O Projeto Comprova é uma iniciativa colaborativa e sem fins lucrativos liderada pela Abraji e que reúne jornalistas de 42 veículos de comunicação brasileiros para descobrir, investigar e desmascarar conteúdos suspeitos sobre políticas públicas, eleições, saúde e mudanças climáticas que foram compartilhados nas redes sociais ou por aplicativos de mensagens.
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Política

Investigado por: 2019-08-26

É enganosa publicação que associa, sem evidências, ONGs da Amazônia à exploração de riquezas minerais

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Enganoso
Embora o Ipea relacione cerca de 102 mil ONGs que atuam na Amazônia (número que inclui desde associações de moradores e centros comunitários até organizações de defesa de direitos de grupos e minorias, meio ambiente e proteção animal) não é possível atribuir a elas interesse na exploração das riquezas minerais da região

É enganosa uma publicação compartilhada no Facebook e no Twitter que sugere, sem evidências, que mais de 100 mil organizações não governamentais (ONGs) que atuam na região amazônica estariam interessadas não na “floresta”, mas nos minérios presentes na área.

Por lei, ONGs são entidades sem fins lucrativos e não podem obter autorização para exploração mineral.

Há divergências quanto ao total de ONGs na Amazônia. O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) estima que existam 102 mil entidades da sociedade civil registradas em municípios da Amazônia Legal. Já o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) calcula um número bem mais baixo: 15,9 mil.

As diferenças entre os dados se dão por causa de metodologias diferentes: enquanto o Ipea usa uma base maior, do Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ), o IBGE se vale de um recorte menor, do Cadastro Central de Empresas (Cempre).

Se considerarmos o estudo do Ipea, o post nas redes sociais acerta o número de ONGs com sede na Amazônia. No entanto, a publicação erra ao dizer que a fonte da informação são “levantamentos do Exército Brasileiro e da ABIN”. De acordo com a assessoria do Ministério da Defesa, o “tema não pertence ao escopo da atuação desta pasta”.

De acordo com o Mapa das Organizações da Sociedade Civil do Ipea, o número de ONGs que tem atuação em áreas relacionadas à mineração é muito pequeno: 145 em todo o país, sendo 14 em estados que compõem a Amazônia Legal. É importante destacar que essas entidades não trabalham diretamente na exploração de minérios, e têm papel de representar associações de mineradores.

A publicação também alega que há abundância de mais de 14 tipos de minérios na Amazônia, mas, segundo o chefe do Departamento de Recursos Minerais do Serviço Geológico do Brasil (CPRM), Marcelo Esteves Almeida, nem todos têm potencial de exploração comprovado. De acordo com Almeida, avaliar o potencial de exploração de certos minerais na região, como paládio e ródio, ainda depende de mais estudos.

O Comprova verificou informações publicadas no perfil @Luis_Roberto04 no Twitter e em um perfil pessoal no Facebook.

Enganoso para o Comprova é o conteúdo que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde ou que seja divulgado para confundir, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Como verificamos

Para analisar o conteúdo que viralizou, o Comprova acessou o Mapa das Organizações da Sociedade Civil, do Ipea, e o estudo As Fundações Privadas e Associações sem Fins Lucrativos no Brasil (Fasfil), do IBGE. Também consultamos os especialistas Janine Mello, coordenadora do Mapa das Organizações da Sociedade Civil, e Marcelo Esteves Almeida, chefe do Departamento de Recursos Minerais do CPRM. Analisamos ainda legislação sobre autorização de exploração mineral e sobre constituição de organizações da sociedade civil.

Você pode refazer o caminho da verificação do Comprova usando os links para consultar as fontes originais ou visualizar a documentação que reunimos.

Quantas ONGs existem na Amazônia?

O Ipea calcula que existam 102.080 entidades da sociedade civil com sede em municípios da Amazônia Legal. Esse número representa 12,4% do total de ONGs do país, 820.186. O IBGE, por sua vez, estima que sejam 236.950 fundações privadas e associações sem fins lucrativos, sendo 15.919 (6,7%) em estados que compõem a Amazônia Legal.

A discrepância entre os dados do IBGE e do Ipea está explicada nesta nota técnica. Os dois institutos de pesquisa utilizam bases de dados diferentes; o mapa do Ipea faz um recorte mais amplo. Enquanto o IBGE utiliza o Cadastro Central de Empresas (Cempre), o Ipea parte do Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ), da Secretaria da Receita Federal (SRF), como um todo e de outras 14 fontes de dados auxiliares.

Apesar dos números absolutos divergirem, a proporção de ONGs encontradas nas duas pesquisas em relação ao universo total de empresas é parecido: 4,69% no caso do IBGE e 4,09% no Ipea. Além disso, ambas as pesquisas adotam critérios parecidos para classificar ONGs, baseados na Classification of the Purposes of Non-Profit Institutions Serving Households (COPNI), da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

Estes são os cinco elementos para definir uma ONG: são privadas e não estão vinculadas jurídica ou legalmente ao Estado; não possuem finalidades lucrativas; são legalmente constituídas; são autoadministradas e gerenciam suas próprias atividades de modo autônomo; são constituídas de forma voluntária por indivíduos.

Perfil das ONGs na Amazônia

A pedido do Comprova, o Ipea levantou o perfil das organizações de sociedade civil com sede em municípios que compõem a Amazônia Legal (lista completa das cidades aqui).

As entidades não governamentais sediadas na região representam 12,4% das organizações da sociedade civil em atividade no Brasil. A região Norte, onde fica a maior parte da Amazônia Legal, tem 3,8 ONGs a cada mil habitantes, índice abaixo da média nacional (4/mil hab.). O Sul é a região com maior número de ONGs por pessoa (5,4/mil hab.).

Dentre as entidades sediadas na Amazônia Legal, 50.662 (49,6%) atuam na categoria “defesa de direitos e interesses”, nomenclatura mais ampla que inclui associações de moradores, centros comunitários e organizações de defesa de direitos de grupos e minorias, meio ambiente e proteção animal. Essa forma de organização também é majoritária no restante do país (41,3% do total de ONGs).

O segundo tipo de ONG mais frequente na Amazônia é a religiosa, com 19.320 entidades (18,9%). A proporção regional é menor do que a nacional (25,4%). Segundo a pesquisadora do Ipea Janine Mello, é comum no Norte do país que essas organizações também se dediquem a temas relacionados à saúde, especialmente dos povos indígenas.

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O Ipea também registra os recursos federais recebidos por entidades da sociedade civil. Na Amazônia, esse aporte representou 5,7% do total do valor destinado a ONGs pelo governo entre 2010 e 2018. Apenas 3.626 (0,03% do total da Amazônia) entidades da região obtiveram verba federal, no valor de R$ 6,8 bilhões. Como mostra o gráfico, a destinação de recursos a entidades na Amazônia tem diminuído ao longo dos anos.

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Janine ressalta que o mapeamento mostra apenas entidades registradas em municípios da Amazônia Legal. Ainda não existe um estudo detalhado sobre a atuação de organizações internacionais em território brasileiro. Geralmente, essas entidades estão sediadas no Sudeste, afirma a pesquisadora.

Quais ONGs têm interesse em minérios?

É possível fazer consultas no Mapa das Organizações da Sociedade Civil do Ipea por nome da organização. O Comprova buscou palavras-chaves como “mineração”, “minérios”, “minerais”, “mineradores” e “mineradoras” para estimar quantas entidades não governamentais se dedicam ao assunto. Encontramos apenas 145 organizações que atendiam a essa descrição em todo o país, excluindo clubes de moradores com nomes similares, associações de artesãos de minérios e associações de empresas de água mineral ou suplementos minerais.

Do total, apenas 14 têm sede em estados que compõem a Amazônia Legal. A maioria (36 ONGs) está em Minas Gerais, onde há indústria de extração de minério. As entidades que mapeamos na Amazônia são, principalmente, associações regionais de mineradores e de representação de empresas que trabalham na área de mineração.

Apesar de essas organizações se dedicarem a temas relacionados a minérios, elas não podem obter autorização de exploração mineral, devido à sua natureza jurídica — são entidades sem fins lucrativos, e não empresas. “Organizações sem fins lucrativos não podem ter concessão federal para fazer extração de minério”, explica a pesquisadora Janine Mello.

De acordo com a ouvidoria da Agência Nacional de Mineração (entidade que regula a exploração de minérios no país), para uma pessoa jurídica requerer autorização para uma pesquisa mineral, é preciso ser uma empresa legalmente habilitada, com registro na Junta Comercial. Também é possível que pessoas físicas façam esse requerimento (por exemplo, garimpeiros) — neste caso, é necessário ser pessoa natural do Brasil. Esses requisitos estão no decreto-lei 227.

As ONGs precisam atender a certas exigências para serem registradas no Brasil, entre eles o de “não possuir finalidades lucrativas”, como explica este estudo do Ipea. O Código Civil define o empresário como “quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços”.

Para existir, uma ONG precisa ter inscrição no CNPJ, mas, como é proibido buscar lucros, a atividade de extração mineral é incompatível com a sua atuação.

Esta cartilha do Observatório do Terceiro Setor explica melhor o papel das ONGs no território brasileiro. São entidades de livre associação que existem para influenciar agendas públicas e exercer controle social. Embora algumas dessas organizações desenvolvam trabalhos de assistência à população, as ONGs não têm o objetivo de substituir o trabalho do Estado.

Os formatos de pessoas jurídicas privadas em que elas se enquadram no Código Civil são os de associações e fundações, previstos no segundo e no terceiro capítulos da legislação. De acordo com o artigo 53, “constituem-se as associações pela união de pessoas que se organizem para fins não econômicos”. Conforme uma publicação da Associação Brasileira de Organizações não Governamentais (Abong), elas podem comercializar produtos ou serviços, mas não podem exercer exclusivamente essa atividade ou fazer dela a sua única finalidade.

O artigo 62 estabelece as possibilidades de atuação das organizações: assistência social; cultura, defesa e conservação do patrimônio histórico e artístico; educação; saúde; segurança alimentar e nutricional; defesa, preservação e conservação do meio ambiente e promoção do desenvolvimento sustentável; pesquisa científica, desenvolvimento de tecnologias alternativas, modernização de sistemas de gestão, produção e divulgação de informações e conhecimentos técnicos e científicos; promoção da ética, da cidadania, da democracia e dos direitos humanos; e atividades religiosas.

Recursos minerais na Amazônia

A publicação afirma que o subsolo da Amazônia é rico em “cassiterita, paládio, ródio, tungstênio, zircônio, titânio, linhito, nióbio, tântalo, columbita, cromo, ouro, diamante e urânio, etc.”.

De acordo com o geólogo do CPRM Marcelo Esteves Almeida, há locais na Amazônia onde já é realidade a exploração de recursos minerais como cassiterita (em Pitinga, no Amazonas, e no centro-norte de Rondônia), ouro (no oeste de Roraima, e em Tapajós e Carajás, no Pará), cobre (Carajás), urânio (Pitinga), nióbio-tântalo (Pitinga) e diamante (norte de Roraima).

Um exemplo de destaque é a província mineral de Carajás, no Pará. Segundo este artigo do geólogo Breno Augusto dos Santos — responsável pela descoberta de jazidas de ferro na região em 1967 — as 18 bilhões de toneladas de minério encontradas representam “maior concentração de alto teor já localizada no planeta”. Além do ferro, metais como cobre, zinco, manganês e ouro também são encontrados na região.

No entanto, segundo Marcelo Esteves Almeida, são necessários mais estudos para determinar o potencial de exploração mineral em outras áreas da Amazônia. “As pesquisas estão ainda muito aquém da importância e do tamanho dessa região. Apesar dos esforços recentes, dificuldades logísticas e o custo das expedições científicas têm dificultado bastante o avanço do conhecimento nas últimas décadas”, disse Almeida.

Repercussão nas redes

O Comprova verifica conteúdos duvidosos sobre políticas públicas do governo federal que tenham grande potencial de viralização.

A publicação foi feita no Facebook no dia 15 de agosto e, no dia 22, tinha 1,8 mil compartilhamentos, 987 curtidas e 81 comentários. No Twitter, havia 1,9 mil retweets e 5,9 mil curtidas. O mesmo texto foi usado em diversas publicações nas redes sociais desde então.

Contexto

O presidente Jair Bolsonaro demonstrou publicamente em mais de uma ocasião desconfiança em relação às organizações da sociedade civil. Mais recentemente, ele acusou — sem provas — ONGs que recebem recursos do exterior de estarem por trás das queimadas na floresta amazônica. Para ele, o objetivo seria fazer uma “campanha” contra o governo.

Em agosto, o presidente criticou o ministro das Relações Exteriores da França, Jean-Yves Le Drian, por ele ter participado de reuniões com ONGs quando visitou o Brasil. “O que ele veio tratar com ONG aqui? Quando fala em ONG, já nasce um sinal de alerta”, disse Bolsonaro.

Quando fez acusações contra o ex-diretor do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) Ricardo Galvão, o presidente também tentou associá-lo a ONGs. “No nosso sentimento, isso (dados sobre desmatamento) não condiz com a realidade. Até parece que ele (Ricardo Galvão) está a serviço de alguma ONG, que é muito comum”, afirmou Bolsonaro em julho.

O presidente também atacou entidades estrangeiras durante um discurso em visita a Bahia, em julho. Na ocasião, ele disse que a baía de Angra “fatura quase zero” em turismo por causa dos “xiitas ambientais”. “Eu não sei por que essa gente tem tanto amor por ONGs estrangeiras. O Estado está aparelhado. Não temos preconceito contra ninguém, mas temos uma profunda repulsa por quem não é brasileiro.”

No início do ano, o então ministro da Secretaria do Governo, Carlos Alberto dos Santos Cruz, disse que a administração federal pretendia fazer um levantamento sobre o número de ONGs em atuação no país para, em um segundo momento, “otimizar” o repasse de verbas públicas a essas entidades.

De acordo com o Ipea, de 2010 e 2018, foram repassados R$ 6,8 bilhões em recursos federais a organizações sediadas na Amazônia Legal. Esse valor equivale a 5,74% do total empenhado do Orçamento Geral da União para OSCs, que foi de R$ 118,5 bilhões no período. Essa verba atendeu a 22.214 organizações nesses oito anos, das quais 3.626 eram na Amazônia Legal. “Em 2010, o valor repassado para a Amazônia Legal foi de R$ 1,4 bilhão. Esse valor cai para R$ 338 milhões em 2018”, enfatizou a pesquisadora Janine Mello.

Política

Investigado por: 2019-08-23

Vídeo em que indígena chora por incêndio é de julho e foi gravado em Minas Gerais e não na Amazônia

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Enganoso
As descrições segundo as quais a gravação tem relação com as queimadas na região amazônica são enganosas, pois o vídeo foi feito na aldeia Naô Xohã, na região metropolitana de Belo Horizonte, Minas Gerais

São enganosas as descrições que apontam um vídeo de uma mulher indígena chorando como se fosse relacionado a incêndios recentes na Amazônia. A gravação original foi feita durante um incêndio, de fato, mas no início de julho de 2019, na aldeia Naô Xohã, na região metropolitana de Belo Horizonte, em Minas Gerais.

A própria mulher que aparece no vídeo, Celia Ãngohó, afirmou ao Comprova que o incêndio presenciado por ela ocorreu entre os dias 6 e 7 de julho, no município mineiro de São Joaquim de Bicas. Segundo Celia, que é porta-voz e esposa do cacique da aldeia, à época havia indícios de que o incêndio foi criminoso, pois havia sido encontrada uma garrafa plástica com cheiro de combustível no local após o Corpo de Bombeiros ter controlado o fogo.

A TV Record Minas fez uma matéria sobre o ocorrido em julho. Segundo a produção da emissora, que conversou com o Comprova, o vídeo foi enviado à equipe de reportagem por um homem da aldeia, identificado como Lindomar. Celia Ãngohó também afirmou que enviou o vídeo que ela gravou a Lindomar, para que ele divulgasse à imprensa. O Comprova entrou em contato com ele por telefone, mas não teve resposta até a publicação desta verificação.

Durante o vídeo, Celia cita a mineradora Vale, responsável pela barragem da Mina do Córrego do Feijão, em Brumadinho. Isso porque a mesma aldeia mostrada no vídeo foi afetada no início do ano pelo rompimento da barragem. Uma nota da ONG Instituto Socioambiental (ISA), que acompanhou o caso, afirma que o rio usado pela comunidade foi poluído pelos rejeitos do acidente.

Esta verificação do Comprova investigou informações divulgadas pelas páginas Direita Cambé/PR, Catraca Livre e Sunrise Movement, que compartilharam o vídeo sem o contexto correto no Facebook e no Twitter entre os dias 20 e 21 de agosto.

Como verificamos

Para fazer esta verificação, o Comprova analisou os comentários de três publicações com o vídeo, no Facebook e no Twitter. Em uma delas, na página Quebrando o Tabu (que tirou o vídeo do ar nesse meio tempo), foi localizado um comentário que afirmava que a gravação, na verdade, se tratava de um incêndio em Brumadinho.

A partir disso, o Comprova buscou as palavras-chave “incêndio” e “Brumadinho” no Google e identificou duas matérias do portal R7, que pertence à emissora Record, sobre o ocorrido.

Em seguida, o Comprova entrou em contato com integrantes da equipe de jornalismo da TV Record Minas. Por meio deles, conseguimos o contato da mulher que aparece no vídeo, a indígena Celia Ãngohó, com quem o Comprova conversou por telefone.

Foram também consultadas a Procuradoria da República em Minas Gerais, a Polícia Federal, e a Fundação Nacional do Índio (Funai), hoje ligada ao Ministério da Justiça, chefiado por Sergio Moro. A última não respondeu. Os quatro órgãos enviaram autoridades ao local para apurar a origem do fogo.

O Comprova enviou também o vídeo viralizado para um servidor, de um dos órgãos, que pediu para não ser identificado e que esteve no local. Ele confirmou a identidade de Celia, que é esposa do cacique da aldeia Naô Xohã.

Outros materiais consultados pelo Comprova foram a nota do ISA sobre o caso e reportagens da Record Minas na TV e na internet.

Você pode refazer o caminho da verificação do Comprova usando os links para consultar as fontes originais ou visualizar a documentação que reunimos.

A origem do vídeo

Ao Comprova, Celia Ãngohó confirmou, por telefone, que é a mesma mulher que aparece no vídeo que viralizou e que ele foi gravado em 6 de julho, e não em agosto. A gravação também se refere à sua aldeia, em Minas Gerais, e não a alguma terra na região amazônica.

A origem e a data do vídeo foram também confirmadas pela Procuradoria da República em Minas Gerais. A Polícia Federal, por email, afirmou que esteve em São Joaquim de Bicas.

“Me disseram que [nas redes sociais] estão usando o vídeo com minha fala para fazer campanha em defesa da Amazônia”, disse Ãngohó ao Comprova. “Mas foi um incêndio que aconteceu na minha aldeia. Fico triste porque é um vídeo com milhares de visualizações e não falam com a gente. Estou querendo falar da minha comunidade.”

Ao menos três links (1, 2, 3) mostram reportagens do portal R7 e da TV Record no local no dia 8 de julho, dois dias depois do incêndio denunciado por Ãngohó. As reportagens exibem e fazem referência ao mesmo vídeo que viralizou nos últimos dias. A produtora Ana Paula Pedrosa confirmou ao Comprova que fez reportagens sobre o ocorrido e que a mesma gravação viralizada nesta semana foi recebida pela produção da TV no início daquele mês.

Uma postagem no Facebook da página Mídia Ninja, do dia 7 de julho, e uma nota da ONG Instituto Socioambiental, de 12 de julho, também confirmam que o vídeo existia antes de agosto, mês em que o número de notícias sobre o aumento das queimadas na Amazônia se intensificou. A nota da ONG também confirma a referência à aldeia Naô Xohã, em São Joaquim de Bicas, e não alguma cidade da Amazônia.

A origem do incêndio

Uma das postagens analisadas pelo Comprova, publicada na quarta-feira, 21 de agosto, no Facebook pela página Direita Cambé/PR, divulgou o vídeo do incêndio ocorrido em julho, na aldeia Naô Xohã, afirmando que a “suspeita do presidente [Jair Bolsonaro] pode ser confirmada” e fez referência a “canalhas que querem destruir o governo”.

A Procuradoria da República, que esteve no local para apurar o fogo, enviou ao Comprova um relatório sobre a visita à aldeia Naô Xohã após o incêndio.

Ao Comprova, Ãngohó não mencionou ONGs e afirma que não sabe quem causou o incêndio na aldeia onde vive, ainda que acredite que o fogo tenha origem criminosa. Para ela, o incêndio foi provocado com o objetivo de expulsar os indígenas do local. A terra onde vive não é demarcada, e por isso a comunidade enfrenta constantes conflitos pelo território, segundo ela. A ocupação indígena recente do lugar — eles estão lá há dois anos — agrava o problema.

“A gente tem três turnos de vigília durante a noite, e temos preparo de bota, luva, máscara [para apagar incêndios]”, diz Ãngohó. “A comunidade está apreensiva, vivemos com medo.” Segundo ela, em agosto houve mais incêndios no local. “A gente sabe que é para intimidar.”

Após queimadas na Amazônia nos últimos dias, Bolsonaro insinuou, na quarta-feira (21), sem apresentar provas, que organizações não-governamentais (ONGs) baseadas na floresta poderiam ter provocado o fogo para atingir a gestão federal, uma vez que deixaram de receber recursos do Executivo assim que o candidato do PSL chegou ao Planalto.

A comunidade Naô Xohã fica em um imóvel da Companhia de Mineração Serra Azul (Comisa), subsidiária da Vale. Segundo a Procuradoria da República de Minas Gerais, a área está em processo de regularização fundiária, e o poder público não produziu os relatórios de identificação e delimitação (necessários no processo de demarcação da terra, se ocorrer).

A Procuradoria afirmou ainda, por email, que, à época do incêndio, o órgão foi informado de que indígenas pataxó e pataxó hã-hã-hãe relataram terem visto pessoas desconhecidas rondando a aldeia, efetuado disparos de arma de fogo e provocado um incêndio na mata. Eles recomendaram o contato com a Polícia Federal para informações sobre a investigação.

A Polícia Federal, por sua vez, afirmou ao Comprova que “efetuou diligências preliminares” no local, mas que não comenta investigações em curso. Um inquérito registrado como nº 818/2019 foi instaurado, mas o caso não foi concluído.

Contexto

O Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) registrou em 2019 o maior número de focos de queimada dos últimos cinco anos no Brasil. Foram 75,3 mil ocorrências entre 1º de janeiro e 21 de agosto de 2019, 85% a mais do que no mesmo período do ano passado. Apenas no bioma da Amazônia foram registrados 65,1% dos focos de incêndio.

O número de queimadas também aumentou em relação aos últimos cinco meses. Em agosto, até o dia 21, foram 36,7 mil focos no Brasil, aumento de 175% em relação a julho. Apenas no dia 17 deste mês foram identificadas 2,6 mil ocorrências de incêndios.

Focos de incêndio na Amazônia: https://public.flourish.studio/visualisation/615873/

 

Os dados são do Programa Queimadas, do Inpe, que monitora incêndios florestais por meio de satélites. Os números podem ser consultados aqui e aqui.

No início de agosto, o governo do Amazonas decretou situação de emergência no sul do Estado e na região metropolitana de Manaus por causa do impacto negativo do desmatamento e de queimadas ilegais. O objetivo do decreto é agilizar ações de combate aos focos de incêndio nas regiões mais críticas.

A Secretaria de Estado do Meio Ambiente (Sema) do Amazonas compilou, de janeiro a julho de 2019, 1.699 focos de calor no Estado. A maioria (80%) ocorreu em julho, quando começa o período de estiagem.

O aumento das queimadas acontece em meio à alta do desmatamento na região amazônica. De acordo com medições do sistema Deter, do Inpe, houve salto de 278% nos alertas de desmate de julho de 2019 em relação ao mesmo mês do ano passado.

Monitoramento independente da organização não-governamental (ONG) Imazon também indica tendência de aumento: alta de 66% em julho deste ano em comparação com o mesmo período do ano passado.

Repercussão nas redes

O Comprova verifica conteúdos duvidosos sobre políticas públicas do governo federal que tenham grande potencial de viralização.

A postagem no Facebook da página Direita Cambé teve 201 mil visualizações e mais de 14 mil compartilhamentos até o dia 23 de agosto. No Twitter, a publicação do perfil Sunrise Movement somava 7,7 milhões de visualizações e mais de 139 mil retweets na mesma data. Uma publicação do site Catraca Livre sobre o tema foi compartilhada em sete páginas no Facebook e no Twitter com cerca de 600 interações no total. Outros perfis pessoais no Twitter e no Facebook também compartilharam o vídeo, somando mais visualizações.

Outras postagens

A situação na Amazônia causou comoção internacional: segundo o professor da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) Fábio Malini, que pesquisa ciência de dados e redes sociais, foram 10,2 milhões de tuítes sobre o assunto ao longo de sete dias, 4,3 milhões apenas em 22 de agosto.

As manifestações nas redes sociais, no entanto, frequentemente se utilizaram de fotos fora de contexto. Personalidades públicas como o presidente da França, Emmanuel Macron, a cantora Madonna, o ator Leonardo diCaprio, o jogador de futebol Cristiano Ronaldo e a modelo Gisele Bündchen compartilharam imagens antigas da floresta queimando.

Usuários das redes sociais também amplificaram registros feitos em outros lugares, como Ribeirão Preto, em São Paulo, Malibu, na Califórnia, e Jabalpur, na Índia.

Várias agências de checagem apontaram fotos compartilhadas fora de contexto: AFP, Agência Lupa, Aos Fatos e Estadão Verifica. O Aos Fatos também verificou as publicações mais recentes sobre o vídeo de Celia Ãngohó e a queimada na aldeia em Minas Gerais.

Saiba mais

Satélite mostra invasão de ‘rio de fumaça’ de queimadas sobre São Paulo (Folha)
Qual a relação entre fogo em florestas e o aquecimento global (Nexo)

Verificação

Investigado por: 2019-08-22

Projeto de Lei não pretende “legalizar o incesto”, mas ampliar o reconhecimento de famílias pelo Estado

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Apesar de existirem brechas no projeto, ele não seria suficiente para revogar a proibição do casamento entre pais e filhos prevista no Código Civil.

São enganosas as publicações que atribuem ao Projeto de Lei 3.369, de 2015, a intenção de “legalizar o incesto”. A proposta, de autoria do deputado federal Orlando Silva (PCdoB – SP), tem como objetivo ampliar o reconhecimento de famílias pelo Estado brasileiro, englobando, por exemplo, a adoção por casais homossexuais e os casos em que crianças são educadas por tios e avós.

Para uma especialista em Direito de Família entrevistada pelo Comprova, apesar de existirem brechas no projeto, ele não seria suficiente para revogar a proibição do casamento entre pais e filhos prevista no Código Civil.

As postagens viralizaram depois que a Comissão de Direitos Humanos e Minorias (CDHM) da Câmara dos Deputados colocou a votação do PL na pauta da quarta-feira, 21 de agosto. Após a repercussão nas redes, a proposta foi retirada da agenda para “aprimoramento do texto”.

Esta verificação do Comprova investigou informações divulgadas pelas páginas Nas Ruas e Só a Verdade, no Facebook, e pelos sites Estudos Nacionais e Jornal da Cidade Online (posteriormente editado).

Como Verificamos

Para esta checagem, o Comprova consultou a íntegra do PL 3.369/2015 e as assessorias de imprensa do autor da proposta, deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), e do relator do texto na CDHM, deputado Túlio Gadêlha (PDT-PE).

Também foram entrevistadas a presidente da Comissão de Direito de Família da OAB Pernambuco, Virgínia Baptista, a professora de Direito de Família da Universidade Federal Fluminense (UFF) Fernanda Pimentel, e o deputado Túlio Gadêlha.

Você pode refazer o caminho da verificação do Comprova usando os links para consultar as fontes originais ou visualizar a documentação que reunimos.

“Casamento entre pais e filhos”

Segundo as publicações viralizadas, o PL em questão regulamentaria o casamento entre “um pai com seu filho, o pai com a filha, mãe com filha, mãe com um filho, ou qualquer combinação entre pais e filhos”. Para justificar tal afirmativa, as postagens mencionam o artigo 2º da proposta, que estabelece:

“São reconhecidas como famílias todas as formas de união entre duas ou mais pessoas que para este fim se constituam e que se baseiem no amor, na socioafetividade, independentemente de consanguinidade, gênero, orientação sexual, nacionalidade, credo ou raça, incluindo seus filhos ou pessoas que assim sejam consideradas”.

O trecho, contudo, não faz qualquer menção a casamentos, mas a núcleos familiares.

O que dizem as especialistas

Orlando Silva e Túlio Gadêlha afirmaram que o objetivo do projeto é de ampliar a concepção de família aceita pelo Estado. Na opinião da professora de Direito de Família da Universidade Federal Fluminense (UFF) Fernanda Pimentel, essa é a interpretação mais provável.

Para a especialista, o projeto tem como objetivo regulamentar casos que já são reconhecidos em tribunais, como “quando um padrasto cria uma enteada, ou um enteado, ou um tio que crie sobrinhos”, disse, em entrevista ao Comprova.

Essa regulamentação tem diversas consequências jurídicas, como o direito à herança, a benefícios previdenciários e à dedução do dependente no Imposto de Renda, afirmou.

A professora destacou, contudo, que o Projeto de Lei traz conceitos muito abertos, o que possibilita múltiplas interpretações, inclusive a mencionada nas postagens viralizadas. “O texto, realmente, quando ele usa essa técnica das cláusulas gerais, ele o faz de maneira muito genérica. Se eu quiser, eu conduzo esse texto para uma interpretação bastante ampla, permitindo essas relações”, disse Pimentel.

Essa opinião é reforçada pela presidente da Comissão de Direito da Família da OAB Pernambuco, Virgínia Baptista. Para a advogada, o ponto do projeto que permitiria interpretações divergentes do objetivo dos autores é o uso da expressão “independentemente de consanguinidade”.

“Abre brecha, sim, para relações incestuosas, eu acho que é bem claro no texto dele. Talvez ele precisasse rever esse trecho da lei. A questão da consanguinidade é uma vedação e isso não vai poder ser superado”, afirmou em entrevista ao Comprova.

Fernanda Pimentel pontuou, contudo, que o Projeto de Lei não seria interpretado de maneira isolada, mas levando em consideração todas as outras normas e costumes da sociedade – tornando improvável a “acolhida da relação incestuosa”.

“Quando o projeto fala que a família é toda forma de união entre duas ou mais pessoas que para este fim se constituam e que se baseiem no amor, na socioafetividade, independentemente de consanguinidade, gênero e orientação, ele está transferindo para o Judiciário a possibilidade de aplicar isso ao caso concreto. Só que, diferentemente desse pânico instalado, essa interpretação não é solta. Ela é feita a partir da Constituição e do sistema jurídico vigente”, disse Pimentel.

Atualmente, o casamento entre pais e filhos e entre irmãos é proibido pelo artigo 1.521 do Código Civil. Para que o PL permitisse este tipo de relacionamento, explica Pimentel, precisaria haver uma revogação tácita do artigo, ou seja, quando se presume que a lei anterior foi revogada.

“Só que revogação tácita tem que ser reconhecida pelos tribunais. E toda orientação jurisprudencial do direito brasileiro é no sentido de valorizar esse interdito na formação da família brasileira, que é a vedação da relação incestuosa. Então, eu não creio que o projeto de lei encaminharia para a acolhida dessa relação incestuosa”, afirmou.

Autor e relator negam intenção de legalizar incesto

Em nota oficial publicada na página Vermelho.org, o deputado Orlando Silva explicou que o projeto tem como objetivo ampliar o reconhecimento de famílias pelo Estado, incluindo núcleos formados por pessoas sem laços sanguíneos.

“Quando o projeto diz ‘independentemente de consanguinidade’, está se referindo às milhares de famílias, sejam de casais héteros ou homoafetivos, formadas a partir do generoso ato da adoção legal de crianças”, disse na nota.

Em posicionamento oficial enviado ao Comprova, o deputado Túlio Gadêlha, que emitiu parecer pela aprovação do PL na Comissão de Direitos Humanos e Minorias, acrescentou que o projeto também quer o reconhecimento de “uma família formada por parentes, como avós e netos ou tios e sobrinhos, por exemplo”.

“Ter um conceito de família amplo é importante para que essas novas concepções possam ter acesso a programas sociais, por exemplo. Esse reconhecimento está em relatórios da ONU, no STF, só não houve no Legislativo”, afirmou Gadêlha em entrevista ao Comprova.

Retirado da pauta

Após a repercussão nas redes sociais, a votação do PL foi retirada da pauta desta quarta-feira pela Comissão de Direitos Humanos e Minorias.

Em nota de esclarecimento publicada no site da Câmara dos Deputados, o presidente da Comissão, Helder Salomão (PT-ES), afirmou que o projeto tem sido objeto “de interpretações distorcidas” e que por isso, a pedido do relator, retirou o PL da pauta para “aprimoramento de sua redação por meio da elaboração de substitutivo”.

Um substitutivo é um tipo de emenda que altera a proposta, recebendo este nome porque substitui o projeto original.

Em entrevista à Rádio Câmara nesta quarta-feira, 21 de agosto, o deputado Orlando Silva esclareceu que pediu que Túlio Gadêlha redigisse o substitutivo para atender às pessoas de boa fé que querem esclarecimento” e para que “não pairem dúvidas quanto aos nossos objetivos”.

Em entrevista ao Comprova, Túlio Gadêlha afirmou que pretende “continuar abrangendo todos esses formatos de família, mas excluir esse entendimento deturpado que parte da bancada evangélica tem feito”. “Eu acho importante a gente, que está nesse campo do Legislativo, ter a sensibilidade de compreender o olhar de outros parlamentares”, disse.

O deputado chegou a reconhecer que a redação do PL pode deixar em aberto interpretações divergentes, mencionando o caso da poligamia, que, segundo algumas publicações viralizadas, seria legalizada com o projeto. “De fato, o projeto, lendo-se, pode compreender uma configuração de família, como vem sendo colocado, pela poligamia. São reconhecidas como formas de família união de duas ou mais pessoas.” Apesar disso, ele enfatizou que não concorda com essa avaliação, feita também por outros parlamentares.

Tramitação do projeto

O projeto de lei foi apresentado em 21 de outubro de 2015. No ano seguinte, recebeu um parecer favorável de Jean Wyllys (PSOL-RJ), mas não foi votado.

Com o fim da legislatura passada, o PL foi arquivado, mas voltou a tramitar a pedido de Orlando Silva este ano. No dia 8 de agosto, Túlio Gadêlha apresentou o relatório pela aprovação do projeto e pela rejeição de uma emenda que usava como conceito de família “a união de um homem e de uma mulher, por meio de casamento ou de união estável, e a comunidade formada por qualquer dos pais e seus filhos”.

O projeto ainda deverá ser analisado pelas comissões de Seguridade Social e Família e de Constituição e Justiça e de Cidadania.

Comissão não tem maioria de esquerda

Ao contrário do que diz a publicação do site Estudos Nacionais, a composição da Comissão de Direitos Humanos e Minorias não tem maioria de esquerda entre os titulares. Partidos de tendências mais conservadoras têm nove indicações e os mais progressistas também têm nove nomes.

O PSL, partido do presidente Jair Bolsonaro, tem como representantes os deputados Filipe Barros (PR) e Julian Lemos (PB). Os outros integrantes do bloco são: Abílio Santana (PL-BA), Aroldo Martins (Republicanos-PR), Bia Cavassa (PSDB-MS), Delegado Éder Mauro (PSD-PA), Iracema Portella (PP-PI), Lauriete (PL-ES), Sóstenes Cavalcante (DEM-RJ).

O PT ocupa uma vaga do MDB e uma do PP, com Erika Kokay (DF) e Padre João (MG), respectivamente). O bloco tem ainda: Camilo Capiberibe (PSB-AP), Carlos Veras (PT-PE) e Helder Salomão (PT-ES, presidente do colegiado). A comissão é formada ainda por Eli Borges (Solidariedade-TO), José Medeiros (Podemos-MT), Márcio Jerry (PCdoB-MA) e Túlio Gadêlha (PDT-PE).

Repercussão nas redes

O Comprova verifica conteúdos duvidosos sobre políticas públicas do governo federal que tenham grande potencial de viralização.

A publicação da página Nas Ruas teve 3 mil comentários, 2,8 mil curtidas e 1,7 mil comentários. O post da Só a verdade teve 4,3 mil compartilhamentos, 214 comentários e 275 curtidas. O artigo publicado no site Estudos Nacionais teve 20 mil interações no Facebook, segundo a ferramenta CrowdTangle. As publicações foram feitas entre os dias 19 e 20 de agosto e tinham esses números de interação nas redes sociais no dia 21.

O texto do Jornal da Cidade Online teve 162 mil interações no Facebook entre os dias 20 e 22 de agosto, de acordo com o CrowdTangle. Inicialmente publicado com o título “Zambelli denuncia projeto de Manuela que pretende legalizar casamento entre pais e filhos”, o artigo foi alterado. O site publicou uma errata corrigindo a informação de que a ex-deputada Manuela D’Ávila (PCdoB) seria autora do projeto de lei. Além disso, passou a afirmar que “a redação do projeto é tão confusa que levantou uma polêmica no sentido de que o PL poderia normalizar o incesto”.

O Estadão Verifica e a Agência Lupa já haviam checado esta alegação.

Política

Investigado por: 2019-08-22

Um terço do que governo quer remanejar são cortes da Educação

  • Evidência comprovada
  • Enganoso
Evidência comprovada
É verdade que quase um terço do dinheiro que o governo pretende remanejar vem do Ministério da Educação
Enganoso
Não é possível afirmar com certeza quanto do dinheiro será remanejado devido a acordos com parlamentares. O Comprova identificou que, dos valores remanejados, 58% aumentam as verbas para ações incluídas no Orçamento integralmente por emendas parlamentares

É verdade que o governo do presidente Jair Bolsonaro (PSL) propôs ao Congresso o remanejamento de R$ 3 bilhões no Orçamento, em meio às negociações para a aprovação da reforma da Previdência na Câmara. Quase um terço desse valor sairia do Ministério da Educação (MEC). As alegações estão em postagens compartilhadas na internet.

Essas mesmas postagens, no entanto, tratam de forma enganosa a destinação dos recursos remanejados. Elas afirmam que o presidente Jair Bolsonaro distribuiu R$ 3 bilhões para “comprar” votos de parlamentares para aprovação da reforma da Previdência.

O Comprova apurou, no entanto, que não é possível dizer que esses recursos foram usados para “comprar” parlamentares. É possível afirmar, por outro lado, que parte do remanejamento irá, sim, beneficiar parlamentares. Mais especificamente, deputados e senadores terão R$ 1,77 bilhão a seu dispor para usar em emendas.

O projeto ainda precisa ser aprovado pelo Congresso.

Esta verificação do Comprova investigou as informações que constam de postagens nas páginas Esquerda Diário e A Casa de Vidro no Facebook. Ambas compartilham um artigo do site Esquerda Diário cujo conteúdo também foi verificado pelo Comprova.

Como verificamos

Para verificar este artigo, o Comprova analisou a íntegra do projeto de lei proposto pelo Governo Federal, onde estão previstos os remanejamentos no Orçamento de 2019.

Analisamos para quais órgãos e programas o PL prevê aumentar os recursos e para quais ele pretende diminuí-los. O Comprova também entrou em contato com o Ministério da Educação e com o Ministério da Economia.

Além disso, analisamos, por meio do portal SIGA Brasil, do Senado, os dados da elaboração da Lei de Orçamento Anual (LOA) de 2019 e vimos como cada um desses programas foi incluído no Orçamento deste ano – se foi iniciativa do Executivo, do Legislativo ou de ambos. Isso porque os dois poderes podem incluir despesas no Orçamento.

Para entender o papel das emendas parlamentares, entrevistamos os cientistas políticos Lara Mesquita e Vitor Oliveira. Sobre as regras orçamentárias, entrevistamos a professora de finanças públicas e orçamento público Ursula Dias Peres, da USP. Sobre o remanejamento e as emendas, contatamos Gil Castello Branco, da ONG Contas Abertas. E sobre a dívida pública, questionamos a Instituição Fiscal Independente (IFI), órgão ligado ao Senado e que busca dar transparência às contas do governo.

Você pode refazer o caminho da verificação do Comprova usando os links para consultar as fontes originais ou visualizar a documentação que reunimos.

O remanejamento do Orçamento

As postagens verificadas remetem a texto do site Esquerda Diário que afirma que “R$ 3 bilhões em emendas parlamentares foram distribuídos na véspera da votação do segundo turno da Reforma da Previdência. Quase 1/3 desse valor saiu dos cortes na educação”.

O artigo do Esquerda Diário se baseia em texto da Folha de S. Paulo que mostra que quase um terço das verbas canceladas provém do Ministério da Educação. Ao todo, o MEC perde o saldo de R$ 926 milhões. Isso porque, conforme o projeto de lei sugerido pelo governo Bolsonaro, o órgão teria tanto cortes em algumas de suas ações no valor de R$ 1,16 bilhão quanto suplementação no valor de R$ 230 milhões.

No entanto, as postagens viralizadas exageram o teor do texto ao afirmar que “R$ 3 bilhões em emendas parlamentares foram distribuídos” pelo governo de Jair Bolsonaro.

A reportagem da Folha não é taxativa em relação ao valor do remanejamento que seria destinado a atender interesses de parlamentares. O texto afirma que, “segundo interlocutores de Palácio do Planalto, R$ 2 bilhões são para atender a pleitos de parlamentares e R$ 1 bilhão se destina a ações do Ministério da Defesa.”

O texto do Esquerda Diário ainda diz que reforma se trata de “cortar gastos públicos para liberar mais recursos aos donos da dívida pública”.

O projeto de lei (PLN 18/2019), que ainda está em tramitação no Congresso, prevê o remanejamento de R$ 3 bilhões do Orçamento de 2019. O projeto foi encaminhado pelo Executivo na terça-feira (6) e publicado no dia seguinte, datas em que a Câmara dos Deputados realizava a votação em segundo turno do texto-base da reforma da Previdência.

Em nota, a assessoria do MEC afirmou que o valor cancelado abrange todas as unidades do Ministério e diversos de seus programas. Sozinha uma ação do MEC relativa ao funcionamento de instituições de ensino superior, por exemplo, perderia quase R$ 175 milhões.

Depois do MEC, o órgão que sofre maior corte é o Ministério da Infraestrutura. Se aprovada a redação do Executivo, ele perderia R$ 757 milhões.

Os órgãos que teriam aumentos mais significativos são, em ordem decrescente, o Ministério da Defesa, o Ministério da Saúde e o Ministério do Desenvolvimento.

Entre as ações do Ministério da Defesa que teriam aumento de verba, se aprovado o remanejamento, estão a construção de submarino de propulsão nuclear (R$ 152 milhões) e aquisição de cargueiro militar (R$ 148 milhões).

Remanejamentos no Orçamento são parte da rotina orçamentária de qualquer governo. No entanto, a escolha de quais áreas ganham ou perdem recursos depende das prioridades do Executivo.

“Há uma escolha do governo, há determinação política dentro da regra técnica [do Orçamento]. A situação financeira está complicada, mas o governo escolheu cortar do MEC e colocar na Defesa”, afirmou a professora de finanças públicas e orçamento público da USP Ursula Dias Peres.

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Apesar de ser possível identificar no projeto de lei de onde o governo pretende cortar verbas e para onde pretende destiná-las, não é possível afirmar com certeza quanto desse dinheiro será remanejado devido a acordos com parlamentares.

Anualmente, Planalto e Congresso em conjunto definem a Lei Orçamentária Anual (LOA), espécie de documento que define receitas e despesas para o ano seguinte. O remanejamento é uma das formas previstas em lei para alterar o que está autorizado na LOA.

Deputados e senadores podem modificar o que está definido no projeto do Executivo por meio de emendas parlamentares. Dessa forma, é possível direcionar parcela do Orçamento para cumprir compromissos políticos assumidos pelos parlamentares em seus redutos eleitorais.

O Comprova verificou que tanto as ações que serão cortadas quanto as que receberão verba possuíam emendas parlamentares no Orçamento de 2019 (aprovado em dezembro de 2018).

Do montante que o governo pretende remanejar agora, 58% (R$ 1,77 bilhão) vão para cinco ações que foram incluídas no Orçamento integralmente por emendas.

Das cinco ações mencionadas, duas são do Ministério da Saúde (R$ 700 milhões), duas do Ministério do Desenvolvimento Regional (R$ 670 milhões) e uma do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (R$ 400 milhões).

Elas se referem a custeio de serviços de atenção básica em saúde e assistência hospitalar, além de projetos de desenvolvimento sustentável, de desenvolvimento urbano e de fomento ao setor agropecuário.

Se não fossem pelas emendas parlamentares, essas ações não estariam no Orçamento de 2019, pois não estavam previstas no projeto de lei enviado pelo Executivo para o Congresso.

Já do montante total que será cancelado, 40% corresponde a ações integralmente de emendas. Esses dados foram obtidos a partir do SIGA Brasil, sistema com dados orçamentários disponibilizado pelo Senado.

Questionado se os valores remanejados se destinam ao pagamento de emendas parlamentares, o Ministério da Economia não respondeu. Em nota, a assessoria do órgão afirmou que, no PL, “todas as programações suplementadas e canceladas podem ser consultadas”. No entanto, não consta no documento se os valores de destinam ao pagamento de emendas.

Segundo Gil Castello Branco, economista e secretário-geral da ONG Contas Abertas, o que o governo pode fazer por meio de remanejamentos é destinar verbas para projetos de parlamentares. E, por isso, não há como saber o que é pleito de parlamentar porque não se trata de uma emenda formal, mas de um remanejamento de recursos. “Vamos saber do que se trata nessa dotação [valor autorizado no Orçamento], mas não se é de algum parlamentar. Desta vez não é formal, [o parlamentar] vai ao ministério pedir, mas ninguém sabe quem pediu o quê.”

Além disso, esse dinheiro não é distribuído aos parlamentares, como as postagens fazem crer. Ele é remanejado para aumentar os recursos de parte das ações previstas no Orçamento. E, em contrapartida, outras ações do Orçamento devem ter valor equivalente cancelado.

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O texto final do Orçamento de 2019 foi aprovado, em dezembro de 2018, com o total de despesas previstas de R$ 3,4 trilhões e R$ 19,2 bilhões em emendas parlamentares.

Das despesas então aprovadas, 95,4% foram para ações que tiveram suas verbas inteiramente incluídas no Orçamento pelo Executivo. As ações integralmente incluídas por emendas parlamentares, por sua vez, representaram 0,3% do valor total.

Em nota, o MEC afirmou que “a suplementação orçamentária não garante o descontingenciamento de recursos, o qual depende da liberação de limites orçamentários estabelecidos por meio do decreto de programação orçamentária e financeira para 2019”. Apesar dos cortes em seu orçamento, o órgão também teve R$ 230 milhões de suplementação.

Mesmo depois de aprovadas no Orçamento ou com o remanejamento autorizado pelo Congresso, não há garantia de quais ações serão de fato executadas. Para tanto é preciso que o governo libere o gasto desses valores por meio de decreto, só então o órgão correspondente pode executar o gasto.

As emendas parlamentares

A postagem do Esquerda Diário afirma que o governo “abriu de par em par os cofres públicos para comprar parlamentares”, em referência ao uso político das emendas, quando usadas como barganha pelo Executivo. Apesar da conotação negativa que o termo pode sugerir, especialistas ouvidos pelo Comprova apontam que a prática de governos utilizarem emendas parlamentares para viabilizar projetos não é nova, nem ilegal, nem negativa.

As emendas parlamentares são prerrogativas constitucionais de senadores e deputados federais. Foram criadas para que os recursos do país fossem melhor distribuídos, pulverizando parte do dinheiro público da União para fins específicos decididos pelos congressistas e beneficiando entidades, municípios ou mesmo bairros pelo Brasil. Alguns de seus destinos podem ser reparar estradas ou comprar ambulâncias, por exemplo.

Desde 2015, uma emenda constitucional definiu que o Executivo é obrigado a executar as emendas parlamentares individuais, atingindo pelo menos o montante de 1,2% da receita corrente líquida. No geral, esse valor é menor do que o valor total de emendas aprovadas na LOA. Isso implica que o Executivo tem discricionariedade para definir quais emendas vai executar.

A partir de 2020, também as emendas de bancadas passarão a ter um percentual mínimo a ser executado. A mudança foi aprovada em junho de 2019.

“Faz parte da natureza política trocar e negociar, em troca de que se chegue a um consenso”, afirma Vitor Oliveira, cientista político e diretor da consultoria Pulso Público. “As emendas são ferramentas que a Presidência tem para mobilizar os parlamentares e resolver democraticamente problemas de ação coletiva, como a aprovação de uma matéria.”

“As emendas têm uma função importante para o orçamento”, também diz Lara Mesquita, cientista política e pesquisadora na Fundação Getúlio Vargas (FGV). Ela afirma que parlamentares têm mais conhecimento de realidades locais (em lugares em que o governo central não pode estar), portanto sabem que áreas em quais localidades precisam de mais recursos.

No entanto, pode-se questionar, diz Mesquita, os critérios utilizados pelo governo federal para a execução ou não de determinadas emendas.

Manoel Galdino, diretor da ONG Transparência Brasil, concorda. Para ele, negociações entre governo e Congresso são legítimas, mas o processo de liberação de emendas é feito sem transparência, e nem sempre os recursos liberados após acordos são os mais válidos e efetivos para o interesse público.

“Atualmente, o que decide quais emendas serão liberadas é a negociata política, o mero jogo para aprovar uma lei”, diz. Para ele, antes das liberações deveria haver avaliações técnicas que considerassem as agendas do governo e Congresso, mas também respeitassem “o mínimo de viabilidade, da eficiência e impessoalidade” para o bom uso do dinheiro público.

Por outro lado, Oliveira lembra que, desde 2015, as emendas são mais difíceis de serem usadas como moeda de troca (ou para a “compra” de parlamentares, como diz o Esquerda Diário), pois a partir daquele ano sua execução passou a ser obrigatória.

A dívida pública

Ao criticar acordos recentes de emendas parlamentares com recursos da Educação, o artigo do Esquerda Diário afirma que o suposto repasse do dinheiro do MEC para a aprovação da reforma da Previdência se trata de “cortar todos os gastos públicos [como das escolas e das aposentadorias] para liberar mais recursos aos donos da dívida pública”.

A crítica à dívida pública aparece em outras publicações do site, que defende que o débito, de R$ 3,8 trilhões em 2018, não deve ser pago. Uma postagem de 3 de maio de 2019, também sobre os cortes na Educação e a reforma da Previdência, afirma que a dívida pública é “ilegal, ilegítima e fraudulenta”, que “enche o bolso dos banqueiros” e que só a abolição do pagamento “pode garantir um futuro digno à juventude e à classe trabalhadora”.

Para Josué Pellegrini, consultor no Senado Federal e diretor da Instituição Fiscal Independente (IFI), que atua para ampliar a transparência nas contas públicas, a postagem mais recente do Esquerda Diário traz uma “visão equivocada” da dívida. “Chegar ao ponto em que o país não pudesse pagar a dívida e os credores não quisessem mais financiar o governo seria uma verdadeira tragédia econômica e do ponto de vista social”, diz ele.

“Mesmo excluindo o pagamento de juros, o governo continua com um deficit enorme”, Pellegrini aponta. Em 2018, o aumento da dívida da União chegou a 2,6% do valor do PIB. “Se por acaso os credores não quisessem mais financiar o governo, a União não teria como pagar o deficit [hoje coberto pelos empréstimos]. Haveria um ajuste fiscal gravíssimo.“

A dívida pública da União equivale a todos os empréstimos contraídos pelo governo federal para financiar o deficit orçamentário (que inclui gastos para a oferta de serviços públicos e o refinanciamento da própria dívida), segundo definição do Tesouro Nacional. Por meio dos chamados títulos de dívida, a União capta recursos de terceiros quando suas despesas superam a receita disponível, assumindo o compromisso de devolver o valor com juros.

Atualmente, os três maiores financiadores da dívida pública são os fundos de investimentos (26,8%), fundos de Previdência (23,9%) e instituições financeiras (23,1%), mas o grupo inclui também não residentes, seguradoras e o próprio governo, segundo dados de junho de 2019 do Tesouro Nacional. A não ser pelos bancos, o valor que financia a dívida está dividido em componentes “dos quais estão por trás milhares de investidores”, incluindo pessoas físicas, diz Pellegrini. Não há “donos”, ele afirma, mas “todos somos detentores da dívida pública”.

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Atualmente, a Previdência Social, com as contas deficitárias, está entre os principais responsáveis pelo crescimento acelerado da dívida, afirma Pellegrini. Isso porque o deficit da Previdência está entre os principais responsáveis pelo deficit da União. Como as contribuições previdenciárias não são suficientes para pagar as aposentadorias, o governo acaba recorrendo a outras fontes de recursos, emitindo os títulos públicos.

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Analistas apontam que a reforma da Previdência é essencial para o equilíbrio fiscal, a estabilidade e o crescimento da economia. Pellegrini acrescenta que a União seria menos dependente da dívida pública (porque pagaria menos juros) se não chegasse a deficits primários tão altos, podendo inclusive aplicar recursos em outras áreas do governo.

Repercussão nas redes

O Comprova verifica conteúdos duvidosos sobre políticas públicas do governo federal que tenham grande potencial de viralização.

A publicação do Esquerda Diário sobre as emendas parlamentares e a reforma da Previdência foi divulgada na página do Facebook do site em 8 de agosto de 2019 e até o dia 21 do mesmo mês contava com mais de 6,4 mil compartilhamentos e 10 mil interações. A postagem foi também republicada pela página A Casa de Vidro, com 1,1 mil compartilhamentos até o dia 21. A ferramenta CrowdTangle, usada para análise de engajamento de posts nas redes sociais, indica que, além dessas, outras 18 páginas no Facebook e no Twitter repassaram o conteúdo e tiveram compartilhamentos.

 

Saiba mais

Qual o volume de emendas liberadas na aprovação da reforma (Nexo)
Para que servem as emendas e quais os prós e contras de sua existência (Nexo)

Verificação

Investigado por: 2019-08-20

Imagem de matança de baleias não foi capturada na Noruega

  • Contexto Errado
Contexto Errado
A foto foi tirada em Tórshavn, capital das Ilhas Faroé, território dinamarquês. O registro foi feito pelo fotógrafo Jan Egil Kristiansen durante a caçada anual de baleias-piloto, em 2004.

Está fora de contexto a fotografia que circula nas redes sociais sobre suposta matança de baleias promovida pela Noruega. Segundo publicações localizadas pelo Comprova no Instagram e no Twitter, o país nórdico é “hipócrita” por se preocupar com o meio ambiente no Brasil enquanto promove a caça dos animais.

A foto em questão, na verdade, foi tirada em outubro de 2004 em Tórshavn, capital das Ilhas Faroé, território dinamarquês localizado no Atlântico Norte. A imagem foi publicada no Flickr do fotógrafo Jan Egil Kristiansen com o título “Grindadráp” (caçadas, no idioma feroês).

Esta verificação do Comprova investigou a origem e o contexto da foto divulgada nos perfis @direitaopressao, no Instagram, e @elzaaraujoyaho1, no Twitter.

Como verificamos

O Comprova utilizou ferramentas de busca reversa de imagem, como o Google Imagens e o TinEye, e consultou os arquivos do Wayback Machine, ferramenta que registra capturas de tela de sites na internet, e do Flickr.

A equipe também entrou em contato com o fotógrafo Jan Egil Kristiansen, responsável pelo clique da caçada nas Ilhas Faroé, e buscou informações no site oficial do governo do arquipélago e da Dinamarca.

‘Hipocrisia’

As postagens no Instagram e no Twitter destacam uma suposta “hipocrisia” da Noruega em criticar políticas ambientais brasileiras enquanto permite a caça de baleias em seu território. Para isso, utilizam uma fotografia de pescadores matando os animais em uma praia cuja água está manchada de sangue.

Diferentemente do que é informado pelas publicações que viralizaram nas redes sociais, a imagem não foi tirada na Noruega, e sim em um território da Dinamarca, no Atlântico Norte.

Por meio da ferramenta de busca reversa de imagem TinEye, que permite fazer buscas por imagens semelhantes publicadas na internet, o Comprova localizou uma publicação de 2009, atualmente fora do ar, no site BuzzFeed. Com auxílio da ferramenta Wayback Machine, que grava versões antigas de conteúdos publicados na internet, a equipe conseguiu reler o artigo, que também comentava sobre as caçadas de baleia nas Ilhas Faroé. Contudo, não havia menção ao responsável pelo registro.

A partir dessas informações, o Comprova filtrou resultados da busca reversa no Google Imagens para resultados que fizessem menção ao termo “Faroe Islands” e encontrou uma publicação no Flickr de uma mulher chamada Miriam Godet que creditava a imagem ao fotógrafo Jan Egil Kristiansen.

O post também continha um link que redirecionava para o perfil profissional do fotógrafo na rede social, onde a foto foi originalmente publicada. O álbum no qual a foto está inserida se chama “Grindadráp” (caçadas, no idioma feroês) e o clique foi feito no dia 09 de outubro de 2004 em Tórshavn, capital das Ilhas Faroé.

O Comprova, então, entrou em contato com Jan pelas redes sociais. Em mensagem via Facebook, ele reiterou as informações encontradas pela equipe. “Confirmo a data e o lugar nas Ilhas Faroé, que não fazem parte da Noruega desde 1814. Também gostaria de acrescentar que não vejo nada de errado em comer carne de baleia-piloto, e que a maioria dos noruegueses provavelmente concorda com isso”, escreveu. Ele, que atua como freelancer, ainda comentou que “tirou a foto por conta própria” e depois vendeu a diferentes veículos de comunicação.

A equipe também descobriu que a imagem está à venda pela agência GettyImages por valores entre US$175 a US$ 499.

Prática milenar

De acordo com o site do governo das Ilhas Faroé, “as formas locais e tradicionais de agricultura e caça, incluindo a caça costeira de baleias-piloto, permitiram às Ilhas Faroé manter um grau relativamente alto de autossuficiência na produção local de alimentos”. O texto ainda diz que “é considerado bom senso econômico e ambiental aproveitar ao máximo os recursos naturais que estão disponíveis localmente”.

Um hotsite do governo dedicado a esta prática afirma que “a condução, encalhe, matança e distribuição de baleias-piloto são totalmente regulamentadas por leis. As capturas são compartilhadas entre os participantes e a comunidade local”.

Caça a baleias na Noruega

Apesar da imagem compartilhada nas redes sociais não ter sido tirada na Noruega, a prática é comum no país. Conforme afirma o próprio governo, em seção de seu site, a baleação começou a funcionar novamente em 1993, depois de cinco anos parada. “Na Noruega, a caça às baleias sempre foi feita em combinação com a pesca tradicional. A baleeira norueguesa é sustentável e legal. A gestão de recursos da Noruega é baseada no princípio do uso sustentável dos recursos naturais. A colheita de recursos marinhos, incluindo baleias, é baseada em critérios científicos.”

O Comitê Científico da Comissão Internacional Baleeira (IWC), responsável pela conservação de baleias e regulamentação da caça, proibiu a caça comercial em todo o mundo. Noruega e Islândia não aderiram, mas informam o número de animais capturados. Anualmente, são estabelecidas quotas com base nos procedimentos desenvolvidos pelo IWC.

Em sua resposta ao Comprova, Jan ainda explicou a diferença entre a caça na Noruega e no arquipélago onde mora. “A baleação norueguesa ocorre em mar aberto, não nas praias como aqui nas Ilhas Faroé”, escreveu.

Repercussão nas redes

A publicação de @elzaaraujoyaho1 obteve 798 RTs e 1,5 mil curtidas. No Instagram, a publicação de @direitaopressao obteve 9.522 likes até o dia 20 de agosto.

O Estadão Verifica, parceiro do Comprova, e a Agência Lupa também desmentiram conteúdos semelhantes.

Contexto

O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, afirmou no dia 17 de maio que parte dos projetos do Fundo Amazônia – iniciativa que capta doações não reembolsáveis da Noruega e da Alemanha para ações de prevenção, monitoramento e combate ao desmatamento – apresentaram irregularidades após análise preliminar. Ele também afirmou que proporia a revisão de critérios de contratações.

A Embaixada da Noruega, que responde por 94% das doações, respondeu, em nota, não ter sido informada pelo governo sobre proposta de mudança no programa. Ainda, garantiu que estava satisfeita com a atual gestão, feita pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), e com a seleção de seus projetos em andamento.

Com a divulgação de dados que mostram aumento do desmatamento na Amazônia, a ministra alemã do Meio Ambiente, Svenja Schulze, anunciou em entrevista ao jornal “Tagesspiegel”, em 10 de agosto, que congelaria projetos de proteção florestal na Região Amazônica no valor de R$ 155 milhões de reais.

Um dia depois, Bolsonaro comentou a decisão e disse que a Alemanha “vai deixar de comprar à prestação a Amazônia”. No dia 14, o presidente deu uma sugestão aos europeus. “Eu queria até mandar recado para a senhora querida Angela Merkel, que suspendeu 80 milhões de dólares pra Amazônia. Pega essa grana e refloreste a Alemanha, tá ok? Lá está precisando muito mais do que aqui.”

Antes, em 7 de agosto, o ministro Salles havia afirmado que a Noruega possui passivos ambientais e desqualificou as cobranças que o país tem feito às mudanças no Fundo. “A Noruega é o país que explora petróleo no Ártico, eles caçam baleia. E colocam no Brasil essa carga toda, distorcendo a questão ambiental”, declarou.

Dois dias depois, a nação nórdica emitiu nota para afirmar que “está comprometida a continuar com a gestão responsável, prudente e sustentável dos seus recursos petrolíferos”. A indústria petrolífera norueguesa, declarou, “é líder global em padrões de saúde, segurança e proteção ambiental”. Contudo, no dia 15, o ministro norueguês do Clima e Meio Ambiente, Ola Elvestuen, anunciou que o país suspendeu o repasse de 300 milhões de coroas norueguesas, o equivalente a R$ 133 milhões, para ações contra o desmatamento no Brasil.

De acordo com o jornal norueguês Dagens Næringsliv, Elvestuen considera que o Brasil quebrou o acordo para financiar medidas de desmatamento. Questionado sobre a decisão, Salles disse que as negociações sobre o destino do fundo ainda estão em andamento e que, por isso, vê como “natural” a decisão de reter repasses à iniciativa.

No domingo, 18, o presidente Jair Bolsonaro compartilhou vídeo em seu perfil no Twitter atribuindo à Noruega uma caça de baleias. As imagens, no entanto, foram feitas pela ONG Sea Shepherd UK, que desmentiu o uso incorreto das gravações e esclareceu que elas foram feitas nas Ilhas Faroé.

Verificação

Investigado por: 2019-08-20

A partir de imagem verdadeira, postagem enganosa exagera extensão de trecho em obras na BR-381

  • Enganoso
  • Localização verificada
Enganoso
É enganosa a descrição de um vídeo sobre a BR-381, segundo a qual a filmagem divulgada teria sido feita em um trecho muito maior do que o real
Localização verificada
Vídeo que mostra obras na BR-381 inauguradas após a posse de Bolsonaro é verdadeiro e correspondente à localização alegada

Uma página de apoio ao presidente Jair Bolsonaro no Facebook compartilhou um vídeo com imagens de um trecho recém-asfaltado da BR-381 e o descreve na legenda como se fosse outro, três vezes maior.

O vídeo é verdadeiro e mostra trechos asfaltados e um túnel da BR-381 entre Nova Era e Antônio Dias, em Minas Gerais. A distância entre as duas cidades é de 35 km. Na descrição enganosa, o trecho é apresentado como sendo entre Belo Horizonte e João Monlevade, também ligadas pela BR-381, mas distantes 115 km.

A BR-381 é popularmente conhecida como “Rodovia da Morte” devido ao grande número de acidentes que ocorrem na estrada. O trecho entre Belo Horizonte e João Monlevade, citado na descrição enganosa da postagem no Facebook, tem uma média de um acidente por dia, segundo dados da Polícia Rodoviária Federal (PRF).

Esta checagem do Comprova investigou os dados de uma publicação da página Bolsonaro Bahia no Facebook.

Como verificamos

Para investigar essa publicação, o Comprova consultou o site do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT), do Ministério de Infraestrutura, reportagens publicadas pela imprensa sobre as referidas obras, a página da empresa que realizou a obra dos túneis e o YouTube e tentou contato com o proprietário da página e com o autor do vídeo.

Você pode refazer o caminho da verificação do Comprova usando os links para consultar as fontes originais ou visualizar a documentação que reunimos.

Vídeo da BR-381

Inicialmente, a legenda da postagem com o vídeo diz que o trecho liberado para o tráfego fica entre Belo Horizonte e João Monlevade. Mas, ao ouvir o vídeo, nota-se que o autor da gravação fala que o trecho filmado corresponde ao caminho entre os municípios de Nova Era e Antônio Dias.

Nesse caso, o autor do vídeo está correto.

O mapa abaixo mostra a localização e a distância das quatro cidades.

Para confirmar o que efetivamente estava sendo filmado, o Comprova fez contato com a página Bolsonaro BAHIA, que postou o conteúdo, e com seu administrador, André Meirelles, a fim de encontrar a fonte primária da gravação, mas não obteve resposta.

Posteriormente, ao acessar o YouTube e colocar as palavras-chave “Nova Era Antônio Dias” chegou-se a um vídeo com a mesma duração e mostrando o mesmo trecho postado pelo usuário Bruno Cesar em 21 de julho de 2019.

No Facebook, o Comprova encontrou o perfil de Bruno ao fazer uma busca por seu nome e fez contato com ele. Além de ter publicado em seu perfil o mesmo vídeo viralizado, em 22 de julho deste ano, ele ainda fez uma advertência na legenda: “Obs = Só quis expressar minha satisfação com o andamento das Obras e a redução dos trechos perigosos NÃO TEM NADA A VER COM POLÍTICA, SÓ ESPERO QUE O TÍTULO DE RODOVIA DA MORTE ACABE”.

O usuário, entretanto, não respondeu.

Um dia antes, em 21 de julho, Bruno havia publicado um vídeo da mesma estrada com a seguinte descrição: “Muito feliz por passar no túnel entre Nova Era e Antônio Dias já mostram um certo progresso na BR-381”.

Reportagens comprovam inauguração de trecho da BR-381

O Comprova encontrou reportagens de veículos da imprensa que registraram a inauguração da obra em 19 de julho deste ano no trecho que compreende Antônio Dias e Nova Era, mencionada pelo autor do vídeo.

Uma matéria publicada no site do Diário do Aço, que cobre a região do Vale do Aço, em Minas Gerais, afirma que o ministro da Infraestrutura, Tarcísio Gomes de Freitas, inaugurou um trecho da duplicação da rodovia BR-381, na localidade de Antônio Dias. Lá, explica que “o trecho integra o chamado ‘binário pista nova’ […], onde estão localizados também dois túneis no sentido Nova Era”.

O DNIT e o Ministério da Infraestrutura também publicaram notícias sobre a inauguração e liberação para o tráfego em 19 de julho deste ano. Entretanto, como é possível ver na página da própria rodovia, os túneis citados já estavam finalizados desde outubro de 2015.

Contudo, a conclusão do binário pista nova era a condição para a liberação do trânsito “em cerca de 12 km de pista simples”, incluindo a passagem pelos túneis Prainha e Antônio Dias. Isso se dá porque o binário pista nova e os dois túneis são de obras e lotes diferentes: o primeiro faz parte do 3.1 e o segundo, do 3.3.

Essa obra teve início em maio de 2014, durante o governo de Dilma Rousseff, como aponta esta matéria do jornal Estado de Minas.

Comparação de imagens para verificação da localização

Para confirmar que o trecho mencionado pelo autor do vídeo realmente correspondia às imagens mostradas, o Comprova pesquisou outras gravações do trecho publicadas por usuários em dias próximos.

Abaixo, pode-se ver uma reprodução do vídeo viralizado (à esquerda), em que aparece o túnel Antônio Dias, e a captura de tela (à direita) da gravação do usuário Minas Gerais Pelo Mundo do mesmo túnel. Em ambas as imagens veem-se as mesmas marcas na construção.

Em e-mail ao Comprova, o DNIT confirmou a localização da filmagem e declarou que esta foi feita “certamente no trecho de pista nova do Lote 3.1”. Também assinalou que, de acordo com a fala do usuário, as imagens foram feitas “na semana de 21 a 27 de julho deste ano”.

A duplicação à qual o autor do vídeo se refere ainda não foi concluída. Segundo o DNIT, “foram entregues 15 quilômetros do lote 3.1 de pista nova e com piso de concreto. A pista está funcionando como um desvio de obra e nos dois sentidos. Isso ocorre para que seja feita a modernização do trecho já existente. Os desvios são realizados nos quilômetros 303 e 314 e os motoristas têm acesso aos túneis Antônio Dias e Prainha”.

O DNIT também explicou que após a modernização da pista antiga, o trecho já liberado passará a ser de pista dupla, com os veículos trafegando apenas no sentido Governador Valadares – Belo Horizonte, direção oposta à vista na filmagem.

No site oficial da obra da BR-381 é possível ver o outro lado do túnel Antônio Dias, com uma placa indicativa, cujo sentido do tráfego passará a valer após a duplicação mencionada.

A iniciativa Nova 381, movimento do setor empresarial de Minas Gerais com o objetivo de promover o desenvolvimento socioeconômico do estado a partir da BR-381, tem um site em que registra o andamento das obras da estrada, que vai de Governador Valadares até Belo Horizonte, passando por, dentre outras cidades, Antônio Dias e Nova Era.

A BR-381 corta a Região Metropolitana do Vale do Aço (RMVA), popularmente conhecida como Vale do Aço. O local é composto por quatro municípios (Coronel Fabriciano, Ipatinga, Santana do Paraíso e Timóteo), além de mais 24 cidades metropolitanas, dentre elas Antônio Dias. O nome da região advém dos complexos de indústrias siderúrgicas, que precisam da BR-381 para que ocorra o escoamento da produção.

O trecho da BR-381 ao qual se refere a descrição do vídeo, entre Belo Horizonte e João Monlevade, está previsto para ser duplicado pela iniciativa privada em processo de concessão que será realizado em 2020 pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) e que está em fase de audiências públicas. A rodovia será concedida em um pacote com a BR-262, no trecho entre Vitória (ES) e João Monlevade.

Repercussão nas Redes

O Comprova verifica conteúdos duvidosos sobre políticas públicas do governo federal que tenham grande potencial de viralização.

O post com o vídeo que mostra a rodovia BR-381 foi publicado em 5 de agosto de 2019 pela página Bolsonaro Bahia e contou até o dia 19 de agosto com mais de 4,8 mil compartilhamentos e 150 mil visualizações.

Verificação

Investigado por: 2019-08-16

É enganoso vídeo que fala sobre “recado final” de militares ao STF

  • Enganoso
Enganoso
Não há comprovação de que o alto comando das Forças Armadas esteja pressionando a corte em nome do ministro da Justiça, Sergio Moro. Tanto o Exército quanto o STF negam o episódio

É enganoso um vídeo publicado no YouTube sobre um suposto clima de suspense no Supremo Tribunal Federal (STF) atribuído a um “duro recado” que o alto comando do Exército teria mandado aos ministros. Segundo o rumor, os militares teriam alertado os integrantes da corte para que não “mexessem” com o atual ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro.

O vídeo em questão é composto por uma sequência de fotos dos ministros do Supremo, de integrantes do governo, do presidente Jair Bolsonaro (PSL) e de militares fardados. As imagens são acompanhadas por um áudio no qual a narradora mistura fatos verídicos e falsos para construir a tese do “recado”.

O vídeo é favorável a Moro. Diz que ninguém “mexe” com ele por causa de sua “autoridade, respeito, caráter e popularidade” e que, se “mexerem com Moro”, a briga será “grande e feia”.

Esta verificação do Comprova investigou os dados do vídeo publicado no canal BR Notícias no YouTube.

Como verificamos

Para fazer esta apuração o Comprova entrou em contato com as assessorias de organizações e pessoas citadas no vídeo. São elas: o Exército, o STF, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), o vice-presidente Hamilton Mourão (PRTB), e com o canal que divulgou o vídeo no YouTube.

A equipe também conversou com o ex-candidato a governador do Distrito Federal, general Paulo Chagas (PRP), com um advogado criminalista e consultou reportagens feitas sobre as afirmações que constam no vídeo.

Você pode refazer o caminho da verificação usando os links para consultar as fontes originais ou visualizar a documentação que reunimos.

O “recado”

A narradora do vídeo afirma que o alto comando do Exército mandou um duro recado para o Supremo e, a partir daí, “um grande clima de suspense pairou no ar”. De acordo com a narração, trata-se de uma notificação de um general para que “ninguém mexesse” com Moro na questão dos vazamentos das conversas entre ele e procuradores da força tarefa da Lava Jato.

Ao Comprova, o coronel Guerra, chefe da assessoria de imprensa do Exército, disse por telefone que o “duro recado” citado no vídeo “não ocorreu e é falso”. Por meio de sua assessoria, o Supremo também negou ter recebido qualquer “recado” de integrantes do Exército.

Mourão

Além do rumor de origem não identificada, o vídeo também especula sobre o “recado” ter sido dado ao Supremo pelo vice-presidente da República, Hamilton Mourão (PRTB). A assessoria de imprensa do general da reserva nega que ele tenha dado qualquer “recado” à corte superior e afirma que os fatos descritos no vídeo são inverídicos.

É enganoso que Mourão tenha mandado qualquer recado aos ministros do STF caso eles interferissem a respeito das conversas atribuídas a Moro. A narrativa do vídeo mescla afirmações feitas pelo vice-presidente, como a defesa da operação Lava Jato, com o discurso falso que o militar teria ameaçado a Suprema Corte. O vice-presidente não deu declarações sobre interferências a serem feitas no STF caso os ministros “mexessem com Moro”, mas defendeu a operação Lava Jato publicamente.

Mourão também disse que Moro é de “ilibada confiança” do presidente Bolsonaro e defendeu a privacidade das comunicações do ministro.

FHC

Outra figura pública citada no vídeo por ter defendido Moro foi o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB). A narradora diz que o tucano “saiu em defesa de Moro” e disse que o vazamento não passa de uma “tempestade em copo d’água”.

Ao Comprova, a assessoria do Instituto Fernando Henrique disse que o ex-presidente não saiu em defesa de Moro, o que ele fez foi comentar o caso ao ser questionado por um repórter.

Os processos julgados por Moro

O vídeo afirma que alguns ministros disseram “em off” para a reportagem que nada poderia anular os julgamentos da Lava Jato. A expressão “em off” é utilizada no jornalismo quando o repórter não revela quem foi a fonte que lhe passou a informação – isso é feito para preservar o informante.

De acordo com o vídeo, o pior que poderia acontecer seria Sergio Moro ser convidado à Suprema Corte para dar explicações ao “Conselho Superior de Censura”, já extinto. Para verificar esta afirmação, o Comprova entrevistou João Paulo Boaventura –advogado criminalista, sócio do escritório Boaventura Turbay Advogados.

Boaventura disse que o Conselho foi extinto na Constituição de 1988. “Hoje ele é aquele setor do Ministério da Justiça que faz classificação etária de programas de televisão, filmes, etc.”.

Apesar de Moro não ter de dar explicações ao Supremo, como afirma o vídeo, o ministro foi convidado e compareceu a uma sessão no Senado Federal, em 19 de junho, e a outra na Câmara dos Deputados, em 2 de julho.

Lava Jato

O áudio do vídeo está correto quando afirma que o Ministério Público Federal (MPF) diz que a operação Lava Jato é o maior caso de lavagem de dinheiro já apurado no Brasil.

De acordo com o site do MPF, a investigação é realmente a maior deflagrada até hoje e mira um esquema de corrupção que já dura pelo menos 10 anos e envolveu grandes empresas como a Petrobras e a Odebrecht.

Repercussão nas redes

Até o dia 15 de agosto, o vídeo postado no canal BR Notícias, do YouTube, foi visualizado por mais de 327 mil pessoas. De acordo com o Crowdtangle, uma ferramenta de monitoramento de redes sociais, a gravação obteve mais de 22 mil interações no Facebook até a mesma data.

Contexto

Em 9 de junho de 2019, o portal The Intercept começou a divulgar conversas do aplicativo Telegram atribuídas ao ministro Sergio Moro. Nas mensagens, o ex-juiz teria orientado os membros do Ministério Público sobre como agir com relação à operação. Esse tipo de comunicação é considerada ilegal pela Constituição brasileira e pelo Código de Processo Penal.

Depois do vazamento, houve especulações sobre o que aconteceria com os processos julgados por Moro enquanto era juiz federal da 13ª Vara Federal em Curitiba – antes de assumir o cargo no governo Bolsonaro. O pedido de suspeição contra Moro na condenação do ex-presidente Luiz inácio Lula da Silva (PT), apresentado ao STF em dezembro de 2018, ganhou força após as reportagens. A defesa do petista alega que Moro foi parcial no julgamento de Lula.

O vídeo enganoso foi publicado em 10 de agosto, em meio a uma campanha contra o STF que convoca um ato de protesto para o próximo dia 25, cujos alvos são os ministros da corte. Diversas postagens dessa campanha, detectadas no monitoramento do Comprova, pedem o fechamento do STF.

No fim do vídeo analisado, a narradora pede a “intervenção militar” e a imposição do artigo 142 da Constituição contra o STF.

A redação do artigo 142 é objeto de uma leitura enganosa por parte dos apoiadores de uma “intervenção militar”, segundo os quais as Forças Armadas poderiam fechar o Congresso ou Supremo e, ainda assim, estar dentro da lei. Ocorre, no entanto, que o artigo 142 da Constituição não permite tal ofensiva.

Uma ação desse tipo configuraria um golpe de Estado, pois, de acordo com a Constituição Federal, nenhum representante eleito pode ser destituído a não ser por deliberação da maioria absoluta do Poder Legislativo. Uma ação deste tipo configuraria um golpe de Estado, .

O artigo se restringe às diretrizes sobre o funcionamento das Forças Armadas. Esse artigo serve de base para a Lei Complementar 97, de 1999, e o Decreto 3897, de 2001, que regulam as chamadas missões de Garantia da Lei e da Ordem (GLO). As GLOs são realizadas exclusivamente por ordem da Presidência da República e ocorrem nos casos em que há o esgotamento das forças tradicionais de segurança pública.

A intervenção federal, por sua vez, é um mecanismo previsto no artigo 34 da Constituição. Ela pode ser decretada pelo governo federal nos estados e no Distrito Federal e depende de autorização do Legislativo, ou seja, da Câmara dos Deputados e do Senado Federal. A medida, no entanto, não prevê o fechamento do Congresso. No caso do Rio de Janeiro, que passou por uma intervenção militar recentemente, a prerrogativa colocou os órgãos de segurança pública do Estado sob o comando de um general do Exército.

Um outro vídeo, publicado em março de 2019, adotou estratégia semelhante à utilizada no vídeo investigado nesta verificação – fala em supostos avisos e ultimatos de militares ao Supremo.

Na ocasião, o “recado” não teria sido dado em defesa de Moro, mas sim para impedir a eventual soltura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O vídeo falava em um “aviso final” que o general da reserva Paulo Chagas, que se candidatou ao governo do Distrito Federal, teria dado ao STF.

Tal aviso envolveria o julgamento de mérito sobre a prisão em segunda instância, que estava marcado para 10 de abril de 2019. Uma mudança na jurisprudência (atualmente a favor do cumprimento da pena após sentença confirmada em segunda instância) poderia beneficiar Lula, até então condenado por Moro e o TRF-4. O ex-presidente só seria condenado em terceira instância no caso triplex em abril.

Ainda em abril, especificamente no dia 4, o ministro Dias Toffoli, presidente do STF, atendeu a pedido da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e tirou o julgamento da prisão em segunda instância da pauta da Corte, sem data fixada para retornar até o momento. O assunto, no entanto, pode voltar a ser examinado em alguma sessão sem pauta definida.

A base do vídeo para a argumentar que os militares tinham ameaçado o STF é um texto publicado em 30 de março de 2019 por Chagas. Ao Comprova, o general disse que o post é uma adaptação de um texto originalmente publicado em 2017. O texto original é muito parecido com o replicado na corrente. No entanto, Chagas diz que a parte do “aviso final” ao STF foi inserida pelo autor do post que viralizou.

Política

Investigado por: 2019-08-14

Artigo enganoso associa mais armas a menos violência; texto traz perspectiva incompleta de estatísticas sobre o Brasil e os EUA

  • Enganoso
Enganoso
Pesquisas realizadas por universidades nos Estados Unidos e no Brasil indicam o contrário. O artigo também usa dados incorretos sobre o Brasil.

É enganoso um artigo compartilhado nas redes sociais com a alegação de que mais armas podem reduzir os índices de violência. Pesquisas realizadas por universidades nos Estados Unidos e no Brasil indicam o contrário.

O artigo usa números de armas e homicídios dos Estados Unidos, mas fornece dados incorretos sobre o Brasil.

A publicação original foi feita após dois atentados com armas de fogo nos Estados Unidos que resultaram em 31 mortos. O texto acusa a mídia de hipocrisia e a esquerda de ser oportunista por relacionarem a permissividade com a posse de armas à violência.

O Comprova calculou a correlação entre a força ou fraqueza relativa das legislações estaduais sobre armamentos e a taxa de mortes por armas de fogo nos estados americanos, estatística que também inclui acidentes e suicídios. O resultado encontrado aponta que quanto mais forte a regulamentação antiarmas, menor o índice de mortes por armas de fogo.

Esta verificação do Comprova investigou os dados de um texto publicado no site Jornal da Cidade Online.

Como verificamos

O Comprova verificou as alegações feitas no post com dados de instituições como Small Arms Survey, Organização Mundial da Saúde (OMS), FBI, Giffords Law Center, Departamento de Justiça norte-americano, Suprema Corte dos Estados Unidos, Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e Fórum Brasileiro de Segurança Pública. O Comprova também entrou em contato com o autor da publicação.

Você pode refazer o caminho da verificação usando os links para consultar as fontes originais ou visualizar a documentação que reunimos.

Armas e homicídios no Brasil e nos Estados Unidos

É verdadeiro que os Estados Unidos são o país mais armado do mundo, com 393 milhões de armas, mais do que as 300 milhões indicadas no texto do Jornal da Cidade Online. O país também está em primeiro lugar como a nação com mais armas entre seus cidadãos: há 120,5 armas para cada 100 habitantes. Mais de uma por pessoa e duas vezes mais do que o Iêmen, que está em segundo lugar e tem uma taxa de 52,8 armas per capita.

O Brasil é o sétimo do ranking, com 17,5 milhões de armas. Valor bem acima do exposto no texto, de menos de 1 milhão. Considerando o número de armas entre os cidadãos, há 8,3 para cada 100 habitantes.

Os dados são do último relatório da organização Small Arms Survey, de 2017, cujos estudos, envolvendo 178 países, são usados por governos do mundo inteiro para desenvolver políticas públicas. A organização é ligada ao Graduate Institute of International and Development Studies, de Genebra (Suíça).

A taxa de homicídios no Brasil é 4,8 vezes maior do que a dos Estados Unidos. Enganosamente, o texto afirma que é seis vezes maior.

Por aqui, há 31,3 homicídios a cada 100 mil habitantes e por lá, 6,5 a cada 100 mil. Os dados são de relatório de 2017 da Organização Mundial da Saúde (OMS) (expostos na página 55).

 

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Relação entre armas e violência

A premissa do texto é de que mais armas podem reduzir os índices de violência. No entanto, a maioria das pesquisas sustenta o contrário: que dificultar a compra reduz as mortes por arma de fogo.

Um estudo feito na Universidade de Columbia e publicado em 2016 no periódico Epidemiologic Reviews revisou os resultados de 130 pesquisas feitas em 10 países, de 1950 a 2014. Resultado: políticas que restringem o acesso a armas resultaram em menor violência nos países.

Em 2018, mais pessoas morreram por armas do que por acidentes de carro nos Estados Unidos, mostrou o CDC, equivalente à Anvisa norte-americana.

Há também uma revisão feita no Brasil pelo professor do Insper e pesquisador na área em análise econômica do direito Thomas Conti. Ele analisou 61 pesquisas sobre o assunto – muitas delas, revisões de outros estudos – e descobriu que 90% delas indicam que mais armas não estão associadas a menos crimes. Os critérios de seleção foram estudos publicados nos últimos cinco anos, em revistas científicas de alto padrão. Ele afirma que os estudos que defendem que mais armas combatem a violência têm falhas na metodologia.

Ainda no Brasil, há três grandes estudos que analisam a relação entre armas de fogo e violência: Mapa da Violência, o Atlas da Violência e Anuário Brasileiro da Segurança Pública. Todos apontam que maior circulação de armas está associada a mais violência.

Daniel Cerqueira, coordenador do Atlas da Violência e pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada (Ipea), órgão do governo federal, afirmou ao Comprova que as evidências internacionais e brasileiras apontam que as armas estão relacionadas à violência. Ele também destacou que a realidade dos Estados Unidos precisa ser comparada com a de outros países desenvolvidos — neste caso, o país tem índices de violência acima dos registrados em nações europeias.

“As pesquisas internacionais mostram que a arma conspira contra a segurança da própria família, que aumenta as chances de os vizinhos sofrerem violência, aumenta as chances de a arma cair no mercado ilegal e inclusive de o lar da família ser alvo de interesse de criminosos em busca das armas”, aponta o pesquisador, doutor em Economia pela PUC-Rio e um dos maiores especialistas do Brasil na relação entre economia do crime e segurança pública. “Os poucos estudos que apontaram o contrário caíram em descredibilidade por erros técnicos, foram refeitos e chegou-se a resultados contrários”, acrescenta.

O estudo mais recente em andamento e com grande abrangência está sendo tocado por um dos mais respeitados pesquisadores sobre os impactos de armas de fogo no mundo, o professor John J. Donohue, da Universidade de Stanford, nos Estados Unidos. A metodologia de análise inclui aquela usada por autores que defendem que mais armas reduzem a violência. Em junho de 2019, um artigo com os resultados foi publicado. Ao analisar os efeitos da flexibilização do porte de armas em diferentes Estados norte-americanos (lá, cada estado tem autonomia para decidir sobre o tema), os pesquisadores descobriram que facilitar o porte de armas aumentou de 13% a 15% a taxa de crimes violentos após 10 anos de as leis terem sido flexibilizadas.

Nos Estados Unidos, os dados também indicam que armas de fogo em casa são um risco para crianças e adolescentes. Este estudo de 2018 feito por pediatras da Universidade de Stanford, na Califórnia, mostra que ferimentos por arma são a segunda principal causa de morte de jovens nos Estados Unidos – os dados usados são do próprio governo federal. Em estados onde comprar armas é mais fácil, o risco é duas vezes maior do que onde há mais obstáculos para comprá-las. Um dos autores do estudo diz que uma criança norte-americana tem 82 vezes mais chances de morrer com um tiro do que uma criança de qualquer outro país desenvolvido.

Há ainda outro problema nos Estados Unidos: quem tem armas de fogo em casa tem 10,4 vezes mais chances de morrer por suicídio, mostrou estudo publicado no American Journal of Epidemiology em 2004. Historicamente, o maior número de mortes por armas de fogo nos EUA ocorre por suicídio, a 10ª maior causa de morte no país. Os dados do CDC ainda mostram que metade dos norte-americanos que se suicidaram em 2017 usaram justamente uma arma de fogo.

O aumento de armas na população está também associado com o aumento de armas no mercado irregular, aponta o Atlas da Violência, publicado em 2019 no Brasil. O documento cita os resultados da CPI das Armas, realizada na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro. O estudo apurou que, entre 2005 e 2015, 17,6 mil armas legais foram desviadas para o mercado paralelo, das quais 86% tinham sido compradas de forma legal para civis e militares.

Legislação sobre armas nos Estados Unidos

O texto do Jornal da Cidade Online faz uma comparação enganosa entre cidades dos Estados Unidos, afirmando que Chicago e Baltimore são as mais violentas e que têm legislações mais restritivas para o acesso a armas.

Baltimore, em Maryland, é a 4ª cidade com índice mais alto de assassinatos nos Estados Unidos (22 por 100 mil habitantes) e Chicago, em Illinois, fica na 20ª posição (9 a cada 100 mil). Os dados são das estatísticas mais recentes compiladas pela agência federal de inteligência americana, o FBI, de janeiro a junho de 2018. A taxa mais alta de homicídio é de St. Louis, no Missouri (26 mortos a cada 100 mil habitantes).

Se considerarmos os índices de crimes violentos (homicídio, estupro, assalto e agressão corporal grave), a cidade mais violenta dos Estados Unidos é Detroit, no Michigan (934 casos por 100 mil habitantes). Baltimore está na 5ª posição do ranking (839 casos a cada 100 mil habitantes) e Chicago só aparece em 30º (479 registros por 100 mil habitantes).

Embora Baltimore e Chicago tenham leis de porte e venda de armas mais restritivas, elas não são as mais rígidas do país. Maryland e Illinois estão, respectivamente, no 4º e 8º lugar do ranking do Giffords Law Center, organização que advoga pelo controle de armas de fogo e classifica a legislação dos estados americanos com notas de A a F (sendo a primeira mais restritiva e a segunda, mais permissiva). A entidade leva em consideração aspectos como verificação de antecedentes e regulamentos de segurança.

A distribuição das cidades com números de criminalidade mais altos não se divide de forma uniforme em relação à rigidez da legislação estadual sobre armas de fogo. Entre as 30 cidades americanas com maior índice de crimes violentos, 12 estão localizadas em estados com nota “F” no ranking Giffords, cinco em estados com notas “D” e “D-”, quatro em estados com notas “C” e “C-”, duas em um estado com nota “B+” e sete em estados com notas “A” e “A-”.

Quando comparamos a taxa de homicídios com a rigidez em relação à legislação de armas, observamos que entre as 30 cidades com índices mais altos de assassinatos, nove estão em estados com nota “F”, ou seja, são mais permissivas; 11 em estados com notas “D” e “D-”, cinco em estados de notas “C+”, “C” e “C-”, uma em um estado com nota “B+” e quatro em estados com notas “A” e “A-”.

O que se pode concluir desses dados é que os exemplos de Baltimore e Chicago são anedóticos, e não são indicadores de tendências nos Estados Unidos em geral. As cidades que estão no topo das mais violentas do país, Detroit e St. Louis, ficam em estados com legislação relativamente mais frouxa em relação a armas: Michigan (nota “C”, 16º lugar no ranking Giffords) e Missouri (nota “F”, 47º lugar).

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No ranking do Giffords Law Center, Maryland tem nota “A-”, o que indica uma legislação relativamente restritiva. Entre as exigências, está a checagem de antecedentes para compra e transferência de pistolas e a proibição de venda de mais de uma arma em um período de 30 dias. Para obter licença para comprar um revólver, é preciso completar um curso de segurança.

As regras mais rígidas para porte de armas de fogo no estado americano foram aprovadas em 2013, com o Firearm Safety Act. No ano passado, foram estabelecidas normas ainda mais duras, de acordo com o Giffords Law Center.

É importante ressaltar que uma parte considerável das armas utilizadas em crimes em Maryland é importada de outros estados. A Divisão de Álcool, Tabaco, Armas de Fogo e Explosivos (ATF, na sigla em inglês) do Departamento de Justiça americano registrou que, em 2017, 53% das armas rastreadas em Maryland foram compradas em outros estados dos EUA, a maior taxa de importação da nação — a média do restante do país é 29%.

Segundo a ATF, os armamentos vieram de unidades da federação como Virginia (nota “D”), Pennsylvania (“C+”), West Virginia (“F”) e Georgia (“F”), que têm legislação mais frouxa que Maryland, segundo o ranking do Giffords Law Center.

Illinois tem nota “B+” e fica na 8ª posição entre os 50 estados americanos no ranking Giffords. Assim como Maryland, é preciso passar por uma checagem de antecedentes antes de adquirir uma licença para portar armas, que dura 10 anos. Há ainda uma lei de proteção a crianças que proíbe deixar armas destrancadas ao alcance de menores de 14 anos. O estado, no entanto, não exige o registro de armas de fogo nem impõe restrições à compra de múltiplos armamentos.

De forma semelhante ao que ocorre em Maryland, Illinois também tem taxa alta de importação de armas de outros estados. Segundo relatório da ATF de 2017, 52% das armas rastreadas utilizadas em crimes vieram de unidades da federação diferentes. Indiana (nota “D-”), Wisconsin (“C-”) e Missouri (“F”) são as fontes mais frequentes de armas, todos estados com legislação mais permissiva, de acordo com avaliação do Gifford Law Center.

O departamento de polícia da cidade de Chicago também produziu um documento sobre a origem das armas empregadas em crimes. O levantamento aponta uma tendência consistente de uma década em que a maioria das armas de fogo ilegais recuperadas em Chicago são rastreadas a estados com menos regulação de armas de fogo. No caso da cidade, quase 60% do armamento usado em crimes vinha de outras unidades da federação.

Usar Chicago como exemplo de cidade em que o controle de armas de fogo não funcionaria já foi uma tática empregada pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, e pela ex-porta-voz da Casa Branca Sarah Huckabee Sanders. Como ressaltou a rádio americana NPR, esse argumento também ecoa em sites de direita, como o Breitbart. Essa alegação, no entanto, já foi desmentida por agências de fact checking dos Estados Unidos, como Politifact.

De acordo com o Politifact, a reputação de Chicago como uma cidade com alta restrição ao porte e venda de armas vem de 1982, quando foi banida a posse de revólveres nos limites municipais. Essa proibição caiu em 2010, com uma decisão da Suprema Corte americana baseada na Segunda Emenda da Constituição do país. Em 2013, o estado de Illinois afrouxou sua legislação sobre armas, permitindo o porte não ostensivo de armas.

Em geral, o estado americano que tem a legislação considerada mais restritiva em relação ao porte e à posse de armas é a Califórnia. Todas as vendas de armamentos e munições precisam passar por verificação de antecedentes; vendedores e compradores devem ter licenciamento; há registros permanentes de armas de fogo; existe proibição de armamentos de alto calibre; autoridades locais têm liberdade de impor ainda mais restrições sobre o assunto.

O Mississippi fica em último lugar no ranking do Giffords Law Center, o que quer dizer que o estado tem a legislação considerada mais permissiva em relação ao porte e à posse de armas. Donos de armamentos não precisam ter licença ou registrar suas armas; não há limite no número de armas que pode se comprar de uma só vez; não há verificação de antecedentes na transação de armas entre duas partes privadas.

A organização pró-controle de armas observou uma correlação entre os estados com legislação mais permissiva e a taxa de mortes por armas de fogo. O Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos Estados Unidos compila essas estatísticas de mortalidade, que incluem acidentes, auto-defesa e suicídio, além de crimes violentos.

Existe correlação entre duas variáveis quando elas caminham juntas. O Comprova calculou a correlação entre a nota do Giffords Law Center e a taxa de mortes por armas de fogo, em uma escala que vai de -1 a 1. Em termos estatísticos, quanto mais próximo o resultado for de 1, maior a correlação — considera-se que ela é “forte” quando fica entre 0,70 e 0,89. A correlação encontrada foi de -0,78, o que quer dizer que quanto mais forte a legislação antiarmas, menor a taxa de mortes por armas de fogo.

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Violência nos Estados Unidos e na Suíça

A publicação do Jornal da Cidade Online faz uma comparação entre os índices de violência de cidades dos Estados Unidos governadas por democratas e republicanos.

De fato, a maioria das cidades mais violentas dos Estados Unidos são governadas por democratas. Segundo estatísticas de crimes mais recente do FBI, de janeiro a junho de 2016, dentre as 20 cidades com maior índice de criminalidade violenta, apenas uma tinha um prefeito republicano — Wichita, no Kansas. Outras três tinham governo apartidário — caso de Springfield, no Missouri, San Bernardino, na Califórnia, e Beaumont, no Texas.

Entre as 20 cidades com menor índice de criminalidade violenta, sete são democratas e seis, republicanas.

O mesmo é observado quando a taxa considerada é a de homicídios. Entre as 20 primeiras, apenas uma tem prefeito republicano: Westminster, no Colorado. Dentre as 32 cidades com taxa de homicídio zero, sete são democratas e cinco, republicanas.

Mas isso quer dizer que ter um prefeito democrata aumenta a violência de uma cidade? Não necessariamente. Ao refletir sobre o assunto, é preciso ter em mente dois conceitos importantes que cientistas usam ao olhar para dados estatísticos: correlação (quando dados de diferentes contextos aumentam ou sobem junto, indicando que um fenômeno está ligado a outro) e causalidade (quando os dados indicam que um fenômeno causa outro).

O site Spurious Correlations (correlações absurdas, em inglês) traz alguns exemplos de ligações que não fazem nenhum sentido. Uma delas é que o número de crianças afogadas em piscina cresce quando é lançado no cinema um filme com o ator Nicholas Cage.

Apenas com os dados apresentados no texto publicado pelo Jornal da Cidade, não podemos afirmar de forma categórica que a correlação entre cidades democratas e taxa de violência seja espúria. Segundo o cientista político Guilherme Jardim, é possível que este seja um caso em que existam “variáveis de confusão”. São fatores terceiros que podem influenciar na correlação entre um elemento e outro.

“Outros fatores podem estar causando, ao mesmo tempo, a eleição de democratas”, afirma Jardim. “Por exemplo, fatores populacionais, raciais, regionais e de pobreza.”

Um artigo na revista National Review explora esse assunto. Um dos elementos a levar em conta é que, em geral, grandes centros urbanos nos EUA são democratas. Das 100 maiores cidades do país, 62% são governadas por este partido. E há exemplos muito diferentes nesse grupo: Baltimore, em Maryland, tem alta taxa de crimes violentos; mas Austin, no Texas, tem índice baixo de violência e também é democrata.

As duas cidades têm características muito diferentes. Por exemplo, enquanto Baltimore tem população majoritariamente negra (61,9%), Austin é composta principalmente por brancos (47,7%) e hispânicos ou latinos (34,2%). Baltimore tem taxa de pobreza de 22,4%, com renda média de US$ 47 mil por ano. Em Austin, esses valores são de 15,4% e US$ 67 mil, respectivamente. Esses elementos podem influenciar, de maneiras distintas, os índices de criminalidade.

A relação entre armas e criminalidade é complexa: pesquisadores do tema afirmam que o crime ocorre por vários fatores, incluindo desigualdade social, acesso a armas, poucos policiais na rua, entre outros.

O texto do Jornal da Cidade Online alega ainda que, retiradas as cidades democratas, a taxa de homicídios dos Estados Unidos seria comparável à da Suíça. Consultado, o autor do artigo não mostrou estatísticas que corroborem essa comparação. O índice de assassinatos suíço é um dos mais baixos da Europa, de 0,5 a cada 100 mil habitantes segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). Nos Estados Unidos, essa taxa é de 6,5 por 100 mil habitantes.

Áreas com restrições às armas

A publicação do Jornal da Cidade Online alega ainda que a restrição às armas em algumas áreas contribuiria para um maior número de ataques.

O Washington Post fez em maio de 2018 a checagem de uma declaração do presidente Donald Trump que usava a mesma informação: ele afirmou que 98% dos ataques aconteceram em lugares onde as armas são proibidas.

O jornal apontou que Trump se baseou em um estudo da organização Crime Prevention Research Center (CPRC). A página foi atualizada e no dia 13 de agosto apontava que 94% dos ataques desde 1950 aconteceram em “Gun-Free Zones”. Consultando o site Wayback Machine, no entanto, é possível ver que em maio deste ano o índice apontado era de 97,8%.

Um estudo da Everytown for Gun Safety, citado pelo Washington Post, apontou que 10% dos ataques entre 2009 e 2016 aconteceram em áreas com restrição às armas. As duas pesquisas, no entanto, não podem ser comparadas por terem metodologias diferentes, como o número de vítimas para que seja considerado um ataque, e terem sido realizadas em períodos distintos.

Com exceção das escolas, que estão na legislação nacional, a definição das normas sobre essas localidades cabe a cada um dos estados.

A publicação do Jornal da Cidade Online relaciona a política de restrição de armas a Joe Biden, adversário de Trump nas eleições de 2020. Em 1990, foi aprovada uma legislação que criava as “Gun-Free School Zones”, que proibia a posse de armas em áreas escolares. O presidente era George H. W. Bush, do Partido Republicano, e Biden estava no Congresso.

Em 1994, durante o governo de Bill Clinton, do Partido Democrata, houve uma nova mudança nas leis criminais, que é relacionada politicamente ao nome de Joe Biden nos Estados Unidos. A lei tem um capítulo sobre armas, mas não estabelece outras zonas, além das escolas, onde as armas são proibidas. O trecho sobre as “Gun-Free School Zones”, porém, estabelece que crimes envolvendo drogas e armas são problemas nacionais. Além disso, frisa que a violência em áreas escolares tem como consequência a queda na qualidade da educação, que tem impacto na economia dos Estados Unidos.

Pena de morte

A publicação do Jornal da Cidade Online ainda critica políticas de esquerda e afirma que “terrorista merece a pena de morte”. Esses trechos não foram verificados pelo Comprova por serem opinativos.

Repercussão nas Redes

O artigo foi divulgado pelo site Jornal da Cidade Online em 6 de agosto e desde então obteve 488 compartilhamentos nas contas de Facebook e Twitter da própria publicação, segundo a ferramenta de medição Crowdtangle. Somando ao engajamento em outras contas, esse conteúdo obteve 1,3 mil interações até o dia 14 de agosto. Os principais divulgadores foram páginas de direita e de apoiadores do presidente Jair Bolsonaro.

Contexto

O texto foi publicado no dia 6 de agosto, após dois ataques nos Estados Unidos, um em El Paso, no Texas, e o outro em Dayton, no estado de Ohio. O primeiro deixou 22 mortos e o segundo terminou com nove mortos.

Em entrevista depois dos atentados, o presidente Jair Bolsonaro (PSL) afirmou a jornalistas que “não é desarmando o povo que você vai evitar isso aí”.

No Brasil, o porte de armas é proibido desde o Estatuto do Desarmamento, Lei 10.826, de 22 de dezembro de 2003, quando o presidente era Luiz Inácio Lula da Silva (PT). As exceções são integrantes das Forças Armadas, policiais (federais, rodoviários federais, ferroviários federais, civis e militares), bombeiros militares, auditores fiscais e tributários, entre outras categorias. Para a posse, alguns dos requisitos eram a declaração da efetiva necessidade e a apresentação de documentos como comprovação de ocupação lícita, residência certa, capacidade técnica e aptidão psicológica.

Em 2005, um referendo retirou o artigo 35 do estatuto, que previa a proibição da comercialização de armas de fogo e munição. Os outros trechos da lei, no entanto, não foram alterados na consulta popular.

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O Estatuto do Desarmamento revogou a lei 9.437/1997, do governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB), que criava o Sistema Nacional de Armas (Sinarm). Essa lei não proibia o porte de arma, apenas limitava ao “requerente comprovar idoneidade, comportamento social produtivo, efetiva necessidade, capacidade técnica e aptidão psicológica para o manuseio de arma de fogo”.

O Mapa da Violência de 2016 apontou que as taxas de homicídios nos estados são heterogêneas e, enquanto São Paulo e Rio de Janeiro, maiores centros urbanos do país, tiveram trajetória de queda, no Norte e no Nordeste houve um aumento. “Continuando o processo iniciado em meados da década de 1990, agora reforçado pelos controles impostos pelo Estatuto do Desarmamento, se consolida a tendência de queda nos grandes polos da violência tradicionais e seu deslocamento para municípios do interior e/ou novos polos”, aponta a pesquisa. As vítimas são predominantemente homens e jovens. Além disso, enquanto o número de vítimas negras aumentou, o de brancas diminuiu.

Em 2019, Jair Bolsonaro assinou sete decretos flexibilizando a posse e o porte de armas. O primeiro foi o 9.685, de 15 de janeiro de 2019, que mudava as regras para a posse. Esse texto foi revogado pelo decreto 9.785, de 7 de maio de 2019, que, por sua vez, foi alterado pelo decreto 9.797, de 21 de maio de 2019.

No dia 18 de junho, o Senado Federal rejeitou o decreto 9.785. Foi aprovado o Projeto de Decreto Legislativo 233/2019, do senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), sustando o texto de Bolsonaro. O presidente criticou a decisão no Twitter.

O decreto de 7 de maio flexibilizava o porte de armas a 20 categorias profissionais, entre elas advogados, políticos com mandato e jornalistas especializados na cobertura policial, e ampliava de 50 para 5 mil o número de munições permitidas. O texto de 21 de maio alterava pontos polêmicos no primeiro, revogando, por exemplo, o artigo que abria a possibilidade de portar armas em aviões.

O texto do PDL, que sustou o decreto, seguiria para análise da Câmara, mas, no dia 25 de junho, Bolsonaro revogou o decreto e publicou os 9.844 (revogado), 9.845, 9.846 e 9.847, de 25 de junho de 2019. Foi apresentado no dia 26 de junho o PL 3723/2019, que tramita em regime de urgência.

O projeto de lei acaba com a proibição do porte de arma e afirma que ele é “pessoal, intransferível e será concedido para” diversas categorias, como caçadores e colecionadores. Além disso, prevê a possibilidade de regulamentar o porte para outras profissões.

Já tramitava na Câmara desde 2012 o PL 3722 (com 132 projetos apensados), do deputado Rogério Peninha Mendonça (MDB-SC), que revoga o Estatuto do Desarmamento.

Verificação

Investigado por: 2019-08-13

Montagem enganosa atribui a Bolsonaro obras na BR-163 feitas no governo Dilma

  • Falso
Falso
Uma montagem de fotos sobre os estágios das obras na BR-163 durante os governos do PT e de Bolsonaro é falsa, pois usa imagens de 2017 e 2015, anteriores à posse do atual presidente

É falsa uma montagem feita com duas fotos para comparar a situação da rodovia BR-163 nos governos petistas e no atual, do presidente Jair Bolsonaro (PSL). No conjunto de imagens, a foto de cima, da estrada em situação precária, é atribuída aos “16 anos de PT”; a de baixo, da estrada em pavimentação, é creditada aos “7 meses de Bolsonaro”. As fotos, porém, não correspondem aos períodos citados.

Esta verificação do Comprova investigou os dados de uma montagem encontrada pelo nosso monitoramento nas páginas “O Mito” e “Bolsonaro Bahia”, do Facebook.

Como verificamos

Para esta verificação, o Comprova submeteu as fotos usadas na montagem ao mecanismo de busca de imagens do Google, funcionalidade que procura na internet outras versões de uma mesma imagem. Consultamos também reportagens sobre a obra e nos sites do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT), do Ministério da Infraestrutura e da concessionária que administra um dos trechos da BR-163.

Você pode refazer o caminho da verificação do Comprova usando os links para consultar as fontes originais ou visualizar a documentação que reunimos.

O Comprova descobriu que as fotografias usadas na montagem com os dizeres “16 anos de PT” e “7 meses de Bolsonaro” não foram capturadas nos momentos alegados. A imagem de cima é de 2017 e a de baixo, de 2015.

As duas fotos usadas na comparação são efetivamente da rodovia BR-163, mas elas também não comparam os mesmos trechos.

A foto de cima foi feita na região do município de Trairão, no estado do Pará, cuja obra de pavimentação é de responsabilidade do DNIT em convênio com o Exército brasileiro e a Polícia Rodoviária Federal (PRF).

A imagem de baixo, por sua vez, foi capturada dois anos antes, na parte da rodovia que fica no Mato Grosso, conforme confirmou ao Comprova a concessionária Rota do Oeste, responsável pelas obras de pavimentação entre os municípios mato-grossenses de Itiquira e Sinop.

BR-163/PA

A fotografia dos caminhões parados em um atoleiro, vista na parte superior da montagem, teve o seu primeiro registro encontrado pela equipe do Comprova em uma matéria publicada pelo site do Jornal Folha do Progresso, de 27 de fevereiro de 2017. Foi recebida pelo veículo por meio do aplicativo de mensagens instantâneas WhatsApp, segundo a sua descrição.

De acordo com a reportagem na qual se encontra a foto, o Exército havia ido para o trecho da BR-163 em Trairão após as fortes chuvas que atingiram a região no mês de fevereiro, como mostra esta matéria do portal G1.

Um dia depois, em 28 de fevereiro de 2017, o Ministério de Infraestrutura publicou uma notícia informando que o Exército e a PRF – em conjunto com o DNIT, responsável pelas obras no trecho em questão da BR-163 – estavam se dirigindo ao local para a manutenção da rodovia.

Em março do mesmo ano, o Ministério de Infraestrutura também informou sobre os níveis operacionais do trecho – entre as comunidades de Santa Luzia e Bela Vista do Caracol – locais igualmente mencionados pelo Jornal Folha do Progresso.

Em 2017 o presidente que estava no poder era Michel Temer, do MDB, que assumiu o cargo após Dilma Rousseff, do PT, ser submetida a um processo de impeachment em 2016.

Em e-mail ao Comprova, o DNIT afirmou que o trecho de Trairão, no Pará, já está asfaltado. “A BR 163/PA, desde a divisa com o Mato Grosso até o Porto de Miritituba, tem a extensão de 706 quilômetros. Atualmente, essa extensão está praticamente toda pavimentada, restando pouco mais de 39 quilômetros a serem pavimentados. São 37 quilômetros do segmento sob a responsabilidade do Exército e 2,5 quilômetros sob responsabilidade de uma empresa contratada. O trecho sob responsabilidade do Exército está dividido em 4 lotes de obras. O cronograma prevê a conclusão dos serviços até o final de 2019, deixando a rodovia trafegável e sem pontos críticos”, disse o DNIT.

BR-163/MT

A fotografia de baixo, que mostra um trecho de estrada sendo pavimentado, foi tirada em junho de 2015, conforme a confirmação da concessionária Rota do Oeste ao Comprova por e-mail.

De acordo com a explicação, a foto da realização da pavimentação consta no banco de dados do setor de Comunicação da empresa, arquivada no sistema em 17 de junho de 2015, às 18h12”.

Segundo a assessoria da concessionária, “a imagem é referente à matéria Rota do Oeste inicia pavimentação da segunda etapa de duplicação, que na época foi divulgada à imprensa para informar sobre o andamento das obras de duplicação da BR-163, na região sul de Mato Grosso.

No site da Rota do Oeste, a matéria explica que o trabalho foi realizado no quilômetro 74 da BR-163 e marcava o aniversário de um ano de obras da concessionária na rodovia.

Em 2015, Dilma Rousseff estava em seu segundo mandato no comando do Brasil, diferentemente do que foi afirmado no meme viralizado.

Repercussão nas Redes

O Comprova verifica conteúdos duvidosos sobre políticas públicas do governo federal que tenham grande potencial de viralização.

A publicação da montagem com as fotografias da BR-163 foi postada na página do Facebook “O Mito” em 5 de agosto de 2019 e até o dia 12 do mesmo mês já contava com mais de 700 compartilhamentos e quase 1.000 interações. O post não aparece mais na página “Bolsonaro Bahia”. Na captura de tela feita pelo Comprova, no dia 5 de agosto, a publicação já havia sido compartilhada 8,8 mil vezes.

O AFP Checamos, Aos Fatos e a Agência Lupa já haviam feito checagem das fotografias da BR-163 anteriormente.

Verificação

Investigado por: 2019-08-09

Contratos de empresa do presidente da OAB com estatais não foram obtidos em licitação, mas são regulares

  • Enganoso
  • Evidência comprovada
Enganoso
Artigo diz que escritório de Felipe Santa Cruz recebeu recursos de estatal sem licitação, mas omite que o tipo de contrato firmado dispensa processos licitatórios
Evidência comprovada
Os contratos existem, foram firmados com Petrobras e Serpro e podem ser verificados nos portais da transparência das estatais

É enganoso um artigo compartilhado nas redes sociais sobre os contratos do escritório do presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz, com a Petrobras e o Serviço Federal de Processamento de Dados (Serpro) durante a gestão da ex-presidente Dilma Rousseff (PT).

O texto omite o fato de que os tipos de contratos firmados com as empresas dispensam licitação. Portanto, não houve nesse aspecto irregularidade na contratação.

Um outro post, feito no Twitter e sobre o mesmo tema do artigo, informa sobre os valores do contrato. Eles são verdadeiros. A mensagem também afirma que o governo Bolsonaro prometeu romper com os contratos ainda em vigor. Na última terça-feira, 6 de agosto, Santa Cruz foi informado pela Petrobras da suspensão do contrato vigente com a estatal.

Esta verificação do Comprova investigou os dados de três publicações encontradas pelo nosso monitoramento: um tuíte do perfil @profeborto, um post no site Jornal da Cidade Online e outro no site Caneta.org.

Como verificamos

O Comprova consultou dados dos contratos nos portais da transparência da Controladoria-Geral da União e da Petrobras, conferiu as legislações federais que dispõem sobre as normas para licitações da administração pública, checou o regulamento do procedimento licitatório da Petrobras e fez contato com o escritório de advocacia de Santa Cruz.

Você pode refazer o caminho da verificação do Comprova usando os links para consultar as fontes originais ou visualizar a documentação que reunimos.

Serpro

O contrato com o Serpro, assinado em 2014 e com vigência até 21 de dezembro de 2019, refere-se à defesa da empresa pública perante o Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região e o Tribunal Superior do Trabalho nos autos do processo nº 0132000-50.1989.5.01.0016.

Para esse contrato, foram feitos três pagamentos, no total de R$ 1,3 milhão. As parcelas foram de R$ 300 mil em março de 2015, R$ 876.000,27 em 10 de setembro de 2018 e a retenção de impostos no valor de R$ 91.421,34, em 18 de outubro de 2018.

O serviço foi prestado sem licitação visto que a modalidade de contratação do escritório de Santa Cruz é classificada como “inexigível”.

Segundo a lei de licitações (Lei 8666/93), a contratação de serviços técnicos, entre eles a defesa de causas judiciais ou administrativas, não exige a realização de processo licitatório. Isto está previsto no inciso II do Art. 25 da lei e no inciso V do art. 13.

Petrobras

Caso semelhante ao Serpro é identificado nos contratos do escritório de advocacia Stamato, Santa Cruz e Saboya Advogados com a Petrobras (atenção: para fazer a consulta por esse link deve-se utilizar o número do contrato. Eles são informados a seguir). A empresa tem o mesmo CNPJ da Santa Cruz Scaletsky Advogados.

Com a Petrobras, a empresa de Santa Cruz teve dois contratos firmados no valor total de R$ 2,5 milhões. Na terça, 6 de agosto, Santa Cruz informou que a estatal cancelou o contrato.

Segundo o Portal da Transparência, o contrato no valor de R$ 1,5 milhão (número 4600407072) foi assinado em maio de 2013 e tinha vigência até janeiro de 2020. Ele se referia à defesa da empresa em ação movida pelo Sindicato dos Petroleiros do Norte Fluminense.

Já o outro contrato (número 4600444383), no valor de R$ 1 milhão, vigorou, também segundo o Portal da Transparência, de junho de 2014 a junho de 2019. Ele se referia à representação da estatal em três ações rescisórias.

De acordo com a OAB, ambos contratos ainda estavam vigentes e seriam encerrados apenas com o fim do processo, apesar de as informações do portal apontarem a data de término em junho de 2019 para um deles. A entidade, porém, disse não poder encaminhar cópia dos contratos, sob a justificativa de que são sigilosos.

A Petrobras disse por telefone que não comentaria. Solicitada a confirmar por email, não respondeu até a publicação deste texto.

Ao todo, os dois contratos com a Petrobras somam R$ 2,5 milhões, e ambos também foram enquadrados como “inexigíveis”. A possibilidade está amparada no Decreto 2.745/1998, assinado pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que estabelece o Regulamento do Procedimento Licitatório Simplificado da Petrobras.

Dispensa de licitação

A legislação permite a dispensa de licitação em casos de “inviabilidade fática ou jurídica de competição”, como casos de defesa de causas judiciais ou administrativas da estatal.

Somados, os contratos da Petrobras (R$ 2,5 milhões) e os pagamentos realizados pelo Serpro (R$1,3 milhão) chegam ao valor aproximado referido no tuíte que viralizou.

Tanto o contrato com o Serpro quanto os contratos com a Petrobras foram feitos com o mesmo CNPJ (11.820.663/0001-79). No entanto, constam no Portal da Transparência três razões sociais diferentes para o referido CNPJ, isso porque a empresa teve seu quadro de sócios e nome alterados no período. Segundo comprovante de CNPJ emitido pela Receita Federal, a razão social atual da empresa é “Felipe Santa Cruz Advogados”.

Nos contratos assinados com a Petrobras, em maio de 2013 e junho de 2014, a razão social que consta no site da estatal é “Stamato, Santa Cruz e Saboya Advogados”. Já no contrato assinado com o Serpro em 2014, consta a razão social “Santa Cruz Scaletsky Advogados”.

Fim dos contratos

Publicações nas redes sociais informam que Bolsonaro prometeu romper com os contratos ainda em vigor de Santa Cruz. O Comprova não localizou reportagens nas quais o presidente prometia rever os acordos específicos do advogado com o Serpro e a Petrobras, mas Santa Cruz anunciou na terça-feira, 6, que a Petrobras suspendeu o contrato com seu escritório.

Santa Cruz classificou a iniciativa como “perseguição política” e disse que irá ajuizar uma ação de reparação de danos contra a estatal.

Procurados pelo Comprova, o Palácio do Planalto e a Petrobras informaram que não iriam comentar o assunto.

Repercussão nas redes

O Comprova verifica conteúdos duvidosos sobre políticas públicas do governo federal que tenham grande potencial de viralização.

O post sobre os contratos de Santa Cruz foi publicado no Twitter pelo perfil @profeborto em 31 de julho e teve 167 compartilhamentos até o dia 8 de agosto.

Uma versão anterior desse conteúdo foi publicada no dia 13 de fevereiro deste ano no site Jornal da Cidade Online com autoria de “Otto Dantas”, identificado como articulista e repórter. Uma reportagem da agência Aos Fatos apontou indícios que o perfil é falso e que a foto anteriormente utilizada para apresentar Dantas foi retirada do banco de imagens Shutterstock.

Outra versão do texto que circula nas redes sociais foi publicada em 8 de fevereiro pelo site Caneta.org e acumulava, até o dia 8 de agosto, mais de 130 mil interações no Facebook, segundo a ferramenta Crowdtangle.

O Estadão Verifica já havia feito a checagem dessas informações em 13 de fevereiro de 2019.

Contexto

O presidente da OAB tem sido alvo de boatos e desinformações nas redes sociais desde a sua posse, em janeiro deste ano, por declarações contrárias ao governo e seu histórico de desavenças com Bolsonaro.

Em 2016, quando era presidente da seccional da OAB no Rio de Janeiro, Santa Cruz foi ao Supremo Tribunal Federal (STF) pedir a cassação do mandato do então deputado federal após a exaltação de Bolsonaro ao coronel Brilhante Ustra durante a votação do impeachment de Dilma Rousseff.

No último dia 29, Bolsonaro disse que poderia explicar a Santa Cruz como o pai dele desapareceu durante a ditadura militar (1964-1985). O presidente da OAB levou o caso ao Supremo e o ministro Luís Roberto Barroso deu prazo de quinze dias para Bolsonaro se explicar, caso queira.

O Comprova verificou que Fernando Augusto de Santa Cruz Oliveira foi vítima do regime e não de guerrilheiros da esquerda, conforme relatório oficial da Comissão Nacional da Verdade (CNV), criada em 2011 para investigar violações aos direitos humanos cometidas pelo Estado.

Outra informação que tem circulado nas redes e que o Comprova verificou é a filiação de Santa Cruz ao PT. Na lista de filiações partidárias disponível no site do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), de fato consta que o advogado foi filiado ao partido no Rio de Janeiro de maio de 2001 a fevereiro de 2009. Além disso, Santa Cruz foi candidato a vereador pelo PT nas eleições de 2004.