O Projeto Comprova é uma iniciativa colaborativa e sem fins lucrativos liderada pela Abraji e que reúne jornalistas de 41 veículos de comunicação brasileiros para descobrir, investigar e desmascarar conteúdos suspeitos sobre políticas públicas, eleições, saúde e mudanças climáticas que foram compartilhadas nas redes sociais ou por aplicativos de mensagens.
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Eleições

Investigado por: 2022-09-02

Vídeo faz apologia ao crime ao incentivar os eleitores a escreverem o próprio voto no caderno de assinaturas da seção eleitoral

  • Falso
Falso
É falso o conteúdo de um vídeo segundo o qual o eleitor pode colocar o número do candidato em que votará ao lado de seu nome no caderno de assinaturas das seções eleitorais para poder auditar a votação. A prática em questão é crime eleitoral e o vídeo investigado, ao estimulá-la, está cometendo apologia a crime eleitoral. Segundo o Código Eleitoral, é proibido “omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, para fins eleitorais”. O caderno de assinaturas serve para conferir a identidade do eleitor, e não o voto dele, que, por Lei, é secreto. O ato incentivado também pode ser enquadrado como “boca de urna”, cuja pena chega a até um ano de detenção.

Conteúdo investigado: Publicação no TikTok em que uma mulher reage com aprovação a um vídeo no qual um homem simula um cenário em que os eleitores podem facilitar, sozinhos, um suposto processo de auditoria das urnas eletrônicas no dia da votação. O homem afirma que os eleitores podem escrever um indício do próprio voto no caderno de assinaturas da seção eleitoral, o qual todo votante precisa assinar logo antes de ir à cabine de votação. No caso, ele usa como exemplo o número de urna do presidente Jair Bolsonaro (PL), que concorre à reeleição.

Onde foi publicado: TikTok.

Conclusão do Comprova: Um vídeo no TikTok traz conteúdo falso ao argumentar que as assinaturas dos eleitores, se acompanhadas do número do candidato escolhido, poderiam gerar uma auditoria da votação. A prática descrita e simulada na publicação investigada é crime eleitoral.

Segundo o artigo 350 do Código Eleitoral vigente, a Lei 4737, de 1965, é proibido “omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, para fins eleitorais”. O caderno de assinaturas serve para conferir a identidade do eleitor, e não o voto dele, que, segundo o artigo 46 do mesmo Código, é secreto.

Segundo informou ao Comprova a assessoria de imprensa do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a prática estimulada pelo conteúdo verificado também pode ser configurada como “boca de urna”, propaganda eleitoral no dia da votação direcionada a eleitores prestes a votarem. Isso é um outro crime, previsto no inciso II do 5º parágrafo do artigo 39 da Lei nº 9.504, de 1997, conhecida como Lei das Eleições. A pena pode chegar a até um ano de detenção.

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma falsidade.

Alcance da publicação: O vídeo no TikTok teve 764.200 visualizações, 37.900 curtidas e mais de 8.800 compartilhamentos até 2 de setembro.

O que diz o autor da publicação: O Comprova tentou entrar em contato com a autora da publicação pelo TikTok, mas não obteve resposta até a publicação desta verificação.

Como verificamos: Buscamos no Google pela expressão-chave “Assinatura permite auditoria de voto”, sem as aspas, para podermos obter, como resultado, páginas relacionadas mas sem, necessariamente, conter essa frase exata. A pesquisa no Google identificou uma reportagem publicada em 2022 pela agência de checagem Aos Fatos, que desmente o mesmo conteúdo verificado, e uma segunda matéria, no próprio site do TSE, de 2018, sobre outra postagem que continha a mesma alegação.

Além disso, encontramos nos arquivos do Comprova um artigo de 2018 desmentindo outro vídeo que, no contexto das eleições gerais daquele ano, fazia a mesma apologia ao crime. Também enviamos e-mail à assessoria de imprensa do TSE, principal autoridade eleitoral do Brasil, apresentando-lhe o caso. Por sua vez, a assessoria de imprensa do tribunal apenas nos recomendou a acessar o Código Eleitoral vigente e nos indicou que a prática estimulada pelo conteúdo verificado pode ser configurada como o crime de “boca de urna”.

Apologia ao crime

O ato de escrever qualquer indício do próprio voto no caderno de assinaturas da seção eleitoral, como estimulado pelo conteúdo verificado, é um crime, previsto no Código Eleitoral vigente, Lei 4737, de 1965. Segundo o artigo 350, que fica dentro da seção “DOS CRIMES ELEITORAIS”, é proibido “omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, para fins eleitorais”. O caderno de assinaturas serve para conferir a identidade do eleitor, e não o voto dele. O eleitor só está autorizado a assiná-lo, segundo o manual do mesário para as eleições deste ano. E, caso tenha biometria registrada em seu título de eleitor, o votante é dispensado do ato.

Segundo a resposta da assessoria de imprensa do TSE ao Comprova, assim como reportagem de 2018 do próprio tribunal, a prática pode constituir “boca de urna”, propaganda eleitoral no dia da votação direcionada a eleitores prestes a votar. Isso é um outro crime, previsto no inciso II do 5º parágrafo do artigo 39 da Lei nº 9.504, de 1997, conhecida como Lei das Eleições. A pena pode chegar a até um ano de detenção.

Voto secreto

O sigilo do voto é garantido e assegurado pela Constituição Federal, sendo cláusula pétrea, ou seja, não pode ser alterado nem por Emenda Constitucional. Diversos dispositivos da Justiça Eleitoral também foram elaborados para garantir a inviolabilidade e o sigilo do voto, como a resolução de 2022 que determina que o eleitor deve deixar o celular com o mesário durante a votação. A Lei das Eleições já proibia o porte de celulares, máquinas fotográficas e filmadoras dentro da cabine. No final deste agosto, o TSE determinou que até mesmo o porte de armas é proibido nas seções eleitorais. De acordo com o Código Eleitoral, violar ou tentar violar o sigilo do voto é crime, com pena prevista de detenção de até dois anos.

Métodos de auditoria

As autoridades eleitorais já contam com métodos oficiais e comprovadamente eficientes para auditar as urnas, incluindo etapas que ocorrem antes mesmo das eleições, como a abertura do código fonte das urnas e os testes públicos de segurança.

No dia da eleição, as urnas eletrônicas emitem a zerésima, um documento com o nome e partido de todos os candidatos que concorrem naquele estado e que atesta que não há nenhum voto contabilizado naquela urna. A zerésima é emitida pelos mesários em cada seção eleitoral antes do primeiro eleitor votar. O presidente da mesa, os mesários e os fiscais presentes devem assinar o documento.

Há também, no dia da votação, o teste de integridade, no qual urnas sorteadas são fiscalizadas nas sedes dos Tribunais Regionais Eleitorais (TREs). Esse processo é realizado desde 2002, e nunca houve divergência entre os resultados da urna eletrônica e da contagem dos votos em papel.

Ao fim da votação, cada urna eletrônica emite também o boletim de urna, que mostra quantos votos cada candidato teve em cada seção eleitoral. Desde 2016, os boletins de urna são gerados com um QR Code, que permite que o eleitor confira os votos por meio do aplicativo da Justiça Eleitoral, “Boletim na mão”.

Os boletins impressos são emitidos em, pelo menos, cinco vias. Uma delas é afixada na porta de cada seção eleitoral e duas são levadas para o cartório eleitoral. O documento registra o total de votos por partido, total de votos por candidato, total de votos nulos e brancos, total de comparecimento em voto, identificação da seção e da zona eleitoral, hora do encerramento da eleição, código interno da urna eletrônica e uma sequência de caracteres para a validação do boletim.

Caderno de votação

O caderno de votação é uma das formas de conferir a identidade do eleitor, que deve assiná-lo antes de votar. Quem tem a biometria cadastrada não precisa registrar a assinatura no caderno de votação, exceto em caso de erro ou qualquer outra dificuldade no reconhecimento biométrico.

Por que investigamos: O Comprova investiga conteúdos suspeitos que viralizaram nas redes sociais sobre a pandemia de covid-19, políticas públicas do governo federal e eleições presidenciais. O conteúdo aqui verificado confunde as pessoas sobre as eleições presidenciais e o processo eleitoral, como um todo. Além disso, há o agravante do fato de estimular os eleitores a cometer um crime.

Outras checagens sobre o tema: A agência de checagem Aos Fatos também desmentiu o mesmo conteúdo. Em 2018, no contexto das eleições gerais daquele ano, checagens do Comprova e do TSE desmentiram uma outra postagem que promovia a mesma alegação daquela aqui verificada.

Recentemente, em relação à auditoria das eleições e às urnas eletrônicas, o Comprova também explicou como funciona a fiscalização do código-fonte das urnas eletrônicas, mostrou que não há dispositivo nas urnas eletrônicas capaz de alterar votação e desmentiu uma peça de desinformação segundo a qual 32 mil urnas teriam sido grampeadas com o objetivo de fraudar a eleição.

Eleições

Investigado por: 2022-09-02

Retirada de produtores de arroz de terras indígenas não foi determinação de Lula

  • Enganoso
Enganoso
A retirada de agricultores das regiões de Raposa Serra do Sol, em Roraima, e Suiá Missú, no Mato Grosso, não foi determinação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), candidato à presidência, como afirma vídeo enganoso postado no Kwai, e sim da Justiça Federal, em 2006 e em 2012. A demarcação de terras tradicionalmente ocupadas por população indígena é prevista no Artigo 231 da Constituição de 1988, que reconhece o direito dos indígenas sobre territórios que originariamente ocupam, competindo à União demarcá-las. O processo de demarcação das duas regiões teve início em 1993, antes do governo Lula.

Conteúdo investigado: Vídeo em que homem acusa o ex-presidente Lula de ter acabado com a produção agrícola nas regiões da Raposa Serra do Sol, em Roraima, e de Suiá Missú, no Mato Grosso, “simplesmente ao bel prazer para demarcar terras indígenas”.

Onde foi publicado: Kwai.

Conclusão do Comprova: As determinações para a retirada de produtores rurais das regiões de Raposa Serra do Sol, em Roraima, e Suiá Missú, no Mato Grosso, em 2006 e 2012, respectivamente, partiram da Justiça Federal, após a Fundação Nacional do Índio (Funai) ter reconhecido as áreas como sendo de ocupação tradicional pelos povos indígenas e a demarcação das reservas ter sido homologada pelo governo federal. As decisões foram resultado de uma longa briga judicial.

A demarcação de Terras Indígenas (TI) é prevista no Artigo 231 da Constituição de 1988, que afirma que “as terras tradicionalmente ocupadas pelos índios destinam-se à sua posse permanente, cabendo-lhes o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes”. O dispositivo legal reconhece o direito dos povos indígenas sobre as terras que originariamente ocupam, “competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens”.

O processo de demarcação das regiões de Raposa Serra do Sol e Suiá Missú, citadas no vídeo verificado, começou em 1993, antes da gestão de Lula (2003-2010).

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Alcance da publicação: Até 2 de setembro, o vídeo no Kwai tinha 61,7 mil curtidas, 8.161 comentários e 23 mil compartilhamentos

O que diz o autor da publicação: O Comprova mandou mensagem para o autor da postagem do vídeo enganoso no Kwai, mas não houve resposta até o fechamento desta verificação.

Como verificamos: O Comprova fez pesquisas na internet para esclarecer o contexto da demarcação e homologação de terras indígenas nas regiões de Raposa Serra do Sol, em Roraima, e Suiá Missú, no Mato Grosso. Também foram consultados a Constituição de 1988, os decretos presidenciais que homologaram as terras indígenas e as decisões da Justiça Federal para a garantia do usufruto da área pelos povos originários. O Comprova ainda consultou reportagens na Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional e entrevistou Rafael Modesto, consultor jurídico do Conselho Indigenista Missionário (Cimi).

Raposa Serra do Sol: apesar de homologada por Lula, demarcação teve início em 1993

A determinação para que os produtores de arroz saíssem da Terra Índigena Raposa Serra do Sol, em Roraima, foi do Supremo Tribunal Federal (STF), em 2009, após finalizado o processo de demarcação da reserva (G1, Gazeta do Povo, Folha, O Tempo). Com isso, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) deu início ao reassentamento dos não indígenas que tradicionalmente viviam na região.

Apesar de ter sido homologada durante o governo Lula, em 2005, a demarcação da Terra Índigena Raposa Serra do Sol aconteceu após anos de uma briga judicial que teve início em 1998, ainda no governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Além disso, desde 1993, o local já era reconhecido como Terra Indígena pela Funai.

Mesmo com a demarcação homologada em 2005, o processo se arrastou até 2009, devido a ações judiciais movidas por produtores que alegavam ter direito às terras.

Em 2009, de acordo com matéria da Folha de S.Paulo, o então ministro da Agricultura de Lula, Reinhold Stephanes, saiu em defesa da produção de arroz na reserva. “A produção está concentrada na região norte do Estado, coincidente com a recém-demarcada área indígena”, disse.

Antes da demarcação, Roraima tinha uma área de 22,5 mil hectares para a produção de arroz, segundo dados do IBGE. Hoje, são 8.628 hectares de área plantada. Apesar da diminuição, dados da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) apontam que na última safra (2021/2022), Roraima foi responsável pela produção de 88,8 toneladas de arroz, o que equivale a 9% da produção da região Norte. No ranking nacional, o estado ocupa a 11ª posição.

A Terra Indígena Raposa Serra do Sol fica no nordeste de Roraima, nos municípios de Normandia, Pacaraima e Uiramutã. A área tem 1.747.464 hectares e é ocupada por cinco povos indígenas: Ingariró, Macuxi, Patamona, Taurepang e Wapichana.

Terra indígena na região de Suiá Missú foi homologada no governo FHC

A demarcação da Terra Indígena Marãiwatsédé, na região conhecida como Suiá Missú, foi feita pela Funai em 1993, e homologada por decreto presidencial de Fernando Henrique Cardoso (FHC) em 11 de dezembro de 1998. Ela ocupa 165.241 hectares nos municípios de Alto Boa Vista, São Félix do Araguaia e Bom Jesus do Araguaia, no Mato Grosso. Atualmente, segundo dados do site Terras Indígenas do Brasil, 781 indígenas da etnia Xavante vivem no local.

O processo de demarcação e homologação teve início na conferência ECO-92, quando a petrolífera estatal italiana Agip do Brasil, então proprietária das terras, anunciou a devolução da área à etnia Xavante, que havia sido expulsa em 1966 para a implantação da fazenda de gado Suiá Missú. A propriedade chegou a ser considerada o maior latifúndio do Brasil. À época, uma reportagem do Jornal do Brasil repercutiu o anúncio (o texto pode ser acessado na Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional).

No entanto, mesmo após a demarcação e homologação, a ocupação da terra por não indígenas, que passou a ser ilegal no território, persistiu, o que motivou o início do processo de desintrusão da região em 2012, ou seja, da retirada da população não indígena da localidade. A determinação partiu do STF, que tornou sem efeito, naquele ano, uma liminar do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) que suspendia a desintrusão.

Em 2014, diante de ameaças de nova invasão da Terra Indígena Marãiwatsédé, a Justiça Federal de Mato Grosso determinou nova ação de desintrusão para impedir o estabelecimento de não indígenas na localidade. Nos dois casos, em 2012 e 2014, as ações de desintrusão foram propostas pelo Ministério Público Federal (MPF).

Demarcação de terras indígenas é dever da União previsto na Constituição de 1988

A demarcação de terras indígenas compete ao governo federal, como está previsto no Artigo 231 da Constituição. Segundo Rafael Modesto, assessor jurídico do Cimi, trata-se de um dever da União, que independe da vontade do presidente da República.

“Não se trata de um ato discricionário do presidente que estiver em exercício, mas é uma obrigação estabelecida na Constituição brasileira. Se houver laudo antropológico, científico, que prove que determinada região é tradicionalmente ocupada por povos indígenas, a Constituição obriga que ela seja demarcada e homologada, passando a pertencer à União, mas para usufruto exclusivo da população indígena”, diz Rafael Modesto.

Segundo dados do Cimi, Lula foi o terceiro presidente da República que mais homologou terras indígenas, depois de FHC e Fernando Collor de Mello. Embora a demarcação independa da vontade do presidente da República, há políticas que podem agilizar ou atrasar essas demarcações. Reportagem do UOL publicada em 2021 mostrou que o governo de Jair Bolsonaro atuou para frear as demarcações de Terras Indígenas. Lula, por sua vez, já se manifestou favorável às demarcações durante a pré-campanha. “Temos que ter coragem de dizer que vamos não só demarcar as terras que têm que ser demarcadas como a gente vai acabar com essa história de garimpo ilegal ou com madeireiros ilegais em terras indígenas”, disse, em maio. Em junho, Lula disse que terá “imenso prazer” em “demarcar todas as terras que precisarem ser demarcadas”.

Arroz orgânico do MST

No vídeo, o autor da publicação ainda responde ao ex-presidente Lula sobre a afirmação dele de que o Movimento Sem Terra (MST) seria o maior produtor de arroz orgânico do Brasil. “Isso é mentira, quem produz são os assentados do Incra, se eles pertencem ou não ao MST problema deles”, diz no vídeo. Lula disse a afirmação durante sabatina no Jornal Nacional, da TV Globo, no dia 25 de agosto.

De fato, a produção do arroz orgânico é de assentados do Incra que fazem parte do MST. Eles são responsáveis pela maior produção da América Latina, de acordo com dados do Instituto Riograndense do Arroz (Irga). Segundo a instituição, dos 5 mil hectares de produção de arroz orgânico previstos para a próxima safra no Brasil, quatro mil estão ligados ao MST.

Os assentamentos do Incra são um conjunto de unidades agrícolas destinadas a famílias de agricultores ou trabalhadores rurais que não têm condições econômicas de adquirir um imóvel rural. No MST, são 450 mil famílias que já conquistaram terras. Porém, de acordo com a organização, elas permanecem organizadas pois acreditam que a “conquista da terra é apenas o primeiro passo para a realização da Reforma Agrária.”

Por que investigamos: O Comprova investiga postagens virais na internet que envolvam as eleições presidenciais deste ano, a pandemia da covid-19 e a realização de obras públicas. O vídeo analisado nesta verificação traz afirmações enganosas sobre o tratamento dado por Lula a produtores rurais. Conteúdos desse tipo são danosos ao processo eleitoral, pois podem influenciar a população a votar em determinado candidato com base em informações que não procedem.

Outras checagens sobre o tema:

Em 2020, o Comprova já tinha mostrado que a demarcação de terra indígena em Roraima não tinha relação com alta do preço do arroz e, este ano, o Aos Fatos apontou que não é verdade que o preço do arroz subiu por causa de demarcação de terra indígena.

Em verificações publicadas nesta semana, o Comprova mostrou que vídeo engana ao negar orçamento secreto e descontextualizar alta de preços no Brasil, que empresa de pesquisa eleitoral não funciona dentro do Instituto Lula e que Simone Tebet não deixou médica ser humilhada na CPI da Covid, ao contrário do que dizia post.

Eleições

Investigado por: 2022-09-01

Fim de patrocínio da Petrobras não tem relação com PT, diferentemente do que sugere vídeo

  • Enganoso
Enganoso
É enganoso o vídeo em que um apoiador do presidente Jair Bolsonaro (PL) relaciona o patrocínio da Petrobras a pilotos da Fórmula 1 (F1) à gestão do PT e ainda insinua que o aporte financeiro seria ato de corrupção do partido. O autor da postagem também menciona o gasto com a guarda de aviões da Fundação Nacional do Índio (Funai), mas o valor foi superdimensionado. Sobre o encontro da presidente do PT, Gleisi Hoffmann, com o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Edson Fachin, houve uma solicitação do partido para conter a disseminação de conteúdo de desinformação, não para censurar as redes sociais, como dito no conteúdo verificado.

Conteúdo investigado: Vídeo em que autor começa fazendo conjecturas sobre corrupção da esquerda, alegando que a “petezada” segue praticando esses atos pelo país e que faz “gritedo” (gritaria) quando identificados os supostos malfeitos. Ele relata que Jair Bolsonaro (PL) teria descoberto que a Petrobras estava pagando R$ 750 milhões para patrocinar dois pilotos de F1 e também R$ 1 milhão, por mês, para guardar um avião da Funai. Diz ainda que a presidente nacional do PT, Gleisi Hoffmann, encontrou-se com o ministro do STF Edson Fachin para censurar as redes sociais.

Onde foi publicado: Kwai.

Conclusão do Comprova: Vídeo que trata sobre o patrocínio da Petrobras a pilotos de F1 é enganoso. Embora a petrolífera tenha patrocinado a equipe McLaren, o contrato suspenso pelo presidente Bolsonaro havia sido firmado durante o governo de Michel Temer (MDB), em 2018, e não na gestão do PT. Além disso, ao contrário do que insinua o autor da postagem, não há indícios de irregularidades na negociação, que tratava da exposição da marca da Petrobras e do desenvolvimento de tecnologia da empresa em parceria com a equipe de F1.

Apoiador de Bolsonaro, o autor do vídeo alega que o presidente descobriu o aporte financeiro da Petrobras e que a “petezada fez um gritedo”, isto é, os integrantes do PT teriam se indignado com a revelação da suposta corrupção. O valor do contrato não foi informado oficialmente, mas, na época do rompimento, veículos noticiaram que seria de cerca de R$ 870 milhões. Este valor corresponderia a um contrato de cinco anos, entre 2018 e 2022. A Petrobras não revela valores devido à cláusula de confidencialidade do contrato.

Os valores não eram apenas para “estampar bandeirinhas do Brasil” nos capacetes dos dois pilotos da McLaren, como cita o autor do vídeo aqui verificado. Além do destaque nos capacetes, macacões e nos carros da equipe, o valor envolvia desenvolvimento de tecnologias e pesquisas. A própria McLaren publicou um comunicado quando o contrato foi rompido dizendo que a parceria rendeu “avanços tecnológicos em combustíveis e lubrificantes e identificou oportunidades para futuras colaborações nas áreas comercial, tecnológica e de responsabilidade social entre as duas empresas”.

O PT é o partido do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, também na disputa à presidência, e principal opositor de Bolsonaro, figurando, no momento, como líder nas pesquisas eleitorais.

Na mesma postagem, o autor menciona que Bolsonaro também descobriu gasto mensal de R$ 1 milhão para guardar um avião da Funai. No ano passado, o órgão fez leilão das seis aeronaves que ainda possuía, e com as quais tinha despesas para parqueamento, hangaragem [que inclui serviços como estacionamento, armazenamento, limpeza, abastecimento de energia da aeronave quando necessário, e orientação de pouso e decolagem] e tarifas dos locais em que estavam guardadas.

Em julho de 2019, quando identificada a condição dos aviões, o custo anual do aluguel era de R$ 700 mil por todas as aeronaves, não uma apenas. Em nota, a Funai informou que “as seis aeronaves foram arrematadas pelo total de R$629.500, valor que foi recolhido ao Tesouro Nacional”, mas não revelou os gastos para mantê-las no período em que estiveram paradas.

O vídeo ainda traz outra alegação: o autor afirma que a presidente nacional do PT, Gleisi Hoffmann, se reuniu com o ministro do STF Edson Fachin para censurar as redes sociais, uma alegação que carece de contexto. A equipe jurídica do partido teve encontro em maio deste ano com o magistrado, que à época ocupava a presidência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), para discutir meios de barrar o avanço da desinformação e das chamadas fakes news, particularmente nas eleições. Então, a proposta seria impedir a circulação do que é enganoso e falso, não de todos os conteúdos da internet como é insinuado no conteúdo investigado.

Para o Comprova, enganoso é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Alcance da publicação: Até as 13h30 de 1º de setembro havia mais de 113 mil visualizações e de 11 mil curtidas. A postagem recebeu também 1.369 comentários e foi compartilhada 2.499 vezes.

O que diz a autora da publicação: O autor da publicação foi procurado pelo Kwai, mas não retornou até o fechamento da verificação.

Como verificamos: O primeiro passo foi pesquisar pelas palavras-chaves que constavam no vídeo investigado. No Google, a equipe procurou “Petrobras” + “Fórmula Um” e a consulta retornou reportagens sobre o assunto no Motorsport, Placar, Estadão, G1 e Uol, nas quais, entre outras informações, era citada a rescisão do contrato da petrolífera com a McLaren.

Com o nome da escuderia patrocinada, nova pesquisa foi feita e a equipe identificou que conteúdos de desinformação sobre esse contrato da Petrobras já haviam sido desmentidos anteriormente. Em 2019, a agência Lupa apontou que era falso que o contrato foi rompido com a McLaren para direcionar os recursos à educação. No mesmo ano, o Uol revelou que não era verdade o conteúdo de um tuíte de Bolsonaro, em que o presidente afirmava que o valor pago pela Petrobras era todo em publicidade com a escuderia. No final do ano passado, o Estadão Verifica tratou como boato a alegação feita dois anos antes sobre o destino da verba do patrocínio suspenso.

O Comprova também pesquisou no Google sobre os gastos com aeronaves da Fundação Nacional do Índio, usando os termos “Funai” + “aviões” + “abandono”. Matérias jornalísticas abordam o problema (Poder 360, Exame, Estadão, Agência Brasil), mas não há informações sobre gasto de R$ 1 milhão por mês para guardar apenas um avião, como alegado pelo autor do vídeo. Esse valor era a estimativa de faturamento com o leilão dos aviões.

Também em pesquisa a reportagem buscou conteúdos que relacionassem Gleisi Hoffmann, Edson Fachin e redes sociais. A consulta retornou matérias (CNN, Veja) sobre a iniciativa do PT em conter a circulação de desinformação.

A equipe ainda enviou e-mails à Petrobras e à Funai e encontrou, no site da McLaren, um comunicado da sobre o assunto. Também foi procurado o autor da postagem, que não respondeu até a publicação da verificação.

O contrato e a rescisão

Ao contrário do que foi insinuado no vídeo, o contrato firmado entre a Petrobras e equipes de F1, e depois rompido por Bolsonaro, não se deu na gestão do PT. Segundo a assessoria da petrolífera, a parceria com a McLaren começou em fevereiro de 2018. Naquele ano, Michel Temer (MDB) estava na presidência da República. Quando houve o rompimento, reportagens (Estadão, G1) que abordaram o assunto apontaram que o valor, contratado em libras esterlinas, chegava, à época, em R$ 872 milhões, conforme um documento que tratava sobre os primeiros nove meses da gestão de Bolsonaro.

O fim do contrato, ainda de acordo com a comunicação da empresa, ocorreu em novembro de 2019, mas a Petrobras não revela valores devido à cláusula de confidencialidade. Na época em que a parceria foi desfeita, a McLaren divulgou um comunicado informando sobre o término do contrato com a Petrobras. Também sem detalhar valores, no documento a equipe de automobilismo afirma que “a Petrobras e a McLaren Racing concluíram seu acordo técnico e de patrocínio por mútuo consentimento.”

Pelo comunicado, é possível observar que o valor, embora não tenha sido divulgado, não era somente destinado à publicidade da Petrobras. “A parceria produziu claros avanços tecnológicos em combustíveis e lubrificantes e identificou oportunidades para futuras colaborações nas áreas comercial, tecnológica e de responsabilidade social entre as duas empresas”.

O comunicado da McLaren cita ainda Roberto Castello Branco, então presidente da Petrobras: “O projeto permitiu à Petrobras desenvolver gasolina e lubrificantes de alta tecnologia por meio de pesquisas com novas matérias-primas e testes realizados em condições extremas. O desenvolvimento tecnológico será aplicado em produtos lubrificantes e combustíveis”.

Os patrocínios de petrolíferas são bastante comuns na categoria. A Petronas, estatal petrolífera da Malásia, patrocina a escuderia Mercedes AMG há alguns anos, assim como a Shell, empresa de combustíveis britânica, patrocinadora da Ferrari. Além do mero patrocínio estampando as marcas nos carros, macacões e capacetes, os contratos costumam envolver pesquisas de desenvolvimento, que geram retorno para ambas as partes. A própria Petrobras tem hoje em suas bombas uma gasolina chamada de Petrobras Podium. O combustível foi desenvolvido durante uma passagem anterior da estatal brasileira pela categoria automobilística, em 2002, quando patrocinava outra equipe, a Williams.

Aeronaves da Funai foram a leilão

Em julho de 2019, conforme reportagem do Poder360, Bolsonaro publicou em sua conta no Instagram vídeo da ex-ministra Damares Alves em que mostrava a situação de abandono de um hangar no Aeroporto Internacional de Brasília. As aeronaves indicavam sinais de sucateamento.

Ainda segundo a reportagem, com informação atribuída à ex-ministra, o valor de aluguel pago para manter os aviões estacionados era de R$ 700 mil por ano. E com aluguéis atrasados, o custo chegava a R$ 3 milhões, apontou o Estadão na época. Pelas declarações de Damares, avalizadas por Bolsonaro, não havia um gasto mensal de R$ 1 milhão com apenas uma aeronave, como sugerido no vídeo aqui investigado.

O Comprova procurou a equipe de comunicação da Funai, que explicou que, em 2021, quase dois anos após o vídeo de Damares, a instituição ainda tinha seis das aeronaves em questão. Em “meados de 2021”, afirmou a Funai em nota, foi realizado o leilão das “seis aeronaves que faziam parte do patrimônio do órgão e estavam inoperantes há mais de uma década”. Segundo a fundação, eles foram fabricados entre 1971 e 1984 e eram considerados irrecuperáveis. O órgão não detalhou valores, se limitando a afirmar que “os aviões acarretavam despesas relativas à sua guarda e estadia”. A Funai acrescentou que os leilões ocorreram nos meses de maio e junho de 2021, nos estados do Rio de Janeiro, Goiás, Pará e no Distrito Federal.

Ainda de acordo com a nota, “a ação representou economia aos cofres públicos de gastos com serviços de parqueamento, hangaragem e tarifas de permanência nas localidades em que se encontravam. A realização dos leilões buscou acelerar a venda dos ativos, potencializando o proveito econômico decorrente deles e minimizando riscos de má conservação. As seis aeronaves foram arrematadas pelo total de R$ 629.500, valor que foi recolhido ao Tesouro Nacional”.

Reunião contra a desinformação

O autor do vídeo também faz referência a Gleisi Hoffmann, alegando que a presidente do PT teria se encontrado com o ministro Edson Fachin para censurar as redes sociais.

De fato, as redes sociais estiveram na pauta de uma reunião, em 20 de maio de 2022, do partido com o magistrado, quando ele ainda estava na presidência do TSE, mas o enfoque não era censura, cujo significado é “proibir a circulação pública de informação”, em uma definição mais resumida. A proposta do encontro era buscar meios de conter a disseminação de conteúdos falsos e enganosos, portanto, desinformação.

Em fevereiro, o TSE já havia formalizado parceria com oito plataformas – Facebook, Instagram, Twitter, TikTok, YouTube, Kwai, WhatsApp e Google – para combater a desinformação sobre o processo eleitoral deste ano. No mês seguinte, o Telegram também aderiu ao programa e formalizou a parceria em maio. Mesmo com o engajamento das plataformas, o TSE, por outro lado, criou um sistema de alerta para casos de desinformação relacionados às eleições.

Por que investigamos: O Comprova investiga conteúdos suspeitos que viralizaram nas redes sociais sobre a pandemia, políticas públicas do governo federal e eleições presidenciais. A postagem cita o PT, partido de um dos candidatos à presidência, atribuindo gastos financeiros que não foram assumidos na gestão do partido e insinuando que o patrocínio esportivo seria ato de corrupção. Conteúdos de desinformação como este afetam o processo democrático porque distorce a compreensão da realidade. A população tem direito de saber a verdade e basear suas escolhas em informações confiáveis.

Outras checagens sobre o tema: Faltando apenas 31 dias para o primeiro turno das eleições, em 2 de outubro, aumenta a incidência de desinformação sobre o assunto. O Comprova já demonstrou que são falsas postagens afirmando que empresa de pesquisa eleitoral funcione dentro do Instituto Lula, que Simone Tebet deixou médica ser humilhada na CPI da Covid e que apresentadores estrangeiros fizeram piada sobre Lula e eleitores baianos.

Recentemente, também classificou como enganosa postagem sugerindo apoio de João Amoêdo a Lula e falso vídeo em que Bolsonaro lidera pesquisa de intenção de voto.

Eleições

Investigado por: 2022-09-01

Vídeo engana ao negar orçamento secreto e descontextualizar alta de preços no Brasil

  • Enganoso
Enganoso
É enganoso vídeo publicado no canal Bastidores do Brasil, compartilhado pelo vereador de Fortaleza Odécio Carneiro (SD), que descredibiliza o termo “orçamento secreto” sob o argumento de que o detalhamento da prática está disponível no Portal da Transparência. Apesar de ser citado no site do governo federal, para o orçamento secreto não há critério definido quanto ao processo de indicação e destinação da verba, o que não permite a fiscalização do que foi executado com os valores da emenda. Além disso, a animação investigada aborda temas como a alta da carne e do leite e avalia, sem apresentar dados, que produtores estariam trocando o ramo de laticínios pelo da pecuária, o que justificaria a falta do produto e o aumento nos preços. O mesmo acontece quando se aborda a alta no preço de carros usados, em que o conteúdo omite ou distorce fatores que contribuíram para o cenário.

Conteúdo investigado: Uma animação publicada no YouTube que simula um diálogo familiar no qual a filha (Priscila) apresenta para a mãe (Ana Cláudia) o novo namorado (Igor), que, na peça ficcional, é inspirado no youtuber Wilker Leão. O influenciador ganhou visibilidade após ter chamado o presidente Jair Bolsonaro (PL) de “tchutchuca do Centrão”. Na conversa, Ana Cláudia questiona o genro sobre a atitude em relação ao presidente, assume um tom professoral e passa a “explicar” temas como o orçamento secreto, a relação de Bolsonaro com o Congresso, e a alta dos preços de carros usados, do leite e da carne. Ao longo do vídeo, as justificativas dadas por Ana Cláudia vão deixando Igor, o youtuber, sem argumentos.

Onde foi publicado: YouTube e Facebook.

Conclusão do Comprova: Ao falar sobre o orçamento secreto, vídeo engana ao afirmar que o detalhamento das emendas está disponível no Portal da Transparência do governo federal. O termo “orçamento secreto” é usado para se referir à emenda de relator-geral no Congresso Nacional, que surgiu em 2019. As emendas são recursos do orçamento a que parlamentares têm direito. Porém, no caso das emendas de relator, a prática não permite a transparência e detalhamento do processo de indicação e empenho dos valores, por isso a expressão “secreto”. Os dados somente passaram a ser revelados, e de forma incompleta, após determinação da ministra do Supremo Tribunal Federal (STF) Rosa Weber, em novembro de 2021.

Em relação ao aumento nos preços de alimentos, como carne e leite, o conteúdo omite alguns fatores que contribuíram para o cenário. O vídeo alega que produtores de leite teriam migrado para o ramo da carne e que isso teria feito com que a produção de lacticínios caísse, gerando um aumento no preço do produto. No entanto, não há dados que comprovem esse cenário. Para o professor do Departamento de Economia da Universidade de Brasília (UnB) César Augusto Bergo, essa mudança repentina de ramo seria inviável, uma vez que cada alimento possui especificidades e requer cadeias de produção diferentes.

Além disso, o valor da carne é influenciado pelo preço das commodities, enquanto para o leite, o inverno e o clima seco – intensificado pelo fenômeno La Niña – também interferem no mercado.

O vídeo relaciona a alta no valor dos carros usados à pandemia. De fato, a associação existe. Entretanto, não foi apenas o coronavírus que causou diretamente a elevação dos preços no caso dos automóveis usados. Segundo Mauro Sayar Ferreira, professor da Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), a escassez na cadeia de componentes para a produção de veículos novos e a própria elevação de custos relacionados aos automóveis novos também influenciaram o cenário. Isso teria gerado um aumento de demanda para os carros usados, provocando alta nos preços.

Para o Comprova, enganoso é todo conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Alcance da publicação: O Comprova investiga conteúdos que tiveram maior alcance nas redes sociais. Até o dia 1º de setembro, o vídeo publicado no YouTube teve 319,4 mil visualizações, 68 mil curtidas e 4,9 mil comentários. No Facebook, o conteúdo foi compartilhado pelo vereador de Fortaleza Odécio Carneiro e alcançou 711 mil visualizações, 84,4 mil curtidas, 4,8 mil comentários e 90,1 mil compartilhamentos até a mesma data.

O que diz o autor da publicação: Procurado pelo Comprova, Ricardo Lucena informou que o seu canal tem como objetivo entreter e divertir e que as simulações pretendem estimular a imaginação de quem o assiste. Ele também disse que, no entanto, “nem tudo pode ser levado a sério”, pois também utiliza “exagero em nome do humor”. Lucena afirmou que sempre “checa as fontes” antes de criar, mas reconheceu que algumas explicações “podem estar incompletas”, o que, segundo ele, seria consequência da “complicada logística de criação” dos vídeos. Um exemplo de informação incompleta, de acordo com o criador, é a alta do leite, pois, segundo ele, não teria dado tempo de citar outros fatores.

Como verificamos: Após assistir ao vídeo investigado e transcrevê-lo, a equipe separou os temas abordados a fim de pesquisá-los individualmente. Para entender o que é o orçamento secreto e como a medida influencia na relação dos poderes Executivo e Legislativo, o Comprova consultou os sites do governo federal e da Câmara, além de reportagens de veículos de imprensa como UOL, G1, Brasil de Fato, CNN e Folha.

Também reunimos informações sobre o aumento do preço de carros usados durante a pandemia a partir de matérias jornalísticas do UOL, G1 e Exame, além de entrevistarmos o professor da Faculdade de Ciências Econômicas da UFMG Mauro Sayar Ferreira.

Em seguida, investigamos a alta nos preços do leite e da carne no Brasil por meio da consulta a materiais da Exame, CNN Brasil, G1 e UOL. Além disso, a equipe conversou com o professor do Departamento de Economia da UnB e especialista em mercado financeiro César Augusto Bergo.

Por fim, o Comprova entrou em contato, por e-mail, com o autor do vídeo verificado.

O que é o orçamento secreto?

“Orçamento secreto” foi um termo criado pelo jornal O Estado de S. Paulo (responsável pela revelação da prática) para definir a recém-criada emenda de relator-geral no Congresso Nacional, prática elaborada em 2019 e implementada em 2020.

De acordo com a Constituição brasileira, a emenda parlamentar é um instrumento que o Congresso Nacional possui para participar da elaboração do orçamento anual. Os deputados e senadores têm, nesse caso, a oportunidade de indicar ao Executivo demandas de comunidades que representam. Atualmente, as emendas dividem-se em quatro tipos:

  • Individuais (RP6) – verba destinada individualmente a parlamentares, com caráter impositivo desde 2015 (ou seja, cada parlamentar decide onde alocar o dinheiro e essa emenda é obrigatória, precisa necessariamente estar no orçamento);
  • De bancada (RP7) – verba destinada às bancadas estaduais, com caráter impositivo desde 2019 (ou seja, emendas coletivas, elaboradas por deputados do mesmo estado ou região. Também obrigatória);
  • De comissão (RP8) – verba destinada às comissões temáticas do Congresso. Não são impositivas (ou seja, emendas coletivas de comissões permanentes da Câmara ou do Senado. Não é obrigatória).
  • De relator (RP9) – emenda que permite ao relator-geral do Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) alterar ou incluir despesas. Criada em 2019 e não é obrigatória.

A emenda de relator se diferencia das demais porque é definida pelo deputado ou senador escolhido como relator-geral do Orçamento a cada ano. Além disso, ao contrário das outras, não há critério definido quanto ao destino do dinheiro, o que dificulta a fiscalização sobre a execução da verba.

No vídeo verificado, o autor alega que a prática “não é segredo para ninguém” porque está “disponível no Portal da Transparência”. No entanto, o termo “secreto” dá conta da inexistência de transparência e detalhamento do processo de indicação e empenho dos valores da emenda de relator, dados somente revelados, e de forma incompleta, após determinação da ministra do STF Rosa Weber, em novembro de 2021.

Na decisão, Weber ordenou a divulgação do processo de definição e a execução das emendas de relator nos orçamentos de 2020 e 2021. Além disso, mandou que fossem registradas, em plataforma eletrônica, todas as demandas parlamentares voltadas à distribuição desse tipo de emenda.

No fim do ano passado, o Supremo liberou o pagamento das emendas, depois que o Congresso aprovou novas regras de transparência, e deu prazo de 90 dias para que o sistema de monitoramento (com individualização, detalhamento e motivação das indicações) fosse instituído.

Após Weber negar o pedido de prorrogação de prazo para a implementação das medidas de transparência, o Congresso encaminhou, em maio deste ano, informações sem padronização e incompletas sobre o orçamento secreto.

A justificativa foi de que os relatores dos orçamentos anteriores, deputado Domingos Neto (PSD-CE) e senador Márcio Bittar (União-AC), tiveram dificuldades de reunir os dados, já que não havia obrigação legal para isso à época. Por isso, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), solicitou de forma genérica a todos os deputados e senadores que sinalizassem quais emendas de relator haviam sido apoiadas por cada um.

Cada parlamentar respondeu de uma forma. Alguns não detalharam os valores das emendas, nem os estados e municípios beneficiados. Três em cada 10 sequer responderam o ofício.

Como o orçamento secreto transita entre Executivo e Legislativo

O orçamento secreto nasceu no gabinete do então ministro da Secretaria de Governo, general Luiz Eduardo Ramos. À época, ele era o responsável por fazer a ponte entre o governo e o Congresso. Na prática, com o novo mecanismo, Bolsonaro transferiu ao Congresso a palavra final sobre uma parte do orçamento da União.

Para viabilizar a proposta, Ramos resgatou um dispositivo incluído pelo Congresso na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), mas que havia sido vetado por Bolsonaro três semanas antes. Em 3 de dezembro de 2019, o ministro assinou o documento que criou a emenda chamada RP9. A nova lei, que alterou a 13.898, de 11 de novembro de 2019, foi sancionada pelo presidente da República em 18 de dezembro.

A prática é alvo de críticas e é questionada em ações no STF – ADPF 850/Cidadania; ADPF 851/PSB; ADPF 854/PSOL – e no Tribunal de Contas da União (TCU) pela inexistência de um mecanismo claro de monitoramento do pagamento das emendas, tampouco do destino do dinheiro ou do objetivo da ação.

De acordo com reportagem do UOL, o orçamento secreto teria facilitado o trabalho do governo de Bolsonaro nas negociações com as bancadas do Congresso ao ser usado em troca de apoio político, já que o pagamento das emendas de relator não é obrigatório constitucionalmente. O orçamento secreto, no entanto, passou a ser o mais atendido pelo governo, como revela imagem abaixo retirada do Portal da Transparência, e que faz referência aos empenhos do ano de 2022:

Portal da Transparência – acessado em 30.08.2022

No orçamento de 2021, conforme a CNN, as emendas parlamentares individuais custaram R$ 9,6 bilhões. Já as emendas para as bancadas foram de R$ 7,3 bilhões. As de comissão foram zeradas. Enquanto as de relator custaram R$ 18,5 bilhões.

Em julho de 2022, a Comissão Mista de Orçamento divulgou a relação de R$ 12,3 bilhões em emendas de relator, que foram indicadas para execução pelo deputado Hugo Leal (PSD-RJ). Por causa das restrições da legislação eleitoral, outras transferências só poderão ser pagas depois das eleições de outubro. Ainda há um saldo de quase R$ 4,2 bilhões para indicações de emendas de relator.

Ao longo do mandato de Bolsonaro, governo e Congresso destinaram R$ 65,1 bilhões do Orçamento para as emendas de relator. Desse total, R$ 36,4 bilhões foram empenhados, etapa em que o dinheiro é reservado para ser pago quando o bem ou serviço forem entregues.

Como a prática foi revelada

A adoção da emenda do relator como prática no Congresso em troca de apoio político foi divulgada inicialmente pelo Estadão, após investigação dos jornalistas Breno Pires e Patrik Camporez. Em uma thread publicada no Twitter, Pires contou detalhes da apuração, iniciada em dezembro de 2020.

Segundo ele, relatos da compra de apoio para a eleição do deputado Arthur Lira (PP-AL) à Presidência da Câmara foram o “marco zero” da investigação. No final de janeiro de 2021, uma reportagem revelou que o Planalto liberou R$ 3 bilhões em obras a 285 parlamentares – 250 deputados e 35 senadores – em meio à eleição no Congresso. A reportagem teve acesso a uma planilha interna de controle de verbas, até então sigilosa, com os nomes dos parlamentares contemplados com os recursos “extras”, que vão além daqueles que os deputados e senadores já têm direito de direcionar.

O trabalho jornalístico foi dividido em três eixos: aspectos técnicos, orçamentários legais e as possíveis irregularidades no uso da verba. Somente em 9 de maio, foi iniciada a publicação da série Orçamento Secreto, com dezenas de reportagens. Até 6 de novembro de 2021, segundo o próprio jornalista, mais de 40 publicações sobre o tema já haviam sido divulgadas, dissecando o modus operandi do esquema:

“1 – Com aval do governo, deputados e senadores aliados ditam a aplicação de bilhões de reais, segundo critérios de interesse individual, e não técnicos, com ocultação de seus nomes, atropelando leis orçamentárias e a transparência;

2 – Ministérios aprovavam e desembolsavam as solicitações enviadas diretamente por parlamentares por meio de ofícios não tornados públicos. Eles diziam ter ‘cotas’ e terem sido ‘contemplados’ com ‘recursos a mim reservados’;

3 – Parte do orçamento secreto em 2020 foi pra bancar tratores com valores até 259% acima do mercado;

4 – O ‘Tratoraço’ [em alusão às compras feitas com os valores distribuídos] teve a digital do Planalto; irrigou empresas ligadas a políticos; a oposição só teve 4% do orçamento secreto de R$ 3 bi no MDR (Ministério do Desenvolvimento Regional); políticos indicaram mais de R$ 180 milhões em verbas para fora de seus Estados, contrariando interesse do eleitor;

5 – A estatal Codevasf foi um dos canais preferenciais para escoar o dinheiro do orçamento secreto, com suspeitas de irregularidades, e o órgão foi completamente aparelhado pelo centrão e ampliado durante o governo Bolsonaro;

6 – Houve esforço coordenado entre Executivo e Legislativo para impedir acesso às informações. Senadores chegaram a alegar risco à segurança do Estado para recusarem-se a fornecer cópias de documentos que continham suas indicações. Secretaria de Governo (Segov) fraudou a Lei de Acesso à Informação (LAI);

7 – Apesar de o governo dizer que emendas de relator-geral são prerrogativas do Congresso, elas foram usadas pelo ministro Rogério Marinho (MDR) para agradar prefeitos do Rio Grande do Norte e construir mirante ao lado de condomínio privado que ele planeja no interior do Estado. Ibaneis Rocha (MDB) [governador do Distrito Federal] também as usou;

8 – O acompanhamento do fluxo das emendas em 2021 mostrou que elas foram executadas pelo governo na véspera de votações importantes, como a PEC dos Precatórios. Também houve pagamento de R$ 1 bi antes da PEC do Voto Impresso.”

Alta no preço de carros usados

O autor do vídeo investigado cita o aumento do preço de carros usados como consequência da medida de confinamento adotada na pandemia, que fez com que comércios e estabelecimentos fechassem durante um período. A correlação existe, mas o contexto da pandemia também influenciou a oferta de itens dos carros novos, que não puderam ser produzidos na escala normal. A dinâmica atípica de produção e consequente alta de preços acabaram gerando aumento na procura por veículos usados.

Em determinado momento da animação, uma das personagens pergunta ao primo, que trabalha em uma montadora de carros, se o “para tudo” influenciou no mercado automobilístico. “As montadoras pararam, mas o mercado não parou não, porque tem carro quebrando todo dia. Todo dia tem carro saindo de circulação. Então as pessoas deixaram de comprar carro novo e foram comprar carro usado. […] É a lei de mercado, quanto mais demanda por um produto, mais esse produto vai subir o preço. […] Teve carro aí que subiu 20%, 30%, 40%.”

Em 2021, o setor automobilístico registrou uma alta significativa nos preços. Segundo o G1, o aumento aconteceu em nível mundial e foi ocasionado pela escassez na cadeia de componentes para a produção de veículos.

Neste contexto, com limitação de escolha de algumas marcas e modelos, os carros novos ficaram mais caros e o preço dos usados teve um salto de quase 22% em 2021, conforme aponta a reportagem do UOL de maio deste ano.

Na coluna Autopapo do UOL, de fevereiro deste ano, o colunista Eduardo Rodrigues escreve que a crise dos semicondutores, aliada à inflação e à pandemia fez com que os preços dos carros usados subissem.

De acordo com reportagem da Exame, dados do Monitor de Variação de Preços da KBB Brasil, empresa especializada em pesquisa de preços de veículos, mostraram que o preço dos carros usados teve uma variação média de 19%, entre janeiro e novembro de 2021.

Mauro Sayar Ferreira, professor da Faculdade de Ciências Econômicas da UFMG, explicou ao Comprova que o preço dos carros usados aumentou como reflexo da elevação de custos relacionados aos automóveis novos. “Isso acabou gerando uma migração da demanda dos carros novos para os usados e, como qualquer ambiente onde há um crescimento na demanda, o preço do produto se eleva”, diz.

Em relação à pandemia, principalmente durante os períodos de lockdown, a escassez na oferta de carros novos estava vinculada à restrição de componentes dos automóveis, como os chips que eram produzidos em países orientais. “Com isso, você não conseguia uma oferta grande desse componente e os carros não podiam ser finalizados […] De uma forma geral, as cadeias de componentes de veículos sofreram impacto adverso na paralisação dos lockdowns. Essa menor oferta elevou o preço dos carros e, consequentemente, houve uma migração da demanda para carros usados”, afirma Ferreira.

O economista ressalta que é mais fácil observar a oferta dos carros usados e não necessariamente a demanda. “No caso, a gente consegue perceber o resultado final do preço. Dado que os preços subiram muito, de carros usados, conseguimos compreender que houve um movimento talvez de menor oferta de carros usados, mas com certeza houve uma ampliação na demanda também pelos motivos que eu já expliquei.”

“Talvez a oferta tenha também sido restrita de carros usados porque quando quem está no mercado para vender aqueles carros observa que não conseguirá comprar os carros novos, ou que o custo de outros carros também usados começa a ficar mais muito mais caro, talvez a pessoa fica mais cautelosa na hora de desfazer do produto. Com isso, pode ser que tenha influenciado também a oferta de carros usados”, conclui o especialista.

Alta nos preços do leite

No vídeo analisado, a personagem Ana Cláudia diz ao youtuber que produtores deixaram de produzir leite para entrar no ramo da criação de gado, já que compensaria mais em termos financeiros, e isso fez com que a produção de lacticínios caísse. Apesar de ser um fator que influencia o mercado, não é o único.

O valor elevado do leite se insere no contexto de alta geral de preços de alimentos no Brasil. Conforme apontou reportagem da Folha, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), principal indicador da inflação brasileira, ficou em 10,4% no acumulado dos últimos 12 meses, deixando o país em 4º lugar no ranking de nações com maiores taxas de inflação entre as principais economias mundiais.

Além disso, o preço dos alimentos vem registrando altas acima da inflação. De acordo com uma pesquisa realizada pela Fipe, que mede a variação de preços para diferentes faixas de renda, e divulgada pelo G1, enquanto a inflação acumulada no ano gira em torno de 5,5%, a de alimentos beira os 13%.

Em entrevista ao UOL, Natália Grigol, pesquisadora da área de leite do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada, da Universidade de São Paulo (Cepea – Esalq/USP), disse que “os preços do leite estão em alta devido à oferta limitada. Com o inverno e o clima mais seco, a qualidade das pastagens cai e, por isso, a alimentação do rebanho é afetada, levando à queda na produção”.

Conforme o último levantamento do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) divulgado pelo IBGE, o leite longa vida acumula alta de 29,28% nos últimos 12 meses — e de 28,03% somente em 2022.

Segundo o levantamento, a ração, os suplementos minerais, os fertilizantes e o combustível tiveram aumento crescente nos últimos três anos, o que gerou alta do custo operacional do produtor de leite. “Isso levou muitos pecuaristas a saírem da atividade ou a enxugarem investimentos. Como consequência, agora enfrentamos dificuldade para elevar o nível da oferta”, disse Natália Grigol ao UOL.

Já a Exame aborda que os efeitos do fenômeno La Niña, que acentua a estação seca, “e a disparada nos preços dos combustíveis e fertilizantes, por causa da guerra na Ucrânia, acentuaram a alta no leite”.

Conforme apontou o professor de MBAs da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e presidente da Associação de Produtores de Leite (Abraleite), Roberto Kanter, ao G1, além dos fatores já mencionados, o aumento no preço do leite e seus derivados se dá pelo “mercado mais atrativo para o comércio de carne do animal, do que o leite e os ovos, principalmente com a alta do dólar – que melhorou a remuneração da exportação”.

Ainda ao G1, o presidente da Abraleite disse que, além de reduzir o volume de leite, a alta dos custos de produção fez com que muitos produtores saíssem da atividade. No entanto, não há dados que comprovem que produtores de leite tenham migrado para o ramo da carne.

Alta no preço da carne

Apesar de tanto a carne quanto o leite serem provenientes do gado, os alimentos possuem cadeias de produção diferentes. César Augusto Bergo, professor do Departamento de Economia da UnB e especialista em mercado financeiro, afirma que o mercado de carne é mais profissional no Brasil, já que visa a venda externa e deve cumprir uma série de exigências internacionais, entretanto, em relação ao leite, o produtor deve se preocupar mais com a qualidade do animal e com características de conservação.

“A carne não depende tanto assim de confinamento, é um tratamento mais voltado ao abate e não a questão da qualidade do animal porque o leite você tem que ter um gasto extra com relação a manutenção do animal”, diz o professor.

Por cada alimento possuir suas especificidades, o especialista acredita ser inviável que as pessoas deixem de produzir leite e passem a produzir carne. “O cara responsável não vai entregar um gado de leite para corte. Para ter gado de leite, tem que ter qualidade. Não é qualquer animal que pode ser um gado leiteiro. Então, só se o produtor praticamente se revoltou e mandou tudo pra corte e aumentou a produção de carne. Mas, assim, o mercado de carne no Brasil é tão profissional que eu não acredito muito nessa questão basicamente de você trocar o modal leite pelo modal carne”, explica Bergo.

Em relação a alta no preço da carne, ele esclarece que o produto já enfrentava um grande aumento antes da pandemia. Em 2019, a China passou a comprar ainda mais carne do Brasil por conta de uma peste que dizimou o rebanho suíno no país, gerando uma demanda maior pela carne brasileira em geral.

Segundo o economista, com a pandemia, “o consumo de carne caiu abruptamente de uma hora para outra”. A China até suspendeu as importações de carne bovina brasileira por algum tempo, gerando barateando o produto dentro do Brasil, mas essa questão foi rapidamente superada e a carne voltou a ter uma procura no mercado internacional. Assim, o preço da carne ficou estabilizado em alta. O professor ainda ressalta que o Brasil possui alguns dos mais importantes players do mercado de carne bovina no mundo, que conseguem influenciar indiretamente o preço do produto aqui por conta das exportações.

“O desempenho das exportações de carne brasileira no mercado internacional tem sido crescente. Houve uma queda em 2021 em função da China, mas agora está retornando e, se a gente analisar o preço da carne nos últimos 12 meses, ela se elevou a mais de 20%. Isso acaba de alguma forma pontuando o preço.”

Outro fator que influencia o valor do produto é o preço das commodities, sobretudo aquelas que são utilizadas para preparação do farelo do gado, que tiveram um encarecimento muito por conta da guerra na Ucrânia. Além disso, aponta o professor, estiagens prejudicaram a pastagem para os animais: “Tudo isso acabou prejudicando e demandando mais investimentos na alimentação do gado. Dessa forma, acabou ocasionando uma baixa oferta de animais para abate porque o produtor espera engordar para poder vender e, em função dessas questões ligadas à alimentação do gado, houve essa retração na oferta de animais”.

Por que investigamos: O Comprova investiga conteúdos suspeitos que viralizaram nas redes sociais sobre a pandemia, políticas públicas do governo federal e eleições presidenciais. O vídeo aqui verificado aborda temas que estão em debate na eleição atual e podem influenciar a decisão dos eleitores no momento do pleito. A escolha dos cidadãos deve ser baseada em informações verídicas e confiáveis.

Outras checagens sobre o tema: Em 12 de maio, o Aos Fatos apontou que é falsa a declaração de Bolsonaro de que as informações das emendas de relator (RP9) não são secretas.

Em verificações recentes envolvendo o contexto político-econômico brasileiro, o Comprova mostrou que reportagem cita outros países com cenário econômico positivo além do Brasil, que post de deputado exagera em 5 vezes o lucro das estatais em 2021 e que Brasil é acionista majoritário e responsável pelo controle da Petrobras, ao contrário do que diz post.

Eleições

Investigado por: 2022-09-01

É falso que empresa de pesquisa eleitoral funcione dentro do Instituto Lula

  • Falso
Falso
É falso o conteúdo de vídeo compartilhado no Twitter alegando que o Ipec (Inteligência em Pesquisa e Consultoria) está situado no mesmo endereço que a sede do Instituto Lula, em São Paulo, lançando suspeitas sobre os levantamentos eleitorais em que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), candidato à presidência, tem aparecido na liderança. O fato é que o Instituto Lula surgiu a partir do Instituto Cidadania, cuja sigla já foi Ipec. As duas instituições não estão situadas no mesmo endereço. O próprio autor do vídeo verificado fez uma retratação, admitindo o erro.

Conteúdo investigado: Vídeo compartilhado no Twitter afirma que o Ipec está localizado dentro da sede do Instituto Lula, em São Paulo. O conteúdo de 45 segundos tem a narração do youtuber Gustavo Gayer e é sobreposto com matérias divulgadas na imprensa e que trazem números de pesquisa do Ipec, em que Lula lidera a corrida presidencial. A legenda cita: “Agora tá explicado!!! Cadê o Xandão [presidente do TSE, ministro Alexandre de Moraes]? É crime eleitoral isso ou não?”

Onde foi publicado: Twitter.

Conclusão do Comprova: É falsa a postagem que apresenta trecho de um vídeo em que o autor alega que o Ipec (Inteligência em Pesquisa e Consultoria), antigo Ibope, está situado dentro da sede do Instituto Lula, em São Paulo. Ao estabelecer a suposta relação, são lançadas suspeitas sobre as pesquisas eleitorais que, até o momento, apontam que Lula lidera a corrida para a presidência da República.

No tuíte em que o vídeo foi compartilhado, cujo perfil é de um apoiador do presidente Jair Bolsonaro (PL), que disputa a reeleição, o autor reforça a ideia de que o Ipec fica no mesmo endereço e faz ilações, escrevendo: “Agora tá explicado!!!” Na sequência, pergunta pelo ministro Alexandre de Moraes, presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), de maneira pejorativa: “Cadê o Xandão? É crime eleitoral isso ou não???”

A confusão acontece porque as duas instituições tiveram a mesma sigla inicialmente, conforme explicado pela assessoria do ex-presidente Lula. “Ipec era o primeiro nome do Instituto Cidadania, que depois virou Instituto Lula.”

A organização do ex-presidente está situada na rua Pouso Alegre, no bairro do Ipiranga, enquanto o instituto de pesquisa tem sede na avenida Paulista, no bairro da Bela Vista, ambos na cidade de São Paulo. As duas sedes ficam distantes cerca de cinco quilômetros uma da outra.

O próprio autor do vídeo, o youtuber Gustavo Gayer, publicou uma nova gravação para se retratar, admitindo a confusão com os dois nomes.

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma falsidade.

Alcance da publicação: Até o dia 1 de setembro, o post no Twitter teve mais de 80 mil visualizações, 13,5 mil curtidas, 392 comentários e foi republicado mais de 5 mil vezes.

O que diz o autor da publicação: O autor do tuíte não tem canal de mensagem direta no Twitter, e o seu perfil não foi localizado em outras redes sociais. Já o autor do vídeo apagou o conteúdo original e publicou nova gravação em que admite ter passado uma informação errada para o público.

Como verificamos: Inicialmente, a reportagem pesquisou no Google pelas palavras-chaves “Ipec” + “Instituto Lula” e a consulta retornou reportagens sobre os levantamentos eleitorais realizados pelo instituto de pesquisa e também uma publicação no YouTube de Gustavo Gayer, autor do vídeo, cujo título é “Eu errei sobre o Ipec e o Instituto Lula”. Na gravação, ele se retrata pelo erro.

Mesmo com o vídeo de retratação, o Comprova prosseguiu nas buscas sobre outros dados. No site do Instituto Lula, procuramos informações do endereço onde está situada a fundação para, depois, confirmar a localização por meio de busca no Google Maps. Já o Ipec não disponibiliza o endereço na sua página oficial, mas a equipe conseguiu localizá-lo por meio de busca em um portal de consulta a CNPJs.

No Google, retomamos a pesquisa pela palavra-chave “Instituto Lula”, associada agora ao termo “endereço Ipec”, o que nos retornou outro perfil no Twitter que reproduziu a alegação falsa checada nesta verificação.

A assessoria do ex-presidente Lula também foi procurada.

A gravação compartilhada

Em um tom de alerta, o vídeo compartilhado no Twitter começa chamando a atenção para o fato de que o Ipec, que havia divulgado pesquisa de intenção de voto para presidente na segunda (29) e na terça-feira (30), ocupava o noticiário de boa parte dos grandes veículos. No levantamento, Lula aparece na frente de Bolsonaro, com 44% da preferência do eleitorado brasileiro, ante os 32% do presidente. O cenário é semelhante ao apontado em outras pesquisas eleitorais, como as mais recentes conduzidas pelo Datafolha e pela Quaest.

Na sequência, o autor do vídeo afirma que o Ipec fica dentro da sede do Instituto Lula, em São Paulo. “Isso não é brincadeira, eu não tô exagerando. Tá aqui”, diz Gayer que, então, passa a fazer uma pesquisa na internet, compartilhando a tela do seu computador, para indicar o endereço “Pouso Alegre, 21”.

Primeiro, ele mostra a imagem da consulta de endereço do Instituto Pesquisas e Estudos de Cidadania, antigo nome do Instituto Lula, cuja sigla também era Ipec. Depois, mostra foto recente do instituto na internet com, obviamente, a mesma localização. Gayer finaliza, dizendo: “Olha o absurdo a que nós chegamos, gente!”

Siglas iguais, atividades diferentes

Ao ser questionada sobre a alegação do vídeo compartilhado no Twitter, a assessoria do ex-presidente informou, em mensagem pelo WhatsApp, que “Ipec era o primeiro nome do Instituto Cidadania que, depois, virou o Instituto Lula.”

No site da organização, há um recorte histórico mostrando as suas diversas fases até culminar com a criação do Instituto Lula, em 2011, após o término do segundo mandato do petista na presidência da República. Foi nesse ano que, segundo a assessoria do ex-presidente, a instituição deixou de ser chamada Ipec.

A assessoria reforçou, ainda, que não há nenhuma relação do instituto com o Ipec que realiza as pesquisas eleitorais, e que, embora tenham a mesma sigla, “o nome, CNPJ e função são completamente diferentes.”

Ao consultar o CNPJ do Instituto Lula, aparecem informações sobre atividades relacionadas, tais como defesa de direitos sociais, de minorias e associação ligada à cultura.

Já, no CNPJ do Ipec, aparece como atividade principal a realização de pesquisas de mercado e de opinião pública. A empresa é formada por ex-executivos do antigo Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística (Ibope), que encerrou suas atividades em 2021.

Autor de vídeo admite erro e se retrata

Em sua conta no YouTube, Gustavo Gayer publicou um vídeo de retratação na noite desta quarta-feira, 31 de agosto, mesma data em que o primeiro conteúdo publicado por ele viralizou nas redes sociais.

O conteúdo tem 1 minuto e 21 segundos. Nele, o autor afirma que está se retratando da informação divulgada no primeiro momento, mas adverte não ter sido alvo de nenhuma ordem judicial. Gayer disse ter percebido que errou ao afirmar que o Ipec estaria sediado dentro do Instituto Lula. A alegação falsa foi feita após uma pesquisa equivocada que ele próprio realizou na internet.

“Errei e é por isso que 10 minutos depois que eu gravei o vídeo, quando vi que tinha errado, deletei o vídeo. Mas não achei que era o bastante ainda, por isso estou aqui fazendo minha retratação. Tento sempre ser leal aos fatos, quando erro, vou admitir”, afirmou o autor.

Ataques às pesquisas eleitorais

Ao criar uma relação inexistente, até o momento, entre o Instituto Lula e o Ipec, o autor do vídeo, assim como os internautas que compartilham o conteúdo, contribuem para uma narrativa que tenta desacreditar as pesquisas eleitorais diante de resultados desfavoráveis a seus candidatos.

Com a aproximação das eleições, os conteúdos de desinformação sobre os levantamentos de intenção de voto são frequentes. Somente na segunda quinzena de agosto, o Comprova demonstrou ser falso vídeo que coloca Bolsonaro à frente em pesquisa, que senador ironizou resultado de instituto para desacreditar pesquisas e que não há no TSE registro de suposta pesquisa impedindo entrevistado de votar em Bolsonaro.

Importante destacar que as pesquisas eleitorais não representam uma previsão do resultado da votação, que ocorrerá em primeiro turno no dia 2 de outubro, mas um retrato do momento em que a consulta foi feita. Até as eleições, muitos fatores podem mudar o cenário para os candidatos em disputa.

O autor do vídeo

Gustavo Gayer Machado de Araújo, conhecido nas redes sociais como Gustavo Gayer, é candidato a deputado federal em Goiás pelo PL, partido de Bolsonaro, e apoiador do presidente. De acordo com informações registradas no sistema do TSE para Divulgação de Candidaturas e Contas Eleitorais referentes às eleições de 2022, ele é empresário e tem 41 anos. Em 2020, disputou a prefeitura de Goiânia, quando obteve 45.928 votos, ficando no 4º lugar.

Além do canal no YouTube, criado em 2016, Gayer atua no Instagram (343 mil seguidores), Facebook (271 mil seguidores) e no Twitter, onde atualmente está com a conta bloqueada por violar as regras da plataforma.

Em agosto, o Projeto Comprova desmentiu outros dois vídeos de Gayer: o mais recente, em que disse que o TSE admite que o PCC (facção criminosa) tem ligação com o PT de Lula, e outro no qual afirmou que Lula teria dito que vai implantar uma ditadura no Brasil se eleito.

Por que investigamos: O Comprova investiga conteúdos suspeitos que viralizaram nas redes sociais sobre a pandemia, políticas públicas do governo federal e eleições presidenciais. A postagem verificada tenta relacionar o instituto ligado ao ex-presidente Lula ao Ipec, que realiza pesquisas eleitorais em todo o País. Informações falsas causam prejuízos ao processo democrático, porque a população tem direito de saber a verdade e basear suas escolhas em informações confiáveis.

Outras checagens sobre o tema: A pouco mais de um mês do primeiro turno da disputa presidencial, cresce o número de conteúdos de desinformação circulando nas redes sociais envolvendo os postulantes ao cargo. Nesta semana, o Comprova mostrou ser falso que Simone Tebet deixou médica ser humilhada na CPI da Covid, que apresentadores estrangeiros não fizeram piada sobre Lula e eleitores baianos e que é enganosa postagem no twitter sugerindo apoio de João Amoêdo a Lula.

Conteúdos que tentam colocar em xeque a credibilidade de pesquisas eleitorais ou de institutos de pesquisas também são recorrentes. Neste sentido, o Comprova apurou que senador ironizou resultado de levantamento para desacreditar pesquisas e também já produziu um material explicando os métodos científicos levados em consideração para a realização das pesquisas.

Eleições

Investigado por: 2022-08-31

É falso que Simone Tebet deixou médica ser humilhada na CPI da Covid

  • Falso
Falso
É falso que a candidata à presidência da República Simone Tebet (MDB) tenha deixado a médica Nise Yamaguchi ser humilhada durante depoimento na CPI da Covid no ano passado. Tebet, que é senadora pelo Mato Grosso do Sul, não estava no dia do depoimento e não era titular da comissão. A bancada feminina, na época liderada por Tebet, se revezava nas sessões para sempre ter uma mulher presente. No dia, a senadora Leila Barros (PDT-DF), também conhecida como Leila do Vôlei, defendeu a médica.

Conteúdo investigado: Tuíte do perfil Família Direita Brasil acusa a senadora Simone Tebet de não evitar que a médica Nise Yamaguchi fosse humilhada na CPI da Covid. No debate da TV Bandeirantes, Tebet negou ter participado da sessão.

Onde foi publicado: Twitter.

Conclusão do Comprova: É falso que a senadora Simone Tebet (MDB), candidata à presidência da República, tenha deixado a médica Nise Yamaguchi ser humilhada durante depoimento na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid em junho de 2021, como sugere tuíte. A afirmação foi feita inicialmente pelo presidente e candidato à reeleição, Jair Bolsonaro (PL), durante debate na TV Bandeirantes, no domingo (28), e repercutida por apoiadores nas redes sociais.

Tebet não era membro titular da CPI e não estava presente no dia da sessão, 1° de junho de 2021. Como não havia nenhuma mulher entre os 11 titulares e sete suplentes do colegiado, a bancada feminina do Senado, então liderada por Tebet, se organizou em um revezamento para participar das sessões.

No dia do depoimento de Yamaguchi, que foi ouvida pela CPI por ter defendido tratamentos ineficazes contra a covid e por suspeita de integrar um “gabinete paralelo” do governo, participaram, ao longo da sessão, cinco senadoras. Durante o depoimento, a médica foi frequentemente interrompida pelos senadores. Como dito pela candidata à presidência no debate, a senadora Leila Barros (PDT-DF) pediu respeito a Yamaguchi e que ela tivesse a possibilidade de expor seus argumentos. A assessoria da pedetista confirmou ao Comprova que ela conversou com Tebet, durante a sessão, sobre as constantes interrupções sofridas pela médica durante sua fala e que decidiu ir ao plenário interceder em favor de Yamaguchi, mesmo não concordando com o posicionamento da médica.

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original.

Alcance da publicação: O post no Twitter teve 4,5 mil interações até 29 de agosto. Ele foi apagado após o contato do Comprova com o autor.

O que diz o autor da publicação: Ao Comprova, ele informou que só reproduziu a fala do presidente e não emitiu “opinião sobre o fato”. “Agora, com o esclarecimento de vocês, iremos remover a postagem”, disse.

Como verificamos: Primeiramente, procuramos o trecho do debate em que Bolsonaro faz a afirmação sobre Tebet. Na sequência, procuramos por notícias do dia do depoimento de Nise Yamaguchi para saber se ela realmente foi humilhada e se alguém interveio em sua defesa. Além disso, procuramos informações no site do Senado sobre quais eram as mulheres presentes no dia do depoimento da médica e como é a escolha dos membros que vão compor a CPI.

Também entramos em contato com as assessorias de imprensa de Simone Tebet, que não respondeu, e de Leila Barros, que confirmou que o diálogo entre as duas aconteceu. Por fim, entramos em contato com o autor da postagem, que disse que só reproduziu a fala do presidente e apagou o post.

Bolsonaro disse que Tebet deixou médica ser humilhada

Durante o debate entre os presidenciáveis, promovido pela TV Bandeirantes, Folha de S. Paulo e pelo UOL, no domingo (28/8), Bolsonaro acusou a candidata Simone Tebet de ter sido conivente com humilhações sofridas pelas médicas Nise Yamaguchi e Mayra Pinheiro durante depoimento delas na CPI da Covid no ano passado.

A acusação foi feita em resposta a uma pergunta da emedebista, que questionou Bolsonaro a razão pela qual ele teria “tanta raiva das mulheres”. O momento pode ser visto a partir da seguinte minutagem desse vídeo: 5m30.

Para responder a pergunta, Bolsonaro diz: “Me acusa sem prova nenhuma. […] Por que essa forma barata de me acusar, como se eu não gostasse de mulheres? […] Duas mulheres foram na CPI da Covid: a senhora Nise Yamaguchi e a senhora Mayra [Pinheiro], lá do Ceará. Foram maltratadas, foram esculhambadas, foram humilhadas. Onde estava vossa excelência? Que era da comissão da covid. Estava escondidinha, apoiando Renan Calheiros, Omar Aziz, apoiando essas pessoas”.

A senadora então responde que não estava presente no dia e que acionou a senadora Leila Barros (na época do PSB, hoje no PDT-DF), presente na sessão, e que ela interveio a favor de Nise. “Nós tínhamos um rodízio, podíamos no início ficar uma mulher. Assim que ouvi a doutora Nise sendo agredida, ela foi vítima de violência política sim, não concordo com as ideias dela, mas ela foi vítima de violência. Liguei para a senadora Leila, que era a que estava no rodízio e, mesmo sendo da oposição do atual presidente, defendeu a doutora Nise exigindo que ela fosse respeitada”, disse.

No dia, Leila Barros realmente interveio a favor de Nise e pediu respeito à testemunha. Após quase três horas de depoimento, a senadora pediu (momento pode ser visto entre 2:48:40 e 2:49:59) que os senadores deixassem Yamaguchi falar, após ela ter sido interrompida pelo senador Omar Aziz (PSD-AM), presidente da CPI. “Ela não está conseguindo concluir um raciocínio. Vocês sabem o lado que estou, mas quem está acompanhando, a gente percebe que tem uma ansiedade muito grande pelas respostas da depoente. Eu peço só a vocês que a gente tenha um grau de tranquilidade”, disse.

O presidente da CPI então afirmou que as interrupções se deviam ao fato de ela não estar respondendo às perguntas e ressaltou que Leila tinha acabado de chegar. A senadora explica que estava acompanhando o depoimento do gabinete e completa: “Ela está sendo interrompida”.

Segundo Simone Tebet, ela pediu para Leila ir até a sessão. A assessoria da pedetista confirmou que a conversa aconteceu. “Como uma das 16 parlamentares eleitas para o Senado, Leila do Vôlei é uma forte defensora dos direitos e da participação feminina nos espaços de poder, independentemente do campo ideológico. Leila acompanhou o depoimento da Dra. Nise Yamaguchi desde a abertura da sessão e conversou com a senadora Simone Tebet acerca das constantes interrupções na fala da convidada quando estava a caminho do Plenário da CPI da Pandemia. Leila do Vôlei, Simone Tebet e todas as senadoras eleitas desempenham mandatos independentes e agem por vontade própria na defesa dos direitos das mulheres”, diz a nota.

Tebet não estava na sessão

De acordo com o registro de presença da CPI, Tebet não estava presente no dia do depoimento da médica Nise Yamagushi. Ao contrário da fala do presidente Bolsonaro, Tebet não era titular da CPI da Covid. Todos os 11 membros titulares e sete suplentes da comissão eram homens. A bancada feminina, criada em 2021, não tinha prerrogativa de sugerir nomes para o colegiado. Por isso, o grupo se organizou em um rodízio para que sempre tivesse uma representante nas sessões. Tebet foi a primeira líder da bancada feminina e ficou no cargo até fevereiro deste ano.

Além de Leila Barros, no dia do depoimento de Yamaguchi, estiveram presentes na sessão, conforme registro de presença, as senadoras Eliziane Gama (Cidadania-MA), Rose de Freitas (MDB-ES), Zenaide Maia (Pros-RN) e Soraya Thronicke (União Brasil-MS), que também é candidata à presidência da República e participou do debate do último domingo (28).

Depoimento de médica é marcado por interrupções

Nise Yamagushi depôs na CPI da Covid como convidada no dia 1º de junho de 2021. O depoimento durou cerca de nove horas. Próxima ao presidente Jair Bolsonaro, ela defendeu por diversas vezes tratamentos sem eficácia comprovada contra a doença, a exemplo da cloroquina. A médica também é apontada como integrante do chamado “gabinete paralelo”, que assessorou informalmente o presidente Bolsonaro durante a pandemia.

De acordo com levantamento feito pela CNN, Nise foi interrompida 43 vezes no intervalo de 1h30 na primeira parte da sessão em que participou.

Em um momento, o senador Otto Alencar (PSD-BA), que também é médico, chegou a falar que Nise não sabia nada de infectologia e que ela “não estudou”. “A senhora não soube explicar o que é o vírus (…). A senhora não sabe nada de infectologia, nem estudou, doutora. A senhora foi aleatória mesmo, superficial. O covid-19 é da família dos betacoronavírus”, disse Alencar.

Após o depoimento, a médica disse que foi humilhada na sessão e chegou a processar os senadores Omar Aziz e Otto Alencar por danos morais.

“Por diversas vezes, tive minhas falas e raciocínios interrompidos. Ignoraram meus argumentos e atribuíram a mim palavras que não pronunciei. Não foi por falta de conhecimento que deixei de reagir, mas, sim, por educação. Não iria alterar a minha essência para atender a nítidos interesses políticos”, afirmou a médica.

Em 28 de agosto, Nise também se manifestou pelas redes sociais. Sem citar diretamente o episódio e sem afirmar que foi defendida, ela disse que “mulheres que querem votos de mulheres têm que ter coerência” e “não podem se omitir de defender aquelas que são atacadas publicamente”.

Quem é Nise Yamagushi?

Nise Yamaguchi, 62 anos, é médica imunologista e oncologista e, defensora da cloroquina e da sua derivada, a hidroxicloroquina, em pacientes com covid-19, mesmo após pesquisas demonstrarem que o medicamento, usado normalmente contra lúpus, malária e artrite reumatoide, não funciona contra a doença.

Há mais de 35 anos na medicina, Yamaguchi lidera o Instituto Avanços em Medicina, localizado na cidade de São Paulo, especializado em tratamento de câncer. Ela é mestre em imunologia e doutora em pneumologia pela Universidade de São Paulo (USP). A médica também integra a Sociedade Brasileira de Cancerologia (SBC), Americana (ASCC) e Europeia (ESMO) de Oncologia, além de ser conferencista e palestrante internacional, colaborando na elaboração de diversos livros sobre medicina.

Muito próxima de Bolsonaro, ela chegou a ser cotada como um dos nomes para substituir Luiz Henrique Mandetta, no Ministério da Saúde.

Em várias ocasiões, Nise chegou a afirmar que existem estudos que apontam os benefícios da cloroquina e que existe uma “guerra de narrativas” em torno da substância.

Em seu currículo, a médica cita o trabalho no Hospital Albert Einstein, participando de desenvolvimento científico e reuniões clínicas. Contudo, em julho de 2021, Yamaguchi foi afastada do hospital após fazer declarações sobre o nazismo em uma entrevista à TV Brasil.

“O medo é prejudicial para tudo. Em primeiro lugar, te paralisa, te deixa massa de manobra. Qualquer pessoa, você pega… Você acha que alguns poucos militares nazistas conseguiriam controlar aquela massa de rebanho de judeus famintos se não submetessem diariamente a humilhações, humilhações e humilhações, tirando deles todas as iniciativas?”, afirmou a médica.

Nise chegou a dizer que foi afastada da instituição por defender a cloroquina, mas o Hospital Albert Einstein divulgou nota para reafirmar que a causa do afastamento foi por sua fala sobre o nazismo. “Foi uma analogia infeliz e uma manifestação insólita por parte da médica”, disse o hospital na época.

Atualmente, Yamaguchi não tem vínculo formal com a instituição. Contudo, voltou a integrar o corpo clínico aberto, como são chamados os profissionais que usam as instalações do hospital.

O depoimento da médica na CPI da Covid atendeu ao pedido do senador Eduardo Girão (Podemos-CE). No requerimento, o parlamentar destacou que em depoimento à CPI, o diretor da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), Antonio Barra Torres, disse que, numa reunião com o Governo Federal, a pesquisadora defendeu alterar a bula da cloroquina. Durante as nove horas de depoimento, a médica citou dados incorretos e fez declarações falsas sobre as vacinas da covid-19.

Por que investigamos: O Comprova investiga conteúdos suspeitos que viralizaram nas redes sociais sobre a pandemia, políticas públicas do governo federal e eleições presidenciais. A postagem verificada faz uma afirmação falsa sobre a candidata à presidência da República Simone Tebet. O conteúdo é danoso ao processo democrático, porque a população tem direito de saber a verdade e basear suas escolhas em informações confiáveis.

Outras checagens sobre o tema: O Correio Braziliense também explicou que a senadora Leila Barros, integrante da bancada feminina do Senado, interveio a favor de Nise Yamaguchi na CPI da Covid.

Em checagens recentes, o Comprova também mostrou que é enganosa postagem no Twitter sugerindo apoio de João Amoêdo a Lula, que vídeo que mostra Bolsonaro à frente na pesquisa Ipec do dia 15 de agosto de 2022 é falso e que senador ironizou resultado de instituto para desacreditar pesquisas eleitorais.

Também verificamos que a vacina da covid-19 não provoca Aids, ao contrário do que sugeriu Bolsonaro em live e que morte de seis médicos canadenses não tem relação com a vacina contra a covid.

Eleições

Investigado por: 2022-08-31

É falso que apresentadores estrangeiros fizeram piada sobre Lula e eleitores baianos

  • Falso
Falso
É falso o vídeo que circula na internet atribuindo risadas de apresentadores de programa de TV da Irlanda a críticas contra Luiz Inácio Lula da Silva (PT), candidato à presidência. Uma tradução foi inventada de modo a distorcer o contexto do diálogo, que não faz qualquer menção ao Brasil ou ao ex-presidente. Na verdade, os apresentadores têm uma crise de riso após um deles emitir um som nasal enquanto dá risadas depois de uma fala sobre papilas gustativas.

Conteúdo investigado: Trecho de programa de TV estrangeira com legendas que insinuam que apresentadores debocham de suposta afirmação do ex-presidente Lula sobre comprar votos de eleitores baianos. O conteúdo diz ainda: “Lula faz os baianos virar piada no mundo todo. Nordestinos humilhados no mundo todo por causa do ladrão [sic]”.

Onde foi publicado: Kwai, Facebook e WhatsApp

Conclusão do Comprova: É falso que apresentadores de um programa de TV estrangeira disseram que o ex-presidente Lula (PT) comprou votos de cidadãos baianos. O vídeo investigado pelo Comprova exibe um trecho de um programa irlandês, veiculado em novembro de 2020. No trecho manipulado foram inventadas legendas para insinuar que a dupla de apresentadores estava ridicularizando eleitores por supostamente trocarem votos por R$ 10 ou um lanche de mortadela. Porém, o conteúdo não corresponde ao que é dito no programa. Os apresentadores riem, na verdade, de uma piada sobre papilas gustativas e sequer fazem referência ao Brasil. Enquanto dá risada, um deles emite um som nasal que assemelha ao grunhido de um porco, o que provoca uma crise de risos na dupla.

Também não é verdade que Lula disse ser possível comprar o voto de eleitores baianos. Essa alegação tem origem em um boato antigo que manipula uma entrevista do petista à Rádio Metrópole, de Salvador, concedida em 2017. A edição maliciosa distorce uma fala do ex-presidente, na qual ele defende que, para recuperar a economia brasileira, é preciso incluir os mais pobres no mercado. “Você dá R$ 10 para o pobre e ele vira consumidor, você dá R$ 10 milhões para um rico e ele enfia na conta bancária”, disse Lula.

O Comprova considera falso conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e é divulgado de modo deliberado para espalhar uma falsidade.

Alcance da publicação: O conteúdo atingiu, até o dia 30 de agosto, mais de 188 mil visualizações distribuídas entre duas postagens na rede de vídeos curtos Kwai. No Facebook, uma publicação recebeu 849 compartilhamentos.

O que diz o autor da publicação: O Comprova entrou em contato com o perfil @Marcosbr37, autor de uma publicação do conteúdo no Kwai, mas até o momento não obteve retorno.

Como verificamos: O Comprova baixou o vídeo do Kwai na plataforma Save from Net e o inseriu no programa InVID, que possibilita uma busca reversa na internet a partir dos frames do vídeo. Dentre os resultados, foi possível localizar o trecho original do programa, postado na conta oficial da atração no Twitter; um tuíte da apresentadora Karen Koster, que explica o motivo das gargalhadas; e textos de sites locais que explicam o contexto da situação (Evoke e Extra.ie). As matérias identificadas pela reportagem também ajudaram a confirmar a transcrição do diálogo entre os apresentadores.

Na sequência, foram feitas buscas por conteúdos que relacionam Lula a votos de eleitores da Bahia. O resultado exibiu checagens do Estadão Verifica, do Aos Fatos e da Agência Lupa, que desmentem o boato de que o ex-presidente teria admitido comprar os eleitores. O Comprova também identificou uma verificação da Agência Lupa sobre o mesmo vídeo analisado nesta checagem.

Apresentadores não fazem qualquer referência ao Brasil

O vídeo compartilhado com a inserção de legendas falsas é um trecho do programa Ireland: am, que foi ao ar no dia 10 de novembro de 2020, como mostra postagem no Twitter oficial da atração. O programa matinal é exibido diariamente pelo canal Virgin Media One, do grupo Virgin Media Television, com sede em Dublin, na Irlanda.

Na edição de 10 de novembro de 2020, o convidado foi o chef Tony Keogh, do restaurante Cornucopia. Antes de chamá-lo, o apresentador Alan Hughes faz uma pergunta à colega de bancada, Karen Koster, cuja resposta o diverte. Hughes, ao dar risadas, emite um som nasal que assemelha a um grunhido de porco (snort, em inglês), o que acaba provocando uma crise de riso na dupla.

A própria apresentadora Karen Koster explica, em um tuíte postado no mesmo dia, que a causa da graça foi o som da risada do colega de bancada. “Alan’s snort pushed me over the edge!”, escreveu ela. Numa tradução livre para o português: “O ronco do Alan me tirou do sério”. O tuíte foi compartilhado pelo site Evoke, que repercutiu o episódio.

Antes de os apresentadores caírem na gargalhada, Alan havia perguntado:

“Karen, do you like your taste buds tickled?”

Karen responde: “Everyday. Before nine if possible”.

Em uma tradução livre em português:

“Karen, você gosta de ter as suas papilas gustativas agradadas?”

“Todos os dias. Antes das nove se possível”.

O contexto sobre o motivo da risada é informado na matéria da Evoke. Outro artigo traz a transcrição do diálogo em inglês. Não há qualquer referência ao Brasil, ao Partido dos Trabalhadores ou a Lula.

Na continuação do vídeo original, ainda em meio aos risos, a apresentadora Karen Koster introduz, em áudio quase inaudível, a receita que o chef Tony Keogh realizou no programa. Ela diz “Baked cauliflower fritter with avocado, basil and cream” ou “couve-flor assada com avocado, manjericão e creme”, em tradução livre. Uma postagem do restaurante no Facebook, no mesmo dia do episódio, mostra a execução do prato.

Na sequência, Koster pede desculpas ao chef, culpando o colega de bancada pela crise de risos, e o programa segue.

Legendas falsas

As legendas falsas inseridas no vídeo retomam postagens enganosas que tiveram origem em 2017, quando Lula concedeu entrevista à Rádio Metrópole, de Salvador. Na ocasião, um trecho da entrevista foi manipulado para parecer que Lula teria afirmado comprar votos de eleitores baianos por R$ 10, como mostraram o Estadão Verifica, Aos Fatos e Agência Lupa.

Abaixo, as legendas falsas inseridas no vídeo verificado, em comparação com o que os apresentadores dizem de fato (entre parênteses e com a tradução livre para o português ao lado):

Legenda falsa: “Lula compraria voto baiano por R$ 10 e lanche mortadela”

(“Are you looking for a snack to tickle your taste buds? Karen, do you like to tickle your taste buds?” / “Você está procurando um lanche para agradar seu paladar? Karen, você gosta de ter suas papilas gustativas agradadas?”)

Legenda falsa: “Todos os dias? Nove dedos?”

(“Everyday. Before nine if possible” / “Todos os dias. Antes das nove, se possível”)

Legenda falsa: “O povo brasileiro vota com o estômago. Lanche mortadela e R$ 10 reais”

(“Tony Keogh from Cornucopia Restaurant is helping us to ease into the morning with a healthy breakfast snack” / “Tony Keogh, do Restaurante Cornucopia, está nos ajudando a relaxar pela manhã com um lanche saudável no café da manhã”).

Por que investigamos: O Comprova investiga conteúdos potencialmente falsos e enganosos relacionados às eleições presidenciais de 2022, à pandemia e a políticas públicas do governo federal. O vídeo analisado produz e dissemina falsidades, com ampla viralização nas redes sociais, que podem afetar diretamente a imagem de pessoas e organizações públicas. Conteúdos desse tipo são prejudiciais ao processo democrático porque atrapalham o conhecimento do eleitor sobre candidatos e podem influenciar suas decisões, que devem ser tomadas com base em informações verdadeiras.

Outras checagens sobre o tema: O projeto Comprova já desmentiu outros conteúdos que inventam ou distorcem declarações de personalidades políticas, incluindo Lula. Em agosto, apontamos ser enganoso um vídeo que tira de contexto trechos de uma entrevista do ex-presidente para afirmar que o petista disse que vai implantar uma ditadura no Brasil. Também indicamos que não há registros de que Lula tenha defendido uma performance artística em que crianças poderiam tocar um homem nu.

O conteúdo analisado nesta verificação também foi classificado como falso pela Agência Lupa.

Eleições

Investigado por: 2022-08-30

É enganosa postagem no Twitter sugerindo apoio de João Amoêdo a Lula

  • Enganoso
Enganoso
É enganoso um tuíte que sugere que um dos fundadores do Partido Novo, João Amoêdo, apoia o ex-presidente e candidato em 2022 Luiz Inácio Lula da Silva, do PT. O autor da postagem publicou um print de parte de um tuíte em que Amoêdo citou Lula e ocultou frases em que o empresário criticou o petista. Pouco depois, o autor esclareceu que fez um corte parcial e que estava “zuando” na publicação. O esclarecimento, no entanto, não viralizou como o tuíte original.

Conteúdo investigado: Tuíte mostra o trecho de uma postagem de João Amoêdo, feita também no Twitter, com a legenda: “até o Amoêdo lulou”. O texto sugere que o ex-presidente do Novo, historicamente antipetista, passou a apoiar Lula nas eleições de 2022. Na publicação citada no tweet enganoso, Amoêdo disse: “Bom de discurso, democrata, preocupado com o povo, defensor das instituições. Esse é o Lula candidato que se apresentou no JN [Jornal Nacional]”. O empresário fez a postagem em 25 de agosto, dia da sabatina do petista no programa da TV Globo.

Onde foi publicado: Twitter.

Conclusão do Comprova: É enganosa a publicação do usuário André Serret no Twitter que sugere que João Amoêdo, um dos fundadores e ex-presidente do Partido Novo, passou a apoiar o ex-presidente Lula nas eleições de 2022. Amoêdo, que foi candidato à Presidência em 2018, é crítico de Lula e do PT há anos, posição que mantém na atual campanha eleitoral.

No tuíte enganoso, o autor disse que “até o Amoêdo lulou” e compartilhou o print de outra publicação, também do Twitter, em que o fundador do Novo disse: “Bom de discurso, democrata, preocupado com o povo, defensor das instituições. Esse é o Lula candidato que se apresentou no JN [Jornal Nacional, programa da TV Globo para o qual o petista deu entrevista no dia 25 de agosto]”. O conteúdo verificado foi publicado no dia da sabatina.

O autor ocultou críticas de Amoêdo feitas a Lula na mesma postagem. No tuíte original, o empresário disse: “Bom de discurso, democrata, preocupado com o povo, defensor das instituições. Esse é o Lula candidato que se apresentou no JN. Entretanto, quando eleito, Lula nos entregou outro país: do mensalão, da corrupção institucionalizada, do [‘]nós contra eles[‘] e de benesses para os aliados”.

Em um novo tuíte, em resposta à publicação enganosa, o autor escreveu que estava fazendo uma brincadeira. “Eu tô zuando gente. Eu só cortei a primeira parte [do tuíte de Amoêdo], pois ficou engraçado”, disse. O esclarecimento, porém, teve menos repercussão que a publicação original. Parte das pessoas que a compartilharam parecem ter acreditado que Amoêdo passou a apoiar Lula.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Alcance da publicação: O tuíte verificado pelo Comprova foi publicado no dia 25 de agosto. Até o dia 30, a publicação acumulava 2.414 curtidas, 219 compartilhamentos e 32 comentários na rede social.

O que diz o autor da publicação: O Comprova entrou em contato com André Serret pelo Twitter, mas não obteve resposta até o fechamento desta verificação.

Como verificamos: Para verificar a postagem, o Comprova procurou, na conta oficial de Amoêdo, o tuíte que havia sido printado. Usando as ferramentas de pesquisa do Twitter para buscar, entre os tuítes do empresário, a palavra-chave “Lula”, a verificação encontrou a publicação em que o fundador do Novo comentou a participação do petista na sabatina no Jornal Nacional.

O Comprova também entrou em contato pelo Twitter com André Serret para confirmar que a postagem enganosa se tratava de uma brincadeira. O autor da publicação não retornou o contato da verificação. Além disso, a reportagem buscou a assessoria de imprensa de João Amoêdo. Por mensagem, via WhatsApp, ela respondeu: “Lamentável e mentirosa a postagem. O fato é que sou totalmente contrário à candidatura do Lula e a postagem original e real é uma crítica ao ex-presidente pela sua incoerência”.

Quem é o autor do tuíte

André Serret tem pouco mais de 9.500 seguidores no Twitter. Na rede social, ele se define ironicamente como “palestrante desmotivacional quântico” e tem na sua foto de perfil uma imagem de Eymael (DC), candidato recorrente à Presidência. Quase todas as suas publicações são sobre política brasileira. Morador do Rio de Janeiro, ele faz críticas frequentes ao presidente e candidato à reeleição Jair Bolsonaro (PL). Para as eleições de 2022, declarou voto em políticos de esquerda, como Marcelo Freixo (PSB), candidato a governador do Rio, e Alessandro Molon (PSB), que disputa vaga no Senado.

Por que investigamos: O Comprova investiga conteúdos suspeitos que viralizaram nas redes sociais sobre a pandemia, políticas públicas do governo federal e eleições presidenciais. A postagem verificada faz referência ao suposto apoio de João Amoêdo a Lula, candidato à Presidência pelo PT. O conteúdo enganoso é danoso ao processo democrático, porque distorce a compreensão da realidade, ao passo que a população tem direito de saber a verdade e basear suas escolhas em informações confiáveis.

Outras checagens sobre o tema: Desde o início da campanha eleitoral, no dia 16 de agosto, o Comprova verificou conteúdos falsos ou enganosos favoráveis à candidatura de Lula nas redes sociais, como o que sugeriu que o presidente do Chile, Gabriel Boric, criaria políticas públicas inspiradas nos governos do petista; o que insinuou que banqueiros apoiam Lula por causa de supostos prejuízos ao setor no atual governo; e o que sugeriu que o ex-presidente havia se tornado o centro das atenções, inclusive de Bolsonaro, no evento de posse de Alexandre de Moraes na presidência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Eleições

Investigado por: 2022-08-30

Vídeo que mostra Bolsonaro à frente na pesquisa Ipec do dia 15 de agosto de 2022 é falso

  • Falso
Falso
É falso que a primeira rodada da pesquisa Ipec, divulgada no Jornal Nacional no dia 15 de agosto, mostrou Jair Bolsonaro (PL) com 44% das intenções de voto para a presidência da República. O trecho do noticiário que citou os dados foi manipulado e postado nas redes sociais. O Ipec e a TV Globo confirmaram que o conteúdo é falso. A informação verdadeira é que o levantamento apontou o candidato Luiz Inácio Lula da Silva (PT) à frente da disputa, com 44%. Bolsonaro foi o segundo, com 32%.

Conteúdo investigado: Vídeo divulgado no TikTok com imagens do Jornal Nacional, da TV Globo, mostra a apresentadora Renata Vasconcellos narrando o resultado de uma pesquisa eleitoral divulgada pelo Ipec. Na montagem veiculada, o candidato à presidência Jair Bolsonaro aparece na liderança com 44% das intenções de voto, enquanto Lula tem 32%. A publicação foi apagada.

Onde foi publicado: TikTok

Conclusão do Comprova: O presidente Jair Bolsonaro, candidato à reeleição, não registrou 44% das intenções de voto na primeira rodada da pesquisa Ipec, instituto criado por ex-executivos do Ibope, que teve os resultados divulgados no Jornal Nacional no dia 15 de agosto. O levantamento mostrou, na verdade, o contrário: o ex-presidente Lula na liderança da disputa, com 44%. Bolsonaro aparece em seguida, com 32%.

Um vídeo, em que a narração da jornalista Renata Vasconcellos e o gráfico apresentado no noticiário foram manipulados, mostra os porcentuais dos candidatos invertidos (Bolsonaro com 44% e Lula com 32%), com o objetivo de induzir o internauta a acreditar que Bolsonaro estava à frente na disputa de acordo com a pesquisa, o que não é verdade.

O conteúdo da publicação também foi desmentido em notas encaminhadas ao Comprova pelo Ipec e pela TV Globo.

Para o Comprova, falso é todo conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma falsidade.

Alcance da publicação: A peça verificada foi postada no TikTok, onde teve 2,5 milhões de visualizações; 80,5 mil curtidas; 3.315 comentários e 35,8 mil compartilhamentos, até o dia 29 de agosto de 2022. Depois disso, foi apagada.

O que diz o autor da publicação: Não foi possível entrar em contato com o autor da publicação, já que o TikTok só permite a troca de mensagens entre perfis que se seguem mutuamente. A equipe não encontrou páginas do autor em outras redes sociais.

Como verificamos: Para checar a veracidade do conteúdo publicado no TikTok sobre a pesquisa eleitoral realizada pelo Ipec de 12 a 14 de agosto, foram buscadas palavras-chave no Google a respeito do levantamento (Ipec, Jair Bolsonaro, Lula, 44%, 32%, pesquisa de 12 a 14 de agosto, Jornal Nacional).

Assim, foi possível encontrar notícias sobre o resultado da pesquisa em diferentes veículos de imprensa, como a Folha de S. Paulo, o Poder360, o G1 e o Estadão. Buscamos, ainda, o conteúdo veiculado pelo Jornal Nacional, cujo trecho foi publicado no perfil oficial do programa no Twitter, a fim de compará-lo com o TikTok.

O Comprova também entrou em contato com as assessorias de imprensa do Ipec e da TV Globo. As duas empresas afirmaram que o conteúdo é falso. A equipe também tentou, sem sucesso, contato com o responsável por postar o vídeo no TikTok.

Por último, foram checadas as pesquisas eleitorais reunidas pelo agregador de notícias do Poder360, no qual não consta nenhum levantamento no período indicado com resultados semelhantes ao do post modificado. O site do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) também foi consultado.

Pesquisa mostrou Lula na liderança da disputa

Os dados da primeira rodada da pesquisa Ipec, contratada pela Globo, foram divulgados pelo Jornal Nacional no dia 15 de agosto. No noticiário, a apresentadora Renata Vasconcellos informa que, de acordo com o levantamento, Lula tinha 44% das intenções de voto. Bolsonaro aparecia em segundo, com 32%. A pesquisa foi repercutida em veículos da imprensa como Folha de S. Paulo, Poder360, G1 e Estadão. O levantamento completo pode ser pesquisado no site do Ipec. A íntegra pode ser visualizada neste link.

O vídeo aqui verificado teve áudio e imagem manipulados e mente ao afirmar que Bolsonaro registrou 44% das intenções de voto na primeira rodada da pesquisa Ipec.

No início do vídeo verdadeiro, publicado pelo Jornal Nacional no Twitter, Renata diz: “O Ipec divulgou hoje a primeira pesquisa contratada pela TV Globo sobre a intenção de voto para as eleições presidenciais. O ex-presidente Lula, do PT, lidera a disputa seguido pelo presidente Jair Bolsonaro, do PL.” A apresentadora continua: “O Ipec é o instituto criado por ex-executivos do Ibope Inteligência, que encerrou as atividades. Essa pesquisa compreende o período entre as convenções partidárias e o prazo de registro oficial das candidaturas que se encerrou hoje. A margem de erro é de dois pontos percentuais para mais ou para menos”.

Em seguida, os dados são mostrados em gráfico com a narração de Renata: “Luiz Inácio Lula da Silva, do PT, aparece com 44%. Com a margem de erro tem de 42% a 46%. Jair Bolsonaro, do PL, tem 32%. Com a margem de erro tem de 30% a 34%.”

O vídeo manipulado começa com a primeira frase do vídeo original: “O Ipec divulgou hoje a primeira pesquisa contratada pela TV Globo sobre a intenção de voto para as eleições presidenciais.” Em seguida, foram inseridos o áudio e a imagem com alteração, apresentando a informação errada de que Bolsonaro registrou 44% das intenções de voto. Ou seja, a peça de desinformação também omitiu fala da apresentadora sobre a liderança de Lula na disputa e os detalhes sobre a metodologia e margem de erro da pesquisa.

| Gráfico com informações verdadeiras sobre a primeira rodada da pesquisa Ipec para presidência da República, divulgado pelo Jornal Nacional no dia 15 de agosto. Fonte: TV Globo

O gráfico mostrado na peça de desinformação mantém os índices dos demais candidatos. Ciro Gomes (PDT) aparece com 6%; Simone Tebet (MDB), com 2% e Vera Lúcia (PSTU), com 1%, conforme o resultado oficial da pesquisa. Outra alteração visual é a adição de um recurso gráfico que imita a imagem de uma bateria carregada sobrepondo a coluna de Bolsonaro.

A pesquisa original do Ipec, que é referenciada no conteúdo modificado no TikTok, está registrada no TSE com o número BR-03980/2022. O levantamento entrevistou 2.000 eleitores, de modo presencial, em 130 municípios das 27 unidades da Federação, de 12 a 14 de agosto de 2022. A margem de erro do levantamento é de 2 pontos percentuais, com um intervalo de confiança de 95%. A pesquisa em questão foi contratada pela emissora de TV Rede Globo.

Ipec e Globo confirmam que conteúdo é falso

Em nota, a assessoria de comunicação do Ipec informou que “é falso o vídeo que circula em redes sociais e grupos de WhatsApp onde o presidente Jair Bolsonaro (PL) aparece com 44% das intenções de voto e o ex-presidente Lula, do PT, com 32%, segundo dados do Ipec e com imagens do Jornal Nacional, da TV Globo”.

Além disso, o Ipec informou que está denunciando o vídeo ao Sistema de Alerta de Desinformação Contra as Eleições do TSE e ao Ministério Público Eleitoral (MPE) “para que adotem as medidas cabíveis”.

Ao Comprova, a TV Globo também disse que o conteúdo é falso. “A pesquisa, divulgada dia 15, mostra exatamente o contrário: o ex-presidente Lula lidera a disputa, com 44% das intenções de voto, seguido por Bolsonaro, com 32%”, informou nota encaminhada pela assessoria de imprensa da emissora. O texto também destaca a denúncia feita pelo Ipec ao TSE e ao MPE.

Outra forma de verificação de pesquisas eleitorais para presidente realizadas pelo Ipec no período de 12 a 14 de agosto, como divulgado no vídeo do TikTok, é o agregador de pesquisas do jornal digital Poder360. A plataforma reúne levantamentos e estudos com números de intenção de voto para Presidência da República, governos estaduais e Senado.

A ferramenta é atualizada diariamente pela equipe de jornalistas do veículo. Nas datas indicadas, não consta nenhuma pesquisa eleitoral, a nível nacional, em que Bolsonaro aparece em primeiro lugar na disputa. A maior porcentagem indicada por pesquisa oficial de intenção de voto para presidente na semana do intervalo indicado é de 37%. Contudo, consta, no agregador, pesquisas anteriores a esse período em que Bolsonaro ocupou a liderança nos levantamentos, principalmente antes de Lula ser considerado elegível por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), em abril de 2021.

TSE disponibiliza lista de pesquisas registradas

O TSE disponibiliza, em seu site, uma aba para a consulta de pesquisas eleitorais registradas no Brasil. De acordo com a lei eleitoral, a partir do dia 1º de janeiro de 2022, entidades e empresas que realizam trabalhos que envolvem pesquisas de opinião pública sobre intenção de voto devem realizar um registro prévio junto à Justiça Eleitoral. A regra prevê que o cadastro precisa ocorrer até cinco dias antes da divulgação de cada pesquisa.

O registro da pesquisa no TSE deve ser acompanhado de uma série de informações, entre as quais: quem contratou a pesquisa, valores gastos, origem dos recursos, metodologia e período de realização, plano amostral e ponderações sobre sexo, idade, grau de instrução, nível econômico e área física de realização do trabalho a ser executado; bem como intervalo de confiança e margem de erro. Também devem constar na documentação itens como o questionário completo da pesquisa.

Embora não seja possível ver o resultado das pesquisas registradas no próprio site do TSE, essa é uma ferramenta importante para o eleitor acompanhar os levantamentos que, de fato, foram contratados e registrados. As informações são públicas e ficam acessíveis no portal do órgão, que salienta não realizar controle prévio sobre o resultado das pesquisas ou cuidar de suas respectivas divulgações.

A empresa que fez a pesquisa apresenta-se como Inteligência em Pesquisa e Consultoria. O Ipec é um empreendimento com fins de lucro, como várias empresas que fazem pesquisas eleitorais no Brasil. O empreendimento é comandado por executivos ligados ao antigo Ibope Inteligência, que encerrou suas atividades em 24 de janeiro de 2021 depois de 79 anos de atuação. A ex-CEO do Ibope, a estatística Márcia Cavallari, ocupa o mesmo cargo hoje no Ipec.

Por que investigamos: O Comprova investiga conteúdos suspeitos que viralizaram nas redes sociais sobre a pandemia de covid-19, políticas públicas vinculadas ao governo federal e as eleições presidenciais. O vídeo aqui verificado induz a uma conclusão falsa, a partir da adulteração de números apontados em uma pesquisa de intenção de voto.

É frequente que as pesquisas sejam alvo de peças de desinformação, sobretudo com a proximidade de eleições. Conteúdos desse tipo podem influenciar na decisão de eleitores brasileiros, que vão às urnas no próximo dia 2 de outubro para escolher presidente, senadores, governadores e deputados. Os eleitores devem escolher seus candidatos baseando-se em informações verdadeiras.

Outras checagens sobre o tema: O Fato ou Fake, do G1, publicou uma verificação apontando o conteúdo como falso. O material divulgado já foi desmentido também por outros veículos de checagem de desinformação como o UOL Confere, Folha, Yahoo e Lupa.

O Comprova verificou recentemente o caso de um senador ironiza resultado de instituto para desacreditar pesquisas eleitorais e que não há registros de que Lula tenha defendido performance em que criança toca em homem nu. Em março deste ano, o Comprova explicou também que as pesquisas eleitorais seguem métodos científicos, ao contrário de enquetes.

Eleições

Investigado por: 2022-08-26

Senador ironiza resultado de instituto para desacreditar pesquisas eleitorais

  • Enganoso
Enganoso
Post do senador Flávio Bolsonaro engana ao sugerir que dados do Datafolha são imprecisos. Para isso, ele utiliza reportagem do portal G1, de agosto de 2018, mostrando o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) como líder nas pesquisas eleitorais daquela eleição para presidente. O conteúdo não leva em consideração que pesquisas eleitorais não são uma previsão do resultado, mas um recorte das intenções de voto em um determinado momento. Posteriormente, Lula foi impossibilitado de concorrer ao pleito e Jair Bolsonaro esteve em primeiro lugar nas análises seguintes. A pesquisa boca de urna do instituto mostrou Bolsonaro com 45% das intenções de voto e Fernando Haddad, candidato do PT em 2018, com 28%. O resultado oficial foi de 46,03% dos votos para Bolsonaro e 29,28% para o petista.

Conteúdo investigado: Publicação do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) com print de matéria do G1 a respeito de pesquisa do Instituto Datafolha, em agosto de 2018. A imagem mostra o ex-presidente Lula (PT) com 39% das intenções de voto e Jair Bolsonaro (à época no PSL), com 19%, além de dados dos demais candidatos. O senador destaca com um quadro amarelo as informações relativas aos dois candidatos mais bem pontuados, bem como a data e o horário da divulgação do levantamento. O post é acompanhado da legenda: “DataFolha como sempre muito preciso! Kkkk Em 22 de agosto de 2018, eles davam 39% para o ladrão (que estava preso), e 19% para Bolsonaro e o final vocês já sabem!”.

Onde foi publicado: Instagram.

Conclusão do Comprova: É enganosa a postagem de Flávio Bolsonaro sugerindo que as análises feitas pelo Instituto Datafolha são imprecisas. O político utiliza uma matéria do portal G1, de 22 de agosto de 2018, em que Lula aparecia com 39% das intenções de voto, enquanto Bolsonaro estava com 19%, para tentar tirar a credibilidade de pesquisas eleitorais e induzir a uma ideia de que as análises atuais não retratam a realidade.

Ouvido pelo Comprova, Daniel Bramatti, jornalista e responsável pela análise de pesquisas eleitorais no Estadão desde 2010, comenta que o fato da pesquisa não mostrar Bolsonaro à frente naquele momento não indica erro ou uma imprecisão. “Pesquisa não é previsão de resultado, é uma fotografia do momento. Não é previsão do resultado nem quando é feita na véspera da eleição”, afirma.

A mesma pesquisa Datafolha do dia 22 de agosto também mostrou um cenário sem o ex-presidente Lula, que estava preso, e com Fernando Haddad, candidato do PT que disputou aquele pleito, em seu lugar. Nesse cenário, Bolsonaro liderava com 22% das intenções de voto e Haddad tinha apenas 4%. No dia 31 de agosto, o TSE barrou a candidatura de Lula.

A consulta em questão foi a última com Lula entre as opções para os entrevistados. Bolsonaro esteve em primeiro lugar nas intenções de voto de todos os levantamentos do Datafolha divulgados a partir daquela data.

A pesquisa de boca de urna chegou a registrar crescimento dos dois candidatos: Bolsonaro pontuou 45%, e Haddad aparecia com 28%. O resultado das urnas foi compatível com essa última sondagem. O então candidato do PSL teve 46,03% dos votos e o petista teve 29,28%.

Enganoso para o Comprova é qualquer conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos que obtêm maior alcance nas redes sociais. Até o dia 26 de agosto, a publicação feita pelo senador em seu perfil no Instagram acumulava mais de 39,9 mil curtidas e passava dos 5,6 mil comentários.

O que diz o autor da publicação: O Comprova entrou em contato com a assessoria do senador Flávio Bolsonaro, que não retornou até o fechamento desta verificação..

Como verificamos: Inicialmente, fizemos uma busca no Google com o título da reportagem descrito na publicação feita pelo senador. A procura retornou a matéria publicada pelo G1, mostrando que, de fato, o levantamento do Datafolha foi divulgado na data indicada e os resultados eram verdadeiros.

A reportagem também procurou pela pesquisa em questão no site oficial do Datafolha, que disponibiliza todos os levantamentos sobre eleições feitos desde 1992. Ali, encontramos a íntegra da pesquisa divulgada em 22 de agosto de 2018, e verificamos que o instituto também perguntou aos entrevistados sobre um cenário eleitoral com Fernando Haddad em vez do ex-presidente Lula.

Depois de ler a íntegra da pesquisa que aparece na publicação, verificamos as pesquisas do Datafolha divulgadas nas semanas e meses seguintes, entre agosto e outubro de 2018, até a votação de segundo turno. Em seguida, comparamos as pesquisas publicadas na véspera e na boca de urna do primeiro e segundo turnos com o resultado das eleições daquele ano

Print e números publicados por senador são reais

A imagem compartilhada pelo senador Flávio Bolsonaro no Instagram destaca uma manchete do portal G1, cuja reportagem foi publicada em 22 de agosto de 2018. A matéria detalhou os números obtidos em levantamento do Instituto Datafolha relativo à corrida presidencial daquele ano.

Na ocasião, o instituto apurou os percentuais de intenção de voto em dois cenários distintos, sendo o primeiro com o ex-presidente Lula e um segundo cenário com o ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad (PT).

Também foram analisadas as intenções de voto dos candidatos por diferentes segmentos: sexo, faixa etária, escolaridade, renda familiar, regiões do país e religião.

Os números que aparecem na imagem compartilhada pelo político correspondem aos dados apurados pelo Datafolha naquela ocasião. Apesar de trazer informações reais na postagem, o senador acrescenta à publicação uma frase que ironiza o conteúdo, em uma clara tentativa de descredibilizar o levantamento e o próprio instituto de pesquisa.

Pesquisa em questão trazia dois cenários

A mesma pesquisa Datafolha do dia 22 de agosto também mostrou um cenário sem o ex-presidente Lula, e com Haddad em seu lugar. Nesse cenário, Bolsonaro liderava com 22% das intenções de voto e Haddad tinha apenas 4%. Na análise sem Lula, o número de eleitores que declararam votos em branco e nulos também era de 22%, o que superava as intenções de voto em Marina Silva (16%), Ciro (10%) e Alckmin (9%) – todos à frente de Haddad naquele momento. Lula ainda constava como candidato nas pesquisas, pois o PT havia registrado seu nome como candidato do partido. O TSE decidiu barrar sua candidatura apenas no dia 31 de agosto daquele ano, ou seja, nove dias depois da divulgação da pesquisa.

Assim, a pesquisa do dia 22 de agosto de 2018 foi a última em que o nome do ex-presidente Lula apareceu entre as opções para os entrevistados. Bolsonaro apareceu em primeiro lugar nas intenções de voto de todos os levantamentos do Datafolha divulgados a partir dali.

A sondagem seguinte do instituto para a eleição nacional foi divulgada no dia 11 de setembro, cerca de dez dias após a decisão do TSE. Naquela data, Bolsonaro aparecia isolado na liderança, com 24% das intenções de voto, e quatro candidatos empatados tecnicamente no segundo lugar: Ciro Gomes (13%), Marina Silva (11%), Geraldo Alckmin (10%) e Fernando Haddad (9%). Entre a pesquisa feita no fim de agosto e aquela divulgada em 11 de setembro, Bolsonaro sofreu o atentado a faca em Juiz de Fora (MG) e passou as semanas seguintes hospitalizado. Nos dias seguintes, as sondagens do Datafolha mostraram uma tendência de crescimento contínuo nas intenções de voto em Bolsonaro. Ele pontuou 26% na pesquisa divulgada em 14 de setembro, depois 28% no dia 19 – resultado que ele manteve no dia 28 daquele mês.

Haddad também cresceu nas pesquisas de intenção de voto no mesmo período. O Datafolha mostrou o petista com 13% na pesquisa estimulada de 14 de setembro, e ele chegou a 22% na sondagem divulgada no dia 28 – neste dia, isolando-se pela primeira vez na segunda colocação.

Pesquisas na véspera e boca de urna coincidiram com o resultado das eleições

Na véspera da votação em primeiro turno, no dia 6 de outubro, Bolsonaro aparecia com 40% das intenções de votos válidos e Haddad tinha 25%, segundo o Datafolha. Já a pesquisa de boca de urna, feita após a votação, chegou a registrar crescimento dos dois candidatos: Bolsonaro pontuou 45%, e Haddad aparecia com 28%. O resultado das urnas foi compatível com essa última sondagem.

O então candidato do PSL teve 46,03% dos votos e o petista teve 29,28%, portanto o resultado divulgado pelo TSE ficou dentro da margem de erro (de dois pontos percentuais, para mais ou para menos) da última pesquisa divulgada pelo Datafolha antes da apuração dos votos.

O mesmo se repetiu no segundo turno da eleição presidencial. No dia 27 de outubro, véspera da votação, o Datafolha apontava Bolsonaro com 55% das intenções de voto e Haddad com 45%. O resultado apurado pelo TSE foi de 55,13% para o candidato do PSL e 44,87% para o petista.

Funcionamento de pesquisas eleitorais

O Projeto Comprova explicou recentemente como funciona uma pesquisa eleitoral, que busca apontar as intenções de voto no momento em que é realizada. Utilizando uma amostra cientificamente calculada para representar a população brasileira, a pesquisa eleitoral consegue representar o grupo como um todo e evitar vieses que possam prejudicar a interpretação da realidade.

É considerada uma série de critérios, também chamados de variáveis, para aproximar o grupo de entrevistados da composição real da população, como raça, gênero, escolaridade e ocupação. As variáveis usadas podem diferir entre os institutos de pesquisa. O Comprova também mostrou que as pesquisas eleitorais retratam os resultados obtidos no momento em que elas foram realizadas. Como são feitas por amostragem e não trazem resultados absolutos, as pesquisas apresentam as margens de erro, que incluem essa possível oscilação nos resultados. Para eliminar essa margem de erro, seria necessário entrevistar todas as milhões de pessoas com idade para votar na cidade, estado ou país, o que é inviável.

Daniel Bramatti, responsável pela análise de pesquisas eleitorais no Estadão desde 2010, explica que existe um cálculo estatístico para definir o tamanho da amostra de acordo com a precisão desejada para a pesquisa.

“Se quiser uma pesquisa mais precisa, com menos margem de erro, a sua amostra vai ter que ser um pouco maior. Se não tiver condições de fazer com uma amostra muito grande, vai ter um cálculo para definir qual vai ser a sua margem de erro e se ela é aceitável para o que se está buscando. As pesquisas no Brasil buscam uma margem de erro máxima de 3 pontos percentuais, muitas com 2 pontos percentuais. Isso depende do número de entrevistados. Então, quanto maior o número de entrevistados, menor a margem de erro e maior o intervalo de confiança – ou seja, a sua certeza de que ao fazer a pesquisa ela vai dar resultados que venham dentro da margem de erro esperada”, explica o especialista.

Em relação à postagem feita por Flávio Bolsonaro, Bramatti afirma que não há nada indicando que a pesquisa Datafolha estava errada: “O fato de a pesquisa de agosto não mostrar o Bolsonaro na frente ou não mostrar que ele venceria, não quer dizer nada. Simplesmente pesquisa não é previsão de resultado. Pesquisa é uma fotografia do momento em que ela é realizada”.

Ele ressalta que a definição de intenção de voto tem ficado cada vez mais para o último momento e pode ser alterada até no dia da votação. Além disso, a decisão do eleitor passa pela influência de redes sociais e do círculo social, o que pode gerar mudanças de última hora.

Por que investigamos: O Comprova investiga conteúdos suspeitos que viralizaram nas redes sociais sobre a pandemia de covid-19, políticas públicas do governo federal e eleições presidenciais. Com a proximidade da eleição, as pesquisas eleitorais têm sido alvo ainda mais frequentes de críticas e questionamentos, especialmente de candidatos insatisfeitos com suas posições nos resultados de intenção de voto. Conteúdos de desinformação sobre pesquisas podem prejudicar o processo democrático uma vez que confundem a população ao tentar descredibilizar as análises. É importante, portanto, que os eleitores tenham acesso a informações verídicas sobre as pesquisas, que seguem um método científico e buscam eliminar possíveis distorções e vieses.

Outras checagens sobre o tema: Conteúdos de desinformação que tentam colocar em xeque as pesquisas eleitorais costumam circular com frequência nas redes sociais. O Comprova já mostrou que vídeo faz alegações enganosas para colocar em dúvida credibilidade das pesquisas, além de ter produzido um material explicativo para mostrar que pesquisas eleitorais seguem métodos científicos, ao contrário de enquetes.

Conteúdo recente publicado pelo Aos Fatos também detalha como são feitas as pesquisas eleitorais.