O Projeto Comprova é uma iniciativa colaborativa e sem fins lucrativos liderada pela Abraji e que reúne jornalistas de 42 veículos de comunicação brasileiros para descobrir, investigar e desmascarar conteúdos suspeitos sobre políticas públicas, eleições, saúde e mudanças climáticas que foram compartilhados nas redes sociais ou por aplicativos de mensagens.
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Investigado por: 2024-03-15

Estados só enviam verbas ao governo federal para o pagamento de dívidas

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Um post viral afirma que os estados de São Paulo, Minas Gerais, Paraná, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Goiás, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul se uniram para não enviar mais verbas ao governo federal. Não existe no sistema tributário brasileiro a previsão de repasses de um ente menor da Federação (estados e municípios) para um ente maior (governo federal). Ou seja, os estados não enviam verbas ao governo federal; eles enviam valores para o pagamento de dívidas. Atualmente, alguns governos estaduais estão tentando negociar a forma de pagar a dívida que têm com a União.

Conteúdo investigado: Post dizendo que os governos de São Paulo, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Paraná, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Goiás e Minas Gerais se uniram para não enviar mais verbas à União. “O povo apoia. Chega de tratar vagabundos!”, finaliza a publicação.

Onde foi publicado: TikTok e WhatsApp.

Contextualizando: Está circulando nas redes sociais que alguns governadores de estados do Sudeste, Sul e Centro-Oeste teriam se unido para não enviar mais verbas ao governo federal. A alegação precisa ser contextualizada.

O Comprova consultou os estados mencionados na postagem – São Paulo, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Paraná, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Goiás e Minas Gerais. Os que responderam fizeram referência exclusivamente ao pagamento de dívidas com o governo federal. Mato Grosso do Sul afirmou não estar fazendo esse movimento e que o post é desinformativo. Mato Grosso e o Rio Grande do Sul não responderam até a publicação deste texto, assim como o Ministério da Fazenda.

Um ponto a ser esclarecido é que o repasse de verbas de estados à União se dá, exclusivamente, para o pagamento de dívidas. Governos estaduais e federal estão conversando para chegar a um acordo sobre o pagamento desses valores.

No dia 13, segundo a Folha, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), afirmou que o governo irá apresentar uma proposta de renegociação da dívida com os estados. O documento deve ser levado já na próxima semana ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para, então, ser levado aos governadores e, depois de aprovado pelas partes, ser encaminhado ao Congresso para que se torne um projeto de lei complementar.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Até 15 de março, o post foi visualizado mais de 253 mil vezes no TikTok e compartilhado no WhatsApp cerca de 3,2 mil vezes.

Como verificamos: O Comprova pesquisou notícias sobre as dívidas dos estados com o governo federal, buscou contato com os estados citados na postagem e o Ministério da Fazenda, entrevistou a advogada Bruna Neves e o economista José Márcio Camargo e consultou a legislação sobre o tema.

Estados pagam dívidas para a União

Quando se trata de repasse de verbas dos estados para o governo federal, a questão envolvida é o pagamento de dívidas dos estados com a União. Segundo a advogada Bruna Neves, especialista em Direito Empresarial e Tributário, não existe no sistema tributário nacional a previsão de repasses de um ente menor da Federação (estados e municípios) para um ente maior (governo federal), e sim o contrário: “O que acontece são repasses do ente maior para o menor, porque a União sempre tem mais arrecadação, maior fôlego financeiro”, diz a advogada. Caso os estados decidam suspender o pagamento das dívidas, ela explica que eles “incorrerão num endividamento ainda maior”.

Professor da PUC-Rio e economista-chefe da Genial Investimentos, José Márcio Camargo explica que o endividamento dos estados com a União ocorre devido a empréstimos diretos feitos pelo governo federal aos estados ou nas ocasiões em que os estados contratam crédito no mercado financeiro tendo o governo federal como agente garantidor. “Se o estado não paga, o governo federal assume a dívida e o estado se torna devedor da União.”

De acordo com Bruna Neves, para que haja qualquer renegociação da dívida dos estados com o governo federal é necessário alterar a legislação. Ela cita a Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar nº101, de 4 de maio de 2000), que veda, no artigo 35, operação de crédito entre entes da Federação “ainda que sob a forma de novação, refinanciamento ou postergação de dívida contraída anteriormente”.

Sendo assim, a proposição de governadores do Sul e do Sudeste de deixarem de pagar juros sobre a dívida e que incida apenas correção monetária sobre os débitos, deveria necessariamente contar com uma mudança na legislação. O mesmo se aplica às propostas apresentadas pelo presidente do Senado Federal, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), ao presidente Lula, em novembro do ano passado, para a renegociação das dívidas dos estados. “Para negociar a dívida em si, como o Pacheco está propondo, certamente deverá haver alteração legislativa autorizadora”, explica a advogada.

Proposta dos governadores do Sul e Sudeste

Governadores dos estados do Sul e do Sudeste se reuniram no início do mês, em Porto Alegre, no âmbito do Consórcio de Integração Sul e Sudeste (Cosud), e discutiram alternativas que facilitariam o pagamento da dívida. A proposta desses estados, e também defendida por Goiás, está registrada na Carta de Porto Alegre, documento produzido ao final do encontro.

O texto propõe a revisão da metodologia de amortização do saldo devedor e dos encargos contratuais das dívidas dos estados com a União, o que, segundo os estados, “geram ônus exacerbado e crescente aos orçamentos estaduais, penalizando políticas públicas e investimentos essenciais à população”. Tanto o documento quanto as respostas dos estados sinalizam haver disposição do governo federal para dialogar sobre o tema. “Ressaltamos ter observado disposição de diálogo do Ministério da Fazenda a respeito do tema, que precisa se transformar, agora, em encaminhamento prático e objetivo”, diz trecho da Carta de Porto Alegre.

A resposta dos estados

O estado de São Paulo tem uma dívida de R$ 260 bilhões com a União, conforme o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) disse em áudio enviado pela assessoria de imprensa do governo ao Comprova. Segundo ele, São Paulo tem capacidade de pagar a dívida, mas desembolsa R$ 21 bilhões por ano, valor que poderia ser gasto com obras públicas.

Consultada pelo Comprova, a Secretaria da Fazenda do Paraná confirmou que o estado “apoia movimento no âmbito do Cosud, mas não encabeça o pleito que busca viabilizar melhores condições e acordos para renegociar a dívida dos entes federativos envolvidos”.

Por e-mail, a assessoria de imprensa do governo de Santa Catarina informou que a dívida pública do estado com a União gira em torno de R$ 10,9 bilhões e equivale a 26,4% da Receita Corrente Líquida do estado, que em 2023 foi de R$ 41,2 bilhões. A resposta destaca que o governador Jorginho Mello (PL) descarta qualquer possibilidade de não honrar os compromissos e suspender o pagamento das parcelas da dívida com a União. “Não haverá calote por parte de Santa Catarina e tal alternativa nunca foi discutida entre os governadores que integram o Cosud”, diz trecho da nota.

A assessoria ressaltou que está em discussão no momento no Cosud a alteração dos encargos da dívida pública dos estados com a União, o que pressupõe a mudança de metodologia de cálculo do Coeficiente de Atualização Monetária (CAM) usado pelo Governo Federal.

“A proposta defendida é recalcular os saldos devedores dos contratos e fazer com que o CAM seja apurado segundo as variações mensais do IPCA mais 4% ao ano e Selic, aplicando o menor resultado. Atualmente, o CAM considera a série histórica de 1º de janeiro de 2013 para cá e o indexador aplicado é a Selic. Para efeitos de comparação, vale lembrar que em 2023 a Selic fechou em 11,75%, contra um IPCA de 4,62%”, detalha o governo de Santa Catarina, acrescentando que, com a mudança, o estado teria um saldo devedor em média 15% menor do que o atual.

O governo de Minas Gerais informou que a dívida do estado com a União é de R$ 145,79 bilhões, e que “não há qualquer alinhamento conjunto do Governo de Minas e de outros estados da federação para deixar de repassar recursos ao Governo Federal”. A nota afirma que o governo aguarda uma análise do Ministério da Fazenda sobre possíveis soluções para o equacionamento da dívida de Minas com a União.

“Uma das propostas debatidas diz respeito à necessidade de revisão dos indexadores de cobrança da dívida para possibilitar um acordo no qual o abatimento dos valores devidos seja real e progressivo, permitindo ao governo melhorar a gestão dos recursos, incrementar a arrecadação e aumentar os investimentos públicos em serviços essenciais, como saúde, segurança e educação”, diz a nota do governo de Minas

Já o estado de Goiás disse que “desconhece qualquer iniciativa no sentido de suspender unilateralmente o envio de recursos à União, contrariando previsões legais ou contratuais”. Ainda de acordo com a nota, “o que existe é uma discussão junto ao Ministério da Fazenda para mudança nos indexadores de correção das dívidas dos estados com a União, reduzindo e tornando os juros mais adequados ao cenário econômico atual”.

Como afirmado acima, Mato Grosso do Sul disse não estar participando de nenhuma proposta conjunta de estados para renegociar a dívida, e Mato Grosso e Rio Grande do Sul não responderam até a publicação deste texto.

Como o conteúdo pode ser interpretado fora do contexto original: Publicado com a palavra “urgente” no alto, o post afirma algo que não é verdadeiro, e confunde os cidadãos. É um conteúdo que ataca o governo federal, cujos integrantes são chamados de “vagabundos”. Em uma democracia, como a brasileira, críticas e ataques podem ser feitos, mas, quando se baseiam em mentiras, são perigosos. O post fala de governos estaduais e federal, mas o Brasil terá eleições neste ano e, embora elas sejam para escolher prefeitos, vice-prefeitos e vereadores, publicações como esta, desinformativas, prejudicam o processo eleitoral, uma vez que muitas pessoas podem se basear em peças como essa para escolher candidatos de um partido em detrimento de outros.

O que diz o responsável pela publicação: Procurado pela reportagem, o perfil que publicou o post viral não respondeu até a publicação deste texto.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: O Comprova já contextualizou outros conteúdos relacionados a contas públicas, como o de decreto com contingenciamento de recursos federais não determina corte de verbas. Também verificou ser enganoso vídeo que compara dados diferentes e engana sobre contas.

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Investigado por: 2024-02-26

Médico foi premiado nos EUA por entidade da qual é membro e ainda responde a ação na Justiça Federal

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Publicação que diz que o endocrinologista Flávio Adsuara Cadegiani, após ser inocentado de crimes no Brasil, recebeu prêmio nos EUA, omite contexto relevante. O médico é membro da instituição que fez a homenagem. Criada na pandemia da covid-19, a entidade é formada por profissionais que defendem o uso de medicamentos sem comprovação científica de eficácia para tratar a doença, como a ivermectina. Cadegiani é investigado por estudo realizado com o medicamento proxalutamida em pessoas internadas com covid-19 no qual houve a morte de 200 pacientes no Amazonas. Ele foi inocentado em processos administrativos nos Conselhos Regionais de Medicina do Amazonas e do Rio Grande do Sul, mas ainda é alvo de um inquérito criminal no Amazonas e uma ação civil pública no Rio Grande do Sul.

Conteúdo investigado: Uma publicação de uma ex-integrante do governo Bolsonaro sobre o médico Flávio Cadegiani aponta que o endocrinologista recebeu prêmio de reconhecimento pela contribuição científica nos Estados Unidos. Postagem acompanha manchete “Depois de ser inocentado de crimes no Brasil, cientista brasileiro é premiado nos EUA”. A matéria, publicada pelo Médicos pela Vida, associação que defende o “tratamento precoce” contra covid-19, afirma que Cadegiani foi atacado pela imprensa por estudo com proxalutamida em 2021 e que foi injustamente alvo de busca e apreensão. O texto também afirma que o estudo de Cadegiani foi reconhecido nas mais renomadas instituições científicas do mundo como de alta qualidade.

Onde foi publicado: Instagram, X (antigo Twitter), Facebook e YouTube.

Contextualizando: O médico Flávio Cadegiani, investigado no Brasil por supostas irregularidades em estudo para tratar pacientes com covid-19 com o medicamento proxalutamida, ainda não aprovado para tratar a doença, recebeu um prêmio nos Estados Unidos, no dia 2 de fevereiro, por “Contribuições para a Excelência em Pesquisa”. A notícia repercutiu nas redes sociais, com um tom de que seria uma prova de que o médico teria sofrido perseguição em seu país.

O prêmio, porém, foi concedido pela Front Line COVID-19 Critical Care Alliance (FLCCC), que apresenta Cadegiani como um de seus membros-fundadores e defende o tratamento precoce contra a covid-19 com medicamentos como a ivermectina e a hidroxicloroquina, que não são recomendados pela Organização Mundial da Saúde (OMS) para tratamento da doença. Segundo informações da equipe do médico e confirmadas pela FLCCC, no entanto, Cadegiani não participou da criação da aliança. A associação alega que o endocrinologista recebeu o título porque “se juntou à organização em seus primeiros dias e contribuiu extensivamente para o que a organização se tornou”.

O Comprova analisou versões anteriores do site da associação por meio da ferramenta Wayback Machine e constatou que o nome de Cadegiani, de fato, não aparece nas primeiras edições. A primeira aparição do nome do médico como membro data de 2021.

O prêmio foi entregue pelos médicos Paul Marik e Pierre Kory, diretor científico e presidente e diretor médico da FLCCC, respectivamente. Em novembro de 2021, um artigo escrito pelos dois foi retirado de publicação pela revista científica Journal of Intensive Care Medicine. A retirada aconteceu após o hospital cujos dados de mortalidade foram utilizados no estudo entrar em contato com o periódico e sinalizado erro nos números da pesquisa. Dessa forma, o artigo, intitulado “Clinical and Scientific Rationale for the ‘MATH+’ Hospital Treatment Protocol for COVID-19”, passava a falsa impressão de que o protocolo defendido pela FLCCC para o tratamento de pessoas hospitalizadas com covid-19, chamado “MATH+”, que inclui medicamentos como hidroxicloroquina e ivermectina, tinha tido resultado positivo na redução do número de mortes. Os outros médicos que assinam o estudo também são da organização.

Os médicos Pierre Kory e Flávio Cadegiani participaram de um outro estudo sobre o uso da ivermectina como tratamento profilático da covid-19, publicado na revista Cureus, que, posteriormente, divulgou uma errata ao tomar conhecimento que os autores haviam omitido informações sobre conflitos de interesses. Segundo a errata, Cadegiani não informou ser “consultor pago (US$ 1,6 mil, cerca de R$ 8 mil) da Vitamedic, fabricante de ivermectina” e “membro fundador da Front Line COVID-19 Critical Care Alliance (FLCCC), uma organização que promove a ivermectina como tratamento da covid-19”.

Já Pierre Kory omitiu ser presidente e diretor médico da FLCCC. A errata ainda diz que, em fevereiro de 2022, “Kory abriu um serviço privado de telessaúde para avaliar e tratar pacientes com covid aguda, covid de longa duração e síndromes pós-vacinais”.

A informação também consta em artigo da revista Time, intitulado “Right-Wing Doctors Are Still Peddling Dubious COVID Drugs”, de maio de 2023. Segundo o texto, o médico Pierre Kory lançou um “centro de tratamento avançado da covid-19” com consultas a U$ 1.650 (cerca de R$ 8.250) para atendimento de ‘síndrome pós-vacinação’ ou outros problemas”. Ainda segundo a matéria, outro membro da FLCCC, o médico Fred Wagshul, vende consultas sobre ivermectina a U$ 211 (cerca de R$ 1.055).

Cadegiani foi inocentado em Conselhos de Medicina mas ainda responde a ação na Justiça Federal

A postagem sobre o prêmio de Flávio Cadegiani diz que o médico foi “inocentado de crimes no Brasil”, mas necessita de contexto. Cadegiani é investigado por supostas irregularidades em estudo com o medicamento proxalutamida, administrado em pacientes com covid-19, no qual houve a morte de 200 pacientes no Amazonas. O médico foi inocentado em processos administrativos nos Conselhos Regionais de Medicina do Amazonas e do Rio Grande do Sul. Porém, dois procedimentos contra ele ainda tramitam na Justiça Federal: um inquérito criminal, no Amazonas, e uma ação civil pública, no Rio Grande do Sul.

Em setembro de 2021, no ofício enviado à Procuradoria-Geral da República (PGR) para que o órgão investigasse as mortes no estudo no Amazonas, a Conep relata uma série de irregularidades, como aplicação em locais diferentes e com número de participantes acima do autorizado, desrespeitando, segundo o órgão, o protocolo da pesquisa que havia sido aprovado.

De acordo com a Conep, a autorização dada ao endocrinologista permitia que a pesquisa com proxalutamida fosse realizada com 294 voluntários, em Brasília. No entanto, Flavio Cadegiani começou a aplicar o medicamento em pacientes no Amazonas e em outros estados, como o Rio Grande do Sul. O órgão também alega que o parecer final entregue pelo médico continha resultados de 645 pessoas, mais do que o dobro do número autorizado.

Procurada pelo Comprova, a PGR informou que o inquérito criminal aberto pelo Ministério Público Federal (MPF) para apurar as mortes durante o estudo está em tramitação na Justiça Federal do Amazonas, sob sigilo. O órgão ainda informou que há outro inquérito que investiga Cadegiani em processo em andamento na Justiça Federal do Rio Grande do Sul. Neste último caso, o MPF moveu ação civil pública contra um conjunto de réus em razão de supostos fatos lesivos à saúde pública em estudo com proxalutamida para tratamento da covid-19 no Hospital Arcanjo São Miguel, em Gramado, no Rio Grande do Sul. A pedido do MPF, a Polícia Federal chegou a cumprir mandados de busca e apreensão contra o médico e outros envolvidos no estudo.

O caso resultou em denúncia contra Cadegiani na CPI da Pandemia por crime contra a humanidade. Na época, a Rede Latino-americana e Caribenha de Bioética (Redbioética), da Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (Unesco), disse que o caso “poderia ser um dos episódios mais graves e sérios de infração à ética de pesquisas e de violação aos direitos humanos dos participantes na história da América Latina”.

Em relação às mortes, Cadegiani argumentou que a maioria havia sido registrada no grupo que tomou placebo. Segundo a Conep, diante do alto número de mortes era necessário interromper o cegamento do estudo – o medicamento fornecido aos participantes (proxalutamida ou placebo) era desconhecido do pesquisador – para verificar se os óbitos estariam associados à toxicidade do medicamento ou se o grupo de controle estaria em desvantagem por suposta eficácia da proxalutamida.

A comissão ainda alegou que o pesquisador “nunca demonstrou a rastreabilidade dos medicamentos fornecidos na pesquisa (cadeia de distribuição e dispensação), sendo impossível certificar qual produto o grupo controle realmente recebeu”.

Em entrevista ao portal Metrópoles, Flávio Cadegiani negou violações éticas e defendeu o estudo. Já em nota enviada ao Comprova, a assessoria do médico alegou que ele não fez publicações em que nega responder a processo na Justiça e ressaltou que Cadegiani foi inocentado pelos Conselhos de Medicina do Amazonas e do Rio Grande do Sul. “Ambos os conselhos concluíram pela total regularidade da conduta do pesquisador e que o estudo fora, sim, autorizado. Ainda constatou-se que a condução dos ensaios estava de acordo com os princípios éticos e com a legislação vigente no país”, destaca trecho da nota (Parágrafo acrescentado após a publicação de uma primeira versão deste texto).

Quem é Flávio Cadegiani

Flávio Cadegiani é médico formado pela Universidade de Brasília (UnB) com especialização em endocrinologia e metabolismo pela Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabolismo (Sbem). Com histórico de obesidade na infância, o médico se tornou conhecido no tratamento de pessoas com a doença, em Brasília. O especialista é autor do livro “Overtraining Syndrome in Athletes, A Comprehensive Review and Novel Perspectives”, publicado pela editora Nature.

Em 2021, um estudo coordenado por Cadegiani ganhou projeção nacional após se tornar alvo da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep), do Conselho Nacional de Saúde (CNS), atrelado ao Ministério da Saúde. A comissão enviou, em setembro daquele ano, ofício à Procuradoria-Geral da República (PGR) para que o órgão investigasse a morte de 200 pessoas que participaram do estudo com proxalutamida no Amazonas.

O endocrinologista foi convocado, ainda em 2021, a depor na Comissão Parlamentar de Inquérito da Pandemia, que o indiciou por crime contra a humanidade relativo ao estudo com proxalutamida. Assim como Cadegiani, a médica Mayra Pinheiro, autora da postagem analisada aqui, foi convocada no inquérito. Ela foi indiciada por epidemia com resultado morte, crime contra a humanidade e prevaricação. Na época, a médica ocupava a Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde, do Ministério da Saúde, durante o governo de Jair Bolsonaro. Mayra Pinheiro, que ficou conhecida como “Capitã Cloroquina”, chegou a disputar eleições em 2022 para deputada federal pelo Partido Liberal (PL), mas não se elegeu.

Ambos os profissionais defendiam o chamado “kit-covid”. De acordo com o relatório da CPI, o conjunto de remédios sem eficácia comprovada, cujos mais conhecidos eram a cloroquina, a hidroxicloroquina, a ivermectina e a azitromicina, não é um “rol fechado”. “A depender de quem se expressa, podem ser incluídos a flutamida, proxalutamida, colchicina, spray nasal, bem como vitaminas diversas e suplementos alimentares”, destaca o texto. Segundo a Anvisa, além das vacinas, os medicamentos aprovados para tratar a covid-19 são: remdesivir, sotrovimabe, baricitinibe, paxlovid (nirmatrelvir + ritonavir), molnupiravir e tocilizumabe.

Como o conteúdo pode ser interpretado fora do contexto original: Da forma como foi divulgada, a postagem dá a entender que Cadegiani recebeu prêmio de instituição americana independente e respeitada no meio científico, e que ele foi absolvido de investigações do MPF que tiveram repercussão na imprensa, umas delas criminal, por estudo com proxalutamida no tratamento a pacientes com covid-19. Essas interpretações, sugeridas pela postagem, não condizem com a realidade.

O que diz o responsável pela publicação: O Comprova buscou a médica Mayra Pinheiro por meio de contato disponibilizado em sua rede social, por mensagens nas plataformas, e pelo PL do Ceará, mas sem sucesso. 

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Publicado no Instagram, a postagem alcançou 24,3 mil visualizações até 26 de fevereiro.

Como verificamos: O Comprova buscou informações sobre o prêmio dado a Cadegiani e constatou que ele foi concedido pela FLCCC Alliance. Em seguida, foram consultadas informações no site da organização e em veículos de imprensa sobre seus fundadores, além de pesquisas sobre o médico. Também foram consultados documentos oficiais da CPI da Pandemia. O Comprova ainda fez contato com a PGR para apurar sobre os inquéritos abertos pelo MPF contra Cadegiani, consultou um deles, que não está sob sigilo, no site da Justiça Federal do RS, e buscou informações sobre a responsável pela postagem analisada.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: O Comprova já publicou uma série de checagens que desmistificam o uso de medicamentos sem eficácia comprovada contra a covid-19. Entre eles, Flavio Cadegiani já apareceu em verificação de vídeo enganoso em que médicos associam o aumento de problemas cardíacos à vacinação e em estudo sobre ivermectina, que apresenta dados imprecisos e não comprova eficácia do antiparasitário contra covid.

 

Atualização: Este Contextualizando foi atualizado em 27 de fevereiro de 2024 para incluir resposta da equipe do médico Flavio Cadegiani recebida posteriormente à publicação e, em 28 de fevereiro, para incluir esclarecimento da Front Line COVID-19 Critical Care Alliance (FLCCC) sobre o nome do médico constar em seu site como membro fundador da entidade.

Correção: uma primeira versão deste Contextualizando informou equivocadamente que o médico respondia a “processos” na Justiça Federal. Como consta deste texto atualizado, Cadegiani é alvo de um inquérito que corre sob sigilo na Justiça Federal no Amazonas e de uma ação civil pública na Justiça Federal do Rio Grande do Sul.

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Investigado por: 2024-02-14

O que os protestos de agricultores na Europa têm a ver com políticas ambientais

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Publicações nas redes sociais alegam que supermercados da Europa estão desabastecidos por conta dos recentes protestos de agricultores, que estariam se manifestando contra políticas ambientais. As postagens omitem que a escassez de determinados produtos em supermercados ocorre de forma pontual, e não generalizada. Os conteúdos virais também sugerem que as regulamentações ambientais seriam o único descontentamento dos manifestantes. Na verdade, os agricultores têm uma série de outras reivindicações, como a redução de importações estrangeiras mais baratas e a redução da burocracia.

Conteúdo investigado: Vídeo exibe gôndolas vazias de um supermercado. A postagem alega que os mercados da Bélgica e França estão desabastecidos por conta dos protestos realizados por agricultores europeus, que estariam se manifestando contra os “lunáticos climáticos e suas políticas”.

Onde foi publicado: X (antigo Twitter), Facebook e TikTok.

Contextualizando: Desde janeiro deste ano, agricultores têm protestado por toda a Europa. Ao contrário do que sugerem as postagens virais, as queixas dos manifestantes vão além do descontentamento com regulamentações ambientais. Os agricultores também protestam contra a concorrência externa, inflação, rendimentos baixos, burocracia da União Europeia (UE), entre outros.

Ações adotadas pelos agricultores como forma de protesto incluem o bloqueio de estradas e de centros de distribuição. A medida acarretou o atraso de entregas e desabastecimentos pontuais de determinados produtos em supermercados da Europa.

Protestos na Europa

Os movimentos orquestrados por diversas entidades sindicais de agricultores ganharam destaque no fim de janeiro na França, com o bloqueio de estradas e de uma fábrica da Lactalis, maior grupo de laticínios do mundo. Os produtores franceses reclamam dos aumento dos custos da energia e das regras ambientais europeias, que impactam os gastos com a produção.

Esses protestos ganharam fôlego para se espalhar pelo continente durante um protesto em Bruxelas, na Bélgica, embora tenham sido registrados uma série de manifestações anteriores. Na ocasião, em 1º de fevereiro, agricultores jogaram ovos e pedras no Parlamento Europeu, em Bruxelas, além de soltarem fogos de artifício próximo ao prédio, em um ato contra os crescentes custos de produção que afetam a agricultura local e favorecem a importação de produtos.

Uma das demandas mais recorrentes entre as organizações de trabalhadores é a alegação de que a concorrência com produtos vindos de outros países seria desleal com os produtores locais. O internacionalista e fundador do instituto Global Attitude, Rodrigo Reis, explica que o movimento da classe agricultora se concentra na competição com o mercado externo em meio a um cenário de aumento de custos. “Existe um receio da classe agricultora em proteger o mercado interno de produtos importados que serão mais baratos do que os produzidos internamente, e aí existe também um argumento usado por eles na questão ambiental de que esses produtos importados não respeitam as mesmas normas ambientais respeitadas por eles”, destaca.

Além dos dois países, foram registrados protestos na Espanha, em Portugal, Itália, Romênia, Polônia, Grécia, Alemanha e Países Baixos. As reivindicações são semelhantes em quase todos os países, com descontentamento em relação à inflação, concorrência externa, burocracia da União Europeia e regulamentações. Apesar disso, existem demandas específicas para a categoria agrícola de cada Estado.

Desabastecimento nos supermercados

Por consequência de bloqueios realizados por manifestantes, algumas unidades de supermercados começaram a sofrer com escassez de produtos frescos, como frutas e verduras. Na Bélgica, de acordo com o The Brussels Times, as redes que passaram por desabastecimento em determinadas regiões foram Aldi, Colruyt, Lidl e Delhaize.

Em 6 de fevereiro, a RTBF informou que os centros de distribuição da Colruyt já estavam funcionando desde o dia 1º do mesmo mês. Ainda de acordo com o veículo, unidades da rede Delhaize também estavam de volta ao normal. A Delhaize ainda acrescentou que a perda de itens durante as manifestações foi limitada e estima que 100 mil quilos de produtos foram doados a bancos de alimentos. De acordo com a rede, alguns supermercados não ficaram desabastecidos.

De acordo com uma reportagem do Le Parisien, publicada em 29 de janeiro, os bloqueios tiveram pouco impacto no abastecimento dos supermercados da França. Ao jornal, o delegado geral da Federação do Comércio e Distribuição – que reúne marcas como Carrefour, Système U, Auchan e Aldi – afirmou que atrasos poderiam acontecer “aqui e ali”, mas de forma marginal.

Segundo o Europe 1, os agricultores pretendiam bloquear o mercado internacional de Rungis, atacadista de produtos frescos, o que levantou a preocupação de escassez de alguns alimentos. No entanto, a reportagem apontou que a distribuição em massa não deveria ser afetada, já que as marcas costumam ter armazenamento próprio. Conforme o Le Parisien, manifestantes tentaram invadir o mercado de Rungis e ao menos 91 pessoas foram presas na ocasião.

O bloqueio de estradas e centros de distribuição afetou outros países, como Luxemburgo. De acordo com o RTL Today, houve escassez de produtos frescos em algumas unidades do Lidl e Delhaize no país que faz fronteira com a Bélgica, França e Alemanha.

Como o conteúdo pode ser interpretado fora do contexto original: A postagem utiliza um registro isolado de um supermercado para alegar que há desabastecimento generalizado na Europa. Além disso, associa o protesto de agricultores europeus apenas a normas ambientais. Dessa forma, a publicação gera um cenário alarmista e omite que a insatisfação dos manifestantes em relação à política verde é apenas uma pauta entre diversas outras reivindicações.

O que diz o responsável pela publicação: Não foi possível entrar em contato com a responsável pela postagem analisada, já que o perfil não aceita mensagem de contas que não segue.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Até o dia 9 de fevereiro, o conteúdo viral no X acumulava mais de 77,4 mil visualizações, 2 mil compartilhamentos e 5 mil curtidas. No Facebook, o vídeo foi publicado ao menos 40 vezes em contas diferentes com a mesma legenda. No TikTok, uma das publicações descontextualizando as imagens teve mais de 64 mil visualizações e 3,5 mil curtidas.

Como verificamos: Primeiramente, realizamos uma busca reversa do vídeo para verificar o contexto da gravação original. Um dos registros que integra a peça verificada foi encontrado em uma conta do TikTok, indicando que a gravação foi feita em um supermercado na Bélgica. Para comprovar que trata-se de um registro recente, o perfil publicou os metadados do vídeo, que apontam que a gravação foi realizada em 31 de janeiro deste ano.

Depois, também transcrevemos e traduzimos o áudio do vídeo. Com a tradução, foi possível identificar que o supermercado gravado pertencia à rede Lidl. Na gravação, a pessoa que filma diz: “O Lidl está começando a ficar sem estoque, não há mais produtos graças à greve. Continuem assim, pessoal, logo alcançarão sua meta. Estamos indo!”.

Em sequência, procuramos notícias em jornais europeus que informassem sobre desabastecimento em supermercados, sobretudo na rede Lidl. Também buscamos informações sobre os protestos e as reivindicações dos agricultores. Por fim, entramos em contato com um especialista para entender a dimensão da pauta climática nas manifestações.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: Recentemente, o Comprova explicou por que a ação humana é responsável pela crise climática no planeta. A checagem mostrou que a participação do ser humano nas mudanças climáticas é um consenso científico.

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Investigado por: 2023-12-22

Entrega de chaves de condomínio no Amapá começou no dia de evento com Lula

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Publicações nas redes sociais alegam que o governo Lula (PT) teria descumprido uma promessa de entregar as chaves de um conjunto habitacional em Macapá apenas para lotar a cerimônia de lançamento do empreendimento, com participação do presidente. A entrega teve início, no entanto, ainda no dia do evento e não era de responsabilidade do governo federal, mas da construtora que fez a obra, em processo sob supervisão da Caixa Econômica Federal e com apoio do governo do Amapá.

Conteúdo investigado: Publicações alegam que o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) prometeu a entrega de chaves no evento de lançamento de um conjunto habitacional, com participação do presidente, para que estivesse lotado e não houvesse vaias. As postagens são acompanhadas de um vídeo em que uma mulher questiona, sem aparecer na imagem, onde estão as chaves e narra, em meio a uma multidão, que o público presente teria sido enganado.

Onde foi publicado: X (antigo Twitter) e TikTok.

Contextualizando: Publicações nas redes sociais alegam que o governo Lula (PT) teria descumprido uma promessa de entregar as chaves de um novo conjunto habitacional durante uma cerimônia de lançamento com participação do presidente. As chaves começaram a ser entregues, contudo, ainda no dia do evento, ocorrido em 18 de dezembro deste ano.

As postagens são acompanhadas de um vídeo gravado após a cerimônia de inauguração do Miracema III e IV, em Macapá (AP), com mil unidades habitacionais do programa Minha Casa, Minha Vida (MCMV).

A cerimônia de lançamento contou com a participação do presidente Lula e do ministro da Cidades, Jader Filho (MDB), além do governador do Amapá, Clécio Luís (Solidariedade), entre outras autoridades locais, como membros do Ministério Público amapaense.

O conjunto habitacional foi lançado pela modalidade Recursos do Fundo de Arrendamento Residencial (FAR) do MCMV, que oferece imóveis subsidiados com recursos públicos em áreas urbanas para famílias em situação de vulnerabilidade, que estejam em um cadastro habitacional local, por exemplo.

O modelo MCMV – FAR também prevê a participação de diferentes agentes públicos e privados para viabilizar cada empreendimento, com responsabilidades distintas entre si.

Conforme estabelece uma portaria do Ministério das Cidades, estão envolvidos, em geral, a própria pasta, que regula regras e propostas do MCMV – FAR; a Caixa Econômica Federal, gestora dos recursos do FAR; algum ente público local, que pode ser uma prefeitura ou o governo do Estado; um agente financeiro, que supervisiona o processo e pode ser a própria Caixa; uma construtora, a quem cabe propor e erguer a obra; e os beneficiários, que, entre outras coisas, devem assumir o financiamento do imóvel, se necessário.

No caso do Miracema III e IV, a entrega das chaves aos novos moradores foi realizada pela construtora CMT Engenharia, em operação com apoio do governo do Amapá, na condição de ente público local, que fez a seleção e orientação dos beneficiários ao longo de todo o processo, e com supervisão da Caixa, agente financeiro do conjunto habitacional, segundo comunicou o banco ao Comprova.

A entrega das chaves começou ainda no dia 18 de dezembro, logo após o evento com a participação de Lula. Até o começo da tarde do dia 22, foram entregues 862 unidades, também segundo a Caixa.

“A entrega das chaves é realizada mediante assinatura do contato e realização de vistoria pela família beneficiária indicada pelo Ente Público local, neste caso o Governo do Estado, à luz das regras estabelecidas pelo Programa”, escreveu a assessoria de imprensa da Caixa, em nota.

A Secretaria de Habitação do Amapá (Sehab) reforçou que a entrega das chaves é de responsabilidade da CMT Engenharia. A pasta divergiu da Caixa, contudo, ao comunicar que todas as mil chaves já foram entregues: “Informa ainda que, no mesmo dia do evento, foram entregues 300 chaves, e que a conclusão desta etapa foi realizada nesta quinta-feira, 21”, escreveu, em nota.

A construtora CMT Engenharia, citada pela Caixa e pela Sehab, não respondeu aos contatos do Comprova por telefone e e-mail até a publicação deste texto

Além das partes envolvidas no empreendimento, o Comprova também buscou contato com o MP-AP, que havia divulgado ter acompanhado todo o processo de finalização das obras. O órgão comunicou não ter recebido reclamação formal sobre não recebimento de chaves por parte dos beneficiários.

Como o conteúdo pode ser interpretado fora do contexto original: Sem o contexto completo, que mostra quando a entrega das chaves teve início, os leitores poderiam ser levados a acreditar que o governo tentou enganar as pessoas beneficiadas. A investigação mostra que o vídeo analisado não trazia, porém, todas as informações para que o leitor pudesse entender o que aconteceu na situação mostrada ali. 

O que diz o responsável pela publicação: O Comprova procurou o autor da postagem no X por mensagem privada. Além de não responder, ele apagou a publicação no X e no TikTok. Não é a primeira vez que conteúdos veiculados pelo mesmo autor são investigados. Anteriormente, já foi verificado ser falso que PT ou a governadora de PE reinauguraram obra de Bolsonaro ligada à transposição do São Francisco, que policiais foram expulsos pelo MST de protesto em rodovia no PR, e não feitos reféns, bem como que vídeo de mulher com rosto de Lula e delegado parecido com Bolsonaro é uma sátira.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. As publicações com o vídeo foram, no entanto, excluídas pelo autor. Ao menos até 21 de dezembro, quando ainda estava no ar, o post no X tinha 50,6 mil visualizações e 2 mil curtidas.

Como verificamos: O Comprova identificou, ao analisar o vídeo, uma faixa com a logomarca do atual governo federal (abaixo). Em seguida, a reportagem buscou por entregas recentes de moradias populares com participação do presidente Lula, ocasião em que encontrou a cerimônia realizada em Macapá, no Amapá.

A reportagem também identificou que a cor dos prédios e a estrutura de evento montada aparentes no vídeo condizem com o cenário mostrado em imagens oficiais da cerimônia e do empreendimento.

| Presidente Lula em cerimônia de lançamento de conjunto habitacional (Foto: Ricardo Stuckert/PR)

| Conjunto habitacional Miracema, em Macapá (Foto: Nayana Magalhães/GEA)

A partir disso, a equipe localizou postagens no X feitas por Max Yataco, secretário-adjunto de Habitação do Amapá, que mostram famílias recebendo as chaves de unidades do Miracema III e IV. Em contato por telefone, Yataco confirmou que o vídeo em que uma mulher contesta a falta das chaves teria sido gravado após a cerimônia em Macapá com a participação de Lula.

Além de Yataco, o Comprova fez contato, por e-mail, e obteve retorno da Caixa Econômica Federal, do Ministério das Cidades, do governo do Amapá e do Ministério Público amapaense.

A reportagem também procurou a CMT Engenharia, mas foi informada que a empresa não possui assessoria de imprensa e que as pessoas autorizadas a falar sobre o assunto não estavam no escritório nos dois dias em que telefonou. Por e-mail, também não houve resposta até esta publicação.

Chaves começaram a ser entregues após cerimônia em Macapá

Ao pesquisar sobre a cerimônia nas redes sociais, o Comprova localizou vídeos postados na mesma data, mas à noite, após o evento, em que famílias aparecem recebendo chaves dos imóveis.

Um deles foi compartilhado às 21h36 de 18 de dezembro no X pelo governador do Amapá, Clécio Luiz. No post, ele comunicava que a equipe do governo estadual seguia no residencial Miracema III e IV para realizar a entrega das chaves para os novos moradores do empreendimento.

O vídeo mostra o secretário-adjunto Max Yataco, segundo o qual, naquele momento, estavam sendo colhidas as assinaturas para a entrega de chaves. Ele diz também que o processo ainda demoraria um pouco. Mais tarde, às 23h15, Yataco compartilhou outro vídeo, de uma moradora com a chave em mãos.

Por telefone, o secretário-adjunto afirmou que algumas pessoas ficaram chateadas quando correu um rumor, não verdadeiro, de que não seria feita a entrega das chaves já naquele dia. Yataco também reafirmou que a responsabilidade da entrega era da construtora CMT Engenharia, que executou a obra.

“Eles [construtora] repassaram para a gente a dificuldade na logística da entrega, mas em nenhum momento foi repassado que não seriam entregues as chaves. Na verdade, o que aconteceu foi um rumor entre eles mesmos [beneficiários] de que não seriam entregues as chaves, aí algumas pessoas ficaram indignadas, chateadas, e começaram essa movimentação vista no vídeo”, relatou ao Comprova.

Yataco disse também que a Secretaria de Habitação enviou convites da cerimônia para os beneficiários, comunicando que poderiam levar até três familiares para participar do evento, mas que não teria sido ventilada informação sobre a entrega das chaves, uma vez que o procedimento caberia à construtora.

Na véspera da cerimônia, o governador do Amapá divulgou vídeo no Instagram anunciando a entrega de mil unidades habitacionais junto do presidente Lula. No dia do evento de lançamento, o governo federal também reafirmou, com publicação oficial, que seria feita a entrega dos imóveis.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: É comum a disseminação de desinformações associadas a eventos dos quais o presidente participa. O Comprova já demonstrou, por exemplo, que Lula se encontrou com liderança religiosa da Nigéria em evento de igualdade racial, não com “feiticeiro”, que ele não foi hostilizado em visita a polo automotivo de Goiana nem dentro do Bahia Farm Show e ser falso que defendeu o nazismo e o fascismo em evento do PT em 2017.

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Investigado por: 2023-12-19

INSS pagou 13º em novembro apenas para beneficiários que não tiveram adiantamento

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Publicação no TikTok confunde ao fazer uso de imagens do INSS e alegar que aposentados receberão até R$ 12 mil em dezembro. Na verdade, apenas os segurados e dependentes da Previdência Social que não puderam receber antecipadamente em 2023 o abono anual, equivalente ao 13º salário, tiveram valores referentes a ele depositados agora em novembro. Para quem se tornou beneficiário ativo em junho e recebe o teto do INSS, foi paga uma parcela única de R$ 11.886,85 no mês passado.

Conteúdo investigado: Vídeo exibe imagens do INSS e a legenda “Está assinado! Pagamento de até R$ 12.000 reais [sic] para aposentados”. Ao fundo, uma narradora afirma que aposentados e pensionistas, entre outros beneficiários, que tiveram um benefício acima de um salário mínimo concedido a partir de maio deste ano poderão receber até R$ 12 mil com uma parcela única do 13º agora em dezembro.

Onde foi publicado: TikTok.

Contextualizando: A maior parte dos segurados e dependentes da Previdência Social recebe anualmente um abono do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) equivalente ao 13º salário pago para os trabalhadores com vínculo empregatício ligado à Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

Em 2023, esse abono anual foi pago em duas parcelas iguais, nos meses de maio e junho, de modo adiantado. Costumeiramente, elas são depositadas nos meses de agosto e novembro de cada ano. Desde 2020, contudo, o valor tem sido quitado antecipadamente, a priori para minimizar perdas econômicas da pandemia de covid-19. Neste ano, a ideia foi aquecer a economia ao injetar recursos em mercados locais.

Ainda em 2023, quem se tornou beneficiário ativo do INSS apenas depois de maio não pôde contar com o abono anual antecipado. Esse valor equivalente ao 13º só foi pago agora em novembro, com uma parcela única e em quantia proporcional aos meses deste ano em que a pessoa teve direito ao benefício comum. O abono proporcional e o benefício foram pagos juntos, seguindo o calendário de depósitos do INSS.

Um segurado que esteja aposentado desde junho de 2023 e receba o valor do teto do INSS (R$ 7.507,49), por exemplo, teve depositados em sua conta agora em novembro R$ 11.886,85. Esse valor equivale a R$ 7.507,49 do benefício comum e R$ 4.379,36 de abono proporcional a sete meses (de junho a dezembro).

Publicações nas redes sociais têm confundido esse pagamento efetuado em novembro com um suposto novo 13º ou um abono extra para aposentados e pensionistas, o que não é verdade. Os beneficiários que tenham recebido as parcelas de maio e junho não têm direito a um novo depósito em 2023.

Em setembro, o INSS emitiu comunicado para alertar isso devido à circulação de conteúdos de desinformação. Ao Comprova, o INSS reafirmou não haver previsão de um novo abono.

“O INSS, inclusive, tem uma ação em curso na Procuradoria Federal Especializada para retirada desses conteúdos do ar”, escreveu, em contato por e-mail.

O abono anual é pago para segurados e dependentes da Previdência Social que, durante o ano de 2023, tenham recebido auxílio por incapacidade temporária, auxílio-acidente, aposentadoria, pensão por morte ou auxílio-reclusão. Isso corresponde a cerca de 30 milhões de beneficiários, segundo o governo federal.

Os segurados que recebem benefícios assistenciais do INSS, caso do Benefício de Prestação Continuada (BPC) e da Renda Mensal Vitalícia (RMV), não têm direito ao abono anual.

Como o conteúdo pode ser interpretado fora do contexto original: A publicação desinforma ao afirmar, em um primeiro momento, que aposentados vão receber R$ 12 mil em dezembro. O texto narrado no vídeo ainda é confuso e, apesar de retificar a fala de abertura em um segundo momento, não esclarece quem terá direito ao abono em novembro e como calculou o valor de até R$ 12 mil.

O que diz o responsável pela publicação: O Comprova não conseguiu contato com o autor da publicação, uma vez que apenas perfis que sejam seguidos por ele no TikTok podem enviar mensagem.

O que podemos aprender com esta investigação: É comum que desinformadores façam uso da imagem de órgãos oficiais para atribuir credibilidade a conteúdos enganosos e deixem de informar as fontes primárias de alegações fora de contexto. Para ter a clareza sobre a informação divulgada, é importante pesquisá-la junto aos canais de órgãos oficiais e em veículos de imprensa. Além disso, é necessário cautela com perfis que se autointitulam canais de notícias, mas não disponibilizam um link seguro nem fontes de informações em seus conteúdos. No caso do perfil em questão, há apenas um link para a compra de máquinas de cartões, na tentativa de gerar receita ao canal a partir da indicação de clientes.

Alcance da publicação: A postagem no TikTok teve 27,6 mil curtidas e 3,7 mil compartilhamentos até 19 de dezembro.

Como verificamos: O Comprova entrou em contato com o INSS via assessoria de imprensa, além de ter buscado por publicações sobre o abono anual em canais oficiais do governo e veículos de imprensa.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: O Comprova explicou recentemente por que não há pagamento de 13ª parcela no Bolsa Família e mostrou não existir uma nova lei que obrigue motorista a pagar pensão por invalidez em casos de acidentes de trânsito.

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Investigado por: 2023-12-13

Empréstimo do Brics foi aprovado pelo Senado e será destinado para pequenas e microempresas brasileiras

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Vídeo nas redes sociais aponta que o governo brasileiro pegou empréstimo de US$ 1 bilhão no "banco do Brics" sem ter uma finalidade definida para a quantia. O motivo seria o fato de a atual presidente da instituição internacional ser a ex-presidente da República Dilma Rousseff (PT). No entanto, o valor tem destino: será usado em um programa que garante acesso a crédito para as micro, pequenas e médias empresas brasileiras, via Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), criado em 2020 para reduzir os impactos econômicos da pandemia da covid-19.

Conteúdo investigado: Vídeo mostra homem relacionando a nomeação de Dilma Rousseff como presidente do Novo Banco de Desenvolvimento (NBD) – conhecido como “banco do Brics” – ao fato de o Brasil ter fechado um empréstimo de US$ 1 bilhão junto à instituição financeira. Segundo ele, a imprensa não teria dado publicidade à aprovação da operação de crédito. O conteúdo é acompanhado do trecho de um telejornal no qual a apresentadora fala sobre o empréstimo, citando que ainda não há destinação para o valor. Na sequência, um comentarista aparece para participar do jornal e diz que, com o empréstimo, o governo federal “pode roubar e muito”.

Onde foi publicado: TikTok.

Contextualizando: O Projeto de Resolução (PRS 44/2023) que autorizou o Brasil a fazer um empréstimo de até US$ 1 bilhão com o Novo Banco de Desenvolvimento (NDB, na sigla em inglês) foi aprovado pelo Senado em abril deste ano. A informação foi divulgada no portal Senado Notícias. Um vídeo que viralizou nas redes sociais, publicado no mês de outubro, usa essa informação para afirmar que o governo brasileiro obteve o crédito sem dar destinação aos recursos, com anuência da presidente do banco Dilma Rousseff e assinatura do ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT). Um comentarista ainda acrescenta que, com a operação, o governo federal “pode roubar e muito”.

No entanto, o próprio PRS 44/2023, de autoria da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado, sinaliza qual será o destino do valor da operação de crédito: o financiamento parcial do Programa Emergencial de Acesso a Crédito (FGI PEAC), criado em 2020 para reduzir os impactos econômicos da pandemia da Covid-19 e executado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). O programa garante a ampliação do acesso ao crédito para Microempreendedores Individuais (MEIs), micro, pequenas e médias empresas brasileiras (MPMEs).

O governo federal, em outubro, negou a informação de que a quantia do crédito não teria destinação determinada. Por meio de nota, a Secretaria de Comunicação da Presidência comunicou que o pagamento do empréstimo deverá ser feito em 30 anos, com juros de 1,64% ao ano.

Além disso, não se sustenta a afirmação de que a imprensa brasileira não teria dado publicidade à aprovação do crédito. O tema foi pautado por veículos jornalísticos como O Globo, Gazeta do Povo, Folha de S. Paulo e Correio Braziliense, também no mês de outubro, quando Dilma assinou o acordo para o empréstimo.

O que é o “banco do Brics”?

O Novo Banco de Desenvolvimento (NDB, na sigla em inglês) foi criado em 2015. Um ano antes, o Brasil foi sede da 6ª edição da cúpula do Brics, um bloco político-econômico composto por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. Neste evento, que aconteceu em Fortaleza, no Ceará, o grupo de países assinou a criação do NDB, com o objetivo de subsidiar projetos de infraestrutura e desenvolvimento, públicos ou privados, nas cinco nações que formam o grupo e em outros países emergentes.

A instituição realiza dois tipos de operações de crédito: soberanas, que são aquelas em que um país ou ente federativo da nação membro do Brics pede dinheiro; e não soberanas, que ocorrem quando uma empresa privada com sede em um dos países membros solicita o empréstimo.

O banco está sediado em Xangai, na China. Além dos cinco países fundadores, o NDB possui três novos membros: Bangladesh, Emirados Árabes e Egito. A instituição é formada por um conselho de governadores, outro de diretores, além de um presidente e quatro vice-presidentes. A presidência é rotativa, sendo periodicamente ocupada por representantes das nações do Brics.

Quem representa o Brasil no conselho de governadores atualmente é Fernando Haddad, ministro da Fazenda. Dilma Rousseff teve o nome aprovado para a presidência por um comitê do NDB após ser sabatinada por ministros da Economia de outros países membros do Brics. O mandato de Dilma como presidente do NDB vai até julho de 2025. Quem antecedeu a petista no cargo foi Marcos Troyjo, diplomata indicado à presidência do banco por Jair Bolsonaro, em 2020.

Projetos do Brasil no NDB

Os projetos subsidiados pelo NDB focam em áreas como energia limpa, infraestrutura de transporte, água e saneamento básico, proteção ambiental e infraestrutura digital. De acordo com dados coletados no site do banco, até 11 de dezembro de 2023, existiam 29 projetos do Brasil na instituição internacional, o que inclui aqueles aprovados (18), em tramitação (6), cancelados (3) e concluídos (2).

Portanto, o empréstimo de US$ 1 bilhão para o financiamento parcial do Programa Emergencial de Acesso a Crédito (FGI PEAC), aprovado pelo Senado em abril, não é o primeiro que o Brasil contrata com o NDB. A lista de projetos brasileiros envolve iniciativas públicas e privadas de diferentes estados e municípios do país.

O valor mais alto que o país já recebeu em empréstimo do NDB foi de US$ 1,2 bilhão para subsidiar a infraestrutura sustentável do BNDES, em 2020, durante a gestão do ex-presidente do banco, Marcos Troyjo.

 

Como o conteúdo pode ser interpretado fora do contexto original: Neste caso, a peça de desinformação tenta associar a imagem da ex-presidente Dilma Rousseff, enquanto atual presidente do NDB, ao fato do Brasil ter fechado acordo de empréstimo com o banco. Mas, na verdade, já existe um histórico de acordos do país com a instituição pelo menos desde 2018. Além disso, o conteúdo investigado dá a entender que a imprensa não cobriu o empréstimo, quando sua aprovação pelo Senado foi noticiada de forma vasta.

O que diz o responsável pela publicação: O Comprova tentou entrar em contato com o autor da publicação. Mas, até a publicação deste texto, ela não respondeu nossos questionamentos.

O que podemos aprender com esta investigação: É comum que os desinformadores usem trechos de reportagens ou fatos verdadeiros, de forma descontextualizada, para imprimir veracidade a determinadas teorias ou afirmações. Ao se deparar com publicações desse tipo, principalmente aquelas que não identificam fontes de informação e misturam opinião com fatos, é importante consultar diferentes veículos de imprensa de sua confiança, além de buscar canais oficiais, como o site do governo federal, do Senado e os dados no portal do próprio banco.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Até o dia 13 de dezembro, o vídeo tinha mais de 140 mil visualizações, 5.275 compartilhamentos, 5.005 curtidas e 625 comentários.

Como verificamos: Em busca no Google pelos termos “Dilma empréstimo Brics” localizamos matérias publicadas na imprensa a respeito do tema, além de uma publicação do Governo Federal que detalha a finalidade do empréstimo. Também foram feitas buscas por “Oeste sem filtro + Constantino + Dilma empréstimo Brics”, sendo possível localizar o trecho da reportagem que aparece no conteúdo investigado.

No site do NDB encontramos uma relação com o histórico de todos os projetos do Brasil, divididos em: aprovados, em tramitação, cancelados ou concluídos. A lista reúne empréstimos desde 2018. Também procuramos a responsável pelo perfil que compartilhou o conteúdo apurado.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: O Comprova verificou um vídeo publicado no TikTok, que alegava que um suposto membro da Otan ameaçou “desmantelar o Brasil”, dividindo-o em cinco partes, se o país continuasse sendo aliado dos Brics, grupo de países formado atualmente por Brasil, Rússia, China, Índia e África do Sul. O conteúdo foi considerado enganoso. Já mostramos também serem enganosos posts afirmando que o Brasil fará empréstimo a Argentina.

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Investigado por: 2023-12-01

Brasil defende solução pacífica entre Venezuela e Guiana em disputa por região petrolífera

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O governo brasileiro não toma partido na atual tensão entre Venezuela e Guiana pelo controle do território de Essequibo, região com mais de 160 mil quilômetros, rica em recursos naturais e que está sob administração da Guiana. A posição oficial do Itamaraty é de busca por uma solução negociada e pacífica para o caso. O Ministério da Defesa enviou reforço de tropas do Exército Brasileiro a Roraima, na região da fronteira com os dois países. O objetivo, segundo o ministro José Múcio disse à TV Globo, é impedir que militares venezuelanos transitem pelo território brasileiro.

Conteúdo investigado: Vídeo no Instagram aborda tensão entre Venezuela e Guiana pelo domínio do território de Essequibo, administrado pela Guiana e onde foram descobertas ricas jazidas de petróleo em 2015. Ao afirmar que tropas do Exército Brasileiro se deslocaram para Roraima, na região da fronteira do Brasil com os dois países, o responsável pela gravação diz que, devido à proximidade do presidente brasileiro com o venezuelano, “a população fica na dúvida se este comboio seria para impedir a invasão venezuelana ou para apoiá-la”. Ele alega também que o episódio pode colocar em xeque a relação do Brasil com os Estados Unidos, já que uma empresa americana de petróleo atua na região.

Onde foi publicado: Instagram.

Contextualizando: Informações de que o Exército Brasileiro enviou reforço a Pacaraima (RR), na região da tríplice fronteira entre Brasil, Venezuela e Guiana, começaram a ganhar projeção nas redes sociais em novembro de 2023. Segundo publicação do jornal Folha de Boa Vista do dia 24, “moradores do município de Pacaraima divulgaram, nas últimas duas semanas, vídeos que registram uma movimentação anormal de tropas do Exército Brasileiro em direção à fronteira do Brasil com a Venezuela”.

Posteriormente, entre os dias 29 e 30, outros veículos começaram a publicar notícias sobre o reforço (Folha de S.Paulo, Estadão, TV Globo, Agência Brasil), que acontece em momento em que a Venezuela ameaça anexar a região de Essequibo, que corresponde a dois terços do território da Guiana, fica na fronteira entre os dois países e é rica em petróleo recursos naturais. A região é disputada entre Venezuela e Guiana desde 1841. A reivindicação do território pela Venezuela se intensificou a partir de 2015, quando foram descobertas jazidas de petróleo em Essequibo.

A controvérsia pela soberania da região remonta a 1811, quando a Venezuela tornou-se independente do domínio espanhol tendo a região de Essequibo como parte de seu território. Três anos depois, em um acordo com a Holanda, o Reino Unido assumiu o controle da área que corresponde à Guiana e, segundo denúncia da Venezuela em 1841, se apoderou do território. O impasse resultou, em 1899, em um tribunal internacional que decidiu que o território pertencia à então Guiana inglesa.

A Venezuela, porém, voltou a contestar o domínio da região de Essequibo e atualmente se apega a um acordo, firmado em Genebra, pouco antes da independência da Guiana, em 1966, que decidiu por uma solução negociada, mas que nunca saiu. A Guiana, por sua vez, reivindica a validade do acordo de 1899, não reconhecido pela Venezuela.

A escalada atual na tensão, além de motivar o reforço do Exército Brasileiro na fronteira, resultou no envio de chefes militares à Guiana pelo governo norte-americano para planejar a defesa do país. O Reino Unido também se manifestou pela ajuda militar à Guiana contra uma possível investida bélica da Venezuela.

Reforço militar é para impedir trânsito de tropas venezuelanas em território brasileiro

Segundo o G1, o ministro da Defesa, José Múcio Monteiro, afirmou à TV Globo, em 30 de novembro, que o envio de reforço do Exército Brasileiro a Pacaraima tem o objetivo de evitar qualquer trânsito de militares venezuelanos pelo território brasileiro. Ao Comprova, o Ministério da Defesa afirmou, em nota, que tem acompanhado a situação: “As ações de defesa têm sido intensificadas na região da fronteira ao Norte do país, promovendo maior presença militar”, informou a pasta.

Itamaraty busca solução pacífica para o caso

O vídeo que viralizou no Instagram sobre o assunto diz que, devido à proximidade de Lula com Nicolás Maduro, presidente venezuelano, não se sabe se o reforço do Exército Brasileiro na fronteira seria para impedir a invasão venezuelana da Guiana ou para apoiá-la. Segundo posicionamento do Ministério das Relações Exteriores, o Brasil é neutro no caso.

Em 30 de novembro, a embaixadora brasileira Gisela Padovan, secretária de América Latina e Caribe do Itamaraty, disse que o Brasil tem conversado com as duas partes em busca de uma solução negociada e pacífica para a questão. “O nosso interesse realmente é não ter nenhuma questão militar e bélica na nossa região. A gente prima pela paz e pela cooperação e todos os esforços brasileiros, nos mais diferentes âmbitos, são nesse sentido”, disse a embaixadora.

A embaixadora ressaltou que o caso está sendo avaliado pela Corte Internacional de Justiça da Organização das Nações Unidas (ONU), e que o governo brasileiro está acompanhando as resoluções do órgão sobre o caso. “O Brasil está acompanhando e mantendo um diálogo construtivo em busca de uma solução bilateral ou pela Corte, mas uma solução pacífica”, disse Gisela Padovan.

Em meio à tensão entre os dois países, Nicolás Maduro convocou um referendo para 3 de dezembro em que os venezuelanos terão que responder se apoiam a anexação de cerca de 75% do território da Guiana para a criação da chamada “Guiana Essequiba”.

Em 1º de novembro de 2023, a Corte Internacional de Justiça decidiu que a Venezuela não pode tentar anexar a região de Essequibo, na Guiana. Porém, o governo de Caracas diz que não reconhece o órgão e que o referendo está mantido. A Corte tem o papel de resolver disputas entre Estados, mas sua atuação é mais simbólica do que prática, já que o tribunal não pode obrigar países a cumprirem suas decisões.

Como o conteúdo pode ser interpretado fora do contexto original: Da forma como foi veiculado, o vídeo e o comentário do autor dão margem à interpretação de que o envio de tropas do Exército Brasileiro para Roraima teria o objetivo de apoiar o governo venezuelano em uma possível invasão à Guiana.

O que diz o responsável pela publicação: O Comprova fez contato com o responsável pela conta que postou o vídeo. Ele alegou propósito informativo. Porém, quando perguntado sobre a origem da informação, critério e contexto da publicação em seu perfil no Instagram, não respondeu.

Alcance da publicação: Até o dia 1º de dezembro, o vídeo que motivou esta verificação tinha 1,7 milhão de visualizações, 159.413 mil curtidas no Instagram, 22,6 mil envios, além de 1,7 mil comentários.

Como verificamos: O Comprova buscou notícias na imprensa sobre o conflito entre Venezuela e Guiana pelo domínio de Essequibo e fez contato com o Ministério da Defesa e o Ministério das Relações Exteriores para entender a posição do Brasil na disputa e o envio de tropas do Exército para a região da tríplice fronteira. O Comprova também identificou um padre que atua há 11 anos em Pacaraima para buscar informações sobre o clima na região e fez contato com o responsável pelo vídeo que deu origem a esta verificação.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: Outros conteúdos que viralizaram recentemente nas redes sociais motivaram a criação dos seguintes textos explicativos pelo Comprova: Divulgação de salários por empresas visa igualdade de gênero e não prevê exposição de dados pessoais; Desmatamento na Amazônia cai, mas queimadas crescem; e Lei que institui pau de arara como manifestação cultural não permite retorno do uso dos veículos.

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Investigado por: 2023-11-29

Divulgação de salários por empresas visa igualdade de gênero e não prevê exposição de dados pessoais

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Decreto do governo federal que regulamenta Lei da Igualdade Salarial estabelece que empresas com mais de 100 empregados deverão divulgar relatórios constando o cargo de seus trabalhadores e trabalhadoras e os valores de suas remunerações. A intenção é verificar se a legislação está sendo cumprida. Caso constatada desigualdade salarial entre homens e mulheres, a empresa será notificada e terá que elaborar um plano para mitigação do problema.

Conteúdo investigado: Publicações afirmam: “de acordo com um decreto do Governo Federal, as empresas estão agora obrigadas a divulgar os salários de seus colaboradores”. Nas postagens, não fica claro se os nomes das pessoas também serão divulgados junto com os valores nem qual é o motivo da política governamental.

Onde foi publicado: X (antigo Twitter) e Telegram.

Contextualizando: A partir de 2024, empresas com mais de 100 empregados terão que divulgar o Relatório de Transparência Salarial e de Critérios Remuneratórios, que deverá conter cargo ou ocupação das trabalhadoras e dos trabalhadores e os valores de todas as remunerações. A publicação deve trazer as informações com os dados pessoais anonimizados, ou seja, sem identificação.

A medida está prevista no Decreto nº 11.795, publicado no Diário Oficial da União (DOU) do dia 23 de novembro, regulamentando a Lei nº 14.611, de julho deste ano. A lei estabeleceu a obrigatoriedade de igualdade salarial entre mulheres e homens para a realização de trabalho de igual valor ou no exercício da mesma função, enquanto o decreto trata dos mecanismos a serem utilizados para garantir e fiscalizar isso.

Os relatórios deverão ser divulgados a cada seis meses, sempre nos meses de março e setembro, e devem conter os valores relativos ao salário contratual; 13° salário; gratificações; comissões; horas extras; adicionais noturno, de insalubridade, de penosidade, de periculosidade, entre outros; terço de férias; aviso prévio trabalhado; descanso semanal remunerado; gorjetas; e outras remunerações previstas em norma coletiva de trabalho.

Outras informações que deverão constar nos relatórios ainda serão estabelecidas pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), bem como o formato e procedimento de envio, que deverá ser por meio de ferramenta informatizada. Além do envio ao MTE, os relatórios deverão ser disponibilizados ao público na internet.

Caso seja constatado que há desigualdade salarial entre homens e mulheres, funcionários da mesma empresa, ela será notificada pelo MTE e a empresa terá 90 dias para elaborar um Plano de Ação para Mitigação da Desigualdade Salarial e de Critérios Remuneratórios entre Homens e Mulheres. Estes planos deverão conter as medidas a serem adotadas, bem como a implementação de ações de promoção da diversidade e inclusão no ambiente de trabalho.

Como o conteúdo pode ser interpretado fora do contexto original: Sem o contexto, o usuário que se depara com a publicação não tem como compreender do que se trata o decreto em questão e por qual motivo as empresas são obrigadas a divulgar os salários dos colaboradores. A afirmação isolada pode até gerar interpretações equivocadas sobre vazamento de dados pessoais e invasão de privacidade.

O que diz o responsável pela publicação: Foi enviada mensagem direta para o autor da publicação via X . O perfil em questão enviou como resposta links de matérias que anunciam o decreto publicado pelo governo federal. A página, que se classifica como portal de “notícias, comédia, paródia, ironia e sátira”, já compartilhou outros conteúdos alvos de investigação do Comprova.

O que podemos aprender com esta verificação: Usuários das redes sociais devem estar atentos a informações incompletas que circulam online. No caso da publicação em questão, não havia contexto suficiente para entender do que se tratava o decreto, o que dá margem para interpretações equivocadas, como por exemplo, a compreensão errônea de que os dados pessoais dos trabalhadores e trabalhadoras seriam expostos, sem respeito à Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais.

Alcance da publicação: No X, a publicação teve 26,8 mil visualizações, 23 comentários, 37 republicações e 329 curtidas até 29 de novembro. No Telegram, foram 8,3 mil visualizações até a mesma data.

Como verificamos: No Google, fizemos uma busca pela frase: “empresas estão agora obrigadas a divulgar os salários de seus colaboradores”. Como resultado da pesquisa, apareceu uma matéria da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), portal de notícias governamental, anunciando a publicação do decreto que regulamenta a lei da igualdade salarial. A partir disso, analisamos as informações incluídas no Decreto nº 11.795 e na Lei nº 14.611, sancionada em julho deste ano.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: O Comprova já realizou outras checagens sobre o tema de regulamentação de empresas privadas. Em junho deste ano, mostramos que tarifação em Pix para empresas é facultativa e existe desde 2020. Anteriormente, também mostramos que é falso que PT tenha projeto de expropriar empresas privadas.

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Investigado por: 2023-11-22

Desmatamento na Amazônia cai, mas queimadas crescem; veja dados dos governos mais recentes

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A Amazônia é frequentemente alvo de desinformação nas redes sociais. Números e imagens mostrando desmatamento e queimadas são usados, muitas vezes sem contexto, por diferentes grupos políticos para atacar opositores. O Comprova analisa dados de queimadas e incêndios na Amazônia brasileira e esclarece, a partir de análises de especialistas, o aumento de focos de incêndio no bioma em 2023.

Conteúdo investigado: Em vídeo publicado no Instagram, uma mulher aborda pessoas na rua e mostra imagens de queimadas que ela diz serem na Amazônia. Ela questiona os passantes se as fotos seriam de incêndios que ocorreram durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) ou do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Os respondentes indicam que seriam imagens feitas durante o governo Bolsonaro e ela afirma que são fotos de 2023 e que “a mídia não está noticiando nada”. O vídeo é acompanhado da legenda “Até ano passado, queimadas na Amazônia eram escândalo. Hoje, não dá nem notícia. Por quê?”.

Onde foi publicado: Instagram

Contextualizando: A preservação da floresta amazônica é ponto crucial no debate sobre as mudanças climáticas. No Brasil, o tema divide grupos políticos. Durante seu mandato, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) foi criticado dentro e fora do país pelas decisões políticas que afetaram o bioma. Ele é acusado de favorecer o agronegócio em detrimento da preservação da floresta e de ser responsável por aumentar o garimpo ilegal na região. Já neste primeiro ano de mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que prometeu zerar o desmatamento ilegal até 2030, o país registra na Amazônia o maior número de queimadas para o mês de outubro em 15 anos.

Em 2023, dados oficiais do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) mostram que houve uma redução do desmatamento no bioma, mas um aumento nas queimadas. Segundo especialistas ouvidos pelo Comprova, os motivos são diversos e incluem as condições climáticas — principalmente pela influência do El Niño —; queimadas para gestão da terra; e o legado de desmatamentos anteriores, que acabam deixando o solo seco e, com isso, mais propenso a incêndios.

Nas redes sociais, opositores de Lula cobram do poder público, de ativistas e até artistas posicionamento a respeito do aumento nos focos de incêndio, alegando que durante o mandato do ex-presidente Bolsonaro havia uma exigência maior de ações governamentais para controlar a degradação da Amazônia. Alguns grupos políticos afirmam ainda que a imprensa estaria deixando de noticiar os incêndios para favorecer a atual gestão.

Para esclarecer a questão, o Comprova analisou dados de queimadas e desmatamentos registrados nos quatro anos de governo Bolsonaro e no primeiro ano de governo Lula (até setembro) e reuniu informações a respeito das políticas de ambos relativas ao meio ambiente. Também foram consultados especialistas para detalhar a situação do desmatamento e das queimadas na Amazônia e quais as causas dos incêndios recentes.

O governo Bolsonaro e a Amazônia

Antes mesmo de tomar posse, o ex-presidente Jair Bolsonaro já preocupava ambientalistas. Ao longo da campanha, ele falou em reduzir o trabalho de fiscalização do Ibama, liberar a mineração e agropecuária em terras indígenas e retirar o Brasil do acordo climático de Paris, o que não se concretizou. Ele queria, em suas palavras, pôr fim ao “ativismo ambiental xiita”.

Os primeiros anos do governo Bolsonaro foram marcados por recordes no número de incêndios na Amazônia. Em 2019, foram detectados mais focos de incêndio entre os meses de março e abril do que durante toda a série histórica do Projeto Queimadas, do Inpe, que começou em 1999. Em agosto do mesmo ano, o número de incêndios foi o maior em 15 anos. Foi naquele ano que aconteceu o “Dia do Fogo”, ocasião em que fazendeiros do Pará se uniram para causar incêndios e desmatar áreas para criação de gado. O caso foi noticiado internacionalmente.

Os incêndios ganharam ainda mais repercussão mundial após a nuvem de fumaça causada pelos incêndios florestais escurecer o céu de São Paulo.

Em agosto de 2019, Bolsonaro afirmou que as organizações não governamentais (ONGs), que atuam na proteção ambiental, seriam as responsáveis pelos incêndios ilegais. O então presidente disse ainda que as ONGs seriam financiadas pelo ator Leonardo Di Caprio. No dia seguinte, Bolsonaro disse que o Brasil não tinha recursos para combater os incêndios, pois a “Amazônia é maior que a Europa”. Como checado pela imprensa, a informação é enganosa.

No ano seguinte, 2020, as queimadas se mantiveram e foram somadas a um aumento no desmatamento. Segundo o Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), a taxa de desmatamento entre agosto de 2020 e julho de 2021 foi 57% maior que a da temporada anterior e a pior dos últimos dez anos.

Em 2021, o então presidente afirmou, em um evento com investidores em Dubai, que a floresta amazônica, por ser úmida, não pega fogo.

Sob a gestão do ex-ministro Ricardo Sales na pasta de Meio Ambiente, funcionários de perfil técnico no Ibama e no ICMBio foram preteridos por indicados do círculo pessoal dele. Foram nomeados, particularmente, muitos policiais militares para postos relevantes.

A frase de Salles que marcou sua passagem pelo governo aconteceu em um pronunciamento na reunião ministerial de 22 de abril de 2022. Ele defendeu que o governo aproveitasse os dias de transtorno do início da pandemia de Covid-19 para “ir passando a boiada”. A sugestão era que o governo emitisse decretos e medidas provisórias para afrouxar a fiscalização ambiental diante do caos global causado pela pandemia.

Após ser alvo de uma ação de busca e apreensão pela Polícia Federal, Sales deixou o cargo e foi substituído por Joaquim Leite, que manteve, grosso modo, as mesmas diretrizes da gestão anterior.

Às Forças Armadas ficou relegado o planejamento e o combate ao desmatamento na Amazônia.

As promessas e ações de Lula para a Amazônia

Durante a campanha eleitoral de 2022, o então candidato Luiz Inácio Lula da Silva (PT) destacou projetos de preservação ambiental e principalmente o combate ao desmatamento na Amazônia como uma maneira de se diferenciar de Bolsonaro, mas também de obter apoio internacional.

Uma das prioridades da campanha era conseguir a liberação de recursos do Fundo Amazônia de forma rápida junto às autoridades da Noruega. No primeiro ano de governo, em setembro de 2023, ele anunciou a liberação de R$ 600 milhões para os municípios brasileiros para combater o desmatamento e os incêndios para 2025.

Com o aumento nos registros de incêndios ao longo do ano, o Comitê Orientador do Fundo Amazônia aprovou, em novembro, um incremento nos recursos disponíveis para os nove Estados da Amazônia Legal atuarem no combate a incêndios florestais e queimadas ilegais.

Dias depois, o presidente do Ibama, Rodrigo Agostinho, admitiu ao Estadão que a estrutura de combate a incêndios e a resposta à crise na Floresta Amazônica ainda são insuficientes.

Lula também prometeu, em discurso na COP27, zerar o desmatamento e a degradação de biomas até 2030.

Considerando o período compreendido somente no governo Lula – 1º de janeiro a 31 de julho –, a redução na destruição da floresta amazônica no Brasil foi de 63%. A pesquisadora do Imazon Larissa Amorim afirmou ao site O Eco que o resultado só foi possível devido à retomada da pauta ambiental pelo novo governo.

“Somente o fato de não incentivar o desmatamento ilegal, por si só, já causa um efeito, por perda daquela sensação de impunidade. O fortalecimento dos órgãos responsáveis pelas ações de combate ao desmatamento, como, por exemplo, o Ibama e o ICMBio, também são muito importantes”, disse ao site.

Do ponto de vista político, Lula enfrenta problemas para dar destaque à questão do meio ambiente. Sob pressão da bancada ruralista e com apoio de deputados do Centrão, foi aprovado um projeto de lei complementar que retirou poderes dos Ministérios de Meio Ambiente e dos Povos Indígenas. A pasta, que é comandada por Marina Silva, ficou sem o Cadastro Ambiental Rural (CAR) e sem a Agência Nacional de Águas (ANA).

A relação do desmatamento com o atual cenário das queimadas

Dados do Programa de Monitoramento do Desmatamento da Floresta Amazônica Brasileira por Satélite (Prodes), do Instituto Nacional de Pesquisas Especiais (Inpe), mostram que houve queda no desmatamento entre agosto de 2022 e julho de 2023. Durante o período, o bioma perdeu 9.001 quilômetros de floresta — uma queda de 22,36% em comparação com o período anterior.

No entanto, a Amazônia tem sido castigada com o crescimento no número de focos de queimadas. De acordo com Inpe, entre 1º de janeiro e 20 de novembro de 2023, 91.162 focos foram registrados no bioma. Só em novembro são 11.160. O acumulado, porém, ainda é menor se comparado ao mesmo período em 2022, quando foram 110.481 focos — uma queda de 17%.

“Embora exista uma relação entre desmatamento e incêndios florestais, a dinâmica atual mostra que os incêndios podem persistir e até aumentar mesmo em um contexto de desmatamento reduzido, devido a fatores climáticos e legados do desmatamento passado”, explica o professor do Departamento de Engenharia Civil e Ambiental da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) Celso Augusto Guimarães Santos.

Entre as condições climáticas, o El Niño é apontado como um dos fatores já que o fenômeno deixa o tempo mais seco. Outro ponto são as queimadas para gestão da terra, como a limpeza de terrenos de pastagem, que podem sair do controle devido às condições ambientais.

“Esta situação destaca a complexidade dos desafios ambientais enfrentados na Amazônia e a necessidade de abordagens de gestão e conservação que considerem tanto o desmatamento quanto às condições propícias para incêndios”, afirma.

Guimarães Santos integra um grupo de pesquisadores que publicou um artigo na revista Nature Ecology & Evolution que aponta que apenas 19% dos incêndios registrados este ano na Amazônia estão ligados ao desmatamento recente. O dado faz parte de uma pesquisa feita por cientistas de diversas instituições nacionais e internacionais.

“A fragmentação resultante do desmatamento anterior pode tornar as florestas remanescentes mais vulneráveis a incêndios, pois as bordas das florestas são mais suscetíveis a secar e queimar”, complementa.

O professor José Salatiel Rodrigues Pires, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), explica, ainda, que as queimadas são rastreadas como pontos de calor, gerados pela queima de áreas para agricultura, em áreas de pastagens secas que já haviam sido desmatadas ou em florestas secas. Nesta situação, um raio, por exemplo, pode gerar um ponto de combustão que será detectado pelo satélite, mas que nem sempre terá ligação com o desmatamento

Esta questão técnica já vigia no governo Bolsonaro, mas no cenário atual, de seca na Amazônia, se torna mais relevante. Assim, explica Pires, para ter certeza da origem da queimada, é preciso usar um conjunto de dados.

“Quando o satélite detecta um ponto de calor, ele não verifica qual o uso da terra existe nessa área (se é uma área de cana-de-açúcar, uma área de pastagem ou uma floresta desmatada queimando)”, diz. “Para poder analisar se as áreas de queimadas são áreas desmatadas, temos que cruzar essa informação com as imagens de outros satélites. Se o foco de calor está em uma área de agricultura, sabemos que foi uma queimada de manejo agrícola, mas se está em uma floresta, podemos verificar se é devido a desmatamento”, afirma.

Sem cruzar os dados, diz o pesquisador, pode-se pensar, “de forma errônea, que tudo se trata de área desmatada sendo queimada”.

A mídia não mostra as queimadas atualmente?

Ao contrário do que é dito na publicação investigada, a mídia tem relatado o atual momento na Amazônia e a relação entre as queimadas e o desmatamento. Em julho, o Nexo publicou uma reportagem que explica os motivos para o aumento nas queimadas, mesmo com a queda no desmate.

O Estadão também trouxe um conteúdo em que mostra os motivos para o aumento no número de focos de incêndio na Amazônia. O artigo, inclusive, aponta que, segundo a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, os impactos do El Niño, agravados pelas mudanças climáticas, são um desafio e, por isso, aumentou o número de brigadistas na região. Além disso, na mesma reportagem, o presidente do Ibama, Rodrigo Agostinho, admite que a estrutura de combate ao fogo é insuficiente e, por isso, solicitaria mais recursos ao Fundo Amazônia para ações como essa.

O tema também foi discutido no episódio do podcast O Assunto, do G1, em 7 de novembro. No episódio, a diretora de ciência do Ipam (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia), Ane Alencar, apontou a seca e os índices anteriores de desmatamento como fatores que contribuem para o alastramento do fogo.

Como o conteúdo pode ser interpretado fora do contexto original: A publicação dá a entender que as queimadas na Amazônia não estão na pauta da mídia. No entanto, como mostra a verificação, o tema tem sido discutido, assim como o foi no governo passado. Atualmente, as matérias focam em explicar o motivo do aumento nos incêndios uma vez que os índices de desmatamento tem caído.

O que diz o responsável pela publicação: O Comprova entrou em contato com o perfil no Instagram responsável por um vídeo viral a respeito do tema, mas não houve retorno até a conclusão deste conteúdo.

O que podemos aprender com esta verificação: Formar opiniões baseadas em fatos e evidências é importante para a tomada de decisão dos cidadãos. A Amazônia é um dos biomas mais importantes do mundo e é tema de discussões na sociedade e nos diversos níveis do poder público. Diante de conteúdos que tratam o tema de forma alarmista, sem apresentar fontes de informação ou contexto e sem respaldo de especialistas, é preciso desconfiar – ainda mais no ambiente político polarizado do Brasil. Munidos de informações relevantes e atualizadas, os cidadãos podem acompanhar e fiscalizar governos para que sejam tomadas medidas para a preservação da região.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. No instagram, a publicação contava com 5,6 milhões de visualizações em 21 de novembro.

Como verificamos: A reportagem buscou dados sobre desmatamento no sistema Prodes e sobre queimadas no Programa Queimadas, ambos do Inpe. Também pesquisamos por reportagens atuais a respeito da situação da Amazônia e matérias feitas durante o governo Bolsonaro. Ainda entrevistamos os pesquisadores José Salatiel Rodrigues Pires, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e Celso Augusto Guimarães Santos, do Departamento de Engenharia Civil e Ambiental da Universidade Federal da Paraíba (UFPB).

O Comprova também demandou o Inpe, mas o órgão informou que não iria se manifestar sobre postagens de terceiros.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: A Amazônia e as políticas públicas relacionadas ao bioma são alvos frequentes de desinformação. Recentemente o Comprova publicou conteúdo explicativo sobre o Fundo Amazônia. Também já mostrou que o presidente Lula não vendeu a região para uma mineradora em troca de dinheiro do Fundo e mostrou que é falso que as chuvas impedem desmatamento na Amazônia.

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Investigado por: 2023-10-26

Lei que instituiu pau de arara como manifestação cultural não permite retorno do uso dos veículos

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Uma lei sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em agosto de 2023 reconheceu a tradição do uso do pau de arara em romarias religiosas como manifestação cultural e imaterial do Brasil. Esse tipo de veículo consistia na adaptação de caminhões para o transporte de pessoas, com a inclusão de bancos e toldos em carrocerias. Embora tradicional em cidades do interior do Nordeste, a utilização é proibida desde 2014 por resolução do Conselho Nacional de Trânsito (Contran). A lei sancionada não faz qualquer mudança quanto a isso.

Conteúdo investigado: Vídeo mostra trechos de uma solenidade do governo federal com a presença do presidente Lula e outras autoridades. O narrador do conteúdo diz que o povo nordestino “pode comemorar”, pois o “governo petista oficializou o pau de arara patrimônio cultural brasileiro”. O autor ainda cita supostos financiamentos para meios de transporte como ônibus e metrôs destinados a países como Cuba e Argentina, dando a entender que o governo estaria, ao mesmo tempo que financia obras no exterior, incentivando o transporte precário no Brasil. Na sequência, aparecem trechos de declarações de Lula, do deputado José Guimarães (PT) e do padre Cícero José da Silva, da Diocese do Crato, no Ceará, durante a cerimônia.

Onde foi publicado: Kwai e Telegram.

Contextualizando: Em 1º de agosto de 2023, o presidente Lula (PT) sancionou uma lei que torna a tradição do uso do pau de arara em romarias religiosas como manifestação cultural e imaterial do Brasil. No dia, foi realizada uma cerimônia em Brasília junto a lideranças políticas e religiosas do Ceará. Dentre os que aparecem nos registros fotográficos, estão os deputados federais José Guimarães (PT) e Yury do Paredão (sem partido), o atual prefeito de Juazeiro do Norte, Gledson Bezerra (Podemos) e o ex-gestor do município, Arnon Bezerra (PDT). O padre Cícero José da Silva, reitor da Basílica Santuário Nossa Senhora das Dores, da Diocese do Crato, também compareceu.

| Foto: Ricardo Stuckert/PR
 

No encontro, Guimarães, que é o autor da proposta, ressaltou que o transporte hoje mudou, mas ficaram “o legado e a cultura”. “Um projeto reconhecendo o transporte pau de arara como patrimônio cultural e imaterial do Brasil, essa é a natureza do projeto”, disse.

Em nota enviada ao Comprova, o deputado reiterou o posicionamento. Ele ressaltou que a lei não significa o retorno do veículo ou “qualquer tipo de regularização junto ao Código Brasileiro de Trânsito”, como enganam posts virais nas redes sociais. “Trata-se claramente de uma homenagem aos romeiros e romeiras que, por décadas, utilizaram esse transporte para o turismo religioso, criando assim uma tradição histórica que ultrapassa gerações”, afirmou. “Tentar distorcer esse fato configura, no mínimo, uma atitude de má fé e merece ser repudiada inclusive com medidas judiciais”, disse.

A Lei Nº 14.641 declara como “manifestação da cultura nacional a tradição do uso, em romarias religiosas, do transporte conhecido como “pau de arara”, como está disponibilizado no Diário Oficial de 2 de agosto deste ano. Não há qualquer menção a uma mudança no Código de Trânsito Brasileiro (CTB) ou invalidação de resoluções do Conselho Nacional de Trânsito.

Desde 2014, é proibido o transporte de pessoas em pau de arara, que é uma adaptação de carrocerias de caminhões usadas para comportar passageiros durante o deslocamento. Na resolução Nº 508 de novembro de 2014, o conselho instituiu os requisitos de segurança para a circulação, a título precário, de veículo de carga ou misto transportando passageiros no compartimento de cargas.

| Foto: Rozelia Costa/Basílica Nossa Senhora das Dores (via Agência Senado)
 

A resolução revogou uma determinação anterior, emitida em 1998, que permitia o uso dos veículos em algumas situações. Por meio de nota, o Ministério dos Transportes, pasta à qual o conselho é vinculado, destacou a obrigatoriedade dos bancos revestidos com espuma, presença de encosto de cabeça e cintos de segurança para todos os ocupantes, devidamente fixados na estrutura da carroceria, além de boa qualidade da carroceria, presença de barras de apoio, proteção lateral, entre outros.

“Deste modo, esta resolução é explícita quanto aos requisitos necessários para a possibilidade de utilização destes veículos, como é o caso do projeto sancionado pelo presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva”, apontou a pasta.

Ficou proibida, com a resolução, a utilização de veículos de carga tipo basculante e boiadeiro.

O descumprimento da medida, ou seja, o transporte de pessoas nesse tipo de veículo, acarreta ao proprietário ou condutor do veículo penalidades e medidas administrativas. Reportagem do UOL, publicada em 2022 mostrou que, apesar de proibido, o transporte ainda é usado em alguns locais.

Pau de arara faz parte da cultura de romeiros

Os veículos do tipo pau de arara eram tradicionalmente usados em diversas regiões do Nordeste e estão ligados especialmente ao êxodo rural e às romarias. Atualmente, mais de quatro milhões de pessoas utilizam todos os anos o transporte em romarias, como a de Padre Cícero, em Juazeiro do Norte, e de São Francisco das Chagas, em Canindé, ambas no Ceará, e a de Bom Jesus da Lapa, na Bahia. Diante da proibição, grupos de romeiros pedem ao Contran medidas mais simplificadas que garantam a segurança, sem descaracterizar este meio de transporte.

Padre Cícero José da Silva, reitor da Basílica Santuário Nossa Senhora das Dores, da Diocese do Crato, divulgou carta, quando houve a sanção da lei, e ressaltou o caráter cultural do transporte. “Trazemos na memória a coragem dos primeiros peregrinos que iam a Juazeiro do Norte nas carrocerias adaptadas dos caminhões e, através da experiência de fé, contribuíram para a construção da identidade religiosa e cultural da cidade, além do desenvolvimento econômico.”

A Diocese do Crato, inclusive, mantém, em seu site, registros de festas antigas que tinham o uso do transporte. “Como de costume os romeiros enfeitam os carros, ônibus, caminhões pau de arara. Colocam a imagem do padre Cícero, da Mãe das Dores, usam bandeirolas nas mais diversas cores para demonstrarem a alegria por estarem no Juazeiro do ‘Padim Ciço’. Os juazeirenses, por sua vez, ficam nas calçadas das ruas aguardando os bombons, pirulitos e pipocas jogados pelos romeiros que estão nos transportes”, escreve uma publicação de setembro de 2016.

Empréstimos e falta de água já foram esclarecidos pelo Comprova

O autor da publicação também faz alegações relacionadas a supostos financiamentos para meios de transporte como ônibus e metrôs destinados a países como Cuba e Argentina. Em janeiro deste, o presidente Lula afirmou que o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) voltará a financiar projetos de desenvolvimento e engenharia em países vizinhos. A fala aconteceu durante pronunciamento em Buenos Aires, na Argentina, ao lado do então presidente argentino, Alberto Fernández.

No mesmo dia, Lula disse que ele e empresários brasileiros estariam interessados na conclusão da rede de tubulação para transporte de gás natural argentino. Ele afirmou que iria criar condições para “ajudar” nas obras, com o BNDES atuando como financiador do empreendimento. No entanto, não houve nenhuma formalização para a retomada de financiamentos neste sentido.

A ligação entre empréstimos e financiamentos a países vizinhos com um suposto descaso com o Brasil é uma crítica comum aos governos do PT. O tema é comum em peças de desinformação. O Comprova já investigou vídeo que citava 20 operações que supostamente teriam sido financiadas pelo BNDES entre os anos de 2009 e 2014 (durante os governos petistas de Lula e Dilma Rousseff). A peça apresenta informações falsas referentes aos valores financiados, além de atribuir ao banco sete construções que não tiveram acesso a recursos de linhas de crédito do banco.

Em outro caso, foi mostrado que publicação misturava dados verdadeiros com números incorretos sobre financiamentos do BNDES nos governos do PT. Também foi mostrado este ano que é enganoso que o Brasil fará empréstimo à Argentina enquanto Lula bloqueia recursos da saúde e educação.

O fornecimento de água no Nordeste do país também tem sido um tema recorrente de desinformação em posts compartilhados nas redes sociais. No vídeo alvo desta checagem, o autor cita, sem dar detalhes, que “cortaram a água” do povo nordestino.

O Comprova já demonstrou, por exemplo, como é o funcionamento do processo de captação e bombeamento de água para estados do Brasil e que o governo federal não bloqueou água na região. Também mostrou que a polarização intensifica a desinformação sobre a transposição do Rio São Francisco, a maior obra de infraestrutura hídrica do Brasil, que atende estados nordestinos.

Os autores dos conteúdos também propagam informações fora de seu contexto original, para fazer alegações enganosas e falsas a respeito deste tema . Neste sentido, o Comprova mostrou, recentemente, que protesto na Bahia não foi motivado por falta de água, nem tem relação com Governo Lula.

Como o conteúdo pode ser interpretado fora do contexto original: A postagem analisada aqui, como foi veiculada sem a devida contextualização, dá a entender que o uso do veículo poderá ser retomado no Brasil. Além disso, ao mencionar investimento em outros países, o vídeo possibilita a interpretação que haveria uma ação direta do governo federal para desfavorecer a aplicação de recursos na região em comparação com países como Argentina e Cuba.

O que diz o responsável pela publicação: O Comprova tentou contato com o autor da publicação, mas não houve retorno até a publicação desta verificação.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Até o dia 26 de outubro, a publicação no Kwai acumulava mais de 106 mil visualizações, 10,5 mil curtidas e 3,4 mil comentários. O conteúdo também vem sendo disseminado no Telegram.

Como verificamos: A verificação buscou no Google pelos termos “Lula + pau de arara”, o que resultou em links de reportagens publicadas na imprensa e que tratam da solenidade que marcou a assinatura da lei que torna a tradição do uso do pau de arara em romarias religiosas como manifestação cultural e imaterial do Brasil, entre as quais, a do Correio Braziliense, Metrópoles e da própria agência de notícias do governo federal.

Pelos mesmos termos, mas em busca no YouTube, localizamos a transmissão da solenidade.

O Comprova também buscou a assessoria de imprensa do deputado federal José Guimarães, autor da lei sancionada, e com o Ministério dos Transportes.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: O conteúdo contextualizado pelo Comprova também já foi checado pelo Boatos.org, que mostrou ser falsa a volta do uso do pau de arara como meio de transporte. O governo federal e suas políticas são, constantemente, alvos de desinformação. O Comprova já verificou que o governo Lula assinou acordo de cooperação técnica com Autoridade Palestina, não com o Hamas; que Alckmin não sugeriu acabar com Bolsa Família; e que o presidente não instituiu banheiro unissex nas escolas.