dois internautas que compartilharam a montagem da foto da artista com o áudio, mas não obtivemos retorno até o fechamento desta checagem.

Verificação

Fraude nas eleições

No áudio que circulou pela primeira vez em 2018 e que já havia sido desmentido, mas voltou a viralizar agora, a mulher afirma que, se Jair Bolsonaro não fosse eleito naquele ano, se mudaria para o exterior porque seria um indício de que as urnas teriam sido burladas, ou seja, fraudadas.

O áudio também sugere que, no pleito anterior, em 2014, a vitória já estava assegurada para o candidato Aécio Neves (PSDB) e, “do nada”, Dilma Rousseff (PT) se reelegeu para a presidência.

Naquele ano, a disputa eleitoral foi bastante acirrada e a petista venceu com 51,64% dos votos válidos. As teorias sobre supostas fraudes começaram logo em seguida, questionando a confiabilidade das urnas eletrônicas, e o PSDB – partido derrotado nas eleições – ingressou com um pedido de auditoria junto ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Um ano depois, relatório do próprio partido confirmou que não houve fraude, embora tenha defendido que o sistema não permitia uma auditoria externa independente e efetiva. O TSE argumenta que há diversas formas de auditar e recontar os votos. Recentemente, o Comprova fez uma checagem sobre o tema, reafirmando que não há evidências de irregularidades nas eleições de 2014.

Mudança para Portugal

Bolsonaro foi eleito em outubro de 2018. Pouco depois, em janeiro de 2019, Luana Piovani mudou-se para Portugal, numa atitude diferente daquela descrita pela pessoa do áudio de que, se o então candidato não chegasse ao Palácio do Planalto, ela deixaria o país.

Em abril deste ano, a atriz afirmou que o motivo de ir morar no exterior era a vontade de criar os filhos fora da “bolha” de celebridade, além da possibilidade de oferecer mais liberdade e segurança para as crianças, sem mencionar razões políticas.

A postura de Luana Piovani nas redes sociais, entretanto, tem se mostrado frequentemente contrária aos posicionamentos de Bolsonaro e sua gestão na pandemia, como demonstra neste vídeo.

Filhas?

Além de ser possível identificar que a voz não é da atriz, a mulher no falso áudio diz que tem “duas filhas”, o que não é o caso da atriz. Luana, conforme publicações em revistas e sites de celebridades e em seus posts em redes sociais, é mãe de dois meninos (Dom e Bem) e apenas uma menina (Liz). A informação está, inclusive, em sua descrição no Instagram.

‘Não sou eu’

Em viagem a Istambul, na Turquia, a atriz gravou stories em seu perfil no Instagram logo depois que o Comprova procurou sua assessoria de imprensa. Além de se dizer “anti-Bolsonaro” e negar a autoria do áudio viral, Luana pediu: “Pelo amor de deus, não cansem minha beleza”.

Acrescentou que, se tivesse votado nas eleições presidenciais de 2018, teria escolhido Marina Silva, então candidata pela Rede Sustentabilidade. Antes de finalizar os stories, afirmou ser “anti-Lula também” e pediu novamente: “Pelo amor de deus, não diz que eu sou Bolsonaro, não, que me dói até a barriga”.

Não foi a primeira vez que a atriz teve seu nome envolvido em desinformação. Áudios falsos atribuídos a ela e com apoio a Bolsonaro, como o verificado aqui, circulam desde 2018, e já foram checados por veículos como G1 e Veja SP. A atual postagem também foi verificada pela Agência Lupa.

Por que investigamos?

Em sua quarta fase, o Comprova checa conteúdos suspeitos sobre o governo federal, eleições e a pandemia que tenham atingido alto grau de viralização. O conteúdo verificado aqui atingiu 62,2 mil interações no Facebook até 23 de julho.

No falso áudio – que, como afirmado anteriormente, já circulava em 2018 –, a voz feminina fala em fraude nas urnas nas últimas eleições presidenciais, mesmo discurso que o presidente Bolsonaro vem pregando desde antes de ser eleito. Conteúdos como esses geram desinformação e reforçam a impressão sem fundamento de que o processo eleitoral brasileiro não é seguro, colocando em xeque a própria democracia.

Recentemente, o Comprova publicou verificações semelhantes, sobre conteúdos que questionavam o sistema eleitoral brasileiro, como postagens que afirmavam falsamente que urnas usadas aqui haviam sido hackeadas nos Estados Unidos e que um vídeo mostrava fraude nas eleições de 2014. No ano passado, o projeto mostrou que o sistema de votação eletrônica pode ser auditado e que a Smartmatic nunca vendeu urnas para o Brasil.

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.

Política

Investigado por: 2021-07-23

Fragmento de arroz não é ‘resto’ e é vendido desde antes do governo Bolsonaro

  • Enganoso
Enganoso
Os fragmentos de arroz são um subproduto apto para o consumo humano. Eles não são restos de comida e apresentam o mesmo valor nutricional que os grãos inteiros. Além disso, eles já eram comercializados antes do governo do presidente Jair Bolsonaro, e a marca que aparece na foto de uma das postagens não detectou nenhum aumento de produção ou vendas em 2020 ou 2021.
  • Conteúdo verificado: Posts no Instagram e Twitter mostram sacos de arroz com um rótulo indicando que são fragmentos de arroz. Os posts dizem que esses grãos quebrados seriam “restos de comida”, com “valor nutricional reduzido”, usados para “compor rações de animais e fazer farinha de arroz” e que teriam começado a ser comercializados no governo de Jair Bolsonaro com um preço maior, devido à “miséria” e “fome” do país.

Não é verdade que os “fragmentos de arroz” sejam restos de comida e tenham começado a ser vendidos nos supermercados recentemente, já durante o governo Bolsonaro, como sugerem alguns posts que viralizaram.

Esse subproduto do arroz, formado por grãos que quebraram durante a etapa de polimento e que são separados dos inteiros, está regulamentado como apropriado para o consumo humano desde a Instrução Normativa de 2009, do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), e tem valor nutricional similar ao do arroz inteiro, segundo especialistas ouvidos pelo Comprova.

Além disso, segundo a fabricante da marca que aparece na foto que acompanha um dos tuítes, Rampinelli Alimentos, os fragmentos são comercializados desde 2016 e indicados para receitas de sopas e caldos.

A empresa também afirmou que não foi percebido nenhum aumento recente no volume produzido de fragmentos de arroz no governo Bolsonaro e, portanto, nem no consumo.

O Comprova entrou em contato com os responsáveis pelas postagens, e um deles, @diogotapuio, nos respondeu, dizendo que o tuíte se refere ao aumento da fome e da pobreza no Brasil.

Como verificamos?

O Comprova consultou documentos oficiais do MAPA que regulamentam sobre o consumo humano de fragmentos de arroz e conversou com especialistas em alimentação e agricultura.

Fizemos contato também com a Associação Brasileira da Indústria do Arroz (Abiarroz), para saber mais sobre a venda desse subproduto no país, com a Apas (Associação Paulista de Supermercados) e Abras ( Associação Brasileira de Supermercados).

Além disso, a equipe procurou a empresa Rampinelli – que aparece nas postagens em uma foto que mostra vários sacos de fragmentos comercializados pela marca.

Pelas redes sociais, fizemos contato com os responsáveis pelas postagens verificadas, mas só um deles nos respondeu.

Verificação

O que são fragmentos de arroz

Os conteúdos enganosos indicam que os fragmentos de arroz seriam “restos de comida”.

A Instrução Normativa 6/2009 do MAPA – que define o padrão oficial de classificação do arroz, com os requisitos de identidade e qualidade –, prevê a comercialização dos fragmentos de arroz.

Ele é definido como “o produto constituído de, no mínimo, 90% de grãos quebrados e quirera”, sendo que os grãos quebrados são “o pedaço de grão de arroz descascado e polido que apresentar comprimento inferior às (três quartas) partes do comprimento mínimo da classe que predomina e que ficar retido na peneira de furos circulares de 1,6 mm de diâmetro” e quirera (menor parte do grão quebrado) que é “o fragmento de arroz que vazar na peneira de furos circulares de 1,6 mm de diâmetro”.

Dessa forma, o fragmento de arroz beneficiado é classificado em 4 subgrupos – integral, polido, parboilizado integral e parboilizado polido – e nas 2 categorias: grão quebrado e quirera, como mostra a imagem abaixo, retirada do Departamento de Inspeção de Produtos de Origem Vegetal, do MAPA:

 

A pesquisadora em Ciência de Alimentos da Embrapa Arroz & Feijão Priscila Zaczuk Bassinello reforça que os fragmentos de arroz não podem ser considerados “restos” nem “sobras”. “Restos são alimentos que já não podem ser reaproveitados. Quando a gente fala de sobras limpas são os alimentos prontos que não foram distribuídos e dependendo da quantidade podem ser também uma forma de desperdício. Não é o caso de fragmentos de arroz”, explica.

Segundo ela, a ocorrência dos fragmentos é algo normal e ocorre sempre, já que o grão tende a quebrar no processo até chegar na embalagem que vai ao mercado. “Dependendo do tipo de amido que tem no grão ele pode ser mais frágil, depende do manejo, da genética da cultura. Então, essa quebra faz parte de grande parte dos cultivares que temos no mercado e sempre você tem uma porcentagem de quebra. Já se espera, pelo menos, de 30 a 40% de perda com grãos quebrados em qualquer cultivo”, explica.

Carlos Magri Ferreira, agrônomo e analista da Embrapa Arroz e Feijão, afirma que o fragmento de arroz é um subproduto e a origem dele pode ser em função da forma de cultivo, condições climáticas durante o ciclo da cultura, ação física no grão, problemas na secagem ou no beneficiamento. “O grão quebrado reduz o preço do arroz. Dessa forma, pesquisas na área são realizadas para reduzir o aparecimento deste”, explicou.

Os fragmentos são menos lucrativos para os produtores. Priscila afirma que a indústria que compra o arroz e vai empacotar paga o preço em função do rendimento industrial. “Quanto mais quebrados, menos eles pagam por aquele material. No mercado se define a porcentagem aceitável de grãos inteiros, eles falam em, no mínimo, 65% de inteiros do arroz.”

A Rampinelli Alimentos ressaltou que o produto vendido como “fragmento de arroz” é classificado pelo MAPA na categoria “quebrado”, tipo 1 – informações que estão na embalagem.

Segundo a Abiarroz, “a quantidade de fragmento de arroz produzida no Brasil não chega a 10% do total da produção (cerca de 1 milhão de toneladas)”.

Consumo humano

Os posts que estão viralizando indicam que os fragmentos de arroz seriam usados “para compor rações e fazer farinha de arroz” e estariam ligados à “miséria” e à “fome”.

Apesar de serem usados para ração animal e para fazer farinha de arroz, Priscila destaca que não dá para confundir fragmentos com aquilo que é abaixo do padrão e desclassificado para consumo humano.

“Não é apto para consumo humano quando o arroz está em mau estado de conservação, com presença de mofo, odor estranho ou com substâncias nocivas à saúde. Isso tudo não tem relação com o fato de eles serem quebrados. A quebra pode acontecer com qualquer um dos tipos, qualquer classe, porque isso depende de manejo pós-colheita. Não há problema nenhum em se comercializar e consumir um grão de arroz quebrado. Não é considerado um defeito”, explica.

Ferreira destaca que a preferência do consumidor é definida por questões sociais, religiosas, econômicas e culturais e que o brasileiro é exigente e, normalmente, não aceita comprar arroz quebrado. “O padrão médio desejado pelo consumidor brasileiro é pelo arroz longo fino, polido, que, após o cozimento, fique macio, seco e solto. A marca comercial e tipo 1 são fatores predominantes na decisão de compra. Talvez seja o produto que o brasileiro mostre-se mais exigente para servir seja para a família ou convidados”, explica.

Para Priscila, deve-se levar em consideração o mercado para o qual o arroz será vendido. Alguns países valorizam o arroz fragmentado, principalmente na África, em que já é hábito consumir os grãos quebrados. Segundo ela, países africanos têm receitas específicas para esse arroz. Em contraposição, outros mercados só toleram menos de 10% de teor de quebrados no pacote. “A preferência varia e a qualidade pode ser boa para alguns e ruim para outros, depende dos hábitos alimentares daquela cultura. Os fragmentos também podem ser misturados com porcentagens de arroz inteiro em alguns países que aceitam esse tipo de mistura, principalmente importadores de baixa renda”, afirma.

O arroz especial e os fragmentos de arroz representam cerca de 1% do consumo total da cultura no Brasil, segundo a Abiarroz. De acordo com a associação, a maior parte da produção brasileira desse tipo de grão é comercializada para países africanos, onde há o hábito de consumo do arroz quebrado.

Em resposta ao Comprova, a Rampinelli Alimentos disse que o produto chamado de “fragmento de arroz” é indicado para receitas de sopas, minestras e caldos e não é vendido para consumo animal. A empresa fabrica outro produto para a alimentação de cães, comercializado com o nome “Arroz Luppy”, que é feito à base de arroz.

Valor nutricional

Um dos conteúdos enganosos afirma que os fragmentos de arroz tem “valor nutricional reduzido”.

Segundo a nutricionista, professora da área de Tecnologia de Alimentos da Federal de Pernambuco (UFPE) e consultora da Associação Brasileira de Nutrição(Asbran), Viviane Lansky Xavier, os fragmentos de arroz têm o mesmo valor nutricional que os grãos inteiros, sendo que a diferença está na estrutura física.

Na entrevista ao Comprova, para exemplificar, ela disse que comparou os dados dos produtos da marca Rampinelli: o fragmento de arroz polido apresenta 80g de carboidratos e 6g de proteínas por 100g de produto. Já o arroz polido inteiro apresenta o mesmo teor de carboidratos (80g) e 6,6g de proteína por 100g de produto. Ou seja, a variação no teor de proteínas não chega nem a 1g por 100g de produto.

“Há pequenas variações nesses valores entre uma marca e outra, depende de como a empresa fez a informação nutricional que está no rótulo, mas, na comparação, não há tanta diferença assim. Temos que lembrar também que, quando pensamos numa alimentação saudável, o arroz está no grupo de alimentos energéticos, ou seja, aqueles que são as fontes de carboidratos. Quanto ao teor deste nutriente, não há diferença entre os produtos”, explica.

Ela ressalta que é hábito alimentar de se consumir o arroz inteiro, enquanto que o fragmento, historicamente, é destinado a alimentação animal, pois o valor comercial sempre foi menor. “A própria embalagem do fragmento de arroz geralmente indica a forma de consumo: ideal para sopas, canjas etc. É a mesma coisa do milho, tem o inteiro e o quebrado, chamado de quirera também, ou xerém. É usado na alimentação animal, mas também na alimentação humana”, afirma.

Priscila destaca que como o arroz só foi quebrado ele preserva a mesma constituição nutricional do grão que lhe deu origem, mudando apenas a estrutura física. “Ele preserva as mesmas propriedades nutritivas do arroz inteiro. O que pode alterar é a qualidade culinária, que pode tender a empapar mais do que o grão inteiro”, comenta.

Comercialização e governo Bolsonaro

Uma das postagens afirma que “no Brasil de 2021, fragmento de arroz é vendido nos mercados”, como se o produto nunca tivesse sido comercializado antes. A outra diz “eu não sei se vocês tem noção, mas fragmento de arroz não era comercializado”, e afirma que, antes desse ano, o quilo do produto custava R$1. Os dois tuítes são acompanhados de uma foto, que mostra o pacote de 5kg dos “fragmentos de arroz” da marca Rampinelli, sendo vendido a R$15,99 em um supermercado.

As afirmações não procedem. A norma do MAPA sobre a classificação desse subtipo de arroz é de 2009, como já mencionado. “Existe essa classificação normatizada no Ministério da Agricultura. Sempre existiu no Brasil e a classificação existe de longa data, desde a década de 80”, diz Priscila Zaczuk Bassinello.

Já o produto da Rampinelli começou a ser vendido em 2016, bem antes de Jair Bolsonaro se tornar presidente do Brasil. Ao Comprova, a empresa disse que a ideia foi criar um produto voltado para o preparo de caldos e sopas: “o fragmento entra no catálogo de produtos da Rampinelli para agregar ainda mais a diversidade de receitas. Sendo assim, ele NÃO é um substituto dos demais produtos”.

De lá pra cá, as vendas nunca corresponderam a mais de 1,2% das vendas totais da empresa, como mostra a tabela abaixo, enviada ao Comprova:

Além disso, segundo a Rampinelli, não foi percebido nenhum aumento recente nesse volume – e, portanto, nem no consumo.

A Abiarroz disse que, por causa da falta de costume dos brasileiros em consumir o arroz quebrado, ele não é encontrado com facilidade em todos os supermercados. “Nos estados do Sul do país, onde se tem costume de comer caldo, sopa, canja, minestra, especialmente com clima mais frio, é mais facilmente encontrado. A percepção de indústrias que comercializam fragmento de arroz é de que houve queda no consumo deste produto, desde 2016”, afirma a associação.

O Comprova não conseguiu localizar uma média de preços do fragmento de arroz nos últimos anos. A Rampinelli disse que, em comparação com outros produtos, o fragmento realmente é comercializado a um preço mais baixo, mas que “não é responsável pela formação do preço de venda ao varejo, este é o próprio supermercado/atacadista que faz”.

O Comprova também procurou a Apas que disse que possui uma base de dados provenientes de parceiros, como a Fipe (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas), com cerca de 200 produtos. No entanto, o arroz fragmentado não existe nas análises, pois há uma representação ínfima no setor supermercadista do estado de São Paulo. Dessa forma, não há uma base de dados para comparar os preços deste produto.

Procuramos a Associação Brasileira de Supermercados, que disse que não conseguiria atender nossa solicitação.

Já a Abiarroz afirma que o preço do fardo de arroz quebrado geralmente equivale a 24% do valor do arroz polido – que é mais consumido no país. “A alteração de preço é proporcional ao preço do arroz Tipo 1, uma vez que, muitas vezes, sequer se tem a matéria-prima para fragmento de arroz em função da qualidade do arroz brasileiro, que apresenta grande percentual de grãos inteiros”, diz a nota enviada ao Comprova.

O preço médio do arroz mais comumente usado nos lares brasileiros subiu 61% no país, entre maio de 2020 e maio de 2021, durante a pandemia, segundo dados da Fundação Getulio Vargas (FGV).

O que diz quem publicou o conteúdo

O conteúdo enganoso foi publicado no Twitter pelos usuários @diogotapuio e @astrafito. O post de Diogo ainda foi compartilhado no Instagram pela página “Esquerda Pensante”.

O Comprova tentou contato com os três, mas só Diogo Cabral nos respondeu, dizendo que a postagem está relacionada aos níveis alarmantes de insegurança alimentar no Brasil.

“O tuíte ilustra uma grave situação que temos atravessado no país: a fome”, nos escreveu ele, por mensagem no Instagram. Diogo mencionou ainda os dados de aumento da insegurança alimentar e da desigualdade no país. Não informou, porém, se sabia quando o fragmento de arroz começou a ser comercializado.

De fato, o Brasil uma pesquisa de abril da organização humanitária Oxfam, que atua em todo o mundo, apontou que mais de 19 milhões de brasileiros passaram fome durante a pandemia da covid-19.

Também é verdade, segundo uma pesquisa da FGV, que o número de brasileiros em situação considerada de extrema pobreza — ou seja, vivendo com menos de R$246 mensais — aumentou desde o começo de 2020. Antes da pandemia, em 2019, o índice chegava a 10,97%, mas, com o pagamento do auxílio emergencial mais amplo no ano passado, havia caído, em agosto, para 4,25%. Em fevereiro, com as mudanças no pagamento do benefício, o índice voltou a subir e ultrapassou o período pré-pandêmico, chegando a 12,83% — o que corresponde a 27,2 milhões de pessoas.

Apesar disso, os números não estão relacionados à venda dos fragmentos de arroz em supermercados.

Por que investigamos?

Em sua quarta fase, o Comprova checa conteúdos suspeitos sobre o governo federal ou a pandemia de covid-19 que tenham atingido alto grau de viralização. Em julho de 2021, os participantes decidiram também iniciar a verificação da desinformação envolvendo possíveis candidatos à presidência da República. Desde então, o projeto tem monitorado nomes que vêm sendo incluídos em pesquisas dos principais institutos.

Os posts verificados nessa checagem atingiram mais de 57 mil interações no Twitter e Instagram e, ainda que a intenção dos autores tenha como base informações verdadeiras – aumento da fome e da pobreza no país –, a venda do fragmento de arroz não tem relação com esse cenário.

Além disso, o conteúdo engana ao indicar que esses produtos não seriam apropriados para consumo humano e ao relacionar a comercialização dos fragmentos como consequência do governo Bolsonaro.

Enganoso é o conteúdo que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.