O Projeto Comprova é uma iniciativa colaborativa e sem fins lucrativos liderada pela Abraji e que reúne jornalistas de 42 veículos de comunicação brasileiros para descobrir, investigar e desmascarar conteúdos suspeitos sobre políticas públicas, eleições, saúde e mudanças climáticas que foram compartilhados nas redes sociais ou por aplicativos de mensagens.
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Política

Investigado por: 2019-10-10

Dos países com mais de 200 milhões de habitantes, Brasil é único com sistema universal de saúde

  • Evidência comprovada
Evidência comprovada
SUS prevê o atendimento a toda a população gratuitamente. Entre os países com sistemas similares, nenhum tem população tão grande. O Comprova analisou individualmente os países com mais de 200 milhões de habitantes.

 

Postagem publicada no Twitter pede a defesa do Sistema Único de Saúde (SUS) e afirma que o SUS é o único sistema público de saúde que “atende a uma população com mais de 200 milhões de pessoas” e que “fornece remédios de graça” – algo que, segundo a postagem, nem o equivalente britânico, o Serviço Nacional de Saúde do Reino Unido (NHS, na sigla em inglês), supostamente faria.

De fato, todo e qualquer brasileiro tem o direito de ser atendido gratuitamente pelo SUS, algo definido na Constituição e na lei 8.080, de 1990. Também é verdade que o SUS fornece remédios gratuitamente. Hoje a população brasileira é de 210,5 milhões.

A publicação, no entanto, comete um erro ao dizer que o NHS não fornece medicação “totalmente de graça”. O sistema britânico oferece remédios gratuitos para uma lista de doenças e para alguns grupos, como idosos, jovens de até 16 anos, populações pobres ou com doenças graves.

O Ministério da Saúde, contatado pelo Comprova, destacou que “o Brasil é o único país do mundo com mais de 100 milhões de habitantes que conta com um sistema público (financiado pelo dinheiro dos impostos), universal (para todos) e gratuito para toda a população”.

Há vários sistemas de saúde no mundo. Em alguns países, o sistema é público, mas, diferentemente do Brasil, a gratuidade cobre apenas parte da população e o atendimento a que as pessoas têm direito pode variar.

Dos países reconhecidos por possuírem sistema de saúde público e universal, como Reino Unido, Canadá, Dinamarca, Suécia, Espanha, Portugal e Cuba, nenhum tem população superior a 100 milhões de habitantes. O mais populoso é o Reino Unido, com cerca de 66,4 milhões de pessoas.

O Comprova só analisou individualmente os sistemas de saúde dos países com mais de 200 milhões, número citado pela postagem. De fato, nenhum deles possui um sistema público de saúde universal, como o SUS. Foram pesquisados China, Índia, EUA, Indonésia, Paquistão e Nigéria.

Esta verificação do Comprova analisou uma publicação do perfil @Adrieli_S do Twitter.

Para o Comprova, uma evidência é comprovada quando não restar nenhuma dúvida sobre a sua veracidade.

Como verificamos

Na verificação foram consultados o Ministério da Saúde, o Serviço Nacional de Saúde do Reino Unido (NHS, na sigla em inglês) e estudos sobre o SUS.

O Comprova também entrevistou Oswaldo Yoshimi Tanaka, diretor da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP); Alcides Miranda, médico especialista em saúde comunitária e professor de Saúde Coletiva na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS); e Ivo Lima, mestre em Saúde Pública pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).

Além disso, por meio de sites dos governos nacionais e relatórios de organizações internacionais, analisamos como funciona o sistema de saúde em cada um dos outros países com mais de 200 milhões de habitantes

Você pode refazer o caminho da verificação do Comprova usando os links para consultar as fontes originais.

Quem tem direito ao SUS?

A Constituição Federal brasileira define que todo brasileiro tem direito a ter acesso à saúde via SUS. A frase “a saúde é direito de todos e dever do Estado” define a ideia. Qualquer pessoa pode ir a uma unidade básica de saúde ou a um hospital e receber atendimento de graça. O SUS não é apenas atendimento médico, mas também vigilância em saúde e fornecimento de medicamentos.

Beneficiários de planos de saúde também têm direito a atendimento pelo SUS – nesse caso, no entanto, as operadoras dos planos privados são obrigadas pela lei a ressarcir os cofres públicos pelos serviços prestados que tenham cobertura do plano.

O que mais o SUS faz?

Há, também, outros serviços que beneficiam a toda população, como atendimento de emergência por acidentes por meio do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu); regulação de hemocentros assim como transplante de órgãos.

Além disso, o SUS financia pesquisas epidemiológicas, importantes para ajudar o governo a avaliar o risco de ocorrência de surtos ou epidemias e também trazer dados para o controle e prevenção de doenças. E, por meio da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), fiscaliza a qualidade de alimentos em restaurantes e supermercados.

Vacinas exigidas para bebês também são oferecidas pelo SUS, por meio do Programa Nacional de Imunização, que oferece todas as proteções recomendadas pela Organização Mundial da Saúde (OMS). A estratégia é reconhecida mundialmente como um sucesso na vacinação infantil.

O SUS fornece remédios de graça? Quais?

Sim. Entre as doenças cujos medicamentos são fornecidos gratuitamente pelo SUS estão diabetes, pressão alta, asma, HIV e alzheimer. A lista de drogas fornecidas é atualizada anualmente e se chama Relação Nacional de Medicamentos Essenciais (Rename). O Ministério da Saúde informou ao Comprova que, na última década, o número de remédios incluídos na lista aumentou em 54%: passou de 574 drogas em 2010 para as atuais 885.

Quem precisa de um remédio que está na lista, mas não é oferecido pelo posto de saúde, ou que não está na lista, pode processar o governo (judicializar) para obrigá-lo a pagar o tratamento. Em geral, pacientes ganham a ação se provam à Justiça que correm risco de vida caso fiquem sem o remédio solicitado.

Como era a saúde no Brasil antes do SUS?

Antes de o SUS ser regulamentado em 1990, só eram atendidas as pessoas que tinham carteira assinada, contribuíam para a Previdência e, portanto, faziam parte do Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social (Inamps).

Quem não tinha carteira assinada podia apenas participar de programas específicos do Ministério da Saúde ou das secretarias de Saúde estaduais ou municipais (como vacinação ou combate a alguma doença específica). Caso contrário, era preciso pagar plano privado ou buscar atendimento em instituições filantrópicas, como as Santas Casas de Misericórdia.

A criação do SUS aconteceu no contexto do fim da ditadura militar e diante de denúncias sobre a medicina previdenciária, como os seus custos. O sistema brasileiro foi inspirado no britânico, o NHS (National Health Service), que havia sido implantado 40 anos antes, após o fim da Segunda Guerra.

O NHS é pioneiro no modelo beveridgiano de serviço nacional de saúde, que entende a saúde como uma forma de cidadania. Outros modelos na Europa também se baseiam na ideia do NHS de fornecer cobertura integral para todos os cidadãos, como o de Portugal, criado em 1974, o da Itália, de 1978, e o da Espanha, de 1986.

Uma diferença entre esses sistemas e o SUS é que, no Brasil, apesar de o Estado ser obrigado a dar assistência de saúde gratuita à população, o governo, proporcionalmente, investe menos na área do que outros países.

De acordo com um relatório do Banco Mundial de 2017, mais da metade dos gastos totais com saúde no Brasil são financiados privadamente (individualmente e planos de saúde privados). No país, a despesa pública com saúde representa 48,2% do total, enquanto a média entre os integrantes da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) é de 73,4%. Já entre nações com condições econômicas semelhantes, o Brasil está acima apenas da média entre os países do BRICS (Brasil, Rússia, China, Índia e África do Sul), 46,5%.

Como afirma Alcides Miranda, médico especialista em saúde comunitária e professor de Saúde Coletiva na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), os demais países com sistemas de saúde universais como o SUS investem um valor, em relação ao PIB, bem maior do que o brasileiro. “Temos mais população e financiamento público que chega a um terço de outros países na saúde. Mas, mesmo com essas dificuldades, o SUS tem cumprido uma função de priorizar os mais vulneráveis e os mais expostos a riscos.”

O SUS britânico fornece remédios de graça?

A publicação que verificamos erra ao dizer que o NHS não fornece medicação “totalmente de graça”. O sistema britânico é financiado por impostos e fornece medicamentos de graça para doenças crônicas (como diabetes) e para alguns grupos populacionais, como idosos, menores de 16 anos, grávidas e pessoas beneficiadas por programas assistencialistas.

Para o resto da população, há uma taxa de até 9 libras (cerca de R$ 45) para medicações receitadas por médicos do NHS, pois os remédios são subsidiados pelo governo. Quando está internado, o paciente não paga pelo remédio. Remédios para câncer e infecções sexualmente transmissíveis (IST) não têm impostos.

“O NHS tem regras mais restritas sobre o que é ou não oferecido. O SUS, pela Constituição brasileira, deve oferecer tudo. Está escrito: ‘A saúde é um direito do cidadão e um dever do Estado’. Temos uma relação de medicamentos obrigatoriamente fornecidos, como para diabetes ou pressão alta. Se o remédio não estiver na lista, a pessoa pode judicializar [entrar com processo] e ganhar”, explica Oswaldo Yoshimi Tanaka, diretor da faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP).

O atendimento primário (em postos de saúde) é de graça e cobre praticamente toda a população britânica – o SUS, por outro lado, cobria cerca de 40% dos brasileiros até 2012. O NHS ainda oferece ambulâncias de graça, internações e assistência social para doenças mentais e tratamento dentário de graça para alguns grupos. Em alguns casos, oferece desconto, assim como o SUS, para que o indivíduo pague o resto.

Como é em outros países com mais de 200 milhões de habitantes?

Nenhum dos outros países com mais de 200 milhões de habitantes no mundo tem um sistema de saúde com atendimento integral para todos os cidadãos.

De acordo com Ivo Lima, mestre em Saúde Pública pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), países em desenvolvimento têm adotado como alternativa a adoção de sistemas baseados em seguros para ampliar a cobertura em vez da criação de um sistema universal. “Há a cobertura por um seguro, mas é básico. Há uma desigualdade relevante, porque pessoas mais pobres estão mais submetidas ao risco de adoecer, mas são as que menos têm acesso ao serviço de saúde”, afirmou. “É diferente do seguro nacional alemão (onde a cobertura está ligada ao emprego). Lá, não tem diferenças no acesso ao serviço de saúde”.

Saiba qual é o modelo em cada um dos outros países com mais de 200 milhões de habitantes:

  • China

Na China, o sistema público de saúde não é gratuito. Existem os seguros de saúde públicos e os privados. O seguro público é financiado em conjunto por empregados, empregadores e pelo governo. A depender se a região é urbana ou rural, mais ou menos desenvolvida, variam também as porcentagens de subsídio pelo Estado. Além de ajudar a financiar o seguro de saúde em si, os pacientes têm que pagar taxas pelos atendimentos e medicações prescritas, e parte desses gastos pode ser reembolsada posteriormente. Estimativas mostram que, em 2011, a parcela da população coberta por seguro de saúde público passava dos 95%. O sistema de saúde chinês era universal e gratuito até a década de 80. A partir daí, ele sofreu diversas reformas.

  • Índia

O acesso à saúde é um direito constitucional na Índia. Apesar disso, não há um sistema para atendimento universal como o SUS e, segundo a Newsweek, em 2018, 70% dos custos com saúde eram pagos pelos pacientes e essa foi a causa de quase 7% da população estar abaixo da linha da pobreza. Naquele ano, foi implantado o Modicare (em referência ao primeiro-ministro Narendra Modi), um programa que oferece cobertura de até 500 mil rúpias anuais por família (R$ 28,6 mil, na conversão do dia 7 de outubro) para tratamento hospitalar para moradores pobres de áreas rurais e urbanas (neste caso, usando como pré-requisito a ocupação e incluindo empregados domésticos e trabalhadores da área de construção, por exemplo). Quatro anos antes, havia sido criado o National Health Mission, que coordenou iniciativas como o combate à pólio.

  • Estados Unidos

Não há sistema universal de saúde – é necessário pagar para ter atendimento ou remédios. Em hospitais, o paciente pode não ser atendido se não tiver plano de saúde (é o caso de 10% dos norte-americanos, o equivalente a 30,4 milhões de pessoas). O governo subsidia planos de saúde para alguns grupos específicos, como idosos ou pessoas de baixa renda – no entanto, mesmo para eles o atendimento e os remédios não são de graça. Estudo publicado em março no American Journal of Public Health aponta que, dos pedidos de falência feitos nos EUA entre 2013 e 2016, 66,5% estavam ligados a dívidas de saúde.

  • Indonésia |

Existe um programa de saúde pública criado em 2014, o JKN, com o objetivo de reduzir as dificuldades de acesso a serviços básicos pela população. O atendimento é feito por meio de seguros oferecidos pelo governo, com cobertura e preço que variam a depender do indivíduo – quem tem emprego formal, por exemplo, pode ter um seguro, parecido com o funcionamento do Inamps no Brasil, antes da criação do SUS. Em alguns casos, o seguro é de graça, como para populações vulneráveis. Vacinas básicas gratuitas são oferecidas para bebês, crianças em idade escolar e para meninas jovens, por exemplo. O atendimento em unidades básicas de saúde tem custo mais acessível, enquanto serviços mais complexos são bastante caros, segundo o Ministério das Relações Exteriores do Brasil.

  • Paquistão

De acordo com relatório de 2015 do Escritório Europeu de Apoio ao Asilo (Easo) da União Europeia, o sistema de saúde do Paquistão é fortemente privado. O relatório afirma que à época, mais de 65% da população rural não tinha acesso a instalações básicas de saúde ou serviços de qualidade. Segundo texto de 2018 do jornal Dawn, um dos mais prestigiosos do país, cerca de 51% da população paquistanesa não tem acesso a serviços básicos de saúde. O sistema de saúde público é descentralizado, o que significa que ele pode variar entre as diferentes regiões do país. Em 2015, o primeiro-ministro do país lançou um programa nacional de seguro de saúde (PMNHIP) voltado a famílias vivendo abaixo da linha de pobreza, e que atualmente atinge cerca de 4,7 milhões de pessoas, de 77 distritos diferentes (o país tem mais de 150 distritos). O programa consiste em fornecer cupons de saúde de valor fixo, para cobrir serviços emergenciais e de maternidade, por exemplo. Há também um segundo vale com valor maior para sete doenças consideradas de tratamento prioritário, como diabetes, câncer e HIV.

  • Nigéria

O país tem o National Health Insurance Scheme (NHIS), que é um órgão criado pelo governo federal em 1999. Ele funciona como um plano pré-pago: paga-se um valor regular fixo e os fundos dessa arrecadação devem ser destinados a Organizações de Manutenção em Saúde (HMOs), que administram os hospitais e clínicas da Nigéria. Contudo, o sistema de saúde no país é precário devido à corrupção governamental.

Repercussão nas redes

O Comprova verifica conteúdos duvidosos sobre políticas públicas do governo federal que tenham grande potencial de viralização.

A publicação foi feita no Twitter no dia 2 de outubro. Em 9 de outubro, tinha 25,7 mil retweets e 65,8 mil curtidas na rede social.

Política

Investigado por: 2019-10-09

Publicação atribui a Bolsonaro sucesso em índices de segurança com dados fora de contexto

  • Enganoso
Enganoso
O texto tira os dados de contexto e credita à nova gestão efeitos de governos anteriores

É enganosa uma publicação que circula nas redes sociais exaltando o governo Jair Bolsonaro (PSL) por reduzir a criminalidade no Brasil, bater recorde na apreensão de drogas e deflagrar o maior número de operações da Lava Jato até então. O texto tira os dados de contexto e credita à nova gestão efeitos de governos anteriores.

A taxa de mortes violentas intencionais já havia caído 10,8% em 2018, na gestão de Michel Temer (MDB), de acordo com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Quanto às drogas, os dados vão até 31 de agosto e indicam que há recorde na apreensão de haxixe e que a apreensão de cocaína é a segunda maior desde 1995. A apreensão de maconha está em menos da metade do recorde de 2017.

Quanto à Lava Jato, em 2019, não foram deflagradas mais operações do que em anos anteriores.

O ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, chegou a repercutir o tuíte com os dados imprecisos com o comentário: “seguimos”.

O Comprova verificou uma publicação do site Crítica Nacional que foi compartilhada em diversos perfis e páginas de redes sociais, como @PorTiMeu_BR no Twitter e Direita RJ no Facebook.

Enganoso para o Comprova é o conteúdo que confunde o leitor ou que seja divulgado para confundir, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Como verificamos

Para esta verificação, o Comprova consultou o Ministério da Justiça, a Polícia Federal, a Procuradoria da República no Rio de Janeiro e os dados de violência do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Também ouvimos o pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) Daniel Cerqueira, um dos coordenadores da publicação Atlas da Violência, e a professora de Segurança Pública da Universidade Federal Fluminense (UFF) Jacqueline Muniz, que ajudou a criar e implantar o sistema nacional de estatística criminal do Ministério da Justiça.

Você pode refazer o caminho da verificação do Comprova usando os links para consultar as fontes originais ou visualizar a documentação que reunimos.

Houve redução na criminalidade no Brasil?

Sim. Nos primeiros meses da gestão Bolsonaro houve queda nas mortes por violência, de acordo com dados do Ministério da Justiça. Os pesquisadores ouvidos pelo Comprova destacam, no entanto, que a tendência não é recente e que não é possível atribuir os números ao governo atual.

De acordo com dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o número de mortes violentas intencionais em 2018 já havia caído 10,8% no Brasil em comparação a 2017, no governo Michel Temer (MDB). Em pelo menos 13 Estados esse índice já vinha diminuindo desde 2011. A taxa de mortes violentas intencionais inclui homicídio doloso, latrocínio, lesão corporal seguida de morte e as mortes decorrentes de intervenções policiais.

Embora o número de mortes em geral tenha caído de um ano para outro, as mortes decorrentes de intervenções policiais cresceram 19,6% em relação a 2017. Os dados mais recentes disponíveis do Fórum Brasileiro de Segurança Pública são referentes ao ano de 2018. (Para que você veja as taxas de criminalidade por Estado, basta clicar na seta para a direita ou para a esquerda. Também é possível selecionar uma das opções ao clicar na seta que aponta para baixo.)

O Ministério da Justiça disponibiliza dados sobre criminalidade até maio de 2019 na plataforma Sinesp, que compila boletins de ocorrência enviados pelos Estados ao governo federal.

No entanto, como afirma texto publicado pela Folha, o sistema é visto com desconfiança por pesquisadores, por não obedecer a critérios básicos de padronização e estatística.

Criado há sete anos, o Sinesp só começou a ser alimentado sistematicamente pelos estados no fim de 2018. Além disso, não é exigido um critério técnico dos estados e distritos nem é fiscalizada a origem da coleta de dados.

Segundo a plataforma, nos cinco primeiros meses deste ano, houve queda de 23,7% no número de vítimas no País — estatística que inclui homicídio doloso, lesão corporal seguida de morte e roubo seguido de morte. Essa taxa também já havia diminuído 10,3% no período de janeiro a maio de 2018 em relação a 2017.

Ao buscar créditos pela melhora da segurança no Brasil, o presidente Jair Bolsonaro declarou no Twitter, em maio: “‘especialistas’ dirão que a queda [em homicídios] não tem relação com nossas ações, mas se o número tivesse aumentado, certamente culpariam o governo”.

Pesquisadores ouvidos pelo Comprova afirmam que os efeitos de políticas de segurança pública não podem ser notados a curto ou médio prazo. Além disso, a competência na solução de problemas na área costuma ser dos governos estaduais e municipais (veja a explicação mais abaixo).

“Considerando o pouco tempo de governo e, portanto, de implementação de qualquer política pública, não se pode atribuir uma participação da política atual na queda das taxas de crimes”, disse a professora Jacqueline Muniz, da UFF.

O pesquisador do Ipea Daniel Cerqueira afirma ainda que, além de não ser responsável pela diminuição nos índices de violência, o governo Bolsonaro age de forma “contraproducente” do ponto de vista da segurança pública.

Segundo ele, uma das medidas propostas pelo Executivo, de flexibilizar o acesso a armas de fogo, pode resultar no aumento de mortes nos próximos anos. “Existe uma evidência internacional que quanto mais armas, mais crimes, mais homicídios e mais suicídios”, afirma. O Comprova já fez uma verificação sobre o tema.

Cerqueira critica os principais pontos do pacote anticrime proposto pelo ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro. Para ele, o excludente de ilicitude e o endurecimento das penas de crimes são um “contrassenso”.

“O excludente de ilicitude de forma generalizada é uma licença para matar”, aponta. “E o endurecimento na punição é completamente contrário ao diagnóstico da violência no Brasil. O problema do país é a identificação dos homicidas e dos grandes criminosos. Por que isso acontece? Falta investigação e inteligência.”

De acordo com o Atlas da Violência de 2019, a taxa de elucidação de homicídios não é calculada no Brasil e, nos Estados onde esse índice é aferido, a média fica entre 10% e 20%.

Redução nos índices de criminalidade podem ser atribuídos ao governo federal?

Segundo os especialistas em segurança pública ouvidos pelo Comprova, a queda nos índices de criminalidade não pode ser atribuída ao governo federal. Em geral, resultados negativos ou positivos estão ligados a ações estaduais e municipais. Além disso, o efeito gerado por políticas públicas não costuma ser imediato.

De acordo com Jacqueline Muniz, da UFF, o governo federal só pode atuar sobre os assuntos de segurança pública de forma indireta, já que são os poderes estadual e municipal que administram de maneira direta e continuada os territórios e suas populações.

“Ninguém mora, estuda e trabalha na abstração que é a União. A população vive nas cidades e no campo, cuja competência de intervenção direta é do município e do Estado”, explica ela.

Para Muniz, o principal papel do governo federal é o de indução — ou seja, o de estimular os governos estaduais a aplicarem uma determinada política pública. Além disso, a União pode repassar recursos do Fundo Nacional de Segurança Pública para os Estados e municípios e intervir com o Exército, de maneira pontual e complementar às ações das polícias estaduais.

O pesquisador do Ipea Daniel Cerqueira acrescenta que, além dos papéis de indução e no financiamento, outra atuação esperada do governo federal é participar da capacitação dos operadores e gestores da segurança pública.

Do ponto de vista jurídico, ele diz que não há uma definição clara a respeito de quem tem responsabilidade sobre a segurança pública. Cerqueira explica que, durante a elaboração da Constituição de 1988, a parte que regulamenta a área foi coordenada pelos militares. O artigo que versa sobre o tema, o art.144, não é muito específico.

“Nas outras sete Constituições do Brasil e mesmo no Brasil Colônia, não havia uma discriminação legal sobre qual o papel do governo federal na segurança pública. Isso ainda continua sendo do ponto de vista jurídico e legal um limbo”, afirma.

Os dois acadêmicos concordam que políticas de segurança pública não têm resultado imediato. A professora Jacqueline Muniz explica que a atuação da União tem efeito cumulativo. Segundo ela, para entender a participação do governo federal na redução de índices de criminalidade, é preciso analisar indicadores de quanto o Executivo repassou para os Estados, como esses recursos foram aplicados e quais foram os resultados obtidos a partir do uso do dinheiro federal.

“Considerando o pouco tempo de governo e, portanto, de implementação de qualquer política, não se pode atribuir uma participação da política atual na queda das taxas de crimes”, disse ela.

“Há que ir além e demonstrar o que, de fato, se tem feito em apoio aos programas e ações desenvolvidos pelos estados e municípios. É preciso esclarecer quais são as boas práticas que o governo federal tem participado desde janeiro de 2019 que têm ajudado os estados”.

Há um programa pontual da gestão Bolsonaro, focado em cinco cidades brasileiras, já com resultados iniciais: o Em Frente, Brasil. Os municípios de Ananindeua (PA), Cariacica (ES), Goiânia (GO), Paulista (PE) e São José dos Pinhais (PR) registraram queda de 53% em homicídios em setembro, na comparação com o mesmo mês de 2018.

Por que os índices de violência diminuíram?

Consultada pelo Comprova, a Polícia Federal não se posicionou sobre a redução nos crimes. Segundo o pesquisador do Ipea Daniel Cerqueira, são três os principais motivos para a queda nos índices. Dois aspectos são tendências de longo prazo que ajudaram a impedir um aumento ainda maior dos índices de violência.

O primeiro deles é uma mudança severa no regime demográfico brasileiro, com o envelhecimento da população. Outro ponto de mudança para a segurança pública foi o Estatuto do Desarmamento, de 2003. “Isso freou o aumento dos homicídios em alguns Estados em que as polícias focaram na retirada de armas de fogo na rua”, explica o pesquisador.

Além disso, mais recentemente experiências pontuais em Estados e municípios contribuíram para puxar o índice de violência para baixo. “Estados que fizeram bons programas de segurança pública, como Espírito Santo e Paraíba, têm queda de mais de sete anos nas taxas de homicídios”, diz Cerqueira. “Em termos municipais, vários prefeitos fizeram bons programas, como em Diadema, Canoas, e em municípios do Sul, como Pelotas.”

Um dos coordenadores da publicação Atlas da Violência, Cerqueira explica que a queda no número de mortes do país é uma tendência observada há alguns anos. Como citado anteriormente, em 2018 esse índice já havia caído 10,8% no país em relação ao ano anterior.

“Mesmo nos anos anteriores, em que a taxa global de homicídios no Brasil estava crescendo, havia cada vez mais unidades da federação no Brasil diminuindo esse índice”, diz ele. “A taxa só cresceu em 2017 por conta da guerra contra o narcotráfico no Norte e no Nordeste.”

Segundo Cerqueira, de 2016 para 2017 a taxa de homicídios já havia caído em 15 estados brasileiros. No ano seguinte, esse número aumentou para 21 unidades da federação.

Houve recorde em drogas apreendidas no Brasil?

Há um recorde na gestão Bolsonaro: a apreensão de haxixe. A Polícia Federal apreendeu, de janeiro a 31 de agosto, 5,7 toneladas da droga – mais de 2 toneladas foram em uma única operação, realizada no início do ano na Região Metropolitana de Fortaleza. O recorde anterior, de 1,2 tonelada de haxixe apreendida, foi em 2007.

O volume de apreensão de cocaína é, até agora, o segundo maior desde 1995. Na gestão Bolsonaro, houve apreensão de 69 toneladas da droga. O recorde é de 2018, quando a PF apreendeu mais de 79 toneladas de cocaína.

Não há recorde na apreensão de maconha: até agora, houve apreensão de 150,1 toneladas, mais da metade do que o ano passado, mas bem abaixo do recorde de 2017, quando a PF apreendeu 353,9 toneladas.

Ao analisar o período entre janeiro e junho, a apreensão de maconha no governo Bolsonaro está abaixo do registrado desde 2017.

Em relação às demais drogas, as apreensões de LSD, metanfetamina e ecstasy estão longe de bater recorde.

O gráfico abaixo compila os números de apreensão de drogas em todo o território nacional desde 1995, segundo dados da Polícia Federal.

Lava Jato no governo Bolsonaro

A postagem verificada pelo Comprova diz que, em 2019, já foram deflagradas oito fases da operação Lava Jato. O dado, no entanto, está errado. Até a data da publicação, haviam sido deflagradas nove operações somente a partir das investigações realizadas pelo Ministério Público Federal do Paraná – sem levar em conta desdobramentos no Rio de Janeiro e em São Paulo.

Além disso, as fases da operação Lava Jato não têm elo de ligação com o governo. Elas são solicitadas pelo Ministério Público, com autorização judicial, a partir de investigações da Polícia Federal. O MP é um órgão independente, que atua sem interferência do Executivo, Legislativo ou Judiciário. Ou seja, o número de operações Lava Jato não pode ser influenciado pela vontade de um governante.

Por meio do levantamento oficial da operação Lava Jato, disponibilizado pelo site do MPF (Ministério Público Federal), não é possível avaliar ao certo se houve aumento ou diminuição no número de ações deflagradas no decorrer dos anos e afirmar que há um recorde de operações no governo Bolsonaro.

Isso porque o site não exibe as datas em que as fases aconteceram. A página mostra, entretanto, o número total de operações feitas desde 2014 – quando operação começou, em Curitiba – nos três estados (Rio de Janeiro, São Paulo e Paraná). A linha do tempo – que traz todas as fases da Lava Jato – também está desatualizada.

As operações das três forças-tarefa são autorizadas pela Justiça Federal em Curitiba, São Paulo e no Rio de Janeiro, e cada instituição é responsável por contabilizar as operações de seus respectivos órgãos. Eis a tabela disponibilizada pelo MPF sobre as operações.

A última atualização dos dados da 1ª Instância de São Paulo foi feita em 16 de setembro de 2019. Até então, duas operações haviam sido deflagradas. O site não deixa claro, no entanto, a data em que as ações foram feitas.

O mesmo ocorre com as instâncias de Curitiba e Rio de Janeiro. A última atualização do Rio é de 20 de setembro de 2019, e, até a ocasião, 39 operações foram feitas. Por e-mail, a Procuradoria da República do Rio confirmou que não faz um levantamento ano a ano e que as únicas informações disponíveis estão no site.

Os dados de Curitiba foram atualizados em 26 de setembro. Consta no site que, até então, tinham sido deflagradas 65 operações. O número está, entretanto, desatualizado porque, em 27 de setembro de 2019, foi deflagrada a 66ª fase da Lava Jato a partir do Paraná. A investigação, denominada “Alerta Mínimo”, mirou um suposto esquema de lavagem de dinheiro envolvendo doleiros e funcionários do Banco do Brasil.

No caso de Curitiba, em especial, sabe-se que nove fases foram deflagradas em 2019. O Comprova chegou a este número depois de subtrair o número total de operações feitas até o momento (66 fases) pelo número de operações feitas até o fim de 2018 (57). Veja um gráfico que mostra o número de operações deflagradas pela força-tarefa da Lava Jato do Paraná, ano a ano, desde 2014, quando as investigações começaram:

Total de operações da PF em 2019

As discussões a respeito do futuro da Lava Jato cresceram nos últimos meses diante de medidas tomadas pelo presidente Jair Bolsonaro percebidas como contraproducentes para o andamento das investigações. Entre outras coisas, o presidente foi acusado de interferir na Polícia Federal.

A pedido do Comprova, o Ministério da Justiça disponibilizou um levantamento que mostra todas as operações feitas pela Polícia Federal nos últimos 10 anos. Os dados foram compilados, primeiramente, a pedido do jornal Folha de S. Paulo, que revelou em reportagem que, em 2019, a PF fez o menor número de operações nos últimos 5 anos.

A Polícia Federal é um órgão vinculado à pasta da Justiça e Segurança Pública, que no governo do presidente Jair Bolsonaro está sob o comando do ministro Sergio Moro.

O ano que a PF mais fez operações foi 2018, com 629 ações executadas. Veja os números de todas as operações realizadas entre 2009 e 2019:

Repercussão nas redes

O Comprova verifica conteúdos duvidosos sobre políticas públicas do governo federal que tenham grande potencial de viralização.

O texto verificado foi publicado no site e no Twitter do Crítica Nacional em 29 de setembro. Até 8 de outubro, havia mais de 4 mil compartilhamentos e 18,6 mil curtidas.

Política

Investigado por: 2019-10-04

É falso que 700 empresas japonesas querem investir no Brasil impulsionadas pelas reformas do governo Bolsonaro

  • Falso
Falso
700 é o número aproximado de empresas japonesas que já estão operando no Brasil. Postagens usam o número para associar suposto interesse das companhias com reformas defendidas pelo governo

É falso que 700 empresas japonesas querem investir no Brasil por causa das reformas prometidas pelo governo de Jair Bolsonaro (PSL), como dizem publicações no Facebook que viralizaram nesta semana. Na verdade, esse é o número correspondente ao total de empresas japonesas que já funcionam em território brasileiro – segundo a Embaixada do Japão no Brasil, o número exato é de 707 empresas, dado compilado pelo Ministério das Relações Exteriores japonês.

As publicações usam um link do site Conexão Política, datado de 12 de setembro, cujo título inicialmente era: “700 empresas japonesas querem investir no Brasil com expectativa ao governo Bolsonaro”. No entanto, o título foi alterado para: “Embaixador japonês diz que diversas empresas do Japão e do mundo querem investir no Brasil”.

Apesar de publicado em setembro, o texto do Conexão Política reproduz uma entrevista do embaixador japonês no Brasil, Akira Yamada, dada à Agência Brasil e publicada em 24 de março. O texto da Agência Brasil traz a informação de que, segundo Yamada, “há cerca de 700 empresas japonesas atuando no Brasil” e que “esse número não cresce há cinco anos”.

Para o Comprova, falso é o conteúdo divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.

O Comprova entrou em contato com a equipe do Conexão Política via e-mail para questioná-la sobre as informações , mas ainda não obteve resposta.

Como verificamos

Para esta verificação, procuramos a entrevista original do embaixador Akira Yamada à Agência Brasil para fazer a comparação entre o que o diplomata de fato falou e o que estava sendo compartilhado no Facebook.

Também entramos em contato com órgãos diretamente ligados à relação entre Brasil e Japão em busca de dados sobre a presença de empresas japonesas no país. Procuramos a Embaixada do Japão no Brasil, a Câmara do Comércio e Indústria Japonesa no Brasil e a Japan External Trade Organization (Jetro, braço de comércio exterior do governo japonês).

Além disso, procuramos informações sobre empresas japonesas no Brasil junto a órgãos do governo brasileiro, como o Banco Central e o Ministério da Economia.

Para encontrar publicações com o título enganoso, antes da alteração que levou à versão atual, usamos a busca do Facebook.

Você pode refazer o caminho da verificação do Comprova acessando os links para consultar as fontes originais ou visualizar a documentação que reunimos.

A entrevista do embaixador

O texto do Conexão Política reproduz trechos da entrevista do embaixador Yamada à Agência Brasil, na qual o diplomata indica interesse de empresas japonesas em investir no Brasil “se a política se estabilizar e a economia caminhar bem”.

No entanto, em nenhum momento Yamada cita número de empresas japonesas interessadas em investir no Brasil. O único valor que o embaixador de fato cita, de acordo com o texto da Agência Brasil, é o de 700 empresas já instaladas no país.

Yamada também afirmou, segundo a notícia da Agência Brasil, que “aumentou o número de executivos japoneses interessados em vir para o país conhecer os projetos brasileiros e investir” e que “os investimentos estão atrelados às reformas da Previdência e tributária em tramitação no Congresso Nacional”.

Ao Comprova, a assessoria de comunicação da Embaixada do Japão no Brasil confirmou o teor das declarações de Yamada à Agência Brasil.

Quantas empresas japonesas existem no Brasil?

Por e-mail, a Embaixada do Japão no Brasil informou nesta sexta-feira (4) que “o número atual das empresas japonesas calculado em 2017 é de 707”.

A Jetro, uma organização de comércio exterior ligada ao governo japonês, forneceu um relatório do Ministério das Relações Exteriores japonês com informações sobre cidadãos do país no exterior, cuja versão mais recente é de 2017 e está em japonês, sem tradução para outro idioma. Ao observar a linha 18, destacada de amarelo, podemos ver que havia 707 empresas japonesas no Brasil até outubro de 2017.

O Comprova também procurou a Câmara de Comércio e Indústria Japonesa no Brasil para confirmar se o número de 700 empresas no país estava correto, mas não teve resposta.

A lista de empresas associadas à Câmara, atualizada em 15 de julho deste ano, traz 356 companhias. Destas, 225 são japonesas.

O interesse japonês em investir no Brasil

Também recorremos a informações do governo brasileiro para entender o tamanho do interesse japonês em investir no Brasil. Após uma queda no investimento depois de 2014, o montante investido por empresas japonesas no Brasil voltou a crescer em 2018.

Segundo um relatório do Banco Central, entre 2014 e 2017 houve queda no investimento japonês no Brasil, indo de US$ 3,8 bilhões para US$ 537 milhões.

Em 2018, o volume de capital investido avançou para US$ 1,1 bilhão. No primeiro semestre deste ano, o Japão investiu US$ 747 milhões no Brasil. Você pode acessar o relatório do Banco Central nesse link.

Outros dados do governo, desta vez da Rede Nacional de Informações sobre o Investimento (Renai), do Ministério da Economia, mostram que nos últimos anos não houve nada parecido com um patamar de centenas de empresas japonesas interessadas em investir no Brasil. O volume prometido de investimento, inclusive, já foi bem maior em anos anteriores.

As informações da Renai mostram quanto se planejou investir no Brasil com capital japonês desde 2004. Esses investimentos anunciados poderiam envolver 100% de dinheiro japonês ou investimento conjunto com capital brasileiro ou de outros países.

A Renai faz a ressalva de que seus relatórios “não representam um levantamento dos investimentos realizados na economia brasileira” e têm como objetivo “apresentar as intenções para execução de projetos futuros”. A planilha com dados desde 2004 pode ser baixada aqui.

Entre janeiro e junho deste ano, o Brasil teve seis anúncios de investimentos envolvendo capital japonês, totalizando US$ 234 milhões, a partir de seis empresas.

No primeiro semestre do ano passado, os anúncios de investimento com capital japonês no Brasil somaram US$ 1,3 bilhão. Na série histórica, o maior valor anunciado é para o primeiro semestre de 2008, com US$ 11,7 bilhões. Os valores são nominais, ou seja, não foram corrigidos pela inflação e correspondem ao que foi anunciado em cada ano.

Desde 2004, o número de empresas que anunciaram investimentos no Brasil com dinheiro japonês nunca chegou perto da ordem das centenas. A quantidade mais alta de companhias que anunciaram investimentos foi de 31, no ano de 2006. No primeiro semestre de 2019, foram seis empresas.

A Embaixada do Japão também deu informações sobre o interesse do país em investimentos no Brasil. Em e-mail enviado ao Comprova nesta sexta-feira (4), a embaixada mencionou o Softbank, que “estabeleceu em março um fundo de investimento de 5 bilhões de dólares” por meio do qual investe em empresas brasileiras, e o anúncio feito pela Toyota no mês passado de que vai investir R$ 1 bilhão para a fabricação de um novo modelo de veículo.

A alteração no título

A verificação também mostrou que o Conexão Política alterou o título do post. O mesmo link foi compartilhado pelo site em dois dias diferentes com títulos distintos, um falso (“700 empresas japonesas querem investir no Brasil com expectativa ao governo Bolsonaro”) e outro que traz o real significado da entrevista do embaixador japonês (“Embaixador japonês diz que diversas empresas do Japão e do mundo querem investir no Brasil”).

Uma busca pelas palavras “conexão política” e “Japão” no Facebook permitiu encontrar a primeira publicação, ainda com o conteúdo falso, feita na página do Conexão Política no dia 12 de setembro, às 13h52 (veja o print da publicação). Até a tarde desta sexta (4), o link teve 1,2 mil compartilhamentos.

A mesma busca também mostra que, às 15h12 do dia 28 de setembro, o Conexão Política fez outro post no Facebook usando o mesmo link, mas já com o título “Embaixador japonês diz que diversas empresas do Japão e do mundo querem investir no Brasil”. O segundo post teve apenas 120 compartilhamentos até a tarde desta sexta (veja o print da publicação).

O link com o título enganoso também foi compartilhado no dia 27 pela página “Eu Sou Direita” e recebeu 10 mil compartilhamentos até esta sexta. Outra publicação, feita no grupo “Equipe de Bolsonaro de Plantão” no dia 25, tinha 2,2 mil compartilhamentos.

Repercussão nas redes

De acordo com dados do Crowdtangle, plataforma que mede a repercussão de links postados no Facebook, os posts com o link do Conexão Política tiveram mais de 1,7 milhão de interações (curtidas, compartilhamentos e comentários) até a tarde desta sexta-feira (4), entre elas 180 mil compartilhamentos. Algumas das páginas e grupos que postaram o link com o título enganoso foram Eu Sou Direita, Lava Jato Brasil, Equipe de Bolsonaro de Plantão e República de Curitiba.

Contexto

As publicações falsas feitas nesta semana vieram em paralelo à confirmação, na segunda-feira (30), da viagem do presidente Jair Bolsonaro ao Japão este mês. Bolsonaro vai comparecer à entronização do novo imperador do Japão, Naruhito, no dia 23.

Em junho, Bolsonaro visitou a cidade japonesa de Osaka por causa da conferência do G20, grupo formado pelas 20 maiores economias do mundo. Em 27 de junho, Bolsonaro não tinha agenda oficial e passeou pelo comércio local de Osaka, onde tirou fotos com transeuntes, de onde veio a imagem do post que o Comprova analisou.

Em julho, o embaixador do Japão no Brasil, Akira Yamada, participou de uma sessão solene no Senado, em Brasília. A sessão foi convocada pela senadora Leila Barros (PSB-DF) em homenagem aos 111 anos da imigração japonesa no Brasil. O país também tem a maior comunidade nipônica do mundo fora do Japão, com cerca de 2 milhões de pessoas, entre descendentes e japoneses natos.

Durante seu discurso, Yamada disse que “está convicto de que, se as reformas avançarem, muitas empresas japonesas voltarão a olhar para o Brasil novamente para se instalar e aumentar os investimentos”.

Política

Investigado por: 2019-10-03

É falso que leilão vai entregar metade do petróleo brasileiro para estrangeiros

  • Falso
Falso
Áreas oferecidas não correspondem à metade das reservas brasileiras, e Petrobras também participa do leilão

É falso um texto viralizado no Facebook que afirma que “quase metade do petróleo brasileiro vai ser entregue em leilão”. A publicação diz que recursos naturais brasileiros estariam sendo vendidos para empresas estrangeiras e responsabiliza o presidente Jair Bolsonaro (PSL) e o ministro da Economia, Paulo Guedes.

De fato, a Agência Nacional do Petróleo, Gás e Biocombustíveis (ANP) prevê a realização de um megaleilão no dia 6 de novembro para a exploração de quatro novas áreas do pré-sal na Bacia de Santos. Essas descobertas excedem as áreas concedidas à Petrobras em 2010, acordo que ficou conhecido como cessão onerosa. Ou seja, são áreas ainda inexploradas pela estatal brasileira.

O texto cita, corretamente, que a produção estimada para esses campos seria de 1,2 milhão de barris de óleo por dia. A ANP confirma que o excedente da produção chega a esse montante. A publicação viralizada também acerta que a produção de óleo do Brasil é de cerca de 2,6 milhões de barris diários, produção média, em 2019, até o momento. Considerando apenas o mês de agosto, foram quase 3 milhões de barris por dia.

No entanto, ao contrário do que afirma o título da publicação, as reservas que serão leiloadas não correspondem à metade do petróleo do país, hoje calculadas em 12,7 bilhões de barris.

Se somado esse potencial de produção de 1,2 milhão de barris à produção de agosto, esses novos campos seriam responsáveis por cerca de 28% da extração brasileira, e não por metade da produção.

Segundo o texto, “seria um nível inédito de participação estrangeira na extração de petróleo brasileiro”, mas, como o leilão ainda não foi realizado, não é possível saber quanto das reservas ficará nas mãos de empresas estrangeiras. Vence o leilão o consórcio ou a empresa que se comprometer a partilhar mais óleo com a União.

Foram habilitadas para o leilão 14 empresas de 11 países. Dessas, 13 são petroleiras estrangeiras. Entre elas estão empresas que já operam no país, como a anglo-holandesa Shell e a norueguesa Equinor. Há ainda a participação da Petrobras, única empresa nacional habilitada.

Mesmo que não seja a vencedora da licitação, a Petrobras poderá ficar com 30% da exploração em duas das quatro áreas que serão leiloadas.

Além disso, a participação de empresas estrangeiras em leilões de reservas de petróleo no país não foram implementadas pelo governo Bolsonaro. Desde 1997, no governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB), com a aprovação da Lei do Petróleo, a Petrobras deixou de ter exclusividade na exploração de petróleo no país.

Já em 2016, no governo de Michel Temer, permitiu-se que empresas estrangeiras operassem os campos do pré-sal sem participação da estatal. Até então, a estatal deveria ter pelo menos 30% de participação em qualquer consórcio de exploração e produção, limitando às estrangeiras o papel de sócios financeiros.

Considerando os quase 3 milhões de barris diários produzidos no país em agosto, 2,8 milhões foram de reservas operadas pela Petrobras, seja como operadora única ou como a operadora principal em consórcio com outras empresas. Em sequência, ficaram os 72 mil barris que foram extraídos sob operação da Equinor e 46 mil sob operação da Shell. As demais operadoras, sejam estrangeiras ou brasileiras, não chegaram a produzir 30 mil barris diários.

Esta verificação do Comprova analisou um texto publicado no site Esquerda Diário.

Falso para o Comprova é o conteúdo divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.

Como verificamos

Para esta verificação, o Comprova analisou os documentos publicados no site da ANP, na área que reúne informações sobre a Rodada de Licitações dos Volumes Excedentes da Cessão Onerosa, como o edital do leilão.

Além disso, entramos em contato com a assessoria de imprensa da ANP e consultamos reportagens publicadas em grandes veículos de imprensa sobre o megaleilão.

Você pode refazer o caminho da verificação do Comprova usando os links para consultar as fontes originais.

O que é o megaleilão

A Petrobras recebeu, em 2010, o direito de explorar até cinco bilhões de barris de petróleo na Bacia de Santos, pelo acordo de cessão onerosa, em que ela remunera o governo pela produção. No entanto, a ANP avaliou que essa reserva é ainda maior. O leilão, portanto, é para a extração desse volume excedente de petróleo, que tem reserva estimada entre de 6 a 15 bilhões de barris.

A licitação deverá render até R$ 106,3 bilhões em bônus de assinatura à União, que é o lance pago pelas empresas para obter a concessão. A produção estimada nessas áreas é de 1,2 milhão de barris de petróleo por dia.

Os valores são diferentes para cada uma das áreas e foram previstos na resolução do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) que autorizou o leilão, publicada em abril de 2019. Búzios é o maior campo, com 852,21 quilômetros quadrados, e tem o maior valor: R$ 68,1 bilhões. Em seguida, estão Atapu, de R$ 13,7 bilhões; Sépia, de R$ 22,8 bilhões; e Itapu, de R$ 1,7 bilhão. O pagamento será iniciado no dia 27 de dezembro ainda deste ano.

Do valor total, R$ 33,6 bilhões vão para a Petrobras, que será ressarcida devido à mudança no contrato de cessão onerosa. Com isso, a União fica com R$ 72,8 bilhões. Uma parte deverá ser repassada para Estados e municípios ainda neste ano. A proposta do Senado é de que 15% vão para Estados e 15% para municípios, além de o Rio de Janeiro receber mais 3% do valor que caberá ao governo federal.

As regras para a divisão não foram promulgadas no dia 26 de setembro, com a Emenda Constitucional 102, que trata da cessão onerosa. Por isso, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), sugeriu que o governo edite uma Medida Provisória (MP) estabelecendo como será a distribuição do dinheiro. Para votar a reforma da Previdência em segundo turno, senadores cobram a MP.

Quem vence o leilão

As áreas do pré-sal serão leiloadas pelo regime de partilha, em que além de pagar para operar em um campo e de remunerar o poder público com royalties, as petroleiras precisam repassar para a União uma parte da produção em petróleo. Essa parcela é chamada de “excedente em óleo”.

Esse petróleo é entregue bruto para a estatal Pré-Sal Petróleo S.A (PPSA), que é responsável pela venda do mineral. Esse modelo de partilha é usado em áreas do pré-sal ou naquelas consideradas estratégicas pelo governo.

Vence o leilão a empresa que ofertar o maior percentual de “excedente em óleo” para a União, de acordo com o edital, lançado em setembro. Esse termo se refere ao percentual do petróleo explorado na área, por isso o modelo do negócio recebe o nome de “partilha de produção”.

Os percentuais mínimos previstos pela ANP são de 23,25% na área de Búzios, 25,11% na de Atapu, 27,65% na de Sépia e 19,82% na de Itapu.

Petrobras tem preferência

Assim como em todas as rodadas de leilão que oferecem áreas no regime de partilha, a Petrobras pode exercer no megaleilão o direito de preferência para atuar como operadora de um consórcio. A operadora é empresa efetivamente responsável pelo gerenciamento das atividades na área contratada no leilão.

Para esta licitação, a Petrobras manifestou em maio o interesse em fazer parte dos consórcios para as áreas de Búzios e Itaipu. Assim, mesmo que não seja a vencedora para esses campos, poderá ficar com 30% da exploração neles.

O edital do leilão explica que a estatal deverá reivindicar a participação nos dois blocos durante a sessão pública para a apresentação das ofertas, em 6 de novembro. Isso não se aplica no caso de ser a própria Petrobras a vencedora do leilão, isoladamente ou em consórcio. Caso a Petrobras não seja a ganhadora nem decida participar dos consórcios vencedores, a vencedora assumirá e indicará a operadora.

O edital ainda prevê que mesmo se uma operadora estrangeira ganhar o leilão, parte dos bens e serviços adquiridos para atividades de exploração e produção deve ser nacional. Além disso, deve ser assegurada preferência à contratação de fornecedores brasileiros.

A participação de estrangeiras na exploração do petróleo

Apesar de ter deixado de ter exclusividade na exploração do petróleo em 1997 — com a aprovação da Lei do Petróleo — mais de 20 anos depois, a estatal ainda é responsável pela operação da maior parte dos barris produzidos no país.

Dos quase 3 milhões de barris diários produzidos no Brasil em agosto, 2,8 milhões foram de reservas operadas pela Petrobras. Parte dessas reservas ela administra em conjunto com outras petroleiras mas detém o controle da operação.

A primeira rodada de licitações da ANP foi realizada em junho de 1999. A agência concedeu 12 das 36 áreas leiloadas e 13 empresas estrangeiras participaram da concorrência.

Desde então, foram realizados diversos outros leilões, ano a ano, até 2006, quando foi descoberto o pré-sal. Após a confirmação da descoberta do megacampo, hoje chamado de Búzios, o governo decidiu rever as regras do setor e interrompeu por cinco anos a realização de leilões, o que levou a um processo de desmobilização de empresas estrangeiras no país e queda de investimentos no setor.

Em 2010 foram criados os contratos de partilha. Eles garantiam à Petrobras participação mínima de 30% nos consórcios, além de exclusividade na operação dos projetos, limitando às estrangeiras o papel de sócios financeiros.

No governo Temer, em 2016, as regras mudaram e passou a ser permitido que empresas estrangeiras sejam operadoras de campos do pré-sal. Também deixou de ser obrigatória a participação da estatal com um mínimo de 30% de cada consórcio vencedor.

Consórcios liderados por empresas estrangeiras levaram 6 das 13 áreas do pré-sal licitadas sob Temer, tendo sido responsáveis por 99% dos R$ 6,8 bilhões arrecadados.

No megaleilão previsto para novembro, 14 petroleiras foram habilitadas. Dessas, 13 são petroleiras estrangeiras e a Petrobras é a única empresa nacional habilitada.

Repercussão nas redes

O Comprova verifica conteúdos duvidosos sobre políticas públicas do governo federal que tenham grande potencial de viralização.

O texto verificado foi publicado no site e no Facebook do Esquerda Diário em 30 de setembro, além de ter sido postado também por várias páginas no Facebook como “Grupo de Apoio ao Jornalista Glenn Greenwald”, “Acorda meu povo” e “Avante! O PT é a Chama da Luta e da Resistência” .

Até a tarde do dia 3 de outubro, o conteúdo tinha mais de 19 mil interações, com 11,4 mil curtidas, 5,8 mil compartilhamentos e 1,9 mil comentários.

Leia também

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Vinte anos após 1º leilão, Petrobras opera 95% da exploração de petróleo (Folha)

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Política

Investigado por: 2019-10-01

Terras indígenas em Rondônia não foram vendidas a empresa irlandesa

  • Falso
Falso
Contrato foi anulado pela Justiça e era, na verdade, para venda de créditos de carbono

É falso um texto compartilhado no Facebook afirmando que terras indígenas em Rondônia teriam sido vendidas para uma organização irlandesa e que a negociação teria sido anulada pela Justiça.

Na realidade, um contrato para a venda de créditos de carbono, celebrado entre uma empresa irlandesa e uma associação indígena, foi suspenso em 2012 por decisão judicial provisória, a pedido da Advocacia Geral da União (AGU).

O contrato previa que a empresa irlandesa teria os direitos sobre os créditos de carbono gerados pela preservação da floresta pelos indígenas nos trinta anos seguintes. No entendimento da Justiça, os termos do acordo seriam ilegais e abusivos.

Caso fosse um contrato de venda, ele também seria considerado ilegal, pois a Constituição não permite a venda de terras indígenas.

O contrato foi assinado em 2011 pela irlandesa Celestial Green Ventures PL e a Associação Indígena Awo “Xo” Hwara, organização que é apontada no documento como representante das terras indígenas de Igarapé Lage, Rio Negro-Ocaia e Igarapé Ribeirão, localizadas em Guajará-Mirim, em Rondônia. A Celestial Green Ventures já havia feito negociações semelhantes no mesmo período com outros povos indígenas.

O valor total do contrato era de US$ 13 milhões, que seriam pagos à associação indígena em parcelas anuais de US$ 445 mil, ao longo de 30 anos. No entanto, nada chegou a ser pago, porque a venda de créditos de carbono foi anulada pela Justiça Federal em Rondônia em 2012, a pedido da AGU.

Um dos argumentos foi de que a Fundação Nacional do Índio (Funai) não participou da articulação. Segundo a legislação, as terras são de uso exclusivo dos indígenas e o aproveitamento dos recursos só pode ser efetivado se o governo federal concordar.

A anulação do contrato foi confirmada em 2018, decisão a que se refere o texto verificado pelo Comprova. O processo transitou em julgado em junho de 2019, ou seja, não cabe mais recurso.

Esta verificação do Comprova analisou um texto publicado no site Terça Livre, compartilhado em uma página de apoio ao ministro Sergio Moro e pela página República de Curitiba no Facebook.

Falso para o Comprova é o conteúdo divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.

Como verificamos

Para esta verificação, o Comprova consultou o andamento do processo de número 0012239-70.2012.4.01.4100 no site da Justiça Federal em Rondônia [Para visualizar os documentos, você deve acessar a área “inteiro teor”].

Além disso, entramos em contato com as assessorias de imprensa da Funai e da AGU e ouvimos Pedro Soares, gerente de REDD+ (Redução das Emissões por Desmatamento e Degradação) da ONG Instituto de Conservação e Desenvolvimento Sustentável da Amazônia (Idesam).

Também foi contatado Raul Silva Telles do Valle, diretor de Justiça Socioambiental da ONG internacional World Wide Fund for Nature, conhecida pela sigla WWF.

O Comprova não conseguiu acesso à íntegra do contrato entre a Celestial Green e a Associação Indígena Awo “Xo” Hwara.

Através de pesquisas pelo CNPJ da empresa no site da Receita Federal, foi possível encontrar dois cadastros de 1997 com o nome da associação, um deles inativo desde 2008 e o outro ativo. Porém, o Comprova não conseguiu contato com a entidade através dos telefones que estão disponíveis.

Você pode refazer o caminho da verificação do Comprova usando os links para consultar as fontes originais.

O que é o mercado de créditos de carbono

O mercado de créditos de carbono do Redd (Redução das Emissões por Desmatamento e Degradação) prevê que uma entidade pode pagar outra por ela ter evitado a emissão de gases que provocam o efeito estufa (por meio de ações como a redução do desmatamento). Cada crédito é equivalente ao aquecimento global causado por uma tonelada métrica de dióxido de carbono (CO2).

O Redd é um mecanismo voltado para o pagamento daqueles que preservam florestas, reconhecendo que mantê-las de pé ajuda a conter a emissão de gases estufa. O conceito vem sendo desenvolvido desde 2003 nas Conferências do Clima organizadas pela ONU. Umas das discussões é de que maneira países desenvolvidos podem remunerar países em desenvolvimento que conservam suas florestas.

Por que o contrato foi anulado?

Segundo as decisões dos juízes, há dois argumentos principais para a anulação do contrato: o fato de que a lei prevê consulta às comunidades indígenas nas negociações e que a Funai deveria ter sido contatada. Para isso, usam como base o artigo 8º do Estatuto do Índio e o artigo 231 da Constituição Federal.

Também foi apontado que o uso das terras indígenas é exclusivo dos povos indígenas e que, apesar do direito ao uso, as terras são da União.

A juíza Laís Durval Leite, responsável pela sentença de 2018, avaliou que não pode haver exploração comercial das terras indígenas, pois, ao garantir esse direito, o objetivo é de preservar a cultura e as tradições desses povos. A juiza classificou ainda como “abusiva” a cláusula do contrato “que impede o uso da terra, dos rios e dos lagos pelos seus ocupantes tradicionais”.

Em entrevista ao Comprova, Pedro Soares, gerente de REDD+ do Idesam, afirmou que os projetos de Redd deveriam prever apenas ações para redução de desmatamento ilegal e atividades que não vão contra o plano de gestão dessas terras. “Qualquer coisa fora disso, que vá restringir atividades tradicionais, é errada e não pode ser feita dentro de um contrato do tipo”, disse.

Em entrevista ao Comprova, o diretor de Justiça Socioambiental da WWF, Raul Silva Telles do Valle, afirmou que, em geral, indígenas deveriam ter o direito de comercializar créditos de carbono de suas terras. “Se eles têm o direito de usar a terra, eles podem decidir se pode desmatar ou não. (…) Assim como, se explorar madeira, eles que vão vender. (…) Nessa mesma lógica, o carbono não é algo em si, mas é a ação de abrir mão de desmatar e de isso ser reconhecido por terceiros como um benefício para a humanidade”, afirmou.

Em 2012, antes da primeira decisão que suspendia o contrato, a Funai consultou a Advocacia-Geral da União (AGU) sobre a possibilidade de vender créditos de carbono em terras indígenas. A AGU afirmou que era necessário debater a questão para definir leis e políticas públicas a respeito.

A AGU apontou risco nesse tipo de contrato por questões como a dificuldade de confirmar que essas organizações indígenas representem os povos indígenas envolvidos, além de “violações que têm sido verificadas à autonomia e aos direitos dos povos indígenas”.

Tanto a Constituição Brasileira, quanto a Convenção 169 da OIT (Organização Internacional do Trabalho), que trata de povos indígenas e tribais, preveem a criação de um protocolo de que defina o que deve ser considerado consulta oficial a um povo indígena. O protocolo das terras indígenas envolvidas no contrato foi publicado na última sexta-feira (27).

O que é a Celestial Green Ventures?

A Celestial Green Ventures era uma empresa que dizia se dedicar a financiar projetos de compensação de carbono, ou seja, iniciativas de reflorestamento ou preservação de florestas com o objetivo de compensar a emissão de gás carbônico por empresas. A informação está em documento enviado pela Celestial Green Ventures para o site de jornalismo investigativo Agência Pública em 2012.

De acordo com reportagem do Estado de S. Paulo de 2012, no mesmo período, a Funai registrava 30 projetos semelhantes. Deles, 16 eram com a empresa irlandesa.

Segundo dados disponíveis no site do Companies Registration Office, órgão do governo irlandês para registro de empresas, a Celestial Green Ventures foi criada em Dublin, capital irlandesa, em 2010, mas foi liquidada em 2016.

Em que contexto foi feito o contrato?

Os contratos entre a Celestial Green e diferentes povos indígenas foram feitos no contexto do avanço do debate sobre o Redd, que seria uma recompensa em dinheiro a governos, pessoas jurídicas ou projetos que tenham reduzido sua emissão de gases estufa, por meio da redução do desmatamento.

Um dos mecanismos do Redd é o mercado voluntário de créditos de carbono – chamado assim porque os créditos obtidos por meio dele não podem ser considerados nas metas de redução de emissões que os países tenham que cumprir. Nele, pessoas jurídicas e projetos podem vender créditos de carbono fiscalizados por entidades independentes da ONU.

O que diferencia o mercado voluntário do mercado obrigatório (ou regulado) é que ele não está atrelado aos acordos internacionais vigentes. Para o Redd, isso muda em 2020, quando entra em vigor o Acordo de Paris, e ele passará a integrar o mercado regulado.

De acordo com Pedro Soares da ONG Idesam, o contrato da Celestial Green era um projeto mal-intencionado e mal feito. “Ela (a empresa) tentou se aproveitar de um mecanismo (Redd) em construção para um benefício próprio. A gente acredita que, se houvesse regulamentação de Redd no Brasil, esse projeto [da Celestial Green] nunca teria chegado no estágio em que chegou”, afirmou Soares.

O que a legislação brasileira diz a respeito do Redd?

Não existe legislação federal no Brasil que defina as regras de Redd, tampouco suas particularidades em relação a povos indígenas. Alguns estados, como Acre, Rondônia, Amazonas e Mato Grosso, criaram leis estaduais sobre o tema.

Em 2015, a portaria nº 365 do Ministério do Meio Ambiente instituiu o Programa de Monitoramento Ambiental dos Biomas Brasileiros e, no ano seguinte, o governo brasileiro lançou sua Estratégia Nacional para REDD+. Apesar disso, não há lei que especifique as regras de como isso deve ocorrer.

Mercado obrigatório de crédito de carbono

O mercado obrigatório de créditos de carbono consiste atualmente no Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), que entrou em vigor em 2005 e foi previsto pelo Protocolo de Kyoto. O MDL é regulado pela ONU. Por meio dele, países desenvolvidos apoiam projetos de redução de emissões de gases estufa em países em desenvolvimento, como o Brasil, com o objetivo de cumprir suas metas ambientais.

Repercussão nas redes

O Comprova verifica conteúdos duvidosos sobre políticas públicas do governo federal que tenham grande potencial de viralização.

O texto foi publicado no site Terça Livre no início de setembro, mas só foi compartilhado nas páginas República de Curitiba e Sérgio Moro no dia 26. Até o dia 1 de outubro, tinha 6 mil compartilhamentos e 3,3 mil curtidas na primeira e 2,7 mil compartilhamentos e 4,9 mil curtidas na segunda.

Política

Investigado por: 2019-09-27

Greta Thunberg não estuda na escola mais cara do mundo nem possui um veleiro; verificamos esses e outros boatos sobre ela

  • Falso
Falso
Publicações em redes sociais tentam desqualificar jovem ativista sueca ao apontar posses e relações pessoais que ela não tem. Apoiadores do governo Bolsonaro reproduziram falsidades contra Greta no momento em que o Brasil tem sido criticado por sua atuação no meio ambiente

Após discursar, na segunda-feira (23), na Cúpula do Clima da Organização das Nações Unidas (ONU), a jovem sueca Greta Thunberg, de 16 anos, tem sido alvo de uma série de boatos e especulações em redes sociais. Os conteúdos, importados de outros países para o Brasil, atacam a credibilidade da ativista e de sua família.

As publicações, sem lastro na realidade, afirmam que a família de Greta tem iate e motorista particular, que Greta estuda na escola mais cara do mundo, que o pai é um cientista social gay que abandonou as filhas e acusam a mãe de ser uma lésbica satanista, entre outras inverdades.

Esta verificação do Comprova analisou conteúdos publicados nas páginas Comandante Viegas e Mulheres Unidas A Favor de Bolsonaro no Facebook e nos sites Estudos Nacionais e Pleno News.

Falso para o Comprova é o conteúdo divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.

Foto no trem é montagem

Uma das montagens falsas viralizadas na internet – e que foi inclusive compartilhada pelo deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL- SP) – mostra Greta fazendo uma refeição a bordo de um trem. Na janela, está um grupo de crianças negras sentadas em um tronco de árvore.

A montagem, que ganhou variações após o tuíte do deputado, usa uma foto que Greta publicou em seu Twitter em 22 de janeiro de 2019, com a legenda “Lunch in Denmark” (almoço na Dinamarca, em português).

Já a foto das crianças negras é de um slideshow inserido em uma reportagem publicada pela agência de notícias Reuters em 30 de agosto de 2007, sobre a comunidade de Korosigna, na República Centro-Africana.

Na mesma postagem compartilhada por Eduardo Bolsonaro, além da montagem, o filho do presidente Jair Bolsonaro inclui a imagem de um texto que diz que Greta é “financiada pela Open Society de George Soros”. Em resposta a seguidores que apontaram que a imagem era falsa, Eduardo postou link para um texto sobre a suposta relação de Greta com Soros.

O texto, no entanto, não traz nenhuma ligação direta de Greta com Soros ou com alguma entidade financiada pelo empresário.

Para relacionar Greta a Soros, o texto menciona o fato de ela aparecer em eventos junto da ativista alemã Luisa Neubauer, e que, também segundo a publicação, seria “porta-voz de uma ONG fundada com o dinheiro da Open Society, do bilionário George Soros”.

Luisa Neubauer é, de fato, jovem embaixadora da ong One, que tem entre seus financiadores a Open Society Foundations, fundada em 1993 por Soros.

No entanto, o nome de Greta não está listado entre as pessoas, organizações e grupos que receberam bolsas da Open Society.

Ela estuda na escola mais cara do mundo?

Em outra publicação, o texto afirma ironicamente que Greta Thunberg teve a infância roubada, em referência ao discurso da sueca na ONU, mas que estuda na escola mais cara do mundo. Isso não é verdade: ela era aluna de uma instituição pública e hoje está sem estudar, após tirar um ano sabático para dedicar-se ao ativismo pelo meio ambiente.

Até junho, Greta estava no nono ano da escola Kringlaskolan, em Estocolmo, conforme publicou em seu próprio Instagram, um dia após a formatura. Contatada pelo Comprova, a instituição confirmou que não há cobrança de mensalidade. A escola divulgou em setembro, em seu perfil no Facebook, uma entrevista de Greta à televisão americana na qual se refere à adolescente como ex-aluna. Além disso, a escola mais cara do mundo é a Le Rosey, na Suíça, com anuidade de £ 99,498 (R$ 509,78 mil), segundo levantamento do jornal britânico The Telegraph.

Greta tem um veleiro de 2 milhões?

A publicação afirma que a adolescente tem um veleiro de 2 milhões, sem especificar em qual moeda seria. Na verdade, Greta não tem um veleiro. A viagem que a ativista fez do Reino Unido a Nova York, onde mais tarde discursaria na ONU, foi de graça, oferecida pelo filho da princesa Caroline de Mônaco, Pierre Casiraghi, e pelo velejador profissional alemão Boris Herrmann, como afirmou o grupo Boris Herrmann Racing em comunicado e conforme noticiaram os jornais franceses Le Monde, Paris Match e Le Figaro. Greta, em seu Twitter, anunciou que havia ganhado uma carona para a viagem.

A sueca não usa avião desde 2015 para evitar a forte emissão de gases poluentes. A imagem que circula nas redes sociais, mostrando Greta em um veleiro, foi publicada em 27 de agosto no Instagram da própria Greta, com a legenda: “Dia 14. 119 milhas de Manhattan. Vento bastante leve ao sul de Long Island”. Na embarcação, estavam também o pai de Greta, Svante, e o documentarista Nathan Grossman.

Tem motorista particular para dirigir a Mercedes de seu pai?

A mesma publicação afirma que o pai de Greta tem um motorista particular. No entanto, o Comprova não encontrou nenhuma imagem ou informação na imprensa internacional ou nas redes sociais de Greta (1 e 2), do Instagram da irmã, Beata, do pai e da mãe registrando que Svante Thunberg tenha uma Mercedes ou motorista particular. A única foto envolvendo carro foi postada em 2018 pelo pai de Greta, do banco de carona, em seu Twitter, mas não é possível identificar que veículo é.

Há, nas redes sociais da família, duas menções a “motorista”, mas nenhuma delas se refere a Svante ter uma Mercedes e um motorista particular.

A mais recente é de 2018, quando o apresentador de um debate promovido pela The United Planet Faith & Science Initiative (UPFSI) brinca, em 0:52, que o pai de Greta é “relações públicas, motorista, protetor” da filha.

A menção mais antiga a um motorista é de 2015: durante uma viagem em turnê no Japão, a mãe de Greta, a cantora de ópera Malena Ernman, publicou uma foto que mostra um homem de traços asiáticos, vestido de terno, ao lado de um veículo preto. Na legenda, ela brinca com o fato de ter um motorista e evidencia que a família não tem um profissional para conduzi-los: “Meu motorista! É apenas no Japão, nos EUA e no @partajofficial que você vai de limusine a todos os lugares”. Partaj é um programa de comédia da televisão sueca, para o qual ela foi convidada no mês anterior e fez uma atuação.

Gasta milhares de dólares em compras em shoppings?

Para não agredir o ambiente, Greta já afirmou que não compra novos produtos, a não ser que seja absolutamente necessário. Uma análise nas redes sociais de Greta não indica nenhuma imagem com compras – há apenas fotos da natureza e de manifestações em favor da proteção do meio ambiente.

A família de Greta

Outra publicação que viralizou nas redes sociais foi sobre a origem da família de Greta. O texto dizia que o “pai, cientista social gay, foi morar com o namorado na Alemanha” e que a “mãe, lésbica satanista, dá aulas sobre aborto para adolescentes e fez campanha para Hillary [Clinton]” (candidata à Presidência dos EUA em 2016). Ainda, o texto concluía que Greta é “fruto do desajuste psicomoral (sic) causado por essa extrema esquerda vagabunda na família ocidental”.

O Comprova investigou a origem da família da ativista. Seu pai, Svante Thunberg, é um ator de novelas e filmes nascido na cidade de Boo, na ilha de Värmdo, na Suécia, em 10 de junho de 1969. Ele é filho de Olof Thunberg, diretor e ator de cinema, e de Mona Andersson, também atriz. Toda a família de atores é conhecida na Suécia e, recentemente, Svante deixou a carreira para cuidar da carreira de ativista da filha Greta. Por influência da filha, o ator virou vegetariano e depois vegano (confira neste vídeo a partir de 06:08 na entrevista com Greta e seu pai, Svante).

Svante é casado desde 2004 com a mãe de Greta, a cantora de ópera Malena Ernman, nascida como Sara Magdalena Ernman em 4 de novembro de 1970, em Uppsala, cerca de 70 km a norte de Estocolmo. Ela é filha de Lars Ernman e Eva Arvidsson. Malena ficou famosa na Europa pela participação no tradicional concurso de música Eurovision Song Contest, na edição de 2009, sediada em Moscou, na Rússia. A cantora de ópera terminou em 4º lugar na competição com a composição “La Voix”. Em 2016, largou sua carreira bem-sucedida e parou de andar de avião a pedido da filha Greta, pois o estilo de vida sustentável que eles pregavam não condizia com a quantidade de voos que Malena pegava para se apresentar ao redor do mundo. Malena também é membro da Academia Real de Música Sueca, como é possível verificar fazendo uma busca rápida por “Ernman, Malena” neste link.

O casal ainda tem outra filha, Beata Ernman Thunberg, nascida em 2005, que também é cantora como a mãe. A família vive em Estocolmo, de acordo com um site sueco de registro de pessoas.

O texto da publicação ainda dizia que a mãe de Greta havia feito campanha para a candidata à presidência dos Estados Unidos, Hillary Clinton, nas eleições de 2016. Malena compartilhou em sua página oficial no Facebook, em 8 de junho de 2016, um link com uma notícia sobre a candidata. O artigo, do site do jornal sueco Aftonbladet, falava sobre a vitória presumida da candidata nas primárias do partido Democrata nos estados da Califórnia, de Nova Jérsei e do Novo México. Com isso, ficava impossível para o outro candidato democrata, Bernie Sanders, ser escolhido pela sigla para concorrer à presidência. Neste dia, Hillary Clinton foi a primeira mulher na história dos Estados Unidos a ser escolhida como uma das principais candidatas à presidência do país. O artigo do jornal sueco falava sobre a comemoração de Hillary em relação a este ‘marco’ e a mãe de Greta, Malena, compartilhou o link do artigo. Não encontramos nenhum outro registro na internet que a mãe de Greta Thunberg tenha feito qualquer tipo de campanha política para a candidata Hillary Clinton.

Contexto

Uma onda de desinformação e ataques a Greta Thunberg ganhou corpo nas redes sociais a partir da segunda-feira, 23 de setembro, quando a ativista discursou na Cúpula do Clima, em Nova York, nos EUA. Organizado pelas Nações Unidas, o evento reúne todos os anos nações, especialistas e a sociedade civil para discutir planos e ações de combate à crise climática.

A fala de Greta, que viralizou, acusa os líderes mundiais de terem traído a atual geração de crianças e adolescentes por não terem agido o suficiente diante do aquecimento global. “Vocês vêm até nós, os jovens, em busca de esperança. Como ousam?”, criticou. “Vocês roubaram meus sonhos e minha infância com suas palavras vazias. Mas eu tenho sorte. Há pessoas que estão sofrendo, estão morrendo, ecossistemas inteiros estão entrando em colapso.”

Uma das principais vozes contra a crise climática, a ativista ganhou notoriedade em 2018, quando, aos 15 anos, decidiu boicotar a aula às sextas-feiras para protestar diante do Parlamento da Suécia. Sozinha, ela segurou um cartaz no qual pedia que os políticos agissem contra o aquecimento global. A ação, que se repetiu nas semanas seguintes, logo trouxe adeptos, tornando-se então um enorme movimento jovem internacional que ficou conhecido como #FridaysForFuture (sextas-feiras pelo futuro).

Não deveríamos estar falando sobre nenhum outro assunto [além da crise do clima]”, disse Greta em uma apresentação TED na Suécia em 2018. Ela defende que é preciso pensar um modelo econômico não poluente e livre da dependência de combustíveis fósseis.

Antes de chegar à Cúpula do Clima, Greta esteve em diversas capitais europeias, discursando aos parlamentares, e foi recebida pelo Papa Francisco e pelo secretário-geral das Nações Unidas, o português António Guterres. A jovem ajudou a articular, entre março e setembro deste ano, duas greves mundiais de jovens pelo clima — a mais recente, na última sexta-feira (20), reuniu cerca de 4 milhões de pessoas em mais de cem países. Por seu trabalho de combate à crise climática, ela foi também indicada ao Nobel da Paz.

Ativista enfrenta onda de ataques

Os ataques à garota vieram de comentaristas, políticos e seus apoiadores em diversos países. As ofensas mais comuns desqualificam a sueca por sua idade, seu gênero, por supostamente ser rica e por e seu comportamento — Greta é diagnosticada com síndrome de Asperger, um tipo leve de autismo. Há também quem desqualifica suas ideias, considerando que não seriam dela.

Ao menos 13 links de verificações sobre Greta apurados por agências de checagem no Brasil e em outros países foram localizados pelo Comprova até quinta-feira (26). Os boatos viralizaram entre milhares de pessoas em locais como Alemanha, EUA, Turquia e Índia.

Uma reportagem do BuzzFeed News americano mostra que, além da sueca, outras ativistas adolescentes que se juntaram aos protestos pelo clima têm sido atacadas e assediadas nas redes sociais. Algumas delas recebem insultos pessoais constantemente e seus perfis tornam-se alvo de campanhas de destruição, que podem incluir o hackeamento de contas e a divulgação de dados pessoais. Alguns casos incluem ameaças de morte às crianças.

Uma parte significativa dos ataques, boatos e ofensas a Greta e outras adolescentes vem de figuras públicas e militantes virtuais ligados ao negacionismo climático – nome que se dá à negação do aquecimento global, apesar das evidências científicas. Uma reportagem publicada no site DeSmog Blog e replicada pela revista Teen Vogue mostra que pessoas que impulsionaram ataques contra a ativista sueca estão ligadas a grupos radicais pró-mercado, uma rede que tem laços firmes com a indústria de combustíveis fósseis.

Entre as figuras públicas que atacaram Greta estão políticos de extrema direita como o britânico Arron Banks, que insinuou que “acidentes de iate costumam acontecer em agosto” – mês em que a sueca viajou de barco da Europa aos EUA, o canadense Maxime Bernier, que afirmou que a ativista deveria ser “denunciada e atacada“, e o comentarista conservador indiano, com atuação nos EUA, Dinesh D’Souza, que comparou Greta a crianças que estampavam peças de propaganda na Alemanha nazista. Outro comentarista conservador, convidado para falar na Fox News, nos EUA, a chamou ainda de “doente mental”, em referência ao Asperger.

Após o discurso de Greta na ONU, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, ironizou a ativista. “Ela parece uma jovem garota muito feliz, ansiosa por um futuro brilhante e maravilhoso. Que coisa boa de se ver!”, disse ele na terça, 24 de setembro, no Twitter. Na presidência dos EUA, Trump se mostra hostil à preservação do meio ambiente e a ações pelo clima. Greta trocou a descrição na bio do seu perfil no Twitter ironizando o comentário do presidente norte-americano.

“Os haters estão mais ativos do que nunca, indo atrás de mim, da minha aparência, meu comportamento e minhas diferenças. Eles têm todas as mentiras e teorias da conspiração imagináveis”, disse Greta sobre os ataques. “Não entendo por que adultos escolhem passar o tempo zombando e ameaçando crianças por promoverem a ciência, quando poderiam fazer algo de bom. Acho que eles devem simplesmente se sentir tão ameaçados por nós.”

Ataques a Greta no Brasil

O deputado federal e filho do presidente Bolsonaro, Eduardo, tuitou na quarta-feira, 25 de setembro, a imagem falsa de Greta Thunberg no trem e um texto falso que afirma que a ativista é financiada por George Soros. Ele ironizou um trecho do discurso da sueca na Cúpula do Clima em que ela diz que “vocês roubaram minha infância”, referindo-se à crise climática.

Ataques do presidente e de sua família a ativistas e ambientalistas não são inéditos. Ao menos desde a campanha eleitoral, em 2018, Jair Bolsonaro critica os “ecoxiitas”, apelido pejorativo para ambientalistas, e a atuação de ONGs na Amazônia. Ele se elegeu falando em priorizar o desenvolvimento econômico no lugar do meio ambiente, defendendo a expansão da agropecuária e a mineração em terras indígenas, por exemplo. Seus três filhos Eduardo, Carlos e Flávio, todos políticos em exercício, negam o aquecimento global.

Ao se eleger ao Planalto, Bolsonaro reduziu as competências administrativas do ministério e cortou recursos para órgãos como o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e para áreas como o combate ao desmatamento e à mudança do clima. Ele também assinou um decreto que flexibilizou a cobrança de multas por crimes ambientais. Além disso, demitiu servidores da pasta e reduziu a participação civil em conselhos da área.

A manifestação mais recente de Bolsonaro sobre o meio ambiente ocorreu na terça-feira (24), em discurso a outras nações na Assembleia Geral da ONU. Ele reivindicou a soberania brasileira sobre a Amazônia, difundindo mentiras sobre a floresta e as políticas ambientais no Brasil. “É uma falácia dizer que a Amazônia é patrimônio da humanidade”, defendeu.

Ele também afirmou que o Brasil é um dos países que mais preservam o ambiente. Além disso, Bolsonaro atacou o cacique Raoni, liderança indígena que critica o governo.

Repercussão nas redes

O Comprova verifica conteúdos duvidosos sobre políticas públicas do governo federal que tenham grande potencial de viralização. Os conteúdos sobre Greta Thunberg foram verificados porque o Brasil está, nas últimas semanas, no centro das discussões sobre meio ambiente, em função das queimadas e desmatamento na Floresta Amazônica, cujo combate depende de políticas públicas do Planalto. Muitos boatos sobre o tema foram checados nas últimas semanas pelo Comprova – veja outras checagens aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui e aqui

Conteúdos sobre Greta também foram checados por Estadão Verifica, AFP, Aos Fatos, Uol, Folha, Agência Lupa (1, 2 e 3), Boatos.org, E-Farsas e Fato ou Fake.

As publicações falsas sobre Greta Thunberg foram encontradas nas páginas Comandante Viegas e Mulheres Unidas A Favor de Bolsonaro. Até a sexta-feira, 27 de setembro, cada uma das postagens tinha mais de oitocentos compartilhamentos.

Saiba mais

Como jovens se mobilizam pelo clima no Brasil e no mundo (Nexo)

Política

Investigado por: 2019-09-25

Post atribui a Maia declaração falsa sobre votações no Congresso

  • Falso
Falso
Post que atribui a Maia a declaração "O Congresso não é obrigado a ouvir o povo" é falso. A fala foi distorcida e vem sendo usada pelo menos desde 2016 em ataques ao presidente da Câmara

Uma imagem publicada no Facebook na madrugada de segunda-feira, 23 de setembro, distorceu uma fala do presidente da Câmara, deputado federal Rodrigo Maia (DEM-RJ), dita há quase três anos.

O post atribui a Maia a seguinte declaração: “O Congresso não é obrigado a ouvir o povo. Isto aqui não é como um cartório onde a gente carimba o que o povo está pedindo”.

No entanto, Maia não disse que a Câmara não é obrigada a ouvir o povo, mas que a Casa tem independência para debater. “Nós não podemos aceitar que a Câmara dos Deputados se transforme num cartório carimbador de opiniões de parte da sociedade, que são democráticas, que são respeitadas, mas que a Câmara de Deputados tem toda a legitimidade para ratificar, para modificar ou até para rejeitar”, ele disse. “Nós aqui não somos obrigados a aprovar tudo que chega a este Plenário.”

A declaração correta está disponível no site da Câmara e em um vídeo do discurso publicado na página do próprio Rodrigo Maia no Facebook em 1º de dezembro de 2016 (a partir de 4min32s).

A declaração falsa vem sendo usada pelo menos desde 2016 em ataques a Maia, com diferentes motivações e contextos.

Esta verificação do Comprova analisou conteúdos publicados em um perfil pessoal e no grupo Equipe do Bolsonaro de Plantão, no Facebook, e no perfil Nando Moura_Oficial no Twitter.

Falso para o Comprova é o conteúdo divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.

Como verificamos

Para verificar esta publicação, o Comprova consultou os registros de discursos feitos em plenário disponíveis no site da Câmara dos Deputados, assim como o vídeo publicado na página de Maia no Facebook.

O Comprova também recorreu a verificações feitas anteriormente por Estadão e O Globo sobre a mesma frase distorcida.

Você pode refazer o caminho da verificação do Comprova usando os links para consultar as fontes originais.

O que disse Rodrigo Maia

A fala original de Maia foi dita em 30 de novembro de 2016, depois que a Câmara votou o pacote de dez medidas contra a corrupção proposto pelo Ministério Público Federal (MPF). Na ocasião, em uma votação de madrugada, os deputados derrubaram quase todos os pontos do projeto.

A menção mais antiga à frase distorcida que o Comprova conseguiu encontrar está em um texto do site Chumbo Gordo. Pelo site, não é possível saber a data exata em que o texto foi publicado. O link traz apenas a informação de que foi publicado “há 3 anos”.

No entanto, o link do Chumbo Gordo com a frase errada de Maia também cita conteúdos publicados na imprensa nos dias seguintes à votação do pacote anticorrupção, como uma coluna de Vinicius Mota na Folha do dia 5 de dezembro de 2016 e uma notícia do UOL de 6 de dezembro de 2016. A menção a esses textos pode servir como referência do momento em que a declaração distorcida foi publicada — provavelmente no começo de dezembro de 2016. No Facebook, a página do Chumbo Gordo compartilhou o texto no dia 7 daquele mês.

A postagem do Chumbo Gordo sugere que a frase de Maia de que “o Congresso não é obrigado a ouvir o povo” foi publicada na coluna de Vinicius Mota. A coluna de Mota, no entanto, não traz nenhuma referência à frase. Para verificar se em algum momento a Folha publicou sobre o assunto, o Comprova buscou pela frase creditada a Maia e por termos relacionados a ela na busca do Google (veja nos links 1, 2, 3 e 4) e entre as publicações de novembro a dezembro de 2016 no site do jornal. Não foi encontrado nenhum registro.

De lá para cá, a distorção da fala de Maia foi usada para criticar o deputado em diversas ocasiões e por diferentes motivos.

Em agosto de 2017, conforme noticiou O Globo, a frase voltou a circular nas redes logo antes de a Câmara votar — e rejeitar — uma denúncia criminal contra o então presidente Michel Temer (MDB).

Já neste ano, em fevereiro, a reeleição de Maia para o comando da Câmara fez a frase enganosa voltar a circular, mostrou o Estadão Verifica.

No fim de março, o presidente da Câmara anunciou que o pacote anticrime proposto pelo ministro da Justiça, Sergio Moro, não era prioridade na Casa — e a declaração distorcida foi vista novamente no Twitter e em grupos bolsonaristas no WhatsApp.

Agora, a frase reapareceu depois que a Câmara aprovou, na última quarta-feira (18), projeto de lei que afrouxa regras para o uso de dinheiro público em despesas de partidos e candidatos. Para entrar em vigor, o texto ainda precisa ser sancionado por Bolsonaro — o que foi tema de verificação feita pelo Comprova.

Uma busca no Twitter revela que uma das imagens usadas em posts com a hashtag #MaiaTraidordaPatria (que chegou ao topo dos assuntos mais comentados da rede depois da aprovação do projeto) é justamente a que traz a frase enganosa. A imagem foi publicada no Twitter, entre outros usuários, pelo youtuber Nando Moura, que apoia o governo Bolsonaro. Moura tem mais de 300 mil seguidores no Twitter.

Repercussão nas redes

O Comprova verifica conteúdos duvidosos sobre políticas públicas do governo federal que tenham grande potencial de viralização.

O post de Nando Moura no Twitter com a frase atribuída a Maia foi publicado no dia 19 e, até a tarde do dia 25, teve 3,5 mil retuítes.

A mesma imagem com a frase também foi publicada no Facebook em um perfil pessoal na madrugada de segunda, 23 de setembro. Até o dia 25, o post teve 7,6 mil compartilhamentos.

Política

Investigado por: 2019-09-24

É enganosa publicação que associa foto de lixo e entulhos a baderna feita por estudantes na UFSC

  • Enganoso
Enganoso
Entulhos foram acumulados em frente ao prédio após um mutirão de limpeza realizado por estudantes em greve na universidade

É enganosa publicação nas redes sociais que associa fotografias de pichações e entulhos de lixo em frente a um prédio da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) a baderna na universidade pública. O lixo foi acumulado em frente ao prédio após um mutirão de limpeza feito por estudantes em greve na universidade. Alguns dias depois, o lixo foi retirado do local.

As pichações também são verdadeiras, porém o Comprova não conseguiu identificar quando foram feitas. O registro mais antigo das pichações no prédio é de novembro de 2012, segundo um artigo no site oficial da Universidade.

Conforme mostra reportagem do telejornal produzido por alunos de Jornalismo da UFSC, a limpeza foi realizada no dia 11 de setembro por estudantes que ocuparam o prédio e decidiram concentrar ali atividades da greve estudantil, iniciada no dia 10. A mobilização é contra os cortes orçamentários do governo federal nas universidades públicas.

A informação de que os entulhos foram resultado do mutirão de limpeza feito após o início da greve foi repassada por três estudantes entrevistados pelo Comprova e confirmada pela UFSC no Twitter. O lixo foi retirado da entrada do prédio no dia 20, segundo estudantes ouvidos pelo Comprova, o que pode ser atestado em imagens enviadas por eles (veja a seguir).

A pedido do Comprova, o estudante de Jornalismo da UFSC Gabriel Vieira foi ao prédio onde estavam os entulhos e fez um vídeo, às 7h53 do dia 20, do lado de fora do edifício, que mostra o lixo sendo removido por uma empresa de limpeza não identificada. Ele também fez uma fotografia do lugar no mesmo dia, mas no final da tarde, apontando que o prédio estava limpo de novo. A informação da data, associada ao local, está nos metadados dos arquivos checados pelo Comprova.

A fotografia dos entulhos viralizou ao lado de outras imagens que mostram pichações nas paredes do centro de convivência, prédio da UFSC que abriga o Diretório Central dos Estudantes (DCE) e uma agência dos Correios, mas antes acomodava também uma livraria e outras áreas de lazer. Ao menos desde 2010, o centro está abandonado, segundo a UFSC, por falta de recursos para infraestrutura. O Comprova não encontrou o autor das imagens das pichações, mas fotos no Google Maps e no Instagram e outras imagens feitas no local para o Comprova confirmam que o prédio está depredado pelo menos há quatro anos.

O Comprova verificou o conteúdo de um tuíte publicado pelo empresário Luciano Hang no Twitter e de um post da página República de Curitiba no Facebook.

Procurada, a assessoria de imprensa do empresário afirmou por e-mail que as fotos foram recebidas de “um aluno que não quer se identificar para não sofrer represália”.

Enganoso para o Comprova é o conteúdo que confunde ou que seja divulgado para confundir, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Como verificamos

Para esta verificação, o Comprova entrou em contato com o estudante de História Marco Antonio Marcon Pinheiro Machado, representante do DCE da universidade, e os alunos de jornalismo Luiza Morfim e Gabriel Vieira, além das assessorias de imprensa da UFSC e de Luciano Hang. Também usamos a busca reversa de imagens do Google, que permite encontrar imagens semelhantes que já tenham sido publicadas na internet, e pesquisamos fotos do centro de convivência no Google Street View e na ferramenta de localização do Instagram, fazendo uma busca com os termos “centro de convivência UFSC” na rede social.

Você pode refazer o caminho da verificação do Comprova usando os links para consultar as fontes originais ou visualizar a documentação que reunimos.

O que há no centro de convivência

Construído em 1979, o centro de convivência é um dos prédios mais antigos da universidade, que foi fundada em 1960. De acordo com a UFSC, os espaços foram desativados aos poucos desde o início dos anos 2000: o restaurante, por exemplo, fechou em 2006 e a galeria de arte deixou de abrigar exposições em 2015. Hoje, apenas o DCE e os Correios funcionam no prédio.

Uma publicação na conta oficial da instituição no Twitter foi feita no dia 19 de setembro, após a viralização das fotos da pichação. O texto informa que o acesso ao prédio foi bloqueado devido à necessidade de obras estruturais. “Como estamos enfrentando uma escassez de recursos, especialmente para obras, não foi possível reformá-lo. Uma parte do prédio, no térreo, é liberada para uso”, explicava o tuíte. “Como toda estrutura sem uso em qualquer cidade do Brasil, o prédio sofreu invasões e foi vandalizado ao longo dos anos, tendo suas paredes pichadas, janelas quebradas e estruturas de metal furtadas”.

A página República de Curitiba diz que R$ 1,7 bilhão são pagos por ano “para sustentar esta corja”. O valor se aproxima, mas não corresponde ao último orçamento da UFSC. Em 2019, é de R$ 1,5 bilhão e o bloqueio foi de R$ 60 milhões. O orçamento deste ano está dividido em: R$ 1,3 bilhão para pessoal e encargos sociais, mais R$ 227 milhões para outras despesas correntes e R$ 25 milhões para investimentos.

O orçamento executado em 2018 foi de R$ 1,67 bilhão e em 2017 foi de R$ 1,58 bilhão. Os números referentes a todos os anos desde 2008 estão no site da própria universidade.

A administração da universidade confirma na postagem que o lixo visto na imagem era resultado do mutirão de limpeza feito pelos estudantes. Os alunos que estão em greve ocuparam o prédio “para concentrar as atividades da greve estudantil”.

O centro de convivência passou por reformas pontuais. Como mostram textos publicados no site da UFSC, em 2012, foram investidos R$ 90 mil em uma revitalização do prédio para que a 11ª Semana de Pesquisa e Extensão (Sepex) pudesse ser realizada no espaço. Naquele momento, a maior parte do centro já havia sido desativada para uma reforma no telhado, iniciada em abril de 2010 e concluída em fevereiro de 2011, com um custo de R$ 374,6 mil.

A ex-reitora Roselane Neckel negou, em 2014, que o prédio estivesse abandonado, mas reconheceu que faltavam projetos complementares para a reforma do prédio. Há cinco anos, ela previa lançar uma licitação para a obra, o que nunca foi feito.

A mesma entrevista mostra que os problemas do lixo e das pichações são antigos. Segundo ela, em junho de 2012, quando assumiu a gestão da universidade, foram retiradas 12 caçambas de lixo. “Sobre a pichação é uma coisa complicada. Há um grupo de estudantes em trabalho de oficinas, que fazem grafitagem. Pediram para usar o espaço que estava aberto. Não foi invadido. Está ocupado por estas oficinas”, disse.

Em 2016, a universidade fez uma investigação sobre “manifestações nazistas de cunho racista em pichações” encontradas em uma das salas do centro de convivência.

Pichações são anteriores à greve e o lixo é proveniente de um mutirão de limpeza

Pelo Google Maps, é possível ver o prédio por fora. Na foto tirada em janeiro de 2019, o prédio realmente está pichado e com papéis colados nas paredes. Parece abandonado.

No registro mais antigo do local, datado em julho de 2017, as pichações já haviam sido feitas e os vidros já estavam quebrados.

No entanto, por meio do aplicativo, não é possível ver os sacos de lixo e a sujeira acumulada em nenhuma das fotos. Pela posição da banca de jornais, é provável que a foto compartilhada por Luciano Hang tenha sido tirada do outro lado do prédio.

No mapa da universidade, o centro de convivência é o que aparece com o número 10, onde ficam os Correios e o DCE.

O Comprova também pesquisou no Instagram as fotos que haviam sido publicadas no centro de convivência. Uma foto de 2015 já mostrava a mesma pichação em uma das paredes do prédio retratada em uma das imagens da publicação da página República de Curitiba.

Numa busca de imagem reversa no Google, enquanto procurávamos imagens semelhantes àquelas do tuíte de Hang, encontramos um artigo do jornal local ND Florianópolis de 2014, que já mostrava pichações no prédio do Centro de Convivência da universidade. A equipe do Comprova entrou em contato com a redação do site em busca de mais informações e eles nos passaram contatos de alunos do DCE.

O aluno de História e membro do DCE Marco Antonio Marcon Pinheiro Machado confirma que as pichações nas paredes são mesmo antigas e podem ter sido feitas por qualquer um, já que o campus é aberto ao público. Marco ainda reitera que os estudantes realizaram o mutirão de limpeza iniciado no dia 11 de setembro e que o lixo mostrado nas fotos estava sendo removido do local no dia 19 de setembro.

A equipe do Comprova entrou em contato com Luiza Morfim, estudante de Jornalismo da UFSC, que também confirma que o mutirão de limpeza ocorreu durante a greve na universidade e que o prédio está abandonado e com pichações há pelo menos cinco anos. Luiza passou o contato de Gabriel Vieira, aluno de Jornalismo, que fez um vídeo da limpeza na manhã do dia 20 de setembro e, no fim da tarde do mesmo dia, um colega dele fez uma imagem mostrando que todo o lixo havia sido removido pelos funcionários da limpeza.

Qual o desempenho da UFSC

Na sua publicação no Twitter, Luciano Hang afirma que “enquanto a maioria dos brasileiros paga seus estudos com dificuldade, quem tem a oportunidade de estudar em uma federal faz esta baderna”. Diferentemente do que o tuíte sugere, a UFSC é bem avaliada em diferentes rankings.

No ranking mundial da revista britânica Times Higher Education, divulgado em setembro de 2019, a universidade é a quinta brasileira mais bem colocada.

Além disso, a UFSC tem nota máxima (5) no Índice Geral de Cursos (IGC), medido pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), órgão ligado ao Ministério da Educação (MEC).

Neste link, é possível acessar o Conceito Enade (baseado no Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes) dos cursos da universidade, cujas notas também vão até 5.

A instituição é a sexta colocada no Ranking Universitário da Folha, com nota final 92.3 (de 100). Nessa classificação, é a 7ª em ensino e internacionalização, 8ª em pesquisa, 13ª em inovação e 26ª em mercado.

Contexto

As imagens do centro de convivência da UFSC viralizaram após o início de uma greve organizada por estudantes que protestam contra bloqueios no orçamento da universidade determinados pelo MEC. Eles estão parados desde o dia 10 e devem ficar assim por tempo indeterminado, segundo postagem do DCE no Facebook.

A UFSC está entre as universidades mais afetadas pelo contingenciamento de recursos
das instituições federais de ensino superior anunciado em abril pelo MEC. Os bloqueios, que atingem as chamadas despesas não obrigatórias, dependem da arrecadação do governo, que afirma não ter recursos para bancar os gastos previstos no orçamento de 2019. A medida é temporária, segundo o Planalto, mas já afeta as atividades universitárias.

Até setembro, houve corte de R$ 60,1 milhões (35%) dos recursos antes previstos para despesas não obrigatórias da UFSC. A medida atinge o custeio de água, energia, infraestrutura, contratação de serviços terceirizados, pesquisa e atividades de extensão, entre outros. Para o secretário de Planejamento e Orçamento da instituição, Vladimir Arthur Fey, se os valores não forem desbloqueados a UFSC não funcionará até o fim do ano.

Além de reivindicar o fim dos bloqueios, a greve estudantil na UFSC protesta contra o Future-se, projeto apresentado em julho pelo governo federal para incentivar as universidades a captar recursos privados, diante da crise no orçamento das instituições.

Repercussão nas redes

O Comprova verifica conteúdos duvidosos sobre políticas públicas do governo federal que tenham grande potencial de viralização.

As imagens do centro de convivência da UFSC foram publicadas por Luciano Hang no Twitter no dia 16 de setembro e, até o dia 23, acumulavam 1,3 mil retuítes e mais de 5,8 mil curtidas. A página República de Curitiba, no Facebook, publicou as fotografias da universidade no dia 18 de setembro. Até o dia 23, eles tinham 1,1 mil compartilhamentos.

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Política

Investigado por: 2019-09-24

É falso que Davi Alcolumbre tenha ameaçado paralisar reforma da Previdência se houver protesto pela CPI da Lava Toga no dia 25

  • Falso
Falso
Em evento, o presidente do Senado mencionou uma possível paralisação das reformas. Ele, porém, não o fez em tom de ameaça e nem se referia às manifestações do dia 25, mas a uma hipotética decisão da maioria dos brasileiros

É falso que o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), ameaçou paralisar a aprovação da reforma da Previdência se houver manifestação, no dia 25 de setembro, a favor da instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar integrantes do Supremo Tribunal Federal — batizada como CPI da Lava Toga.

O texto viralizado utiliza um tuíte que atribui ao senador a fala: “se os brasileiros se manifestarem pela CPI da Lava Toga, a gente para as reformas”, que teria como fonte o Broadcast, serviço de notícias ao vivo do Grupo Estado.

No entanto, nem o tuíte nem o material publicado pelo Broadcast fazem menção às manifestações que estão sendo chamadas para esta quarta-feira (25). Apesar de ter, de fato, abordado uma possível paralisação das reformas, o presidente do Senado não se referia às manifestações, mas a uma decisão da maioria dos brasileiros.

O Comprova teve acesso ao áudio completo do evento “E agora, Brasil?”, realizado na quinta-feira, 19 de setembro, no qual Alcolumbre falou a jornalistas que seria preciso decidir o que é prioritário para o país: a reforma da Previdência ou a instauração da CPI. As declarações a seguir podem ser ouvidas aos 3:07 e 4:17 deste arquivo de áudio e se referem ao trecho do evento a que o Broadcast faz menção e que foi publicado no Twitter.

“Se o Brasil escolher, se tiver uma enquete, e os 200 milhões de brasileiros pedirem a CPI da Lava Toga, que é uma injustiça pelo nome, a gente para as reformas.(…) Qual é prioridade dos brasileiros? Eu acho que é a reforma da Previdência. Ou 120 dias de uma CPI no Senado não vai paralisar o Senado?”

O Comprova verificou o conteúdo de um texto do site Movimento Avança Brasil.

Falso para o Comprova é um conteúdo divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.

Como verificamos

O texto viralizado usa como fonte um tuíte do perfil do empresário Henrique Bredda, no qual consta: “Se os brasileiros se manifestarem por CPI da Lava Toga, a gente para as reformas – Broadcast 19/9”.

Primeiramente o Comprova buscou pelo termo Alcolumbre no site do Broadcast e chegou a um texto do dia 19, referente a evento “E agora, Brasil?”, do qual Alcolumbre participou e que foi realizado pelo jornal Valor Econômico e pelo jornal O Globo, em Brasília. O texto, no entanto, não mencionava manifestações ou paralisação das reformas.

A única referência ao tema era o seguinte trecho: “Alcolumbre reforçou ser contra a criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar o STF, a chamada CPI da Lava-Toga”.

O Comprova entrou então em contato com Daniel Weterman, jornalista do Broadcast responsável pelo texto, e com o autor do tuíte, Henrique Bredda. O último enviou uma foto da mensagem recebida pelo Broadcast Político, serviço de cobertura em tempo real disponível apenas para assinantes, na data referida.

Já o jornalista confirmou o envio da mensagem, porém destacou que Alcolumbre não fez nenhuma menção às manifestações do dia 25 – o que o Comprova pôde verificar ao ouvir o áudio com a gravação do evento.

Você pode refazer o caminho da verificação do Comprova usando os links para consultar as fontes originais ou visualizar a documentação que reunimos.

O que é a CPI da Lava Toga?

Desde fevereiro deste ano, senadores buscam a instalação de uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) para investigar a atuação dos tribunais superiores, que ficou conhecida como CPI da Lava Toga. O primeiro requerimento de instalação foi feito em fevereiro pelo senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE).

O objetivo da CPI é responsabilizar juízes togados (juiz com formação jurídica obrigatória, ocupante do cargo em caráter vitalício), especialmente do Supremo Tribunal Federal (STF), suspeitos de crimes e irregularidades. Se comprovados esses desvios, os ministros podem ser afastados do cargo, uma vez que o Senado é o único órgão que pode pedir o impeachment de integrantes do Supremo.

Como a CPI da Lava Toga envolve o Senado?

Desde então, senadores tentam instalar a CPI, que depende do apoio de ao menos 27 parlamentares da Casa (de um total de 81), além do aval do presidente do Senado, Davi Alcolumbre, que não é favorável à ideia. Movimentos de apoio à Operação Lava Jato defendem a iniciativa, mas os filhos do presidente Jair Bolsonaro, em especial o senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), têm atuado para barrar seu avanço.

Desde o início do ano, Alcolumbre tem segurado reiterados requerimentos para criação da comissão parlamentar de inquérito.

No evento da última quinta, o presidente do Senado foi claro ao se posicionar, mais uma vez, contrariamente à criação da CPI da Lava Toga. Como a Folha noticiou, o presidente do Senado afirmou: “Continuo me manifestando contrário a ela [a CPI]. Precisamos ter consciência do momento que estamos vivendo. Eu sou contrário, acho que o Brasil não precisa disso. O Brasil espera muito mais que uma CPI para enfraquecer as instituições, porque, no final, isso é para enfraquecer todos nós”.

Quais os últimos acontecimentos referente à CPI da Lava Toga?

Na semana passada, Flávio Bolsonaro pediu para colegas não apoiarem a CPI. Ele foi o único dos quatro senadores do PSL que não assinou a petição pela abertura da comissão, o que gerou uma cisma dentro do partido. O deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) compartilhou em suas redes, no dia 15 deste mês, um vídeo da youtuber Paula Marisa contra a instalação da CPI.

Segundo a senadora Juíza Selma (Podemos-MT), que deixou o PSL na semana passada, tanto Alcolumbre quanto Flávio Bolsonaro teriam pedido que ela retirasse sua assinatura do requerimento que solicita a criação da CPI.

Nas redes sociais, está sendo convocada manifestação em favor à CPI, a ser realizada no dia 25 de setembro, em Brasília. Entre as pautas aparecem também o apoio à Lava Jato e o veto à lei de abuso de autoridade.

Parlamentares dizem que a resistência da família Bolsonaro se deve a um acordo com o Supremo. Em julho, o ministro Dias Toffoli suspendeu todas as investigações criminais que usam dados do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) e de outros órgãos de controle. O pedido havia sido feito pela defesa de Flávio no caso “Queiroz”, que apura irregularidades supostamente cometidas pelo filho de Jair Bolsonaro quando Flávio era deputado estadual no Rio de Janeiro, além de funcionários do seu gabinete na Alerj, sendo Fabrício Queiroz o mais célebre deles.

Votação da Previdência

Nesta terça, 24 de setembro, Alcolumbre decidiu adiar a votação do primeiro turno da reforma da Previdência para a próxima semana. No horário em que o tema seria votado, ele reuniu líderes partidários e foi ao STF (Supremo Tribunal Federal) conversar com o presidente do Judiciário, Dias Toffoli, para apresentar um recurso à decisão do ministro Luís Roberto Barroso que, na semana passada, determinou busca e apreensão em endereços do líder do governo no Senado, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE).

Com o novo adiamento, a PEC só deve ser apreciada na CCJ e, em primeiro turno, no plenário, na terça-feira (1º de outubro). O segundo turno, inicialmente programado para 10 de outubro, agora está previsto para um elástico prazo de “primeira quinzena de outubro”.

Repercussão nas redes

O Comprova verifica conteúdos duvidosos sobre políticas públicas do governo federal que tenham grande potencial de viralização.

Esta checagem verificou texto do site Movimento Avança Brasil, que teve até o dia 23 de setembro mais de 63 mil interações, sendo 12,5 mil compartilhamentos e 22,8 mil comentários.

Eleições

Investigado por: 2019-09-19

Mudanças na lei eleitoral não valerão para 2020 se Bolsonaro aguardar até o fim do prazo para vetos

  • Evidência comprovada
Evidência comprovada
É verdade que, se o presidente da República aguardar até o final do prazo para vetar o projeto que altera lei eleitoral, a eleição de 2020 será disputada com as regras atuais

Um tuíte que viralizou nas redes sociais sugere ao presidente Jair Bolsonaro (PSL) engavetar o projeto de lei 5029/19 —aprovado nesta quarta-feira, 18 de setembro, pela Câmara dos Deputados— e, no último dia do prazo, vetá-lo totalmente. Dessa forma, segundo a postagem, “Rodrigo Maia não vai ter tempo de derrubar o seu veto e a lei não vai valer na próxima eleição”.

É verdade que, se Bolsonaro esperar até o último dia do prazo para vetar a lei, as regras aprovadas não valerão para as eleições municipais de 2020. Isso ocorreria mesmo se o Congresso (formado por Câmara e Senado) decidisse derrubar o veto, porque, para valer nas eleições municipais do ano que vem, qualquer medida legislativa sobre as regras eleitorais tem de estar em vigor antes de 4 de outubro deste ano.

No entanto, mesmo que Bolsonaro vetasse o projeto com tempo hábil para o Congresso decidir sobre a medida antes do dia 4, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, não poderia derrubar o veto sozinho, como indica o tweet verificado. Nem mesmo a própria Câmara poderia sozinha derrubar o veto. Apenas uma sessão conjunta da Câmara e do Senado pode apreciar e deliberar sobre o veto presidencial.

O Comprova verificou o conteúdo de um tuíte publicado pelo perfil @VemPraRua_br.

Evidência comprovada para o Comprova é quando a veracidade de um conteúdo é confirmada sem que reste margem de dúvida.

Como verificamos

Para verificar esta publicação, o Comprova conferiu a regras de tramitação legislativa na Constituição Federal e textos explicativos sobre o veto no site do Congresso.

Além disso, verificamos o status do projeto de lei na ficha de tramitação e se ele constava na lista de matérias aguardando sanção presidencial.

Você pode refazer o caminho da verificação do Comprova usando os links para consultar as fontes originais ou visualizar a documentação que reunimos.

Quanto tempo o presidente tem para vetar um projeto de lei?

O prazo para o presidente sancionar ou vetar um projeto de lei é de 15 dias úteis, contando a data do recebimento do PL pela Presidência.

Apesar de ter sido aprovado pela Câmara nesta quarta (18), o projeto precisa ser oficialmente enviado à Presidência para que o prazo de 15 dias comece a contar, o que ainda não aconteceu.

Esse prazo está definido no primeiro parágrafo do artigo 66 da Constituição Federal.

Se o projeto fosse recebido pelo presidente ainda nesta quinta (19), ele teria até o dia 9 de outubro para sancioná-lo, vetá-lo ou vetá-lo parcialmente.

É verdade, portanto, que, caso o presidente espere até o último dia do prazo para veto, o Congresso não terá tempo de derrubá-lo e fazer com que a lei em questão esteja valendo nas eleições de 2020.

Segundo a ficha de tramitação do PL, ele ainda está “Aguardando envio ao Poder Executivo”. Tampouco ele consta na página das matérias que estão aguardando sanção presidencial.

Quem pode derrubar o veto do presidente?

Se o presidente vetar parcialmente a lei, os trechos vetados voltam para análise do Congresso Nacional, que tem então até 30 dias corridos para analisá-los, em sessão conjunta da Câmara e do Senado. Já os trechos sancionados são publicados e viram lei.

Caso os vetos sejam mantidos, a lei fica como saiu da Presidência. Caso sejam derrubados, os trechos antes vetados passam a integrar a lei.

Para que o veto do presidente seja rejeitado, é necessária a maioria absoluta dos votos de deputados e senadores, ou seja, 257 votos de deputados e 41 votos de senadores, computados separadamente.

Além disso, não caberia ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia, convocar uma sessão conjunta. Apenas o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), pode convocá-la.

Segundo o regimento do Congresso, caso seja convocada uma sessão conjunta, ela deve ocorrer na terceira terça-feira do mês ou na terça-feira seguinte à convocação.

Além disso, se os vetos presidenciais forem rejeitados pelo Congresso, o presidente ainda tem o prazo de até 48 horas para promulgar a lei. E, caso não promulgue nesse prazo, a promulgação pode ser feita pelo presidente do Senado.

Contexto

O tuíte acompanhado da hashtag “VetaBolsonaro” faz referência ao projeto de lei 5029/19, aprovado nesta quarta, 18 de setembro, pela Câmara dos Deputados, que afrouxa o controle sobre o uso das verbas públicas pelos partidos.

Entre as medidas aprovadas pela Câmara estão a permissão da contratação de consultoria contábil e advocatícia para ações de interesse partidário relacionadas exclusivamente ao processo eleitoral, sem que isso conte para o limite de gastos das campanhas.

Pessoas físicas também poderão bancar esses gastos em valores superiores às doações eleitorais que podem fazer hoje. Segundo especialistas, isso amplia as brechas ao caixa dois.

Em carta aberta, mais de 20 entidades da sociedade civil pediram a Maia que barrasse os principais pontos do projeto. O texto afirma que a proposta representa “um dos maiores retrocessos dos últimos anos para transparência e integridade do sistema partidário brasileiro”.

Essa pressão havia levado o Senado a rejeitar praticamente a integralidade do projeto, na terça-feira. No entanto, um dia depois, a Câmara reabilitou diversos pontos rejeitados pelo Senado, apesar de ter abandonado algumas das principais polêmicas que constavam da versão original do projeto.

Repercussão nas redes

O Comprova verifica conteúdos duvidosos sobre políticas públicas do governo federal que tenham grande potencial de viralização.

A postagem no perfil do Vem Pra Rua Brasil no Twitter teve, até o dia 19 de setembro, 2,2 mil curtidas e mais de 800 compartilhamentos.

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