O Projeto Comprova é uma iniciativa colaborativa e sem fins lucrativos liderada pela Abraji e que reúne jornalistas de 42 veículos de comunicação brasileiros para descobrir, investigar e desmascarar conteúdos suspeitos sobre políticas públicas, eleições, saúde e mudanças climáticas que foram compartilhados nas redes sociais ou por aplicativos de mensagens.
Filtro:

Política

Investigado por: 2023-05-09

Post satiriza deputado que votou contra igualdade salarial entre homem e mulher

  • Sátira
Sátira
Não há registro do deputado federal Deltan Dallagnol (Podemos-PR) ter falado que “mulheres devem se resignar em ganhar menos” porque “está na Bíblia" ao justificar seu voto contra a aprovação do projeto de lei que determina que homens e mulheres tenham igualdade salarial. Post satírico no Twitter foi interpretado como verdadeiro e reproduzido por diversos perfis nas redes sociais. Não há registro algum de que o deputado tenha se manifestado sobre o tema.

Conteúdo investigado: Postagem no Twitter diz que o deputado federal Deltan Dallagnol (Podemos-PR) justificou seu voto contra a igualdade salarial entre homens e mulheres dizendo que “não era de Deus”. Segundo o post, ele teria afirmado que “mulheres devem se resignar em ganhar menos. A submissão ao homem deve ser até na remuneração. Está na Bíblia.”

Onde foi publicado: Twitter

Conclusão do Comprova: Um texto satírico do perfil @GloboFakeNews envolvendo o deputado federal Deltan Dallagnol (Podemos-PR) está sendo interpretado como verdadeiro nas redes sociais (exemplo 1, exemplo 2). Nele, o autor diz que o parlamentar justificou seu voto contra a igualdade salarial entre homens e mulheres dizendo que “não era de Deus” e que mulheres “deveriam se resignar em ganhar menos”.

O tuíte faz referência ao Projeto de Lei 1085/23, do Poder Executivo, que equipara salários de homens e mulheres em cargos com a mesma função ou de igual valor. O texto foi aprovado na Câmara e segue para análise no Senado.

Apenas 36 parlamentares foram contra a aprovação na Câmara, e 325 foram favoráveis. Entre aqueles contrários, está o ex-procurador Deltan Dallagnol. Contudo, o Comprova não encontrou registro de que ele tenha justificado seu voto da forma como diz o tuíte ou de qualquer outra.

Tampouco foram encontradas postagens nas redes sociais de Dallagnol a respeito do projeto de lei. O registro da sessão do dia 4 de maio, quando ocorreu a aprovação, mostra que ele sequer discursou naquela ocasião. Ainda assim, o Comprova contatou a assessoria de imprensa do deputado, que confirmou que “o plenário foi virtual, então, ele nem falou na Tribuna”.

Uma análise do perfil @GloboFakeNews deixa evidente que trata-se de postagem com intenção satírica. O autor diz na bio do perfil que publica “a verdade revelada através da fake news”. Além disso, há diversos outros tuítes que têm como alvo políticos bolsonaristas e outras figuras conservadoras, como o pastor Silas Malafaia.

O Comprova identifica como sátira, os memes, paródias e imitações publicadas com intuito de fazer humor e verifica conteúdos satíricos quando percebe que há pessoas tomando-os por verdadeiros.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Até 9 de maio, o tuíte satírico havia sido compartilhado 425 vezes e recebido 1,2 mil curtidas. Um vídeo que publicou a história como se fosse verdadeira foi visualizado no YouTube 8,8 mil vezes até a mesma data.

Como verificamos: Inicialmente, fizemos uma busca no Google pelos termos Dallagnol + mulheres + salários, que retornou links para checagens do Boatos.Org e da agência Aos Fatos sobre o caso. Em seguida, buscamos informação sobre o PL que trata sobre a igualdade salarial entre homens e mulheres para saber como votou o deputado paranaense. Também foram feitas buscas nas redes sociais do parlamentar para saber se ele havia se manifestado sobre o assunto. O Comprova também consultou o registro escrito da sessão da Câmara dos Deputados do dia 4 de maio, quando o projeto de lei foi aprovado para saber se ele chegou a se manifestar naquela ocasião.

Foi feito contato ainda com o deputado Deltan Dallagnol.

O que diz o responsável pela publicação: O autor do perfil @GloboFakeNews foi contatado, mas não respondeu até a publicação deste texto.

O que podemos aprender com esta verificação: O perfil que publicou o conteúdo satírico que se espalhou como verdadeiro é @GloboFakeNews. Neste caso, pode-se gostar ou não da Rede Globo, mas o nome da página já deveria fazer com que o leitor ligasse o alerta e desconfiasse da informação. Uma rápida pesquisa na internet com o nome do deputado e termos usados no post já mostraria que nenhum veículo da imprensa profissional noticiou tal informação.

Também aprendemos que sátiras podem ser entendidas de diferentes formas e, quando tidas como verdades, podem ser perigosas, já que, como neste caso, causam desinformação.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: O site Boatos.org e a agência Aos Fatos também checaram o conteúdo verificado aqui. Além disso, Dallagnol já esteve no centro de outras checagens do Comprova. No tuíte verificado aqui, ele não é o autor da peça de desinformação, mas, recentemente, o projeto verificou post do deputado que enganava ao dizer que projeto de lei proíbe versículos bíblicos nas redes sociais.

Saúde

Investigado por: 2023-05-08

Vacinas não têm vírus e fungos ‘do câncer’, ao contrário do que alega vídeo compartilhado nas redes sociais

  • Falso
Falso
Vacinas não têm vírus e fungos que causam câncer para “matar lentamente os pobres, os feios e os velhos”. A alegação compartilhada em vídeo nas redes sociais não tem comprovação científica. O câncer não está relacionado à aplicação de qualquer imunizante, segundo o Butantan. O Instituto Nacional do Câncer também desmentiu a publicação e reforçou que “as vacinas são um dos principais métodos de prevenção de doenças infecciosas e não são causadoras de doenças”.

Conteúdo investigado: Vídeo em que um homem que se diz “estudioso das vacinas” alega que os imunizantes, em especial aqueles contra o H1N1, teriam “vírus e fungos do câncer”. Ele diz que os imunizantes são usados para controle populacional.

Na gravação, ele cita especificamente que vacinas contêm o VRS Virus, o Papiloma Vírus Humano (HPV), o Mumps Virus, o vírus da Herpes e diz que esses são os causadores silenciosos da doença.

Onde foi publicado: TikTok, Facebook e YouTube.

Conclusão do Comprova: É falso o conteúdo de um vídeo que alega que as vacinas, especialmente a que previne contra o vírus H1N1, estejam sendo usadas para matar lentamente os pobres, os velhos e os feios. A postagem compartilha a gravação de um senhor que mente ao dizer que os imunizantes contêm “vírus e fungos do câncer”.

Em resposta às alegações, o Instituto Butantan explicou ao Comprova que “é errado afirmar que a vacina contra influenza causa câncer, uma vez que não há comprovação científica de que a doença está correlacionada à aplicação de quaisquer imunizantes”.

O instituto também ressaltou que as vacinas, na realidade, têm o potencial de prevenir alguns cânceres que podem ser causados por vírus. Um exemplo é a vacina contra o HPV, disponível na rede pública para pessoas com idade entre 9 e 14 anos. O imunizante protege contra o vírus que é responsável pelo câncer de colo uterino, de pênis, anal e oral. O Butantan citou ainda a vacina contra hepatite B, que previne o câncer de fígado.

O Instituto Nacional do Câncer (Inca) também desmentiu a postagem. A médica infectologista Marianne Monteiro, chefe da divisão clínica do Inca e membro da Comissão de Controle e Infecção, explicou que “as vacinas são um dos principais métodos de prevenção de doenças infecciosas e não são causadoras de doenças”.

A especialista também comentou que a vacina contra o H1N1 está liberada para pacientes com imunossupressão, inclusive câncer. “Os profissionais de saúde devem ser vacinados e também dar as orientações para a vacinação de seus pacientes”, concluiu.

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma falsidade.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Compartilhado em 30 de abril no TikTok, o vídeo checado somava, até a manhã do dia 8 de maio, 420,9 mil visualizações, 22,6 mil curtidas e 2 mil comentários.

Como verificamos: O Comprova consultou o Butantan, produtor da vacina contra o vírus H1N1 no Brasil, e o Inca para falar sobre a suposta relação entre as vacinas e o desenvolvimento de câncer.

Também pesquisou no site da Organização Mundial da Saúde (OMS) sobre as vacinas que usavam vírus em suas composições e a explicação de como elas são feitas para que se garanta a segurança do imunizado.

Vacinas que usam vírus

Atualmente existem vacinas que fazem, sim, uso de vírus (enfraquecido ou em partes) em sua composição para estimular a resposta imune dos anticorpos. Entretanto, nenhuma delas possui quaisquer riscos de transmitir a doença ao imunizado.

Em 2021, a OMS divulgou um guia explicativo dos tipos de vacina que eram aplicadas contra a covid-19 e que faziam uso de vírus. A lista inclui vacina inativada, vacina atenuada ao vivo, vacina vetorial viral, vacina subunita e vacina de ácido nucleico.

As mais comuns são as de vírus inativado e de vetor viral:

  • A primeira consiste no uso de produtos químicos, calor ou radiação para matar ou inativar o vírus, impossibilitando-o de contaminar o vacinado ou gerar efeitos patológicos nas pessoas.
  • A segunda conta com o uso de vírus seguros, que fornecem sub-partes específicas do germe de interesse – chamadas proteínas (como a spike) – para que possa desencadear uma resposta imune sem causar doenças nos imunizados.

Vídeo circula pelo menos desde 2018

A gravação compartilhada no TikTok possui uma marca d’água com o nome “med natural”. Na busca pelo vídeo original, o Comprova encontrou matéria do Fantástico de 2019 que usava trecho do conteúdo checado como exemplo de desinformação sobre as vacinas.

Na matéria, o vídeo aparecia como uma gravação compartilhada no YouTube com o título “A indústria fará de tudo para você não ver este vídeo! Prof. Jaime Bruning 2019”. A reportagem televisiva borrou o nome do canal em que o conteúdo tinha sido publicado.

Ao procurar pelo nome da gravação no YouTube, a equipe de checagem não achou nenhum resultado, o que pode indicar que o conteúdo foi excluído ou ocultado.

Buscando, entretanto, pelo mesmo título no Google, foi possível chegar a uma publicação da página no Facebook “Saúde é qualidade de vida”, que mostra o vídeo na íntegra. O post, de 13 de novembro de 2018, divulga o livro de Bruning, uma palestra do autor, o seu blog e um link para um vídeo no YouTube que virou privado.

Quem é Jaime Bruning

No site de Jaime Bruning atualmente disponível não há informações sobre quem ele é. Há apenas uma página onde consta uma nota em que ele se diz alvo de “acusações, denúncias e perseguição implacável de pessoas que se utilizam de alguns meios de comunicação tendenciosos” por seu trabalho como “terapeuta naturista”. No mesmo texto, ele afirma que interrompeu seus atendimentos ao público.

Contudo, analisando o código-fonte do site (captura de tela feita em 8 de maio de 2023), é possível acessar o conteúdo antigo da página. Nele, Jaime se diz terapeuta naturista e afirma ter feito “mais de três mil palestras em todos os estados do Brasil e também no exterior”. Ele também diz ser formado em Filosofia.

Nessa página, há links para a venda de um folder e de um livro sobre supostas terapias naturais de cura. Neles, há um aviso indicando que Brunning não é médico.

Jaime já foi citado em matéria do Estadão que apontava disseminadores de desinformação que usavam o alcance da audiência para vender produtos como suplementos, cursos e livros.

O que diz o responsável pela publicação: O conteúdo foi publicado pelo perfil @didibraga4 no TikTok, mas a conta não mostra informações de contato e não aceita envio de mensagens pela plataforma. O Comprova buscou no Google e na ferramenta UserSeach pela usuária em outras redes sociais e não encontrou nenhum resultado com o mesmo nome. Seu perfil compartilha majoritariamente vídeos não autorais e contrários ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

O que podemos aprender com esta verificação: Conteúdos com desinformação antivacina utilizam afirmações impactantes para disseminar o medo na audiência, como a de que a pessoa possa desenvolver câncer caso se imunize. Nesse caso, o homem no vídeo cita nomes de livros em que estariam tais informações, mas, ao pesquisar sobre as publicações, é possível perceber que são livros de cunho religioso e espiritual, não publicações científicas. Outra estratégia também usada neste vídeo é a de relatar o caso específico de um indivíduo, impossível de ter a veracidade verificada, como “prova” da suposta informação repassada.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: O Comprova desmentiu por diversas vezes postagens que relacionavam as vacinas com doenças diversas. Já explicou que os imunizantes contra a pólio não causam câncer, e que aqueles contra a covid-19 não causam anomalia genética, não transmitem HPV, nem HIV ou geram problemas de infertilidade.

Saúde

Investigado por: 2023-05-05

Texto repete afirmações falsas de médico norte-americano para criar temor sobre vacinas contra covid-19

  • Falso
Falso
É falso um texto que viralizou no Twitter e que relaciona imunização a aumento de casos de infertilidade ou incidência de tumores. Não há embasamento científico nesta tese, já que os imunizantes tiveram sua segurança comprovada em estudos clínicos. Além disso, o conteúdo exagera na relevância atribuída ao médico norte-americano citado.

Conteúdo investigado: Postagem do site Jornal Tribuna Nacional com o título “O melhor patologista do mundo adverte que centenas de milhões de vacinados estão contraindo câncer e se tornando inférteis”, sobre falas do médico norte-americano Ryan Cole acerca dos supostos efeitos das vacinas de RNA mensageiros (mRNA) contra covid-19. O texto é uma reprodução do site The Exposè.

Onde foi publicado: Site do Jornal Tribuna Nacional e Twitter.

Conclusão do Comprova: É falso o conteúdo de um texto publicado pelo site Tribuna Nacional, que viralizou no Twitter, no qual o autor reproduz afirmações do médico patologista norte-americano Ryan Cole de que o uso de vacinas de RNA mensageiros (mRNA), como algumas das utilizadas contra a covid-19, provocaria um aumento de casos de câncer e infertilidade. Não há comprovação científica sobre essa relação.

Em abril deste ano, o Ministério da Saúde desmentiu que as vacinas causem infertilidade. Estudo feito com homens norte-americanos entre 18 e 50 anos vacinados contra a covid-19 não mostrou alteração na contagem de espermatozoides, diferentemente do que afirma o texto checado. O que existem são estudos que mostram efeitos negativos no sistema reprodutor de homens que se infectaram e morreram de covid.

Segundo o Instituto Nacional de Câncer (Inca), não há evidência alguma de que vacinas causem câncer. “As vacinas são um dos principais métodos de prevenção de doenças infecciosas e não são causadoras de doenças”, disse o instituto em nota. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) também ressaltou ao Comprova que a relação entre a vacina contra a covid-19 e problemas de saúde graves como câncer e infertilidade não tem qualquer embasamento científico.

O Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC), agência do Departamento de Saúde e Serviços Humanos dos Estados Unidos, também ressalta que não há evidências de que as vacinas causem infertilidade em homens ou em mulheres. Inclusive, recomenda a vacinação para pessoas que desejam ter filhos.

O site brasileiro traduziu o texto de um site inglês que já foi banido do Twitter por publicar desinformação sobre a covid-19.

O Comprova classifica como falso o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma falsidade.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. O texto verificado aqui foi compartilhado no Twitter por pelo menos sete contas diferentes. Em uma delas, a postagem teve 73,5 mil visualizações até o dia 5 de maio.

Como verificamos: Buscamos informações a respeito do médico patologista Ryan Cole e questionamos a Sociedade Brasileira de Patologia (SBP) a respeito do título de “melhor patologista do mundo”. A pesquisa relacionada ao nome do médico gerou registros em sites internacionais que atribuem a ele informações similares a respeito de uma suposta relação entre as vacinas contra a covid-19 e doenças como câncer, infertilidade e coágulos sanguíneos.

Com isso, buscamos informações junto ao Inca e à Anvisa para checar se havia correspondência científica nas afirmações de Cole traduzidas pelo texto aqui investigado. Também buscamos informações no Ministério da Saúde sobre a relação da vacina de mRNA contra covid-19 com casos de infertilidade.

Vacina não causa infertilidade e nem câncer

Segundo o Ministério da Saúde, uma pesquisa da Universidade de Miami refutou a relação das vacinas contra a covid-19 baseadas em mRNA com a infertilidade. A pesquisa, publicada na revista científica Jama, ocorreu com homens entre 18 e 50 anos que receberam as duas doses do imunizante, e o estudo constatou que os pacientes vacinados não tiveram alteração na contagem de espermatozoides.

Por outro lado, o não uso do imunizante, ao facilitar a propagação da covid-19, pode causar impacto no sistema reprodutor masculino. “A pesquisa do Programa de Urologia Reprodutiva da Universidade de Miami realizou autópsias em 6 homens que morreram de covid-19. Os cientistas verificaram a presença do vírus no testículo de um deles e a redução na contagem de espermatozoides de outros três.”

O ministério cita ainda uma pesquisa feita pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), que avaliou 26 pacientes com idades entre 18 e 55 anos com casos leves e moderados de covid-19. Os pacientes não se queixavam de dores escrotais e, mesmo assim, 42,3% deles apresentaram epididimite. “Essa inflamação atinge os epidídimos, estruturas responsáveis parte do processo de maturação, às vezes do armazenamento e também do transporte dos espermatozoides”, explica.

Além disso, o autor do artigo desinformativo afirma que as doenças citadas são causadas pela “proteína Spike”, supostamente responsável pelo desenvolvimento de câncer e de coágulos sanguíneos. Porém, como a Anvisa ressaltou, “a vacina induz imunidade celular e produção de anticorpos neutralizantes contra o antígeno spike (S)”. É dessa forma, inclusive, que protege contra a covid-19. O Inca também confirma que não há qualquer comprovação científica que relacione aumento de casos de câncer com a vacinação.

A Anvisa esclareceu ainda que a maioria dos eventos adversos identificados após a vacinação contra a covid-19 não é grave, e está normalmente relacionada a efeitos no local da aplicação, como dor e inchaço, ou eventos de curta duração, como ocorrência de febre e indisposição. Essa informação está disponível na bula dos imunizantes.

Origem do texto

A publicação do Tribuna Nacional é uma reprodução do texto “Top pathologist confirms cancer, infertility & strange blood clots are common side effects of covid-19 vaccination”, do site britânico The Exposè. Esse mesmo site já foi objeto de outra checagem feita pelo Comprova.

No entanto, o site, criado em novembro de 2020, é reconhecido internacionalmente por propagar conspirações e desinformações sobre a covid-19. Ele é escrito pelo mecânico britânico Jonathan Allen-Walker e se tornou famoso por um dos seus artigos, reproduzido pelo Before It’s News. O site foi citado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) como fonte para relacionar as vacinas contra covid-19 com a incidência de AIDS. Em dezembro do ano passado, a Polícia Federal concluiu que Bolsonaro cometeu crime ao fazer tal relação.

Em 2021, o Twitter suspendeu a conta principal do The Exposè, que criou contas alternativas para evitar o banimento. A startup britânica Logically, especializada em combater e analisar a desinformação, descreveu o The Exposè como um site que promove um portfólio de mitos negacionistas da covid-19 e anti-vacina. O mesmo site é responsável por difundir desinformação sobre a origem da covid-19, composição da vacina e estatísticas relacionadas à doença.

Quem é Ryan Cole

O médico estadunidense Ryan Cole é dermatopatologista e trabalha de forma independente desde 2004. É fundador e atua como CEO do laboratório Cole Diagnostics, que realiza serviços de laboratório clínico e patologias. Ele participa da Associação de Médicos Independentes do estado norte-americano de Idaho.

A entidade é um grupo formado desde 2013 por profissionais de saúde que realizam práticas médicas próprias, com “liberdade de diagnosticar e tratar sem sobrecarga de interesses potencialmente conflitantes”, segundo o site da organização. “Somos uma organização de médicos independentes em Idaho. Donos de nossas clínicas, portanto, livres para nos juntar a nossos pacientes na escolha de suas melhores opções de cuidados de saúde”, diz o site, em tradução livre.

Cole já havia questionado a eficácia e segurança das vacinas contra a covid-19. Por três vezes suas declarações sobre o assunto foram checadas e desmentidas pela FastCheck.Org. Em janeiro deste ano, foi aberta uma declaração de acusação contra a licença do médico no estado de Washington por suas declarações falsas ou enganosas sobre a covid-19.

“Melhor patologista do mundo”

A Sociedade Brasileira de Patologia informa que as informações dadas pelo médico Ryan Cole sobre as vacinas de mRNA são inverídicas. “Em consulta a bases de dados, não foram encontradas pesquisas publicadas em nome dele sobre o tema”, confirmou. Sobre ser considerado o melhor patologista do mundo, a SBP reforça que não existe um ranking mundial de patologistas.

Segundo a entidade, “eventualmente entidades da área em todo o mundo promovem homenagens e condecorações de reconhecimento a médicos patologistas de destaque”. Em uma pesquisa no Google sobre condecorações a patologistas mundiais, a maior referência é da revista The Pathologist, com sedes no Reino Unido e nos Estados Unidos. Eles publicam anualmente uma lista de profissionais influentes na área.

Em 2015, a lista foi feita entre os patologistas para definir qual seria o mais influente da área e o escolhido foi o português Manuel Sobrinho Simões. Em nenhuma das listas anuais da revista o médico Ryan Cole é citado em qualquer categoria.

Com relação à atuação do profissional médico com especialização em patologia, a SBP reitera que, em geral, “é responsável pelo laudo anatomopatológico de exames realizados em biópsias ou peças cirúrgicas, atuando em laboratórios, hospitais e universidades”.

“Este profissional é quem diagnostica o câncer, definindo se um tumor é maligno ou benigno. Com base nesses laudos, clínicos e cirurgiões que acompanham os pacientes podem decidir entre as opções de tratamento. Eventualmente, os clínicos examinam com os patologistas os detalhes técnicos específicos dos laudos e, em alguns casos, discutem opções de tratamento”, informa a entidade médica.

O que diz o responsável pela publicação: O Tribuna Nacional afirma que a publicação ocorreu porque entende que é preciso “mostrar também o outro lado da moeda e não apenas seguir o que alguns ditam como regra e o restante copia, pois estão estourando muitos casos com efeitos adversos e os meios de comunicação não estão divulgando”- embora não haja embasamento para fazer tal afirmação. Ele complementa que o texto foi publicado originalmente no The Exposè, o qual considera “internacional e confiável”.

O que podemos aprender com esta verificação: Desinformadores com frequência utilizam materiais falsos traduzidos de outras línguas e citando supostos especialistas de outros países para dar a impressão de credibilidade ao conteúdo falso. Da mesma forma, utilizam termos técnicos, gráficos e imagens desconhecidos da maior parte da população para confundir o leitor. Uma estratégia que pode ser observada neste caso é o uso de dados imprecisos sem a fonte. No título o autor diz que “centenas de milhões de vacinados” estariam sendo prejudicados. Não há no texto a origem desse dado.

Outro ponto a ser notado no texto em questão como estratégia de desinformação é a citação de alguma autoridade como a “melhor do mundo” ou algum título atribuído de maneira genérica, com o interesse de dar peso ao informante. Por isso, é necessário sempre desconfiar de textos chamativos que conclamam alguém desconhecido da maior parte da população como uma pessoa de referência em determinada área.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: As desinformações realizadas pelo médico Ryan Cole já foram alvo de diversas verificações em todo o mundo desde 2020. Em 2021, o Projeto Comprova já havia considerado como enganosa sua afirmação sobre o aumento de casos de câncer após o uso da vacina contra covid-19. Outras agências, como a FactCheck.org e a Fato ou Fake, do G1, também já realizaram checagens sobre falas do médico.

Política

Investigado por: 2023-05-05

Vídeo de estádio lotado entoando ‘Sou Bolsonaro’ é da Festa do Peão de 2022, não da Agrishow de 2023

  • Enganoso
Enganoso
Ao contrário do que afirmam posts nas redes sociais, o vídeo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) sendo aclamado por uma multidão em um estádio não foi filmado na 2ª edição da ​​feira internacional de tecnologia agrícola, conhecida como Agrishow, realizada em maio de 2023, em São Paulo. Na verdade, a gravação é da participação de Bolsonaro na Festa do Peão de Barretos, em 26 de agosto de 2022, conforme confirmado pela assessoria da associação organizadora do evento.

Conteúdo investigado: Publicações no Twitter e TikTok trazem vídeo de uma multidão em uma arena cantando “Eu sou Bolsonaro, com muito orgulho, com muito amor” para o ex-presidente, que aparece junto do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), e do senador Marcos Pontes (PL-SP). No Twitter, o post afirma que a gravação teria sido feita durante a Agrishow em Ribeirão Preto (SP), em 30 de abril de 2023. Já no TikTok, o usuário diz que a filmagem foi feita no mesmo evento, mas em 1º de maio deste ano.

Onde foi publicado: TikTok e Twitter.

Conclusão do Comprova: São enganosos posts que mostram vídeo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) sendo ovacionado por um estádio lotado como se fosse em sua participação na Agrishow deste ano. A gravação, que mostra o público entoando “Eu sou Bolsonaro, com muito orgulho, com muito amor”, é, na verdade, da participação dele na Festa do Peão de Barretos (SP), em 26 de agosto do ano passado, como confirmado pela assessoria de imprensa de Os Independentes, associação organizadora do evento.

Bolsonaro esteve na Agrishow, feira de tecnologia agrícola em Ribeirão Preto, no interior paulista, no dia 1º de maio, e o público entoou músicas de apoio a ele, mas era menos gente, como é possível verificar em vídeos do evento.

O Comprova classifica como enganoso todo conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Até o dia 5 de maio, o post no TikTok alcançou 1,4 milhão de visualizações, 87,5 mil curtidas e 7,7 mil comentários. Até o dia 3, a publicação no Twitter teve 12,2 mil visualizações e 1,7 mil curtidas. O tuíte, no entanto, foi bloqueado porque o proprietário da conta limitou quem pode ver suas publicações.

Como verificamos: A reportagem constatou logo de início que não se tratava de vídeos da Agrishow, já que Bolsonaro havia acabado de participar do evento e nada fora noticiado sobre um estádio ovacionando-o. Além disso, o espaço da Agrishow não abriga uma arena.

Para descobrir que evento era o retratado nos posts, foram feitas buscas no Google por termos como “Bolsonaro”, “Tarcísio”, “Marcos Pontes” (os dois aparecem no conteúdo) e “com muito orgulho, com muito amor”. Elas trouxeram como resultado uma reportagem do UOL, de 26 de agosto de 2022, sobre a participação do então presidente na Festa do Peão de Barretos. No link, há um vídeo que mostra Bolsonaro, Tarcísio, Marcos Pontes e o empresário Luciano Hang com as mesmas camisas do conteúdo verificado aqui e em uma arena.

A partir daí, a reportagem buscou outros vídeos do evento em Barretos e, com a ferramenta InVid, conseguiu se certificar de que os posts não eram da Agrishow, mas, sim, da Festa do Peão de 2022.

Com esta informação, a equipe contatou as assessorias de imprensa da Agrishow, do Instituto Agronômico (IAC), visitado por Bolsonaro durante a feira agrícola deste ano, e do grupo que organiza a festa de Barretos. Também entrou em contato com os responsáveis pelas publicações nas redes sociais.

O que diz o responsável pela publicação: O conteúdo foi publicado pelos perfis @EliseWilshaw e @PrValdirSoaresOfc no Twitter e TikTok, respectivamente. Como a primeira conta não mostra informações de contato, o Comprova buscou no Google pela usuária em outras redes sociais. Encaminhamos mensagem pelo Instagram, mas não houve retorno até a publicação da checagem.

A pessoa responsável pelo perfil no TikTok possui uma conta no Facebook na qual disponibiliza contatos de telefone e e-mail. Por WhatsApp, o usuário disse que encontrou o vídeo no Kwai e que o texto sob a gravação já estava na publicação. A intenção do post, segundo ele, é prestar apoio ao ex-presidente Bolsonaro.

O que podemos aprender com esta verificação: É comum que disseminadores de desinformação reutilizem vídeos antigos fora de contexto para sugerir, de forma enganosa, que um determinado episódio ocorreu recentemente.

No caso dos conteúdos investigados nesta checagem, o espectador já poderia desconfiar da informação, porque ambos afirmam que a Agrishow deste ano teria ocorrido em duas datas diferentes (1º de maio e 30 de abril). Com uma pesquisa no Google, é possível identificar que na feira de 2023, Bolsonaro está utilizando uma roupa diferente da mostrada no vídeo enganoso, por exemplo.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: No ano passado, a agência Lupa checou conteúdo que também envolvia Bolsonaro e a Agrishow. Em verificações anteriores envolvendo a utilização de gravações fora de contexto, o Comprova mostrou que vídeo em que Alckmin e Moraes são hostilizados é de 2016 e foi gravado na USP, que homens dançando ao som de “Infiel” não são ministros de Lula e que vídeo usa reportagem sobre apreensões de carros no governo Bolsonaro para criticar gestão Lula.

Política

Investigado por: 2023-05-02

Conflito entre agricultor e policiais militares em plantação não tem relação com governo do PT

  • Enganoso
Enganoso
É enganoso o vídeo que atribui ao governo do PT uma ação de policiais militares contra um agricultor. As imagens foram feitas no dia 5 de abril de 2023 na localidade de Água Preta, distrito do município de São João da Barra (RJ), onde há anos ocorre uma disputa entre produtores rurais e a joint venture Gás Natural Açu (GNA), responsável pela construção de usinas termelétricas e do Porto do Açu na região. As desapropriações são conduzidas pelo governo do Rio de Janeiro, desde 2021 sob o comando de Cláudio Castro (PL).

Conteúdo investigado: Vídeo que mostra policiais militares mandando que um trator passe por cima de uma lavoura e usando spray de pimenta contra um homem, aparentemente responsável pela plantação. Sobre a imagem, há um texto onde se lê: “esse eh o governo de vcs petistas”.

Onde foi publicado: TikTok.

Conclusão do Comprova: É enganoso o vídeo que atribui ao governo do PT a ação de ao menos três policiais militares contra um homem em uma lavoura de abacaxi no município de São João da Barra, no Rio de Janeiro. No vídeo, os agentes mandam que um trator passe por cima da plantação, enquanto lançam spray de pimenta sobre o rosto de um homem, que tenta impedir a ação. As imagens foram gravadas no dia 5 de abril de 2023 na localidade de Água Preta, distrito de São João da Barra.

No vídeo, é possível identificar a farda da Polícia Militar fluminense pela bandeira do Estado no braço direito dos agentes. A Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro (PMERJ) confirmou que a ação foi realizada por agentes do 8º Batalhão de Polícia Militar (BPM) de Campos dos Goytacazes, que foram acionados após um relato de descumprimento de ordem judicial em um terreno no distrito de Água Preta, em São João da Barra. O local é alvo de disputa entre agricultores que vivem na região e a Gás Natural Açu (GNA), uma empresa privada que constrói uma usina termelétrica na região.

Diferentemente do que afirma o texto escrito sobre a imagem, não há relação entre a ação dos policiais e qualquer governo do PT. A PM é subordinada ao Estado, que, no caso, é governado desde 2021 por Cláudio Castro, do PL, partido de oposição ao PT. O Rio de Janeiro não é governado pelo PT desde 2002, quando Benedita da Silva, que era vice de Anthony Garotinho, assumiu o posto após ele se licenciar para se candidatar à Presidência da República.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Até o dia 2 de maio, este vídeo havia alcançado 213,2 mil visualizações no TikTok.

Como verificamos: Primeiramente, o Comprova fez a transcrição da narração do vídeo, e identificou, nos segundos finais, uma voz masculina que afirma: “O produtor rural não tem força diante do dinheiro da GNA”. O narrador também fala em “força policial” e “Porto do Açu”. Por isso, o próximo passo foi buscar por estes termos no Google, associados à palavra “plantação”.

O resultado levou a uma publicação feita no dia 9 de abril de 2023 no site A Nova Democracia, que exibia o mesmo vídeo, denunciava uma ação da Polícia Militar na região de São João da Barra e mencionava a empresa GNA.

O Comprova, então, procurou por reportagens sobre o assunto e localizou uma publicação do Estadão de 9 de outubro de 2022 sobre as desapropriações no Porto do Açu, que fica na mesma região e pertence à mesma joint venture, e outra no site Ururau a respeito da ação policial que foi registrada no vídeo.

Em seguida, foram procuradas a Polícia Militar do Rio de Janeiro, a empresa GNA e o geógrafo Marcos Antonio Pedlowski, professor da Universidade Estadual do Norte Fluminense (UENF) e chefe do Laboratório de Estudos do Espaço Antrópico (LEEA), que acompanha o caso.

Vídeo foi feito em São João da Barra, no Rio de Janeiro

As imagens registradas no vídeo aqui investigado foram feitas no dia 5 de abril de 2023 na localidade de Água Preta, distrito do município de São João da Barra, na região de Campos dos Goytacazes, no Rio de Janeiro. Na ocasião, policiais militares do 8º Batalhão de Polícia Militar foram acionados pela empresa privada GNA porque, segundo relato feito à polícia, um homem impedia a passagem de máquinas para a construção de uma linha de transmissão que ligará uma usina termelétrica ao Sistema Interligado Nacional, em São João da Barra.

A região é alvo de disputa há anos. De um lado está a empresa GNA, que já construiu no local uma usina termelétrica, a GNA I, e que agora ergue uma segunda, a GNA II, com início da operação previsto para 2025. Para que a usina opere, contudo, é preciso que passem pelo local linhas de transmissão ligando a usina termelétrica ao Sistema Interligado Nacional. Do outro lado da disputa estão as famílias proprietárias das terras por onde passarão as linhas de transmissão.

De acordo com o geógrafo Marcos Antonio Pedlowski, professor da UENF que acompanha a situação, o conflito nesse caso específico se dá porque não há consenso entre as famílias e a empresa a respeito dos valores pagos como indenização pelo uso por tempo indefinido das terras.

“As famílias que possuem as propriedades que ficaram no caminho das torres de transmissão reclamam dos baixos valores pagos pela GNA para impedir o uso das terras que ficarem dentro da faixa de servidão. Por isso estão acontecendo conflitos entre a GNA e essas famílias”, explica Pedlowski.

Já a GNA informou, em nota, que a empresa ganhou na Justiça o direito de usar a faixa de servidão – o trecho de terra ao lado das torres de eletricidade – para a passagens das linhas de transmissão que ligarão a usina termelétrica em construção ao Sistema Interligado Nacional. “Proprietários afetados pela faixa de servidão receberam oferta de indenização pelo acesso e uso da área. Os que não aceitaram tiveram indenizações depositadas em juízo”, diz a nota.

Policiais mandaram destruir lavoura de abacaxi recém-plantada

De acordo com o professor Marcos Antonio Pedlowski, a decisão judicial que autorizou o uso da faixa de servidão pela empresa GNA foi uma liminar de um juiz de São João da Barra, afetando centenas de produtores, incluindo os donos da terra onde as imagens foram feitas. Segundo ele, os donos da propriedade arrendaram um pedaço do terreno para um homem que fez no local uma plantação de abacaxi, mas a área arrendada ficava justamente dentro da faixa de servidão, o que desencadeou o conflito.

A GNA informou em nota que, apesar da decisão judicial, na semana do dia 5 de abril, “a equipe da empresa foi impedida de exercer suas atividades por um bloqueio físico feito por um indivíduo que se apresentou como novo responsável pela área e dono de uma recente lavoura de abacaxi”. Por isso, a Polícia Militar foi acionada.

Segundo a PMERJ, os policiais do 8º BPM (Campos dos Goytacazes) foram acionados devido a um relato de descumprimento de ordem judicial em terreno na localidade de Água Preta. “Segundo os policiais militares que estavam na ocorrência, houve resistência de pessoas que encontravam-se no local e, a princípio, descumprindo a determinação judicial”, disse a PMERJ, em nota.

No vídeo investigado, é possível ver quando um dos policiais manda que um trator passe por cima da plantação, enquanto o homem que tenta impedir a ação recebe no rosto o que parece ser um jato de spray de pimenta. A ação truculenta foi notícia em sites locais (A Nova Democracia e Ururau) e a PMERJ informou que “o 8ºBPM instaurou um procedimento apuratório interno a respeito desta ocorrência”. O inquérito está em andamento.

Não há ligação entre a ação policial e o governo do PT

Apesar de mostrar uma situação real, o vídeo engana ao afirmar, com um texto sobre a imagem, que a ação registrada é do governo petista, insinuando uma relação com o governo federal do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Na realidade, as partes envolvidas no conflito são uma empresa privada, a GNA, os proprietários das terras por onde passam as linhas de transmissão da usina que está sendo construída, e a Polícia Militar do Rio de Janeiro, vinculada ao governo do estado, e não ao governo federal.

Desde 2021, o Rio de Janeiro é governado por Cláudio Castro, do PL, partido que faz oposição ao PT. A última vez que um petista ocupou o Palácio Guanabara foi em 2002, muito antes do conflito que aparece nas imagens.

O que diz o responsável pela publicação: A reportagem não conseguiu contatar o perfil que postou o vídeo, uma vez que o TikTok, onde o conteúdo foi postado, não permite o envio de mensagens entre contas que não se seguem.

O que podemos aprender com esta verificação: O vídeo mostra um conflito entre policiais e um agricultor, sem informar onde ou quando aconteceu. No entanto, há elementos no conteúdo que permitem identificar algumas pistas: o narrador menciona o nome de uma empresa e fala sobre a polícia, mas não se refere em momento algum ao governo federal ou ao PT, o que já é um indício de que o contexto talvez seja outro. Uma busca rápida por vídeos na internet que envolvem o nome da empresa e um conflito com policiais rapidamente leva ao conteúdo original, que mostra não haver mesmo uma relação com o governo petista.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: O Comprova já desmentiu conteúdo que enganava sobre conflito no campo no governo Bolsonaro e mostrou que a retirada de produtores de arroz de terras indígenas não havia sido determinação de Lula.

Política

Investigado por: 2023-04-28

Projeto de lei não proíbe versículos bíblicos nas redes sociais, ao contrário do que diz post

  • Enganoso
Enganoso
É enganosa a afirmação do deputado federal Deltan Dallagnol (Podemos-PR) de que a aprovação do Projeto de Lei 2630/2020, conhecido com “PL das Fake News”, poderá acarretar no banimento de versículos da Bíblia das redes sociais. A proposição, já aprovada no Senado e que agora tramita na Câmara Federal, visa estabelecer normas de transparência para plataformas de busca e de mídias sociais no Brasil e, dentre outros pontos, cria medidas de combate à disseminação de conteúdo falso nesses ambientes. O texto ainda está em discussão no legislativo e foi modificado pelo relator da Câmara, Orlando Silva (PCdoB-SP), mas a versão apresentada inicialmente, e comentada por Dallagnol, já previa a proteção à liberdade de expressão e à manifestação religiosa, alinhada ao que estabelece a Constituição.

Conteúdo investigado: Postagens no Twitter, no Facebook e no grupo de Telegram do deputado federal Deltan Dallagnol (Podemos-PR), em 24 de abril, afirmam que alguns versículos da Bíblia serão banidos das redes sociais caso o Projeto de Lei 2630/2020, o “PL das Fake News”, seja aprovado. Em uma imagem, há menção a 11 versículos bíblicos que tratam de temas como submissão feminina, relações homossexuais e aplicação de castigos físicos às crianças. “Até a fé será censurada se nós não impedirmos a aprovação do PL da Censura que terá sua primeira votação AMANHÃ!”, escreveu.

Onde foi publicado: Twitter, Facebook e Telegram.

Conclusão do Comprova: É enganosa a postagem feita por Deltan Dallagnol em que ele afirma que versículos da Bíblia serão banidos das redes sociais caso o Projeto de Lei 2630/2020, conhecido como “PL de Fake News”, seja aprovado na Câmara.

No Twitter, o parlamentar cita textos bíblicos que tratam de temas como a submissão da mulher ao homem, relações entre pessoas de mesmo sexo e o uso de violência para educar os filhos.

O texto aprovado no Senado em 30 de junho de 2020 e que está em discussão na Câmara Federal não faz nenhuma referência explícita à supressão de postagem com trechos bíblicos ou restrição de publicação desse tipo de conteúdo. Na realidade, a proposta traz a salvaguarda das manifestações religiosas entre os conteúdos que devem ser removidos ou ocultados pelas plataformas de redes sociais.

No texto inicial do projeto que tramita na Câmara dos Deputados, o mesmo dispositivo foi mantido, desta vez no artigo 6º. Além disso, a redação é alinhada ao que estabelece a Constituição Federal, na qual a liberdade de consciência e de crença são atestadas como invioláveis.

O texto do PL ainda será votado no plenário da Câmara e o relator do projeto, o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), afirmou que a proposição traz de forma explícita que as medidas de combate à desinformação e ao discurso de ódio previstas no PL não atingirão a liberdade religiosa.

Silva apresentou a versão do texto que deve ser votada em 27 de abril. Assim como o texto original, a nova redação proposta não faz alusão direta e explícita à supressão ou ao impedimento de postagens de trechos bíblicos.

A palavra “discriminação” foi retirada do texto também em uma tentativa do relator de atender à demanda da bancada evangélica, que diz temer a censura de conteúdo religioso. O trecho do PL dizia antes que o Estado era obrigado a promover campanhas contra desinformação para combater o discurso de ódio baseado em discriminações. O termo, para a bancada, barraria publicações opinativas

O Comprova classifica como enganoso todo conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. No Twitter, o conteúdo teve 513,8 mil visualizações, 10,9 mil curtidas e 3,7 mil compartilhamentos até o dia 28 de abril. No Facebook, até a mesma data, o post alcançou 1,4 mil interações, entre curtidas, comentários e compartilhamentos. No Telegram, a publicação teve 22 mil interações até 25 de abril.

Como verificamos: O primeiro passo foi procurar mais informações sobre o Projeto de Lei 2630/2020, citado pelo deputado no post, como o texto original da proposta e sua tramitação atual. Para isso, o Comprova consultou os sites da Câmara dos Deputados e do Senado Federal.

Depois, por meio de buscas no Google pelas palavras-chave “PL 2630/2020” e “textos bíblicos”, encontramos checagens das agências Lupa e Aos Fatos e do Coletivo Bereia (especializado em checagem de conteúdo voltado ao público gospel), além de reportagens da Terra, CartaCapital, Veja e O Globo. A procura também retornou publicações em sites direcionados ao público evangélico que mencionam o PL e o suposto banimento de versículos da Bíblia nas redes sociais.

Também consultamos a Constituição Federal a respeito da liberdade de crença e procuramos no Google por propostas que poderiam ensejar o banimento de versículos da Bíblia por meio dos termos “PL” + “versículos da Bíblia”.

Como resultado, encontramos dois projetos de 2019 do deputado federal Pastor Sargento Isidório (Avante-BA): PL 2/19, que queria proibir o uso indiscriminado da palavra “Bíblia” ou da expressão “Bíblia Sagrada” em publicações impressas ou eletrônicas, e o PL 4606/2019, que proíbe “qualquer alteração, edição ou adição aos textos da Bíblia Sagrada, composta pelo Antigo e pelo Novo Testamento em seus capítulos ou versículos”.

O primeiro projeto foi arquivado em março de 2022, enquanto o segundo aguarda apreciação pelo Senado. Nenhum deles pretende proibir a publicação de versículos bíblicos nas redes.

Por fim, o Comprova pesquisou o conteúdo de cada versículo citado no tuíte e entrou em contato com a assessoria de imprensa de Dallagnol.

Textos do PL no Senado e na Câmara

Ao buscar pela referência do texto original apresentado no Senado e na Câmara, verificamos que as versões do PL 2630/2020 disponíveis para consulta pública já previam que as sanções das redes sociais não se aplicariam a conteúdo religioso.

O texto inicial que tramitou no Senado, ainda em 2020, apresentado pelo senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) afirma no parágrafo 9º que “as medidas estabelecidas no caput devem ser ser proporcionais, não discriminatórias e não implicarão em restrição ao livre desenvolvimento da personalidade individual, à manifestação artística, intelectual, de conteúdo satírico, religioso, ficcional, literário ou qualquer outra forma de manifestação cultural”.

No Senado, a proposição foi aprovada em junho daquele ano e depois seguiu para a Câmara, onde tramita há três anos. Com a mobilização relacionada ao combate aos ataques às escolas no Brasil, nos últimos meses, o debate sobre a necessidade de retomada da discussão do PL voltou a se intensificar. Nesse contexto, o trâmite da proposta voltou a caminhar na casa legislativa.

O texto do PL enviado do Senado à Câmara previa no artigo 6º a não aplicabilidade de sanção por parte das redes sociais a conteúdo religioso: “As vedações do caput não implicarão restrição à manifestação artística, intelectual ou de conteúdo satírico, religioso, político, ficcional ou literário, ou a qualquer outra forma de manifestação cultural, nos termos dos arts. 5º, inciso IX, e 220 da Constituição Federal”.

Na casa legislativa há uma disputa entre parlamentares contrários e favoráveis ao projeto. Nesse debate, propostas de modificações ao texto foram apresentadas e organizadas pelo relator, o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), que, em 27 de abril, apresentou oficialmente a versão do texto que deve ser votada.

A nova redação proposta, assim como o texto original, não faz alusão direta e explícita à supressão ou ao impedimento de postagens de trechos bíblicos.

No texto do relator, os artigos 1º e 3º do PL, que citam o tema da religiosidade, apontam que as condicionantes previstas na lei não implicarão na restrição de conteúdos religiosos e que a legislação deverá observar “o livre exercício da expressão e dos cultos religiosos, seja de forma presencial ou remota, e a exposição plena dos seus dogmas e livros sagrados”, respectivamente.

Além disso, conforme já apontado, a redação do PL tem referências declaradas à garantia constitucional das liberdades, incluindo a de expressão e a religiosa.

Desinformação sobre trechos da Bíblia

A postagem enganosa feita por Dallagnol acerca da suposta censura a publicação de versículos bíblicos tem circulado, justamente, no contexto de intensos conflitos entre os grupos favoráveis e contrários à aprovação do PL.

No dia 23 de abril, postagens de teor semelhante foram feitas no Instagram da Frente Parlamentar Evangélica do Congresso Nacional (FPE), na qual o deputado federal Eli Borges (PL-TO), presidente da Frente, diz que o PL pode trazer problemas à comunidade religiosa.

Diante da difusão dessa informação enganosa, o relator do projeto Orlando Silva destacou em vídeo publicado em 26 de abril, ao lado do deputado Cezinha da Madureira (PSD-SP), ex-coordenador da Frente Parlamentar Evangélica, que “a Bíblia é intocável”. E ressaltou: “É fake news imaginar que se possa mexer com o texto sagrado”.

Publicamente, o relator tem destacado que nem a versão inicial do PL, nem a proposta feita após algumas discussões têm qualquer restrição ao conteúdo bíblico. Ele tem afirmado publicamente que haverá um esforço extra na estruturação do texto para evitar qualquer interpretação que possa dificultar a livre prática religiosa.

No dia 25 de abril, os deputados aprovaram o regime de urgência da proposição. Com isso, o texto não passará mais por nenhuma comissão e será votado diretamente no plenário da Câmara. A previsão é que a votação ocorra no dia 2 de maio.

O que diz o responsável pela publicação: Ao Comprova, a assessoria do deputado encaminhou um vídeo postado no Instagram em 25 de abril de 11 minutos e 30 segundos em que Dallagnol faz um pronunciamento. Na gravação, que tem como título “A casa caiu! Me acusaram de divulgar ‘fake news’!”, o parlamentar lê os textos bíblicos que citou no tuíte e afirma que eles poderiam ser classificados como discriminatórios às mulheres e à população LGBTQIA+ por exemplo, e, por isso, seriam moderados ou retirados do ar.

“Tudo aquilo que for lido como um discurso de preconceito em relação à mulher, ‘o homem é a cabeça da mulher’ [em referência a Coríntios 11:3], qualquer coisa dessas que está lá na Bíblia, ainda que seja discurso religioso, vai ser considerado… tem potencial de ser considerado abuso, para ser moderado e controlado”, diz o parlamentar.

O que podemos aprender com esta verificação: Produtores de desinformação usam afirmações exageradas ou enganosas voltadas para causar comoção ou revolta em grupos específicos e angariar apoio ou promover rejeição a certos temas e assuntos que estão em discussão.

Para evitar ser enganado em casos que se referem a projetos de lei ou outros textos em discussão na Câmara e no Senado é recomendável procurar a fonte primária da informação. Ambas as casas divulgam nos seus sites a íntegra de todas as matérias discutidas.

No caso em questão, a publicação enganosa foi feita em um cenário de intensa disputa em torno do tema de bastante impacto que é a regulação das plataformas de redes sociais, o que inclui o combate a conteúdos de caráter criminoso e desinformativo nesses ambientes.

Logo, diante de debates de tamanha implicação, é fundamental ponderar a origem das informações recebidas e os objetivos da página/perfil que as divulgam, de modo a evitar a repercussão de versões que não têm amparo na realidade e buscam confundir a população em momentos cruciais de tomada de decisões.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: O tuíte de Dallagnol foi checado pelas agências Lupa e Aos Fatos, e pelo Coletivo Bereia. Veículos como Terra, CartaCapital e Veja noticiaram o caso afirmando que o deputado “compartilhou fake news”.

No ano passado, o Comprova mostrou que, utilizando declarações antigas de Dallagnol, vídeo enganava ao dizer que Lula poderia perder candidatura por conta da Lava Jato.

Política

Investigado por: 2023-04-28

Retirada de gado de áreas rurais tem a ver com desmatamento ilegal, não com suposta venda da Amazônia

  • Falso
Falso
É falso que o governo federal tenha vendido a Amazônia a outros países e que esteja ordenando a retirada de cabeças de gado de áreas embargadas para entregar as terras a compradores estrangeiros. Fazendeiros, de fato, foram notificados pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), mas as áreas a serem desocupadas foram embargadas por desmatamento ilegal. O objetivo da medida, segundo o órgão, é viabilizar a recuperação da floresta.

Conteúdo investigado: Post reproduz três vezes, em looping, imagens gravadas em uma área rural com um helicóptero decolando e outro em terra, e uma pessoa mostrando um documento. Na primeira vez, uma mulher diz: “Eles tão notificando as áreas embargadas e estão dando cinco dias para tirar os animal (sic)”. Na segunda, um homem afirma que a Amazônia foi vendida na época dos governos de Dilma Rousseff e Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e que ONGs estrangeiras se beneficiariam. Na terceira e última vez em que a gravação é exibida, outra voz cita que, no governo de Jair Bolsonaro (PL), foram retomadas terras que o PT havia entregado a outros países.

Onde foi publicado: TikTok e Facebook.

Conclusão do Comprova: Post mente ao se apropriar de vídeo de apreensão de gado na Amazônia e inventar narrativa de que a área foi vendida e terá base militar. A publicação viral, que usa imagens verdadeiras de helicópteros em uma propriedade rural, contém alegações falsas a partir de narrações inseridas sobre o vídeo original.

Em um dos áudios no vídeo, um homem não identificado cita cidades da Amazônia e diz que toda a área será desapropriada para ser entregue a outros países. Segundo ele, uma base militar será construída no local. Na terceira vez em que o vídeo é exibido, outro homem diz que Lula e Dilma entregaram terras a estrangeiros e que Jair Bolsonaro, quando presidente, “tomou tudo de volta” e deu aos sem-terras.

As afirmações não procedem. Ao Comprova, Ibama afirmou que os helicópteros mostrados no vídeo participavam da Operação Retomada, deflagrada na região de Uruará, no Pará. A ação, de acordo com publicação enviada pelo órgão, tem “foco na apreensão de gado criado em áreas já embargadas por desmatamento ilegal na Amazônia” para possibilitar a recuperação da floresta. O assunto foi noticiado pela imprensa profissional (UOL, Metrópoles, Correio Braziliense).

O Ibama confirmou ter notificado proprietários rurais, mas o motivo não tem relação com suposta venda das áreas. Na verdade, os fazendeiros notificados, segundo o órgão, descumpriram embargos, “o que caracteriza novo crime ambiental”. A notificação mostrada no vídeo diz respeito, portanto, ao descumprimento da lei. Uma verificação do mesmo conteúdo feita pelo Estadão Verifica também constatou, a partir de vídeo em melhor resolução, que o documento que aparece na imagem corresponde a notificação de área embargada por desmatamento ilegal. O vídeo, contudo, não está mais disponível.

Também não há registros de “venda da Amazônia” nos governos petistas ou de construção de base militar envolvendo países estrangeiros na divisa entre Tocantins e Maranhão. Não foram localizadas reportagens sobre suposta obra ou negociação. O tema vem sendo explorado há anos, em diferentes contextos, por produtores de desinformação, e a alegação de venda de terras foi negada pelo PT em 2020.

Verificação anterior do Comprova já mostrou ser falso que Lula tenha vendido solo da Amazônia.

Como sugere o vídeo verificado, Bolsonaro, de fato, enquanto presidente, afirmou ser contra a venda de terras para estrangeiros. Em 2021, firmou posição contrária a um Projeto de Lei (PL) que autorizava a comercialização de até 25% da área de municípios a empresas de outros países. O conteúdo omite, contudo, que o PT também se posicionou contra o PL, ocasião rara em que opositores estiveram lado a lado.

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma falsidade.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Até o dia 28 de abril, o post no TikTok somava 218,3 mil visualizações, 14,6 mil curtidas, 12 mil compartilhamentos e mais de 2,2 mil comentários. Já a publicação no Facebook acumulava 1,6 mil compartilhamentos, 1,4 mil curtidas e quase 800 comentários.

Como verificamos: O Comprova fez o download do vídeo do TikTok e usou a ferramenta Transkriptor para transformar o áudio do vídeo em texto. Com base nas alegações feitas pelos narradores, buscou no Google palavras-chave como “áreas embargadas, gado, Amazônia”; “base militar, venda, Amazônia”; e “venda, terras, Bolsonaro, estrangeiros”.

A pesquisa retornou verificação sobre o mesmo vídeo feita pelo Estadão Verifica, outras checagens envolvendo suposta venda da Amazônia e conteúdos jornalísticos.

A equipe também fez busca reversa das imagens, por meio do InVid, na tentativa de encontrar outras postagens que pudessem ter usado o mesmo vídeo. Por meio do recurso Image Upscaler, oferecido pelo site Clipdrop, aumentou a qualidade das imagens para buscar pistas no próprio vídeo.

Por fim, a equipe enviou e-mail para as assessorias de imprensa do Ibama e do Ministério da Defesa. O último órgão não havia respondido os questionamentos até a publicação desta verificação.

O que diz o responsável pela publicação: O Comprova enviou mensagem pelo TikTok ao perfil @clory_usa e, via Facebook, ao perfil de Vera Würzius. Ambos não deram retorno até a publicação da verificação.

O que podemos aprender com esta verificação: O conteúdo verificado faz uso de imagens com baixíssima qualidade. Essa é uma estratégia comumente usada por produtores de desinformação. Neste caso, a baixa resolução impede a leitura do documento exibido pela mulher na gravação.

Além disso, os narradores, que enfileiram informações sem citar fontes, não são identificados. Esse é um sinal de alerta. Um dos homens chega a usar o termo “a princípio”, o que indica que ele não tem certeza sobre o que o está falando.

Nesses casos, desconfie! Procure se informar sobre o tema, fazendo buscas no Google e lendo notícias divulgadas pela imprensa profissional. Se a Amazônia tivesse, realmente, sido vendida, o tema teria gerado repercussão mundial e motivaria uma série de reportagens sobre o assunto.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: O mesmo conteúdo foi desmentido pelo Estadão Verifica. Post similar, com alegações parecidas, foi classificado como falso pela Agência Lupa.

O Comprova já investigou outras peças de desinformação envolvendo o presidente da República e a suposta venda da Amazônia. Constatou, por exemplo, que vídeo engana ao dizer que Lula vendeu Amazônia a mineradora em troca de dinheiro para o Fundo Amazônia e que é falso que ele tenha vendido solo da Amazônia a empresa norueguesa em documento secreto.

Política

Investigado por: 2023-04-25

Lula não foi expulso de Portugal, ao contrário do que diz título de vídeo

  • Enganoso
Enganoso
É enganoso o título de um vídeo que circula no Facebook afirmando que uma convocação nacional em Portugal expulsou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) do país. Embora tenha ocorrido uma manifestação contra o chefe do Executivo brasileiro, Lula cumpriu agendas em Portugal entre os dias 21 e 25 de abril, como previsto desde sua partida do Brasil.

Conteúdo investigado: Título de vídeo no Facebook afirma que uma manifestação teria expulsado Lula e Janja de Portugal. “CONVOCAÇÃO NACIONAL EM PORTUGAL EXPULSA CASAL JANJO DO PAÍS ‘NEGÓCIO FICOU FEIO PARA O BARBA’”, diz o texto. No vídeo, contudo, o autor fala de uma manifestação prevista para o dia 25 de abril contra o presidente brasileiro. O conteúdo foi postado no dia 24 de abril.

Onde foi publicado: Facebook e YouTube.

Conclusão do Comprova: É enganoso o título de um vídeo no Facebook que diz que uma “convocação nacional” teria expulsado o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) de Portugal. O conteúdo foi publicado por volta das 11h do dia 24 de abril. Neste dia, o presidente participou pela manhã do Fórum Empresarial Portugal-Brasil e fez a entrega do Prêmio Camões a Chico Buarque.

Embora o título sugira que um protesto já teria expulsado o presidente brasileiro de Portugal, no vídeo o autor cita uma manifestação convocada para o dia seguinte da postagem, 25 de abril. Quem organizou a manifestação foi um partido da extrema-direita portuguesa, o Chega!, que fez postagens chamando para um ato pela manhã contra a presença de Lula no país.

O vídeo desinformativo cita o deputado André Ventura, presidente do partido Chega!, que deu diversas declarações à imprensa e nas redes sociais criticando o presidente brasileiro.

Lula optou, ainda em 21 de abril, por não participar da cerimônia em homenagem à Revolução de Cravos, comemorada no dia 25, no Parlamento português. A possibilidade dele discursar na cerimônia gerou revolta entre alguns partidos, inclusive o Chega!. Por essa razão, a CNN Portugal apurou que o presidente deixou de incluir a agenda.

Nesta terça-feira (25), ele participou de um evento no início da manhã, em uma sessão separada da que celebra oficialmente o aniversário da revolução, como informou a Folha, e, em seguida, viajou para Madri, na Espanha, como já era previsto desde antes de sua chegada a Portugal. Foi durante essa cerimônia que estava sendo planejado o protesto. Houve manifestação na porta do Parlamento, mas a polícia de Portugal não informou quantas pessoas participaram. Dentro do prédio, Lula foi vaiado por parlamentares do Chega! durante seu discurso, mas recebeu apoio de deputados da esquerda em forma de aplausos.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. No Facebook, o post foi visualizado 12 mil vezes e, no YouTube, 32 mil vezes até 25 de abril.

Como verificamos: Assistimos ao vídeo para entender do que se tratava e buscamos reportagens sobre a agenda de Lula em Portugal. Também entramos em contato com o Ministério das Relações Exteriores e com a Secretaria de Comunicação Social da Presidência (Secom), que não nos responderam até a publicação deste texto.

O que diz o responsável pela publicação: A reportagem não conseguiu contatar Fabiano Guiguet, autor da publicação enganosa que já teve outro conteúdo verificado pelo Comprova.

O que podemos aprender com esta verificação: Logo ao abrir o post, em uma primeira leitura do título, o leitor entende que Lula já teria sido expulso de Portugal, mas, ao assistir ao vídeo, essa informação não aparece – o autor do conteúdo fala de um protesto que seria realizado no dia seguinte ao da postagem. Assim, ao nos depararmos com conteúdos alarmistas que são publicados em redes sociais, sem fontes – e muitas vezes com todas as letras maiúsculas, como no post verificado aqui –, devemos desconfiar, porque é uma tática comum dos desinformadores usar títulos bombásticos para espalhar mentiras.

Usar títulos ou legendas espalhafatosas que não são confirmadas pelos conteúdos de vídeos ou links inseridos na postagem é uma tática comum de quem dissemina desinformação. Eles contam com algum tipo de reação emocional que induza ao compartilhamento imediato da postagem antes mesmo da leitura ou conferência do conteúdos presentes nos vídeos e links associados à publicação.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: Lula é alvo frequente de publicações duvidosas checadas pelo Comprova, como o vídeo que engana ao dizer que ele vendeu Amazônia em troca de dinheiro para o Fundo Amazônia e o post que afirma, erroneamente, que o governo federal decretou o fim da Zona Franca de Manaus.

Saúde

Investigado por: 2023-04-24

É enganoso post de deputado que questiona a eficácia das vacinas contra a covid-19

  • Enganoso
Enganoso
É enganoso tuíte em que o deputado federal Osmar Terra (MDB-RS) coloca em dúvida a eficácia e segurança das vacinas contra a covid-19. Em seu post, ele tira de contexto reportagens sobre a pandemia e, diferentemente do que ele afirma, as vacinas não foram retiradas da campanha de imunização, como confirmou o Ministério da Saúde ao Comprova.

Conteúdo investigado: Tuíte em que o deputado federal Osmar Terra (MDB-RS) publica títulos de reportagens da BBC News Brasil, da Associação Médica Brasileira e do G1 e escreve: “Mas não foi só a vacina Astrazeneca retirada da vacinação pelo Ministério da Saúde. A Jansen e a Coronavac também foram. Falta de eficácia e efeitos colaterais com risco, foram alegados. Na verdade não haviam completado os testes quando foram autorizadas pela Anvisa, de forma emergencial. Parte da fase 3 de testagem, foi feito direta em toda população, sem ter ideia ainda do que aconteceria…É isso?”.

Onde foi publicado: Twitter.

Conclusão do Comprova: O deputado federal Osmar Terra (MDB-RS) engana ao afirmar, em tuíte, que as vacinas da Astrazeneca e da Janssen e a Coronavac foram retiradas pelo Ministério da Saúde da campanha de imunização contra a covid-19. Ele desinforma ao escrever que “falta de eficácia e efeitos colaterais com risco foram alegados” e que elas foram aprovadas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) com testes ainda incompletos.

Na publicação, o deputado posta prints de reportagens de diferentes sites. O título do texto da BBC News Brasil é “Por que Brasil deixou de recomendar uso das vacinas Astrazeneca e Janssen contra covid-19?”; o da Associação Médica Brasileira (AMB), “Sem demanda e registro definitivo, Butantan suspende produção de Coronavac”; e, por último, o do G1, “Investigação sobre morte de gestante de 35 anos levou à suspensão do uso da vacina Astrazeneca, diz Anvisa”.

Sobre o texto da BBC, a própria reportagem diz que “a interrupção do uso e produção do imunizante [Astrazeneca] pelo Ministério da Saúde nada tem a ver com a eficácia, mas sim com um possível risco aumentado de trombose dias após a vacinação, segundo documento publicado pelo Ministério da Saúde” e que o Ministério ainda prevê o uso da vacina “caso outras opções estejam em falta”. A reportagem é de 12 de abril. Um dia depois, o governo federal publicou documento de dezembro afirmando que a Astrazeneca continua sendo indicada para pessoas a partir de 40 anos – ou seja, diferentemente do que diz o deputado, ela continua sendo aplicada.

Já o texto da AMB copia o título de uma reportagem do UOL de 25 de junho de 2022, que também não diz que a vacina foi retirada da campanha, apenas que não havia mais pedido do ministério para que o Instituto Butantan, seu fabricante, a produzisse. “O Ministério da Saúde planeja usar a vacina produzida pelo Butantan —e criada pelo laboratório chinês Sinovac— apenas para o público infantil, de 3 a 11 anos. A pasta anunciou ter assinado um aditivo de contrato com o instituto para adquirir um total de 2,6 milhões de doses”, diz o texto.

O terceiro print publicado por Terra, do G1, é de 11 maio de 2021 e trata da suspensão da aplicação da Astrazeneca em grávidas. A reportagem informa que, de acordo com o ministério, apenas gestantes com comorbidades seriam imunizadas, e com Coronavac ou Pfizer. Mas comunicado do órgão em 9 de julho do mesmo ano anunciou a retomada da vacinação para todas as grávidas. Segundo a recomendação, que segue valendo, gestantes devem se vacinar com imunizantes Coronavac e Pfizer.

Em contato com o Comprova, a Fiocruz enviou link para um texto publicado em seu site em 14 de abril. Nele, afirma que “o imunizante [Astrazeneca] continua sendo considerado seguro e eficaz” pelo Ministério da Saúde e pela Anvisa e que “o acordo de cooperação técnica do Ministério da Saúde com o Biomanguinhos/Fiocruz para produção de insumos, incluindo a vacina AstraZeneca, segue vigente”.

Também procurado, o Ministério da Saúde afirmou que o post contém informação falsa e reforçou a segurança e eficácia de todas as vacinas ofertadas para a população. “O atual cenário da covid-19 no país, com redução de casos graves e óbitos pela doença, é resultado da população vacinada”, escreveu o órgão. “Os eventos adversos, inerentes a qualquer medicamento ou imunizante, são raros” e apresentam “risco significativamente inferior ao de complicações causadas pela infecção da covid-19”.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. O tuíte verificado aqui foi compartilhado mais de 3,3 mil vezes e teve mais de 10,3 mil comentários até 24 de abril.

Como verificamos: O primeiro passo foi buscar as reportagens cujos prints foram publicados no tuíte enganoso e verificar seu conteúdo. A equipe também pesquisou sobre as decisões mais recentes do Ministério da Saúde e da Anvisa em relação aos imunizantes nos sites dos órgãos e em reportagens de veículos profissionais.

Além disso, contatou o Ministério da Saúde, o Instituto Butantan e a Fiocruz.

O que diz o responsável pela publicação: Procurada pela reportagem a partir do e-mail informado no site da Câmara dos Deputados, a equipe de Osmar Terra – que já teve outros posts relacionados à pandemia classificados como enganosos ou falsos pelo Comprova (como o que ele usava dados de um único hospital para dizer que a covid-19 estava reduzindo no Rio Grande do Sul e o que ele publicava informações imprecisas para colocar em dúvida a eficiência de medidas de distanciamento social) – não respondeu até a publicação deste texto.

O que podemos aprender com esta verificação: Conteúdos duvidosos sobre as vacinas contra a covid vêm sendo publicados nas redes sociais desde antes de elas serem ofertadas à população, embora sejam comprovadamente seguras e eficazes. Quando nos depararmos com peças que questionem isso, devemos ficar atentos e buscar informações confiáveis em sites de veículos profissionais e de órgãos como Ministério da Saúde e Anvisa, além do da Organização Mundial da Saúde.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: O Comprova publicou recentemente um texto para ajudar o leitor a entender a situação da vacina da Astrazeneca e por que sua recomendação mudou. Também já explicou que o imunizante contra covid-19 não provoca Aids, ao contrário do que sugeriu Bolsonaro em live e que os eventos adversos graves pós-imunização são raros e benefícios superam os riscos.

Política

Investigado por: 2023-04-24

Vídeo engana ao dizer que Lula vendeu Amazônia a mineradora em troca de dinheiro para o Fundo Amazônia

  • Enganoso
Enganoso
Ao reclamar da expulsão de garimpeiros de área em Itaituba, no Pará, boato desinforma sobre empreendimento autorizado pela Agência Nacional de Mineração e pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Sustentabilidade. A Brazauro, subsidiária de uma empresa canadense, cumpriu a legislação e pagou compensação ambiental para dar início a obras no local. Diferentemente do que afirma o post, também não há relação entre o projeto e o Fundo Amazônia, que, por sua vez, não recebe 500 milhões de dólares por mês nem gera contrapartidas aos doadores.

Conteúdo investigado: Vídeo que afirma que Lula “vendeu a Amazônia”, mais especificamente a região de Itaituba, no Pará, para estrangeiros. O narrador cita projeto da mineradora Brazauro, que teria negociado terras naquela área, e relaciona o empreendimento com “canadenses e alemães”, Fundo Amazônia e políticos brasileiros.

Onde foi publicado: TikTok.

Conclusão do Comprova: Não é verdade que o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), e o governador do Pará, Helder Barbalho (MDB), tenham “vendido a Amazônia” para uma empresa estrangeira em troca de recursos bilionários do Fundo Amazônia. Ao fazer essa alegação, post desinforma sobre um projeto de mineração em Itaituba, no Pará, que obteve autorização de lavra pela Agência Nacional de Mineração (ANM) e realizou licenciamento ambiental junto à Secretaria do Estado de Meio Ambiente e Sustentabilidade (Semas) em diferentes governos.

Garimpeiros, de fato, devem ser impedidos de explorar ilegalmente a área para obtenção de ouro. A prática na região vinha sendo realizada desde a década de 1970, segundo estudos, com danos ao meio ambiente e ganhos de produção não ressarcidos ao Estado, detentor do patrimônio. No caso do empreendimento Tocantinzinho, executado pela Brazauro, subsidiária da empresa canadense G Mining, a exploração mineral será executada seguindo regras definidas pelos órgãos públicos e mediante pagamento de R$ 9,7 milhões em compensação ambiental. A construção da base de operação a céu aberto ocorre desde o ano passado.

O projeto Tocantinzinho também não tem qualquer relação com o Fundo Amazônia, diferentemente do que alega o conteúdo verificado. O fundo tem como finalidade captar doações para investimentos em ações de prevenção, monitoramento e combate ao desmatamento e de promoção da conservação e do uso sustentável da Amazônia Legal. Também não faz sentido dizer que o mecanismo de captação de recursos receba “500 milhões por mês” de governos estrangeiros por conta do empreendimento. Desde 2008, o Fundo Amazônia recebeu ao todo US$ 1,2 bilhão da Noruega, US$ 68 milhões da Alemanha e US$ 7,7 milhões da Petrobras.

As doações são usadas para financiar projetos de preservação ambiental no bioma e não geram nenhum tipo de benefício aos doadores, segundo o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), responsável pela gestão do fundo. A exploração mineral, que causa prejuízos ao meio ambiente, não está entre as modalidades de projetos apoiadas pelo Fundo Amazônia.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Até o dia 24 de abril, o post somava 182,8 mil visualizações, 10,3 mil curtidas, 6,8 mil compartilhamentos e mais de 900 comentários.

Como verificamos: O Comprova fez essa investigação a partir de documentos públicos relativos ao projeto Tocantinzinho, notícias da imprensa profissional sobre o Fundo Amazônia, dados de sites financeiros sobre as empresas citadas e contato com os ministérios de Minas e Energia e do Meio Ambiente, com a Secretaria de Estado do Meio Ambiente e Sustentabilidade do Pará e com o BNDES. A empresa Brazauro foi contatada por mensagens. A reportagem também fez uso da plataforma Cruzagrafos, da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) para tentar encontrar conexões da empresa de mineração investigada com outras empresas.

O que é o Tocantinzinho

O projeto é um empreendimento de mineração a céu aberto operado pela empresa Brazauro, que é subsidiária da empresa canadense G Mining. Segundo relatório de impacto ambiental anexado ao processo, a exploração ocorre em uma área de 43.840 hectares no município de Itaituba, no Pará, dentro da Província Mineral do Tapajós. A reserva de ouro foi estimada em 60 toneladas, com previsão de vida útil de 11 anos de operação a partir do segundo semestre de 2024.

A área fica próxima ao distrito de Moraes de Almeida, distante cerca de 290 quilômetros do centro da cidade de Itaituba. O relatório de impacto ambiental aponta que a localidade foi alvo da ação ilegal de garimpeiros durante 50 anos: “A região em que se encontra a Província Mineral do Tapajós já foi alvo de intensa atividade garimpeira principalmente nas décadas de 1970 e 1980, cujo objetivo era a extração de ouro de forma não sustentável, ocasionando diversos impactos ambientais.”

Segundo o documento, a área do Tocantinzinho era alvo de extração ilegal de ouro “a partir do desmonte hidráulico dos solos superficiais e do uso de mercúrio”. O empreendimento da Brazauro não está livre de impactos ambientais, mas a operação é feita de modo regular, ou seja, passou pela análise dos órgãos públicos de fiscalização e traz contrapartida ao Estado.

Os procedimentos de obtenção de ouro também diferem da prática adotada pelos garimpeiros. O relatório informa que o Tocantinzinho compreende a extração de minério de ouro pelo “método de lavra a céu aberto (abertura de cava) e beneficiamento apropriado”. A perfuração da mina é feita por meio de técnicas de desmonte de rochas por explosivos, além de escavadeiras nas camadas superiores de solo. A cava da mina deve atingir 350 metros de profundidade e 900 metros de largura. Para cada tonelada de minério bruto, pretende-se obter 1,5 grama de ouro.

Processo teve análise de diferentes governos

O Comprova reconstituiu o processo de autorização do empreendimento com base em informações do Ministério de Minas e Energia e do governo do Estado do Pará. A linha do tempo mostra que a Brazauro recebeu licenças durante diferentes gestões federais e estaduais — lembrando que a legislação exige análise técnica para aprovação desse tipo de projeto.

Em julho de 2003, a empresa Brazauro deu entrada em um pedido de exploração da área junto ao governo federal. O Ministério de Minas e Energia relata que a autorização de pesquisa foi concedida cerca de dois anos depois, em abril de 2005, durante o primeiro mandato de Lula. Já a portaria de lavra foi concedida pela Agência Nacional de Mineração apenas em maio de 2018, durante o governo do ex-presidente Michel Temer (MDB).

Além de obter os direitos de exploração com a ANM, a empresa de mineração precisa fazer o licenciamento ambiental antes de começar a atuar na região. Nesse caso, por se tratar de um território de abrangência estadual, o licenciamento deve ser realizado com a Secretaria Estadual de Meio Ambiente e Sustentabilidade do Pará. O procedimento depende de três etapas: a licença prévia, a de instalação e a de operação.

A licença prévia, que confirma a viabilidade ambiental de um projeto ainda a ser desenvolvido, foi emitida pela Semas em 2012, ainda durante a gestão de Simão Jatene (PSDB), que governou o Pará entre 2011 e 2018. Quatro anos depois, a Brazauro solicitou a licença de instalação do empreendimento, necessária para o início das obras. O documento foi expedido em 2017.

Os trabalhos não foram concluídos durante todo esse tempo. Segundo o governo do Pará, houve três processos administrativos infracionais na instalação do projeto, que resultaram em multa de R$ 365 mil. Eles se referem a exigências do poder público sobre as obras que não teriam sido atendidas dentro do prazo estipulado, mas o Comprova não encontrou os processos publicamente para verificar quais foram os problemas.

Ainda segundo a secretaria, a Brazauro justificou que não teria como atender essas condições por conta dos atrasos no início das obras, em especial uma linha de transmissão responsável por levar energia elétrica até o local, e solicitou a suspensão da licença de instalação em 2019. Houve encaminhamento de novo pedido para retomada em dezembro de 2021, com uma nova autorização sendo emitida no ano passado e obras a partir de setembro. Ambos os fatos ocorreram na gestão do atual governador, Helder Barbalho (MDB).

Danos e compensação ao meio ambiente

A extração de minério ocasiona uma série de danos ao meio ambiente. O impacto é detalhado em relatório entregue à Secretaria Estadual de Meio Ambiente e Sustentabilidade durante o processo de licenciamento ambiental do Tocantinzinho, localizado em um município que faz parte da Amazônia Legal.

O projeto prevê supressão da vegetação do bioma, limpeza da área, terraplanagem, implantação de vias de acesso internas e externas, aquisição e transporte de insumos, contratação e mobilização de mão de obra, edificações de estruturas físicas temporárias e permanentes, montagem dos equipamentos, captação de água e construção de aterro sanitário, além da inserção da presença humana no ambiente, gerando efluentes e resíduos.

“Essas atividades gerarão o corte de matas e outros tipos de vegetações e, consequentemente, parte de ecossistemas ricos e importantes deixarão de existir e muitos animais que vivem nestas áreas de matas perderão seus habitats. A retirada da vegetação também poderá provocar o aumento das erosões e, por isso, os rios e córregos poderão ficar temporariamente turvos, podendo haver alteração nas comunidades de animais que vivem na água”, informa o relatório. Ao menos 10 espécies de mamíferos registradas na área estão ameaçadas de extinção.

Entre os insumos da operação estão combustíveis, produtos químicos e explosivos. A atividade exige ainda consumo de água e energia, fatores que impactam o meio ambiente. Outro problema gerado é a produção de resíduos sólidos, que podem contaminar o solo e lençóis freáticos, trazendo riscos para a saúde humana, a fauna e a flora do bioma.

Como contrapartida ao impacto do projeto na Amazônia, a Brazauro pagou R$ 9.720.465,06 a título de compensação ambiental. Deste valor, R$ 6.804.325,55 foram encaminhados ao Estado e R$ 3.158.669,88 ao Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), segundo o governo do Pará.

A destinação final da verba não foi detalhada ao Comprova, mas documentos públicos indicam que o dinheiro seria usado para a conservação do Parque Nacional do Jamanxim, da Área de Preservação Ambiental do Tapajós e do Parque Estadual do Utinga.

O relatório apresentado pondera que, indiretamente, o empreendimento da Brazauro gera empregos e arrecadação pública e substitui o garimpo ilegal, que corre às margens da legislação brasileira.

A origem da Brazauro

A Brazauro Recursos Minerais S/A é uma mineradora brasileira, subsidiária da canadense G Mining Ventures Corporation. A empresa de capital aberto tem ações negociadas na Bolsa de Valores de Toronto (TSX: GMIN), mas, segundo sites financeiros, a maior parte é de posse de acionistas internos, que são diretores e executivos da própria empresa. A canadense adquiriu a Brazauro em 2021 e está concentrada no desenvolvimento do projeto Tocantinzinho. Este é o único empreendimento da Brazauro no Brasil.

Antes da compra pela G Mining, entre 2010 e 2021, a mineradora era de propriedade da Eldorado Gold Corporation. Trata-se de outra empresa de origem canadense com papéis negociados em bolsa no Canadá e nos Estados Unidos (TSX: ELD e NYSE: EGO) e que explorava anteriormente a mina de São Bento, em Minas Gerais. Sites de finanças mostram que as ações da Eldorado estão diluídas entre instituições e fundos de investimento.

Procurada pelo Comprova, a Brazauro disse que atua “com responsabilidade e de forma sustentável e não possui qualquer tipo de relação com organizações governamentais e não governamentais como as que foram reproduzidas no vídeo”.

Sem relação com Fundo Amazônia

Diferentemente do que alega o vídeo do TikTok, não existe qualquer relação entre o Tocantinzinho e o Fundo Amazônia. O BNDES, gestor do fundo, refutou a alegação em contato com o Comprova e destacou que este é voltado para ações de preservação do meio ambiente, e não projetos de mineração. Os valores recebidos em doações também diferem completamente do exposto.

O Fundo Amazônia foi criado em 2008 e tem como finalidade captar doações para investimentos não reembolsáveis em ações de prevenção, monitoramento e combate ao desmatamento e de promoção da conservação e do uso sustentável da Amazônia Legal. Os repasses não dão benefícios aos países doadores, menos ainda vantagens em uma suposta exploração da biodiversidade e dos recursos minerais da região.

O BNDES esclareceu ao Comprova em checagem anterior que o Fundo Amazônia é um fundo de REDD+, o que significa dizer que é um fundo que recebe doações baseadas em resultados já alcançados na redução de emissões em função da redução do desmatamento. Portanto, não há contrapartidas relacionadas.

De acordo com o site oficial, o Fundo Amazônia recebeu em toda a sua história quase US$ 1,3 bilhão em doações, equivalente a R$ 3,4 bilhões pela cotação média do dólar em relação ao real no momento da entrada de cada parcela. O governo da Noruega foi responsável por US$ 1,2 bilhão, e o governo da Alemanha, por outros US$ 68 milhões. A Petrobras, com US$ 7,7 milhões, completa a lista de doadores.

A página do Fundo Amazônia aponta que, até o final de fevereiro deste ano, foram financiados 102 projetos envolvendo a quantia de R$ 1,5 bilhão. Os critérios e os focos de apoio podem ser consultados no site do fundo. Em 2019, primeiro ano do governo de Jair Bolsonaro (PL), o comitê orientador foi paralisado. Insatisfeitos com a gestão do fundo, Alemanha e Noruega suspenderam os repasses. O comitê foi reinstalado em 15 de fevereiro deste ano.

Garimpo ilegal é crime

No vídeo do TikTok, o narrador reclama que garimpeiros estão sendo retirados da área do projeto da Brazauro e que a empresa “vai tomar nosso ouro, nossos minérios, tudinho”. O que a gravação não conta é que garimpo ilegal é crime. A prática pode ser enquadrada como dano ambiental e usurpação do patrimônio da União, com penas de até cinco anos, além de multa. O garimpo ilegal é um dos fatores que explicam o alto índice de desmatamento ao ano no Brasil e frequentemente envolve invasões de terras e conflitos com povos indígenas, como os Yanomami.

O que diz o responsável pela publicação: O Comprova não conseguiu identificar o autor da gravação. O perfil do TikTok que publicou o vídeo é anônimo e realizou apenas mais uma postagem na plataforma. Também não foi possível fazer contato por mensagem privada com o perfil pelo próprio TikTok, que permite que apenas amigos troquem mensagens entre si.

O que podemos aprender com esta verificação: O narrador do vídeo, que não se identifica, faz alegações genéricas a respeito de eventual negociação envolvendo o solo da Amazônia. Para transmitir credibilidade no discurso, o homem usa uma estratégia: cita um suposto geólogo que teria atuado por 15 anos na Brazauro, mas, em nenhum momento, menciona o nome dele. É importante desconfiar quando a fonte não é citada e o autor do conteúdo é anônimo.

Em outra parte do vídeo, o narrador diz que “parece” que políticos estariam recebendo dinheiro pela negociação; o termo usado já sugere que ele não tem certeza do que está afirmando.

Nesses casos, procure se informar sobre o tema, fazendo buscas no Google e lendo notícias divulgadas pela imprensa profissional. Se a Amazônia tivesse, realmente, sido vendida, o tema teria gerado repercussão mundial e motivaria uma série de reportagens sobre o assunto.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: O Comprova já desmentiu outras peças de desinformação envolvendo o presidente da República e a suposta venda da Amazônia. Constatou, por exemplo, que vídeo engana ao distorcer falas de Lula e sugerir ameaça à soberania nacional e que é falso que ele tenha vendido solo da Amazônia à empresa norueguesa em documento secreto.