O Projeto Comprova é uma iniciativa colaborativa e sem fins lucrativos liderada pela Abraji e que reúne jornalistas de 42 veículos de comunicação brasileiros para descobrir, investigar e desmascarar conteúdos suspeitos sobre políticas públicas, eleições, saúde e mudanças climáticas que foram compartilhados nas redes sociais ou por aplicativos de mensagens.
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Saúde

Investigado por: 2020-09-17

É falso que irmãos morreram após se vacinarem contra a covid-19

  • Falso
Falso
Mulher fez acusação, sem apresentar qualquer prova, em vídeo que viralizou nas redes sociais, mas a Anvisa informa que só maiores de idade podem receber os testes das vacinas e que não houve nenhum relato de mortes ou reações adversas graves relacionadas aos testes feitos no Brasil
  • Conteúdo verificado: Em uma transmissão ao vivo que ficou gravada no YouTube, uma mulher conta a história de uma família brasileira que teria tomado vacina contra a covid-19 para poder viajar ao exterior e diz que três jovens morreram depois disso.

Não é verdade que três irmãos morreram após receber uma dose da vacina contra a covid-19, como afirma uma mulher em um vídeo que viralizou no Youtube. Ela faz diversas alegações no vídeo, mas sua história tem vários furos ou pontos que não fazem sentido, como verificou o Comprova.

A autora do vídeo diz que os jovens tinham 13, 16 e 18 anos e não especifica qual das quatro vacinas em teste no Brasil teria sido responsável pelo ocorrido – ela nem usa a palavra “vacina”, alegando que, caso falasse, seu vídeo seria derrubado. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que autoriza as pesquisas clínicas sobre a proteção no país, informou que apenas maiores de idade podem receber as doses. Além disso, a Anvisa afirmou que não houve nenhum relato de mortes nem de reação adversa grave relacionadas às imunizações.

Ainda segundo a autora do vídeo, a suposta família teria decidido se imunizar porque ia viajar para fora do Brasil. Também segundo a Anvisa, “as vacinas em teste estão restritas ao protocolo de pesquisa e aos voluntários selecionados previamente para a pesquisa”. Vacinas em fase de testes não podem ser exigidas como pré-requisitos para viagens ao exterior – ou seja, a família não poderia ter acesso ao medicamento.

A pessoa que gravou o vídeo se apresenta como terapeuta. O Comprova entrou em contato com ela, que afirmou não ter “mais nada a acrescentar”.

Como verificamos?

O Comprova entrou em contato, por e-mail, com a Anvisa e com as quatro instituições que coordenam testes com vacinas contra a covid-19 no Brasil – apenas a Iqvia não respondeu até a publicação desta verificação. Também consultamos a Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep) sobre critérios e exigências desse tipo de estudo. Por fim, consultamos o Ministério de Relações Exteriores.

Enviamos um pedido de entrevista pelo Facebook à autora do vídeo. Ela respondeu o primeiro contato e depois bloqueou a jornalista da equipe que enviou a mensagem. Uma outra repórter fez nova tentativa, mas não houve retorno até a publicação deste texto.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 17 de setembro de 2020.

Verificação

Testes no Brasil e reações adversas

Em princípio, a autora do vídeo diz que não sabe informar qual foi a vacina contra covid-19 usada pela família. Segundo a Anvisa, quatro substâncias diferentes estão sendo testadas no Brasil. O Comprova consultou as instituições responsáveis pelos experimentos sobre os critérios para adesão de voluntários e os efeitos adversos.

O Instituto Butantan informou que 4 mil voluntários (do total de 9 mil) já tomaram a primeira das duas doses da CoronaVac, desenvolvida em parceria com a farmacêutica chinesa Sinovac Life Science. Segundo a instituição, eles “são monitorados e, até o momento, não foi reportado nenhum efeito colateral grave, muito menos óbito”. O órgão classificou como “irresponsável e totalmente inverídico o depoimento que atribui a morte de pessoas ao uso da CoronaVac”. No vídeo verificado aqui, a autora faz menção ao governador de São Paulo, João Doria. Agências de checagem, como o Aos Fatos, verificaram um post no Facebook escrito pela autora do vídeo em que ela afirma que a família teria tomado a CoronaVac.

O Butantan ressaltou ainda que “qualquer estudo sério é interrompido imediatamente assim que identificada qualquer anomalia”.

Este foi o caso da vacina desenvolvida pela Universidade de Oxford e a companhia AstraZeneca, depois que uma voluntária do Reino Unido teve complicações. Os testes foram interrompidos em 8 de setembro, inclusive no Brasil, onde são conduzidos pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) em 5 mil voluntários. Após ter sido considerada segura, a testagem foi retomada no dia 14.

A Unifesp afirmou que “o estudo clínico envolve adultos acima dos 18 anos e as reações até o momento foram as esperadas, como dor temporária no local da aplicação, dor de cabeça e febre passageira”. A universidade acrescenta que “não houve intercorrências graves no Brasil”.

Outro órgão que está trabalhando a vacina é a Iqvia. A imunização chamada de Janssen-Cilag será testada em 7 mil voluntários – o que deve começar em breve. A farmacêutica não respondeu o pedido do Comprova até o fechamento deste texto, mas, no dia 18 de agosto, a Anvisa permitiu que a empresa, que faz parte do grupo Johnson & Johnson, iniciasse estudos clínicos no Brasil.

A testagem conduzida pelo Centro Paulista de Investigação Clínica (Cepic), da vacina Pfizer/Wyeth, tem a menor amostragem: mil voluntários. Os responsáveis declararam que “nenhum participante do estudo de vacina contra covid-19 da Pfizer/BioNtech morreu”.

Viagem para o exterior

A autora do vídeo diz que a família tomou a vacina porque queria viajar para a Europa. Contudo, a Anvisa diz que imunizações em fase de testes não podem ser exigidas como pré-requisito de viagens para fora do país. As substâncias “estão restritas ao protocolo de pesquisa e aos voluntários selecionados previamente para a pesquisa”. O órgão declarou ainda que as vacinas “não estão disponíveis para uso fora do protocolo de pesquisa e fora das instituições que fazem parte do estudo”.

O Comprova também questionou o Ministério de Relações Exteriores. Não houve retorno até a publicação desta reportagem.

Critérios de idade e ética das testagens

De acordo com o vídeo, os jovens que supostamente foram vítimas tinham 13, 16 e 18 anos. Mas todas as autoridades de saúde consultadas declararam que menores de idade não são admitidos nos testes com a vacina contra a covid-19.

O coordenador da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa, Jorge Venâncio, explica que “se as pesquisas da vacina fossem incluir menores, teria que ter uma emenda ao protocolo”. Ele também afirmou que o novo critério não poderia ser uma exceção a poucos participantes, mas uma norma geral. E acrescenta: “Se alguma das pesquisas tentasse inserir crianças [sem notificar] seria uma violação grave ao protocolo, que poderia gerar uma denúncia na Anvisa por violação das boas práticas clínicas”.

Venâncio explica ainda que menores de idade só são inseridos em testes quando os exames em pessoas adultas não são suficientes ou quando o objeto de estudo é próprio do grupo etário – como doenças ou medicações infantis. Pesquisas com menores de idade exigem “o consentimento dos pais e do menor, e todos os critérios de segurança”.

O coordenador da Conep observa também que “a pandemia atinge muito menos crianças que adultos. Não tem lógica fazer testes com crianças”.

A autora do vídeo, em uma segunda transmissão, deu a entender que a família tinha se submetido a algum tipo de acordo para não comentar possíveis efeitos adversos da vacina. Venâncio afirma que a prática é proibida. “Ainda que existisse esse tipo de acordo, não teria validade jurídica”, acrescenta Venâncio.

A autora do vídeo

A autora do vídeo afirma que é terapeuta e mora em Portugal. Segundo seu perfil no Linkedin, trabalha com “terapias holísticas e vibracionais” desde 1998. Em uma live de junho deste ano, ela contou ter sido cantora, mas que, após ouvir uma palestra do médium Luiz Antonio Gasparetto, procurou se aprofundar no tema da mediunidade.

Ao primeiro contato do Comprova, ela agradeceu, declarou que não tinha “mais nada a acrescentar” além do relatado na gravação e que “não iria expor ninguém sem autorização”, pois tem “ética e respeito pela dor da família”. O Comprova voltou a entrar em contato com a terapeuta, apresentando as informações da Anvisa que contradizem seus vídeos. Ela não respondeu.

Por que investigamos?

Em sua terceira fase, o Projeto Comprova investiga conteúdos relacionados às políticas públicas do governo federal e à pandemia. Conteúdos que trazem desinformação relacionada à covid-19, como o verificado aqui, são ainda mais perigosos pois colocam a saúde da população em risco e podem custar vidas.

Uma vacina é a forma mais eficiente de imunizar a população e esforços estão sendo feitos em todo planeta para chegar a essa solução. Mais do que gerar medo e desconfiança, o vídeo coloca a saúde da população em risco ao incentivar que as pessoas não se vacinem contra a doença.

A gravação teve 97.834 visualizações no YouTube até 16 de setembro e, segundo a ferramenta CrowdTangle, foi republicado 133 vezes no Twitter e teve 11.350 interações no Facebook.

Fato ou Fake, e-farsas, Aos Fatos e Lupa também investigaram esse conteúdo e classificaram como falsos os posts que circularam nas redes sociais.

Publicações que tentam desacreditar a importância da vacina já foram verificadas pelo Comprova, como a que dizia que a vacina causava danos irreversíveis ao organismo, o tuíte que afirmava que a imunização usa células de fetos abortados e uma teoria conspiratória segundo a qual a proteção teria um microchip para rastrear a população.

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.

Política

Investigado por: 2020-09-17

TV alemã exibiu elefantes ao falar sobre queimadas na Amazônia

  • Comprovado
Comprovado
Emissora alemã confirmou ao Comprova a exibição da imagem para ilustrar uma matéria sobre queimadas na Amazônia veiculada em 2019 e disse que retirou do site a reportagem tão logo os produtores se deram conta do erro
  • Conteúdo verificado: Postagens nas redes sociais com fotografia de uma reportagem da rede de televisão alemã N-TV, que utilizou uma imagem de elefantes para falar sobre o incêndio na Amazônia

É verdadeira a publicação que mostra uma televisão transmitindo reportagem da emissora alemã N-TV sobre as queimadas na Amazônia. Na matéria, é exibida uma imagem de elefantes em um rio com as legendas ‘Feuerkatastriophe im Amazonas’ (catástrofe do fogo no Amazonas) e ‘Sorge un bedrohte Tierarten’ (preocupação com espécies ameaçadas de extinção). A publicação, que circulou em diversas contas em redes sociais, acrescenta a legenda: “TV Alemã mostrando os animais fugindo do incêndio na Amazônia. É pra rir ou não?”.

A emissora N-TV, que costuma cobrir o impacto dos incêndios na Amazônia, confirmou ao Comprova por e-mail que realmente utilizou a imagem dos elefantes na reportagem sobre as queimadas, mas que ao perceber o erro – já que não há elefantes na fauna brasileira – retirou o material do ar. Por isso, não é mais possível encontrá-la no site da emissora. A fotografia dos elefantes exibida na matéria foi tirada pela fotógrafa Charmaine Noronha, da agência Associated Press (AP), em Botswana, na África, em 2013.

A reportagem alemã foi veiculada em agosto de 2019, quando as queimadas na Amazônia brasileira estavam em evidência ao redor do mundo. A imagem começou a circular com tom de sátira já no mês seguinte, no Reddit e também no site MEME, mas só apareceu em publicações brasileiras em setembro deste ano – quando incêndios voltaram a ser assunto.

Como verificamos?

O Comprova realizou uma busca reversa de imagens utilizando Google, Bing, TinEye, Baidu e Yandex para identificar diferentes versões da publicação e qual teria sido a primeira aparição da fotografia da televisão exibindo a reportagem. Procuramos, ainda, o vídeo no site oficial da N-TV e da Heute TV, uma emissora de televisão de Viena, na Áustria, que havia republicado o vídeo da reportagem sobre incêndios. Também buscamos pela fotografia dos elefantes com uma pesquisa simples no Google.

Em seguida, o Comprova procurou a porta-voz da N-TV, o repórter responsável pela matéria sobre as queimadas na Amazônia e o profissional responsável por fazer verificações na emissora. Também entrou em contato com uma agência de checagem alemã, a Correctiv.

Verificação

Imagem é verdadeira, mas vídeo foi retirado do ar

A N-TV, emissora privada alemã que integra o grupo RTL de mídia, foi o primeiro canal de notícias 24 horas em alemão e chegou a pertencer ao mesmo grupo da CNN. Além de cobrir assuntos locais, a N-TV possui um noticiário internacional e, desde o ano passado, tem publicado diversas reportagens sobre incêndios na Amazônia.

Essa reportagem foi ao ar no dia 23 de agosto de 2019. O Comprova a localizou pelo título que aparece na chamada da televisão: ‘Feuerkatastriophe im Amazonas’ (catástrofe do fogo no Amazonas). Logo abaixo, consta mais uma informação sobre a reportagem: ‘Sorge un bedrohte Tierarten’ (preocupação com espécies ameaçadas de extinção).

A segunda chamada, na sequência das informações sobre os animais ameaçados de extinção, também é real: ‘Nawalny verlässt nach 30 Tagen Gefängnis’ (Nawalny deixa a prisão após 30 dias), se referindo à soltura do líder opositor russo, crítico de Vladimir Putin. Esta notícia também foi publicada no dia 23 de agosto de 2019 no site da N-TV.

O texto sobre os incêndios no Amazonas foi publicado no site da emissora no mesmo dia, assinado pelo repórter Roland Peter, correspondente da N-TV na América Latina, mas não faz nenhuma menção a elefantes. O Comprova entrou em contato com Peters, mas ele não soube dizer se a imagem era real ou não.

Apesar de todas as informações de datas baterem, o vídeo em que os elefantes aparecem não foi localizado no site da N-TV. O Comprova encontrou uma checagem sobre o mesmo assunto no site Boa Informação, que classifica a reportagem como verdadeira, mas não poderia confirmar se os elefantes tinham sido usados na imagem porque o vídeo tinha sido excluído.

O link divulgado pelo Boa Informação levava até o site da austríaca Heute TV, que havia republicado a reportagem. No entanto, ao clicar no endereço, fomos redirecionados para a capa do site. Por uma semana, tentamos contato com os dirigentes na Heute TV, mas não tivemos retorno.

O Comprova procurou pela porta-voz da N-TV, Bettina Klauser, por e-mail. Ela repassou a demanda a Alessia Gerkens, gerente de comunicação e relações públicas na RTL, grupo do qual a emissora faz parte. A reportagem também entrou em contato, por e-mail e via Twitter, com Andreas Greuel, o responsável por fazer verificações na emissora.

Por e-mail, Gerkerns confirmou que a imagem dos elefantes foi utilizada pela N-TV, mas que a reportagem foi retirada do ar ainda em 2019 depois que a produção percebeu o erro. Por isso, não é possível encontrar o vídeo original. Também por e-mail, Andreas Greuel agradeceu o contato e o interesse em esclarecer os fatos e disse que “infelizmente, erros acontecem”.

Elefantes não são nativos do Brasil

Não há elefantes nativos na fauna brasileira, embora existam animais no país em situação de cativeiro. A fotografia usada pela emissora de TV alemã foi feita em 2013 em Botswana, na África, por Charmaine Noronha. A imagem está publicada no site da agência Associated Press (AP).

Viralização da publicação no Brasil

A reportagem alemã foi exibida no final de agosto de 2019, quando os focos de incêndio e as queimadas na Amazônia brasileiras estavam em evidência e eram tema de debate ao redor do mundo.

Porém, a publicação em tom de sátira só começou a viralizar no Brasil em 2020. O primeiro registro encontrado pelo Comprova em português é de 6 de setembro deste ano.

Por que investigamos?

Em sua terceira fase, o Comprova verifica postagens suspeitas que tenham viralizado nas redes sociais e que tratam das políticas públicas do governo federal ou da pandemia da covid-19. Questões relativas à Amazônia estão no centro do debate político e são constantemente objeto de desinformação.

Em 2019, o Comprova mostrou que não era verdadeira a acusação de que o governo do ex-presidente Lula teria vendido terras para uma empresa da Noruega e que imagens de um avião combatendo incêndios não tinham sido gravadas no Brasil

Neste ano, o Comprova fez outras verificações envolvendo a Amazônia, como a de um vídeo que mostra uma queima controlada feita pelo Ibama e não um incêndio provocado para culpar o presidente, a de um post que usa uma foto antiga de madeireiros para acusar ONGs por incêndios na Amazônia e a de um vídeo que distorce dados sobre queimadas na Amazônia.

O post verificado pelo Comprova foi publicado pelo perfil @direitadaopressao e teve 9,8 mil curtidas no Instagram. No Facebook, foi compartilhado por vários perfis pessoais e em um deles teve 1,1 mil compartilhamentos.

Comprovado, para o Comprova, é o evento confirmado ou o conteúdo original publicado sem edição.

Política

Investigado por: 2020-09-16

Vídeo distorce dados sobre queimadas na Amazônia

  • Enganoso
Enganoso
Diferentemente do que mostra o vídeo, houve um aumento do número de focos de incêndio na Amazônia em relação a 2019 e o Brasil não é o país com produção mais sustentável de alimentos no mundo. Está na 40ª posição entre 67 países em um ranking da The Economist
  • Conteúdo verificado: Vídeo lançado pela Associação de Criadores do Pará afirma que a Amazônia não está queimando, que o Brasil é o país que mais preserva áreas nativas do mundo e que os alimentos brasileiros são os mais sustentáveis do planeta

Um vídeo produzido pela Associação dos Criadores do Pará (AcriPará) que viralizou nas redes sociais usa informações distorcidas, fora de contexto ou dados questionáveis para afirmar que a Amazônia brasileira não está sendo alvo de queimadas e que o Brasil é o país mais sustentável do mundo na produção de alimentos. A peça também afirma que o Brasil é a nação que mais preserva áreas de vegetação nativa em todo o mundo, o que não está correto. Além de divulgado por diversos usuários na internet, o vídeo foi compartilhado pelo ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles e pelo vice-presidente Hamilton Mourão (PRTB), presidente do Conselho Nacional da Amazônia Legal.

O monitoramento feito pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) mostra um aumento de 11% no número de focos de queimada na Amazônia do início do ano até 14 de setembro em comparação com o mesmo período do ano passado. Dos 64.498 pontos de calor identificados na região em 2020, 49.792 ocorreram em agosto e setembro.

Embora o Brasil preserve 66,5% de cobertura vegetal nativa – dado usado corretamente no vídeo –, segundo o Projeto MapBiomas, o país perdeu 87 milhões de hectares de vegetação nativa desde 1985, considerando áreas que foram desmatadas e nunca recuperadas.

O Brasil também está longe de produzir os alimentos mais sustentáveis do mundo: ocupa o 40º lugar entre 67 países no Food Sustainability Index, elaborado pela revista The Economist e pelo Barilla Center for Food & Nutrition. No quesito agricultura sustentável, o Brasil ainda perde posições no ranking, ficando na 51ª colocação.

O vídeo cita como fonte para a maioria dos dados mencionados a Embrapa Territorial, braço de análises geográficas da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa). As informações da Embrapa Territorial já haviam sido questionadas no ano passado por um artigo divulgado na revista científica Environmental Conservation, publicada pela Cambridge University Press. Os autores do artigo afirmaram que alguns dados apresentados por Evaristo de Miranda, chefe da empresa pública, não apresentam referências científicas.

Nesta terça-feira (15), o vídeo foi retirado do ar após o Greenpeace Brasil notificar plataformas como Twitter, Facebook e YouTube que a peça usava imagens da ONG sem autorização.

Como verificamos?

A ferramenta de busca do Google foi o ponto de partida desta verificação. Por meio desse recurso, mapeamos estudos e reportagens sobre preservação ambiental, sustentabilidade alimentar e destruição do bioma brasileiro.

Para checar as informações sobre queimadas na Amazônia, acessamos o site do Inpe. Lá encontramos dados mensais sobre os focos de incêndio.

Sobre a parte de preservação ambiental, pesquisamos no Projeto MapBiomas, uma das referências na área. Também consultamos o Banco de Dados sobre Áreas Protegidas, mantido pela ONU Meio Ambiente.

Ainda sobre esse tema, encontramos o artigo de autores brasileiros para a revista Environmental Conservation, uma publicação da Cambridge University Press e que contestava dados da Embrapa Territorial, uma das bases para as informações contidas no vídeo. Realizamos uma entrevista com o biólogo Fábio Angeoletto, um dos autores do estudo. Ele nos enviou respostas elaboradas em conjunto com os demais responsáveis pela publicação: Marcelo Vacchiano, Jeater Santos e Normandes Matos da Silva.

Em seguida, fomos em busca de informações com entidades que cuidam do meio ambiente no país, como Embrapa Territorial e Ministério da Agricultura.

Durante a verificação, consultamos alguns documentos que trouxeram respostas sobre as afirmações feitas no vídeo: relatório Food Sustainability Index, censo agropecuário do IBGE (2017) e o Environmental Performance Index (EPI). Procuramos, ainda, o auxílio de especialistas para avaliar dados citados no vídeo e explicar alguns conceitos sobre controle ambiental. Fizemos uma entrevista por telefone com Tasso Azevedo, coordenador do MapBiomas.

Verificação

Quem produziu o vídeo?

O vídeo verificado foi produzido pela Associação de Criadores do Estado do Pará (AcriPará), uma associação de pecuaristas fundada em 2017. Em contato por WhatsApp com o Comprova, o presidente da entidade, Maurício Pompéia Fraga Filho, afirmou que o material foi criado como resposta a um vídeo feito pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil, que afirmava que a Amazônia estava “em chamas”.

“Esse vídeo foi feito de uma maneira despretensiosa para rebater esse outro vídeo, que recomenda que não se consumam produtos agropecuários do Brasil. O nosso vídeo foi feito só para pôr nas redes sociais e acabou viralizando”, explicou Fraga Filho.

A gravação da AcriPará ainda conta com um erro de localização. Entre as imagens há um mico-leão-dourado, animal existente apenas na Mata Atlântica. Em entrevista à Globo, ele admitiu ter sido uma “gafe”.

Ao Comprova, Fraga Filho disse que não duvida dos dados sobre queimadas na Amazônia, mas não quer que o setor produtivo “seja prejudicado pelo erro de uma minoria”.

“Nós vivemos na Amazônia, conhecemos o problema. Não somos negacionistas, conhecemos e acreditamos nos números do Inpe. Somos legalistas, brigamos pela regularização fundiária e ambiental. Mas não podemos aceitar que todo o setor produtivo brasileiro seja prejudicado pelo erro de uma minoria”, diz.

Fraga Filho é presidente da AcriPará desde a criação da entidade. No último dia 10 de setembro, a revista Veja mostrou que já foi processado por submeter trabalhadores em uma de suas fazendas a condições análogas à escravidão. Ele fez um acordo e pagou R$ 1,5 milhão.

Queimadas

A principal afirmação do vídeo verificado é que “a Amazônia não está queimando novamente”. Dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais mostram que foram registrados 20.485 focos ativos de queimadas na Amazônia entre os dias 1º e 14 de setembro, o que já é superior aos 19.925 focos de calor identificados em setembro de 2019. Um foco de queimada é um sinal de fogo detectado pelos satélites da Nasa que tiram fotos da Terra a partir do espaço.

Outros 29.307 focos de queimadas foram identificados em agosto de 2020; número ligeiramente inferior aos 30.900 pontos de incêndios identificados no mesmo mês do ano anterior.

Ao longo de todo este ano, o Inpe identificou 64.498 focos de queimada na Amazônia. Esse dado é 11% superior ao que foi registrado, em 2019, entre os dias 1º de janeiro e 14 de setembro. Em 2020, 77,19% dos incêndios realizados no bioma ocorreram nos meses de agosto e setembro.

Análise feita pelo Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam) sobre os focos de calor na Amazônia em 2020 aponta que a maior parte deles está relacionada ao desmatamento, não à severidade da época seca do ano. “O indicador principal é a alta proporção de focos em propriedades privadas (PP) e assentamentos (ASR) possivelmente devido à conversão de florestas em outros usos, e em florestas públicas não destinadas (ND), como resultado da grilagem e da ação de criminosos interessados em especular com a terra”, informa a nota técnica divulgada pelo Ipam.

A divulgação de dados de queimadas e desmatamento já provocou vários embates entre o governo federal e o Inpe. Em julho de 2019, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) disse que a divulgação dos números faz com que o país seja “malvisto” no exterior. Logo depois, em agosto, o então diretor do instituto Ricardo Galvão foi exonerado. Em 2019, o Inpe registrou 89.176 pontos de calor na Amazônia; o que representa 30% a mais do que o instituto havia identificado em 2018.

Em julho de 2020, após o Inpe divulgar um relatório que mostrava dados recordes de desmatamento na Amazônia, o governo exonerou Lubia Vinhas do cargo de coordenadora-geral de Observação da Terra, departamento do instituto responsável por monitorar o desmatamento.

Em 15 de setembro, o vice-presidente Hamilton Mourão disse que há alguém dentro do Inpe “que faz oposição ao governo”, divulgando dados apenas quando eles são desfavoráveis à atual gestão. Na verdade, todos os dados sobre queimadas no país são públicos e atualizados diariamente pelo instituto em um site que pode ser consultado por qualquer pessoa.

Líder de preservação?

O vídeo faz duas afirmações em relação à preservação ambiental. Na primeira, diz que o Brasil preserva 66,3% de sua mata nativa. O número é próximo dos 66,5% apresentados no relatório do Projeto MapBiomas, uma das referências atualmente em dados sobre vegetação nativa.

De acordo com o projeto, desde 1985 o país registrou uma perda líquida de 87 milhões de hectares de sua vegetação nativa – a perda líquida é o balanço entre perda com desmatamento e o ganho com a regeneração no período.

A segunda afirmação do vídeo é de que o Brasil é “o país que mais preserva mata nativa no mundo”, citando a Embrapa como fonte dos dados. Questionada pelo Comprova, a empresa enviou um relatório feito pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente de 2016 para corroborar suas afirmações.

O documento da ONU, no entanto, não fala sobre área preservada, mas área protegida, que leva em consideração unidades de conservação e terras indígenas. Não necessariamente todas as áreas protegidas estão preservadas no país.

“O que estamos vendo nesses últimos dois anos é um forte processo de degradação dentro das áreas protegidas, de desmatamento dentro das áreas protegidas, garimpo dentro das áreas protegidas. Então não dá para a gente falar que estamos protegendo e conservando as áreas quando nós estamos deixando acontecer esse tipo de coisa dentro dessas áreas protegidas”, explica o engenheiro florestal Tasso Azevedo, coordenador do MapBiomas.

“A gente observou que uma coisa é você ter cobertura de vegetação nativa, a outra coisa é saber o quanto disso está preservado. O que é estar preservado? É aquilo que não sofreu nem desmatamento anterior e cresceu de novo e também não foi degradado. Tem diferentes formas de se medir isso, mas a gente já demonstrou esse ano que pelo menos 9% da cobertura de vegetação nativa do Brasil é de vegetação secundária, que são áreas que já deixaram de ser floresta alguma vez e voltaram a crescer. Portanto, não são áreas que foram preservadas, são áreas que foram desmatadas e que voltaram a crescer”, continuou.

O Brasil só aparece na liderança em áreas protegidas apenas quando são considerados os dez maiores países em extensão territorial. Os 30,28% do Brasil ficam à frente de Austrália (19,39%), China (15,62%), Estados Unidos (11,79%), Rússia (9,7%), Canadá (11,04%), Argentina (8,48%), Argélia (4,64%), Índia (5,97%) e Cazaquistão (3,31%). Os dados estão no Banco de Dados sobre Áreas Protegidas, mantido pela ONU Meio Ambiente.

Ao fazer a comparação com todos os países do mundo, porém, o Brasil cai para a 32ª colocação em proporção de área protegida, como mostra a tabela abaixo.

As posições da Embrapa Territorial já haviam sido questionadas em um artigo brasileiro publicado na revista Environmental Conservation, uma das publicações da Cambridge University Press, em junho do ano passado. No material intitulado “Os dados confirmam que Brasil lidera o mundo em preservação ambiental?”, os autores dizem que Evaristo de Miranda, chefe da Embrapa Territorial, apresenta “estatísticas criativas, influenciadas por uma narrativa ideológica que distorce a realidade ambiental brasileira”.

O Comprova conversou com o biólogo Fábio Angeoletto, um dos autores do artigo. “Nossa crítica à essa afirmação também decorre pelo fato de desconhecermos em que ranking (global ou mesmo regional) o Brasil é classificado como líder em preservação ambiental. Parece-nos que tal avaliação é apenas uma propaganda ideológica, porque é destituída de referências científicas”, explica.

“Se tomarmos como referência o Environmental Performance Index (EPI), que é organizado pelas universidades de Yale e Columbia nos Estados Unidos, o qual classifica a partir de consistente metodologia científica o desempenho ambiental de 180 países do globo, o Brasil não figura como líder nem em nível regional e muito menos global, seja no índice EPI global, ou seja, nos índices temáticos (florestas, por exemplo). Além disso, desde o relatório de 2016 o Brasil tem caído significativamente de posição neste ranking, já refletindo o desmonte que está ocorrendo nas políticas de preservação e conservação ambiental com os governos Temer e Bolsonaro”, completa.

O relatório citado por Angeoletto realmente mostra o Brasil muito longe da liderança em diversos índices. Na edição 2020 do EPI, o país aparece apenas na 114ª posição entre 180 países no quesito “perda de cobertura vegetal”. No ranking geral, que inclui saúde e vitalidade do ecossistema, o Brasil está em 55º.

Ao longo do relatório, o Brasil é mencionado de maneira negativa em duas oportunidades, além de um ponto sobre o desmatamento da Amazônia. “O desmatamento e a expansão agrícola continuam a ameaçar os ecossistemas exclusivos desta região [América Latina], contribuindo para as pontuações regionais médias baixas em Biodiversidade e Habitat e Serviços de Ecossistema. Embora eventos muito recentes, como a queima da Amazônia no Brasil, Bolívia e Peru no final de 2019, não tenham sido incluídos nas pontuações do EPI de 2020, esses eventos seguem uma tendência preocupante de aumento da destruição e deterioração do ecossistema”, diz um trecho do relatório.

O texto ainda faz uma crítica à política ambiental do governo de Jair Bolsonaro . “À medida que as mudanças climáticas e o desmatamento aumentam a frequência e a gravidade das secas — e à medida que o governo do Presidente Bolsonaro reverte as proteções ambientais — incêndios como os vistos em 2017 e 2019 podem se tornar ainda mais generalizados e devastadores”.

Produção e sustentabilidade

A definição de alimento sustentável — conceito mencionado no vídeo analisado — envolve aspectos que vão desde a plantação até a chegada ao prato de quem consome. O Ministério da Agricultura informou ao Comprova por e-mail que trata-se de um conceito que permeia questões econômicas, sociais e ambientais. “Quando as condições de produção viabilizem o equilíbrio econômico/financeiro dos produtores e agentes da cadeia produtiva, respeitando as condições trabalhistas e sociais dos trabalhadores e, mantendo o respeito e garantia de meio ambiente preservado, temos uma produção de alimentos perfeitamente sustentável”, afirmou a assessoria.

Em resumo, um mantimento sustentável é aquele cuja cadeia produtiva (que engloba processos como plantio, colheita, embalagem e distribuição) busca gerar o menor impacto possível no meio ambiente. Além disso, a produção leva em conta questões sociais, éticas e relacionadas à saúde do consumidor.

Questionada, também por e-mail, sobre o que caracteriza um alimento sustentável, a Embrapa Territorial respondeu: “O que é sustentável não é o alimento em si, mas a maneira de produzi-lo. A diversidade de alimentos e das formas de produzi-los no Brasil varia muito. Até para um mesmo alimento, as práticas e os sistemas de produção variam.”

Sobre se os alimentos produzidos no Brasil seriam os mais sustentáveis do mundo, como sugere o vídeo verificado, o órgão explica que depende do item a ser analisado e sugeriu outras fontes.

“Para que se afirme que os alimentos produzidos no Brasil são os mais sustentáveis do mundo, há necessidade de uma avaliação a partir do estabelecimento de índices capazes de classificar uma série de padrões submetidos à atividade agropecuária mundial”

De acordo com o relatório Food Sustainability Index, organizado pela unidade de inteligência da revista The Economist e pelo Barilla Center for Food & Nutrition, o país não é líder em sustentabilidade. O documento leva em consideração 37 indicadores divididos em três grandes áreas: perda de comida e desperdício, agricultura sustentável e desafios nutricionais.

O Brasil aparece em 40º lugar no ranking geral, que reúne 67 países. Quando o tema é agricultura sustentável, o Brasil aparece na posição 51.

Entre os indicadores, as melhores notas do país são em política de resposta à perda de comida, sustentabilidade da retirada de água, manejo da água, mitigação da mudança climática e política de resposta a padrões alimentares. As piores notas são em diversificação do sistema de agricultura, número de pessoas por restaurante de fast food, impacto comercial, composição da dieta e prevalência da subnutrição.

Área territorial

Dependendo da origem dos dados, há uma pequena variação no total de área usada para agropecuária no Brasil. Para a Embrapa Territorial, conforme estimativas de 2019, as lavouras ocupam 66 milhões de hectares, ou 7,8% do território nacional. Ainda segundo a Embrapa Territorial, o censo agropecuário do IBGE (2017) calculou a área dedicada a plantações em 7,5% do território nacional. Já um estudo da agência espacial americana National Aeronautics and Space Administration (Nasa), da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) e outras instituições internacionais feito em 2018 estimou, com outros métodos, a área cultivada em lavouras do Brasil em 7,6% do território nacional. Em relação à produção de alimentos de origem animal, a área dedicada a pastagens plantadas e nativas é da ordem de 180 milhões de hectares (21,2% do território nacional), segundo a Embrapa.

Segundo o órgão, a soma das áreas dedicadas à produção de alimentos de origem vegetal e animal totaliza cerca de 246 milhões de hectares no Brasil, o equivalente a 29% do território nacional. Esse é o número apontado pelo vídeo verificado pelo Comprova.

Outro dado que aparece no vídeo é que produtores rurais teriam adquirido 218 milhões de hectares para preservação de florestas. O tamanho da área é confirmado pela Embrapa Territorial. Contudo, a entidade não especifica se esse território fica apenas na Amazônia, como sugere o vídeo. “O total das áreas destinadas à preservação da vegetação nativa pelos produtores rurais em todo o Brasil — a título de áreas de preservação permanente (APPs), reservas legais (RLs) e vegetação excedente — resulta em 218 milhões de hectares.” Os dados são referentes aos cadastros feitos até janeiro de 2018, os mais atualizados até o momento.

“Se você pegar e olhar para as áreas que estão conservadas… falam de ‘200 milhões que os agricultores compraram para proteger’… é outra leitura bem estranha, né? Porque se você pegar as áreas privadas no Brasil e comparar com as áreas protegidas, nas áreas de terra indígena nos últimos 35 anos, o desmatamento foi meio de 0,5%. Se você pegar as áreas privadas, o desmatamento da área que existia de floresta em 1985 foi de 20%. Daí você vê a diferença que tem entre o que está sendo conservado em áreas protegidas e aquilo que está sendo conservado nas propriedades rurais”, ressaltou Tasso Azevedo.

A ferramenta usada para mensurar as áreas de preservação e reserva é o SiCAR, um sistema autodeclaratório de registro. Conforme Fábio Angeoletto, é preciso cautela com essa metodologia.

“O SiCAR e os mecanismos que ele possui (a exemplo do CRA — Cota de Reserva Ambiental) é sem dúvida um avanço em termos de ferramenta de monitoramento e gestão do patrimônio ambiental do Brasil, sobretudo por se tratar de um país com dimensões continentais. Contudo, por ser autodeclaratório (o detentor do imóvel rural é que diz o que está ou não preservado da vegetação nativa em seu interior) ele precisa ser validado (…). Se esta fase de validação não é realizada ele tem sua eficácia extremamente prejudicada”, destaca o biólogo.

Ele complementa que o SiCAR é uma ferramenta desenvolvida com o fim de gestão: “Querer transformá-lo em ferramenta de regularização fundiária é um erro que abre margem à oficialização da grilagem de terras devolutas no Brasil.”

O SiCAR foi criado em 2012, mas ficou ativo apenas em 2014. Em outubro de 2019, o presidente Jair Bolsonaro sancionou a lei que retira o prazo para que os agropecuaristas criarem seus registros. Antes disso, datas limites para adesão ao sistema foram criadas e acabaram prorrogadas.

“A lei diminui o alcance e a efetividade do CAR na proteção da flora nativa do Brasil. Ao retirar o prazo para a inscrição no SiCAR, haverá menos dados disponíveis para a gestão ambiental adequada de milhões de hectares de florestas nativas do Brasil”, avalia Angeoletto.

Por que investigamos?

Em sua terceira fase, o Comprova verifica postagens suspeitas que tenham viralizado nas redes sociais que tenham ligação com políticas públicas do governo federal ou com a pandemia do novo coronavírus. O vídeo verificado aqui é um exemplo.

O Brasil vive uma série de problemas ambientais, principalmente em decorrência das queimadas que consomem a Amazônia e o Pantanal. Segundo matéria da Folha de S.Paulo, os 14 dias de setembro deste ano já registraram mais focos de incêndio na floresta amazônica do que em todo o mesmo mês no ano passado. Já o Pantanal — apontado como maior planície alagada do Planeta e com um bioma que cobre Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Bolívia e Paraguai — é vítima de um dos maiores incêndios da história.

O vídeo, publicado pelo usuário @Jouberth19, já foi assistido 38,8 mil vezes no Twitter. Também foi curtido 35,4 mil vezes e compartilhado por 9,9 mil usuários ao ser reproduzido nos perfis do Twitter do ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles e do vice-presidente Hamilton Mourão, que é presidente do Conselho Nacional da Amazônia Legal.

A Agência Lupa chegou o mesmo conteúdo e chegou a conclusão de que ele é falso. A iniciativa Fakebook de verificação de informações ambientais checou informações semelhantes às do vídeo, como a de que o Brasil possui a maior área protegida do mundo e a que dizia que o agronegócio brasileiro é o mais sustentável do mundo.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Política

Investigado por: 2020-09-11

Post usa foto antiga de madeireiros para acusar ONGs por incêndios na Amazônia

  • Falso
Falso
Post reproduz uma publicação feita no Facebook por outro perfil, no ano passado, e usa uma foto verdadeira, de indígenas detendo madeireiros, para acusar ONGs por queimadas
  • Conteúdo verificado: Publicações nas redes sociais reproduzem postagem de Facebook que diz que indígenas prenderam em flagrante membros de ONGs que seriam incendiários.

São falsas as postagens que acusam ONGs de serem responsáveis pelas queimadas na Amazônia. Nas publicações, é usada uma foto antiga de indígenas prendendo madeireiros ilegais. A viralização da mesma imagem já havia ocorrido em agosto do ano passado, quando o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) disse, sem provas, que poderia “estar havendo ação criminosa desses ongueiros para chamar a atenção contra o governo”.

Tanto naquela época quanto agora, o clique vem acompanhado da legenda: “Lembram que caíram de pau em cima de Bolsonaro, quando disse suspeitar que ONGs estariam envolvidas nos incêndios na Amazônia? Índios prenderam incendiários em flagrante. Outro preso pela polícia em Iranduba”, insinuando que os indígenas estariam prendendo membros de organizações não governamentais.

Não é verdade. A imagem foi registrada pelo fotógrafo Lunaé Parracho para a agência Reuters e mostra uma operação de indígenas da etnia Ka’apor na terra indígena Alto Turiaçu, no Maranhão, contra a exploração ilegal de madeira em 7 de agosto de 2014. Com membros de outras tribos, eles prenderam e expulsaram desmatadores daquele local – e não funcionários de uma ONG.

Uma das páginas que viralizou a foto no Instagram desta vez, o perfil @Galeradadireita retirou o post do ar após constatar que seu conteúdo era falso, conforme contou ao Comprova, e postou uma errata após entrevista com a equipe. Outros internautas que publicaram a foto com a legenda falsa foram contatados, mas não deram retorno ao Comprova até a publicação desse texto.

Como verificamos?

O Estadão Verifica, um dos 28 veículos parceiros do Projeto Comprova, havia feito uma investigação da mesma imagem no ano passado. Por meio desse trabalho, conseguimos identificar a foto e o fotógrafo, com quem fizemos contato via Instagram.

Na sequência, mandamos mensagem para o perfil do Instagram @Galeradadireita, que publicou o conteúdo verificado e retirou-o do ar. Também tentamos falar com outros perfis que compartilharam o post, mas não obtivemos resposta.

Verificação

A foto

A imagem foi feita pelo fotógrafo Lunaé Parracho, da agência Reuters, em 7 de agosto de 2014. Ela mostra membros da etnia Ka’apor detendo madeireiros que atuavam ilegalmente dentro da terra indígena Alto Turiaçu, nas imediações da cidade de Centro do Guilherme, no Noroeste do Maranhão.

De acordo com Parracho, a operação foi feita porque os indígenas, também chamados de Caapores, estavam cansados da falta de assistência do governo para acabar com a exploração ilegal da madeira e se juntaram a outras tribos para expulsar os desmatadores.

O caso virou notícia na época. Em 5 de setembro daquele ano, a Folha de S. Paulo publicou reportagem com o título: “Índios prendem e agridem madeireiros invasores no Maranhão”.

No site de fotografia da Reuters é possível ver a sequência com a foto verificada aqui. Há imagens dos indígenas tirando as roupas dos desmatadores, de um caminhão carregado de toras, de tratores usados para desmatar e de caminhões sendo queimados. A série, chamada de “Guerreiros da Amazônia lutam contra madeireiros”, foi premiada no China International Press Photo Contest, em 2015.

Parracho é gaúcho e se dedica desde 2011 a questões sociais e ambientais do Brasil – a Amazônia é um de seus principais focos. Colabora com a agência Reuters desde 2012 e já teve seus trabalhos publicados em veículos como The Guardian, The Wall Street Journal, Al Jazeera e The Washington Post, entre outros.

“Quando fiz essa foto, sentia esperança ao ver aqueles guerreiros protegerem suas terras. É o contrário do que sinto ao vê-las sendo usadas nessas fake news, que passam por cima de todos nós como um rolo compressor. Elas roubam a verdade daquele povo em resistência, e isto é uma síntese do genocídio que estamos vivendo. Sinto que estamos sendo esmagados, como todos provavelmente estão se sentindo, tendo clareza ou não do que está acontecendo”, afirmou Parracho sobre o uso de sua foto no conteúdo verificado aqui.

Bolsonaro x ONGs

As críticas do presidente Jair Bolsonaro às ONGs vêm desde 2019, quando as queimadas na Amazônia viraram notícia em todo o mundo. Em agosto do ano passado, ele acusou, sem provas, as organizações de estarem por trás dos incêndios na floresta.

Três meses depois, o presidente pediu em uma de suas lives para que as pessoas não fizessem doações para ONGs. “Logicamente o mundo não está vendo o que eu estou falando aqui, mas não doem dinheiro para ONG. ONGs não estão lá [na Amazônia] para preservar ambiente, mas em causa própria.”

Recentemente, em nova live, disse que não conseguia “matar esse câncer chamado ONG”. “Você que está numa ‘ONGzinha’ aí pegando grana de fora. Vocês sabem que as ONGs, em grande parte, não têm vez comigo, a gente bota para quebrar em cima desse pessoal lá. Não consigo matar esse câncer em grande parte chamado ONG que tem na Amazônia.”

O perfil

Contatado pelo Comprova, o perfil @galeradadireita no Instagram, que republicou o post que já havia circulado no ano passado, informou que retirou o conteúdo do ar após constatar “que era fake”. Sobre publicar sem checar a veracidade, Julio Cesar, responsável pela página, disse que “esta vez, infelizmente, passou” e que vai redobrar a atenção.

No dia 10 de setembro, após contato com o Comprova, o perfil publicou uma errata. Na legenda, escreveu: “Boa tarde a todos!! A página Galera da Direita publicou esse post ontem (e) foi constatado que se trata de notícia fake. Peço desculpa a todos seguidores e vamos tomar mais cuidado com nossas publicações!! (Jo 8,32) ‘conhecereis a verdade e a verdade vos libertarás!!!’.

Apesar da correção, há outros conteúdos considerados falsos e enganosos na página, como o que distorcia informações para afirmar que a Organização Mundial da Saúde havia pedido desculpa por reviravoltas com hidroxicloroquina e o que dizia que a OMS concluiu que pacientes assintomáticos não transmitem a covid-19.

O perfil posta conteúdos favoráveis a Bolsonaro, contra o ex-presidente Lula e a TV Globo. De acordo com o autor, ele não tem ligação com nenhum partido. “Sou somente um brasileiro que está cansado de ver o país ser saqueado por políticos ladrões e uma imprensa totalmente complacente”, afirmou ao Comprova.

Já o perfil do Facebook que escreveu o post original não respondeu ao pedido de entrevista do Comprova.

 

Por que investigamos?

Em sua terceira fase, o Comprova verifica postagens suspeitas que tenham viralizado nas redes sociais que tenham ligação com políticas públicas do governo federal ou com a pandemia. É o caso do post do @Galeradadireita, que distorce a informação de uma foto verdadeira para enganar os leitores e acusar ONGs pelos incêndios na Amazônia.

Vivemos um momento delicado, em que a maior floresta do mundo está sob ameaça, sofrendo incêndios criminosos, e o presidente minimiza o perigo. No mês passado, ele chegou a afirmar que “Essa história de que a Amazônia arde em fogo é uma mentira“. A disseminação de conteúdos que reforçam essa visão, falsa, apenas agrava os riscos que a Amazônia corre. Não foi possível medir a viralização do post do @Galeradadireita no Instagram, mas, no Facebook, o conteúdo já foi compartilhado mais de 91 mil vezes desde 26 de agosto de 2019, quando começou a se espalhar.

Além do Estadão Verifica, a Agência Lupa e o AFP Checamos também investigaram o post no ano passado. E o Comprova já mostrou outros conteúdos ligados a queimadas, como o vídeo que mostrava fogo controlado feita pelo Ibama, e não incêndio provocado para culpar o presidente.

Falso, para o Comprova, é todo conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original.

Política

Investigado por: 2020-09-11

Tuíte diz que matemática não aceita fake news, mas erra ao comparar salários

  • Enganoso
Enganoso
Tuíte verificado pelo Comprova usa valores incorretos para comparar o salário mínimo em 2012 e 2020 e desconsidera o contexto econômico dos dois períodos
  • Conteúdo verificado: Post no Twitter compara o valor do salário mínimo em dólar entre os anos de 2012 e 2020 e diz que a “matemática não aceita fake news”.

Tuíte que traz uma comparação entre o salário mínimo de 2012 com o de 2020 engana ao desconsiderar a manutenção do poder aquisitivo. A postagem viralizou no Twitter ao comparar o valor em dólares do salário mínimo dos dois anos, sugerindo que as pessoas passaram a ganhar menos no atual governo. A publicação afirma que o valor era de US$ 400 em 2012 e de US$ 187 em 2020. O Comprova fez os cálculos com base em informações do Banco Central e na legislação que regula o reajuste do salário mínimo. As quantias divergem do indicado na postagem. O salário mínimo de 2012 oscilou entre US$ 365,88 e US$ 297,60. Em 2020, o valor ficou entre US$ 247,04 e US$ 176,22 até 10 de setembro.

Além disso, o tuíte não considera o contexto econômico do período. Especialistas consultados pelo Comprova confirmam que a política monetária do governo atual contribuiu para a desvalorização do real frente ao dólar, mas também afirmam que a pandemia, o desemprego e a queda de juros iniciados nos governos anteriores contribuíram significativamente para este cenário. Enquanto 2012 era o segundo ano de mandato da ex-presidente Dilma Rousseff (PT), 2020 é o segundo ano de gestão do presidente Jair Bolsonaro (sem partido).

O Comprova tentou contatar o autor da postagem pelo Twitter e Instagram para entender a base do cálculo e o objetivo da mensagem. Não houve resposta até a publicação desta reportagem.

Como verificamos?

O Comprova buscou informações em sites de notícias sobre o valor do salário mínimo definido para os anos de 2012 e 2020. No site do Banco Central, pesquisou informações sobre a cotação do dólar nos dois anos. Também buscamos as leis federais 12.382/11 e 13.152/15, que definiram a política de valorização do salário mínimo entre os anos de 2012 e 2019.

Ouvimos ainda a análise de dois economistas: Jocildo Fernandes Bezerra, professor de Política Monetária da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), e Clemente Ganz Lúcio, diretor técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) até fevereiro deste ano.

Verificação

Valor do salário mínimo

O salário mínimo em 2012 era de R$ 622. Segundo os dados do Banco Central, o dólar teve a menor cotação de 2012 em 29 de fevereiro, quando foi negociado a R$ 1,70. A maior cotação da moeda naquele ano foi de R$ 2,09, em 18 de dezembro. O que significa que o salário mínimo de 2012 oscilou entre US$ 365,88 e US$ 297,60.

Já em 2020, o valor do salário mínimo é R$ 1.045. Neste ano, o menor valor do dólar foi registrado em 2 de janeiro, quando a moeda foi negociada a R$ 4,02. O salário mínimo de 2020, porém, só começou a vigorar em fevereiro. Desde então, o menor valor do dólar foi de R$ 4,23, em 4 de fevereiro e o maior foi de R$ 5,93, em 14 de maio. Isso significa que o salário mínimo deste ano oscilou entre US$ 247,04 e US$ 176,22 até agora.

Em 2011, entrou em vigor a lei 12.382, que determinava a política de valorização de longo prazo do salário mínimo, com regras para o reajuste da remuneração a ser paga entre 2012 e 2015. Por essa política, o salário mínimo era reajustado de acordo com a inflação do último ano mais a variação do Produto Interno Bruto (PIB) dos dois anos anteriores. A política de valorização do salário mínimo foi renovada em 2015, pela lei 13.152, com as regras para reajuste entre 2016 e 2019.

A partir de 2020, o governo federal passou a adotar uma nova regra de reajuste do salário mínimo, que levava em consideração apenas a inflação do último ano, medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC). Com isso, o reajuste do mínimo deixou de conceder um aumento real no valor recebido pelos trabalhadores anualmente.

O que dizem os especialistas

Em entrevista ao Comprova, o professor da UFPE Jocildo Bezerra disse que é comum que se compare o valor do salário mínimo com o dólar para poder analisar o poder de compra dos trabalhadores em diferentes países, por exemplo. Para esclarecer esse ponto, ele citou um levantamento feito, no ano passado, pelo site Picodi, que compara o poder de compra dos salários mínimos de 52 países.

Segundo Bezerra, é preciso lembrar que há muitas diferenças no ambiente econômico entre 2012 e 2020. “Em parte, o elevado desemprego que nós temos hoje no Brasil é derivado da política econômica do governo Dilma [Rousseff, do PT, presidente entre 2011 e 2016]. Desse ponto de vista, não dá muito para desacreditar o governo atual em relação ao governo Dilma. E nós também tivemos um choque externo que foi a pandemia”, afirma.

Ele acredita, porém, que um dos principais fatores para a alta do dólar foi a queda na taxa de juros, que teria ocorrido de forma excessiva e numa velocidade muito grande nos últimos anos. Como juros menores significam ganhos menores para quem investe em títulos e mercado de capitais, muitos investidores foram retirando seu dinheiro do Brasil, argumenta Bezerra. “O dólar já vinha subindo antes da pandemia por causa dessa aceleração na queda da taxa de juros que começou em 2016, mas se acentuou a partir de maio de 2019”, diz.

O Comprova também consultou Clemente Ganz, que foi diretor técnico do Dieese até fevereiro deste ano. Ele ressalta que a redução do salário mínimo em dólares não implica na queda do poder aquisitivo: “Você não pode dizer que o valor do salário mínimo hoje é metade do poder de compra que ele tinha em 2012, isso não é verdade. O salário mínimo não teve uma redução a metade, pelo contrário, a média do poder de compra foi preservado”.

Clemente explica ainda que a comparação pela taxa de câmbio é “correta, do ponto de vista formal”, mas que há metodologias mais adequadas para comparar o salário mínimo entre nações. Uma delas é o câmbio de paridade do poder de compra, que consiste em pegar um produto – que não se altere entre os países analisados – e ver quantas unidades podem ser compradas com o salário mínimo de cada país. “Um sanduíche do McDonalds é o mesmo em qualquer lugar. Por exemplo, nos Estados Unidos, com um salário mínimo, eu compro 100 sanduíches; na Nigéria eu compro 20, e assim por diante”.

Por que investigamos?

Em sua terceira fase, o Comprova verifica postagens suspeitas que tenham viralizado nas redes sociais que tratam das políticas públicas do governo federal ou da pandemia da covid-19. É o caso desse tuíte publicado pelo perfil @pedromachadobr, que tenta comparar a política econômica de salários aplicada pelos governos Dilma Rousseff e Jair Bolsonaro. A publicação teve 73,4 mil curtidas e 11,9 mil compartilhamentos no Twitter.

Recentemente, o Comprova fez outras verificações sobre políticas públicas do governo federal e mostrou que, com a correção pela inflação, o dólar sob Bolsonaro não é o mais caro desde a criação do Plano Real; ser enganoso que o Exército teria refeito todo o trecho da transposição do Rio São Francisco inaugurado pelos ex-presidentes Michel Temer (MDB) e Lula (PT) e ser falsa uma publicação que usava dados da aprovação de Lula para tratar do apoio popular ao presidente Jair Bolsonaro.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Saúde

Investigado por: 2020-09-10

Tuíte engana ao afirmar que sol mata o coronavírus

  • Enganoso
Enganoso
Tuíte faz referência a estimativas de um estudo que se baseia em modelos antigos, criados para outros vírus. Especialistas ouvidos pelo Comprova dizem que estudo não tem nenhuma conclusão nova
  • Conteúdo verificado: Tuíte afirma que, segundo cientistas, o sol do meio-dia é eficaz na erradicação do SARS-CoV-2 e mata o vírus em 34 minutos.

É enganosa uma postagem no Twitter que aponta possíveis benefícios da exposição ao sol contra a covid-19. De autoria do perfil @AlanLopesRio, a postagem diz que cientistas teriam afirmado que permanecer 34 minutos no sol seria suficiente para “matar o vírus” (inativá-lo no organismo humano). Especialistas atestam que essa relação não tem embasamento científico.

O Comprova localizou um artigo publicado, em junho, na revista “Photochemistry and Photobiology” que menciona a relação entre exposição ao sol e inativação do vírus, citando um intervalo de tempo de 34 minutos. No entanto, nele existem problemas metodológicos que inviabilizam o estabelecimento dessa relação.

“Não tem nenhuma conclusão nova e nenhum dado real nesse estudo. Aí eles jogam com esse tipo de argumento, que é ‘ruim para a saúde não tomar sol’. Claro, é mesmo”, avalia o professor do Instituto de Física da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e integrante do grupo de estudos de desinformação em redes sociais da Unicamp, ouvido pelo Comprova, Leandro Tessler.

Como verificamos?

Para checar as informações no tuíte de @AlanLopesRio fizemos, em primeiro lugar, uma busca no Google para entender a possível eficácia da exposição à luz solar no tratamento da covid-19. Por meio dela, encontramos notícias em sites brasileiros, como o portal IG Saúde, e americanos, como NY Post, datados da segunda quinzena de junho, que tratam dessa relação. As reportagens mencionam o estudo citado acima, que aborda a mesma duração de exposição ao sol do post.

Com a leitura das matérias, chegamos a um estudo publicado em 5 de junho na revista “Photochemistry and Photobiology”, da Sociedade Americana de Fotobiologia, sobre a “Inativação estimada dos coronavírus por radiação solar, com foco em especial na covid-19”. Procuramos, então, especialistas que pudessem comentar as conclusões da pesquisa. Conversamos com o infectologista Eduardo Sprinz, professor de medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e chefe do Serviço de Infectologia do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA), com o professor Leandro Tessler, do Instituto de Física da Unicamp, e com a professora de virologia Ana Claudia da Franco, também da UFRGS.

Procuramos, ainda, o autor da postagem no Twitter, pela rede social e por e-mail. Até a data de publicação desta checagem, ele não retornou os contatos.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 10 de setembro de 2020.

Verificação

34 minutos de sol

O estudo publicado na revista da Sociedade Americana de Fotobiologia é assinado por Jose-Luis Sagripanti e C. David Lytle, dois pesquisadores aposentados.

O Comprova entrou em contato com Leandro Tessler, professor do Instituto de Física da Unicamp e integrante do grupo de estudos de desinformação em redes sociais da universidade, para saber mais sobre as conclusões do artigo. Em junho, quando as notícias sobre a pesquisa foram divulgadas, ele publicou no Twitter alguns questionamentos sobre o que estava sendo veiculado na imprensa.

Na postagem alvo desta verificação, o autor escreve que “cientistas afirmaram que sol do meio-dia é extremamente eficaz na erradicação do vírus. Segundo o estudo, o sol mata o coronavírus em 34 minutos”.

À nossa reportagem, Tessler explicou, porém, que os dados apresentados no artigo “não medem, apenas estimam a sensibilidade do SARS-CoV-2 à radiação UVC. Além disso, o período de exposição de 11 a 34 minutos ao sol do meio-dia valeria para a maioria das cidades norte-americanas durante o verão. Para São Paulo, eles fazem o cálculo, o período seria bem mais curto se isso fosse correto”, afirma Tessler.

Por causa do método utilizado pelos pesquisadores, Tessler diz que é preciso “olhar com cuidado” para o estudo. Segundo o professor, o artigo não chega a detalhar se a ação dos raios ultravioleta seria eficaz contra o vírus encontrado em superfícies ou como uma forma de tratamento para pessoas infectadas. “Eles não fazem nenhuma medida do efeito. Eles fizeram um modelo anos atrás, […] para o vírus da gripe. E não tem nenhuma medida nem para o SARS-CoV nem para o SARS-CoV-2. Se olhar a tabela 1, onde está ‘D37’, está em branco. Então, não é um resultado. Tudo isso é uma estimativa feita com modelos para outros vírus”, completa.

Fica em casa

No mesmo tuíte, o perfil ainda afirma que “quem determinou a prisão domiciliar queria um genocídio em massa. O ‘fica em casa’ é uma fraude”.

No estudo, Jose-Luis Sagripanti e C. David Lytle fazem considerações sobre medidas como lockdown e campanhas para que os cidadãos fiquem em casa. Segundo os pesquisadores, “dados epidemiológicos disponíveis gratuitamente (em 29 de maio de 2020) demonstram que as medidas de bloqueio que impedem indivíduos saudáveis de permanecerem ao ar livre não resultaram em uma diferença óbvia e estatisticamente significativa nas infecções por milhão de habitantes quando comparados aos países onde indivíduos saudáveis estavam livres para permanecer ao ar livre, com potencial exposição à radiação solar. Se o aprisionamento de cidadãos saudáveis pode não ser determinante como essas estatísticas sugerem, então o papel potencial de estar fora de casa, exposto à luz solar direta ou espalhada, na pandemia de covid-19 não deve ser subestimado”.

Para Tessler, os autores fizeram analogias que são pouco críveis.

“Eles citam Suécia, Bielorrússia, Nicarágua, Uruguai, Indonésia, Coréia do Sul e Namíbia. Tem de olhar com cuidado o que aconteceu em cada um desses países. O Brasil tem muito sol e a pandemia está correndo solta. A Índia também. Então, não é parâmetro importante o que eles estão argumentando”, conclui o professor.

O pesquisador da Unicamp acrescenta que há fatores importantes que não foram considerados:

“Tem outra questão que acho ser muito mais relevante, que é a umidade do ar. Ele (o vírus) é desativado em ambiente seco. Isso é muito mais ativo contra o vírus do que essa suposta exposição ao ultravioleta. Inclusive, porque se você ficar exposta ao sol por 34 minutos ao meio-dia todos os dias, é muito provável que desenvolva câncer de pele. Não é só o vírus que é sensível à radiação ultravioleta do sol, sua pele também é.”

O Comprova já fez verificações relacionadas ao distanciamento social, como a que apresenta somente parte de uma entrevista do governador de Nova York para afirmar que o isolamento foi em vão e a que trata sobre uma pesquisa de Harvard que teria concluído que isolamento seria capaz de piorar a pandemia.

Vitamina D

Estudos já mostraram que a exposição ao sol é fonte de vitamina D. Entretanto, segundo as pesquisas, a falta de vitamina D está relacionada à resposta imune do organismo ou a problemas respiratórios. Isso não quer dizer que sua presença seria suficiente para eliminar o novo coronavírus. Os estudos não são conclusivos, apenas estabelecem correlação, não causa e efeito.

“O que existe é uma associação de quadros mais graves (de covid-19) em pessoas com baixa quantidade de vitamina D”, pontua o infectologista Eduardo Sprinz.

“As vitaminas são essenciais para o bom funcionamento do sistema imune, mas não há comprovação de que a vitamina D seja mais importante do que outras”, complementa a professora Ana Claudia Franco.

A vitamina D envolve dois compostos: D2 e D3, obtidos principalmente com a exposição à luz solar. Para que corpo seja capaz de produzir essas substâncias da maneira correta, o ideal é que tronco, braços e pernas recebam raios de sol, sem filtro solar, por cerca de 15 minutos por dia.

A deficiência de vitamina D é comumente ligada a problemas ósseos, mas recentemente também tem aparecido como relacionada a dificuldades pulmonares. Uma pesquisa de 2018 apontou que a falta da vitamina D é capaz de influenciar no mau funcionamento respiratório e na saúde de adultos de meia-idade.

Uma publicação feita em 28 de agosto por endocrinologistas e pneumologistas da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) pontua que “dados clínicos mostram benefícios na prevenção de infecções respiratórias e melhora da função pulmonar quando pacientes com deficiência de vitamina D são suplementados. No momento da redação deste artigo, não havia dados publicados sobre a suplementação de vitamina D para pacientes com covid-19.”

Em outro trecho, afirma que a “prevenção de infecções respiratórias e a melhora da função pulmonar são benefícios adicionais observados quando a deficiência de vitamina D é tratada. Até agora, qualquer efeito protetor da vitamina D especificamente contra covid-19 grave permanece obscuro.”

O autor do post

O conteúdo investigado foi encontrado no perfil @AlanLopesRio no Twitter e também em um perfil com o mesmo nome no Facebook. O mesmo homem aparece nas fotos de perfil e de capa das duas redes sociais e as postagens têm praticamente os mesmos conteúdos. Ambas também contêm indicações ao “Movimento Direita Inteligente”. Na descrição da página do movimento encontram-se os dizeres “conservador nos costumes e liberal na economia” e o destaque do apoio de mais de 14 anos ao presidente Jair Bolsonaro, ex-deputado federal.

No Twitter, além da postagem em que o autor do perfil afirma que “o fica em casa” é uma fraude, há outros conteúdos que desacreditam a gravidade da emergência sanitária e disseminam informações falsas. Em um deles, ele comenta uma imagem de uma aglomeração em uma praia carioca com a legenda “O Rio de Janeiro finalmente acordou!”. Evitar aglomerações é uma das recomendações das principais autoridades de saúde do mundo para evitar a transmissão do novo coronavírus.

Em outra postagem, o perfil defende o uso da cloroquina para pacientes com o novo coronavírus. Ele diz que a atriz Camila Pitanga fez uso do medicamento, insinuando que ela apresentou sintomas da covid-19, e afirma que a mídia, os governadores, os prefeitos e o ex-ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, “fizeram uma propaganda genocida contra o medicamento e impediram o povo de se salvar”.

Lopes omite que a atriz, na verdade, contraiu malária – cujo tratamento padrão é realizado com a cloroquina. Pitanga, em entrevista à TV Globo, afirmou ter tido seu nome vinculado à desinformação nas redes sociais. Conteúdos alegavam que a atriz estava com a covid-19 e fez uso do medicamento. À época, as agências Aos Fatos e Lupa verificaram algumas dessas postagens, mostrando se tratar de conteúdos falsos. Até o momento, apesar de eficaz contra a malária, não existem evidências científicas robustas que atestem a eficácia da cloroquina no tratamento de pacientes com o novo coronavírus.

Nas páginas, há também um vídeo em que o autor do tuíte investigado pelo Comprova anuncia sua pré-candidatura a vereador no Rio de Janeiro sem, no entanto, indicar por qual partido. Com o adiamento das eleições municipais de 2020, o prazo para registo de candidaturas foi estendido para o dia 26 de setembro. Lopes não respondeu aos contatos do Comprova.

Por que investigamos?

Em sua terceira fase, o Projeto Comprova monitora e verifica conteúdos suspeitos que circulam nas redes sociais sobre políticas públicas do governo federal, eleições municipais e a pandemia de covid-19.

Postagens falsas ou enganosas envolvendo o novo coronavírus causam ainda mais danos nas redes sociais porque podem colocar a saúde das pessoas em risco. É o caso do conteúdo em questão que, ao propagar uma informação sem embasamento científico sobre uma doença contra a qual não há vacina nem tratamento eficaz, pode incentivar o descumprimento das recomendações das principais autoridades sanitárias do mundo para o controle da pandemia.

Até a data de publicação deste texto, a postagem de @AlanLopesRio somava mais de 16 mil interações no Twitter. No Facebook, a publicação tinha sido compartilhada 315 vezes.

Não é a primeira vez que conteúdos sugerindo tratamentos sem eficácia comprovada contra o coronavírus viralizam nas redes sociais. O Comprova já verificou conteúdos falsos e enganosos sobre a ozonioterapia, ivermectina, hidroxicloroquina e sobre o chamado tratamento precoce contra a covid-19. Em junho, o Coletivo Bereia checou um conteúdo similar à postagem objeto desta verificação, concluindo ser enganoso.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Saúde

Investigado por: 2020-09-08

Post confunde ao comparar letalidade da covid-19 com outras doenças

  • Enganoso
Enganoso
Tweet que minimiza a pandemia esconde que tanto a mortalidade quanto o total de óbitos e de casos diagnosticados da doença provocada pelo novo coronavírus são altos
  • Conteúdo verificado: Post no Twitter afirma que o tratamento ou a vacina contra febre amarela, dengue, tuberculose, aids e sífilis não são obrigatórios e que por isso a vacina contra covid-19 não deveria ser compulsória. A publicação cita que a “taxa de morte” do novo coronavírus é baixa.

Um tuíte viral faz uma comparação enganosa entre os índices de mortes da covid-19 e os de febre amarela, dengue, tuberculose, aids e sífilis para minimizar os impactos da doença causada pelo novo coronavírus. De fato, a letalidade (razão entre número de mortes e o total de pacientes) da covid-19 é menor do que as de febre amarela, tuberculose e aids, mas outros indicadores – como mortalidade (mortes em relação ao total da população) e o total de óbitos e de casos diagnosticados – são muito maiores para a covid-19, fazendo com que a doença seja tratada como uma emergência no mundo todo.

O tuíte analisado compara diferentes doenças para questionar a possível obrigatoriedade de uma vacina contra o novo coronavírus. Apesar de ainda não existir um imunizante aprovado contra a covid-19, a possibilidade de vacinação compulsória está prevista em lei sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) em fevereiro. Além disso, duas das doenças citadas – febre amarela e tuberculose – têm vacinas disponíveis. O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) estabelece a obrigatoriedade da vacinação das crianças nos casos recomendados pelas autoridades sanitárias.

É importante destacar ainda que as enfermidades mencionadas no tuíte têm formas de transmissão bastante diferentes, o que dificulta a comparação entre elas. Apenas na tuberculose o contágio é por via aérea, como na covid-19. Febre amarela e dengue têm transmissão por vetores contaminados (mosquitos). Já aids e sífilis podem ser transmitidas por sexo desprotegido ou de mãe para filho, durante a gestação, entre outras formas.

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Como verificamos?

O Comprova buscou dados de números de mortes, casos diagnosticados e outros indicadores relevantes das doenças citadas no portal do Ministério da Saúde. Os boletins epidemiológicos mais recentes estão disponíveis neste link. O site do Departamento de Condições Crônicas e Infecções Sexualmente Transmissíveis também foi fonte de informações adicionais.

A reportagem também consultou o DataSUS, ferramenta de estatísticas do Ministério da Saúde, para obter dados de morbidade hospitalar no Sistema Único de Saúde (SUS). Os números consolidados mais recentes disponíveis nessa plataforma são de 2018.

Por fim, conversamos por telefone com Juarez Cunha, presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), e com Fernando Carvalho, epidemiologista da Universidade Federal da Bahia (Ufba), para contextualizar os números consultados.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 8 de setembro de 2020.

Verificação

Letalidade da covid-19

A taxa de letalidade da covid-19 no Brasil, de 3,4%, realmente é baixa em comparação com a da febre amarela, da aids e da tuberculose. No entanto, o número de casos confirmados é muito maior do que o número de diagnósticos das outras doenças citadas. De acordo com especialistas ouvidos pelo Comprova, os mais de 4 milhões de infectados pelo novo coronavírus fazem com que ela seja mais preocupante que a febre amarela, por exemplo, que possui uma vacina obrigatória no calendário de vacinação do ECA, e, mesmo com uma taxa de letalidade de 16,7%, registrou apenas 18 casos entre julho de 2019 e maio de 2020, com três mortes.

“A covid ainda é uma doença nova para nós e que a gente ainda está aprendendo, mas, ao mesmo tempo, nós temos 4 milhões de pessoas infectadas no Brasil e mais de 120 mil mortos. Então, a gente não pode desprezar, como sendo uma doença sem repercussão. Pode até, comparada com outras, ter uma letalidade menor, mas com esse número tão grande de pessoas infectadas, uma letalidade que pode não ser tão grande se transforma em um absurdo como esse que a gente tem”, explica Juarez Cunha, presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm).

“Fica difícil comparar letalidade por letalidade. Por exemplo, febre amarela é uma doença que tem uma letalidade bem mais alta, mas esse ano tivemos 18 casos no Brasil com três óbitos. Então, não dá para comparar com 4 milhões de casos, mesmo com a letalidade mais baixa. Os números que a gente tem são incomparáveis com qualquer uma dessas aí, tanto tuberculose, aids, febre amarela. Qualquer uma delas a gente não consegue comparar esses números”, prosseguiu.

Diferenças entre as doenças citadas

A covid-19 é uma doença nova: os primeiros casos foram registrados na China em dezembro de 2019. Ainda não há vacina ou tratamento reconhecidamente eficaz contra o novo coronavírus.

A aids é uma doença causada pelo vírus HIV, que ataca o sistema imunológico. A transmissão ocorre por sexo sem proteção, uso compartilhado de seringas, transfusão de sangue ou de mãe para filho, durante a gravidez. O tratamento, disponível gratuitamente no SUS, é feito com medicamentos antirretrovirais, que impedem a multiplicação do vírus no organismo.

A estimativa mais recente do Ministério da Saúde é que, ao final de 2018, havia 900 mil pessoas vivendo com HIV no país. Dessas, 85% estavam diagnosticadas, 81% estavam vinculadas a algum serviço de saúde e 66% faziam uso dos medicamentos antirretrovirais.

Ainda segundo o ministério, a política pública de combate ao HIV/Aids nas últimas três décadas tem se baseado na universalização do acesso à terapia antirretroviral, na testagem em massa nos serviços públicos, especialmente para as populações-chave, e na campanha de conscientização sobre prevenção.

Assim como a aids, a sífilis é uma infecção sexualmente transmissível (IST). Uma das formas mais importantes de prevenção é o uso de camisinha masculina ou feminina. A infecção é causada por uma bactéria chamada Treponema pallidum e é curável, com uso da penicilina benzatina (benzetacil).

A sífilis congênita é transmitida para a criança durante a gestação e pode causar uma série de complicações. Por isso, é importante que a mulher faça o exame de sífilis durante o pré-natal para começar o tratamento. O Ministério da Saúde estimula a testagem e o uso de preservativo como forma de prevenção.

A dengue, por sua vez, é causada por um arbovírus, transmitida pela picada do mosquito Aedes aegypti. Não existe um tratamento específico para essa doença — em geral, a assistência médica é feita de forma a aliviar os sintomas, com repouso e hidratação. Na maioria dos casos, há cura espontânea depois de 10 dias.

A política do Ministério da Saúde contra dengue gira em torno do combate ao mosquito transmissor: tanto no trabalho de campo contra o Aedes como na conscientização da população sobre as formas de eliminá-lo.

Em 2016, a Organização Mundial da Saúde (OMS) recomendou o uso da vacina Dengvaxia (CYD-TDV) para o combate à dengue. A imunização é voltada para pessoas de 9 a 45 anos. Além dela, o Instituto Butantan entrou na terceira fase de testes de uma outra vacina. Essa etapa deve terminar em 2024.

A febre amarela também é causada por um vírus transmitido pela picada de mosquitos (dos gêneros Haemagogus e Sabethes em áreas silvestres e do Aedes aegypti em áreas urbanas). Em geral, ocorre em surtos de forma sazonal, de dezembro a maio. A vacina contra febre amarela, disponível no Calendário Nacional de Vacinação, protege contra a infecção durante a vida toda.

Em março deste ano, o Ministério da Saúde iniciou uma campanha de vacinação contra a febre amarela em seis estados. “A febre amarela apresenta alta letalidade, por isso é importante que a população atenda aos alertas dos serviços de saúde para vacinação, e desta forma prevenir a ocorrência de casos, óbitos e surtos de maior magnitude. A vacina é segura e altamente eficaz (acima de 95%)”, disse, em nota oficial, Rodrigo Said, coordenador-geral de vigilância em arbovirose do Ministério da Saúde.

Além da vacinação, o Ministério da Saúde também aposta na vigilância de primatas não-humanos que possam carregar o vírus causador da doença.

A tuberculose é a única entre as doenças citadas no tuíte analisado que é transmitida pelo ar, assim como a covid-19. Diferentemente da doença causada pelo novo coronavírus, a tuberculose tem cura. O tratamento dura seis meses e está disponível gratuitamente no SUS.

A infecção é causada pelo bacilo de Koch e geralmente afeta os pulmões, mas pode atingir outros órgãos. A vacina BCG, também ofertada no Calendário Nacional de Vacinação, protege as crianças das formas mais graves da doença.

Em 2017, o Ministério da Saúde lançou o Plano Nacional de Combate à Tuberculose, baseado em pilares definidos pela Organização Mundial da Saúde (OMS) — entre as ações previstas, estão o incentivo à testagem e ao tratamento continuado até o fim.

Movimento antivacina

A onda antivacina que tem tomado o mundo preocupa os profissionais de saúde. Em pesquisa recente feita pelo Datafolha, 9% dos entrevistados disseram que não tomariam a vacina da covid-19 quando ela estivesse disponível, 89% disseram que tomariam e 3% não souberam responder.

“O movimento antivacina é algo que você não consegue discutir, porque é mais ideológico, ele não consegue fazer uma discussão com base na ciência. Mas a gente tem o grupo dos hesitantes, que são aqueles que estão na dúvida sobre a vacina, ou por causa da eficácia, ou da segurança, ou têm medo dos eventos adversos. Essas declarações antivacina podem impactar esse grupo que, em geral, a ciência sempre consegue responder o que ele quer saber”, salienta Juarez Cunha, presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações.

O epidemiologista Fernando Carvalho acredita que, mesmo com o movimento antivacina, a procura para ser vacinado ganhará força na população.

“Com uma doença como a covid, é importante que grande parte da população seja vacinada, principalmente aqueles que não tiveram contato com a doença. Como a gente não sabe se a doença deixa imunidade duradoura, então vai ser uma vacinação, ao que tudo indica, para os grupos de risco, os idosos, pessoas com comorbidade, pessoal de saúde. Não tenha dúvida de que, quando abrir a vacinação, vai ter candidatos em massa. Somente os malucos que estão querendo criar um clima”, disse.

O debate sobre a obrigatoriedade da vacina voltou a ser assunto depois que o presidente Jair Bolsonaro disse que ninguém seria obrigado a se vacinar. A opinião foi corroborada pela Secretaria de Comunicação do Governo Federal (Secom), em posts nas redes sociais, e pelo vice-presidente Hamilton Mourão.

“O que é que eu posso dizer: está errada essa afirmativa do presidente de que ninguém pode obrigar ninguém a tomar vacina. Pode, por lei pode. É recomendável, inclusive, que as pessoas tomem para não se prejudicar a si e aos outros. Inclusive, a lei vem, principalmente, por causa dos outros. A saúde é pública, não é do cidadão libertário individual”, prossegue Carvalho.

Como o Comprova mostrou, a lei nº 13.979/20, de iniciativa do governo federal e sancionada por Bolsonaro, prevê a obrigatoriedade da vacinação enquanto seguir o estado de calamidade pública.

O autor do tuíte

O tuíte analisado foi publicado pelo perfil @canalCCore2, que tem 39,5 mil seguidores. Esse usuário faz postagens frequentes de apoio a Jair Bolsonaro e de divulgação de uma rede social para conservadores.

Procurado pelo Comprova, ele argumentou que o tuíte analisado expressava sua opinião. “Usei essas doenças como exemplos de coisas que matam, sempre mataram, e ninguém nunca ligou”, disse.

Ele citou uma reportagem do Estadão de janeiro de 2018 sobre um surto de febre amarela, que informava que o índice de letalidade da doença em São Paulo naquela ocasião era de 40%. Entre dezembro de 2017 e janeiro de 2018, foram registradas 81 mortes por febre amarela no país.

Por que investigamos?

A terceira fase do Projeto Comprova investiga conteúdos relacionados às políticas públicas e à pandemia do novo coronavírus. Conteúdos enganosos sobre a covid-19 são perigosos porque podem custar vidas. Até 8 de setembro, mais de 127 mil pessoas morreram no Brasil por causa da doença.

A vacina é a maneira mais eficiente de imunizar a população. Postagens como a verificada levantam conspirações que não possuem embasamento científico. Isso pode levar as pessoas a optar por não se vacinarem, mesmo com uma possível obrigatoriedade.

A postagem verificada teve mais de 4,6 mil interações até o momento da publicação deste texto.

O Comprova já fez outras verificações envolvendo a vacina para a covid-19. Uma delas afirmava que a vacina causaria danos irreversíveis ao DNA, o que não é verdade. Outra mostrou que é falso que um projeto de lei previsse a prisão para quem se recusasse a ser vacinado.

Enganoso, para o Comprova, é conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Saúde

Investigado por: 2020-09-05

É falso que testes são manipulados e pandemia é uma farsa

  • Falso
Falso
Vídeo publicado no YouTube e no Instagram divulga alegações falsas sobre a pandemia, sobre validade de testes e sobre notificações erradas nos EUA
  • Conteúdo verificado: Vídeo publicado no Instagram e no YouTube e que trata a pandemia como farsa e fala de manipulação de testagens e fraudes em notificações nos EUA

O Comprova investigou o conteúdo de um vídeo postado por uma mulher em seus perfis no Instagram e no YouTube nos quais ela denuncia uma suposta “farsa” na pandemia de covid-19 e uma alegada manipulação de dados. Essas afirmações não são verdadeiras. A pandemia existe e já matou mais de 870 mil pessoas no mundo – só de pessoas infectadas foram mais de 26,4 milhões, segundo a universidade Johns Hopkins. Apenas no Brasil, de acordo com o Ministério da Saúde, foram mais de 124 mil óbitos e cerca de 4 milhões de infectados até a publicação deste texto.

A mulher, que se apresenta como sendo Karina Michelin, diz no vídeo que a farsa acontece por causa da manipulação dos testes. Ela engana ao questionar a validade dos exames e dizer que há “muita controvérsia e resultados falsos”. Por ser uma doença nova e a pandemia, uma situação sem precedentes na história recente, há discussões em curso sobre a melhor forma de utilizar e divulgar os testes, mas “não há manipulação”, como diz Luiz Fernando Barcelos, presidente da Sociedade Brasileira de Análises Clínicas (Sbac).

“No início da pandemia, os testes não tinham a eficácia que gostaríamos, mas melhoraram muito e estão atendendo perfeitamente bem”, afirma ele. Barcelos alerta para outros fatores que vão na contramão do que Karina afirma e que confirmariam números da covid-19 no Brasil ainda maiores: “Além de testarmos pouco, grande parte dos assintomáticos não entra no bolo dos quase 4 milhões de infectados no país [por não fazerem o exame]”.

A mulher também erra ao afirmar que os Estados Unidos contam, entre os casos positivos, pessoas que não foram testadas para a covid-19. O artigo que ela mostra na gravação, do Center for Disease Control and Prevention (CDC), dos Estados Unidos, é claro ao informar que o caso só será confirmado positivo se “atender a evidências laboratoriais”.

Outra desinformação que o vídeo traz é sobre “essa mania de contar mortes de acidentes de trânsito como covid-19”, que, segundo a autora, “parece que virou moda e está se espalhando pelo mundo”. Ela conta sobre uma pessoa que morreu em um acidente de moto na Flórida e entrou para as estatísticas do novo coronavírus e ilustra com uma reportagem do site Fox 35 sobre o assunto. Mas Karina omite uma informação importante, que está no início do texto: dois dias depois da publicação da matéria da Fox 35, em 18 de julho, o óbito foi retirado da lista de vítimas da pandemia.

O Comprova tentou contato com Karina Michelin, mas não recebeu retorno até a publicação deste texto.

Como verificamos?

O primeiro passo foi transcrever o vídeo e buscar os links das reportagens que ela mostra na gravação. Também entramos em contato com a autora do vídeo por meio de mensagem no Instagram – foram três tentativas, sem resposta.

Para checar a veracidade das afirmações, buscamos no Google artigos publicados nos órgãos oficiais citados por ela e, também por meio de pesquisas no Google, encontramos publicações importantes e reportagens sobre testes mundo afora.

Por último, por telefone, entrevistamos Luiz Fernando Barcelos, presidente da Sbac, para que ele comentasse o argumento de Karina sobre a “manipulação dos testes”.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 4 de setembro de 2020.

Verificação

Os testes usados no Brasil

No Brasil, atualmente, há dois tipos de testes utilizados: os moleculares, também conhecidos como PCR ou RT-PCR, e os sorológicos ou rápidos.

O PCR é considerado o teste mais preciso. Ele diagnostica a presença do material genético do vírus no organismo a partir de amostras de secreções do nariz ou da garganta coletadas por um instrumento chamado “swab”, um tipo de cotonete. Esse teste é realizado entre o terceiro e o décimo dia do aparecimento de sintomas no paciente e pode levar dias para apresentar o resultado.

Já os testes rápidos mostram, a partir de uma amostra de sangue, se a pessoa já teve contato com o vírus no passado. Eles detectam os anticorpos produzidos no organismo em resposta à infecção. Essa proteção natural do organismo leva cerca de 15 dias para se formar, o que faz com que o teste sorológico seja indicado a partir do décimo dia após o início dos sintomas. Em vez de identificar quem está com a doença ativamente, esse tipo de teste é mais útil para descobrir quem já teve a covid-19. E há um certo nível de imprecisão nesses testes, podendo dar positivo para outros tipos de coronavírus que já circulavam.

Especialistas afirmam que desenvolver um teste sorológico com 99% de especificidade para a covid-19 demoraria anos. Esses testes apresentam falsos resultados negativos em 15% dos casos e falsos resultados positivos entre 1% e 5% das vezes em que é usado (leia mais em “Sem manipulação”).

Segundo o Ministério da Saúde, até abril, os dados oficiais de casos de covid-19 no país eram baseados nos testes PCR. Desde então, a contagem passou a incluir testes rápidos, que se tornaram maioria a partir de maio. Até o final de agosto, 8 milhões de testes rápidos foram distribuídos, dentre os 14,4 milhões no total, contando os do tipo PCR. O governo federal havia prometido entregar 46,2 milhões de exames de vários tipos, mas alcançou apenas 28% da meta até o fim de julho. Desses, 24,2 milhões são do tipo PCR.

Idealmente, o PCR deveria ser utilizado em massa – assim, seria possível identificar com mais precisão os doentes ativos para a elaboração de políticas públicas de combate à pandemia. Porém, como Luiz Fernando Barcelos, presidente da Sociedade Brasileira de Análises Clínicas, afirma, “não há dinheiro nem recurso tecnológico para isso, então, faz-se o que é mais adequado”. A mistura dos dois testes nos dados oficiais dificulta o monitoramento correto da evolução da doença e, isso, para a microbiologista Natália Pasternak, causa um “caos epidemiológico”, conforme ela escreveu em um texto em parceria com o jornalista Carlos Orsi no site do Instituto Questão de Ciência.

Nos Estados Unidos, epidemiologistas também criticam a mistura de testes nos dados oficiais, questionando o CDC e a impossibilidade de interpretar dados sem essas especificações. Em entrevista ao jornal The Atlantic, Ashish Jha, professor de Saúde Global e diretor do Instituto de Saúde Global de Harvard, afirmou que, ao misturar testes sorológicos e PCR, vão “levar para baixo a taxa de positivos de maneira bastante dramática”.

Apesar das discussões sobre os testes, diferentemente do que Karina afirma, os cientistas e pesquisadores declaram que não há manipulação – ou mesmo tentativa disso – nos testes e seus dados. “A doença é muito nova. É quase nada para a história de uma doença”, diz Barcelos.

Testes nos Estados Unidos

Karina diz que o CDC introduziu em abril uma nova definição para a covid-19 e que essa mudança “produziu os primeiros resultados em junho até a atual explosão de casos nos Estados Unidos”. No momento em que ela fala sobre isso, o vídeo mostra um texto da página do CDC, e ela continua: “Se analisarmos bem o documento, (…) de acordo com a nova definição do CDC, para que um caso seja definido como covid-19 não é necessário nem mesmo testar positivo, basta que seja provável”. Isso não é verdade. O artigo que ela traz na gravação é bem claro ao informar que o caso só será confirmado positivo se “atender a evidências laboratoriais”.

Em julho, os Estados Unidos já haviam testado 44 milhões de habitantes – como comparação, no Brasil, onde a primeira morte ocorreu mais tarde, haviam sido 4,5 milhões.

Recentemente, em 24 de agosto, um dia antes do vídeo de Karina, o órgão publicou uma mudança. Até então, a recomendação era fazer teste em caso de contato próximo com pessoas infectadas, mas passou a ser outra: “Se você teve contato (de pelo menos 1,8 metro) com uma pessoa infectada por covid-19 durante pelo menos 15 minutos, mas não apresenta sintomas, não necessariamente precisa de um teste, a menos que seja uma pessoa vulnerável ou que seu médico, seu estado ou seus profissionais de saúde pública locais o recomendem”. De qualquer forma, isso também não confirma as declarações de Karina.

Sem manipulação

A Sociedade Brasileira de Análises Clínicas é um dos órgãos que, com com outras entidades, realiza a avaliação de kits de diagnóstico para o SARS-CoV-2, nome científico do novo coronavírus, disponíveis no mercado brasileiro. Em contato com o Comprova, o presidente da associação, Luiz Fernando Barcelos, explicou que não se pode falar em manipulação. Os testes passam por um processo de controle da Anvisa e atendem “perfeitamente bem” ao que se propõem: avaliar a presença ou a ausência do novo coronavírus no organismo.

Ele atribuiu os “falsos negativos” à situação em que a pessoa está infectada, mas seu exame não acusa a presença do vírus pois ela foi testada antes de ter uma quantidade detectável de anticorpos. Segundo Barcelos, “há uma confusão” sobre isso, já que a janela imunológica leva de 10 a 14 dias e deve ser respeitada. “Isso acontece com muita frequência, porque as pessoas, de forma geral, ficam muito estressadas e atropelam esses prazos. Então, não devemos chamar de falsos negativos, pois foram feitos na hora em que a pessoa não apresentava a doença.”

Já os “falsos positivos”, sobre os quais Karina comenta, não são comuns. Segundo Barcelos, o Brasil testa muito pouco e, como muitas pessoas são infectadas, mas permanecem assintomáticas, o número de casos é muito maior do que o informado. Para ele, é um erro falar que a pandemia é uma farsa, como diz Karina em seu post.

Sobre esse tema, Karina Michelin faz referência a um artigo de março de 2020 em chinês: “se é verdade que um dos primeiros artigos científicos que testou os primeiros testes concluiu que o mesmo produziu 80,3% de falsos positivos, esse teste já nasceu falso”, diz a apresentadora. Depois, afirma: “O que causa aí uma certa estranheza é que a revista chinesa que publicou o artigo decidiu retirá-lo logo em seguida, né?”

De fato, um artigo foi publicado em março com o título “Potential false-positive rate among the ‘asymptomatic infected individuals’ in close contacts of COVID-19 patients” (em tradução livre, “Taxa de falsos positivos potencial entre indivíduos infectados assintomáticos em contato próximo com pacientes com covid-19”). Esse estudo não está mais disponível e o motivo dessa alteração está claro na página da publicação.

A justificativa do editor responsável é que o texto foi amplamente discutido após sua pré-publicação. “Leitores criticaram principalmente os resultados do artigo e as conclusões, que dependiam de deduções teóricas, mas não em dados epidemiológicos de campo, e que outras pesquisas seriam necessárias para provar essa teoria”, afirmou o editor. Assim, o conselho editorial responsável pelas listas de pré-publicações decidiu deixar o artigo offline. Ou seja, diferentemente do que Karina Michelin dá a entender, o artigo foi retirado do ar por sua metodologia ter sido criticada pela comunidade científica, o que põe em dúvida, consequentemente, seus resultados.

A autora do vídeo

Em seu Instagram, Karina Michelin se define como “jornalista curiosa, cheia de dúvidas; atriz e apresentadora; poeta; em constante evolução”. Segundo seu perfil no LinkedIn, ela é produtora e apresentadora do programa de TV Miami Lifestyle. Em 2006, Karina venceu a edição do Miss Italia nel Mondo, que elege a descendente de italianos mais bonita.

No Facebook, onde mantém um perfil aberto, já publicou vídeos e textos questionando atitudes adotadas em meio à pandemia e recomendações feitas pela Organização Mundial da Saúde. Em julho, o Comprova classificou como enganoso um vídeo em que ela comparava, erroneamente, pesquisadores que estudam a covid-19. Ela também compartilhou um texto segundo o qual a OMS teria declarado que a transmissão da doença a partir de assintomáticos é “muito rara”, afirmação que, como o Estadão investigou, foi distorcida.

Por que investigamos?

Em sua terceira fase, o Projeto Comprova investiga conteúdos relacionados às políticas públicas do governo federal e à pandemia. Conteúdos que trazem desinformação relacionada à covid-19, como o verificado aqui, são ainda mais perigosos pois podem custar vidas.

Karina – que, como informado anteriormente, já apareceu em uma verificação do Comprova –, coloca a saúde das pessoas em risco ao dizer que a pandemia é uma farsa. O post investigado agora tinha quase 18 mil visualizações no Instagram e 549 no YouTube até 4 de setembro.

Outras verificações que tentam desacreditar as estatísticas e as ações dos governos e das autoridades sanitárias já foram publicadas pelo Comprova, como a do médico que usou dados enganosos ao sugerir uma conspiração sobre a covid-19, a do assessor de Bolsonaro que utilizou informação desatualizada para insinuar fraude no registro de óbitos e a dos posts que distorciam dados para negar as mortes.

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original.

Saúde

Investigado por: 2020-09-04

Projeto de lei não prevê prisão para quem se recusar a tomar vacina contra a covid-19

  • Falso
Falso
O que o projeto de lei em tramitação na Câmara propõe é a definição de uma lista de pessoas prioritárias para uma possível campanha de imunização. A possibilidade de adoção de vacinação obrigatória contra covid-19 já está prevista em lei sancionada pelo presidente da República em fevereiro
  • Conteúdo verificado: Post no Facebook afirma que um projeto de lei em tramitação na Câmara dos Deputados quer obrigar as pessoas a tomarem a vacina contra a covid-19, sob pena de serem detidos por até um ano.

É falso um post que afirma que o projeto de lei nº 3.982/20, protocolado pelo deputado federal Wolney Queiroz (PDT-PE) em 29 de julho de 2020, torne obrigatória a vacinação para covid-19. O PL prevê uma lista de pessoas prioritárias para uma possível campanha de imunização e sujeita o descumprimento das regras ao crime de “infração de medida sanitária preventiva”, descrito no Código Penal.

A proposta de Queiroz acrescenta artigos a uma lei que já prevê a possibilidade de que a vacinação contra a covid-19 seja compulsória. Ela foi apresentada pelo próprio governo federal e sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro em fevereiro. Segundo o texto, a decisão se a vacina deve ou não ser obrigatória cabe às autoridades de saúde. O Ministério da Saúde já informou que não tornará a vacina compulsória.

Especialistas em Direito ouvidos pela reportagem confirmaram que a proposta que tramita na Câmara não torna obrigatória a imunização. Dessa forma, as penas previstas no Código Penal para o crime de infração de medida sanitária preventiva só poderão ser aplicadas caso as autoridades assim determinarem.

Ao Comprova, o deputado Wolney Queiroz disse que o objetivo do projeto é, apenas, definir uma lista de prioridade para a vacinação, considerando que milhões de pessoas devem querer se imunizar. Segundo o deputado, a punição valeria para agentes públicos que descumprissem a ordem de prioridade para beneficiar algum conhecido.

O autor da postagem, o cantor gospel Sérgio Lopes, afirmou que após contato com a equipe do Comprova, fez pesquisas na internet e reconheceu que a postagem era falsa. Sérgio pediu desculpas pelo ocorrido e solicitou que sua assessoria retirasse o conteúdo das redes sociais (Instagram e Facebook).

Como verificamos?

O Comprova buscou o projeto de lei original no site da Câmara dos Deputados. A reportagem entrou em contato com a Casa para saber sobre a tramitação do PL. Também falamos com o autor do texto para saber mais detalhes.

Em paralelo, o Comprova também entrevistou por WhatsApp três advogados sobre o argumento do post de que o “PL quer tornar a vacinação contra covid-19 obrigatória” e eles deram sua avaliação sobre o assunto.

Também entramos em contato com a Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), que publicou uma nota oficial intitulada “declarações sobre a obrigatoriedade da vacinação no Brasil”.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 4 de setembro de 2020.

Verificação

O projeto de lei

O PL foi protocolado em 29 de julho de 2020. Ele acrescenta trechos à lei 13.979, de 6 de fevereiro de 2020, de autoria do Governo, para “estabelecer procedimentos e ordem de prioridade para vacinação contra a covid-19”.

A redação original determina que o Ministério da Saúde distribua gratuitamente a vacina em até 15 dias após a aprovação pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como “segura e eficaz”. Também estabelece a seguinte ordem de prioridade para a imunização: profissionais da saúde, idosos, pessoas com doenças do grupo de risco, profissionais de escolas e de atendimento ao público, jornalistas e pessoas saudáveis de idade inferior a 60 anos.

O PL ainda prevê que “o descumprimento das medidas elencadas” será considerado “infração de medida sanitária preventiva”. Este é um dos crimes contra a saúde pública previstos no Código Penal. Na prática, estipula pena de detenção, de um mês a um ano, e multa para quem “infringir determinação do poder público, destinada a impedir introdução ou propagação de doença contagiosa”.

Até o dia 4 de setembro, a proposta só foi apresentada à Mesa Diretora e não recebeu nenhum encaminhamento. As comissões temáticas da Câmara estão com as atividades paralisadas por causa da pandemia. Sem o parecer das comissões, é necessária a aprovação de um requerimento de urgência para que a proposição seja apreciada pelo Plenário da Câmara, que está funcionando de forma virtual.

O que diz o autor

Em conversa com o Comprova, o deputado federal Wolney Queiroz disse que o objetivo do projeto de lei é estabelecer uma regra definindo quem terá preferência na vacinação, com a suposição de que grande parte da população deva buscar essa imunização contra o novo coronavírus. Segundo o parlamentar, ele nunca pensou na hipótese de que as pessoas sejam obrigadas a se vacinar e esse não é o intuito do projeto de lei apresentado.

“Meu projeto, em hora nenhuma, quer obrigar ninguém a nada. O meu espírito é apenas de dar essa preferência no uso da vacina. Quem não quiser se vacinar, eu não fiz com essa preocupação. Eu mesmo não sei se vou me vacinar. Só imaginei que milhões de pessoas iam querer tomar a vacina no mesmo dia, no mesmo mês, e não teria para todo mundo. Aí, escolhi priorizar os mesmos grupos que já são escolhidos em outras vacinações, como a da gripe, por exemplo. A vacina da gripe tem critérios para ela. No entanto, ninguém é obrigado a se vacinar contra a gripe”, explicou.

De acordo com Queiroz, o projeto de lei prevê a detenção apenas para quem tentar beneficiar alguém que não se encaixa na prioridade para vacinação do momento. “O objetivo da sanção era para o agente público que descumprisse o critério e quisesse proteger um conhecido. Um secretário de saúde que quisesse proteger um político, um cara famoso ou um cara rico, e quer colocar alguém de 18 anos para tomar a vacina na frente dos velhinhos do povo pobre porque o cara tem uma posição social, tem dinheiro, ou porque deu R$ 50 lá para furar a fila da vacina. É para esse tipo de gente, para o agente público, esse é o objetivo da lei. Fico perplexo como é que isso tomou um volume e um entendimento tão diverso daquele com o qual eu estava inspirado”, justificou.

O deputado lembrou ainda que o artigo 268 do Código Penal tem um parágrafo que trata especificamente dos funcionários da saúde pública e de profissionais de saúde que tentem infringir uma determinação que busque conter a propagação de doença contagiosa.

O que dizem os especialistas

Em entrevista ao Comprova, o mestre em Processo Penal Daniel Bialski, explica que as leis têm o princípio da “taxatividade”. Isso quer dizer que só se poderia dizer que o PL torna a imunização obrigatória caso a obrigatoriedade estivesse expressamente escrita. “O legislador, quando impõe qualquer criação de nova ou retificação de norma já existente, precisa ser absolutamente claro nisso. Teria que implementar a lei prevendo, por exemplo, ‘quando disponível a vacina, ela também passa a ser item obrigatório’”, explicou Bialski.

São as autoridades competentes que poderão determinar, ou não, a compulsoriedade da vacina, bem como a amplitude dessa eventual obrigatoriedade, afirmou ao Comprova, a especialista em direito administrativo Cecilia Mello. “Portanto, a penalidade prevista no PL somente terá incidência em relação à vacina se essa se tornar obrigatória”, disse.

O texto do PL fala dos deveres do poder público quanto à distribuição do imunizante, pontua Fernanda Tórtima, advogada criminalista. Ela ainda ressalta que o texto em vigor da Lei nº 13.979/2020 determina apenas que as autoridades competentes poderão adotar medida de vacinação compulsória. “Não é possível extrair do texto legal, nem daquele já em vigor, nem do que poderá alterar a lei vigente, a conclusão de que a vacinação passará a ser compulsória.”

Vacinas são obrigatórias?

A Sociedade Brasileira de Imunizações publicou nota reiterando seu posicionamento em favor da vacinação e lembrando que a imunização já é obrigatória em alguns casos previstos em lei, cabendo punição em caso de desobediência: “É dever das autoridades públicas e dos profissionais da saúde conscientizar a população acerca da importância da vacinação, independentemente da obrigatoriedade, sob pena de vivermos retrocessos como a volta do sarampo devido às baixas coberturas vacinais. [A SBIm] Entende também que é dever de cada pessoa buscar a vacinação com o objetivo não apenas da proteção individual, mas também coletiva. É essencial lembrar que o artigo 14 do Estatuto da Criança e do Adolescente (lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990) define a obrigatoriedade da vacinação para este grupo, cabendo a aplicação de penalidades pelo descumprimento”

Lei assinada por Bolsonaro já prevê obrigatoriedade

Também conhecida como “Lei do Coronavírus”, a lei nº 13.979 assinada em 6 de fevereiro de 2020 foi proposta pelo governo e sancionada por Bolsonaro. O artigo 3º diz que “para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional de que trata esta Lei, as autoridades poderão adotar, no âmbito de suas competências, entre outras, as seguintes medidas: I – isolamento; II – quarentena; III – determinação de realização compulsória de: a) exames médicos; b) testes laboratoriais; c) coleta de amostras clínicas; d) vacinação e outras medidas profiláticas; ou e) tratamentos médicos específicos.”

O Ministério da Saúde, no entanto, já antecipou que não irá adotar a compulsoriedade da vacina contra a covid-19 mas que irá incentivar a imunização.

Uma das postagens investigadas e com o maior número de compartilhamentos foi a do cantor gospel Sérgio Lopes, que afirmou que fez a publicação a partir do que havia visto nos stories de um dos seguidores. Após contato com a equipe do Comprova, ele disse ter feito pesquisas na internet e reconheceu que a postagem era falsa. Sérgio pediu desculpas pelo ocorrido e solicitou que sua assessoria retirasse o conteúdo das redes sociais (Instagram e Facebook).

Por que investigamos?

O Projeto Comprova checa conteúdos virais nas redes sociais sobre a pandemia de covid-19 e também sobre políticas públicas. Publicações duvidosas enfraquecem a confiança da população em autoridades sanitárias e dificultam os esforços oficiais de combate à doença. O post analisado teve mais de 1,5 mil interações no Facebook, segundo a plataforma de monitoramento CrowdTangle, até a publicação deste texto.

Ainda não há substância ou medicamento que seja capaz de prevenir a contaminação pelo novo coronavírus. Por isso, a vacinação é a única alternativa para salvar vidas e permitir à população retomar as atividades econômicas de forma segura.

Esta não é a primeira vez que as candidatas a vacina para a covid-19 foram alvo de desinformação. Há boatos que enganam ao apontar utilização de células de feto abortado, enquanto outros falsamente alertam para o risco de danos irreversíveis ao DNA. Em outros casos, as pesquisas por imunizantes são relacionadas em teorias da conspiração.

O post checado pelo Comprova viralizou no momento em que Jair Bolsonaro disse a uma apoiadora que “ninguém pode obrigar ninguém a tomar vacina”. A fala do presidente foi repercutida pela Secretaria de Comunicação (Secom) no Twitter. Apesar disso, uma lei assinada pelo próprio presidente em fevereiro dá a possibilidade para as autoridades determinarem o caráter compulsório da imunização. Bolsonaro prometeu vetar o projeto de lei de Wolney Queiroz, caso ele passe no Congresso.

Este conteúdo também foi checado pelo Boatos.org.

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.

Saúde

Investigado por: 2020-09-03

Vídeo dissemina informações falsas para afirmar que a pandemia é um plano de controle populacional

  • Falso
Falso
É falso que os testes não funcionam e que as vacinas que estão sendo desenvolvidas contra a covid-19 sejam parte de um plano para reduzir a população
  • Conteúdo verificado: Vídeo que circulou em várias redes sociais mostra um italiano lendo e comentando um texto com o objetivo de afirmar que pandemia é um plano de controle e redução populacional, desencorajando as pessoas a fazerem testes para diagnosticar a doença e tomar uma possível vacina.

São falsas as informações existentes em um vídeo no qual um homem afirma que a covid-19 é a sigla de “conspiração para vacinação com inteligência artificial”. Ele também afirma que existe um plano para controlar e reduzir a população mundial em 80% e que nenhum dos testes é capaz de identificar com precisão o vírus SARS-CoV-2.

O nome da doença, covid-19, é uma abreviação de coronavirus disease 2019, algo como “doença do coronavírus de 2019” em inglês. O nome foi dado pela Organização Mundial de Saúde (OMS), seguindo a orientação internacional para denominação de doenças que existe desde 2015. O nome do vírus, SARS-CoV-2, significa Severe Acute Respiratory Syndrome-related Coronavirus 2, ou, em tradução livre, “Coronavírus 2 relacionado à Síndrome Respiratória Aguda Grave”. O vírus foi batizado pelo Comitê Internacional de Taxonomia de Vírus.

Em relação às vacinas, antes de serem aprovadas, elas são submetidas a uma longa série de testes em células, em dois tipos de animais e, por fim, em três fases de ensaios clínicos em humanos. Todas essas etapas buscam identificar se o composto é eficaz e garantir que ele não produza efeitos colaterais graves. Depois que esses estudos são concluídos e os resultados são publicados, as autoridades sanitárias de cada país também avaliam o resultado para decidir se a vacina é segura antes de autorizar a imunização da população.

Por fim, os quatro tipos de testes disponíveis no mercado brasileiro são capazes de identificar marcadores genéticos específicos do SARS-CoV-2, segundo a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Alguns testes identificam proteínas específicas do novo coronavírus, enquanto outros rastreiam anticorpos criados após o contato dele com o corpo.

Como verificamos?

Para investigar a veracidade das afirmações do vídeo, dividimos a verificação em três blocos. Primeiro, consultamos as normativas da OMS, do Comitê Internacional de Taxonomia de Vírus e do Código Internacional de Classificação e Nomenclatura de Vírus para compreender quais são os critérios para estabelecer o nome de uma nova doença.

Na sequência, entrevistamos Daniel Mansur, professor de Imunologia da UFSC e membro do comitê científico da Sociedade Brasileira de Imunologia, para compreender como funcionam as vacinas e os testes que estão sendo realizados com possíveis imunizantes contra o novo coronavírus.

Entramos em contato com o Ministério da Saúde e a Anvisa para entender como funcionam os testes para o diagnóstico da covid-19 no Brasil. Sobre esse assunto, conversamos também com a professora Clarice Weis Arns da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e com Paulo Vitor Simas, pós-doutor em Virologia no Instituto Pirbright, na Inglaterra. Ele também trabalha com a validação de métodos moleculares de diagnóstico da covid-19 no Instituto Nacional de Saúde do Peru.

Por fim, procuramos o perfil que divulgou o vídeo no Instagram. Além de não responder aos questionamentos do Comprova, a página bloqueou o perfil de um dos verificadores que tentou o contato.Também questionamos um perfil do Facebook que reproduziu o conteúdo. Até a publicação deste texto, não houve retorno.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 3 de setembro de 2020.

Verificação

O significado da covid-19

O argumento central do homem que aparece falando italiano no vídeo – há uma voz sobreposta que dubla em português – é que a pandemia do novo coronavírus seria, na verdade, um “plano internacional de controle e redução de populações”. Segundo ele, as vacinas contra a covid-19 que estão sendo testadas têm por objetivo enfraquecer o sistema imunológico das pessoas, deixando-as mais suscetíveis a outras enfermidades. Nesse sentido, os governos da maioria dos países estariam apoiando o desenvolvimento dos imunizantes para reduzir suas populações.

Apoiando-se nesse argumento, o homem afirma que covid-19 não seria o nome da doença causada pelo vírus SARS-CoV-2, mas uma sigla para “Certificado de Identificação de Vacinação de Inteligência Artificial” — que, segundo ele, seria o nome dado ao plano de redução populacional. O homem afirma ainda que o número 19 faria referência ao ano em que o plano foi criado. Tais informações são falsas.

Covid-19 quer dizer 2019 coronavirus disease, expressão em inglês que significa doença do coronavírus de 2019. Isso porque a enfermidade foi identificada no ano de 2019, a partir de um surto na cidade de Wuhan, na China. Esse nome foi dado pela OMS, em 11 de fevereiro de 2020. O nome oficial das doenças é definido pela entidade porque é ela quem organiza a Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde (CID).

A nomenclatura segue as determinações de boas práticas para nomear novas doenças humanas infecciosas, reunidas em um relatório elaborado pela OMS, em colaboração com a Organização Mundial de Saúde Animal (OIE, na sigla em inglês) e com a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO, também na sigla em inglês).

O documento sugere que os nomes de doenças incluam termos descritivos genéricos como síndrome, doença ou febre (syndrome, disease ou fever); patógenos associados como coronavirus, salmonella ou parasitic; e o ano da primeira vez em que a doença foi detectada ou reportada. A data deve ser usada quando houver necessidade de diferenciar eventos similares que aconteceram em anos diferentes.

Para evitar estigmatização de países, populações, culturas ou animais, o relatório determina que os nomes de novas doenças não podem conter localizações geográficas, como “gripe espanhola”; nomes de animais, como “gripe suína” e “gripe aviária”; nem termos que possam incitar medo como morte, fatal, e epidemia (death, fatal e epidemic).

O vírus causador da covid-19

O nome do vírus que causa a covid-19 é SARS-CoV-2, que significa Severe Acute Respiratory Syndrome-related Coronavirus 2, ou Coronavírus 2 relacionado à Síndrome Respiratória Aguda Grave em tradução livre. Ele leva esse nome porque pertence à mesma família do vírus SARS-CoV, responsável pela epidemia de SARS ocorrida em 2003. O nome foi dado pelo Comitê Internacional de Taxonomia de Vírus (ICTV, na sigla em inglês), que existe desde 1966.

O Código Internacional de Classificação e Nomenclatura de Vírus, editado pela ICTV, prevê que os nomes dos vírus sejam identificações internacionais e, por isso, não devem ser traduzidos para outras línguas ou alfabetos.

Segurança das vacinas

As vacinas passam por uma série de etapas para garantir que são eficazes e seguras para os seres humanos antes de chegar à população. De acordo com o imunologista Daniel Mansur, a primeira etapa, ainda no plano da biologia, é descobrir o que no vírus é o melhor alvo para a vacina. “No caso do SARS-CoV-2, a gente descobriu desde janeiro que o receptor de entrada na célula é o ECA2 e que a proteína do vírus que se liga nesse receptor era a spike. A partir daí, sabemos que se conseguirmos bloquear essa proteína, impedimos que o vírus entre na célula. Esse é o objetivo de todas as vacinas em desenvolvimento hoje”, afirma.

A partir da descoberta desse alvo, os pesquisadores começam a pensar qual é a melhor estratégia para entregar o antígeno (molécula capaz de despertar a resposta imune) no corpo. É nesse ponto que as vacinas em teste atualmente se diferenciam, segundo Mansur. A vacina da chinesa Sinovac, que está sendo testada em parceria com o Instituto Butantan, em São Paulo, usa o vírus inativado, incapaz de fazer mal ao corpo. A vacina de Oxford, em parceria com o Bio-Manguinhos da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), pega outro vírus que não faz mal aos seres humanos e adiciona uma proteína do SARS-CoV-2 dentro dele. Já a vacina da Pfizer usa o RNA para levar essa proteína para o corpo sem usar um vírus. As três estratégias podem ser capazes de gerar anticorpos.

“Depois que você consegue comprovar em laboratório que células humanas reagem à vacina, você começa a fazer ensaios pré-clínicos em animais. Obrigatoriamente, tem que ser dois animais. O primeiro é um roedor, normalmente um camundongo. Se a vacina tiver eficácia nesse roedor, ela é testada em um primata não humano, um macaco. Em ambos os animais, o que se está verificando é se ela causa efeitos colaterais graves”, explica o professor.

Se a vacina não gerar efeitos colaterais nesses animais, os pesquisadores dão início à fase 1 de testes em humanos, com grupos com menos de 100 pessoas. O objetivo é, também, avaliar se existem efeitos colaterais à imunização. “Por exemplo, é normal as pessoas terem febre leve ou vermelhidão no local da injeção. Isso são reações inflamatórias que a gente quer que a vacina induza para que o corpo possa reagir. Agora, se ela tiver uma Síndrome de Guillain-Barré [um distúrbio autoimune], é um efeito colateral grave. E a gente não quer que essa vacina continue”, diz Mansur.

Se a fase 1 funcionar, a vacina entra na segunda etapa, quando o número de testados é expandido para as centenas. Nesse estágio, os pesquisadores buscam entender se pessoas de diferentes etnias, gêneros ou nacionalidades têm reações diferentes ao antígeno. Isso porque a humanidade é muito diversa e uma vacina precisa ser eficiente nesses diferentes grupos. Se essa fase também der resultados positivos, os pesquisadores avançam para a terceira, em que milhares ou dezenas de milhares de pessoas são vacinadas. Esse último estágio é decisivo para comprovar a eficiência das vacinas e a inexistência de efeitos colaterais graves.

Por fim, mesmo com todas essas etapas de testes e com os resultados publicados para serem avaliados por outros cientistas, a vacina só pode ser administrada para a população se for autorizada pela autoridade sanitária competente de cada país, que deve revisar os resultados dos testes e decidir se o composto é seguro. No caso do Brasil, essa competência é da Anvisa, órgão do governo federal vinculado ao Ministério da Saúde. Entidades internacionais como a OMS podem, no máximo, ajudar com a logística de campanhas de vacinação. Mas o governo do país é soberano para aprovar a vacina ou não.

De acordo com a professora Clarice Weis Arns, a validade de uma vacina não deveria ser um tema discutível. “Uma vacina, na verdade, nunca vai causar mal, porque ela já foi comprovada por vários testes”, afirma. Ela lembra que algumas pessoas podem ter alergias a componentes da vacina, mas são grupos minoritários. “Por exemplo, para o vírus da [gripe] influenza, uma parte importante da vacina é produzida em ovos embrionados de galinha. E, às vezes, o que pode acontecer é a pessoa ter uma alergia à albumina do ovo”, explica.

Segundo Mansur, é difícil de imaginar que uma conspiração consiga passar por todas essas etapas e entregar uma vacina capaz de prejudicar a saúde de milhões de pessoas. “Imagine o tanto de gente que você teria que manter em silêncio em todos esses órgãos para não vazar uma informação como esta. Além disso, nós temos cerca de 200 vacinas em desenvolvimento. Todas elas estão competindo pelos mesmos mercados. As estratégias são muito diferentes umas das outras e os processos são muito diferentes uns dos outros”, lembra.

De acordo com a OMS, existem — na data de publicação deste texto — 143 vacinas contra a covid-19 em estágio pré-clínico e 33 que já avançaram para os estudos em humanos, das quais 8 já estão na fase 3 de testes.

Efetividade dos testes

O vídeo afirma que os testes para diagnóstico da covid-19 não são capazes de detectar o novo coronavírus, mas que identificam outros organismos. Não é verdade.

A professora Clarice Arns e o pesquisador Paulo Vitor Simas explicam que existem diferentes tipos de exames para detectar a presença do SARS-Cov-2. Os exames podem identificar partes específicas do material genético do vírus (biologia molecular) ou a resposta imunológica do organismo (presença de anticorpos).

No caso dos testes moleculares, os cientistas pegam uma parte específica do sequenciamento genético do antígeno e comparam com a amostra do paciente. A técnica permite não apenas detectar a presença do SARS-CoV-2, como também diferenciá-lo de outras versões de coronavírus.

Arns acrescenta que, mesmo em caso de mutação do SARS-CoV-2, a técnica molecular permanece eficaz: “São pequenas mutações, que o organismo ainda não percebe a diferença. O teste molecular usa aquela parte do genoma do vírus conservada, que não muta”.

A professora também explica que os testes sorológicos se baseiam na resposta imunológica. ”Se uma pessoa tem contato com o vírus, o seu corpo irá produzir uma resposta imunológica que pode ser medida por diferentes ferramentas”, pontua Arns. Estudar a presença e quantidade dos anticorpos permite não apenas determinar se o organismo foi infectado pelo novo coronavírus, como também as características do contágio.

A Anvisa faz uma ressalva quanto aos testes sorológicos: “existe a possibilidade de resultados falso positivos, isto é, do teste detectar a resposta imunológica (anticorpos) orientados para outras cepas de coronavírus, por exemplo, que não seja o Sars-Cov-2, devido a similaridade entre elas”.

A pesquisadora afirma ainda que tanto os testes moleculares quanto os sorológicos são específicos para o antígeno estudado. Ou seja: “quando um teste é específico para SARS-CoV,-2 ele só vai identificar SARS-CoV-2”, afirma Arns. Portanto, não é possível que os exames para diagnosticar covid-19 detectem “pequenos vírus inofensivos ou detritos celulares que naturalmente fazem parte da nossa microbiota”, como defende o vídeo.

Simas destaca que cada Estado faz suas próprias análises para atestar a eficácia dos exames: “Vale ressaltar que os testes são validados considerando critérios rigorosos exigidos pela legislação sanitária de cada país e que somente são aprovados aqueles que realmente são sensíveis e específicos”.

Em resumo: os testes para diagnosticar a covid-19 não detectam o vírus em si, mas parte do seu material genético ou anticorpos produzidos pelo organismo em resposta a presença do antígeno. As características dos exames são específicas para SARS-CoV-2. Eventuais mutações do vírus não afetam a efetividade dos testes moleculares, que trabalham com o material genético. Os exames sorológicos, porém, podem identificar anticorpos de outros antígenos que não o novo coronavírus. Os fabricantes trabalham para minimizar essas ocorrências.

Leia na íntegra a explicação da Anvisa sobre os tipos de testes para diagnosticar a covid-19.

Propagadores do vídeo

O vídeo foi publicado em 29 de agosto no Instagram pelo perfil @verdadeforadamidia. O conteúdo foi dublado por uma mulher por cima do áudio em italiano e traz legendas em português.

Enviamos uma mensagem em 2 de setembro informando que a gravação estava sendo verificada pelo Comprova. Também questionamos qual era a fonte do material e se os responsáveis pelo perfil tinham atestado a veracidade das informações antes de compartilhá-lo. Em menos de 24 horas, a conta bloqueou o perfil que enviou as mensagens, sem retornar o contato da equipe.

O mesmo vídeo, com a marca do @verdadeforadamídia, foi publicado por um canal do YouTube em 1º de setembro. A publicação foi removida da plataforma no dia seguinte por ferir os termos de serviço do site.

Encontramos o contato do proprietário do canal no Facebook e enviamos uma mensagem no dia 2 de setembro. Até o momento da publicação deste texto, não houve resposta.

Por que investigamos?

A terceira fase do Comprova verifica publicações suspeitas sobre as políticas públicas do governo federal e sobre a pandemia de covid-19 que tenham tido grande viralização nas redes sociais. É o caso desse vídeo, que teve mais de 75 mil visualizações no YouTube e no Instagram. Diversos leitores do Comprova também receberam o vídeo pelo WhatsApp e sugeriram a verificação.

Quando a publicação trata de medicações ou de vacinas contra a covid-19, a checagem é ainda mais importante. Informações equivocadas sobre esses temas pode colocar as pessoas em risco por estimulá-las a evitar tomar alguma medida de proteção contra o novo coronavírus. Uma nota técnica da Sociedade Brasileira de Imunologia afirma que a existência de mais de uma vacina é mais do que bem-vinda, considerando todas as incertezas sobre a disponibilidade de vacinas contra a covid-19 e quanto ao tempo de duração da resposta imune a esses compostos, além da quantidade de pessoas no mundo que precisarão ser imunizadas.

As vacinas voltaram a ganhar destaque no debate nacional depois que o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) afirmou que não podia obrigar ninguém a tomar a vacina, o que é enganoso. A fala foi reproduzida, em seguida, pela Secretaria de Comunicação da Presidência da República. Desde o início da pandemia, o SARS-CoV-2 já levou a morte de 123,7 mil pessoas no Brasil e infectou ao menos 3,9 milhões de brasileiros. O Comprova já mostrou ser falso que a vacina contra a covid-19 cause danos irreversíveis ao DNA e que ela tenha um microchip para rastrear a população.

O site italiano Facta e os brasileiros Aos Fatos, Boatos.org, Lupa e Fato ou Fake checaram o mesmo conteúdo e concluíram que ele é falso.

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.

Atualização

Esta verificação foi atualizada em 4 de setembro para inclusão de uma resposta da Anvisa.