O Projeto Comprova é uma iniciativa colaborativa e sem fins lucrativos liderada pela Abraji e que reúne jornalistas de 41 veículos de comunicação brasileiros para descobrir, investigar e desmascarar conteúdos suspeitos sobre políticas públicas, eleições, saúde e mudanças climáticas que foram compartilhadas nas redes sociais ou por aplicativos de mensagens.
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Política

Investigado por: 2023-09-22

Boato sobre risco de ‘guerra civil’ no Brasil usa carta antiga de militares da reserva

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Enganoso
Vídeos no Kwai tiram de contexto conteúdo publicado em um canal do YouTube, em novembro do ano passado, quando oficiais da reserva divulgaram um documento pedindo que os comandantes das Forças Armadas atendessem a manifestações contra a posse do atual presidente, Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Conteúdo investigado: Post reproduz comentário do jornalista Luís Ernesto Lacombe em vídeo no YouTube com a legenda “caso não haja uma retomada da democracia, terá guerra civil no nosso Brasil”.

Onde foi publicado: Kwai.

Conclusão do Comprova: Posts nas redes sociais enganam ao afirmar que o Brasil está sob o risco de uma “guerra civil” com base em uma carta feita por militares da reserva aos comandantes das Forças Armadas, divulgada em novembro do ano passado. As postagens mostram uma edição antiga do Programa 4 por 4, do jornalista Luís Ernesto Lacombe, e não refletem o momento atual da política brasileira.

Na época, os militares inativos alegaram que o Brasil estava sob um “elevado risco de ingressar rapidamente em uma convulsão social” caso o atual quadro político e institucional fosse mantido. A carta colocava em dúvida a lisura do processo eleitoral e defendia como “natural e justificável” o fato de as pessoas estarem acampadas em frente aos quartéis do Exército pedindo intervenção militar, para evitar a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), eleito democraticamente.

Dez meses depois, a realidade é outra. Esse tipo de aglomeração foi dispersada pelas forças de segurança pública após o 8 de janeiro, quando centenas de manifestantes montaram caravanas para o acampamento em Brasília e atacaram a sede dos Três Poderes. Mais de 1,3 mil pessoas foram identificadas e respondem pelas suas condutas na Justiça.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Até o dia 21 de setembro, posts idênticos no Kwai acumularam mais de 78 mil visualizações, 5,3 mil curtidas e 2,5 mil compartilhamentos. Eles foram publicados entre o final de agosto e o começo de setembro deste ano na plataforma.

Como verificamos: O conteúdo original foi encontrado por meio de uma busca no Google com as palavras-chave “Lacombe”, “carta” e “militares”. Essa pesquisa retornou a edição completa do Programa 4 por 4, canal do YouTube apresentado por Luís Ernesto Lacombe, com data de publicação em 27 de novembro de 2022. A partir dessa informação, o Comprova procurou outras notícias para entender e contextualizar o episódio.

A carta dos militares da reserva

No trecho utilizado no conteúdo, Lacombe menciona uma carta de “militares da reserva das três forças”. Segundo ele, o documento consiste em um “alerta para a situação de risco de convulsão social no Brasil” e pede “providências” para os comandantes das Forças Armadas diante de supostos “abusos e ilegalidades” do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

A existência do material também foi noticiada pelo jornal Gazeta do Povo. A carta é de autoria de um grupo denominado “504 Guardiões da Nação” e foi assinada por 221 servidores inativos do Exército, da Marinha e da Aeronáutica. O deputado federal General Girão (PL-RN) encabeça a lista.

O documento não menciona explicitamente o termo “guerra civil”, mas pressiona o Alto Comando das Forças Armadas a agir a respeito da agitação popular no país. Com base em um relatório do Ministério da Defesa que não encontrou indício de fraude nas urnas eletrônicas, a carta dizia que as Forças Armadas não deveriam aceitar “que se tenha um candidato, quaisquer que seja ele (sic), como próximo presidente” enquanto existissem dúvidas “sobre a legitimidade da escolha, livre e soberana, da vontade da maioria”.

O material alegava que os militares seriam os “reais guardiões” da Constituição — reproduzindo indiretamente uma leitura distorcida sobre o artigo 142 da Constituição Federal de 1988 — e que a defesa de um golpe de Estado em frente aos quartéis era “natural e justificável” porque o povo brasileiro estava se sentindo “indefeso, intimidado e de mãos atadas” por instituições como o STF e o TSE.

“Dessa forma, aguardamos vossas decisões e depositamos nossa total confiança […] de que chegarão à melhor solução para apaziguarem os ânimos acirrados, que hoje retiram a tranquilidade dos cidadãos brasileiros e a credibilidade perante o cenário internacional”, escreveram.

Contexto diferente

Após a vitória de Lula contra Jair Bolsonaro (PL) no 2º turno das eleições presidenciais, em 30 de outubro, milhares de pessoas passaram a bloquear estradas e frequentar acampamentos em frente aos quartéis-generais do Exército de diversas cidades brasileiras pedindo um golpe militar.

A carta dos militares da reserva municiou esses atos golpistas, que persistiram até a posse de Lula e foram efetivamente dispersados pelas forças de segurança depois dos ataques de 8 de janeiro.

Atualmente, não apenas os acampamentos golpistas foram desfeitos, como os participantes e financiadores do 8 de janeiro estão sendo investigados e punidos na Justiça. O STF julga 1.345 pessoas pelo envolvimento no episódio. Os primeiros três réus foram condenados em 14 de setembro.

O que diz o responsável pela publicação: Os três perfis do Kwai que publicaram o vídeo foram contatados pelo Comprova mas, até a finalização desta verificação, não deram retorno.

O que podemos aprender com esta verificação: A publicação de vídeos antigos, sem a apresentação da data ou do contexto da gravação, é uma tática comum por parte dos desinformadores para dar a entender que é algo atual. Além disso, a utilização de termos alarmantes, como “guerra civil”, chama a atenção do público e é outra forma de impulsionar peças de desinformação.

Ao encontrar esse tipo de conteúdo, procure mais informações sobre as falas e o contexto daquela declaração. Também busque informações em canais oficiais e em veículos de comunicação de sua confiança.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: Conteúdos sobre militares são alvos frequentes de peças de desinformação e já foram verificados pelo Comprova. Recentemente, o projeto mostrou que posts usam vídeo de luta de policiais em Cuiabá para satirizar desfile do 7 de Setembro, que vídeo sobre confronto envolvendo manifestantes e Exército venezuelano na fronteira com o Brasil é de 2019 e que post engana ao associar vídeo de 2022 a início de movimento contra Lula.

O Boatos.org analisou o mesmo vídeo desta verificação. O material já havia gerado uma onda de desinformação no ano passado, com posts distorcendo a sua autoria, como mostrou o Estadão Verifica.

Comprova Explica

Investigado por: 2023-09-21

Polarização intensifica desinformação sobre transposição do São Francisco; entenda

  • Comprova Explica
Comprova Explica
O Projeto Comprova e agências de checagem do Brasil já investigaram cerca de 30 conteúdos que desinformavam sobre a “paternidade” e o funcionamento daquela que é considerada a maior obra de infraestrutura hídrica do Brasil. A localização do Projeto de Integração do São Francisco (PISF) – ou transposição do São Francisco, como também é chamado – ajuda a explicar a disputa, já que o Nordeste é fundamental do ponto de vista político e eleitoral, avaliam especialistas.

Conteúdo analisado: A transposição do São Francisco é alvo frequente de boatos e informações enganosas nas redes sociais pelo menos desde 2019. A partir da transição entre os governos de Jair Bolsonaro (PL) e de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o tema passou a ser um dos mais problemáticos no cenário da desinformação.

Comprova Explica: Considerada a maior obra de infraestrutura hídrica do Brasil, a transposição do Rio São Francisco tem como objetivo levar água do Velho Chico para regiões que sofrem com a seca e a estiagem, no Semiárido do Nordeste brasileiro. A proposta do empreendimento, cujo custo total é de R$ 14 bilhões aos cofres da União, é garantir a segurança hídrica de 12 milhões de pessoas em 390 municípios dos estados de Pernambuco, Paraíba, Ceará e Rio Grande do Norte.

A obra é dividida nos eixos Leste (217 km) e Norte (260 km) e consiste na construção de canais, reservatórios e estações de bombeamento para integrar as águas do Rio São Francisco – que nasce em Minas Gerais e passa pela Bahia, antes de chegar a Pernambuco, onde a obra se inicia –, a outras bacias hidrográficas dos estados atendidos pelo projeto. Além disso, conta com os ramais associados do Agreste (71 km), Apodi (115 km) e Salgado (36 km).

Pensado desde o final da década de 1840, o projeto de integração das bacias do Rio São Francisco com as bacias do Nordeste Setentrional só começou a sair do papel no segundo mandato de Lula (2008-2011). Desde então, o empreendimento foi marcado por atrasos, problemas de planejamento e execução, além do custo ambiental e da incerteza de que, efetivamente, ele atingiria o objetivo de garantir abastecimento de água e contribuir com o desenvolvimento da região.

Diante do tamanho, da complexidade e do impacto social e político, a transposição é alvo de disputas e, como consequência, tema frequente de desinformação. Nos últimos anos, o Projeto Comprova e outras agências de checagem pelo Brasil desmentiram cerca de 30 conteúdos sobre o projeto – desde a responsabilidade por entregas até o funcionamento das estações de bombeamento e dos canais. Em abril deste ano, o Comprova explicou detalhes do projeto. Agora, este Comprova Explica traz mais detalhes sobre o cenário de desinformação que cerca a transposição e a importância política e social da obra.

Como verificamos: Buscamos no Google informações sobre a transposição do São Francisco, além dos tipos de conteúdos desinformativos que têm circulado pelas redes a respeito do tema. Também mapeamos os pontos da obra que já foram alvo de alguma desinformação e reunimos checagens sobre o assunto de agências como Estadão Verifica, Lupa, Aos Fatos, Fato ou Fake (g1), Reuters e do próprio Comprova.

Além disso, falamos com o Ministério da Integração e Desenvolvimento Regional (MIDR), com o cientista político e professor da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (Unilab), Cláudio André de Souza; com a cientista política, professora da Universidade Federal de Alagoas (Ufal) e do Programa de Pós-Graduação em Ciência Política (PPGCP) da Universidade Federal do Piauí (UFPI) e secretária executiva da Associação Brasileira de Ciência Política (ABCP), Luciana Santana.

Também ouvimos a jornalista, historiadora e doutora em Recursos Naturais pela Universidade Federal de Campina Grande (UFCG) Catarina Buriti, que é pesquisadora do Instituto Nacional do Semiárido (INSA), ligado ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), e coautora do livro “Um século de secas: por que as políticas hídricas não transformaram o semiárido brasileiro?”, publicado em 2018 pela Chiado Books.

Por fim, entrevistamos Ruben Siqueira, atual coordenador da Comissão Pastoral da Terra (CPT), ligada à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), na Bahia. De 2005 a 2015, ele foi coordenador de projeto da Bacia do São Francisco na CPT.

Caminhos da desinformação

Os conteúdos desinformativos sobre o Projeto de Integração do São Francisco não fazem distinção entre os eixos Norte e Leste, embora, mais recentemente, o primeiro tenha ficado mais tempo em evidência. Isso porque, em novembro do ano passado, foi identificado um defeito na Estação de Bombeamento EBI-3, na cidade de Salgueiro (PE), que impediu o funcionamento das bombas e suspendeu a liberação de água para canais do Eixo Norte.

Como a estação só teve o funcionamento interrompido em janeiro deste ano, para a realização do reparo necessário, diversas publicações passaram a acusar o governo Lula de desligar as bombas da transposição deliberadamente, com a intenção de deixar a população sem água e sofrendo com a seca. Isso gerou conteúdos desinformativos sobre a Barragem de Jati (CE) e suas cascatas, vistas das margens da rodovia CE-153, sobre o Reservatório de Negreiros (PE) e sobre a Estação de Bombeamento Vertical EBV-6, em Sertânia (PE).

Antes disso, publicações já atribuíam falsamente ao governo Bolsonaro entregas no Eixo Norte, como o Canal de Penaforte (CE), as estações de bombeamento EBI-1 e EBI-2, em Cabrobó (PE). No Eixo Leste, entregas feitas por Dilma Rousseff (PT) e Michel Temer (MDB) também foram falsamente parar na conta de Bolsonaro: a inauguração da Ponte do Rio da Barra (PE) e do canal do Rio do Feijão (PB), por exemplo.

Além disso, vídeos mostravam canais de outra obra – o Cinturão das Águas do Ceará (CAC) –, alguns ainda em construção, como se fossem da transposição, sem água. No Eixo Leste, até uma valeta de escoamento de água da chuva, seca, foi falsamente identificado um canal da transposição sem água, graças ao atual governo.

Mais de um século de buscas de solução para a seca

A ideia de levar água do São Francisco a outras regiões – que não o próprio curso do rio – não é recente: “Desde fins do século XIX, quando a seca já era vista como uma calamidade no Nordeste e a busca pela solução do problema se tornou uma questão de Estado, diferentes políticas públicas foram implementadas: no início do século XX, predominava a política de construção de grandes açudes, enquanto mais para o fim do mesmo século, ganharam importância as políticas descentralizadas de construção de cisternas, ao lado das residências”, explica Catarina Buriti, que é jornalista, historiadora, doutora em Recursos Naturais pela UFCG e pesquisadora do Instituto Nacional do Semiárido.

Ousado, o projeto de integração das bacias do Rio São Francisco com as bacias do Nordeste Setentrional, afirma Catarina, já tinha sido pensado naquela época. Entre o final da década de 1840 e o início dos anos 1850, o imperador Dom Pedro II encomendou ao engenheiro Henrique Guilherme Halfeld um relatório sobre a exploração do São Francisco. O documento, de mais de 100 páginas, foi publicado em 1860, como já mostrou o Comprova em 2021.

| Primeira página de relatório de exploração do Rio São Francisco, publicado em 1860, a pedido do imperador Dom Pedro II. Crédito: Brasiliana Iconográfica.

Os estudos de engenharia, aponta Catarina, “comprovaram a viabilidade da transposição do rio para combater a escassez hídrica nos territórios do atual Nordeste, que não possuíam rios perenes”, mas o projeto não saiu do papel, talvez pelas limitações da época, o que só veio acontecer mais recentemente. Isso aconteceu no momento que Catarina afirma ser, talvez, o mais crítico em termos de escassez hídrica na região Nordeste, de 2011 a 2017, quando foi registrada a maior seca da história a atingir os municípios do Semiárido brasileiro.

É importante lembrar que o projeto de transposição executado nas últimas décadas não é o mesmo daquela época – o atual começou a ser gestado na década de 1990 e começou a sair do papel no segundo mandato de Lula. Até 2016, ou seja, no último ano completo de mandato da ex-presidente Dilma, a execução física da obra alcançou 95,5% nos eixos Norte e Leste, segundo dados do MIDR, em meio a atrasos, mudanças de planejamento e problemas, como canais rachados.

Apesar disso, a obra seguiu pelos governo de Temer – que iniciou a operação do Eixo Leste – e Bolsonaro, que concluiu as entregas do Eixo Norte e executou 99,95% das obras do Ramal do Agreste e 10,84% do Ramal do Apodi (trechos associados, mas que não fazem parte do traçado da transposição, que é dividida nos Eixos Norte e Leste).

Obra vista como “redenção”

Em uma região que sofre tanto com os efeitos da seca, não era de se surpreender que uma obra capaz de levar água do Rio São Francisco onde antes não chegava seria vista como uma verdadeira “redenção”. Mas ela não foi a única a ser encarada assim. “Historicamente, as políticas para a região eram vistas como a ‘redenção’ para o Nordeste e com a transposição não foi diferente. Cada nova política hídrica que surgia, ao longo da história do Nordeste, era vista como a ‘grande redenção’ da região. Os políticos locais e seus representantes no Parlamento tiveram um papel na propagação dessa ideia de ‘salvação’ da população”, aponta Catarina.

É o “discurso da seca”, como define o atual coordenador da Comissão Pastoral da Terra na Bahia e ex-coordenador da Bacia do São Francisco na mesma CPT, Ruben Siqueira. Ele é crítico ao projeto no governo Lula e a coalizão política deste a uma “direita nordestina”: “Essas tradicionais oligarquias sempre usufruíram desse discurso da seca, dessa economia da seca, dessa cultura da seca, falsa, como se fosse falta de água, mas não é. É falta de terra, de política pública, de justiça social, de política ecológica”, aponta Ruben.

Essa ideia de que a transposição do São Francisco seria a salvação ajudou a transmitir uma falsa ideia, mas bastante disseminada, de que a obra resolveria todos os problemas de seca e escassez de água – e, ao mesmo tempo, de que ela bastaria para que as pessoas convivessem com o Semiárido sem a necessidade de outras estratégias, o que não é verdade. Mais do que isso, chega a ser uma ilusão, já que, com as mudanças climáticas, as secas, como eventos climáticos extremos, estão mais recorrentes, explica Catarina, que não ignora as questões ambientais da obra, mas reconhece sua importância. “A transposição é mais uma política pública importante para a região, mas não a única. Funciona de forma integrada com outras ações de adaptação à seca”, diz.

Ela se refere à construção de tecnologias sociais hídricas, descentralizadas e de baixo custo, como as cisternas de placas que ficam ao lado das residências rurais para captar água da chuva, e à Operação Carro-Pipa, através da qual a Defesa Civil e o Exército Brasileiro, em articulação com estados e municípios, abastecem as áreas mais vulneráveis com água potável. O Programa 1 Milhão de Cisternas (P1MC), por exemplo, foi capaz de reduzir de 36 para 12 dias por ano o tempo que mulheres rurais – as principais responsáveis pela atividade – usavam apenas para transportar água de açudes para suas casas.

| Cisterna construída ao lado de residência rural para captação de água da chuva em Quixadá (CE). Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil.

Para Ruben Siqueira, são projetos como o P1MC, premiado em 2009 pela Organização das Nações Unidas, que funcionam para a convivência com a seca, porque se inspiram no que a própria natureza faz – reter água para o período em que ela não virá. “A caatinga é exuberante quando floresce. Tem esse jeito dela de segurar a água. Tem uma experiência incrível da natureza que aprendeu a viver assim, guardando água. Então, por que o ser humano não faz o mesmo? Aprende a guardar, acumular”, afirma, lembrando que a ideia de captar água da chuva e guardá-la começou com a sociedade civil organizada, no norte da Bahia, entre os anos 1980 e 1990.

| O mandacaru é uma planta nativa do Brasil, adaptada às condições climáticas do Semiárido. Ela consegue reter uma quantidade grande de água em suas raízes, talos ou folhas. Foto: Manuela Cavadas/Acervo ASA.

O projeto das cisternas foi levado ao ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB); depois, a construção delas seguiu – e avançou – nos governos petistas, mas praticamente não andou na gestão de Bolsonaro. Esta reportagem publicada pelo UOL em setembro do ano passado mostra que, de 2003 a 2018 (governos Lula, Dilma e Temer), foram entregues 929 mil cisternas de água para consumo humano. De janeiro de 2019 a junho de 2022, na gestão Bolsonaro, foram 37,6 mil.

Apesar de especialistas e da própria sociedade civil reconhecerem que a tecnologia das cisternas é fundamental para o convívio com a seca, apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro afirmam em um volume considerável de publicações desinformativas sobre a transposição do São Francisco que o atual governo, do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, optou por “desligar” o bombeamento de água para beneficiar donos de carros-pipa e fazer voltarem as cisternas, como se eles tivessem deixado de existir ou de ser necessários por conta da transposição.

“Esses vídeos geralmente são produzidos por pessoas que desconhecem minimamente a realidade da seca no Semiárido brasileiro”, aponta Catarina, lembrando que a Operação Carro-Pipa utiliza veículos cadastrados no programa para abastecer municípios em situação de emergência ou calamidade pública pela seca ou pela estiagem.

Também há operações privadas e, em geral, mesmo que haja registros de fraudes, há um rigor na fiscalização dos veículos usados na operação do Exército. “Em geral, os carros-pipa cumprem um papel importante na distribuição e no acesso à água para populações mais distantes, de modo que não consigo enxergar lógica ou conexão com a necessidade de desligamento do sistema de transposição. Pelo contrário, a transposição leva água para locais mais próximos, facilitando para que esses agentes transportem água com menor custo, em termos de gasto de combustível, por exemplo”, explica a pesquisadora.

| Operação Carro-Pipa, do Exército, atende municípios atingidos por seca ou estiagem no Semiárido do Nordeste do Brasil, além do norte de Minas Gerais e Espírito Santo. Foto: Exército Brasileiro.

Da mesma forma, os conteúdos que, ao exibir um canal da transposição sem água, afirmam que a população do Nordeste foi deixada para viver sob a seca não fazem sentido. Isso porque, como já mencionado em checagens ao longo de 2023, a água do São Francisco não corre pelos canais da Transposição ininterruptamente, e sim quando há demanda. O Ceará, por exemplo, que constrói o Cinturão das Águas do Ceará para levar água da transposição ao reservatório Castanhão, só demanda água do Velho Chico no período chuvoso – uma das razões para isso é evitar perdas com a evaporação.

Impacto social e político do projeto para o Nordeste brasileiro

Para o cientista político Cláudio André de Souza, professor da Unilab, Campus dos Malês (BA), mesmo que não seja a única solução para a convivência da população do Semiárido com a seca, a transposição do Rio São Francisco tem um impacto significativo no Nordeste. “Há determinadas obras que não só transformam a vida das pessoas, como têm impacto, geram emprego, mobilizam milhares de pessoas e, lá na ponta, vão significar, para diversos agricultores que estão no sertão, o acesso à água, que desemboca diretamente na questão produtiva”, diz.

Segundo ele, apesar dos discursos das oposições ao longo dos anos, de que a obra não daria certo e de que seria um “elefante branco”, o impacto positivo é inegável: “A questão da água é, literalmente, um ponto de inflexão. As pessoas são outras, têm outras perspectivas, outros sonhos, outra forma de se socializar quando passam a ter água. Essa é uma demanda que não é só para o acesso à água do ponto de vista do consumo humano, mas também envolve uma discussão sobre a capacidade produtiva e a transformação de áreas que hoje são legadas a um nível baixíssimo de desenvolvimento social e econômico”, pontua.

Também cientista política e professora da Ufal e do Programa de Pós-Graduação em Ciência Política da UFPI, Luciana Santana observa que a obra da transposição foi muito polêmica do ponto de vista ambiental e pela incerteza se, efetivamente, faria uma mudança estrutural tão importante como se propunha. Para ela, houve sim mudança e impacto social, principalmente no sertão.

“Você tem ali um impacto muito grande e que contribuiu, sim, com a mudança. Houve um processo de interiorização com a chegada da água em determinados locais onde antes o rio não chegava. Tem um desenvolvimento maior, uma integração maior também dos estados. Então, regionalmente, houve uma mudança substancial de desenvolvimento estrutural, que era necessária”, aponta.

Os impactos ambientais, diz, também são inegáveis, mas não há como voltar atrás, uma vez que a obra já está em pleno funcionamento. “Nas cidades que estão ao redor de onde houve a transposição, você olha o antes e o depois, e é muito impactante. De alguma maneira, você melhorou a situação e a qualidade de vida das pessoas ali nessa região. Até por esse impacto, a gente tem essa polarização tão grande nessa obra”, afirma Luciana.

| Região do Semiárido brasileiro. Foto: Arquivo/Agência Brasil.

Um exemplo mais pontual de como a transposição fez diferença na vida das populações do Semiárido brasileiro é citado pela pesquisadora Catarina Buriti ao lembrar o impacto da chegada das águas da transposição, em março de 2017, à bacia hidrográfica do rio Paraíba do Norte, na microrregião dos Cariris paraibanos, a região geográfica mais seca do Brasil. “Na época, o açude de Boqueirão, reservatório que abastece 1 milhão de pessoas de Campina Grande (PB) e mais 18 municípios do entorno, estava no volume morto, quase em colapso, com apenas 3% da sua capacidade. Em poucos meses da chegada das águas da transposição, foi decretado o fim do racionamento”, lembra.

Ruben Siqueira, da CPT, não vê desta forma. Para ele, por onde os canais da transposição passaram, as áreas deixaram de ser terras de pequenos produtores rurais para de médios e grandes. “Nós conhecemos, andamos por lá durante o processo de construção, antes das obras, durante e depois. Transformou a região em um lugar de grandes e médios proprietários, não mais de pequenos produtores rurais. Quem não conseguiu se empregar nas empresas que surgiram ali foram para Fortaleza, Juazeiro do Norte, Caruaru, Serra Talhada, outros lugares. [A transposição] é um equívoco total e completo, é um crime. O custo é altíssimo. É a água mais cara do mundo”, critica.

Sobre a gestão e o acesso, Catarina observa que levar água ou aumentar a quantidade dela não é suficiente para resolver os problemas da seca ou estiagem. “Há vários problemas de gestão das águas que precisam ser revistos para assegurar o acesso prioritário, conforme previsto na legislação. Ou seja, a Transposição aumenta a quantidade de água nessas áreas, e isso é muito importante, mas é necessário a gestão adequada para assegurar o uso da água aos múltiplos usuários, principalmente para as comunidades mais vulneráveis”, alerta.

Disputa de “paternidade” pela transposição

A polarização em torno da obra mencionada por Luciana Santana é justamente o que faz com que, nos últimos anos, a transposição do São Francisco tenha sido alvo de tanta desinformação. “Utilizar a desinformação em relação à transposição tem relação com você garantir, abarcar uma posição política contra ou a favor de algum adversário político. Isso fica muito evidente com relação a dizer quem é o responsável pela obra, qual a porcentagem da obra foi finalizada ou quem finalizou”, exemplifica.

No governo Bolsonaro, por exemplo, diversas postagens nas redes buscaram inflar a responsabilidade dele pela obra, ainda que ele a tenha recebido com mais de 90% da execução física concluída. Para apoiadores – e no discurso do próprio governo na época – o agora ex-presidente era o verdadeiro responsável por levar água ao Nordeste, algo que nem Lula, nem Dilma, nem Temer teriam conseguido fazer, o que não é verdade. Além de todo o Eixo Leste ter entrado em operação no governo Temer, trechos do Eixo Norte já tinham sido inaugurados por Dilma.

“Essa busca por paternidade, essas inaugurações de tempos em tempos são uma tentativa de resgate mesmo daquilo ali como um capital político. E o mais bem sucedido é aquele que consegue buscar a maior propaganda positiva para si”, diz Luciana. É um pensamento parecido com o de Cláudio André de Souza, para quem a execução da obra serve como um indicativo de eficácia de governo.

| Em março de 2017, enquanto o então presidente Michel Temer entregava o Eixo Leste da Transposição, os ex-presidentes Lula e Dilma Rousseff fizeram uma “inauguração popular da Transposição do Rio São Francisco” na cidade de Monteiro, na Paraíba. Crédito: Ricardo Stuckert/Instituto Lula.

“Se trata de uma obra muito complexa, gigantesca, que toca um assunto que é muito caro a uma parte importante da população brasileira. A gente está falando da convivência com o Semiárido, da chegada da água, e isso tem um valor muito grande do ponto de vista do comportamento político, da percepção de eficácia governamental, de presença de Estado na vida de milhares de pessoas”, observa.

Ruben Siqueira também fala sobre o valor político da obra para o governo Lula. “Era uma obra que tinha um grande apelo popular: Lula, o nordestino fugido da seca, vai resolver, vai fazer aquilo que Dom Pedro II não conseguiu, que era a transposição”, aponta.

Levar a cabo a transposição do São Francisco, explica Cláudio André, era uma forma de Lula, principalmente, levar uma obra estruturante ao Nordeste e encarar o desafio de mudar a relação dos governos com aquela parte do Brasil. Não bastava chegar com o Bolsa Família, aponta, era preciso ter um projeto estruturante que mudasse a correlação de forças, internamente, pensando no Nordeste.

Luciana Santana concorda: “Para o governo Lula é uma obra que teve um impacto muito expressivo em termos de infraestrutura e entrou naquele pacote de que, no Nordeste, não são apenas políticas públicas de assistência social, mas também de infraestrutura, de mudança, que fazem diferença regionalmente”.

O problema, no entanto, é que, apesar do investimento alto, a obra não foi concluída nos governos petistas, antes do impeachment de Dilma, em 2016. É daí que vem a entrada de Bolsonaro na disputa pelo capital político: “Para ele, trabalhar nessa obra foi como se ele tivesse ali investido também. Ao mesmo tempo, ele quer mostrar para o Nordeste, que é um lugar onde ele tem uma baixa aprovação, ele é politicamente menos quisto do que Lula, que ele estava olhando também para a região”, diz Luciana.

| Em junho de 2020, Bolsonaro também “inaugurou” a obra. Foto: Alan Santos/PR/Divulgação.

A diferença, aponta Cláudio André, é que, no Nordeste, Lula “joga em casa”, inclusive pela marca do lulismo, que sempre foi de combate à pobreza, e por ser uma região onde ele e o PT sempre tiveram protagonismo. “Essa é uma obra que tem um alto investimento e eu entendo que é uma obra muito simbólica, principalmente para Lula. Para Bolsonaro, significava ter ganhos eleitorais. Mas, a gente sabe que Lula apresenta um padrão de voto muito consistente no Nordeste. É uma região em que ele tem estabilidade na competição política”, explica.

Enquanto isso, para Bolsonaro, deixar um “legado” de sua gestão no Nordeste poderia significar uma possibilidade, ainda que bastante remota, de sustentar uma candidatura em 2026, aponta Cláudio André. “O tempo inteiro no governo Bolsonaro, ele tentou imprimir uma marca, algum tipo de agenda que fizesse com que ele de fato entrasse no Nordeste, e se a gente olhar para as eleições de 2022, se ele tivesse tido um desempenho melhor no Nordeste, além do Sudeste, e poderia de fato ter ganhado as eleições”, afirma.

Qual a situação da transposição do São Francisco agora?

Atualmente, segundo o MIDR, estão concluídos 548 km da extensão total, de 699 km, da transposição (considerando eixos Norte, Leste e ramais). A quilometragem finalizada corresponde a ambos os eixos e o Ramal do Agreste, que foi entregue em 2021.

Por enquanto, o Ramal do Apodi tem 27% das obras concluídas e a previsão do governo federal é entregá-lo em 2025. Já o Ramal do Salgado está em fase inicial. O edital de licitação para a execução das obras foi publicado em 2022.

O MIDR alerta que, em virtude da dinâmica de construção do empreendimento, não é adequado se considerar a extensão “concluída” em cada gestão federal, já que alguns trechos tiveram grande parte executada em uma gestão, mas apenas entraram em operação (foram concluídas) na gestão seguinte.

Conforme o ministério, ambos os eixos estão operando em toda a extensão. Apenas a EBI-3, que apresentou defeito em novembro do ano passado e teve o funcionamento interrompido em janeiro deste ano, está operando com 50% da sua capacidade instalada, desde julho. Em nota, o MIDR informou que está tomando as providências para restabelecimento da operação com 100% da capacidade no início de 2024.

Por que explicamos: O Comprova Explica esclarece temas importantes para que a população compreenda assuntos em discussão nas redes sociais que podem gerar desinformação. Por ser uma obra que afeta a vida de milhões de pessoas, que envolveu diversos governos e um alto investimento financeiro, a Transposição do São Francisco é objeto de interesse de desinformadores. Como é uma obra complexa, é importante que as pessoas entendam seu funcionamento, a situação atual das estruturas e os impactos sociais trazidos por ela para que não compartilhem conteúdos falsos ou mentirosos.

Outras checagens sobre o tema: Alvos frequentes de desinformação nas redes sociais, temas envolvendo a Transposição do São Francisco já foram checados por diversas agências como Estadão Verifica, Lupa, Aos Fatos, Reuters, Fato ou Fake e UOL Confere.

Desde 2019, o Comprova já verificou ao menos dez conteúdos relacionados à transposição. Por exemplo, mostrou que morte de peixes na barragem de Oiticica não foi causada pelo fechamento de comportas; que posts fazem comparações enganosas sobre transposição para exaltar Bolsonaro; e que exército não refez todo o trecho da transposição inaugurado por Temer e Lula.

Comprova Explica

Investigado por: 2023-09-21

Contribuição assistencial a sindicatos não é obrigatória e trabalhador deve ficar atento a abusos

  • Comprova Explica
Comprova Explica
O Supremo Tribunal Federal (STF) autorizou, em decisão do dia 11 de setembro, a cobrança da contribuição assistencial pelos sindicatos mesmo de trabalhadores não filiados. O argumento é o de que, com o fim do imposto sindical, os órgãos perderam sua maior fonte de custeio, restando prejudicada a representação dos trabalhadores em deliberações e negociações coletivas de trabalho. A decisão não representa o retorno do imposto sindical, já que a contribuição não é obrigatória. Mas o trabalhador deve ficar atento a eventuais abusos que podem ser cometidos.

Conteúdo analisado: Posts no Instagram, TikTok e X (antigo Twitter) que desinformam sobre a contribuição assistencial. Há conteúdos afirmando que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva(PT) e os sindicatos “vão saquear o bolso do trabalhador com a volta do imposto sindical”, que ele “triplicou o imposto” e também questionando cláusulas abusivas de convenção de trabalho de um sindicato paulista relacionadas à cobrança da contribuição assistencial, como o valor de 12% do salário dos trabalhadores, uma taxa de R$ 150 caso o empregado se oponha ao pagamento e prazo de dez dias para se opor à cobrança.

Comprova Explica: Decisão recente do Supremo Tribunal Federal (STF) estabeleceu, em tese de repercussão geral, que sindicatos podem cobrar a contribuição assistencial mesmo de trabalhadores não sindicalizados, desde que a cobrança seja estabelecida em convenção ou acordo coletivo de trabalho e que o empregado tenha o direito de optar por não ser descontado.

A decisão foi tomada por maioria de votos e sob o argumento de que, com a extinção do imposto sindical pela Reforma Trabalhista (Lei 13.467/2017), os sindicatos tiveram sua principal fonte de custeio cortada, o que gerou seu enfraquecimento e a consequente perda de representação dos trabalhadores em deliberações e negociações coletivas.

No entanto, a contribuição assistencial não significa a volta do imposto sindical, pois seu pagamento não é obrigatório, devendo constar nas convenções ou acordos coletivos de trabalho a forma e o prazo para que o trabalhador envie sua oposição ao pagamento. Diante de conteúdos que geraram desinformação sobre o tema, a seção Comprova Explica traz detalhes sobre a decisão.

Como verificamos: O Comprova consultou a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), a Reforma Trabalhista (Lei 13.467/2017), a decisão recente do STF sobre a contribuição assistencial e as advogadas Priscila Moreira, mestre em Direito do Trabalho pela Universidade de São Paulo (USP), e Cíntia Possas, consultora jurídica de entidades sindicais. O Comprova ainda procurou o Sindicato dos Empregados de Agentes Autônomos do Comércio (Seaac) de Sorocaba e Região que, na convenção coletiva 2023/2024, estipulou uma taxa de R$ 150 caso o empregado queira se opor ao pagamento da cobrança assistencial.

Compensação após extinção do imposto sindical

No dia 11 de setembro, o STF formou maioria para considerar constitucional a contribuição assistencial cobrada pelos sindicatos de todos os profissionais de uma categoria, mesmo os não sindicalizados, desde que firmada em convenção ou acordo coletivo de trabalho e que seja assegurado o direito de oposição por parte do profissional. Ou seja, caso o profissional não manifeste se opor à cobrança, ele terá o valor descontado pela empresa para repasse ao sindicato.

O entendimento do STF foi firmado no Agravo de Recurso Extraordinário (ARE) 1018459, em alteração ao estabelecido anteriormente, em 2017, quando os ministros haviam decidido pela inconstitucionalidade da cobrança aos não filiados a sindicatos. A mudança se deu após a Reforma Trabalhista que, naquele mesmo ano, extinguiu a obrigatoriedade do imposto sindical, alterando o artigo 578 da CLT.

Com isso, o STF autorizou a cobrança da contribuição assistencial dos empregados não sindicalizados para “a mera recomposição do sistema de financiamento dos sindicatos”, desde que observadas duas condições: se pactuada em acordo ou convenção coletiva e caso os referidos empregados deixem de exercer o seu direito à oposição.

“Com o fim do imposto sindical, os sindicatos perderam sua maior fonte de financiamento. Muitos, inclusive, deixaram de funcionar. O novo entendimento do relator Gilmar Mendes, ao seguir voto do ministro Luís Roberto Barroso, foi no sentido de garantir o funcionamento do sistema sindical”, explica a advogada Priscila Moreira.

Segundo a também advogada Cíntia Possas, é errado afirmar que a cobrança da contribuição assistencial seja o “novo imposto sindical”. Isso porque, ao contrário do extinto imposto sindical, que previa o pagamento obrigatório e anual do equivalente a um dia de trabalho ao sindicato, a cobrança da contribuição assistencial prevê a recusa ao pagamento: “Ela não é uma imposição, não é compulsória, o trabalhador pode se opor a ela”, diz Cíntia.

Cobrança é devida caso não haja oposição

Caso a contribuição assistencial esteja estabelecida em convenção ou acordo coletivo de trabalho e o profissional não tenha manifestado oposição ao pagamento, ele terá o valor descontado. Como explica Cíntia Possas, as convenções ou acordos coletivos deverão estipular o valor e a periodicidade da cobrança, bem como o prazo e a forma para o profissional manifestar sua oposição: “Isso vai variar de acordo com o que for definido nas assembleias com os trabalhadores e formalizado nas cláusulas das convenções ou acordos coletivos de trabalho. Essa negociação é prerrogativa dos sindicatos, como consta no artigo 513 da CLT”.

Cabe aos sindicatos dar publicidade às convocatórias para assembleias com os trabalhadores e às convenções ou acordos coletivos de trabalho, o que costuma ser feito em seus sites e em jornais de grande circulação. Os sindicatos também devem incluir as convenções e acordos coletivos no sistema Mediador, do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).

O profissional que quiser se opor à cobrança deverá estar atento a essas publicações. “É importante que o trabalhador tenha atenção ao sindicato que o representa e busque essa aproximação. Ele precisa ficar atento às informações, pois o prazo para manifestar a oposição costuma ser curto”, alerta Cíntia Possas.

Priscila Moreira explica que a cada nova convenção ou acordo coletivo, que pode ter até dois anos de vigência, o profissional deverá protocolar oposição à cobrança assistencial caso não deseje ter o valor descontado. “E essas variáveis, como o prazo para a oposição e a forma como ela deve ser feita, também podem variar de acordo com esses atos normativos. Geralmente a oposição costuma ser por carta escrita de próprio punho e entregue ao sindicato”, diz.

Sindicato cobrou uma taxa ilegal

Um caso recente que envolve o Seaac Sorocaba e Região, representante da categoria de agentes autônomos, vem causando polêmica. Como mostrou a Folha, na convenção coletiva 2023/2024, a cobrança assistencial está fixada em 12% do valor do salário dos profissionais e houve a inclusão de uma taxa de R$ 150 em caso de oposição à cobrança. O prazo para manifestar a oposição é de apenas dez dias. Segundo a advogada Priscila Moreira, a taxa é ilegal.

“Em relação a esse ‘pedágio’, digamos assim, para apresentar a oposição, isso é ilegal. O sindicato não pode cobrar algo de um empregado que não é filiado para ele se opor à cobrança. Isso não pode. Fere o artigo 8º da Constituição Federal, na interpretação do inciso V: não sendo obrigatória a filiação, o pagamento também não o é”, explica a advogada.

Sobre a cobrança de 12% do valor do salário dos profissionais, a advogada considera abusiva, mas não ilegal: “De fato é abusiva a cobrança, mas acaba sendo uma negociação entre os sindicatos (laborais e patronais)”. Já em relação ao prazo de dez dias para oposição, Priscila Moreira afirma que o período costuma mesmo ser curto. “Normalmente, os sindicatos colocam uma semana ou dez dias, no máximo, para que a oposição seja feita. E, como regra, o próprio empregado, pessoalmente, deve ir ao sindicato, às vezes em horários específicos, para entregar uma carta de oposição à cobrança escrita de próprio punho.”

Já a advogada Cíntia Possas ressalta, em linhas gerais, que há tese defensiva no sentido de que os sindicatos não podem dificultar a manifestação da oposição por parte do trabalhador, criando obstáculos ao exercício do direito de se opor à cobrança.

O Comprova procurou o sindicato, mas não obteve resposta.

Por que explicamos: A decisão do STF sobre a constitucionalidade da contribuição assistencial para empregados não filiados a sindicatos gerou ruídos nas redes sociais. Houve confusão sobre o que chamaram de “novo imposto sindical” ou “a volta do imposto sindical”, o que não procede.

O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para publicações que obtiveram maior alcance e engajamento e que induzem a interpretações equivocadas. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: Recentemente, o Comprova publicou matérias explicativas sobre a mobilização dos prefeitos em defesa do Fundo de Participação dos Municípios, o pedido de recuperação judicial da 123 milhas e o funcionamento da lista de espera por transplante de órgão no Brasil.

Contextualizando

Investigado por: 2023-09-21

Vigilância Sanitária fiscalizou cozinha improvisada no RS para apurar denúncia e orientar voluntários

  • Contextualizando
Contextualizando
Um vídeo que circula nas redes sociais confunde usuários ao dizer que a Vigilância Sanitária teria feito uma "batida" em uma cozinha de voluntários que distribuía alimentos às vítimas das enchentes no Rio Grande do Sul. A secretária de Saúde do município de Roca Sales, onde ocorreu a ação, informou que a fiscalização foi motivada por uma denúncia e teve como objetivo orientar sobre o uso de toucas, luvas e armazenamento de carnes. A Secretaria Estadual de Saúde, que recebeu a denúncia, também reforçou que a inspeção não teve caráter punitivo, apenas informativo. Voluntárias que atuavam no local durante a fiscalização criticaram a abordagem, mas confirmaram que se tratava de uma visita para orientação.

Conteúdo investigado: Vídeo publicado no TikTok por um deputado estadual de Santa Catarina mostra uma ação da Vigilância Sanitária em um espaço improvisado para distribuir comida para vítimas das enchentes no Rio Grande do Sul. A publicação do parlamentar é acompanhada do seguinte texto: “Absurdo! Vigilância Sanitária fazendo batida em cozinha de voluntários, improvisada para atender as vítimas da catástrofe que assola o Rio Grande do Sul”. Na gravação, uma mulher xinga e critica a intervenção dos agentes.

Onde foi publicado: TikTok, Instagram, Facebook e YouTube.

Contextualizando: Em 12 de setembro, agentes da Vigilância Sanitária do município de Roca Sales, no Rio Grande do Sul, e da Vigilância em Saúde do estado fiscalizaram uma cozinha improvisada, que distribuía alimentos a vítimas das enchentes que atingiram o estado, após receberem uma denúncia.

Ao Comprova, a secretária de Saúde do município, Raquel Oestreich, explicou que a visita buscava orientar os voluntários, sem “intenção punitiva”. A versão foi corroborada pela Secretaria Estadual de Saúde do Rio Grande do Sul, em nota enviada.

O Comprova também conversou com Carolina Mazzotti, voluntária que atua na cozinha improvisada e estava no local no momento da inspeção. Ela, inclusive, fez uma transmissão ao vivo enquanto ocorria a visita dos agentes. Mazzotti disse que, inicialmente, os voluntários acreditaram que o local seria fechado. No entanto, depois foi informada de que o motivo da intervenção era uma denúncia e que a visita tinha o objetivo de orientar as pessoas.

Como a publicação pode ser interpretada: A publicação pode ser vista como uma atitude do governo para atrapalhar a ajuda a pessoas afetadas por uma tragédia como a que a população do Rio Grande do Sul enfrenta. Nos comentários, muitos usuários se mostraram indignados com a situação e criticaram a atitude dos agentes.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Em 19 de setembro, o conteúdo somava mais de 383 mil visualizações entre as quatro plataformas onde foi publicado, além de acumular 6 mil interações, divididas entre comentários, curtidas e compartilhamentos.

Como verificamos: Inicialmente, o Comprova fez uma busca no X (antigo Twitter) pelas palavras “vigilância + sanitária + voluntária” e encontrou um vídeo da visita da Vigilância Sanitária que continha o nome de usuário do Instagram de uma das voluntárias, identificada como Carolina Mazzotti. Em seguida, o Comprova entrou em contato com a mulher, que concedeu uma entrevista. A verificação conversou com a secretária de Saúde do município onde ocorreu a vistoria e procurou a Secretaria Estadual de Saúde, que enviou uma nota sobre o ocorrido. Além disso, entrou em contato com o deputado estadual de Santa Catarina autor da publicação e com o deputado estadual Capitão Martim (Republicanos-RS), coordenador do Gabinete de Crise instaurado pela Câmara Legislativa do estado para apoiar vítimas das enchentes, e que posteriormente publicou um vídeo sobre a situação.

Vídeos registraram a fiscalização

O vídeo investigado foi gravado em 12 de setembro, em Roca Sales. Uma mulher filma o local onde estão sendo preparadas marmitas para serem entregues à população afetada pelas chuvas na cidade. Ela diz que os agentes foram “fazer batida”.

“As mulheres trabalhando, tá? Saíram de seus lares. Todo mundo aqui no voluntariado e quem me chega aqui? A Vigilância Sanitária. Para fazer batida, gente”, narra a mulher. “Olha o estado que está essa cidade e chega a Vigilância Sanitária para fazer um fiasco aqui”, emenda.

Uma live, feita pela voluntária Carolina Mazzotti, no Instagram, documentou a passagem dos fiscais da Vigilância Sanitária pela cozinha. Na transmissão, de cerca de 25 minutos, é possível verificar que os agentes não impediram o funcionamento do local, nem impuseram alguma punição. Próximo da metade do vídeo, a própria voluntária confirma isso: “Pessoal, a Vigilância Sanitária veio aqui porque teve uma denúncia. Eles estão bem tranquilos aqui, a gente mostrou para eles o que a gente está fazendo. […] Os rapazes da vigilância foram legais, tá? Foram bacanas. Eles estão conversando com nós. […] Eles vão dar algumas orientações para nós, de vigilância, de como proceder nesses casos”.

No mesmo perfil, está disponível um vídeo postado por Capitão Martim, deputado estadual no Rio Grande do Sul pelo Republicanos. No vídeo, ele aparece ao lado da mulher que fez a live durante a fiscalização. A postagem foi feita após a viralização do vídeo inicial e tenta esclarecer a situação: “A Vigilância Sanitária veio para questão de orientação. Mas o que ficou decidido nesse momento, qualquer ação da Vigilância Sanitária vai passar pelo Gabinete de Crise. E a Vigilância Sanitária está mais do que nunca para orientar”, afirma o deputado.

O Comprova entrou em contato com a assessoria de Capitão Martim para mais esclarecimentos, mas não obteve resposta até o fechamento desta verificação.

Ação buscava orientar voluntários

A secretária de Saúde de Roca Sales, Raquel Oestreich, esclareceu que a Secretaria Estadual de Saúde recebeu uma denúncia e pediu para que o funcionário da Vigilância Sanitária do município os acompanhasse até o local. A visita se daria para passar orientações sobre o uso de luvas, toucas, armazenamento de carnes, entre outras questões. “Vieram de fato vistoriar, óbvio que sem intenção punitiva, somente orientativa. Mas não foram bem recebidos no momento. No meu ponto de vista, a Vigilância fez o correto de averiguar e encontrou tudo dentro do adequado para a situação do momento”, disse Oestreich.

Questionada pelo Comprova sobre a ação, a Secretaria Estadual de Saúde do Rio Grande do Sul emitiu uma nota informando que a Vigilância em Saúde tem atuado nos municípios do Vale do Taquari, atingidos pelas chuvas, distribuindo hipoclorito de sódio para “limpeza de superfícies e para purificar a água para consumo humano, reduzindo as chances de contaminação por vírus, parasitas e bactérias, que causam doenças”. O órgão reforçou que a vistoria tinha como objetivo a orientação aos voluntários, “sem caráter punitivo”. “Inclusive com relato de que pessoas que atuavam no local eram proprietários de restaurantes na região. Reforça a importância do trabalho conjunto que vem sendo realizado por equipes técnicas e voluntários”, destaca.

Críticas à abordagem

O Comprova também entrevistou a voluntária Carolina Mazzotti. Ela informou que a confusão se deu porque, com a chegada dos fiscais, as pessoas que prestavam serviço no local acreditaram que a cozinha seria interditada. Mas, depois, foi esclarecido que houve uma denúncia e que o intuito era de passar orientações para os voluntários.

Ela, no entanto, criticou a abordagem dos agentes: “Eles vieram em um horário em que estava extremamente corrido. Tiraram a chefe, que era a única que conseguia comandar a cozinha, e fizeram essas coisas ali que vocês estão vendo no vídeo. Então, no final, eles falaram que tiveram uma denúncia e que vieram fiscalizar”, disse.

O que diz o responsável pela publicação: O Comprova entrou em contato com o deputado estadual de Santa Catarina, Jessé Lopes (PSL), por WhatsApp. Ao ser questionado sobre a postagem, o deputado afirmou que, antes de fazê-la, verificou o contexto do vídeo. “Temos um integrante da nossa equipe que já morou na região e tem contatos e amigos lá. Foi gravado por morador local voluntário. Foi gravado em um posto de combustível”, argumentou. O parlamentar informou também que buscou saber o motivo da fiscalização e que “segundo a Vigilância Sanitária, a ação foi habitual e discricionária”.

O que podemos aprender com esta verificação: O vídeo é narrado com um tom de indignação e dentro de um contexto sensível, que envolve uma tragédia ocorrida no estado. Sempre busque mais informações ao se defrontar com conteúdos em vídeo cujo local da gravação ou a autoria não é possível identificar. Esses são alguns indícios de que o conteúdo pode se tratar de uma desinformação. Informe-se pelos canais oficiais do município ou estado e consulte veículos de comunicação de sua confiança.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: A agência Lupa verificou o mesmo vídeo. O Comprova já checou outros conteúdos relacionados às enchentes que atingiram o Rio Grande do Sul. Recentemente, foi verificado que doações em Lajeado não foram interrompidas para aguardar a chegada de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ou Geraldo Alckmin (PSB) e que as barragens no Vale do Taquari não têm comportas que poderiam controlar o fluxo de água.

Política

Investigado por: 2023-09-20

Governo federal não bloqueou água no Nordeste e nem todo problema na região tem relação com transposição do São Francisco

  • Enganoso
Enganoso
São enganosos os posts que mostram imagens da transposição do Rio São Francisco e responsabilizam o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) pela falta de água em cidades como Santana, na Bahia, e Missão Velha e Abaiara, no Ceará. As imagens não têm a ver com os trechos citados, e os problemas no fornecimento de água não estão ligados a supostos bloqueios no serviço.

Conteúdo investigado: Vídeo publicado no X (antigo Twitter) mostra o que seria um trecho da transposição do São Francisco entre os municípios de Abaiara e Missão Velho, no Ceará, sem água. Sobre o vídeo, está a inscrição “Cadê a água Lula”. No TikTok, o mesmo vídeo foi exibido por uma mulher que sobrepõe a ele um segundo vídeo, do deputado estadual Leandro de Jesus (PL-BA), em que ele faz críticas ao PT e menciona a falta de água no município de Santana, na Bahia.

Onde foi publicado: X e TikTok.

Conclusão do Comprova: É enganoso conteúdo compartilhado nas redes sociais que associa problemas no fornecimento de água no Nordeste a bloqueios supostamente praticados pelo governo federal. A publicação no TikTok usa trecho de um vídeo do deputado Leandro de Jesus, em que ele menciona a taxa de desnutrição de bebês na Bahia em meio a críticas que faz ao PT. O trecho foi retirado de contexto porque as críticas do deputado são endereçadas ao governo da Bahia e não ao governo federal. O post, que coloca as imagens da transposição sem água ao fundo, tenta relacionar as críticas à suposta falta de água em partes da transposição.

O Comprova apurou que, no caso dos municípios cearenses mencionados no primeiro vídeo, não houve bloqueio ou paralisação de bombeamento por parte do governo Lula. Segundo a Secretaria de Recursos Hídricos do Ceará, o único momento em que a liberação de água foi pausada ocorreu em novembro de 2022, ainda no governo de Jair Bolsonaro (PL). Na ocasião, uma fissura na estrutura da Estação de Bombeamento de Salgueiro (PE) fez com que o fornecimento fosse interrompido para manutenção.

Já o município de Santana, no interior da Bahia, mencionado no segundo vídeo, não depende da transposição do Rio São Francisco para obtenção de água, segundo a administração municipal.

O Comprova não conseguiu, até o fechamento desta verificação, confirmar onde ou quando foi feita a filmagem do trecho da transposição mostrado nos vídeos investigados.

Alcance da publicação: Até terça-feira (19/9), o vídeo somou no TikTok 5,7 mil curtidas; 4,2 mil compartilhamentos e 116,1 mil visualizações. Já no X, a publicação acumula 9,5 mil visualizações, 387 curtidas e 243 compartilhamentos.

Como verificamos: O Comprova analisou as imagens utilizadas nos vídeos investigados e buscou identificar se elas correspondiam, de fato, ao local indicado na legenda. A verificação entrou em contato com a Secretaria de Recursos Hídricos do Ceará, que negou que as imagens tenham sido feitas no município de Missão Velha.

Após a negativa, o Comprova entrou em contato com o Ministério do Desenvolvimento Regional, que responde pelas obras da transposição do Rio São Francisco, em busca de um posicionamento a respeito das afirmações feitas nos vídeos e sobre o abastecimento de água na região, mas não obteve resposta.

Na busca pela identificação do local da imagem, o Comprova utilizou o mecanismo de busca reversa do Google, utilizando o print do vídeo, que indicava ser um trecho da transposição. Entretanto, a imagem do local se assemelha a outros eixos da obra. A ferramenta não conseguiu direcionar para o local exato.

Com isso, o Comprova buscou o Comitê da Bacia Hidrográfica do São Francisco na tentativa de localizar as imagens utilizadas pelos autores da publicação.

Também foram realizadas buscas no Instagram, pois um dos vídeos (Rede X) utiliza narrativa com áudio de perfil de humor do dia 31 de julho e que não tem a ver com o tema água. O vídeo de um canal seco que foi usado na postagem no TikTok exibe uma marca d’água com o nome de um perfil no Kwai, mas esse perfil não foi encontrado na plataforma. Até o momento, não foi possível encontrar o local exato em que o vídeo foi gravado. 

Missão Velha e o Cinturão de Águas do Ceará

A Transposição do Rio São Francisco é formada por dois eixos. O trecho Norte possui 260 km de extensão e atende cidades dos estados de Pernambuco, Ceará, Paraíba e Rio Grande do Norte. Já o eixo Leste é composto por 217 km e está ligado aos municípios localizados em Pernambuco e na Paraíba.

A transposição foi projetada para captar água do Rio São Francisco e enviar para estações de bombeamento, fazendo com que as bombas levem a água por tubos para a área superior do canal, onde será encaminhada – por meio da força da gravidade – para novas estações.

No caso do Ceará, a água do Rio São Francisco passa pelo Núcleo de Controle Operacional da Integração do São Francisco, localizado na cidade de Salgueiro, em Pernambuco. A água é liberada pela estrutura e segue até a Barragem de Jati (CE) onde, posteriormente, encontra o Cinturão de Águas do Ceará (CAC).

O Núcleo, inclusive, interrompeu os serviços de bombeamento de água para o Ceará em novembro de 2022, devido a um serviço de manutenção no conjunto de bombas da Estação de Bombeamento EBI-3. As atividades foram retomadas no dia 13 de julho de 2023.

De acordo com a Secretaria de Recursos Hídricos do Ceará, as águas do Projeto de Integração do Rio São Francisco (PISF) irão percorrer 53 km do trecho emergencial do Cinturão das Águas até o Riacho Seco, no município de Missão Velha, onde fluirá para o Rio Salgado e Rio Jaguaribe, até alcançar o açude Castanhão. O trajeto compreende 350 km.

Ainda segundo a pasta, uma vez chegada ao Castanhão, a transferência para a Região Metropolitana de Fortaleza será efetuada pelo Eixão das Águas.

Santana não depende da transposição

Com relação às críticas à falta de água e ao governo Lula feitas pelo deputado estadual Leandro de Jesus no TikTok, o secretário de governo da Prefeitura Municipal de Santana, padre Vicente Nascimento Júnior, comunicou que o abastecimento de água da cidade é realizado por meio do Rio Corrente – um afluente do Rio São Francisco -, e que o município não depende da transposição para que a água seja distribuída aos moradores.

De acordo com a pasta, a captação da água é feita por bombas na estação do distrito de Porto Novo, por onde segue por dutos até Santana e outras localidades como Canápolis, Serra Dourada, Tabocas do Brejo Velho e Brejolândia.

Procurada pelo Comprova, a concessionária Embasa informou que “a bomba da estação elevatória de Porto Novo apresentou problema no dia 28 de agosto e já foi consertada”.

A Embasa diz ainda que não há escassez hídrica na localidade e comunicou que o abastecimento está regular.

Índice de bebês internados por desnutrição

No vídeo publicado no TikTok também foi inserida parte de uma entrevista com o deputado Leandro de Jesus em que ele cita supostos problemas provocados pela falta de água. Um dos assuntos comentados é o alto índice de bebês internados por desnutrição na Bahia. Apesar de não ser alvo da verificação, o Comprova procurou o parlamentar para que comentasse sobre as afirmações presentes no vídeo. Leandro respondeu sobre o fato de associar o quadro de desnutrição ao serviço de água.

“Como se sabe, a água é um nutriente fundamental para a saúde, metabolismo e transporte de nutrientes […] Sabemos que o acesso a água é limitado e de certo modo burocrático. A outorga da água, que é licenciada por órgãos de fiscalização ambiental do estado, em muitas situações, é demorada, o que causa impacto direto aos moradores locais de municípios que não possuem um plano de abastecimento ou saneamento”, justificou o deputado.

De acordo com a nutricionista Ana Rita Gaia Machado (4733-CRN7), especialista em nutrição materno infantil, problemas no fornecimento de água podem colaborar, sim, para a desnutrição do corpo humano.

“Sem água você não tem condições de higienizar os alimentos e fornecer alimento seguro. Isso aumenta as taxas de infecção e consequentemente a desidratação, vômito, diarreia. E aí a desnutrição”, comenta a profissional.

Analfabetismo no Nordeste

O vídeo publicado no TikTok também mostra taxas de analfabetismo a partir de 15 anos no Nordeste. O Comprova verificou que os números divulgados são autênticos e se referem aos dados de 2022, publicados em junho pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

O Nordeste possui a taxa de analfabetismo mais alta do país, com 11,7% da população nessas condições.

Entre 27 unidades da federação, as que apresentam maiores taxas são da região: Piauí – 14,8%; Alagoas – 14,4% e Paraíba – 13,6%. Veja no gráfico:

O que diz o responsável pela publicação: O Comprova não conseguiu contato com os responsáveis pelas publicações.

O que podemos aprender com esta verificação: A transposição do Rio São Francisco, bem como o fornecimento de água no Nordeste são temas recorrentes de conteúdos com desinformação espalhados na internet. Por se tratar de questões relevantes e com abordagens noticiadas ao longo de décadas, é importante buscar por fontes de informação confiáveis, como veículos de comunicação ou órgãos oficiais.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: Alvo constante de desinformação, o Comprova já realizou verificações relacionadas ao andamento das obras da Transposição do Rio São Francisco e explicou o funcionamento do processo de captação e bombeamento de água para estados do Brasil. Outras abordagens sobre a Transposição do Rio São Francisco também já foram publicadas em diferentes momentos. O Comprova Explica mostrou como acontece o funcionamento da transposição e por que ela gera dúvidas. Recentemente, em junho, o assunto voltou a ser verificado e informou que o trecho do Eixo Norte da transposição não havia sido fechado pelo governo Lula.

Política

Investigado por: 2023-09-19

Lula não estava bêbado nem agarrou apoiadora como alegam publicações que usam vídeo manipulado

  • Falso
Falso
É falso que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) estivesse bêbado e tenha agarrado uma mulher, diferentemente do que alegam publicações nas redes sociais. Os vídeos usados nas peças de desinformação são manipulados e tiveram a velocidade desacelerada para criar um contexto diferente do original. Lula e a primeira-dama, Janja Lula da Silva, cumpriram, no dia 6 de junho, agenda em Pernambuco para visita nas instalações do Polo Automotivo Stellantis de Goiana. O vídeo foi gravado na saída de um hotel, quando uma apoiadora do presidente o abordou.

Conteúdo investigado: Postagens exibem um vídeo de Lula sendo abraçado por uma mulher não identificada. Na situação, ele estava acompanhado da primeira-dama, Janja, e da equipe de segurança. A legenda da publicação afirma que o presidente estava “completamente embriagado” e que ele “beija uma mulher na frente de todos”, inclusive de Janja.

Onde foi publicado: Instagram, Facebook, Kwai, X (antigo Twitter) e TikTok.

Conclusão do Comprova: É falsa a afirmação de que o presidente Lula estivesse “completamente embriagado” e que tenha agarrado uma mulher, diferentemente do que alegam publicações em diferentes plataformas. Os vídeos usados foram manipulados, sendo utilizados com a velocidade reduzida para simular que o presidente estivesse com os movimentos lentos e que isso fosse resultado de uma embriaguez.

Nas imagens, analisadas na versão sem edição, é possível ver o presidente e a primeira-dama, Janja Lula da Silva, na recepção do hotel Atlante Plaza, em Recife, Pernambuco, quando uma apoiadora se aproxima. A mulher, inicialmente, estende a mão para cumprimentar o presidente, mas consegue se aproximar e abraçá-lo.

O presidente, então, sinaliza ao segurança, que tenta retirar a mulher, para esperar. A interação dura cerca de 15 segundos, até que a primeira-dama e um segurança conseguem afastar a mulher. A pessoa que grava o vídeo também se aproxima do presidente e eles falam “fica com Deus” um ao outro.

Aos 8 segundos do vídeo sem edição, a mulher parece dar um beijo no rosto de Lula, mas é possível ver que, durante a interação, o presidente vira o rosto. Mais para frente, aos 14 segundos, a moça parece falar algo no ouvido de Lula, que escuta com a cabeça inclinada para a esquerda. Novamente, aos 18 segundos, a mulher parece beijar a bochecha de Lula. Não há, no entanto, nenhuma iniciativa do chefe de Estado para “agarrar” ou beijar a apoiadora.

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma falsidade.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Até o dia 19 de setembro, as postagens no Instagram acumulavam mais de 1 milhão de visualizações. Uma delas foi sinalizada como informação falsa e, ao abrir o post, o usuário é informado que houve uma verificação que comprovou a inveracidade do vídeo. No TikTok, as publicações manipuladas tinham mais de 30 mil curtidas. No X, o mesmo vídeo foi republicado diversas vezes, com mais de 17 mil visualizações e 6 mil comentários.

Como verificamos: Primeiramente, o Comprova tentou descobrir quando e onde o vídeo foi gravado. Buscando em redes sociais, encontrou uma postagem no Instagram da primeira-dama com as mesmas vestimentas do vídeo analisado. Em seguida, entrou em contato com a Secretaria de Comunicação Social (Secom) da Presidência para uma explicação do ocorrido, bem como uma confirmação da data e do local da gravação.

Além disso, também buscou o vídeo original e encontrou uma postagem no X que repostou a gravação sem manipulação, com a velocidade normal e sem elementos visuais, como legendas e ‘emojis’, que impossibilitassem de visualizar a gravação na íntegra. Por fim, entrou em contato com o autor da publicação para saber o contexto da gravação.

Lula estava em hotel de Recife

No dia 6 de junho, Lula e Janja estiveram em Goiana, cerca de 65 km ao norte da capital, Recife, para visitar as instalações do Polo Automotivo Stellantis de Goiana. No local, o chefe do Executivo participou do lançamento simbólico do quinto modelo da picape Rampage, ao lado do presidente da Stellantis na América do Sul, Antonio Filosa. A visita consta na agenda oficial do presidente.

No vídeo aqui analisado, é possível identificar que as roupas utilizadas por Lula e Janja são as mesmas do evento no polo automotivo, que foi registrado nas redes sociais da primeira-dama. O ambiente, que fica visível na gravação, também apresenta semelhanças com as imagens da recepção do hotel Atlante Plaza, presentes no Google Travel.

Ao Comprova, a Secom confirmou que o vídeo foi gravado no Atlante Plaza, em 6 de junho. A secretaria também negou que o presidente Lula estivesse “agarrando” alguém, como alegam as postagens compartilhadas nas redes sociais. “Uma apoiadora abraçou o presidente, no hotel Atlante Plaza, em Recife, no dia 06/06, e como ela se estendeu no abraço, a segurança conversou com ela”, explicou, em nota.

Gravação foi desacelerada

No dia 7 de junho, um usuário do X repostou o vídeo original, sem legendas por cima e sem indícios de manipulação. Na gravação, é possível identificar que outras postagens desinformativas desaceleraram a velocidade do vídeo para afirmar que Lula estava bêbado.

No vídeo original, fica nítido que Lula apenas abraçou a mulher – e não a beijou ou a “agarrou”, como alegam as postagens. É possível ver que a mulher de laranja contorna os seguranças para cumprimentar o presidente. Inicialmente, Lula apenas a cumprimenta com a mão, mas, logo em seguida, a mulher o abraça. Em nenhum momento do vídeo, Lula “agarra” a mulher. Inclusive, a equipe de segurança do presidente tenta intervir em diversos momentos.

O que diz o responsável pela publicação: O Comprova contatou a página que compartilhou o vídeo no Instagram, mas não houve retorno. Na conta, há a divulgação de cadastro no site News Atual, mas, na plataforma, não é disponibilizado e-mail ou telefone para contato. Uma mensagem foi mandada pela seção de “Fale Conosco”, no site, mas não houve resposta até a publicação desse texto.

O que podemos aprender com esta verificação: É comum que produtores de desinformação reproduzam vídeos com baixa qualidade e que não sejam de sua autoria, sem dar créditos ou explicar o contexto. Neste caso, o vídeo passou por edição para ter a velocidade reduzida, tática que pode ser identificada por meio do som da gravação que aparece de forma mecânica e a alteração brusca de velocidade em que as pessoas se movem. Desconfie também de publicações com legendas sobrepostas.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: O mesmo vídeo foi analisado pela Agência Lupa e pelo Boatos.org. Recentemente, o Comprova também mostrou que doações a atingidos por enchentes no RS não foram interrompidas para aguardar Lula e que presidente levou presentes em contêineres de forma legal.

Política

Investigado por: 2023-09-19

Vídeo de projeção em prédio de Nova York com frase de apoio a Lula é de 2022

  • Enganoso
Enganoso
Postagem engana ao sugerir que a projeção da frase "The world needs Lula" (o mundo precisa de Lula, em tradução livre) no Chrysler Building, em Nova York, seja atual. Na verdade, a projeção foi feita em outubro de 2022, antes do segundo turno das eleições para presidente no Brasil, por um grupo de ativistas brasileiros, norte-americanos e ingleses.

Conteúdo investigado: Vídeo mostra o edifício Chrysler, em Nova York, com projeções que dizem “The world needs Lula” (o mundo precisa de Lula, em tradução livre). Sobre as imagens está escrito: “Agora os bolsominions vão pirar” e emojis de risada. Na legenda, o usuário que postou o conteúdo escreveu: “O velhinho tá on”, se referindo ao presidente.

Onde foi publicado: TikTok e X (antigo Twitter).

Conclusão do Comprova: Não é atual o vídeo que mostra a frase “The world needs Lula” projetada em um prédio em Nova York. A imagem foi publicada inicialmente no perfil do portal ClimaInfo na rede X (antigo Twitter) em 29 de outubro do ano passado, um dia antes do segundo turno das eleições presidenciais. Ela não tem relação com a visita de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) a Nova York nesta semana, onde participa da abertura da 78ª Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU).

No mesmo ano, o ClimaInfo confirmou ao Estadão Verifica que a projeção foi feita no edifício Chrysler, no dia 28 de outubro, e durou cerca de meia hora. Disse ainda que a iniciativa partiu de “ativistas brasileiros, norte-americanos e ingleses, que entenderam a repercussão global da eleição brasileira e, como sabem que seriam afetados pelo resultado, mas não poderiam votar, quiseram dar seu recado”. O portal também informou que os responsáveis pediram para não serem identificados.

O Comprova entrou em contato com o ClimaInfo, mas não obteve resposta até a publicação desta checagem.

A peça que voltou a circular omite a data e contexto da projeção, dando a entender que a manifestação é atual. Diversos usuários publicaram comentários em apoio ao presidente e enaltecendo o reconhecimento recebido pelo petista.

Enganoso, para o Comprova, é todo conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. A publicação no TikTok obteve 131,2 mil visualizações, 13,4 mil curtidas e 4,2 mil republicações até o dia 19 de setembro. Já no X, a postagem alcançou 101,8 mil visualizações, 1 mil compartilhamentos e 2,8 mil curtidas.

Como verificamos: O primeiro passo foi buscar no Google pelas palavras-chave “the world needs Lula” e “Nova York”, que resultou em checagens das agências Reuters e Estadão Verifica, e do site Boatos.org. A partir disso, o Comprova encontrou o vídeo em uma publicação de 29 de outubro de 2022, no perfil do X do ClimaInfo. Também fez uma busca reversa no Google Lens com um frame do vídeo, o que resultou em postagens do ano passado nas redes sociais (1, 2, 3).

Por fim, entrou em contato com o ClimaInfo e com o responsável pela postagem no TikTok.

O que diz o responsável pela publicação: O Comprova enviou mensagem pelo Instagram e Facebook do usuário, mas não houve retorno até a publicação desta checagem. Também tentou contato com o perfil no X que compartilhou o vídeo, mas o usuário não permite envio de mensagens diretas.

O que podemos aprender com esta verificação: Conteúdos em vídeo, ainda que não sofram edição nas imagens, podem ter o sentido alterado dependendo do contexto em que são publicados. As personalidades políticas são frequentemente alvo dessas imagens fora de contexto nas redes sociais. Em casos assim, uma busca rápida em portais de notícias de sua confiança pode ajudar a não compartilhar informações enganosas.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: O conteúdo já foi checado pelas agências Reuters e Estadão Verifica, e pelo site Boatos.org.

Lula é alvo frequente de desinformação nas redes. Recentemente, o Comprova mostrou que doações a atingidos por enchentes no RS não foram interrompidas para aguardar o presidente ou Alckmin; que é enganoso que o Brasil fará empréstimo à Argentina enquanto o petista bloqueia recursos da saúde e educação; e que pedido de recuperação judicial da 123 Milhas não tem relação com políticas do de seu governo.

Política

Investigado por: 2023-09-15

É verídica nota fiscal com imposto de R$ 31,45 sobre produto de R$ 3,15

  • Comprovado
Comprovado
É verídica a nota fiscal que circula nas redes sociais em que uma pessoa que fez a compra de um produto importado de R$ 3,15 terá de pagar R$ 31,45 de imposto. A nota é verdadeira e consta no sistema dos Correios. Parte do valor é referente ao imposto de importação, fixado em 60% e obrigatório para empresas que não participam do programa Remessa Conforme. O cálculo é feito incluindo o valor do frete, o que, neste caso, encarece o imposto pago. O restante corresponde ao valor do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) que incide em produtos importados e varia a cada estado. Em Minas Gerais, para onde o produto foi enviado, a alíquota para importados é de 25%.

Conteúdo investigado: Publicação mostra uma nota fiscal de um produto importado e os valores de impostos de importação e de ICMS cobrados em cima do preço do produto, incluído o valor de frete, a serem pagos pelo importador. A imagem acompanha a legenda “Valor do produto R$ 3,15. Valor do imposto R$ 31,45”.

Onde foi publicado: X (antigo Twitter).

Conclusão do Comprova: Nota fiscal de produto que custou R$ 3,15 e com descrição de impostos no valor de R$ 31,45 usada em uma publicação nas redes sociais é verdadeira. Como verificado pelo Comprova no site dos Correios, o pacote está retido na Receita Federal em Curitiba. Em 1º de setembro, a encomenda foi encaminhada para fiscalização aduaneira e, sete dias depois, foi indicado que estava aguardando pagamento dos impostos. Na manhã de 15 de setembro, o pagamento do valor foi confirmado, de acordo com a plataforma de rastreio dos Correios.

O valor da compra é de R$ 3,15, correspondente a oito unidades de “paper stickers”, conhecidos no Brasil como blocos de anotação autoadesivos. Foi cobrado frete de R$ 24,60 para a entrega dos produtos, valor que é considerado na tabulação dos impostos. Isso porque a Receita Federal realiza os cálculos em cima do “valor aduaneiro”, que é a quantia do produto acrescida do frete e do custo de um possível seguro. Neste caso, por isso, o valor do imposto de importação cobrado aumenta bastante.

Conforme a legislação brasileira, encomendas entre pessoas físicas e empresas (pessoas jurídicas) que não fazem parte do programa Remessa Conforme devem, obrigatoriamente, pagar o imposto de importação de 60% em cima do valor aduaneiro. O programa entrou em vigor no dia 1ª de agosto e institui alíquota zero para remessas enviadas para pessoas físicas de valor até US$ 50, ainda que enviada por pessoas jurídicas.

Sob o produto deve incidir também o ICMS, como autoriza a legislação brasileira. Segundo a Lei Complementar n° 87, o imposto recai sob mercadoria ou bem importados do exterior, por pessoa física ou jurídica, ainda que não seja contribuinte habitual do imposto. Ele é um imposto estadual e, por isso, tem alíquota diferentes para cada estado e tipo de produto. Em Minas Gerais, para onde foram enviados os produtos, o encargo é de 25% para importações. Há a previsão de que as regras mudem na Reforma Tributária, em discussão no Congresso Nacional.

Comprovado, para o Comprova, é ato verdadeiro; evento confirmado; localização comprovada; ou conteúdo original publicado sem edição.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. A publicação no X contava com 855,3 mil visualizações, 1,5 mil republicações e 10 mil curtidas até o dia 15 de setembro.

Como verificamos: Pesquisamos o código de postagem internacional, apresentada na nota fiscal, no site de rastreamento dos Correios. No sistema, aparece que a encomenda em questão teve seu pagamento efetuado e confirmado na manhã de 15 de setembro, após ficar uma semana paralisada na Receita Federal em Curitiba e aguardando pagamento.

Ao clicar em gerar boleto, uma nova janela se abriu, de “minhas importações”. Ao pesquisar novamente pelo código internacional, encontra-se a situação atualizada da encomenda. Na opção “Visualizar DIS”, chegamos à nota fiscal apresentada no tuíte.

Pesquisamos no Google sobre informações de taxas de importação, do ICMS em Minas Gerais e do programa Remessa Conforme. Por fim, entramos em contato com a Secretaria da Fazenda do Estado e com o autor da publicação.

Como foi calculado o valor do imposto

Segundo a Receita Federal, a base de cálculo do imposto de importação é o valor aduaneiro da totalidade dos bens contidos na encomenda internacional. O valor aduaneiro corresponde ao valor dos bens, acrescido do frete e do seguro até o local de destino no país, exceto quando já estiverem incluídos.

O valor da compra, no caso da nota, foi de R$ 3,15 e foi cobrado um frete de R$ 24,60. O valor aduaneiro, portanto, foi de R$ 27,25. Em cima desse valor, foi calculado 60% referente ao imposto de importação, obrigatório para produtos vindos de outros países e para as empresas remetentes que não fazem parte do programa Remessa Conforme. O cálculo, assim como consta na nota, resulta no valor de R$16,65, que aparece como “valor do II devido”.

FluxogramaTributacao.jpg

| Como calcular o valor aduaneiro, como explica a Receita Federal. Disponível aqui

Antes da vigência do programa, 1º de agosto, todos os produtos que eram importados por pessoas físicas de pessoas jurídicas tinham que pagar o imposto independentemente do valor. A partir da data, as empresas internacionais com site no Brasil, de forma voluntária, podem se cadastrar para zerar a alíquota e isentar os consumidores da taxa gerada na fiscalização aduaneira.

Sob o produto incide também o ICMS, como autoriza a legislação brasileira. Segundo a Lei Complementar n° 87, o imposto recai com a entrada de mercadoria ou bem importados do exterior, por pessoa física ou jurídica. O fato gerador do imposto é o desembarque no país e o início da fiscalização aduaneira. A Receita Federal aponta que as importações efetuadas por meio do Regime de Tributação Simplificada (RTS) estão sujeitas ao ICMS, conforme legislação específica de cada unidade da federação, cabendo sua cobrança aos Correios (ECT) ou às empresas de entrega.

O ICMS é de competência dos Estados e do Distrito Federal, conforme previsto no art. 155, II, da Constituição de 1988, e apresenta-se como uma das principais fontes de recursos financeiros para a consecução das ações governamentais. Em Minas Gerais, vigoram também a Lei n° 6.763/1975 e o Regulamento do ICMS (RICMS) , aprovado pelo Decreto n° 43.080/2002.

Em Minas Gerais, a alíquota é de 25% para “operações de importação com mercadorias ou bens integrantes de remessa postal ou de encomenda aérea internacional”, como aponta a Tabela de Operações e Prestações Internas, disponível publicamente no site da Secretaria da Fazenda do Estado.

O Comprova refez os cálculos, simplificou abaixo e confirmou o que consta na nota:

 

Remessa Conforme mudou alíquota de importações

A partir de 1º de agosto, passou a valer o programa Remessa Conforme do governo federal. Entre os benefícios do programa, está a alíquota zero do imposto de importação no envio por pessoas jurídicas. Antes, independente do valor, era cobrada a taxa de importação. Apenas pacotes enviados entre pessoas físicas eram isentos se fossem até US$ 50. Produtos acabados pertencentes às classes de medicamentos no valor de até US$ 10 mil, ou o equivalente em outra moeda, também eram isentos.

Para isso, é necessário que os sites das empresas sejam adequados às exigências do programa. A iniciativa, que é de adesão voluntária, busca alcançar as grandes plataformas de venda digital, com envio das informações relativas às compras do comércio eletrônico transfronteiriço de forma correta e antecipada à chegada da remessa no Brasil.

Essas informações são enviadas aos Correios e às empresas de transporte habilitadas para despacho aduaneiro de remessas, que fazem o registro da declaração aduaneira relativa a esse tipo de importação. Isso dará condições para que a Receita Federal possa tratar as importações, segundo o governo, de forma antecipada e célere, facilitando o fluxo das remessas internacionais ao chegarem ao País.

O pagamento dos impostos devidos é realizado de forma antecipada, o que juntamente com as informações em conformidade com a realidade trarão condições de tais remessas serem liberadas antes mesmo de sua chegada no território nacional.

As remessas chegadas ao país continuarão passando por inspeção não invasiva para confirmação de dados e avaliação de mercadorias proibidas ou entorpecentes. Mas ao fim desse processo, como explica a Receita Federal, as remessas liberadas já poderão seguir para entrega ao destinatário e eventuais problemas nas informações ou pagamentos poderão ser corrigidos pontualmente.

Antes da mudança, a cobrança era feita durante a fiscalização, que acontece por amostragem, quando aleatoriamente, os volumes e embalagens são escolhidos pelo servidor da Receita. Os produtos que, mesmo não seguindo a legislação, não fossem parados na revista não eram cobrados. A partir do novo programa, o valor do imposto do ICMS é cobrado automaticamente na hora da compra e já deve ser embutido no preço final. Há uma cobrança fixa de ICMS, com a alíquota de 17%.

Reforma Tributária vai modificar cálculo do ICMS

A Reforma Tributária, atualmente em discussão no Congresso Nacional, unifica o ICMS e o Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS) no Imposto sobre Bens e Serviços (IBS). A Proposta de Emenda à Constituição 45/19, da Reforma Tributária, estabelece parâmetros para sua criação a fim de atingir o objetivo de simplificar o sistema tributário e evitar distorções presentes no regime atual.

O IBS terá uma única legislação válida para todo o país, não integrará sua própria base de cálculo, como é feito atualmente. Como será feito de forma “externa” do preço do produto, o IBS poderá ser identificado mais facilmente e evitará um efeito cascata da tributação.

O imposto também não será objeto de incentivos e benefícios, exceto os regimes diferenciados previstos na PEC. Cada estado e município poderá ter sua própria alíquota, mas uma alíquota de referência fixada pelo Senado será o patamar mínimo para viabilizar a transição de rateio da arrecadação até 2078. Até essa data, nenhum ente federativo poderá fixar alíquota própria em substituição se for menor que a de referência.

O que diz o responsável pela publicação: O perfil no X @sensocrtico1 não aceita o recebimento de mensagens. Ao clicar no link disponível na biografia do perfil, o usuário é direcionado para um agregador de links, em que é apresentado seu canal de YouTube. No canal, há disponível um endereço de e-mail, o qual foi contatado. O Comprova perguntou a quem pertencia a nota e quais seriam as especificidades dos produtos, mas até o momento da publicação dessa verificação, no entanto, não houve resposta.

O que podemos aprender com esta verificação: Em casos como esse, é importante ficar atento a detalhes presentes na imagem. O preço do frete nesse caso, presente na nota fiscal, foi o que elevou o valor final do imposto. A forma de calcular as taxas aparecem na imagem e podem ser reproduzidas e checadas. Além disso, tendo disponível o número de rastreio de qualquer encomenda, é possível encontrar o status daquele pedido e se ele é verídico ou não.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: Importações e exportações brasileiras costumam ser alvo de postagens contendo desinformação e já foram verificadas pelo Comprova. Recentemente, o projeto mostrou que tuíte engana ao responsabilizar o governo federal por importação de laticínios e que imposto para taxar compras em sites internacionais como Shein e Shopee existe desde 1999.

Política

Investigado por: 2023-09-15

STF não alterou lei sobre reforma agrária pondo fim à propriedade privada

  • Enganoso
Enganoso
Deputado federal distorce decisão recente do Supremo Tribunal Federal (STF) que reafirmou a necessidade do cumprimento de função social para que uma propriedade privada, mesmo que produtiva, esteja imune de ser desapropriada para fins de reforma agrária. A condição já estava prevista na legislação sobre o tema, que não foi alterada. Ao contrário do que afirma o deputado, há sim critérios definidos sobre a função social da propriedade, também previstos na legislação. A decisão do STF foi no âmbito de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), e não significa o fim da propriedade privada ou um marco do início oficial da implantação do comunismo no Brasil, como também afirma o deputado.

Conteúdo investigado: Em vídeo publicado no YouTube, o deputado federal Gustavo Gayer (PL-GO) afirma que um suposto “novo entendimento” do STF põe fim à propriedade privada no Brasil. Ele afirma que a Justiça passará a exigir a função social das propriedades rurais e que, “é algo que não há definição”. “É pela compreensão e entendimento deles que vai determinar se a sua propriedade pode ser desapropriada ou não. Preste bastante atenção. Se você mora numa chácara, se você tem uma casa e o STF decidir que a sua casa, a sua chácara não cumpre função social, o governo agora, o Estado brasileiro poderá tomar de você essa propriedade”, afirmou.

Onde foi publicado: YouTube, Instagram e Twitter.

Conclusão do Comprova: O Supremo Tribunal Federal (STF) não decretou o fim da propriedade privada no Brasil a partir de um “novo entendimento” da corte sobre terras que podem ser desapropriadas para a reforma agrária. Diferentemente do que Gayer afirma em um vídeo, a legislação já exige que a propriedade seja, ao mesmo tempo, produtiva e tenha função social para que não seja passível de desapropriação.

O voto do ministro da Corte Edson Fachin na ADI 3865, que foi seguido por unanimidade em sessão plenária virtual em 1º de setembro deste ano, só reforçou o que já consta tanto no texto constitucional quanto na legislação que regulamenta a desapropriação de terras para fins de reforma agrária. Ou seja, não houve mudança na lei nem no entendimento dela que permita a desapropriação indiscriminada de terras rurais por parte do governo.

O deputado também desinforma ao afirmar que não há definição de “função social”, o que, segundo ele, poderia servir como brecha para que “o governo tome a sua propriedade”. A função social da propriedade rural está descrita no artigo 9º da Lei 8.629/93.

O direito à propriedade é uma cláusula pétrea da Constituição Federal brasileira de 1988, ou seja, não pode ser alterado por decisão judicial, decreto presidencial ou via Proposta de Emenda à Constituição (PEC).

No artigo 5º, a Constituição estabelece que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade”.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Como verificamos: Buscamos o vídeo original e fizemos a transcrição dos momentos em que o deputado falava a respeito da decisão do STF. Em seguida, buscamos no site da Corte a notícia da votação do dia 1º de setembro e a íntegra do voto do ministro Fachin. Consultamos os advogados Juliana Maria Raffo e Marcelo Guaritá, que têm conhecimento no tema, e demandamos o STF, que enviou o acórdão completo do julgamento. Por fim, fizemos contato com o deputado Gustavo Gayer.

Decisão é sobre ADI movida em 2007

A Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) alvo da decisão de setembro do STF foi movida pela Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) em 2007. A CNA pedia alterações na redação dos artigos 6º e 9º da Lei 8.629/93, alegando que alguns trechos iam contra a Constituição Federal.

Para o advogado da confederação, a redação dos dispositivos era conflitante. “Admitir que a propriedade produtiva pode ser desapropriada, se não cumprir sua função social, é dar-lhe tratamento idêntico ao dispensado às propriedades improdutivas, tornando letra morta o inciso II do artigo 185”.

É incontestável, para a confederação, a impossibilidade de exigência simultânea dos dois requisitos, “seja para a conceituação da propriedade produtiva, seja para a caracterização da função social”.

O ministro Fachin indeferiu, ou seja, negou o pedido, mantendo a redação atual. A decisão dele foi seguida unanimemente pelos demais membros do STF.

STF não alterou lei a partir de um ‘novo entendimento’

A decisão do STF não produziu novo entendimento que alterasse a legislação referente à desapropriação de terras para fins de reforma agrária. Tanto a Constituição Federal de 1988, ao tratar do tema nos artigos 184, 185 e 186, quanto a Lei 8.629/93, que regulamentou esses dispositivos, já preveem a necessidade do cumprimento da função social para que uma propriedade, mesmo que produtiva, seja imune da possibilidade de desapropriação.

Na Constituição Federal, a previsão legal está expressa no artigo 184, que diz: “Compete à União desapropriar por interesse social, para fins de reforma agrária, o imóvel rural que não esteja cumprindo sua função social”. Nos artigos seguintes, 185 e 186, consta a necessidade de lei complementar para regulamentar os critérios de função social, como se destaca abaixo:

  • Artigo 185 – Parágrafo único. A lei garantirá tratamento especial à propriedade produtiva e fixará normas para o cumprimento dos requisitos relativos a sua função social.
  • Artigo 186 – A função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei.

Critérios de função social de uma propriedade são definidos

Diferentemente do que é afirmado no vídeo, há sim critérios que definem a função social de uma propriedade. Eles foram estabelecidos na Lei 8.629/93, que regulamentou os dispositivos da Constituição Federal relativos à reforma agrária. No artigo 2º, é dito que “a propriedade rural que não cumprir a função social prevista no art. 9º é passível de desapropriação, nos termos desta lei, respeitados os dispositivos constitucionais”.

O artigo 9º, por sua vez, define os critérios da função social:

I – aproveitamento racional e adequado;

II – utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente;

III – observância das disposições que regulam as relações de trabalho;

IV – exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores.

Em seguida, no texto, são listados os detalhamentos de cada um dos quatro critérios definidos.

Consultada pelo Comprova, a advogada Juliana Maria Raffo, coordenadora da área Cível e de Contratos do Briganti Advogados, confirma o entendimento de que tanto a Constituição Federal de 1988 quanto a Lei 8.629/93 preveem a necessidade de cumprimento da função social da propriedade como critério para que ela esteja imune à desapropriação para fins de reforma agrária.

“Os artigos da Constituição e a Lei da Reforma Agrária [8.629/93] trazem a possibilidade de desapropriação de imóveis que não cumpram a função social”, diz a advogada, acrescentando que “o comumente identificado em uma propriedade produtiva é o atendimento à função social”.

No entanto, há casos em que uma propriedade mesmo que produtiva possa ser desapropriada se não cumprir a função social.

“Por exemplo, uma terra produtiva que usa mão de obra análoga à escrava, que pratica desmatamento ilegal ou o uso ilegal e indiscriminado de recursos naturais disponíveis em sua área não atendem a uma finalidade social. Sendo assim, podem sofrer o pedido de desapropriação. A avaliação se dará no respectivo processo, pois o pedido de desapropriação, nesses casos, deveria indicar e provar que a produção ali existente não atende aos requisitos de função social, especialmente nos aspectos trabalhistas e ambientais”.

Discussão se dará no âmbito de cada processo

O advogado Marcelo Guaritá, membro do Comitê de Leis e Regulamentos da Sociedade Rural Brasileira (SRB), também confirma que a legislação nunca garantiu que o critério da terra ser produtiva por si só fosse garantia de que a propriedade não fosse passível de desapropriação. No entanto, ele afirma que “havia uma crença que isso seria sufiente”.

“O STF agora explicitou que não”, diz o advogado, sócio do escritório PSG Advogados. Assim como a advogada Juliana Maria Raffo, ele concorda que a discussão se dará no âmbito de cada processo.

“O STF fez uma interpretação conjunta dos dois artigos (185 e 186 da Constituição Federal). O problema é a abertura existente sobre os critérios para que se cumpra os requisitos. Qualquer infração, por menor que seja, pode ensejar desapropriação de uma propriedade produtiva? Um descuido sobre as inúmeras normas ambientais e trabalhistas que existem pode levar a esse desfecho? Esse é um risco que atenta contra a segurança jurídica”, avalia o advogado, que acrescenta que esse risco sempre existiu.

Pequenas e médias propriedades não podem ser desapropriadas

No voto, o ministro Fachin apontou que a obrigatoriedade de ser produtiva e ter função social não vale para as pequenas e médias propriedades. A Constituição diz expressamente que elas não podem ser desapropriadas para fins de reforma agrária, contanto que aquela seja a única terra do proprietário.

“Registre-se que essa condicionalidade não é prevista para o caso da pequena e média propriedade rural, ante a expressa linha de precedentes desta Corte, ainda que, pessoalmente, guarde reservas em relação a ela. Na esteira dessa compreensão pretoriana, porque não se pode interpretar um direito restritivamente sem que haja uma finalidade constitucionalmente admitida, não parece possível admitir a desapropriação da pequena e média propriedade rural”, escreveu o ministro.

O que diz o responsável pela publicação: O Comprova entrou em contato com o deputado Gustavo Gayer, mas não obteve resposta até a publicação desta checagem. O espaço segue aberto à manifestação.

O que podemos aprender com esta verificação: Fazendo alegações enganosas a partir de frases de impacto como a de que “O STF acabou com a propriedade privada”, o desinformador, além de gerar uma interpretação errada sobre um fato concreto, provoca medo no leitor. A desinformação é agravada pelo fato de que decisões judiciais muitas vezes são escritas de maneira pouco acessível à população. Assim, o desinformador, ao comentá-las, pode transmitir uma versão distorcida dos fatos.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: O Comprova já analisou outros conteúdos sobre o tema, em checagens como Lula não assinou decreto para colocar à propriedade privada, Ministro Edson Fachin não foi advogado do MST, ao contrário do que afirma o post e post confunde dados e engana sobre conflitos no campo no governo Bolsonaro.

Política

Investigado por: 2023-09-15

Doações a atingidos por enchentes no RS não foram interrompidas para aguardar Lula ou Alckmin

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Falso
É falso que a entrega de doações em Lajeado, no Rio Grande do Sul, tenha sido paralisada para esperar a chegada do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ou do vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB). A alegação feita em vídeo por uma mulher que se identifica como voluntária e presidente de uma ONG não foi corroborada por nenhum órgão envolvido na distribuição e arrecadação das doações, nem por outros voluntários que trabalham na cidade. Não há evidências de que a entrega dos donativos tenha sido interrompida em algum momento. A comitiva do governo federal que visitou a região sequer passou por centros de doações.

Conteúdo investigado: Vídeo em que mulher afirma que o centro de distribuição de doações de Lajeado (RS) deu ordens de segurar doações para a população para aguardar a chegada do presidente Lula para fazer fotos e vídeos. Posteriormente, a mulher gravou e divulgou um segundo vídeo, dizendo que confundiu Lula com Alckmin, mas sustentou a acusação anterior, de que as doações foram paralisadas, aguardando o presidente em exercício.

Onde foi publicado: X (antigo Twitter), Telegram e WhatsApp.

Conclusão do Comprova: É falso o conteúdo do vídeo em que uma mulher, que se apresenta como presidente de uma ONG de proteção animal, alega não ter conseguido retirar doações aos atingidos pela enchente em Lajeado, no Rio Grande do Sul, porque os mantimentos estavam retidos até a chegada do presidente Lula ou do vice-presidente Geraldo Alckmin. A Prefeitura de Lajeado, a Defesa Civil do Rio Grande do Sul e o governo federal negam a acusação.

Em nota, a prefeitura informou que não houve suspensão de entrega de doações e classificou as informações do vídeo como “inverídicas”. De acordo com o tenente-coronel Daniel Silva, chefe da Divisão de Assistência às Comunidades Atingidas da Defesa Civil, as bases de doações do estado montadas em Lajeado não realizam entregas diretamente a voluntários ou vítimas da enchente. Os mantimentos são repassados às prefeituras, que então realizam a distribuição aos que necessitam.

Ao Comprova, a assessoria de Alckmin informou que, durante sua passagem pelo Rio Grande do Sul, o então presidente em exercício sequer esteve em algum dos pontos de distribuição de doações e visitou outros locais.

O Comprova buscou voluntários que trabalharam nos centros de distribuição no dia em que o vídeo foi gravado e nenhum deles corroborou a versão apresentada pela mulher. O Comprova também entrou em contato com um veículo jornalístico local, o Grupo A Hora, e, segundo a jornalista Júlia Amaral, o jornal da cidade não recebeu nenhuma denúncia igual ou similar à do vídeo.

A Unidos Pelos Animais (UPA), ONG do município gaúcho de Sarandi, comunicou o afastamento da autora do vídeo da função de presidente, por iniciativa própria. Ainda segundo a ONG, o vídeo contém somente a opinião da, agora, ex-presidente da instituição. Nenhuma das outras voluntárias estava presente em Lajeado no dia da gravação do vídeo, “tampouco tiveram oportunidade de deliberação sobre o seu conteúdo antes de ser publicado nas redes sociais”.

Em seu Instagram, o ministro-chefe da Secretaria de Comunicação Social, Paulo Pimenta, chamou o vídeo de “fake” e afirmou que buscará a responsabilização pela divulgação do conteúdo. “Isso é crime! Isso é uma conduta de pessoas sem escrúpulos que se aproveitam de uma tragédia para tentar construir uma narrativa criminosa, falta, típica dessa conduta que o Brasil não suporta mais”, disse o ministro.

O ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, informou pelo X, já ter acionado a Polícia Federal para investigar os fatos. “Reitero que fake news é crime, não é ‘piada’ ou instrumento legítimo de luta política”, afirmou Dino.

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma falsidade.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. No X, até 14 de setembro, foram 101 mil visualizações, 1,7 mil retuítes e 3,3 mil curtidas. No Telegram, foram 6,7 mil visualizações até a mesma data.

Como verificamos: O Comprova tentou contato por telefone, WhatsApp e e-mail com a mulher que aparece na gravação. Também procurou a ONG Unidos Pelos Animais de Sarandi.

Em seguida, buscou esclarecimentos junto à Prefeitura de Lajeado, à Defesa Civil do Rio Grande do Sul e ao governo federal.

Por fim, entrevistou cinco voluntários que atuavam na cidade, a coordenadora do centro de distribuição de Lajeado, Bárbara Ecke, o tenente-coronel Daniel Silva, chefe da Divisão de Assistência às Comunidades Atingidas da Defesa Civil, além da jornalista Júlia Amaral, do Grupo A Hora.

O vídeo

A mulher que aparece no vídeo investigado é Samara Luzia Baum. Ela se apresenta como presidente da ONG Unidos Pelos Animaisde Sarandi, município da região norte do Rio Grande do Sul. Na gravação, ela alega que está em Lajeado para prestar apoio às ONGs do Vale do Taquari, recolhendo donativos trazidos para a região.

“Chegamos agora no centro de distribuição de Lajeado e recebemos a informação de que não vai ser liberado alimentos para ser feita a doação, esse trabalho que os voluntários estão fazendo. Eles têm que aguardar o presidente Lula chegar em Lajeado para fazer foto e vídeo e publicação em cima das doações”, afirma a mulher.

Em seguida, ela pede que as pessoas compartilhem a gravação. “Que seja divulgada aí para o pessoal, para a gente ver como funcionam as coisas. As pessoas passando fome, passando necessidade, e estão esperando vim fazer politicagem em cima da tragédia alheia. Então só para repassar a informação para vocês.”

O vídeo viralizou. Após reação da prefeitura e do governo federal, Samara divulgou outro vídeo, em que diz ter se confundido ao citar Lula e que, na verdade, estaria se referindo ao então presidente em exercício Geraldo Alckmin. “Me expressei errado pela raiva.”

Apesar de admitir a confusão com os nomes, sustentou que esteve no centro em Lajeado e que “não conseguiu distribuição de ração”. Ainda assim, ressaltou ter repassado o vídeo somente ao grupo da ONG e acrescentou que “não era para ter vazado”. “Eu gravei na raiva e disse para as gurias: ‘Esperem, deixem eu buscar mais informações'”, afirma na segunda gravação. “Não era para ter sido postado.”

O Comprova não conseguiu contato com a mulher para esclarecer em qual endereço ela teria recebido tal negativa, a que horas e por parte de quem.

A distribuição das doações em Lajeado

O centro de distribuição de doações de Lajeado foi montado no Parque do Imigrante e é coordenado pela prefeitura da cidade do Vale do Taquari. Ao Comprova, a assessoria de imprensa do município detalhou como o espaço está organizado. As doações concentradas no Parque do Imigrante são destinadas apenas a moradores da cidade vítimas da enchente.

A entrega das doações aos atingidos é centralizada em um dos pavilhões do parque e, conforme a prefeitura, para retirar os itens necessários “pessoas afetadas pela enchente devem se cadastrar na Assistência Social”. Há um ponto de atendimento no próprio local.

| Foto: Laura Mallmann / Prefeitura de Lajeado

No ato do cadastro, a pessoa que representa a família atingida informa de quais itens precisa e, em seguida, é encaminhada a outro pavilhão, onde é recebida por um servidor, que a acompanha na retirada das doações. “Além disso, equipes da prefeitura transitam por locais atingidos e oferecem itens de necessidade básica para auxiliar na volta para casa”, diz nota enviada pela prefeitura ao Comprova.

Coordenadora do espaço, Bárbara Ecke explica que os voluntários de outras cidades que procuram o centro para retirar mantimentos e levar a uma família atingida, por exemplo, precisam passar algumas informações básicas para controle da prefeitura sobre a destinação das doações, como o endereço da família vítima da cheia e o número de moradores da casa.

“A gente com certeza não nega ajuda. A gente só busca essas informações justamente para não ter esse problema de ter a mesma família sendo ajudada várias vezes e deixando desassistidas, muitas vezes, outras”, explica.

Além do centro organizado pelo município, existem ainda dois pontos em Lajeado que concentram doações. Estes são de responsabilidade do governo estadual e não atendem particulares. As doações ali agrupadas são destinadas exclusivamente às prefeituras para que os governos municipais repassem esses mantimentos aos necessitados. Os portões dessas duas bases montadas na cidade permanecem fechados à comunidade, pois não são pontos de distribuição de doações às vítimas.

A visita de Alckmin ao Rio Grande do Sul

No fim de semana seguinte às enchentes, Alckmin visitou as cidades mais atingidas no Vale do Taquari, mas não esteve em nenhum desses endereços de centros de doações. Ele desembarcou em Canoas, na Região Metropolitana de Porto Alegre, na manhã de domingo, 10 de setembro.

Conforme sua assessoria, de lá, ele seguiu até a Universidade do Vale do Taquari (Univates), em Lajeado, onde chegou por volta das 9h20 acompanhado de uma comitiva de ministros. O local serviu de ponto de encontro da comitiva com as demais autoridades que já estavam no Rio Grande do Sul.

O grupo então partiu para Roca Sales, onde Alckmin visitou o hospital de campanha e percorreu os locais mais afetados pelas chuvas. Na sequência, o presidente em exercício esteve em Muçum para, já no fim da manhã, voltar à Univates, em Lajeado, onde participou de reuniões com empresários locais e prefeitos, além de conceder entrevistas a jornalistas. Os compromissos se encerraram por volta das 15 horas, quando a comitiva retornou a Brasília.

Ao Comprova, a assessoria de imprensa de Alckmin ressaltou que o vice-presidente não visitou qualquer centro de distribuição de doações no estado. Lula tampouco. No dia da visita, ele estava na Índia para participar da 18ª edição da cúpula de chefes de Estado e governo do G20. O encontro ocorreu nos dias 9 e 10 de setembro em Nova Délhi, capital indiana.

Prefeitura e Defesa Civil estadual negam interrupção ou desassistência

Em nota divulgada nas redes sociais, a administração municipal desmentiu a alegação feita pela mulher. “A Prefeitura de Lajeado informa que não houve suspensão de entrega de doações, conforme informações inverídicas que circularam em vídeo. As doações continuam sendo recebidas e entregues a quem está cadastrado.”

O prefeito de Lajeado, Marcelo Caumo (PP), também negou o boato em publicação no Instagram. “Não recebemos nenhuma orientação de nenhum governo, nem tampouco cumpriríamos tal absurda determinação se viesse.”

O Comprova conseguiu o contato de cinco voluntários que ajudavam no centro de distribuição da prefeitura no dia em que o vídeo foi divulgado. Todos negaram ter testemunhado qualquer tipo de interrupção na distribuição das doações.

“Por mim não passou essa situação ou algo similar”, afirmou o voluntário Jean Carlos Schneider, que trabalhou no Parque do Imigrante no fim de semana.

Procurada pelo Comprova, a jornalista Júlia Amaral, do Grupo A Hora, de Lajeado, disse que o jornal também não soube de outros voluntários que tenham denunciado essa suposta retenção de doações. Segundo ela, ninguém procurou o jornal para fazer a mesma denúncia ou similar.

Em relação às bases de responsabilidade do governo estadual montadas na cidade, a assessoria de imprensa da Defesa Civil do RS esclareceu que o fluxo de destinação das doações recebidas passa, necessariamente, pelas prefeituras.

“As defesas civis dos municípios e as secretarias de assistência social dos municípios atingidos estão fazendo essa triagem. Então, toda e qualquer pessoa que precise de algum item deve procurar a assistência social do seu município, que está fazendo esse cadastro e centralizando as demandas.”

Responsável pelas bases de Lajeado, o tenente-coronel Daniel Silva, chefe da Divisão de Assistência às Comunidades Atingidas da Defesa Civil, reforça que ninguém pode retirar doações nesses endereços além das prefeituras. “Ninguém retira, a gente leva, de regra, ou a prefeitura pode vir, mas tem toda uma comunicação via Defesa Civil”, esclarece.

Sobre o vídeo, especificamente, ele acrescenta que a região tem recebido cestas de alimentos enviadas pelo governo federal aos atingidos pelas enchentes, via Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), mas que Alckmin e a comitiva de ministros não passaram pelos centros de doações. “Não entrou nem na agenda do presidente eles irem até lá tirar foto, isso aí não aconteceu”, afirma.

A Secretaria de Comunicação (Secom) da Presidência divulgou nota, ressaltando que “a gestão das doações é realizada pelos próprios municípios e pelo governo estadual, sem interferência alguma do governo federal”.

ONG divulga nota sobre afastamento da presidente

No dia 12 de setembro, a ONG UPA – Unidos Pelos Animais, da qual Samara Baum era presidente, divulgou uma nota referente à repercussão do vídeo pelo seu Instagram. De acordo com a organização, Samara solicitou seu desligamento do cargo de presidente e responsável técnica veterinária de um dos projetos da ONG.

Ainda segundo a nota, o vídeo contém somente a opinião da, agora, ex-presidente da instituição, visto que nenhuma das outras voluntárias estava presente em Lajeado no dia da gravação do vídeo, “tampouco tiveram oportunidade de deliberação sobre o seu conteúdo antes de ser publicado nas redes sociais”.

Ademais, a nota afirma que todas as doações recebidas em Sarandi foram “devidamente encaminhadas para a região atingida pelas enchentes e distribuídas aos necessitados”.

O que diz o responsável pela publicação: O Comprova tentou contato com Samara Baum por ligação telefônica e por mensagem no WhatsApp, mas não obteve retorno. Após a viralização do vídeo, a médica veterinária privou seus perfis nas redes sociais, impedindo envio de mensagem por parte de pessoas que não são suas seguidoras.

O que podemos aprender com esta verificação: A autora do vídeo utiliza um tom alarmante associado a uma denúncia grave sobre um tema sensível, porém sem apresentar detalhes, como o nome do centro de distribuição onde isso teria ocorrido ou quem teria informado que as doações não estavam sendo distribuídas, nem outras provas que corroborem a denúncia. É importante estar atento a esses sinais como indícios da propagação de desinformação e utilizar canais oficiais para tirar as dúvidas sobre o assunto ou consultar veículos de comunicação de sua confiança.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: O mesmo vídeo foi verificado por outras agências de checagem (Estadão Verifica, UOL Confere, Aos Fatos, Lupa e Fato ou Fake).

Recentemente, o Comprova checou outra peça de desinformação envolvendo as enchentes no Vale do Taquari. Mostrou que barragens na região não têm comportas que poderiam controlar o fluxo de água e que cheia foi causada por ciclone.