O Projeto Comprova é uma iniciativa colaborativa e sem fins lucrativos liderada pela Abraji e que reúne jornalistas de 42 veículos de comunicação brasileiros para descobrir, investigar e desmascarar conteúdos suspeitos sobre políticas públicas, eleições, saúde e mudanças climáticas que foram compartilhados nas redes sociais ou por aplicativos de mensagens.
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Saúde

Investigado por: 2020-05-14

Nem todos pacientes de covid-19 de hospital do Piauí receberam alta após tratamento com cloroquina

  • Enganoso
Enganoso
Textos omitem que ainda há pacientes em tratamento domiciliar e também em leitos ambulatoriais no hospital e o próprio médico que aparece no vídeo diz que as informações foram distorcidas. Além disso, não existe nenhum registro científico ou comparativo de que a melhora clínica dos pacientes foi exclusivamente por conta das medicações

Faltam informações nas publicações que dizem que um hospital no Piauí curou pessoas com covid-19 e esvaziou UTIs com uso da medicação cloroquina. O conteúdo usa um vídeo verdadeiro, gravado pelo médico oncologista Saba Vieira em 8 de maio, no qual ele relata um protocolo adotado pelo médico Justino Moreira, diretor clínico do Hospital Regional Tibério Nunes, em Floriano, para o tratamento precoce de pacientes com o novo coronavírus.

Mas os textos omitem que ainda há pacientes em tratamento domiciliar e também em leitos ambulatoriais no hospital. Além disso, não existe nenhum registro científico ou comparativo de que a melhora clínica dos pacientes foi exclusivamente por conta das medicações.

No vídeo, Vieira diz que no tratamento oferecido pelo hospital há “duas janelas de oportunidade” para quem contraiu a doença. A primeira é a aplicação de cloroquina com azitromicina em pacientes que apresentaram sintomas de um a sete dias. A segunda é o uso de corticoides em pacientes que apresentam sintomas depois de sete a doze dias. Com a repercussão do vídeo, o médico que fez a gravação compartilhou em seu Facebook uma das publicações e escreveu que “o conteúdo e o título estão distorcidos”. Ele não atendeu às solicitações de entrevista feitas pelo Comprova.

Justino confirmou que desde 2 de maio vem adotando essas duas abordagens para pacientes que estão com comprometimento pulmonar e não têm comorbidades. Ao todo, 15 pessoas foram submetidas ao protocolo, com prognóstico positivo, mas ainda não há evidências suficientes para dizer que estão curadas. Isso porque, apesar de os pacientes terem apresentado melhora clínica, apenas cinco já tiveram alta. Quatro ainda estão em tratamento domiciliar e os outros seis seguem internados em leitos clínicos. Nem todos passaram pelos exames necessários de radiografia para receber o laudo de alta da covid-19. A OMS (Organização Mundial da Saúde) também não reconhece nenhum medicamento ou vacina para a covid-19.

Justino afirmou que reavaliaria o caso das pessoas tratadas nesta quinta-feira, 14, último dia do tratamento experimental. Também é importante destacar que a experiência no hospital do Piauí não tem um grupo de controle. Ou seja, não há pacientes que não fizeram uso do tratamento para fins científicos de comparação. O próprio Justino ressalva que o número de pessoas tratadas em Floriano é pequeno e ainda não serve como evidência científica para a eficácia da cloroquina ou do corticoide contra a covid-19.

De acordo com o médico, as publicações que divulgaram o uso de cloroquina não citam que pacientes ainda estão em tratamento e que há ao menos seis pessoas internadas com covid-19 nos leitos ambulatoriais. Justino afirmou que o uso de corticoide é o que mais tem dado resultado. “Não gosto da forma com que foi colocada [na notícia] a cloroquina como solução. O foco é a corticoterapia”, disse ao Comprova.

A medicação, segundo afirma Justino, tem evitado que a doença se agrave a ponto de necessitar de intubação e, consequentemente, internação na UTI. O Hospital Regional Tibério Nunes, localizado no interior do Piauí, tem 10 leitos de Unidade de Terapia Intensiva e 15 leitos de ambulatório destinados à covid-19.

Até esta quinta-feira, 14, não havia pacientes em estado grave na UTI. No ambulatório há pacientes internados, mas nem todos têm indicação para receber o tratamento, por estarem em fases diferentes da infecção ou apresentarem outras doenças prévias.

Apesar de o tratamento estar em curso, até agora, o governo do Piauí não divulgou nenhum protocolo público para adoção dessa modalidade para pacientes com a doença. O hospital também não têm evidências científicas que comprovem a “cura”, como afirmam as publicações, por conta exclusivamente dos medicamentos.

Apenas nesta quarta-feira, 13, o governo do Piauí anunciou a criação de um comitê médico para estudar, avaliar e definir o uso de cloroquina, hidroxicloroquina e corticoides, entre outros medicamentos que auxiliem no tratamento. O Comprova questionou o governo do Estado sobre o tratamento adotado e a falta de acompanhamento técnico dos protocolos, mas não obteve retorno até a publicação desta checagem.

Os protocolos que têm sido utilizados no Hospital Regional Tibério Nunes foram estabelecidos por uma médica que nasceu em Floriano, no Piauí, mas atualmente trabalha no hospital HM Puerta del Sur, localizado em Madrid, na Espanha. Ela compartilha documentos e vídeos em seu Instagram sobre as dicas para o uso do corticoide contra a covid-19.

Recentemente, o YouTube retirou do ar um de seus vídeos indicando a medicação. O Comprova confirmou em mensagem enviada ao Twitter do hospital espanhol que ela é funcionária, mas não obteve resposta sobre os protocolos de tratamento utilizados.

Por que investigamos isso?

O Comprova investiga conteúdos suspeitos compartilhados nas redes sociais sobre o novo coronavírus e a covid-19 que tenham grande viralização. O conteúdo desta verificação foi sugerido por dezenas de leitores que receberam o link por WhatsApp ou se depararam com ele em redes sociais. Um único link foi compartilhado no Facebook mais de 500 vezes.

Muitas das informações enganosas que o Comprova tem verificado estão relacionadas a tratamentos com drogas que ainda estão em fase de testes sem que haja consenso sobre benefícios no combate à covid-19. Boatos e informações descontextualizadas sobre medicamentos podem levar à automedicação e provocar danos à saúde ou relaxamento dos cuidados com a higiene pessoal e isolamento social recomendadas pelas autoridades de saúde como medidas essenciais para diminuir a velocidade de transmissão do novo coronavírus.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor, que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Como verificamos?

O Comprova entrou em contato com o governo do Piauí para chegar ao diretor clínico do Hospital Regional Tibério Nunes, Justino Madeiro. Em conversa por telefone, o médico explicou como tem sido o tratamento de pacientes em Floriano, interior do Estado. A equipe também consultou a Secretaria de Saúde da cidade.

Além disso, entrevistamos Gerson Salvador, infectologista associado da Sociedade Paulista de Infectologia e médico do Hospital Universitário da Universidade de São Paulo (USP).

Verificação

Após a repercussão do vídeo de Sabas Vieira, o Ministério Público Federal do Piauí cobrou que o governo do Estado e a prefeitura da capital, Teresina, adotassem o protocolo aplicado no hospital de Floriano. Vieira é citado pelo MPF como um dos principais defensores do tratamento.

Corticoides são potentes anti-inflamatórios e são muito usados para tratamento de doenças autoimunes, aquelas em que o próprio corpo produz uma resposta contra o organismo, como lúpus.

O uso dos corticoides para pneumonias virais, no entanto, não se mostrou eficaz em estudos anteriores à pandemia do novo coronavírus. Para a covid-19 ainda não há nenhum estudo científico comprovado que possa ser usado para defender ouso, como explica Gerson Salvador, infectologista associado da Sociedade Paulista de Infectologia e médico do Hospital Universitário da USP.

“Os corticoides foram estudados e estão em estudo na covid-19, mas em estudos de pneumonias virais (influenza e outras causadas por outros tipos de coronavírus) anteriores foram vistos dois efeitos: alguns aumentam mortalidade, após altas doses por tempo prolongado, e também aumenta o tempo em que a carga viral é detectável, o vírus fica mais tempo no organismo”, explica.

O infectologista alerta, ainda, para efeitos colaterais vistos em pacientes com pneumonias virais tratados com corticoides, tais como: hiperglicemia e psicose (alterações psiquiátricas).

O especialista ressalta que para a covid-19 ainda não há uma conclusão sobre o uso dos corticoides. “O médico que quer fazer esse estudo tem que submeter ao Comitê de Ética primeiro”, completa.

O uso de corticoides também está sendo testado em pacientes do Vila Nova Star, hospital de São Paulo. Ainda não foi publicado estudo que comprove a eficácia deste tratamento. Recentemente, o Hospital Sírio Libanês também iniciou protocolo de pesquisa com o medicamento dexametasona, um tipo de corticoide.

A Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM) recomenda cuidado para pessoas que já se medicavam com corticoides e apresentam sintomas da covid-19. Para os pacientes que usam a substância como terapia anti-inflamatória e imunossupressora, é recomendado avaliar com o médico a redução no uso.

Contexto

A cloroquina tem sido citada em vários conteúdos enganosos online como a cura para a covid-19. No entanto, o Ministério da Saúde e a Organização Mundial de Saúde esclarecem que ainda não há um tratamento comprovadamente eficaz contra a doença causada pelo novo coronavírus.

A cloroquina e a hidroxicloroquina passaram a protagonizar desinformação nas redes sociais após o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, apontar o medicamento como possível cura da covid-19. No Brasil, o presidente Jair Bolsonaro e seus apoiadores também têm insistido na eficácia do remédio contra a doença, sem comprovação científica.

Uma análise do site de checagem Aos Fatos mostrou que vários congressistas da base de apoio de Bolsonaro divulgaram informações incorretas sobre o medicamento — o principal deles foi o ex-ministro Osmar Terra (MDB-RS).

Alcance

O conteúdo verificado pelo Comprova foi sugerido pelos leitores. Ele foi publicado em sites e compartilhado em diversas páginas de redes sociais e em aplicativos de mensagens. Apenas uma dessas postagens foi compartilhada no Facebook mais de 500 vezes e somava 436 mil interações até esta quinta-feira, 14 de maio.

 

Saúde

Investigado por: 2020-05-14

Sepultamentos cresceram 47% no cemitério Vila Formosa em São Paulo entre março e abril

  • Falso
Falso
Homem que aparece em vídeo que viralizou no Facebook mostrando covas vazias e dizendo que o número de sepultamentos está normal não é funcionário do governo. As imagens foram captadas em uma das unidades do cemitério da Vila Formosa, em São Paulo, em um dia em que não havia sepultamentos no local

Em um vídeo compartilhado nas redes sociais, um homem que se apresenta como funcionário do governo diz que o cemitério da Vila Formosa tem covas abertas, mas não está realizando mais sepultamentos do que antes da pandemia do novo coronavírus. O Comprova apurou que o vídeo foi realmente gravado no Complexo Cemiterial Vila Formosa, na zona leste de São Paulo, mas traz informações erradas.

O complexo é dividido em dois cemitérios – Vila Formosa I e Vila Formosa II – e as duas unidades alternam os dias de enterros. Assim, enquanto em uma unidade estão sendo feitos os sepultamentos, na outra são realizados somente os serviços de limpeza e de exumação de corpos. O vídeo foi gravado no cemitério da Vila Formosa l em um dia em que os sepultamentos estavam sendo feitos na segunda unidade.

Além disso, o homem que aparece dando informações não é funcionário do Serviço Funerário, que é de responsabilidade da Prefeitura Municipal de São Paulo.

Ao contrário do que afirma o narrador do vídeo, houve 47% de aumento no número de pessoas enterradas de março a abril deste ano. Ou seja, depois que o país começou a lutar contra a pandemia de covid-19 – doença causada pelo novo coronavírus.

Por que checamos isto?

No monitoramento que faz de mensagens suspeitas que circulam em redes sociais e aplicativos de mensagens sobre o novo coronavírus e a covid-19, o Comprova vem observando um crescimento na circulação de boatos sobre números de mortes causadas pela doença, falseamento de atestados de óbitos e conteúdos falsos sobre caixões e sepultamentos.

Tais boatos tentam minimizar os efeitos da pandemia e podem fazer com que as pessoas que neles creem relaxem os cuidados com a higiene pessoal e o distanciamento social, ações de contenção do espalhamento do vírus recomendadas pelas autoridades de saúde.

O cemitério de Vila Formosa se transformou em um dos principais alvos desses boatos depois que a prefeitura da capital paulista anunciou a abertura de 8 mil novas valas.

Como verificamos?

Procuramos pela publicação original usando a plataforma de monitoramento de conteúdo Crowdtangle e chegamos a um perfil pessoal no Facebook. Entramos em contato com o usuário em um número de telefone disponível em seu feed de notícias. Perguntamos sobre a autoria do vídeo e ele negou. Informou que recebeu o vídeo em um grupo de WhatsApp e o publicou no Facebook.

Entramos em contato com a assessoria de comunicação da Secretaria Municipal das Subprefeituras da Cidade de São Paulo (SMSUB), responsável pelo Serviço Funerário Municipal. Também consultamos o Plano de Contingenciamento Funerário para confirmar as informações prestadas.

Verificação

O vídeo que circula pelas redes sociais mostra um homem vestido com o que parece um uniforme falando com outro, que está dentro de um carro e que grava a conversa. Não é possível ler as informações do crachá, mas o homem que grava a cena o identifica como “funcionário do governo” e diz que ele trabalha no cemitério, onde não estariam ocorrendo mais enterros que o normal.

A Prefeitura de São Paulo, responsável pelo Complexo Cemiterial Vila Formosa, nega que ele seja funcionário do Serviço Funerário e afirma que houve aumento no número de sepultamentos em toda a cidade.

Na conversa, o autor do vídeo pergunta qual a média de enterros por dia. O homem responde: “Até agora não vi nenhum (…) As covas estão abertas, mas não tem ninguém morrendo nem enterrando ninguém. É uma jogada política. O que morre de gente é o dia-a dia normal e as covas estão todas abertas sem ninguém. Todas abertas para deixar o pessoal em pânico”, disse na conversa.

A assessoria de comunicação da Secretaria Municipal das Subprefeituras da Cidade de São Paulo (SMSUB), da Prefeitura de São Paulo, nega a falta de enterros. O órgão, responsável pelo Serviço Funerário Municipal, explicou ao Comprova que o Complexo Cemiterial Vila Formosa é o maior da América Latina e é dividido em Vila Formosa I e Vila Formosa II.

De acordo com a Secretaria, o vídeo foi gravado no cemitério da Vila Formosa l, em frente à área onde ocorrem os velórios.

Ainda segundo a assessoria, os sepultamentos são feitos em dias alternados em Vila Formosa I e II. Isto quer dizer que todo dia um dos cemitérios fica sem sepultamentos para que sejam realizados os serviços de limpeza e de exumação de corpos.

Além disso, afirmou que houve aumento de enterros. Em março deste ano foram registrados 1.131 e em abril foram 1.668 — crescimento de 47%. Pensando na maior demanda de sepultamentos durante a pandemia da covid-19, a prefeitura elaborou um Plano de Contingenciamento Funerário para garantir o funcionamento adequado do Serviço Funerário Municipal.

Entre as medidas do Plano, anunciadas em 23 de abril, estavam a abertura de 8 mil valas no cemitério da Vila Formosa, 3 mil no São Luiz e 2 mil no Vila Nova Cachoeirinha. São essas valas anunciadas no cemitério que aparecem abertas no vídeo.

Contexto

O vídeo foi publicado em um momento em que há divergência de opiniões sobre o isolamento social. O presidente da República, Jair Bolsonaro, defende a retomada das atividades econômicas, assim como muitos dos seus apoiadores. Essa visão contraria as orientações da Organização Mundial da Saúde (OMS) e do Ministério da Saúde, que recomendam políticas de distanciamento social para evitar a disseminação do novo coronavírus e, consequentemente, o aumento do número de casos da covid-19.

Os governos estaduais mantêm o isolamento em seus Estados. De acordo com a Constituição Federal, em casos de saúde pública, como a pandemia de covid-19, não há hierarquia entre os entes da federação. Ou seja, um decreto federal não vale mais que um estadual. Cabe ao Poder Judiciário decidir qual política pública obedece melhor às leis.

Contestar os números oficiais de óbitos é uma das táticas utilizadas por disseminadores de desinformação para causar indignação na população. Uma corrente falsa de whatsapp utilizou dados falsos de óbitos por covid-19 para erroneamente dizer que teriam morrido menos pessoas no começo de 2020 em comparação ao mesmo período de 2019.

Já no Amazonas, onde foi preciso adotar os sepultamentos coletivos para atender à demanda de enterros, o governo foi acusado de enterrar caixões vazios para causar pânico na população. No mesmo estado, um boato nas redes sociais dizia que o número de mortes teria caído depois de uma visita do ministro da Saúde Nelson Teich.

Alcance

O vídeo ganhou grande repercussão com a sua postagem numa conta pessoal no Facebook. A publicação, do dia 2 de maio, já passa de 62 mil compartilhamentos e teve aproximadamente 620 mil visualizações até o dia 12 de maio.

O conteúdo foi republicado por páginas como “Metralhando a Corrupção” e “Nas Ruas”.

Saúde

Investigado por: 2020-05-13

É falso que máscaras reduzam imunidade e potencializem a proliferação de bactérias

  • Falso
Falso
Ao contrário do que diz um vídeo publicado no YouTube e verificado pelo Comprova, tanto máscaras cirúrgicas quanto artesanais, feitas de pano, dispõem de filtros que permitem a passagem do oxigênio e filtram partículas que possam estar infectadas pelo novo coronavírus. Usadas em acordo com as recomendações médicas, as máscaras são recomendadas para reduzir as taxas de transmissão do novo coronavírus

São falsas as informações divulgadas em um vídeo no YouTube segundo o qual as máscaras de proteção de pano e de uso profissional recomendadas por autoridades sanitárias prejudicam a imunidade dos usuários. As máscaras são classificadas pelos órgãos de saúde como importantes instrumentos para diminuir as taxas de transmissão do novo coronavírus.

O vídeo de oito minutos foi gravado e divulgado por Daniél Rocha em seu canal no YouTube no dia 6 de maio e teve mais de 33 mil visualizações. Nas imagens, Rocha faz diversas afirmações contra o uso de máscaras, como a de que o aparato diminui a imunidade, aumenta a inspiração de dióxido de carbono e potencializa a proliferação de bactérias. Nenhuma das alegações é verdadeira.

Por que checamos isto?

O Comprova fez essa verificação pois o conteúdo do vídeo é potencialmente danoso à saúde pública, tendo em vista que diversas autoridades sanitárias têm recomendado o uso das máscaras para reduzir a possibilidade de contaminação pelo novo coronavírus.

Em circulação desde o fim de 2019, o novo coronavírus já matou mais de 290 mil pessoas no mundo, segundo a Universidade Johns Hopkins, dos Estados Unidos.

Como verificamos?

O Comprova selecionou afirmações do vídeo sobre o uso das máscaras para o combate ao novo coronavírus e questionou três médicos infectologistas sobre o assunto. A reportagem ainda tentou falar com Daniél Rocha, mas não obteve retorno. Também consultamos a Organização Mundial de Saúde (OMS), citada no vídeo.

O que dizem os especialistas

O Comprova questionou três infectologistas sobre as afirmações do vídeo e a eficácia do uso de máscaras contra o novo coronavírus: Jean Gorinchteyn e Guilherme Spaziani, do Instituto de Infectologia Hospital Emílio Ribas, de São Paulo; e Antonio Carlos Bandeira, integrante da diretoria da Sociedade Brasileira de Infectologia.

Primeiro, a filmagem afirma que “se você usa máscara, você vai respirar menos oxigênio ainda, você vai respirar mais dióxido de carbono”. Segundo os três especialistas, isso é falso.

Gorinchteyn explica que as máscaras têm pequenos filtros, que impedem a passagem de gotículas e partículas maiores, mas permitem a troca do ar. Segundo o infectologista, o grau de proteção depende do material utilizado na produção do equipamento de proteção. Mas, tanto as máscaras cirúrgicas quanto as artesanais, feitas de pano, não impedem a respiração. “Os poros não evitam a passagem do ar, são filtros, filtram partículas. Os gases têm tamanho muito menor e conseguem passar”, ressaltou o médico.

Antonio Carlos Bandeira destaca que os tecidos habitualmente usados nas máscaras artesanais não impedem a respiração. Ele recomenda que a confecção seja com algodão: “Tem que ter cuidado de não usar um tecido com gramatura tão alta que impeça o indivíduo de respirar. Se for de algodão, ou com a gramatura adequada, são mais fáceis de ventilar porque as aberturas são maiores. Só teria uma situação assim (de dificuldade de respirar) se for um tecido super fechado. Mas não é o que a gente vê que está sendo usado”.

O vídeo também diz que “pessoas que usam máscara terão mais bactérias na boca, mais bactérias na gengiva, mais bactérias atacando seus dentes, no trato respiratório e, consequentemente, nos pulmões”.

Guilherme Spaziani explicou que o ser humano já tem bactérias próprias da mucosa e de outros lugares do corpo, mas que o uso da máscara de proteção não aumenta o número desses organismos. “Não é porque tem o anteparo na frente do rosto que vamos ter mais bactérias. Essas bactérias precisam estar lá no nosso organismo e ficam na mesma quantidade”, disse.

Gorinchteyn lembra que, apesar de as máscaras não aumentarem a quantidade de bactérias na boca, é preciso trocá-las em um intervalo regular: de 2 h para máscaras cirúrgicas e de 1h30 para equipamentos de pano. “Elas ficam úmidas, pelo ato de falar, transpirar e acabam perdendo o papel de proteção”, completou.

Por fim, os três especialistas destacam que o uso de máscara não diminui a imunidade. “A imunidade é composta por proteínas que são anticorpos e não vai ser prejudicada por usar um objeto na frente do rosto, seja de pano ou hospitalar”, comentou Spaziani.

Jean Gorinchteyn ressaltou que a máscara protege de infecções. “A máscara vai evitar que você esteja exposto aos agentes infecciosos”.

Os três médicos reforçam a importância do uso de máscaras para as pessoas que precisam sair de casa, mas ressaltam que são necessárias outras medidas para evitar o contágio pelo novo coronavírus. “A máscara não é um passaporte para andar na rua, até porque tem outros tipos de contágio, como pelo toque. É preciso lavar sempre as mãos”, completou o doutor Spaziani.

A Sociedade Brasileira de Infectologia criou programas de conscientização sobre a importância do uso de máscaras por quem precisa sair de casa. O “Máscara para Todos” é um deles.

“A gente tem procurado estimular o uso de máscaras pela população para que as pessoas saiam de máscara e voltem de máscara, usando continuamente e respeitando o tempo de uso. A ideia é que isso, somado ao distanciamento social e outras medidas, ajude a reduzir as taxas de transmissão do coronavírus”, finalizou Antonio Carlos Bandeira.

Quem é Daniél Rocha?

Daniél Rocha é o dono do canal do YouTube “Daniél Rocha – Alkaline Man”, com 120 mil seguidores.

Não há indicação no canal ou em seu site oficial sobre a formação profissional de Rocha. No site, Daniél vende livros e seminários sobre emagrecimento com saúde. Ele se descreve como “difusor da Alimentação Alcalina no Brasil”. No texto de apresentação, o youtuber diz ser “referência em Emagrecimento, sem intervenções cirúrgicas, pesquisador empírico, renomado como Mestre do Emagrecimento e Desintoxicação no Brasil”.

No YouTube, Daniél Rocha publica conteúdos sobre alimentação e, mais recentemente, sobre o novo coronavírus. Um deles, publicado há três meses, com o título “A farsa do coronavírus”, tem 159 mil visualizações.

O Comprova entrou em contato com Daniél por e-mail, questionando quais eram as fontes das afirmações do vídeo, mas não obteve resposta.

George Soros não comanda a OMS

No vídeo, Rocha afirma, ainda, que o megainvestidor George Soros, fundador da organização filantrópica Open Society Foundation, “comanda a OMS (Organização Mundial da Saúde) e tem interesse na redução populacional”.

Ao Comprova, a OMS informou que Soros não tem qualquer relação com a entidade, seja como empregado ou como embaixador. A reportagem não encontrou indícios de que o bilionário húngaro-estadunidense tenha relação com a instituição.

A OMS é parte do complexo de agências das Nações Unidas e foi criada pela Conferência Internacional de Saúde, realizada em 22 de julho de 1946, após o fim da Segunda Guerra Mundial, com a chancela de 61 países. A entidade começou a funcionar em 7 de abril de 1948. O diretor-geral da OMS, atualmente, é o etíope Tedros Adhanom.

Soros anunciou que doará US$ 130 milhões para o combate à pandemia, principalmente em regiões mais afetadas nos Estados Unidos, como o Estado de Nova Iorque.

Segundo reportagem da BBC Brasil de 2018, Soros é criticado pela direita por financiar ONGs de defesa de direitos humanos. O bilionário é personagem frequente de boatos falsos online, como o que ele é avô da ativista Greta Thunberg, que investiu na “destruição” do presidente Jair Bolsonaro e que empregava o presidente do partido Novo, João Amoêdo.

As orientações da OMS para o uso de máscaras estão neste link.

Contexto

Vários Estados e municípios tornaram obrigatório o uso de máscaras de proteção em ambientes públicos a partir de abril, seguindo recomendação do Ministério da Saúde. O aparato passou a ser considerado importante para prevenção, mesmo entre pessoas sem sintomas da covid-19. Em São Paulo, por exemplo, Estado com o maior número de casos do novo coronavírus, o item é obrigatório para quem sai na rua desde o dia 7 de maio.

A recomendação mudou após especialistas identificarem grande transmissão da doença entre pessoas assintomáticas. A máscara funciona, segundo especialistas, como uma barreira física. “O uso da máscara de pano de algodão de duas camadas é recomendado a todo momento na rua. Ela não vai te proteger, ela vai proteger o outro”, explicou o médico Guilherme Spaziani.

Alcance

O vídeo publicado no canal do Youtube de Daniél Rocha teve 33 mil visualizações com mais de 800 comentários sobre o tema.

 

Saúde

Investigado por: 2020-05-13

Cloroquina não é alvo de conspiração a favor do remdesivir

  • Enganoso
Enganoso
Há estudos em andamento para verificar a eficiência de ambas as drogas no tratamento de pacientes com covid-19 e governantes que defendem abertamente o uso de cloroquina, caso de Donald Trump e Jair Bolsonaro. Além disso, não há registro de que o homem que aparece no vídeo verificado pelo Comprova esteja envolvido no tratamento de pacientes infectados pelo novo coronavírus

Em um vídeo que circula na internet, um homem que se identifica como médico especialista em ortopedia afirma que a cloroquina é alvo de uma conspiração, por parte de governos e da indústria farmacêutica, que teriam interesse na utilização de uma droga chamada remdesivir – muito mais cara – no tratamento dos pacientes com a covid-19, doença provocada pelo novo coronavírus.

Na postagem, que é o trecho de uma transmissão ao vivo de mais de uma hora de duração, Cláudio Agualusa afirma que a cloroquina já é usada sem restrições há anos, no tratamento de outras doenças, e que a relutância na adoção de um protocolo que inclua a substância é uma tentativa de ampliar a comercialização de uma droga desenvolvida por um laboratório americano, que custaria “milhões”.

As alegações são enganosas. Primeiro, há governantes que defendem abertamente o uso da cloroquina, casos de Donald Trump e Jair Bolsonaro. Segundo, o uso da cloroquina e da hidroxicloroquina no tratamento de pacientes com a covid-19 ainda é objeto de estudos clínicos em todo o mundo, inclusive em uma iniciativa liderada pela Organização Mundial da Saúde (OMS). No Brasil, a coordenação é da Fiocruz. Do mesmo modo, o remdesivir ainda está sendo avaliado no combate à doença.

Por que checamos isto?

O Comprova monitora conteúdos duvidosos sobre o novo coronavírus e sobre a covid-19 compartilhados nas redes sociais e aplicativos de mensagens que tenham grande alcance nas redes sociais. O vídeo investigado pelo Comprova alcançou 44 mil compartilhamentos em somente uma das publicações encontradas.

A cloroquina e a hidroxicloroquina têm estado no centro de inúmeros rumores que circulam, em especial, nos Estados Unidos e no Brasil. Muitos desses boatos dizem que essas substâncias seriam a “cura” para a covid-19, o que poderia desmobilizar a sociedade no enfrentamento da pandemia. Além disso, a cloroquina e a hidroxicloroquina só podem ser usadas sob orientação médica, pois têm efeitos colaterais significativos.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Como verificamos?

Para esta verificação, buscamos dados da Food and Drug Administration (FDA), órgão sanitário dos Estados Unidos, estudos recentes envolvendo o tratamento da covid-19 com hidroxicloroquina e contatamos um especialista em infectologia.

Buscamos o vídeo original com as falas de Agualusa, publicado originalmente numa transmissão ao vivo no Facebook dele e entramos em contato com os municípios onde o médico diz atuar e com o Conselho Regional de Medicina do Rio de Janeiro.

Também foram consultadas matérias jornalísticas, de veículos nacionais e internacionais, com informações sobre o tema.

Verificação

No vídeo, que circula pelas redes sociais e pelo Youtube, o médico Cláudio Agualusa defende a utilização de um protocolo barato para o tratamento de pacientes com a covid-19: administração do antibiótico azitromicina, de cloroquina ou hidroxicloroquina e de sulfato de zinco.

Apesar do baixo custo, o médico afirma que o tratamento não é adotado porque “eles” estão aguardando a possibilidade de utilização de um medicamento muito mais caro, o remdesivir.

A conspiração, segundo o médico, não é política, mas sim em prol do lucro da indústria farmacêutica, já que cada dose do medicamento custaria “milhões de dólares”.

O remdesivir

Trata-se, realmente, de um tratamento antiviral em investigação, administrado por infusão diária. Segundo anúncio do governo americano, no último dia 29, é o primeiro remédio capaz de melhorar a situação dos doentes de covid-19.

O FDA, que regula os medicamentos nos Estados Unidos, autorizou o uso de remdesivir em emergências, o que possibilita entrada da droga no mercado americano sem a exigência de dados completos sobre segurança e eficácia.

A droga, até então era classificada como uma “medicação órfã”, assim como apontado por Agualusa. Essa é uma forma de elencar fármacos destinados ao diagnóstico, prevenção e tratamento de uma doença rara ou negligenciada, cuja produção não é economicamente viável. Há dentro do FDA, o órgão instituído para promover a pesquisa e o desenvolvimento de drogas órfãs é o Office of Orphan Products Developement (OOPD).

Segundo o laboratório Gilead Science, que é responsável pelo desenvolvimento do remdesivir, a droga é fruto de uma pesquisa desenvolvida há mais de uma década e sua aplicação já foi testada em doenças como a Ebola, por exemplo. Em entrevista à NPR, National Public Radio, organização de mídia parcialmente financiada pelo governo dos EUA, uma representante do laboratório disse que o medicamento ainda não tem um preço definido, mas que um suprimento inicial, de 1,5 milhão de doses da droga, foi doado para o tratamento de pacientes com covid-19.

Em um modelo apresentado pelo Institute for Clinical and Economical (ICER) – entidade voltada para a precificação e análise da efetividade clínica de medicamentos, localizada em Boston (EUA) –, o tratamento com o remdesivir deve custar entre 10 e 4,5 mil dólares. A estimativa leva em conta o custo de produção e a efetividade do medicamento. Apesar do valor máximo ser alto – mais de R$ 26 mil, considerada a cotação do dólar americano no dia 12 de maio –, a quantia está bem distante dos “milhões de reais” a que Agualusa se refere no vídeo.

Sobre a utilização do medicamento no Brasil, que, segundo Claudio Agualusa, só começaria depois de um número muito maior de mortes, o ministro da Saúde, Nelson Teich, disse, na segunda-feira, 11 (portanto, depois da realização da live), que está condicionada à realização de estudos clínicos que comprovem a sua eficácia nos casos do novo coronavírus.

A cloroquina

O vídeo de Claudio Agualusa sugere a existência de campanha contra a hidroxicloroquina e a cloroquina, realizada pela indústria farmacêutica e governos, por conta do custo baixo do medicamento e do tratamento com seu uso associado.

As pesquisas mais recentes, publicadas em periódicos médicos importantes como o Journal of the American Medical Association e o The New England Journal of Medicine, não encontraram redução de mortalidade por covid-19 entre pessoas que foram medicadas com hidroxicloroquina.

O uso do medicamento em pacientes com o novo coronavírus, portanto, apesar de autorizado no Brasil, não é uma unanimidade. O Comprova entrou em contato com Estevão Urbano, presidente da Sociedade Mineira de Infectologia e Membro do Comitê de Enfrentamento à covid-19 de Belo Horizonte, que disse que não procede a crença de Agualusa na existência de uma conspiração contra a cloroquina. “Não existe nenhuma normatização ainda. Existem pouco remédios cientificamente testados, os usos empíricos são baseados em trabalhos muito frágeis”, afirmou.

Segundo Urbano, “a cloroquina está muito longe de ser comprovada como uma droga efetiva, e é por isso que ela não é, ainda, um consenso. Embora possa ter também seu papel, não é mais do que uma inferência, ainda, muito frágil.”

O tratamento sugerido por Cláudio Agualusa, inclusive, é o mesmo sugerido por um médico de Nova Iorque, e, como apurado pelo Comprova, ainda não tem comprovação científica.

Cláudio Agualusa

O homem que aparece no vídeo é o médico fluminense Cláudio Agualusa. Ele possui registro ativo junto ao Conselho Regional de Medicina do Rio de Janeiro, e aparece em catálogos online, como o Doctoralia, e o CatálogoMed como especialista em Ortopedia e Traumatologia. Na live, aliás, ele também se identifica como ortopedista, diz já ter receitado cloroquina e hidroxicloroquina a pacientes com “artrites severas”. Não há qualquer indicação de que Agualusa esteja atuando diretamente no tratamento de pacientes com a covid-19.

Agualusa foi candidato a Deputado Estadual, no Rio de Janeiro, em 2018, pelo PRB. Em 2016, já havia se candidatado a prefeito de Búzios, pelo PRP. Não se elegeu em nenhuma das duas ocasiões.

O médico mantém um perfil ativo e uma fanpage no Facebook, onde publica vídeos e textos sobre o novo coronavírus e a covid-19. Ele também já realizou várias transmissões ao vivo — de mais de uma hora de duração — sobre o tema. Nas postagens, Agualusa defende a importância do isolamento social, fala sobre a higienização das mãos e de produtos e, principalmente, trata dos benefícios do tratamento realizado com a cloroquina.

O Comprova tentou entrar em contato com Agualusa, por meio de seu perfil no Facebook, mas não recebemos uma resposta. Na página oficial dele, não há a possibilidade de envio de mensagens privadas.

Contexto

Desde março, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, vem incentivando o uso da cloroquina e a hidroxicloroquina, normalmente prescritas no tratamento de doenças como malária, artrite e lúpus.

No mesmo mês, o presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, também passou a fazer o mesmo. Bolsonaro anunciou o aumento da produção da droga no país em 21 de março, e sua campanha em favor da substância foi um dos pontos de desentendimento com o ex-ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, que não recomendava o uso indiscriminado do medicamento.

Desde então, apoiadores de Trump e Bolsonaro passaram a defender firmemente o uso das substâncias, cuja eficácia continua sob análise.

Alcance

Até as 16h30 do dia 12 de maio, o vídeo havia sido assistido 936 mil vezes vezes na página “Muda Ibertioga”, no Facebook, e 94 mil vezes no canal do YouTube associado à mesma página.

Saúde

Investigado por: 2020-05-08

Dois terços dos nova-iorquinos infectados estavam em casa, mas dado não comprova falhas no distanciamento social

  • Enganoso
Enganoso
Vídeo compartilhado nas redes sociais apresenta somente parte de uma entrevista do governador de Nova York para afirmar que o isolamento foi em vão. Ainda que os dados apresentados sejam verdadeiros, o vídeo omite a parte em que Andrew Cuomo diz que o número de casos começou a cair no estado depois das medidas de isolamento social

É verdadeira a pesquisa que afirma que, de cada três novos pacientes de covid-19 no Estado de Nova Iorque, dois estavam em casa. Mas, ao contrário do que sugerem publicações divulgadas em redes sociais aqui no Brasil, é enganoso afirmar que o distanciamento social determinado pelo estado norte-americano tenha falhado.

Os dados foram divulgados em uma entrevista coletiva do governador Andrew Cuomo, no dia 6 de maio. A pesquisa foi realizada pelas autoridades de saúde do Estado em 113 hospitais ao longo de três dias. O levantamento apontou que, entre as 600 novas internações por Covid-19, 66% dos doentes foram infectados em casa.

Um vídeo com parte da coletiva do governador Cuomo foi editado e legendado em português e publicado no Jornal da Cidade Online e em perfis e páginas de Twitter e Facebook, acompanhado de textos que afirmam que os dados da pesquisa seriam uma prova de que o lockdown decretado pelo Estado de Nova Iorque falhou. Mas a edição omite a parte em que Cuomo fala da queda no número de novas infecções, sugerindo que as políticas de distanciamento social estão funcionando. “Tudo está fechado, o governo fez tudo o que podia, a sociedade fez tudo o que podia. Agora depende de você”, afirmou.

Por que investigamos isso?

Grupos contrários às políticas de distanciamento social têm compartilhado nas redes sociais conteúdos enganosos ou fora de contexto que minimizam ou questionam os efeitos do isolamento na redução da velocidade de contágio da covid-19. Tais narrativas acabam encontrando receptividade nas pessoas afetadas pelo isolamento, sobretudo pelos prejuízos econômicos causados pela pandemia. O Comprova verificou conteúdos enganosos semelhantes recentemente.

O Comprova monitora conteúdos duvidosos sobre o novo coronavírus e sobre a covid-19 compartilhados nas redes sociais e aplicativos de mensagens que tenham grande alcance nasd redes sociais. O vídeo investigado pelo Comprova alcançou 54 mil interações em dois dias somente em uma das páginas que o compartilhou.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro com o propósito de mudar o seu significado; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Como verificamos?

A equipe do Comprova foi em busca da fala original de Andrew Cuomo, para conferir se as legendas em português estavam corretas e se a edição deixou alguma informação de fora. Também buscamos os dados da pesquisa. Por fim, entramos em contato com a assessoria de imprensa do governo do Estado de Nova Iorque para saber qual é a conclusão das autoridades de saúde sobre os dados divulgados.

Verificação

Os Estados Unidos são o país mais atingido pela pandemia do novo coronavírus atualmente. Levantamento da Universidade Johns Hopkins mostra que 1.268.520 pessoas contraíram a covid-19 nos EUA e 76.101 haviam morrido até o dia 8 de maio. Só o Estado de Nova Iorque tem 327.000 casos e 20.828 mortes.

No dia 6 de maio, o governador Andrew Cuomo deu uma entrevista coletiva para falar sobre os dados coletados pelo Departamento Estadual de Saúde. Foram mais de 1.300 pacientes internados em 113 hospitais de todo o Estado ao longo de três dias. O levantamento desenhou o perfil dos pacientes infectados nesse período: pessoas com mais de 51 anos (73%), negras (25%) ou latinas (20%) e que estavam isoladas em casa. “Essa é a surpresa: a grande maioria das pessoas estava em casa. Houve muita especulação sobre isso”, disse Cuomo, “Essas pessoas estavam, literalmente, em casa. Estavam trabalhando? Não. Estavam aposentados ou desempregados”.

A entrevista de Cuomo foi editada e legendada pelo canal de YouTube brasileiro Legendando. O conteúdo da entrevista coletiva não foi adulterado, mas trechos importantes ficaram de fora, como a ressalva de que a amostragem da pesquisa foi relativamente pequena. Ou o trecho em que o governador afirma que o número de casos começou a cair no Estado depois das medidas de isolamento social, colocadas em vigor no dia 22 de março, e sugere que a população está relaxando com os cuidados: “Você está usando a máscara? Está lavando as mãos? Tem pessoas mais jovens visitando você?”, questionou Cuomo. “É uma questão de comportamento”.

Na tela em que os dados são divulgados aparece o slogan do governo no combate à pandemia, que reforça a importância do isolamento: “Fique em casa. Pare a contaminação. Salve vidas”. Essa frase também aparece na versão legendada e editada divulgada nas redes sociais brasileiras. Mas em nenhum momento ela é traduzida.

Procuramos o Departamento de Saúde do Estado de Nova Iorque para saber qual é a leitura que as autoridades sanitárias fazem dos dados. Por e-mail, a assessoria de imprensa declarou que os pacientes que pegaram o novo coronavírus em casa “claramente tiveram contato com pessoas infectadas”.

A assessoria de imprensa do gabinete do governador respondeu que os dados divulgados não significam que a política de isolamento falhou. E destaca a entrevista de Andrew Cuomo para a rede americana CBS, no dia 7 de maio. “A taxa de infecção só está aumentando entre as pessoas que estão em casa, mostrando que o isolamento está funcionando. Estamos em um nível que depende apenas de comportamento pessoal. São pessoas que estão em casa, não estão trabalhando e nem usando o transporte público. É a única população em que os índices estão crescendo, e essa é uma boa notícia”, disse ao apresentador Stephen Colbert.

Contexto

Críticas às políticas de isolamento adotadas para o combate à covid-19 têm sido um discurso comum entre influenciadores de direita. Ecoando declarações do presidente Jair Bolsonaro, muitas pedem a retomada de atividades econômicas. Essa visão contraria orientações da Organização Mundial da Saúde e do Ministério da Saúde, que recomendam políticas de distanciamento social para evitar a disseminação do novo coronavírus.

Num primeiro momento, tanto o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, quando o governador de Nova Iorque, Andrew Cuomo, também resistiram às restrições de circulação. Mas com o aumento no número de casos de covid-19, ambos precisaram voltar atrás. Um decreto entrou em vigor no Estado de Nova Iorque no dia 22 de março, determinando o fechamento de escolas e de toda a atividade não essencial, a proibição de reuniões, o distanciamento de um metro e meio entre pessoas em ambientes públicos e a medidas de higiene, como o uso de álcool gel. Quem tem mais de 70 anos ou doenças crônicas foi orientado a ficar em casa e evitar contato com pessoas de fora do círculo familiar.

No dia 7 de maio, Cuomo criticou quem coloca a saúde pública contra a economia, alegando que não existe essa oposição. O governador acredita que a redução no número de casos aponta que a política de isolamento social adotada pelo Estado está funcionando. “Você tira Nova Iorque (da estatística) e os números (de casos) do resto do país estão aumentando. Nós estamos reduzindo. Então o que estamos fazendo está funcionando. E quando está funcionando, mantenha em curso”, sugeriu.

No dia seguinte, Cuomo destacou o grande número de casos entre comunidades negras e latinas, que tendem a ser mais pobres. E afirmou que só vai reabrir escolas e o comércio quando houver garantia de que o número de casos não vai aumentar. “Se abrirmos de maneira irresponsável, vamos ver esse número de novas infecções aumentar”, disse. “Nós reduzimos a curva (de novos casos), mais ninguém. E nós vamos determinar como vai ser o ritmo de novas infecções daqui para frente”.

Alcance

O vídeo editado ganhou grande repercussão entre os dias 6 e 8 de maio, geralmente acompanhado de textos que afirmavam que a quarentena falhou em Nova Iorque. Ele foi publicado na página de Facebook do Jornal da Cidade Online e somou mais de 54 mil interações até o dia 8. Outros usuários da rede também postaram o vídeo, com menos viralização.

O Twitter também foi usado para disseminar o conteúdo. O usuário Rafael Glau teve 3,5 mil curtidas e mais de 32 mil visualizações em sua publicação na rede social. Uma arte com a arroba dele foi colocada sobre a imagem de Andrew Cuomo, junto com as legendas em português. Outra publicação que teve grande alcance no Twitter foi de Arthur Weintraub, assessor especial do presidente da República e irmão do ministro da Educação Abraham Weintraub. Foram 8,3 mil curtidas e 44,5 visualizações até o dia 8 de maio. No post, ele alega que “o isolamento, na prática e estatisticamente, não funcionou!”, diferentemente do que afirma o governador de Nova Iorque.

Saúde

Investigado por: 2020-05-08

Descoberta de anticorpo em Israel ainda não significa cura para coronavírus

  • Falso
Falso
Laboratório ligado ao governo israelense conseguiu isolar um anticorpo que neutraliza o novo coronavírus, mas um tratamento baseado nesta pesquisa ainda deve levar vários meses para se tornar realidade

É falso que Israel tenha descoberto a cura para o novo coronavírus, ao contrário do que afirma o título de um vídeo com mais de 580 mil visualizações no YouTube. A descoberta a que o vídeo se refere é, na verdade, de um anticorpo que neutraliza o SARS-CoV-2, vírus que causa a covid-19, em estudo do Instituto de Pesquisas Biológicas (IIBR) do Ministério da Defesa israelense.

A instituição anunciou o achado científico como um avanço significativo, mas enfatizou que ainda trabalha em uma patente e que ainda não é uma “vacina para toda a população”.

Nesta quinta-feira, 7, o ministro da Defesa de Israel, Naftali Bennett, divulgou a descoberta de mais três anticorpos no mesmo instituto. Ele comemorou o avanço, mas ressaltou que ainda seria necessária “uma série de testes complexos e um processo de aprovação regulatória”, o que pode levar “vários meses”.

Por que checamos isto?

O Comprova verificou este vídeo porque conteúdos que anunciam a descoberta de curas ou de vacinas para a covid-19 podem ter como um de seus efeitos desmobilizar a sociedade a respeito da necessidade de se proteger da doença.

Pesquisas estão sendo realizadas em diversas partes do mundo tanto para desenvolver uma vacina contra o vírus quanto para encontrar um possível tratamento para a doença que ele provoca.

Em um cenário em que o mundo ainda não tem cura ou vacina para a covid-19, que é altamente contagiosa, entidades como a Organização Mundial da Saúde (OMS) orientam os países a realizar um ativo processo de testagem para rastrear os doentes, mas também recomendam o distanciamento social e o isolamento das pessoas infectadas.

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.

Como verificamos?

O Comprova consultou o site oficial do IIBR e do Ministério da Defesa de Israel. Também acessamos as redes sociais das duas instituições e do ministro da pasta, Naftali Bennett. Os links utilizados como fonte estão no texto abaixo.

Verificação

O Ministério da Defesa de Israel, pasta à qual o Instituto Israelense de Pesquisa Biológica (IIBR) é subordinado, anunciou em suas redes sociais em inglês e em hebraico, na terça-feira, 5, que o laboratório isolou um anticorpo que “neutraliza” o coronavírus SARS-COV-2, causador da covid-19.

Segundo o comunicado, o IIBR é “a primeira instituição a alcançar um avanço científico que atende simultaneamente” três parâmetros importantes: é capaz de neutralizar o novo coronavírus; foi testado especificamente no novo coronavírus que causa a covid-19; e é “monoclonal”, o que significa que não tem proteínas adicionais que podem causar complicações para os pacientes.

Na versão em hebraico do comunicado, que pode ser traduzida para diversos idiomas usando ferramentas como o Google Tradutor, o Ministério da Defesa afirma que o instituto está “atualmente trabalhando em uma patente” para a descoberta e depois vai entrar em contato com farmacêuticas internacionais.

O comunicado enfatiza que o anticorpo “tem o potencial de desenvolver uma cura”, mas que “não é uma vacina para toda a população”. Ainda segundo o Ministério da Defesa de Israel, a descoberta será seguida por uma “série complexa de experimentos e um processo de aprovação regulatória”. De acordo com os cientistas do IIBR, diz a nota, a natureza da descoberta pode reduzir esse trâmite, “que pode se prolongar por vários meses”.

Contexto

A divulgação do vídeo com informações falsas se dá em meio à continuidade da tensão no Brasil a respeito das divergências sobre como lidar com a pandemia. Enquanto os governos estaduais adotaram, em diferentes intensidades, as medidas de isolamento social, o presidente Jair Bolsonaro continua a ser uma das poucas lideranças políticas no mundo que se posiciona contra tais medidas.

O vídeo afirma que, com a suposta cura, “a esquerda perdeu novamente”, ecoando parte da estratégia política de Bolsonaro de classificar todos seus eventuais adversários como esquerdistas. “Se a esquerda pensava que o Brasil ia parar e o governo de Jair Bolsonaro seria abalado, estão muito enganados (sic). A boa notícia chegou hoje e já podemos comemorar”, afirma o locutor do vídeo.

Na sequência, o locutor pede o compartilhamento das imagens “pois o Brasil precisa ouvir isso”. E emenda uma frase que reitera a argumentação de Bolsonaro nos últimos meses, afirmando que “vamos voltar a produzir, a trabalhar e a crescer novamente”.

De acordo com a agência Reuters, Israel foi um dos primeiros países do mundo a fechar as fronteiras e a impor restrições na circulação de pessoas para evitar a disseminação do novo coronavírus. Até esta quinta-feira, 7, foram registrados 16.346 casos da covid-19 no país, com 239 mortos pela doença, segundo a Universidade Johns Hopkins.

Alcance

O vídeo com título “Até que enfim… Desc0berta cura para cor0navírus! Bolsonaro fica mais f0rte e esquerd4 perdeu…” obteve 588,7 mil visualizações desde o dia 5 de maio. O conteúdo foi publicado pelo canal DR News, que tem 989 mil inscritos no YouTube. Leitores solicitaram a checagem do vídeo por meio do WhatsApp do Comprova (11 97795-0022).

Saúde

Investigado por: 2020-05-07

Registro de número de mortes não diminuiu no Amazonas após visita do ministro da Saúde

  • Falso
Falso
Ao contrário do que afirma uma publicação no Twitter, não é verdade que o número de mortes causadas pelo novo coronavírus tenha reduzido no Amazonas depois da visita de Nelson Teich. O estado também registrou recorde de óbitos pela covid-19 em um único dia quando o ministro deixou a capital

Não é verdade que o número de mortes causadas pelo novo coronavírus tenha reduzido no Amazonas depois da visita do ministro da Saúde, Nelson Teich, ao estado.

Uma publicação compartilhada nas redes sociais diz que, antes da visita do ministro, o governo registrava 140 óbitos diários, mas, com a chegada de Teich, o número caiu para 46, sendo apenas dois por covid-19. O conteúdo dessa mensagem é falso.

Ao contrário do que afirma a publicação, o Amazonas registrou recorde de óbitos em um único dia na última terça-feira (05), quando o ministro deixou a capital, Manaus.

Por que investigamos isso?

O Comprova monitora conteúdos duvidosos sobre o novo coronavírus e sobre a covid-19 compartilhados nas redes sociais e aplicativos de mensagens. A decisão pela checagem considerou três aspectos:

  1. Muitos boatos têm sido compartilhados nas redes sociais com conteúdos enganosos que negam os números da pandemia, minimizam os efeitos da covid-19 ou que questionam as decisões de governadores que adotam medidas de isolamento social.
  2. Nesta semana, o Brasil teve recorde de mortes pela por covid-19 em um único dia – foram 615, entre terça e quarta-feira. No Amazonas, o número de óbitos causados pela covid-19 também aumentou, e o Estado enfrenta um colapso do sistema de saúde e do sistema funerário. Medidas restritivas têm sido adotadas para diminuir a velocidade de contágio e, assim, reduzir a pressão sobre esses sistemas.
  3. O Comprova verifica a veracidade de conteúdos suspeitos que tenham grande viralização. O texto verificado foi curtido e retweetado milhares de vezes pelo Twitter e apareceu no monitoramento do Comprova em publicações no Facebook e no WhatsApp.

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.

Como verificamos?

O Comprova acessou dados do Ministério da Saúde sobre o número de casos de infecção pelo novo coronavírus no Amazonas. Também utilizamos dados relacionados ao repasse de verbas do ministério para o estado e entramos em contato com as assessorias de imprensa das secretarias de saúde do governo do Amazonas e da cidade de Manaus.

O Comprova ainda consultou matérias publicadas na imprensa sobre a situação da pandemia no Amazonas e tentou fazer contato com o responsável pela publicação, no Twitter.

Você pode refazer o caminho da verificação acessando os links que oferecemos nesta reportagem.

Recorde de mortes no Amazonas

Uma das primeiras publicações foi feita pelo perfil @GrimoaldoL, no Twitter, na tarde de terça-feira (05). A mensagem havia sido compartilhada por 1,6 mil pessoas e curtida por 4,2 mil até o dia 7 de maio, quando esta verificação foi concluída.

Na publicação, o autor afirma que no dia 4 de maio, quando o ministro da Saúde realizava visitas a hospitais de Manaus, 46 pessoas haviam morrido em todo Estado, sendo apenas duas delas por covid-19. Diz, ainda, , que no dia 5 de maio, quando a mensagem foi compartilhada, haviam sido registradas 39 mortes. A afirmação é falsa.

De acordo com dados divulgados pelo governo do Amazonas, no dia 4 de maio foram registradas 36 novas mortes só por covid-19 no Amazonas, sendo 22 delas em Manaus. Já no dia 5 de maio, o Estado bateu recorde diário no número de mortes registradas por coronavírus, com 65 óbitos — 41 na capital.

Outro trecho da mensagem que circula pelo Twitter afirma que, antes da visita do ministro, o governo de Manaus dizia que morriam 140 pessoas por dia no estado. A prefeitura da capital negou a informação. Por e-mail, o município disse que “o recorde de óbitos no sistema público funerário ocorreu no dia 26 de abril, quando 120 sepultamentos e duas cremações foram realizadas”. Além disso, “a média de sepultamentos e cremações no sistema público funerário nos cinco primeiros dias de maio segue muito acima da média diária de todo o ano de 2019, que foi de 28,3 sepultamentos”, informou a prefeitura.

O Comprova entrou em contato com o autor da publicação no Twitter, para saber a fonte das informações que divulgou. Ele respondeu que havia lido uma notícia sobre o assunto e que encaminharia o link da reportagem. Contudo, isso não foi feito até o momento da publicação desta checagem.

Uma outra versão do texto falso, que também circulou pela internet, dizia que houve redução de 1000% no número de mortes no Estado em dois dias, o que, além de não fazer sentido, matematicamente, não se confirma em nenhum aspecto. O Amazonas registrou um aumento de 38% no número de mortes entre o domingo (3) e terça-feira (5), período da visita do ministro ao estado.

Manaus é uma das cidades mais atingidas pela covid-19 no país, registrando um aumento de 60% no número de casos confirmados da doença na última semana. A taxa de mortalidade do coronavírus no Estado é a mais alta do país e já fez com que a Prefeitura de Manaus abrisse uma vala em um cemitério público da cidade para conseguir realizar todos os sepultamentos. Os dados divulgados pelo Ministério da Saúde no dia 7 de maio mostram que o Amazonas registra 9.243 casos da covid-19 e 751 mortes.

A visita do ministro

O Amazonas é o primeiro Estado visitado pelo ministro da Saúde, Nelson Teich, durante a pandemia. Na visita, que durou dois dias, Teich conheceu hospitais em Manaus e anunciou a chegada de 267 profissionais de saúde para reforçar o enfrentamento ao coronavírus no estado. Ao todo, são 37 médicos, 118 enfermeiros, 57 técnicos em enfermagem, 26 fisioterapeutas, 12 farmacêuticos e 17 biomédicos, que vão atuar em todo o Amazonas.

Desde o início da pandemia, o Ministério da Saúde destinou R$ 68,8 milhões ao Estado para o fortalecimento da rede hospitalar e de vigilância, além do envio de 1,5 milhão de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) e de 90 respiradores.

Contexto

Os dados sobre a dimensão da pandemia do novo coronavírus no Brasil vem sendo constantemente questionados por grupos contrários às medidas de isolamento social e podem ser prejudiciais no combate à doença no país.

O texto verificado sugere, de forma equivocada, que, com a presença do ministro da Saúde, dados que estariam inflados passaram a ser registrados da forma correta.

Alcance

A mensagem havia sido compartilhada por 1,6 mil pessoas e curtida por 4,2 mil, no Twitter, até o dia 7 de maio, quando esta verificação foi concluída.

O conteúdo desta verificação também foi checado por Aos Fatos.

Saúde

Investigado por: 2020-05-06

Ao contrário do que afirma blog, OMS recomenda isolamento como uma das medidas de combate ao novo coronavírus

  • Enganoso
Enganoso
Declaração de uma porta-voz da OMS foi tirada de contexto para dar a entender que a organização não recomenda o confinamento como ferramenta de combate ao novo coronavírus. O Comprova verificou a declaração original e está claro que a recomendação é que não se utilize o isolamento como única medida de combate

É enganosa a afirmação de que a OMS (Organização Mundial da Saúde) não recomenda o confinamento como estratégia de combate ao novo coronavírus. Ela foi divulgada pelo blog Estibordo, que tem uma seção dedicada a traduzir artigos de viés político de direita. O texto, compartilhado pela página do grupo no Facebook, foi baseado na entrevista de Margaret Harris, porta-voz da OMS, para o jornal The Sydney Morning Herald, sobre o afrouxamento da quarentena na Austrália.

O título “OMS diz que nunca aconselhou a aplicação de confinamento como medida para o combate ao coronavírus” desinforma o leitor, já que ao longo do texto fica claro que a declaração da representante da OMS é no sentido de que a organização não recomenda o isolamento como a única medida de combate à pandemia.

Por que investigamos isso

O Comprova monitora conteúdos duvidosos sobre coronavírus e sobre a covid-19 e encontrou o link para esse texto sendo compartilhado nas redes sociais. Também recebeu de seus leitores solicitações de checagem. A decisão pela checagem considerou dois aspectos:

  1. Um estudo feito por pesquisadores brasileiros apontou que o Brasil deve ser o próximo epicentro de contágio do novo coronavírus no mundo. Como ainda não há medicamento para tratar a covid-19 nem vacina para preveni-la, medidas de isolamento e distanciamento social são apontadas por autoridades sanitárias como as únicas maneiras de reduzir a contaminação do novo coronavírus.
  2. O Comprova verifica a veracidade de conteúdos suspeitos sobre coronavírus e a covid-19 que tenham grande viralização. O texto verificado está presente em mais de uma centena de postagens no Twitter e no Facebook.

Enganoso para o Comprova é todo o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro com o propósito de mudar o seu significado; que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor.

Como verificamos

Começamos com o artigo original citado no texto do Estibordo, uma reportagem do jornal australiano The Sydney Morning Herald. Também entramos em contato com o escritório da Organização Mundial da Saúde no Brasil para confirmar que a entrevistada, Margaret Harris, trabalha como porta-voz da organização e quais são as diretrizes para o isolamento social recomendadas pela OMS.

Por fim, procuramos informações sobre o combate ao novo coronavírus nos site do Ministério da Saúde da Austrália e na imprensa local.

O que consta na declaração original

O texto publicado no blog Estibordo foi traduzido de um artigo originalmente publicado em francês pelo site russo Sputnik. Na página “Quem somos?”, a Sputnik se identifica como uma agência de notícias da Rússia e afirma que pertence à Empresa Federal Estatal Agência Internacional de Notícias Rossiya Segodnya.

Tanto o artigo em francês quanto a tradução brasileira usam a palavra “nunca” no título (“OMS diz que nunca aconselhou a aplicação de confinamento como medida para o combate ao coronavírus”) e, com isso, passam a impressão de que a organização é contra as medidas de isolamento em geral.

A declaração da porta-voz da Organização Mundial da Saúde foi tirada de contexto. A matéria original, publicada pelo jornal The Sydney Morning Herald, é sobre o afrouxamento das medidas de isolamento na Austrália. Na entrevista, Margaret Harris afirma que a Austrália e a Nova Zelândia são exemplos de combate à pandemia porque fizeram uma quarentena rigorosa e colocaram em prática medidas para identificar a disseminação do novo coronavírus entre a população. “Nunca dissemos façam lockdown — dissemos identifiquem, façam o rastreamento e acompanhem o desenvolvimento dos casos, isolem e tratem os doentes”, disse Harris.

O texto também confunde ao misturar conceitos diferentes: distanciamento social, isolamento e lockdown. Para a OMS, distanciamento social são as medidas aplicadas a entornos sociais específicos, ou à sociedade em sua totalidade, para reduzir o risco de adquirir ou difundir a covid-19. O lockdown é a forma mais radical, quando as pessoas são proibidas de sair de casa — salvo exceções como atendimento médico. Já o isolamento (também chamado de “confinamento”) é a separação de pessoas que já estão doentes para não propagar a infecção ou contaminação. De acordo com a assessoria de imprensa da OPAS, braço pan-americano da OMS, “distanciamento social e isolamento são algumas das medidas não farmacológicas recomendadas no contexto da covid-19”.

A crítica de Harris, da OMS, é aos países que implantaram políticas de lockdown inspiradas nas medidas colocadas em prática em Wuhan, primeira cidade onde o novo coronavírus foi detectado na China, sem a aplicação de outras políticas de controle, como o rastreamento de todos que tiveram contato com doentes para o isolamento dessas pessoas e o testes realizados em massa na população. “É muito mais do que apenas fechar tudo”, disse Harris.

Situação na Austrália

A Austrália conseguiu achatar a curva da doença. O país estava mais vulnerável pela proximidade (geográfica e comercial) com a China e pelos navios de cruzeiro que circulam por lá. Os resultados positivos se devem a uma ação rápida do governo logo que os primeiros casos foram confirmados, em 20 de janeiro. Até o dia 05 de maio, o país tinha registrado 6.849 pessoas infectadas pela covid-19 e apenas 96 mortes.

A porta-voz da OMS também elogiou a forma como o país, e a Nova Zelândia, “levaram a pandemia realmente a sério, insistindo que era um caso grave, e comunicando isso para a população”, disse ao The Sydney Morning Herald.

As medidas de distanciamento social na Austrália foram estabelecidas pelos estados. Mas todas tinham em comum o rigor. As autoridades de saúde rastrearam os doentes, que ficaram isolados. Quem teve contato com pessoas infectadas ou chegou ao país depois do dia 15 de março também teve que ficar confinado. Além disso, foram realizados testes em massa na população. Com a redução no número de os casos, a partir da última semana de abril os estados tiveram a autorização do governo federal para começar uma volta gradual à normalidade.

Contexto

Textos afirmando que medidas de isolamento social e quarentena são ineficazes têm se espalhado por veículos e grupos de mensagem de direita, muitas vezes acompanhados de mensagens que estimulam a volta das atividades econômicas. O Projeto Comprova já verificou conteúdo com informações da OMS divulgadas de maneira enganosa em outra ocasião.

O blog Estibordo divulga conteúdos de direita, muitas vezes já publicados fora do Brasil. “Nesta seção trazemos traduções feitas por nossa equipe dos maiores escritores ao redor do mundo defendendo a causa da direita no cenário político atual”, diz a descrição da seção “Tradutores de Direita”, que também dá nome ao grupo de Facebook ligado ao blog. Os posts mais recentes do grupo trazem críticas ao governador de São Paulo, João Doria, e às medidas de isolamento adotadas pelo Estado. Esses questionamentos aparecem, inclusive, na publicação com o link do texto, embora o conteúdo não tenha nada a ver com as políticas paulistas.

O Comprova entrou em contato com os autores do blog pelo Facebook, mas não obteve resposta.

Alcance

A publicação do blog Estibordo divulgada no grupo de Facebook Tradutores de Direita teve 623 compartilhamentos até o dia 05 de maio. No Facebook, encontramos outras 60 postagens do mesmo conteúdo. No post que mais viralizou no Twitter, o texto traduzido foi curtido 564 vezes até a mesma data e tuitado por outros 45 perfis. Mas uma publicação da mesma usuária com a versão do conteúdo em francês, publicada pela agência Sputnik, teve muito mais alcance, com mais de cinco mil curtidas.

Saúde

Investigado por: 2020-05-05

Registros de óbitos em cartórios confirmam dados da pandemia no Brasil

  • Falso
Falso
Texto de corrente de WhatsApp diz que "não há epidemia" e mostra números que seriam do Portal da Transparência. O Comprova verificou, no entanto, que esses números não condizem com os verdadeiros dados disponíveis na plataforma

Uma corrente de Whatsapp utiliza falsos dados de óbitos por covid-19 – doença causada pelo novo coronavírus – para contestar a dimensão real da pandemia. O texto diz que os números são do Portal da Transparência, mantido pela Associação Nacional dos Registradores de Pessoas Naturais (Arpen-Brasil), mas eles não condizem com os verdadeiros dados disponíveis na plataforma.

Na primeira frase da mensagem falsa, a publicação diz que não há “epidemia”. Tal desinformação é perigosa uma vez que pode corroborar com teorias conspiratórias sobre um “falso alarde” relacionado à doença. A OMS (Organização Mundial da Saúde) declarou em 11 de março que a propagação do novo coronavírus caracteriza uma pandemia, ou seja, que o vírus se alastra mundialmente.

De acordo com o site Worldometer, até as 14:40 de 5 de maio a doença já havia infectado 3.693.797 pessoas no mundo e registrou 255.595 óbitos. A mentira sobre a covid-19 não existir também pode influenciar as pessoas a descumprirem medidas de isolamento social, impostas para tentar frear as infecções do vírus, e saírem de casa, aumentando a propagação da doença.

Por que checamos isto?

O número de mortos pela covid-19 e a quantidade de novos casos são fundamentais para se compreender a progressão da doença. Os dados dão norte às autoridades públicas para adotar medidas de prevenção e combate ao avanço das infecções.

Boatos que questionam sem comprovação os números de mortes divulgados pelo Ministério da Saúde podem levar as pessoas a adotar comportamentos que as coloquem em risco e ajudem a disseminar ainda mais a doença.

Falso para o Comprova é o conteúdo que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.

Como verificamos?

Para escrever esta reportagem o Comprova contatou a assessoria dos Cartórios, consultou o regulamento sobre o procedimento para registrar mortes no Brasil e reportagens sobre a covid-19.

Também conferiu o número de óbitos registrados em 2019 e os comparou com os de 2020, assim como faz a publicação falsa.

O que dizem os dados do Portal da Transparência do Registro Civil

Ao receber o alerta sobre a viralização do texto, o Comprova acessou o Portal da Transparência do Registro Civil para conferir os dados e verificar a autenticidade da plataforma. A ferramenta foi lançada em 2018 para disponibilizar o número de óbitos, nascimentos e casamentos registrados no país. Ela é abastecida diretamente pelos dados da Central de Informações do Registro Civil (CRC), estabelecida em 2015.

O Portal da Transparência elaborou uma página exclusiva com informações sobre a covid-19. Nela, estão disponíveis dados de óbitos com causa suspeita ou confirmada pelo novo coronavírus, insuficiências respiratórias e pneumonia, divididos por data da morte e do registro em cartório.

Os dados podem diferir um pouco dos apresentados pelo Ministério da Saúde por causa dos prazos legais estabelecidos por lei e normas do Poder Judiciário. A família do falecido tem até 24h para registrar o óbito em cartório. Este, por sua vez, deve efetuar o registro em até cinco dias e, dentro de oito dias, enviar o ato feito à Central Nacional de Informações do Registro Civil, que atualiza a plataforma.

A assessoria de comunicação da associação de cartórios disse que os grandes centros atualizam os dados “em tempo próximo do real”. Já municípios menores ou afastados podem demorar mais, mas prestam as informações dentro do prazo legal. Assim, a plataforma é atualizada “à medida que os dados são lançados no portal, inclusive de forma retroativa”. Os números presentes nesta verificação foram consultados às 14h50 de 5 de maio.

Insuficiência respiratória e pneumonia

O Comprova verificou os dados sobre mortes por insuficiência respiratória no período de 1º de janeiro a 21 de abril de 2019 e 2020. Segundo o texto falso compartilhado nas redes sociais, os óbitos registrados teriam sido “mais de 4.600” em 2019, enquanto o número no mesmo período deste ano seria de “cerca de 4.200”. Os número não são verdadeiros e, mesmo que fossem, significariam uma redução de 8,6%, e não de 9,5% como a falsa publicação afirma.

O Portal da Transparência registra 45.468 casos de insuficiência respiratória entre 1º de janeiro e 21 de abril de 2019 e 46.440 no mesmo período deste ano — aumento de 2,1%.

Os números de óbitos registrados com causa de pneumonia também estão errados no texto falso. Enquanto o texto compartilhado nas redes sociais inclui a enfermidade entre os óbitos computados dentro da categoria “insuficiência respiratória”, o Portal da Transparência classifica esta causa de morte de forma separada e aponta aumento de 0,7% no período de 1º de janeiro a 21 de abril de 2020 com relação ao mesmo período no ano passado (variação de 59.618 para 60.038).

Covid-19

O texto que viralizou nas redes sociais também traz dados equivocados sobre o número de mortes pela covid-19. Ele afirma que “o pior dia da pandemia” teria sido 20 de abril, quando teriam morrido “mais de 300” pessoas com a doença, ao passo que nos cartórios constaria o registro de apenas 21 mortes.

Os dados oficiais disponíveis no portal da covid-19 do Ministério da Saúde mostram que entre 19 e 21 de abril foram confirmadas 279 mortes. Já os dados do portal dos cartórios mostra que em 20 de abril foram 302 mortos confirmados ou com suspeita da covid-19 como causa. Enquanto os dados do Ministério da Saúde apontam óbitos com causa confirmada no período de 24 horas, os cartórios disponibilizam os números pela data da morte.

A corrente do Whatsapp segue com a falsa informação que os cartórios registraram “um único óbito como suspeito de covid-19” no Estado de São Paulo e acusa a imprensa de “alardear a existência de uma mortandade avassaladora no estado”. Na verdade, o portal dos cartórios mostra 102 mortes em São Paulo no mesmo dia.

Quanto a Manaus, o texto compartilhado nas redes sociais diz que “enquanto a televisão anunciava 136 sepultamentos somente em 21 de abril, os cartórios registraram apenas oito óbitos”. Este número aponta o total de sepultamentos, não apenas os confirmados ou com suspeita de covid-19. Consulta ao Portal da Transparência mostra que, na verdade, as mortes com suspeita ou confirmação de coronavírus foram 17. Caso se leve em consideração a data do registro das mortes, foram nove em 21 de abril.

Manaus é uma das cidades mais prejudicadas pela covid-19 no Brasil. O Amazonas foi o primeiro estado brasileiro a ter colapso no sistema de saúde. Atualmente, contabiliza 6.683 casos da covid-19, de acordo com o Ministério da Saúde.

Contexto

Os dados sobre as mortes de covid-19 tornaram-se alvo de desinformação para questionar a dimensão da pandemia e a real necessidade do fechamento do comércio e estabelecimentos e da restrição da circulação de pessoas.

Este tipo de dado sofre diferentes formas de ataques. O Projeto Comprova já verificou, por exemplo, que uma foto antiga foi tirada de contexto para dizer que governos estariam enterrando caixões vazios para aumentar o número de sepultamentos e instigar pânico na população. Outro boato acusava o governador da Bahia, Rui Costa (PT), de solicitar a prefeitos que mentissem com relação aos números.

Alcance

A corrente do Whatsapp chegou a ser repercutida pelo blog RVCHUDO nesse sábado, 2. O texto foi postado no Facebook e recebeu mais de 10 mil compartilhamentos e 172 mil visualizações.

Saúde

Investigado por: 2020-05-05

Áudio de médico é verdadeiro, mas opinião sobre origem do coronavírus não tem respaldo científico

  • Comprovado
  • Enganoso
Comprovado
O áudio foi realmente gravado por Roberto Zeballos
Enganoso
Ao comentar sobre tratamento para a covid-19, o médico afirma a outro profissional que o coronavírus “veio de um laboratório de Wuhan”, mas não há evidências disso e um estudo publicado pela Nature Medicine descarta a hipótese.

Áudio em circulação no WhatsApp traz afirmações duvidosas ditas pelo imunologista Roberto Zeballos e endereçadas a outro médico, Lucas Barbieri, sobre a origem do novo coronavírus. A conversa sobre as possibilidades de tratamento da covid-19 — doença causada pelo vírus — foi registrada na quarta-feira, 29 de abril, e viralizou pelo aplicativo. O Comprova confirmou a autenticidade do material com as duas fontes.

No início da gravação, Zeballos afirma que o novo coronavírus “veio de um laboratório ao lado de Wuhan” e que o governo da China estaria escondendo a informação. Segundo ele, uma pesquisadora chinesa estaria utilizando o vírus para estudos sobre inflamação pulmonar quando um “acidente” teria dado início à pandemia. As afirmações, no entanto, não apresentam respaldo científico.

Estudo publicado pelo periódico médico Nature Medicine, em 17 de março, concluiu que “claramente” o vírus SARS-CoV-2, que provoca a covid-19, “não é uma construção de laboratório ou um vírus propositalmente manipulado”. Segundo os pesquisadores, as características genéticas do novo coronavírus indicam que ele é fruto da seleção natural, ocorrida em um animal ou uma pessoa.

Em entrevista ao Comprova, Roberto Zeballos disse que o áudio é “opinião pessoal” e que a colocação é “irrelevante” porque não pode provar. Ele justifica o conteúdo pelas declarações recentes do virologista francês Luc Montaigner, vencedor do Prêmio Nobel de Medicina em 2008, e entende que é “muita coincidência” a localização do laboratório de Wuhan próxima ao epicentro da pandemia.

Por que checamos isto?

O Comprova recebeu diversos pedidos de leitores para verificação do áudio nos últimos dias, o que indica forte circulação do material no WhatsApp.

Chamou a atenção que o suposto autor do áudio era o médico Roberto Zeballos, cuja entrevista à Rede Record sobre tratamento de covid-19 com corticoides e antibióticos foi distorcida em boato que afirmava ter sido encontrada a “cura oficial” da doença ao longo do mês de abril.

Além disso, postagens falsas sobre a origem do novo coronavírus são comuns nas redes sociais, acompanhando embates entre líderes políticos mundiais e teorias infundadas de que a China teria “fabricado” o vírus por razões econômicas. Tais afirmações fragilizam a relação entre o Brasil e a China — principal parceiro comercial brasileiro. O Comprova já fez outras verificações sobre o mesmo assunto.

Comprovado, para o Projeto Comprova, faz referência a fatos verdadeiros, eventos confirmados, localização comprovada ou conteúdo original publicado sem edição. A etiqueta foi escolhida com base no último critério.

Enganoso, para o Comprova, é um conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Como verificamos?

O autor do áudio se apresenta como “doutor Zeballos”. A reportagem entrou em contato por telefone com o médico Roberto Zeballos, que havia sido fonte em verificação recente e confirmou a autoria. Ele também explicou o contexto da gravação, respondeu perguntas sobre o conteúdo e confirmou o nome do destinatário.

Com base no conteúdo do áudio, o Comprova pesquisou o nome do destinatário, Lucas Barbieri, no LinkedIn, e encontrou o perfil de um cirurgião cardiovascular com atuação em São Paulo. Ele foi contatado por e-mail e mensagens, bem como telefone da clínica, e confirmou o recebimento da mesma gravação na semana passada.

Por fim, o Comprova realizou a transcrição do áudio e verificou as afirmações com base em notícias, pesquisas e verificações feitas anteriormente acerca de boatos sobre a origem do novo coronavírus.

Do que se trata o áudio?

O autor do áudio que circula no WhatsApp é o médico Roberto Zeballos, que atua em consultório próprio, em São Paulo, e nos hospitais Vila Nova Star, Sírio-Libanês e Albert Einstein. Recentemente, Zeballos concedeu entrevista à Rede Record afirmando ter obtido resultados clínicos animadores com o tratamento de pacientes com covid-19. Uma cópia desse vídeo viralizou nas redes sociais e a ela foi agregada por um perfil no Facebook uma descrição falsa de que teria sido encontrada a “cura oficial” para a doença, boato que o Comprova desmentiu em abril.

De acordo com relato de Zeballos, confirmado pelo Comprova com o interlocutor da conversa, o áudio em circulação foi encaminhado ao cirurgião cardiologista Lucas Barbieri por intermédio de um paciente em comum, no dia 29 de abril. Barbieri atua nas instituições Beneficência Portuguesa de São Paulo, HCOR, Hospital Alemão Oswaldo Cruz e Hospital Santa Catarina (ACSC).

Zeballos afirma que a intenção era compartilhar com o colega experiências que estariam dando certo no tratamento de seus pacientes, enquanto aguarda a finalização de estudo, o que deve ocorrer apenas em junho. Segundo ele, a ideia era “ver se eles incluem o protocolo que a gente está fazendo”. Barbieri disse que contatos do tipo entre profissionais da saúde são comuns nessa pandemia, principalmente pelo fato de que a covid-19 é um desafio novo e os casos aumentam a cada dia. Ele não atua, porém, diretamente no atendimento a pacientes com a doença.

Conteúdo enganoso

Antes da descrição do tratamento que defende, Zeballos faz afirmações duvidosas no áudio sobre a origem do novo coronavírus. “Esse vírus veio lá da China, de um laboratório ao lado de Wuhan, onde tem uma chinesinha que pesquisava inflamação pulmonar com o vírus. O coronavírus era um vírus bom, porque ele infectava os animais, e ela estudava”, diz o médico. “Esse laboratório está a 200 metros de Wuhan, então houve um acidente […] Houve um acidente, saiu e espalhou.”

No entanto, não há respaldo científico de que o novo coronavírus seja artificial ou tenha sido fabricado. Pelo contrário: estudo publicado pelo conceituado periódico médico Nature Medicine, em 17 de março, analisou o genoma do vírus que provoca a covid-19 (SARS-CoV-2) e concluiu que “claramente não é uma construção de laboratório ou um vírus propositadamente manipulado”. Segundo os pesquisadores, as características genéticas do vírus, o sétimo coronavírus a infectar seres humanos, indicam que ele é fruto de seleção natural, ocorrida em um animal ou em uma pessoa.

Em 19 de fevereiro, 27 cientistas publicaram uma declaração de apoio aos profissionais da China contra a covid-19 no periódico The Lancet. O texto afirma, entre outros tópicos, que o trabalho estava sendo “ameaçado por rumores e desinformação” sobre a origem da pandemia e que o grupo “condena fortemente teorias da conspiração sugerindo que a covid-19 não tem origem natural”. Além do estudo do Nature Medicine, foram citadas outras oito pesquisas com conclusões semelhantes.

A hipótese de “acidente” no Instituto de Virologia de Wuhan também foi negada pela virologista Shi Zhengli, que lidera pesquisas sobre diferentes tipos de coronavírus a partir de amostras coletadas de morcegos desde 2003, quando a Ásia foi afetada pela epidemia de SARS. Em entrevista à revista Scientific American, ela disse que o laboratório verificou as sequências genéticas dos vírus circulando na China e nenhuma delas coincidiu com a dos vírus com que sua equipe trabalhava.

Pesquisadores ouvidos pela Vox ainda rejeitam a teoria de acidente em laboratório ao afirmar que as probabilidades de contaminação no meio selvagem são muito maiores. O ecologista de doenças Peter Daszak cita estudo de 2018 na província de Yunnan, na China, em que descobriu que 2,7% da população próxima a cavernas havia desenvolvido anticorpos. “Se você extrapolar para a população presente em todo o Sudeste Asiático, são 1 milhão a 7 milhões de pessoas por ano sendo infectadas por vírus de morcegos.”

Outro argumento é que não existe evidência de que os cientistas de Wuhan estariam trabalhando com o novo coronavírus — o mais próximo que estes descobriram, segundo estudos publicados, foi o vírus RaTG13, que compartilha 96% do genoma com o SARS-CoV-2. Porém, os pesquisadores entrevistados pela Vox afirmam que uma diferença de 4% é “enorme em termos evolutivos”.

Zeballos também cita no áudio uma declaração recente do virologista francês Luc Montaigner de que o vírus teria sido criado em meio ao desenvolvimento de vacina contra o HIV no local, versão contestada por outros especialistas e pelo diretor da unidade de virologia e imunologia do Instituto Pasteur, da França, Olivier Schwartz. Argumenta ainda que o fato de o novo coronavírus ser transmitido “em qualquer clima” seria um indício de artificialidade — o Comprova não encontrou referências ou estudos que embasem essa teoria.

No áudio, o médico também afirma que teria recomendado tratamento ao cardiologista Roberto Kalil Filho, do Hospital Sírio-Libanês. “Conversei com o Kalil ontem, ele me autorizou a falar que fui que falei para ele tomar o metilprednisolona que salvou ele”. Procurado pela reportagem, Zeballos negou a prescrição, disse que apenas conversou com o médico por mensagens, e que o tratamento foi decidido pelos médicos que o atendiam. Sobre a eficácia do medicamento, diz que é sua “impressão” e que “aguarda estudos”. Em entrevista ao jornal Folha de S. Paulo, publicada em 10 de abril, Kalil Filho declarou ter sido tratado com cloroquina, antibióticos, corticoides e anticoagulantes e que “não dá para saber o que fez mais efeito ou se foi o conjunto”.

Outro ponto confuso do áudio é o trecho em que o Hospital Israelita Albert Einstein é citado. Zeballos diz o seguinte: “[…] quem tiver menos resistência não aguenta ficar muito tempo no tubo. As pessoas jovens aguentam. Tanto que, no Einstein, a gente entubou mais de 40 pessoas. No Vila Nova, os meus casos não precisaram ser entubados”. A instituição questionou o número de pacientes atendidos e o médico justificou que, ao falar “a gente”, fazia referência à classe médica.

A nota do Hospital Israelita Albert Einstein, divulgada em 4 de maio, afirma que o protocolo mencionado no áudio para tratamento de pacientes com covid-19 “não é o utilizado pela organização, pois todas as diretrizes adotadas pelo Einstein baseiam-se em evidências científicas e não na experiência isolada de um médico” e que “o profissional (Zeballos) não cuidou de número expressivo de pacientes no hospital conforme comenta em seu áudio.”

Contexto

Boatos sobre a origem do novo coronavírus na China são comuns nas redes sociais. Recentemente, o Comprova mostrou que o Nobel de Medicina Tasuku Honjo nunca disse que o coronavírus é artificial e esclareceu que reportagem de TV italiana sobre vírus criado em laboratório chinês não tem relação com a covid-19, por exemplo.

As notícias falsas também refletem críticas e acusações de líderes políticos, como o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. Em 1º de maio, questionado por jornalistas se estava vendo algo que o deixasse altamente confiante de que a origem do vírus seria o Instituto de Virologia de Wuhan, Trump respondeu: “Sim, eu tenho”, sem detalhar o comentário. O presidente norte-americano disse ainda que a Organização Mundial da Saúde (OMS) “deveria se envergonhar por agir como agência de relações públicas da China”.

A suspeita emergiu com a revelação de observações de diplomatas dos Estados Unidos em 2018. De acordo com a coluna do jornalista Josh Rogin, do jornal The Washington Post, diplomatas alertaram há dois anos sobre a precariedade dos níveis de segurança de pesquisas com coronavírus de morcego realizadas no Instituto de Virologia de Wuhan. Órgãos de inteligência, no entanto, afirmaram na sexta-feira (30) que concordam “com o amplo consenso científico de que o vírus da covid-19 não foi feito pelo homem ou geneticamente modificado”.

Em 18 de março, o deputado federal Eduardo Bolsonaro, filho 03 do presidente Jair, causou tensão entre o Brasil e a China ao culpar o país asiático pela pandemia. No Twitter, a embaixada da China rebateu as acusações e disse que Eduardo fazia acusações irresponsáveis.

Apesar de as evidências apontarem para origem natural do vírus, cientistas ainda estão pesquisando de que forma ele entrou em contato, pela primeira vez, com humanos. Relatórios de autoridades de saúde chinesas e da Organização Mundial da Saúde (OMS) trabalhavam com a hipótese de que a doença se alastrou a partir de um mercado de frutos do mar da cidade de Wuhan. No entanto, estudo publicado no The Lancet em 24 de janeiro mostra que 13 dos 41 primeiros casos registrados não tinham relação com o mercado, enfraquecendo a tese. Especialistas ainda realizam pesquisas para descobrir se existiu algum hospedeiro intermediário.

Alcance

O Comprova recebeu de seus leitores diversas solicitações de verificação. O áudio tem sido compartilhado pelo WhatsApp e também foi encontrado em perfis no Twitter.