O Projeto Comprova é uma iniciativa colaborativa e sem fins lucrativos liderada pela Abraji e que reúne jornalistas de 42 veículos de comunicação brasileiros para descobrir, investigar e desmascarar conteúdos suspeitos sobre políticas públicas, eleições, saúde e mudanças climáticas que foram compartilhados nas redes sociais ou por aplicativos de mensagens.Filtro:
É falso que o diretor-geral da Polícia Federal (PF), Paulo Maiurino, tenha denunciado no Twitter um conluio entre ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para assassinar o atual presidente Jair Bolsonaro (sem partido). Propagado em live pela jornalista Leda Nagle, o boato foi desmentido pela PF em abril deste ano e a própria jornalista também se desculpou em vídeo, admitindo o erro. Um perfil falso havia sido usado para fazer a divulgação usando o nome do delegado.
Conteúdo verificado: Vídeo no TikTok mostra a jornalista Leda Nagle lendo um tuíte falsamente atribuído ao diretor-geral da Polícia Federal, Paulo Maiurino, sobre um suposto esquema entre o STF e o ex-presidente Lula para matar Bolsonaro. Material originalmente divulgado em abril, voltou a viralizar neste mês.
É falso que o diretor-geral da Polícia Federal (PF), Paulo Maiurino, tenha denunciado no Twitter um conluio entre ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para assassinar o atual presidente Jair Bolsonaro (sem partido).
No boato propagado em live pela jornalista Leda Nagle, são quase dois minutos de vídeo em que ela lê o falso tuíte. Na mensagem, o perfil promete descrever com mais detalhes o plano para matar o presidente da República.
Apesar de não ser recente, o vídeo voltou a ser compartilhado no TikTok, com mais de 80 mil visualizações. A conta de Twitter que apresentava a suposta denúncia não é de Maiurino.
Polícia Federal, STF e Lula se manifestaram mais uma vez sobre o caso, negando o conteúdo. A reportagem do Comprova tentou contato com Leda Nagle, mas não obteve resposta. A conta @adamilsonkorban no TikTok também não respondeu às perguntas enviadas no espaço para troca de mensagens.
O Comprova considerou o conteúdo falso porque ele foi inventado e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira. A equipe tentou falar com o perfil que publicou o vídeo, mas não obteve resposta até a publicação deste texto.
Como verificamos?
O Comprova fez uma busca avançada pela conta do delegado Paulo Gustavo Maiurino no Twitter associada ao nome de Lula, de Bolsonaro e também ao STF. E não há resultado relacionado a nenhum dos três. Essa consulta foi motivada pelo fato de que, embora a verificação seja de uma publicação no TikTok, o conteúdo fazia referência a uma suposta postagem do policial no Twitter.
Ao fazer uma pesquisa convencional com o nome do delegado, no entanto, apareceram vários compartilhamentos do conteúdo suspeito e ainda outras verificações sobre o assunto, como a da Boatos.org, que o classifica como falso.
O Comprova entrou em contato com o Departamento de Polícia Federal (DPF) para questionar sobre a veracidade das informações imputadas ao chefe da instituição.
Além disso, procurou pelas redes sociais a jornalista Leda Nagle, que aparece no vídeo lendo o texto atribuído a Maiurino, e ainda pela seção “contato”, disponibilizada em seu site para interação com seguidores.
Também foram consultados Lula e o STF, mencionados na publicação, bem como o Twitter, que foi questionado sobre a conta atribuída ao delegado federal, mas não deu um retorno conclusivo. O autor da publicação (@adamilsonkorban) foi procurado por meio de sua conta no TikTok, mas, até a publicação deste texto, não se manifestou.
Verificação
O vídeo
Leda Nagle aparece no vídeo recém-divulgado no TikTok fazendo a leitura de um tuíte no Clube da Notícia, um quadro do seu canal no YouTube em que repercute assuntos do dia. A live é do dia 17 de abril deste ano e atribui ao delegado federal Paulo Maiurino o conteúdo sobre uma suposta armação para matar Bolsonaro.
Em um dos trechos, mostrando a fachada do Supremo, o perfil falso diz que partiu dali, em conjunto com Lula e outros, a ideia do atentado contra o presidente. Dois dias depois, em nota, Leda Nagle pede desculpas pelo erro.
“Algum membro do grupo, por má-fé, ou porque ficou impactado pela notícia, pinçou um trecho de 2 minutos de uma live de 47 minutos e viralizou antes mesmo que eu tivesse voltado com a checagem completa da informação, até porque não tem live no domingo e isto só aconteceria às 20 horas de hoje na live aberta de toda segunda-feira. Lamento o ocorrido”, escreveu a jornalista. Novamente procurada sobre o caso, Leda Nagle não se manifestou.
O vídeo, porém, voltou a viralizar no TikTok há poucos dias, após ter sido publicado pelo perfil @adamilsonkorban. A postagem é acompanhada de hashtags como “#bolsomito”, “#bolsonarotemrazao” e “#fechadocombolsonaro”. As demais publicações do dono da conta sugerem que ele é apoiador de Bolsonaro, pois são reproduções de falas do presidente, de aliados ou de influenciadores bolsonaristas.
Conta verificada
A Polícia Federal desmentiu, em nota enviada ao Projeto Comprova, todo o teor da denúncia lida por Leda, ressaltando que o boato já havia sido refutado em abril. A conta correta que Paulo Maiurino mantém no Twitter é @PMaiurino e tem o selo de verificação da rede social.
Segundo o Twitter, o selo “informa às pessoas que uma conta de interesse público é autêntica”. A rede social também esclarece que, para receber a verificação, o perfil deve ser autêntico, notável e ativo. O perfil @d_delegado não continha a marca.
Com o auxílio do Wayback Machine, a reportagem da Lupa verificou uma série de tuítes do perfil @d_delegado, que vão de “curtidas” em tuítes de Jair Bolsonaro e do vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ) a ofensas contra petistas. Chegam até mesmo a uma tentativa de golpe em apoiadores do presidente. O Comprova confirmou a existência dos posts a partir da mesma ferramenta.
“Preciso de parceiros que possam ajudar financeiramente a entrega de mais de 2,5 mil cestas básicas, as cestas já temos precisamos da doação financeira para podermos pagar o transporte, será entregue em 6 estados para mais de 1,5 mil famílias, se você puder ajudar me chame no privado!”, escreve o perfil fraudulento.
A Polícia Federal é uma instituição de estado, e não de governo. Isto é, embora seja do presidente da República a prerrogativa de nomear o diretor-geral da instituição, os policiais federais têm autonomia para executar quaisquer investigações, inclusive contra membros do governo federal. O Ministério da Justiça está diretamente acima da Polícia Federal na cadeia de comando, mas não tem poder para interferir na atuação da instituição, de modo a cessar ou estimular investigações.
Dessa forma, falas a favor de um governante de turno (“vocês querendo ou não, eu sou a favor do @jairbolsonaro”) ou contrárias a políticos, ou organizações partidárias (“petistas vagabundos”) soam suspeitas, vez que os gestos maculam a credibilidade de agentes federais que podem, eventualmente, conduzir investigações contra os alvos destes comentários.
O que dizem STF e Lula
Em abril passado, o STF publicou um texto no site oficial para alertar sobre o conteúdo falso relacionando a instituição à suposta armação para matar Bolsonaro. Em um dos trechos, ressaltava “a importância da checagem de informações suspeitas, como forma de evitar a propagação de fake news com o nome de autoridades e membros da Suprema Corte”. Questionado sobre o assunto pelo Comprova, o STF compartilhou o link do mesmo alerta para responder à nova viralização do conteúdo falso.
O ex-presidente Lula também foi procurado e, segundo reforçou a assessoria, a própria jornalista Leda Nagle já pediu desculpas por divulgar o boato.
“Infelizmente, grupos bolsonaristas têm usado fake news com fins políticos contra a democracia, o combate à covid-19 e o povo brasileiro. As autoridades e as plataformas de redes sociais ainda não têm conseguido impedir que grupos de profissionais de fake news atuem na política”, acrescentou, em nota.
Atentado contra Bolsonaro
Durante a campanha presidencial, em 6 de setembro de 2018, Bolsonaro sofreu um atentado em Juiz de Fora, Minas Gerais. Ele levou uma facada no abdômen, golpe desferido por Adélio Bispo de Oliveira – diagnosticado, posteriormente, com uma doença mental e, portanto, inimputável.
Após o crime, várias teorias conspiratórias passaram a circular nas redes sociais, e alimentadas pelo próprio presidente Bolsonaro, de que o atentado teria o envolvimento de opositores. Adélio Bispo já havia sido filiado ao PSOL, mas tinha deixado o partido quatro anos antes do ataque. Na ocasião, Juliano Medeiros, presidente nacional do PSOL, afirmou que o partido não deveria responder pelo ex-filiado, mas repudiou o ato. Em nota, declarou se tratar de “um grave atentado à normalidade democrática e ao processo eleitoral.”
Na resposta da Polícia Federal sobre o post atribuído a Paulo Maiurino, a instituição faz referência ao atentado sofrido por Bolsonaro no período de campanha eleitoral. “Sobre as investigações relativas ao atentado ao então candidato à Presidência, foram abertos dois inquéritos, os quais foram concluídos e encaminhados à Justiça.” Nos dois documentos, a conclusão da polícia foi que Adélio Bispo agiu sozinho.
Por que investigamos?
Em sua quarta fase, o Comprova checa conteúdos suspeitos sobre governo federal, pandemia e eleições que tenham atingido alto grau de viralização. O vídeo aqui verificado teve mais de 80 mil visualizações e 6,5 mil curtidas.
Neste conteúdo estão citados dois prováveis candidatos à Presidência da República nas eleições de 2022 – Jair Bolsonaro e Lula –, criando uma situação falsa de enfrentamento fora das disputas democráticas do sistema eleitoral. Além disso, lança suspeita sobre o STF, órgão que tem sido constantemente atacado por grupos bolsonaristas e pelo próprio presidente.
Falso, para o Comprova, é conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.
Para deslegitimar a estratégia de lockdown, um tuíte do deputado federal Osmar Terra engana ao comparar o desempenho da Suécia, em termos de mortalidade por covid-19, com sete países escolhidos a dedo e “outros” que adotaram a medida.
Conteúdo verificado: Um tuíte de Osmar Terra (MDB-RS) afirmando que a Suécia, depois de um ano e meio “sem fazer lockdown”, tem mortalidade por covid-19 mais baixa que Reino Unido, França, Portugal, Espanha, Itália, Bélgica, Estados Unidos e outros países “que fizeram lockdown repetidas vezes”.
É enganoso o tuíte em que o deputado federal Osmar Terra (MDB-RS) compara as taxas de mortalidade da Suécia com outros sete países “que fizeram lockdown repetidas vezes”, de modo a sugerir que a estratégia liberal do primeiro seria eficiente para conter a pandemia e alegar que o bloqueio não ajuda a reduzir o contágio.
Dados mostram que a Suécia tem o maior número de mortes por covid-19 a cada 100 mil habitantes entre os países escandinavos (Noruega, Finlândia, Dinamarca e Islândia), que adotaram medidas mais rígidas desde o início, e apresenta uma taxa de mortalidade que é mais do que o dobro da média mundial. Pela mesma lógica utilizada no post, outros países que adotaram o lockdown, como China e Nova Zelândia, apresentam taxas muito mais baixas.
Além disso, a postagem do ex-ministro da Cidadania do governo de Jair Bolsonaro ignora o fato de que alguns dos países citados mudaram de abordagem durante a pandemia, a exemplo do Reino Unido, e que as medidas de confinamento são impostas e flexibilizadas em diferentes momentos. Estudos que estimam o impacto das políticas públicas em diferentes países levam em conta essas variáveis.
Embora não tenha aplicado o lockdown e tenha agido de forma menos restritiva que outros países da Europa, a Suécia chegou a adotar medidas de prevenção e incentivou o distanciamento entre a população. Em março de 2021, o país restringiu o número de pessoas em lojas e academias, assim como o horário de fechamento de bares e restaurantes, que deveria ser até as 20h30.
A postagem de Osmar Terra foi classificada como enganosa nesta checagem porque usa dados imprecisos e confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano. O deputado foi procurado pelo Comprova, mas não respondeu aos questionamentos.
Como verificamos?
O Comprova buscou informações sobre a prática de lockdown e a evolução da pandemia em reportagens jornalísticas e nos sites oficiais do governo sueco. O mesmo ocorreu em relação aos outros países citados no tuíte.
As taxas de mortalidade por covid-19 foram analisadas por meio de duas plataformas: o Our World In Data, mantido por pesquisadores da Universidade de Oxford, e o Coronavirus Resource Center, base de dados da Universidade Johns Hopkins.
Além disso, a reportagem conversou com o epidemiologista, professor da Escola Superior de Educação Física da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) e coordenador do Epicovid-19, o maior estudo epidemiológico sobre coronavírus no Brasil, Pedro Hallal.
Autor da postagem enganosa, o deputado federal Osmar Terra foi procurado por meio de um assessor de imprensa. A reportagem perguntou qual foi o critério de escolha dos países que aparecem no tuíte e relatou o fato de que a Suécia apresenta taxas de mortalidade mais altas que os países vizinhos e a média mundial. Não houve resposta até a publicação desta checagem.
O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 24 de agosto de 2021.
Verificação
Taxas de mortalidade
A taxa de mortalidade da Suécia é realmente menor que a dos sete países mencionados pelo deputado em seu tuíte. Esse fato, no entanto, não quer dizer que o desempenho do país seja satisfatório ou que o lockdown não funcione para reduzir o número de mortes pelo novo coronavírus.
De acordo com o Coronavirus Resource Center da Universidade Johns Hopkins, dos Estados Unidos, a Suécia era o 38º país com mais óbitos por habitante nesta segunda-feira, 23 de agosto, de um total de 182 países e territórios. A taxa de mortalidade era de 142,61 a cada 100 mil pessoas.
Esse número de fato está abaixo de Bélgica (220,48), Itália (213,53), Reino Unido (197,44), Estados Unidos (191,48), Espanha (176,60), Portugal (171,76) e França (169,21), como pode ser visto na tabela abaixo. Apesar de não ter sido citado, o Brasil aparece em quinto, com 272,22 mortes por 100 mil habitantes.
Porém, a situação é desfavorável para a Suécia quando a comparação é feita com os seus vizinhos da Escandinávia e com a média do planeta, como aponta o epidemiologista da UFPel Pedro Hallal. Ele sustenta que o caso da Suécia não deve servir de exemplo para ninguém.
Em artigo publicado no jornal Folha de S.Paulo em julho deste ano, Hallal já alertava para o fato de a Suécia ter o pior desempenho no combate à pandemia entre cinco países escandinavos, que incluem Dinamarca, Noruega, Finlândia e Islândia. O cenário é o mesmo até hoje.
Ao Comprova, Hallal criticou a comparação feita pelo deputado. De acordo com ele, a Suécia “é um país historicamente muito melhor do que a média mundial, em tudo, e deveria ter resultados parecidos com seus parceiros da região”, mas não é o que acontece.
Na realidade, a taxa de mortalidade por covid-19 do país (1.452 por milhão de habitantes) é mais que o dobro da média do planeta (567), como mostra uma consulta ao Our World In Data, plataforma mantida por pesquisadores da Universidade de Oxford. Os demais — Dinamarca (443), Noruega (149), Finlândia (160) e Islândia (87) — estão todos abaixo dessa média.
A reportagem questionou Hallal se faz sentido separar os países em dois grupos — os que fizeram e os que não fizeram lockdown em algum momento — e comparar as taxas de mortalidade para avaliar a política, considerando ainda o dinamismo da pandemia. Um exemplo é o Reino Unido, que apostou em uma estratégia mais flexível no começo de 2020 e depois mudou de ideia diante de previsões catastróficas e do contágio em alta, passando a adotar medidas mais restritivas.
De acordo com Pedro Hallal, “qualquer cientista que interprete os dados leva isso em consideração” e que ignorar esse tipo de questão constitui “erro primário”. Hallal alertou ainda que, da mesma forma, é preciso considerar que a Suécia promoveu restrições e orientou algumas práticas para diminuir a propagação do vírus ao longo do período.
Dois exemplos de estudos científicos nesse sentido foram publicados pela revista Nature Human Behaviour, em novembro de 2020, e pela revista Science, em fevereiro deste ano. Ambos aplicam métodos estatísticos para analisar as intervenções e interpretam os dados conforme o período específico em que as ações são aplicadas pelos governos. Outra diferença é que o impacto é medido a partir da taxa de transmissão do coronavírus, ou o “ritmo de contágio”, representado pelo termo Rt, e não pela mortalidade.
Seguindo o mesmo critério de Osmar Terra, é fácil elaborar uma comparação em que a Suécia tenha um desempenho mais de 200 vezes pior que outros países que fizeram “lockdown repetidas vezes”. A China, por exemplo, tem uma taxa de mortalidade de 0,35 a cada 100 mil habitantes, e a Nova Zelândia, de 0,53.
O site GZH informou neste mês que o epidemiologista Pedro Hallal cogita concorrer ao Senado no ano que vem. “Ainda estou analisando, mas se concorrer será por algum partido de esquerda ou de centro-esquerda, para contrapor as candidaturas de direita que estão postas”. Ele não está filiado a nenhum partido político no momento, de acordo com o sistema oficial do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Sem lockdown
Até agora, a Suécia não fez lockdown, que é o bloqueio total de uma região. Embora não tenha uma definição única, o lockdown é, na prática, a medida mais radical imposta por governos para que haja distanciamento social e inclui o fechamento de vias e proibição de deslocamentos e viagens não essenciais. Evidências científicas mostram que a adoção de lockdown funciona contra a covid-19. Ele é diferente do isolamento social, que é, em princípio, uma sugestão preventiva para que as pessoas fiquem em casa.
Os países vizinhos da Escandinávia também foram ágeis em aplicar restrições e conter o alastramento do vírus. Dinamarca e Noruega estiveram entre os primeiros países da Europa a promoverem confinamentos, ainda em março de 2020, que se repetiram em outras ondas de contaminação. A Finlândia e a Islândia, da mesma forma, fecharam restaurantes e outros estabelecimentos. Essas medidas vieram acompanhadas de outras estratégias de mitigação, como ampla testagem, rastreamento de contatos e isolamento de casos ativos.
Desde o início da pandemia de coronavírus, os suecos se tornaram um estudo de caso, renunciando a bloqueios e mandatos. Checagem do PolitiFact, de 6 de agosto de 2021, esclarece que, em contraste com alguns de seus vizinhos e os EUA, a sociedade sueca permaneceu amplamente aberta durante a pandemia, e o governo respondeu principalmente com orientações, não ordens de permanência em casa e quarentenas. Em geral, as máscaras também não foram recomendadas.
Reportagem da The New Yorker, de abril deste ano, traz o cenário do país ao longo da pandemia: “enquanto bloqueios, toques de recolher e proibições de viagens estavam sendo implementados no resto do mundo, restaurantes, lojas, bares, museus, creches e escolas primárias na Suécia permaneceram abertos. As pessoas foram incentivadas a trabalhar em casa e a reduzir as viagens, mas ambas eram opcionais. Máscaras não eram recomendadas e permaneceram raras”.
A pessoa por trás da resposta ao coronavírus da Suécia é Anders Tegnell, o epidemiologista chefe do país. A New Yorker destaca que a constituição sueca dá às agências governamentais uma independência extraordinária, então Tegnell e a agência de saúde pública lideraram grande parte da resposta ao coronavírus e, constitucionalmente, o governo tem pouco poder para impor restrições. Segundo a revista, Tegnell “costuma dizer que os bloqueios não são apoiados pela ciência e que as evidências do uso de máscaras são fracas”.
Em uma entrevista à revista científica Nature, publicada em abril de 2020, Tegnell detalhou a estratégia adotada pelo país: “Como sociedade, estamos mais focados em ‘dar um incentivo’, continuamente lembrando as pessoas de colocar em prática as medidas [contra covid-19], e melhorando-as onde vemos no dia a dia que elas precisam ser ajustadas. Não precisamos fechar tudo completamente porque seria contraproducente”, afirmou.
Tegnell introduziu a abordagem “light” do país à pandemia em março do ano passado, à medida que os casos aumentavam. Lena Hallengren, ministra da pasta de Health and Social Affairs (Saúde e Assuntos Sociais), deu uma entrevista à emissora Al Jazeera English, em 1 de agosto de 2020, e, quando perguntada sobre essa abordagem e a diferença com outros países que adotaram o lockdown, disse que:
“A estratégia vem sendo garantir que nós podemos prevenir o vírus de se espalhar na sociedade, proteger grupos vulneráveis, mas também garantir que a nossa sociedade está funcionando, porque todo o tempo nós precisamos de pessoas para trabalhar nos hospitais, precisamos de pessoas para trabalhar nas casas de repouso, nas farmácias, nas ambulâncias [..] Nós não achamos possível que todo mundo fique em casa por meses”.
Dessa forma, a estratégia do país para conter a disseminação do vírus tem como base a “responsabilidade individual” de seus cidadãos. “As leis suecas sobre doenças transmissíveis baseiam-se principalmente em medidas voluntárias – na responsabilidade individual. Afirma claramente que o cidadão tem a responsabilidade de não espalhar uma doença. Este é o centro de onde partimos, porque não há muita possibilidade legal de fechar cidades na Suécia usando as leis atuais. A quarentena pode ser contemplada para pessoas ou pequenas áreas, como uma escola ou um hotel. Mas [legalmente] não podemos bloquear uma área geográfica”, afirmou Tegnell, em abril do ano passado.
Isso pode ser notado na página da agência de saúde do país, onde não há citações a lockdowns. Na aba “diretrizes e recomendações para reduzir a disseminação de COVID-19”, há a indicação de medidas que cada cidadão pode tomar por conta própria: “todos têm a responsabilidade pessoal de prevenir a propagação da infecção. Você deve pensar em como pode evitar ser infectado, como deve manter distância e como pode evitar infectar outras pessoas. Mostre consideração, especialmente para as pessoas que pertencem a grupos de risco. Você deve manter distância de outras pessoas e evitar lugares lotados. Isso é especialmente importante quando você passa um longo período com alguém e quando você está dentro de casa”.
Críticas à estratégia da Suécia
Em junho do ano passado, diante de críticas crescentes sobre a posição da Suécia no combate à pandemia, Tegnell admitiu que o país deveria ter adotado medidas mais contundentes de isolamento social para conter a pandemia e que uma abordagem mais dura poderia ter evitado o alto número de mortes registrado no país.
A abordagem adotada pelo país europeu foi criticada por integrantes da comunidade científica. Em abril de 2020, em um artigo publicado no jornal sueco Dagens Nyheter, 22 pesquisadores afirmaram que as autoridades públicas de saúde haviam falhado no combate à pandemia e que os políticos deveriam interferir.
Matéria da Time, de outubro do ano passado, traz como título “a resposta sueca à covid-19 é um desastre. Não deveria ser um modelo para o resto do mundo”. A reportagem destaca que “os países que fecharam as portas precocemente e / ou usaram testes e rastreamento extensivos – incluindo Dinamarca, Finlândia, Noruega, Coreia do Sul, Japão, Taiwan, Vietnã e Nova Zelândia – salvaram vidas e limitaram os danos às suas economias. Países que bloquearam tarde, saíram do bloqueio muito cedo, não testaram e colocaram em quarentena de forma eficaz ou apenas usaram um bloqueio parcial – incluindo Brasil, México, Holanda, Peru, Espanha, Suécia, EUA e o Reino Unido – têm piorado quase que uniformemente nas taxas de infecção e morte”.
Artigo publicado na revista científica The Lancet destaca que “desde o início da pandemia, a Agência de Saúde Pública da Suécia, Folkhälsomyndigheten (FHM), embarcou em uma abordagem de imunidade de rebanho, permitindo que a transmissão da comunidade ocorresse relativamente sem controle” e que “muitas vozes críticas foram levantadas sobre a resposta nacional da Suécia à covid-19 e seu fracasso em atingir seus objetivos de nivelar e encurtar as curvas de casos, hospitalizações e mortes”.
Em entrevista à AFP, Julival Ribeiro, infectologista consultor da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI) e diretor- geral do Hospital de Base do Distrito Federal disse que “[É possível concluir] que a estratégia [escolhida pela Suécia, de não implementar medidas mais rígidas] não foi a estratégia correta. E, além disso, a Suécia é um país pequeno e você pode até ter mais controle. [Mas] imagine países com milhões de pessoas. (…) Naquela época em que a Suécia adotou essas medidas nós sabíamos pouco em relação à covid-19. Mas o mundo mostrou que o caminho para combater essa pandemia é aliar vacina, medidas restritivas e medidas preventivas”.
Em dezembro, os casos e hospitalizações eram mais altos do que desde os primeiros dias da pandemia no país. As unidades de terapia intensiva em Estocolmo e Malmö, a terceira maior cidade sueca, estavam lotadas. “Era exatamente esse desenvolvimento que não queríamos ver”, disse Björn Eriksson, diretor de saúde e cuidados médicos de Estocolmo, durante uma coletiva de imprensa. A confiança na agência de saúde pública havia caído de 68% em outubro para 52% em dezembro.
Um relatório também apontou que a Suécia fracassou em proteger idosos contra a covid-19. A estratégia adotada pela Suécia foi chamada de “imprudente e cruel”. Hallengren, em entrevista à Al Jazeera English, afirmou que “não temos nenhuma prova de que se tivéssemos lockdown teríamos prevenido isso de acontecer”.
Reportagem da BBC de dezembro mostra que a Suécia sofria com uma pandemia fora de controle, UTIs lotadas e debandada de profissionais de saúde. O aumento exponencial no número de casos fez com que o governo sueco mudasse sua estratégia em novembro, introduzindo restrições mais duras às interações sociais. Foram proibidas reuniões de mais de oito pessoas em shows, palestras e apresentações teatrais. Houve também um veto nacional à venda de álcool a partir das 22h em bares e restaurantes. Em raro pronunciamento, até o rei sueco, Carl XVI Gustaf, criticou a estratégia adotada pelo país no combate à pandemia covid-19. “O povo sueco sofreu enormemente em condições difíceis”, disse o monarca à emissora estatal SVT. “Acho que falhamos.”
No dia 18 de dezembro, como os hospitais já estavam preparados para uma onda pós-Natal, Tegnell e a agência de saúde pública finalmente recomendaram o uso de máscaras, mas apenas no transporte público e durante a hora do rush.
Em 8 de janeiro, a Suécia mudou sua legislação para conceder temporariamente ao governo o poder de adotar medidas de restrição contra a covid-19 em áreas determinadas e aplicar sanções e multas caso elas sejam violadas, mas não estabeleceu que a população fique confinada em casa. Entre as medidas permitidas estavam fechar lojas, centros comerciais e o transporte público e limitar o número de pessoas em reuniões em locais públicos específicos.
Dessa forma, embora a Suécia tenha optado por não fechar as portas no início da pandemia, com bares, restaurantes e lojas permanecendo abertos, restrições foram impostas depois.
Em março de 2021, o país restringiu o número de pessoas em lojas e academias, assim como o horário de fechamento de bares e restaurantes, que deveria ser até as 20h30. Porém, em julho, o governo flexibilizou as medidas. Uma publicação do Ministério da Saúde e Assuntos Sociais da Suécia, de 26 de julho, traz uma lista de restrições que foram suavizadas no dia 15 do mesmo mês, incluindo o aumento da capacidade do transporte público e o fim da proibição de acesso a determinados espaços.
Apesar das críticas e das mudanças impostas, de modo geral, a estratégia do país permaneceu intacta. A Suécia fechou suas fronteiras internacionais, incluindo as da vizinha Noruega, e permitiu que a sociedade interna permanecesse aberta. Embora haja limites para o número máximo de pessoas em reuniões sociais, são na forma de “recomendações”, em vez de leis rígidas aplicáveis por meio de multas.
Uma investigação de um professor da Swedish Defence University, publicada em junho deste ano, mostra que a avaliação de risco da agência de saúde sueca, a PHAS (Public Health Agency of Sweden), em relação à propagação geral do coronavírus no país era excessivamente otimista até 10 de março de 2020, sendo consideravelmente mais positiva do que as avaliações de risco globais da OMS (Organização Mundial da Saúde) e outros prognósticos de especialistas para Suécia.
Além disso, “havia uma recusa contínua da agência em mudar sua posição sobre as máscaras faciais ou recomendar seu uso em locais confinados e lotados para o público. Isso ocorreu apesar das evidências crescentes a favor desse equipamento de proteção. Como tal, a política de máscaras do PHAS divergia da postura da OMS, ECDC (European Centre for Disease Prevention and Control) e de outros grandes estudos científicos nesta área”.
A conclusão do estudo é que “no geral, essas descobertas podem explicar, pelo menos em parte, por que a pandemia teve um impacto tão adverso na Suécia, em comparação com muitos outros países desenvolvidos até agora”.
Segundo o portal Our World In Data, após o pico de novos casos na Suécia entre dezembro e janeiro, que chegou a 32.485 diagnósticos positivos registrados em um único dia, houve uma queda contínua até fevereiro, seguido de um novo período de alta. A partir do mês de abril, com o avanço da vacinação, o número de casos ativos e de mortes pela doença despencou.
Atualmente, 51% da população sueca está totalmente vacinada e 67% receberam ao menos a primeira dose. O país acumula 1,12 milhões de casos e 14.688 mortes desde o início da pandemia.
Quem é o autor?
Osmar Terra (MDB) exerce o sexto mandato na Câmara dos Deputados, representando o Rio Grande do Sul. Em 2016, foi Ministro do Desenvolvimento Social no governo de Michel Temer (MDB) e ocupou a pasta da Cidadania já na gestão de Jair Bolsonaro, em 2019.
O deputado federal é formado em medicina e foi presidente do Grupo Hospitalar Conceição entre 1986 e 1989. Também ocupou o cargo de secretário da Saúde do Rio Grande do Sul de 2003 a 2010, nas gestões de Germano Rigotto (MDB) e Yeda Crusius (PSDB).
Durante o depoimento à CPI, em junho deste ano, Osmar Terra chegou a mencionar a Suécia como uma espécie de “case de sucesso” no controle da pandemia. Ele foi contestado pelos senadores e posteriormente teve frases desmentidas por agências de checagem.
Em sua quarta fase, o Comprova verifica conteúdos suspeitos sobre pandemia, políticas públicas do governo federal e eleições que viralizam nas redes. O post verificado aqui teve mais de 6,5 mil interações no Twitter em menos de uma semana.
O post é danoso ao insinuar que a estratégia do lockdown, adotada pela maioria dos países para combater a pandemia, é ineficiente.
Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.
É falso que dados da Pfizer revelem que 80% das crianças vacinadas desenvolvem efeitos adversos, como afirma uma publicação em um site. A farmacêutica não tem nenhum estudo sobre vacinação em crianças concluído e, até o momento, afirma, assim como órgãos como o Centro de Controle de Doenças (CDC) dos Estados Unidos e a Anvisa, que os benefícios da imunização superam os riscos.
Conteúdo verificado: Texto em site afirma que vacinas das Pfizer produzem “efeitos adversos” em 80% das crianças e indica que a vacinação seria pior do que a covid-19.
É falsa a publicação no site antivacina Coletividade Evolutiva segundo a qual dados da farmacêutica Pfizer teriam mostrado que “80% das crianças vacinadas desenvolvem efeitos adversos”.
Um dos links do conteúdo falso leva a uma página em alemão, de onde o texto em português foi traduzido. Na versão estrangeira há um link para um documento da Food and Drug Administration (FDA), agência regulatória dos Estados Unidos, citado como fonte dos tais dados, mas ele é apenas uma ficha técnica para profissionais de saúde que aplicam vacinas. Neste relatório, há informações sobre reações adversas em públicos de idades diferentes, mas em nenhum momento cita os tais 80% de casos de crianças vacinadas que teriam desenvolvido efeitos adversos.
A Pfizer afirmou à reportagem que, em junho, anunciou o início do teste da vacina em um grupo de crianças com menos de 12 anos, mas ainda não há resultados disponíveis.
O Comprova considerou o conteúdo falso porque ele foi inventado e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira. A reportagem tentou falar com o site que publicou o material, mas não obteve resposta até a publicação deste texto.
Como verificamos?
O primeiro passo foi verificar para onde levavam os links incluídos no post verificado. O primeiro deles, logo no início do texto, sugeria que o leitor seria levado diretamente a um suposto relatório da Pfizer, de 37 páginas, onde constavam informações sobre reações adversas em 80% das crianças vacinadas.
O link, contudo, levava a um site austríaco, com texto escrito em alemão. Usando a ferramenta de tradução do Google, a reportagem percebeu que o conteúdo era similar, embora maior. Este, sim, fornecia um link direto ao suposto relatório que, na verdade, era uma ficha técnica destinada a profissionais responsáveis por aplicar as vacinas, disponibilizado pela FDA, mas sem os dados destacados por nenhum dos dois textos.
Foram realizadas pesquisas sobre a imunização de crianças e adolescentes no site da Pfizer e nas páginas de autoridades de saúde como CDC, FDA e Anvisa.
A reportagem contatou, por e-mail, a Pfizer, que respondeu com um comunicado. Também tentou falar com o Coletividade Evolutiva via e-mail e preenchendo o formulário de contato no site, mas não obteve retorno até a publicação deste texto.
O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 20 de agosto de 2021.
Verificação
Pfizer em crianças
Segundo comunicado da farmacêutica enviado ao Comprova, ainda não há dados disponíveis sobre resultados da vacinação de crianças menores de 12 anos. Em junho, a empresa anunciou o início dos testes nesse grupo, mas não informou quando os resultados devem ser publicados.
“A fase 2/3 do ensaio contará com até 4,5 mil participantes com 11 anos ou menos nos Estados Unidos, Polônia e Espanha em mais de 90 locais de ensaios clínicos”, informa o documento.
Sobre o relatório
Citado como fonte dos dados do texto verificado aqui, o relatório da FDA é verdadeiro, mas não contém as informações alegadas pelo texto original e pela tradução publicada no Brasil. No documento, de 39 páginas, há informações sobre reações adversas em públicos de idades diferentes, mas também como acondicionar, diluir e aplicar uma dose da vacina.
A postagem aqui verificada afirma que 80% das crianças que receberam a vacina da Pfizer tiveram efeitos adversos e que pelo menos 80% podem esperar reações adversas “traumáticas”. O documento não traz este percentual, nem o de 79%, mencionado no texto original do site austríaco. Também não há qualquer menção a reações “traumáticas” ou a um relatório publicado pela Pfizer no dia 19 de maio.
Segundo o documento, que teve a última atualização no site em 12 de agosto de 2021, a reação adversa que atingiu o maior percentual de pessoas vacinadas pela Pfizer com idades entre 12 e 15 anos foi dor no local da injeção (86,2% após a primeira dose).
Nesta mesma faixa de idade, os eventos adversos considerados graves se manifestaram em 0,4% dos que receberam a vacina, após a segunda dose. No grupo placebo da mesma idade, essas reações ocorreram em 0,1% dos participantes. Dos 2.260 adolescentes de 12 a 15 anos que participaram do Estudo 2 da Pfizer nos Estados Unidos, 1.131 receberam a vacina e 1.129, o placebo.
Em um estudo clínico, as reações adversas em adolescentes de 12 a 15 anos de idade incluíram dor no local da injeção (90,5%), fadiga (77,5%), dor de cabeça (75,5%), calafrios (49,2%), dores musculares (42,2%), febre (24,3%), dores nas articulações (20,2%), inchaço no local da injeção (9,2%), vermelhidão no local da injeção (8,6%), linfadenopatia (0,8%) e náuseas (0,4%).
Casos de reações alérgicas graves, miocardite e pericardite foram relatados após a administração da vacina fora dos ensaios clínicos.
Estudo da Pfizer
Em estudo clínico com jovens de 12 a 15 anos, a vacina “demonstrou eficácia de 100%”, segundo a empresa informou à reportagem. “Os ensaios de fase 3 foram realizados em 2.260 adolescentes, nos Estados Unidos, e apresentou respostas robustas na produção de anticorpos e o perfil de segurança aceitável semelhante a outros grupos etários também foi estabelecido.”
Ainda de acordo com o documento, as reações adversas mais comuns, em 10% dos pacientes, e comuns (entre 1% e 10%) “podem incluir dor, inchaço ou vermelhidão no local de injeção, cansaço, dor de cabeça, diarreia, dor muscular, dor nas articulações, calafrios e febre, além de náusea e vômito”.
Pfizer em jovens
Ao contrário de outros imunizantes, o grupo mais jovem a receber a Pfizer na fase de ensaios clínicos foi entre 16 e 25 anos – o que possibilitou que a aprovação inicial do imunizante já considerasse os adolescentes mais velhos como aptos a receber as doses. Depois, graças a estudos divulgados no final de março, os órgãos reguladores ampliaram a possibilidade de aplicação da vacina.
Por aqui, a Anvisa autorizou o uso em adolescentes, a partir de 12 anos, em 11 de junho. Como a própria agência sinaliza, este é o único imunizante aprovado para uso em menores de idade no país.
Por decisão do Ministério da Saúde, a vacinação dos adolescentes, entre 12 e 17 anos, deve ocorrer nos estados após o término da aplicação da primeira dose, por faixa etária, nos adultos.
Como o ritmo de vacinação não é o mesmo em todos os estados, o Comprova buscou informações sobre os 26 estados e o Distrito Federal e constatou que ao menos as seguintes localidades já começaram a imunização de adolescentes (até 20 de agosto): Acre; Amapá; Amazonas; Distrito Federal (no caso dos adolescentes com deficiência ou síndromes, e antes do término da vacinação dos adultos); Maranhão; Mato Grosso do Sul; Pernambuco; Rio Grande do Sul; Rondônia; Roraima e São Paulo.
Esta não é a primeira postagem do site Coletividade Evolutiva que contém informações falsas sobre a vacinação. Há, na página, uma editoria de “manipulação”, com textos sobre o suposto caráter experimental das vacinas contra a covid e sobre o efeito “magnético” do imunizante. O Comprova já considerou falsa uma postagem do site sobre os efeitos colaterais da CoronaVac.
O site austríaco Report24, que teve a postagem traduzida, também já publicou outros conteúdos conspiratórios e contrários à vacinação.
Por que investigamos?
Em sua quarta fase, o Comprova verifica conteúdos suspeitos sobre pandemia, políticas públicas do governo federal e eleições que viralizam nas redes. O texto verificado aqui entrou na lista de monitoramento do Comprova via pedidos de leitores pelo WhatsApp (se tiver dúvida sobre algum conteúdo, você pode enviá-lo para o telefone 11 97045-4984 ou clicando neste link).
Conteúdos que tentam desacreditar as vacinas são perigosos porque podem levar a população a colocar a saúde em risco.
Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.
O discurso do médico Dan Stock, propagado em publicação viral no Twitter, é enganoso ao associar vacinas ao aumento no números de casos de covid-19 nos Estados Unidos. Ele sugere que os imunizantes provocam uma exacerbação da doença, mas não há evidências de que as vacinas estejam associadas ao fenômeno citado pelo médico. Stock também engana ao citar que máscaras são ineficazes para o controle da pandemia e ao recomendar um tratamento sem benefícios comprovados pela ciência. Em um compilado de documentos usados como evidências para sustentar sua afirmação, o médico lista estudos retratados, inconclusivos ou com conclusões que não corroboram com o seu discurso.
Conteúdo verificado: O vídeo mostra um discurso do médico americano Dan Stock em audiência a um conselho escolar, em Fortville, Indiana, nos Estados Unidos. Ele afirma que vacinas de covid confundem o sistema imunológico e fazem o organismo combater o vírus de uma maneira inadequada. O médico sugere que a vacinação pode provocar um fenômeno que exacerba a doença e associa os imunizantes ao recente aumento no número de infecções diárias no país. Stock ainda sugere que máscaras são inúteis para controlar a pandemia e que a vacina não oferece benefícios a pacientes recuperados da covid.
São enganosas as alegações do médico norte-americano Dan Stock de que vacinas de covid-19 confundem o sistema imunológico de pessoas imunizadas e as tornam suscetíveis a quadros mais severos da doença, em comparação com a infecção natural. Uma postagem que divulga o discurso do médico em audiência, na cidade de Fortville, Indiana, foi compartilhada mais de 10 mil vezes no Twitter. A plataforma adicionou um aviso ao conteúdo para alertar que o material é enganoso.
No vídeo, Stock cita um fenômeno conhecido, em inglês, como Antibody-Dependent Enhancement (ADE) que, segundo ele, agravaria casos de covid entre vacinados e poderia estar relacionado ao surto recente de casos da doença nos Estados Unidos. O país aplica os imunizantes da Pfizer/BioNtech (Comirnaty), Moderna e Janssen. Não há evidências, entretanto, que essa condição esteja associada com a doença, tampouco com as vacinas.
O médico ainda tira de contexto um estudo do Centro de Prevenção e Controle de Doenças Infecciosas (CDC) dos Estados Unidos que aponta a incidência de sintomas de covid em pessoas vacinadas em Barnstable, Massachusetts. O próprio estudo afirma que a pesquisa não deve sustentar conclusões sobre a efetividade das vacinas.
O vídeo também espalha desinformação ao sugerir que máscaras faciais são ineficazes para coibir a transmissão do novo coronavírus. As melhores evidências científicas indicam que a proteção é essencial para diminuir a exposição à doença. Por fim, Stock faz propaganda de um tratamento sem comprovação científica.
O Comprova considera enganosas as publicações cujos conteúdos confundem ou usam dados imprecisos, como faz Stock ao distorcer informações de estudos para atacar vacinas.
Como verificamos?
Para investigar o conteúdo, o Comprova apurou primeiramente a ocasião em que o discurso do médico foi gravado. A reportagem identificou que as alegações de Dan Stock ocorreram em 6 de agosto de 2021, durante uma audiência na Mount Vernon School Corporation, uma associação escolar que agrega instituições de ensino voltadas a crianças e adolescentes.
O passo seguinte foi investigar quem era o autor do discurso enganoso. O Comprova identificou que Dan Stock é um médico da família que diz praticar “medicina funcional”. Trata-se de um modelo alternativo baseado em uma visão holística dos sistemas biológicos do corpo humano e na individualidade do paciente. Stock é proprietário de uma loja de suplementos.
Ao buscar pelo vídeo e o nome de Dan Stock no Google, o Comprova encontrou uma série de verificações de veículos estrangeiros (1, 2, 3, 4). Segundo uma verificação do site americano Politifact, o médico indicou por correio de voz que os documentos por ele apresentados aos diretores da associação escolar foram publicados em um blog conservador.
O Comprova analisou os 22 artigos listados no site e identificou estudos retratados por inconsistências técnicas, análises não científicas e até trabalhos que contradizem os próprios apontamentos do médico na audiência. Também consultamos o epidemiologista formado pela Universidade de São Paulo (USP) Julio Ponce, bem como a imunologista da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA) Cristina Bonorino para analisar as alegações de Stock na reunião.
A reportagem ainda recorreu a fontes documentais, como um editorial da revista Science que minimiza o risco de ADE em vacinas de covid, orientações do CDC e da Organização Mundial da Saúde (OMS) acerca de vacinas, bem como o painel de evidências de tratamentos para covid-19 dos Institutos Nacionais de Saúde americanos (NIH).
Contatamos o médico Dan Stock por um e-mail disponibilizado em seu perfil no Linkedin, mas não obtivemos resposta até o fechamento desta reportagem.
Verificação
Não há evidências de que vacinas causam ADE
Ao contrário do que sugere Stock, não há evidências de que vacinas de covid-19 favorecem uma exacerbação da doença mediada por anticorpos. Essa condição, mais conhecida na língua inglesa como Antibody-Dependent Enhancement, descreve um fenômeno em que anticorpos gerados anteriormente por uma infecção natural ou induzidos por vacinas não conseguem neutralizar o vírus em uma nova infecção, e podem facilitar o ataque do patógeno às células do hospedeiro.
Durante seu discurso, o médico sugere que o fenômeno poderia estar associado com aumentos recentes nos números de casos em algumas regiões dos Estados Unidos. Stock cita que foram observados sinais de ADE em estudos com animais durante o desenvolvimento de vacinas contra a Sars, outro coronavírus que foi pivô de uma epidemia em 2003, na China. De fato, a possibilidade de ocorrência dessa condição foi uma preocupação de cientistas no desenvolvimento de vacinas contra a covid, mas nem os estudos pré-clínicos com animais nem ensaios em humanos identificaram evidências do fenômeno, ressalta um editorial da revista Science sobre o assunto, publicado em fevereiro deste ano.
O artigo evidencia ainda que a hipótese levou cientistas a adotarem estratégias para minimizar os riscos de ADE no desenvolvimento das vacinas contra a covid.Também não há evidências de que novas variantes possam desencadear a condição, tampouco o monitoramento de efeitos adversos realizado por agências sanitárias indicou qualquer sinal do problema.
Outra evidência que torna a hipótese improvável é que experimentos com tratamentos baseados em plasma convalescente (com anticorpos contra covid-19) não provocaram exacerbação da doença em voluntários. Até o momento, as evidências da vacinação no ‘mundo real’ mostram que os imunizantes são eficazes em prevenir formas graves da doença. Cerca de 99% das mortes e hospitalizações por covid-19, nos Estados Unidos, ocorrem em pessoas não imunizadas.
Vale ressaltar que o compilado de evidências citado por Stock não contém nenhum estudo que prove a ocorrência de exacerbação de covid mediada por anticorpos. Uma das pesquisas analisou casos de covid em profissionais de saúde vacinados e apontou que a maioria teve sintomas leves ou quadros assintomáticos.
Aumento de casos não é consequência da vacina
Para atacar a vacinação, o médico cita que em Barnstable, cidade de aproximadamente 44 mil habitantes em Massachusetts, 75% dos novos casos de covid-19 ocorreram em pessoas vacinadas. A informação foi retirada de um estudo do CDC, divulgado no final de julho, que avaliou 469 ocorrências da doença na cidade americana.
Os autores da pesquisa, no entanto, destacam no próprio relatório que o levantamento é insuficiente para fornecer conclusões sobre a eficácia das vacinas de covid, incluindo a variante delta, que atualmente corresponde à cepa predominante no país.
“À medida que a cobertura vacinal a nível populacional aumenta, é esperado que as pessoas vacinadas representem uma proporção maior de casos de covid-19. Em segundo lugar, infecções assintomáticas podem estar subrepresentadas por causa do viés de detecção”, explicam os autores no texto.
Entre as pessoas completamente vacinadas, apenas quatro tiveram que ser hospitalizadas e nenhuma morte foi registrada. O estudo ainda afirma que a “vacinação é a estratégia mais importante para prevenir casos graves e óbitos” e recomenda a expansão de estratégias não farmacológicas, como o uso de máscaras em locais fechados, independentemente do grau de vacinação do indivíduo.
Como já explicou o Comprova, os imunizantes já aprovados por agências de saúde nos Estados Unidos e no Brasil foram desenvolvidos para prevenir casos sintomáticos da doença. Nenhuma vacina elimina totalmente o risco de contrair covid, embora reduzam significativamente as chances do paciente desenvolver formas graves. Segundo o CDC, as vacinas também reduzem o risco de pessoas espalharem o novo coronavírus para outras, mas não excluem completamente essa possibilidade.
Julio Ponce lembra que os recentes aumentos de hospitalizações por covid nos EUA estão associados a pessoas não vacinadas. “Mesmo que consideremos que alguns vacinados peguem a doença, eles têm um risco diminuído de agravamento. Em Indiana, onde o vídeo foi gravado, 96% dos novos casos são de pessoas que não se vacinaram”, afirma.
Alerta especial para variante delta
O CDC alerta, entretanto, para casos raros em que vacinados são infectados pela variante delta. Apesar das vacinas serem “altamente eficazes” em evitar o agravamento de infecções desta cepa do novo coronavírus, diferentemente de outras variantes, a delta parece produzir quantidades similares de vírus tanto em pessoas não vacinadas quanto em pessoas totalmente vacinadas.
Por outro lado, a carga viral produzida pelas infecções da variante delta em pessoas totalmente imunizadas diminui mais rapidamente do que as infecções naqueles que não tomaram esquema vacinal completo. “Isto significa que as pessoas totalmente vacinadas [transmitem o vírus] por menos tempo do que as pessoas não vacinadas.”, afirma o CDC.
Melhores evidências indicam que uso de máscaras é eficaz
Stock acerta ao afirmar que o novo coronavírus é propagado por meio de pequenas gotículas chamadas aerossóis. Ele desinforma, no entanto, ao sugerir que devido ao tamanho das partículas, o uso de máscaras não seria eficaz para coibir a transmissão da covid-19. Embora parte dos aerossóis possam escapar das máscaras, o equipamento ainda é essencial para controlar a pandemia.
Segundo o epidemiologista Julio Ponce, trabalhos científicos mostram que o uso da máscara promove uma redução bastante sensível de infectados em contexto de surtos de coronavírus. Ele cita um artigo publicado na conceituada revista de medicina JAMA, o qual afirma que antes da pandemia de covid, o uso comunitário de máscaras para reduzir a transmissão de vírus respiratórios era controverso devido a falta de evidências relevantes sobre a prática.
Ao longo da crise sanitária, entretanto, as evidências científicas cresceram. O artigo pontua que em trabalhos recentes, máscaras de pano de várias camadas bloquearam de 50% até 70% das gotículas pequenas exaladas por uma pessoa infectada. O relatório explica que as máscaras ainda servem como uma barreira contra as gotículas maiores.
O compilado de documentos de Stock contra o uso de máscaras reúne desde análises informais de postagens em blogs, estudos retratados por inconsistências técnicas (1, 2), trabalhos não conclusivos sobre a eficácia da medida (1), até mesmo pesquisas que, na verdade, sugerem benefícios das máscaras. É o caso, por exemplo, deste artigo que conclui que a análise mostra evidências de que estados americanos com regras para uso da proteção registraram uma maior queda nas taxas de diárias de covid, em comparação a outros que não adotaram a medida.
“O que pode ser colocado em contexto é que há máscaras que protegem mais do que outras. Os estudos que o médico menciona parecem ser aqueles feitos com máscaras cirúrgicas, que são adequadas para limitar a projeção de gotículas e aerossóis de quem as usa, mas não são tão eficazes para proteger de aerossóis possivelmente contaminados no ambiente”, afirma Ponce.
O especialista pontua que, por esse motivo, máscaras PFF2/N95 são mais recomendadas para locais de alta exposição, uma vez que os equipamentos são capazes de filtrar até 95% de partículas pequenas.
Vacinas são importantes mesmo para recuperados da covid
Outra informação enganosa do vídeo corresponde à alegação de Stock de que as vacinas de covid não promovem benefícios a quem já se recuperou da doença.
De acordo com o CDC, pesquisadores ainda não estabeleceram por quanto tempo dura a imunidade conferida pela infecção natural ou pelas vacinas. Por outro lado, a agência diz que estudos indicam que os imunizantes podem aprimorar a proteção de pessoas que já se recuperaram da infecção.
Já a OMS afirma que a “maioria das pessoas infectadas com Sars-CoV-2 desenvolvem uma resposta imune nas primeiras semanas, mas ainda estamos aprendendo o quão forte e duradoura é essa resposta imune, e como ela varia entre diferentes pessoas, acrescentando que “mesmo que você tenha tido uma infecção anterior, a vacina age como um reforço que fortalece a resposta imune.”
Em entrevista ao Comprova, a professora da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre Cristina Bonorino explica que, no caso da infecção natural, o microorganismo evolui para escapar das respostas imunes do hospedeiro, e por isso nem sempre a imunidade deixada após a infecção é eficaz e duradoura.
“As vacinas, por outro lado, focam em estimular mecanismos importantes para controlar a multiplicação do microorganismo no indivíduo, sem a desvantagem do que acontece na infecção natural. Vacinas, portanto, geram respostas mais eficazes que a infecção natural”, comenta a especialista.
Tratamento divulgado pelo médico não tem comprovação científica
No vídeo, o médico faz propaganda de substâncias sem benefícios comprovados contra a covid-19 ao citar que tratou 15 pacientes com um protocolo de ivermectina, zinco e vitamina D. O relato de Stock, entretanto, não configura evidência de que o tratamento funcione.
Como já explicou o Comprova em outras verificações, para atestar a eficácia de um medicamento contra a covid, são necessários múltiplos ensaios clínicos randomizados com estrutura adequada e número extenso de participantes. O Painel de Diretrizes de Tratamentos para Covid, dos Institutos Nacionais de Saúde dos EUA (NIH), afirma que não há dados suficientes para recomendar a favor ou contra o uso da ivermectina para o tratamento da doença.
“São necessários resultados de ensaios clínicos adequadamente desenvolvidos, bem concebidos e bem conduzidos para fornecer orientações mais específicas e baseadas em evidências sobre o papel da ivermectina no tratamento da covid-19”, diz o documento
No compilado de documentos de Stock constam estudos que sugerem potenciais benefícios da vitamina D no tratamento da covid-19. As diretrizes do NIH, entretanto, informam que também faltam mais dados para recomendar contra ou a favor do uso da suplementação da substância como terapia contra o novo coronavírus.
O órgão emitiu a mesma recomendação para o uso do Zinco, porém, o painel alerta contra a suplementação acima dos níveis de dieta recomendados, uma vez que o consumo excessivo da substância pode ocasionar deficiência de cobre no sangue e outras doenças.
Quem é Stock
Daniel “Dan” Stock se define no Linkedin como um médico de família experiente e com formação em medicina funcional, um ramo alternativo cujos métodos não têm comprovação científica. De acordo com a rede social, ele se formou na Indiana University School of Medicine em 1988.
Segundo o breve perfil de Dan Stock no Top NPI, um site pensado para auxiliar moradores dos Estados Unidos a encontrarem médicos próximos de onde moram, o profissional tem 33 anos de experiência na medicina e é licenciado para exercer a profissão pelo conselho estadual de Indiana.
Após falar ao conselho escolar da Mount Vernon School Corporation, no condado de Hancock, em Indiana, Stock publicou um texto no Linkedin para agradecer o “apoio esmagador de todos”. O teor da mensagem sugere que as medidas adotadas no contexto do enfrentamento à covid-19 são atentatórias às liberdades individuais.
“Por favor, rezem por mim, por nossa própria liberdade que nosso próprio governo federal ameaça, mas como vocês, chamem vocês legisladores estaduais e locais e exijam que eles não sirvam aos especialistas selecionados pelos lobistas federais, mas a você”, ele escreveu.
O Projeto Comprova enviou questionamentos ao profissional no endereço de e-mail disponibilizado por ele no Linkedin, mas não obteve retorno até a publicação desta checagem.
Por que investigamos?
Em sua quarta fase, o Comprova checa conteúdos suspeitos sobre o governo federal, eleições ou a pandemia que tenham atingido alto grau de viralização. A postagem verificada nesta matéria alcançou mais de 10 mil visualizações no Twitter. Segundo agências de checagem estrangeiras, o mesmo discurso enganoso de Dan Stock atingiu milhões de usuários em outros países.
As alegações do médico são perigosas ao espalhar informações falsas para atacar medidas essenciais para o combate à pandemia, como o uso de máscaras e a vacinação em massa. Essas práticas são recomendadas e defendidas pelas principais agências de saúde no Brasil e no exterior e têm respaldo em evidências científicas relevantes.
O Comprova também já verificou outras afirmações equivocadas sobre a imunização em massa contra a covid. Um boato recente afirmava enganosamente que não há lógica por trás da vacinação para conter a pandemia. Outro conteúdo tirou de contexto uma entrevista de uma autoridade de saúde americana na tentativa de desqualificar a segurança dos imunizantes usados no país. Uma terceira postagem distorcia dados de efeitos adversos da vacina da Pfizer em adolescentes.
Enganoso, para o Comprova, são conteúdos retirados do contexto original e usados em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.
Post engana ao associar a internação por covid-19 do apresentador Silvio Santos com uma suposta falha da Coronavac – vacina desenvolvida pelo Instituto Butantan em parceria com o laboratório chinês Sinovac – que é aprovada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e, portanto, é segura e eficaz. Assim como todos os outros imunizantes em uso no Brasil, a Coronavac é capaz de reduzir o risco das pessoas desenvolverem quadros graves da doença, mas não elimina totalmente a possibilidade de contágio.
Conteúdo verificado: Publicação feita no Twitter e compartilhada no Instagram afirma que o apresentador Silvio Santos foi internado por covid-19 após duas doses da “PlaceboVac” – expressão usada para desqualificar a vacina Coronavac – e questiona o que mais é necessário ocorrer para que haja o cancelamento da distribuição do imunizante, apontado no post como “suspeito e ineficaz”.
O fato de o apresentador Silvio Santos, 90 anos, ter sido internado por covid-19 não comprova que a vacina recebida por ele, a Coronavac, seja ineficaz. O imunizante, assim como os demais em uso no Brasil contra o coronavírus, é capaz, conforme testes realizados e estudos documentados, de reduzir o risco de desenvolver quadros graves da doença, mas não elimina completamente a possibilidade de contágio.
Segundo especialistas, nenhuma vacina é capaz de assegurar 100% de proteção contra as doenças. No caso das utilizadas contra a covid, elas cumprem o papel de servir como um redutor de risco, evitando as formas graves. No entanto, mesmo após a imunização, independentemente de qual fabricante seja a vacina aplicada, é possível haver contaminação, internação e até óbito – mas com frequência muito menor do que entre não vacinados.
Isso acontece porque os imunizantes diminuem, mas não zeram as chances de casos graves e de morte pela doença. Portanto, a acusação feita no conteúdo verificado, no qual o autor afirma que a Coronavac é “suspeita e ineficaz”, devido à internação de Silvio Santos mesmo vacinado, é infundada.
O Comprova entrou em contato com o autor da publicação no Twitter e com o perfil que replicou no Instagram, mas até a publicação deste texto não obteve retorno.
Enganosos para o Comprova são os conteúdos que confundem, mesmo que não haja intenção deliberada de causar dano.
Como verificamos?
O Comprova consultou dados oficiais nos sites da Anvisa e OMS sobre a segurança e eficácia da Coronavac e buscou por notícias em veículos jornalísticos. Em paralelo, procurou informações nas redes sociais da família Abravanel sobre a imunização de Silvio Santos.
Conversou com dois especialistas: a infectologista da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) e consultora da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI) Raquel Stucchi e o médico e consultor em infectologia da Escola de Saúde Pública do Ceará Keny Colares. Além disso, procurou o Instituto Butantan, a Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm) e o SBT.
Também entrou em contato, via Instagram, com o autor da publicação no Twitter e com o perfil que compartilhou o post do Twitter no Instagram, mas não obteve retorno.
O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 18 de agosto de 2021.
Verificação
Silvio está vacinado?
Conforme divulgado em diversos veículos jornalísticos, incluindo publicações no site e nas redes sociais do SBT, emissora da qual Silvio Santos é dono, o empresário e apresentador de 90 anos está vacinado contra a covid-19. Ele recebeu a primeira dose no dia 10 de fevereiro; e a segunda no dia 10 de março, em um posto de saúde na cidade de São Paulo.
Na data da primeira dose, o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), publicou em seu Twitter uma foto do apresentador, com a filha Patrícia Abravanel, e um texto confirmando a aplicação da Coronavac. “Silvio Santos, aos 90 anos de idade, recebeu hoje a vacina do Butantan aqui em São Paulo. Muito feliz por você, meu amigo”, diz a postagem.
No mesmo dia, Patrícia postou no Instagram a imagem do cartão de vacina do pai que confirma que o imunizante aplicado foi a Coronavac (na imagem, consta um erro de escrita no nome de registro de Silvio, que é Senor Abravanel. No cartão foi registrado “Senhor Abravanel).
No dia 13 de agosto, a notícia de que Silvio foi internado por covid-19 em São Paulo ganhou repercussão. No SBT, o portal principal da emissora e o SBT News noticiaram a confirmação da contaminação e a internação; e no telejornal SBT Brasil foi informado que “o empresário e apresentador Silvio Santos, de 90 anos, testou positivo para a covid-19. Ele está internado no Hospital Albert Einstein, em São Paulo, e seu estado de saúde é muito bom”, disse o âncora.
Na mesma data, tanto Patrícia quanto Silvia Abravanel, que também é filha de Silvio, publicaram no Instagram informações sobre o estado de saúde do pai. “Nosso pai está clinicamente bem. Daquele jeito que a gente ama… brincando com todos, fazendo piadas […] Mas testou positivo para covid e, por conta da idade e necessidade de exames frequentes, os médicos decidiram interná-lo”, afirmou Patrícia.
Silvia disse: “Nosso pai está super bem, graças a Deus. Ele testou positivo para covid. Os exames dele estão bons e ele decidiu ficar no hospital para fazer o acompanhamento diário exigido pelos médicos por conta da idade dele”.
Ainda no dia 13, à noite, Silvio deixou o hospital. A informação também foi divulgada no Instagram da sobrinha, Dory Abravanel.
O jornalista Roberto Cabrini, que atualmente trabalha na Record, mas já atuou no SBT, em vídeo publicado no Twitter, no dia 14 de agosto, afirmou ter conversado com Íris Abravanel, esposa do apresentador. Segundo o jornalista, ela afirmou que “Silvio é forte e já havia deixado o hospital onde passou por uma série de exames”.
Também no dia 14 de agosto, segundo o portal R7, Tiago Abravanel, neto de Silvio, atualizou o estado de saúde do avô. Em uma publicação no Instagram, ele agradeceu as demonstrações de cuidado e disse que o avô “está se cuidando”.
A assessoria de imprensa do SBT confirmou ao Comprova que o apresentador tomou as duas doses da vacina Coronavac e disse que Silvio está “muito bem” e “na fase final da quarentena fora do hospital”.
Internação não indica ineficácia da vacina
O post enganoso insinua que o fato de Silvio Santos ter contraído covid-19 e ter ficado internado seria resultado de uma suposta ineficácia da vacina Coronavac. No entanto, isso não é verdade.
Segundo a infectologista Raquel Stucchi, as vacinas funcionam, sim, e reduzem os casos graves e a mortalidade. “É inegável que a vacinação conseguiu diminuir o número das internações, dos casos graves e da mortalidade. Se nós analisarmos os dados de março e abril, é facilmente perceptível que houve uma diminuição expressiva das internações e da mortalidade nos idosos que foram os primeiros a serem vacinados”.
No entanto, ela destaca que, com a vacinação no mundo todo, o que foi observado e já documentado é que a proteção de todas as vacinas, independentemente do fabricante, diminui com o passar dos meses. “Particularmente, para alguns grupos populacionais, como por exemplo, os idosos. Eles vão perdendo a proteção pela vacina depois de 4 a 6/7 meses. Essa é a explicação porque passados todos esses meses aqui no Brasil, nós devemos observar e já estamos observando um aumento de internação de idosos e vamos, infelizmente, observar também um aumento da mortalidade”, explica.
Apesar de o risco de infecção ser maior entre os idosos, Raquel afirma que qualquer pessoa que tenha se imunizado corre o risco de pegar covid, pois ainda não há uma vacina com 100% de proteção para doenças infecciosas. “O que as vacinas fazem, e daí com uma diferença de fabricante para fabricante, é diminuir o risco da gente ter uma forma grave da doença. O risco de pegar covid pós-vacinação é para todos, mas sabemos que algumas pessoas já inicialmente não respondem tão bem às vacinas. Os idosos de uma maneira geral, para qualquer vacina, não respondem tão bem”.
Dessa forma, de acordo com a infectologista, a terceira dose – que já vem sendo discutida no país – para determinados grupos deverá ser obrigatória, “porque nós já sabemos que para qualquer vacina há uma redução da proteção”.
Os Estados Unidos anunciaram nesta quarta-feira (18) que os americanos que receberam as vacinas da Pfizer e da Moderna poderão receber uma terceira dose oito meses depois da segunda, a partir de 20 de setembro.
“Os dados disponíveis mostram claramente que a proteção contra a infecção por Sars-CoV-2 começa a declinar com o tempo, depois das primeiras doses da vacina”, diz um comunicado conjunto de altos funcionários, entre eles a diretora do CDC (Centros de Prevenção e Controle de Doenças), Rochelle Walensky, e a diretora interina da agência reguladora de medicamentos e alimentos dos Estados Unidos (FDA, na sigla em inglês), Janet Woodcock. “Somado à prevalência da variante Delta, estamos começando a ver evidências de uma proteção reduzida contra casos leves e moderados da doença”, acrescentou.
No Brasil, o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, disse nesta quarta-feira (18) que a terceira dose da vacina será aplicada, inicialmente, em idosos e profissionais da saúde. Mas ele não informou quando isso acontecerá. Segundo ele, mais dados científicos são necessários.
Em nota enviada ao Comprova, a SBIm afirmou que nenhuma vacina tem 100% de eficácia. Além disso, fatores como imunossenescência (queda natural da imunidade relacionada ao envelhecimento), comorbidades e possível menor resposta a variantes podem contribuir para a redução do índice.
A nota ainda diz que “esses parecem ser os casos do ator Tarcísio Meira e do empresário e apresentador Silvio Santos. É importante salientar que a imensa maioria dos vacinados que desenvolveram covid não evoluiu para forma grave e que a mortalidade se mostrou muito baixa. Nos países com a vacinação mais avançada, os óbitos vêm se concentrando em não vacinados e em indivíduos com esquema incompleto. Da mesma forma, no Brasil já é possível notar movimento semelhante entre os grupos contemplados há mais tempo”.
Nos EUA, por exemplo, quase todas as mortes por covid-19 em maio foram de pessoas que não foram vacinadas. Uma análise da Associated Press com base em dados governamentais disponíveis daquele mês mostra que infecções em pessoas totalmente vacinadas foram responsáveis por menos de 1.200 das mais de 853.000 hospitalizações por covid-19. Isso representa cerca de 0,1%. O assessor da Casa Branca para doenças infecciosas, Anthony Fauci, chegou a usar a expressão “’pandemia entre não vacinados”.
Imunização é uma estratégia coletiva
O médico e consultor em infectologia da Escola de Saúde Pública do Ceará Keny Colares ressalta que não se pode “julgar o funcionamento de uma vacina baseada na situação de uma pessoa. Para considerarmos a eficácia de uma medicação, de uma vacina, temos que avaliar o comportamento dela em um grande número de pessoas. Visto que somos todos diferentes e essa doença, com várias outras, age diferente de uma pessoa para outra. Isso era assim antes da vacina, e continua sendo depois da vacina”.
Ele reitera que estudos já mostravam que as vacinas têm uma boa proteção, mas não são absolutas. Por isso, “temos que somar essa proteção das vacinas a outras medidas”. Para ele, a imputação de que uma vacina é melhor que outra, baseada no grau eficácia, desconsidera que os dados sobre a proteção contra a infecção foram obtidos em estudos diferentes, com pessoas em locais com circulação viral distinta e em momentos diferenciados também.
Além disso, ressalta que “é muito importante não só o indivíduo estar vacinado, mas a coletividade, porque com todas as vacinas, com todas as doses, se a pessoa ficar circulando em um ambiente que está cheio de pessoas contaminadas, ela tem o risco de se contaminar”.
A vacinação da população geral, destaca, é uma linha de defesa e será preciso “somar todas essas estratégias para viver em segurança, até que surjam novas estratégias com novas ferramentas que consigam melhores resultados. Temos que modular as nossas expectativas para caber na realidade. Existem soluções parciais que, bem utilizadas, vão nos permitir viver”.
Coronavac é eficaz
A Coronavac foi aprovada pela Anvisa para uso emergencial no Brasil em janeiro de 2021 e pela OMS, em junho. Comunicado oficial da organização diz que “a OMS validou a vacina Sinovac-CoronaVac COVID-19 para uso emergencial, dando aos países, financiadores, agências de compra e comunidades a garantia de que atende aos padrões internacionais de segurança, eficácia e fabricação”.
O texto ainda diz que, baseada nas evidências disponíveis, a OMS recomenda a vacina para uso em adultos de 18 anos ou mais, em um esquema de duas doses com um espaçamento de duas a quatro semanas. O documento afirma que “poucos adultos mais velhos (com mais de 60 anos) foram incluídos em ensaios clínicos, portanto a eficácia não pode ser estimada neste grupo etário. No entanto, a OMS não está recomendando um limite máximo de idade para a vacina porque os dados coletados durante o uso subsequente em vários países e os dados de imunogenicidade de suporte sugerem que a vacina provavelmente tem um efeito protetor em pessoas idosas”.
A OMS recomendou ainda que os países que usam a vacina em grupos de idade avançada realizem monitoramento de segurança e eficácia para verificar o impacto.
Um artigo científico encaminhado por cientistas do Butantan, em abril de 2021, para a revista científica The Lancet mostrou que a eficácia da Coronavac para casos sintomáticos atingiu 50,7% com 14 dias de intervalo entre as duas doses, mais do que os 50,38% divulgados anteriormente.
Outro estudo feito pelo Instituto Butantan na cidade de Serrana, no interior de São Paulo, vacinou cerca de 75% da população adulta e constatou queda de 80% nos casos sintomáticos de covid e de 86% nas internações, além da redução de mortes em 95%.
Uma pesquisa, feita no Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo, apontou queda de 80% nos casos de covid-19 entre os 22 mil funcionários vacinados com a Coronavac.
Atualmente, a Coronavac é usada em mais de 30 países. Em entrevista ao Estadão, o médico infectologista e professor da Universidade Estadual Paulista (Unesp) Alexandre Naime afirmou que o que está por trás da desconfiança em relação às vacinas desenvolvidas na China é uma “guerra política” que mais desinforma do que ajuda as pessoas a entenderem como funciona cada uma delas. “Não cabe comparar agora. No futuro terá sim a revacinação e novas vacinas. Agora, precisamos salvar vidas”, afirma.
O autor do post no Twitter é @felipetellesbr, mas a página que compartilhou o tuíte dele no Instagram se chama Mundo Conservador, que traz na bio a descrição: “análises conservadoras diferenciadas e enriquecimento intelectual”.
Nas redes sociais, Felipe se descreve como “um grande entusiasta do Ocidente” e afirma que é dono da página @mundoconservador.
Entramos em contato, via Instagram, com o autor da publicação no Twitter e com o perfil que compartilhou o post no Instagram, mas não tivemos retorno.
Por que investigamos?
Em sua quarta fase, o Comprova verifica conteúdos suspeitos sobre pandemia, políticas públicas do governo federal e eleições que viralizam nas redes. O post verificado aqui teve mais de 9,4 mil interações no Instagram.
Conteúdos enganosos que tentam desacreditar as vacinas são perigosos porque podem levar a população a colocar a saúde em risco.
Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.
É enganosa a afirmação de que o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) tenha promovido cerca de 100 oficiais-generais aos postos de marechais. Os militares recebem proventos pelo cargo, mas não há portarias promovendo-os, e a nomenclatura não retrata os postos exercidos por eles na ativa.
Conteúdo verificado: Postagem em site, compartilhada no Facebook, afirma que Bolsonaro nomeou 100 marechais e que os nomes estão no Portal da Transparência.
Não é verdade que o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) nomeou 100 novos marechais, posto máximo da escala hierárquica do Exército Brasileiro, entre eles o falecido coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra (ex-chefe do DOI-CODI) e os generais Augusto Heleno (ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional- GSI), Eduardo Villas Boas (ex-comandante do Exército), Edson Pujol (ex-comandante do Exército), Joaquim Silva e Luna (presidente da Petrobras) e Sérgio Westphalen Etchegoyen (ex-ministro do GSI).
A afirmação consta em uma publicação de um site. Todos os nomes aparecem no Portal da Transparência recebendo salários compatíveis com o cargo, mas este não está relacionado ao posto ocupado por eles na ativa e nenhum recebeu promoção, conforme esclareceu o Ministério da Defesa ao Comprova. Além disso, a reportagem não localizou qualquer documento assinado pelo presidente ou por Braga Netto, ministro da Defesa, promovendo militares à patente.
No Facebook, o autor do conteúdo o compartilhou com legenda questionando “sabia que marechais são nomeados em tempos de guerra?”, dando a entender que Bolsonaro estaria se preparando para um confronto, conforme interpretaram vários usuários no grupo de apoio à reeleição onde foi feita a postagem. Nos comentários, grande parte apoiou uma intervenção militar contra o Supremo Tribunal Federal (STF).
O autor modificou a legenda após ser procurado pelo Comprova e afirmou acreditar na existência de uma guerra institucional e em uma tensão entre as instituições, “mas não no sentido do cargo”, justificando ter informado que marechais são promovidos em tempos de guerra apenas como um complemento do texto publicado por ele.
O Comprova considera enganosos conteúdos retirados do contexto original e usados em outro, de modo que seu significado sofra alterações.
Como verificamos?
O Comprova buscou pelo termo “marechal” no Portal da Transparência do governo federal, localizando uma lista com 101 nomes que apresentavam o cargo. Em seguida, buscou especificamente nomes que aparecem na publicação aqui verificada.
Utilizando o Google, pesquisou diferentes termos combinados para tentar identificar nomeações realizadas por Jair Bolsonaro, associando o nome do presidente à palavra marechal e a nomes que aparecem na lista.
A ação foi repetida utilizando o nome do ministro da Defesa Walter Souza Braga Netto e o mesmo método foi utilizado no campo de busca do Diário Oficial da União e na plataforma de Acesso à Informação. Nenhum documento neste sentido foi localizado. Publicações na imprensa também foram consultadas.
A reportagem entrou em contato, via email, com o Ministério da Defesa e analisou leis que tratam da hierarquia e das pensões militares, além de informações sobre o cargo de marechal. Por fim, conversou com o responsável pela publicação.
Verificação
Em pesquisa ao Portal da Transparência, o Comprova identificou 101 nomes de militares (Página 1 – PDF, Página 2 – PDF) reformados e reservistas com o cargo de marechal, um cargo especial criado em caso de guerra e que tem como atribuição liderar o Exército no conflito, respondendo diretamente ao presidente da República. Dentre eles, estavam os nomes citados na publicação. Entretanto, não foi localizado no Diário Oficial da União nenhum documento assinado por Bolsonaro ou pelo ministro da Defesa em relação às nomeações.
Dessa forma, o Comprova questionou ao Ministério da Defesa como elas ocorreram e o que significa o fato de essas pessoas aparecerem como marechais no Portal da Transparência. Em resposta, o órgão afirmou não ter havido qualquer promoção de oficiais-generais aos postos de marechal (Exército), almirante (Marinha) ou marechal-do-ar (Aeronáutica).
“O Estatuto dos Militares previa o direito ao militar, com mais de trinta anos de serviço, de perceber os proventos de nível hierárquico superior, ao ser transferido para a inatividade. Cabe ressaltar que essa prerrogativa do posto acima terminou com a MP n° 2215-10/2001. No entanto, todos os militares que à época já contavam com 30 anos de serviço militar ganharam o direito”, informou.
A medida provisória citada pelo ministério dispõe sobre a reestruturação da remuneração dos militares das Forças Armadas, alterando duas leis – 3.765/1960, que trata sobre as pensões militares, e 6.880/1980, que dispõe sobre o Estatuto dos Militares.
O texto revoga o artigo 6º da lei das pensões que, até 2001, facultou aos militares com mais de 30 e 35 anos de serviço, contribuírem, respectivamente, para a pensão correspondente a um ou dois postos, ou graduações acima.
Ainda conforme a resposta do Ministério da Defesa, os postos de almirante, marechal e marechal-do-ar são previstos no Estatuto dos Militares e serão providos em tempo de guerra.
Esta previsão consta no artigo 16 da lei, que fixa os círculos hierárquicos e a escala hierárquica nas Forças Armadas, bem como a correspondência entre os postos e as graduações da Marinha, do Exército e da Aeronáutica.
O parágrafo 1° define que o posto é conferido por ato do Presidente da República ou do Ministro de Força Singular, sendo confirmado em Carta Patente. O parágrafo 2º, por sua vez, deixa claro que os postos de almirante, marechal e marechal-do-ar somente serão providos em tempo de guerra.
Nesse contexto, em relação aos nomes que constam no Portal da Transparência, o Ministério da Defesa diz que o posto corresponde ao pagamento recebido pelos militares, não retratando os postos exercidos por eles na ativa.
Levy Cardoso participou da Revolução Liberal de 1924, em São Paulo, da Revolução de 1930, que levou Getúlio Vargas à Presidência do Brasil, e da Intentona Comunista de 1935. Em 1944, como tenente-coronel, comandou o 1º Grupo de Artilharia Expedicionário na Segunda Guerra Mundial. Chegou ao posto de general-de-Exército em 1964 e dois anos depois foi para a reserva.
As nomeações que constam no Portal da Transparência foram divulgadas pela imprensa na última semana e políticos de oposição e entidades batizaram o assunto de “Farra dos Marechais”. Uma reportagem publicada pelo Poder 360 leva a uma lista de nomes citados no post aqui verificado e informa que o Portal da Transparência identifica cerca de 100 generais reservistas ou reformados do Exército como marechais.
Essa mesma lista foi citada pelo conteúdo aqui verificado, assim como alguns dos nomes, verificados pelo Comprova. Todos constam no Portal da Transparência recebendo gratificações pelo cargo de marechal.
Dentre eles, está o ministro do Gabinete de Segurança Institucional, Augusto Heleno Ribeiro Pereira, que aparece duas vezes enquanto servidor do governo federal: como marechal e reservista do Exército, com salário bruto de R$ 32.153,77, e como ministro, cuja remuneração bruta é de R$ 30.934,70.
O mesmo ocorre com o ex-comandante do Exército Eduardo Dias da Costa Villas Boas, que recebe remuneração bruta de R$ 32.180,43 como marechal e de R$ 13.623,39 como assessor especial da presidência da República. Outros três citados – Edson Pujol, Joaquim Silva e Luna e Sérgio Westphalen Etchegoyen – também recebem como marechais.
A reportagem do Poder 360 afirma ter apurado que a nomenclatura foi incluída neste ano no portal, após reestruturação de divulgação de informações conduzida pela CGU (Controladoria Geral da União), pelo Ministério da Defesa e pelas Forças Armadas. O veículo afirma que os órgãos avaliam, inclusive, alterar ou retirar a especificação do cargo de marechal da página, após diferentes interpretações terem sido divulgadas sobre o assunto.
A busca livre feita pelo Comprova no Portal da Transparência só contabiliza os valores e cargos a partir de abril deste ano. O site disponibiliza, porém, o download de dados de inativos e pensionistas desde janeiro de 2020. Naquele mês, usando o nome de Eduardo Villas Boas como exemplo, a reportagem identificou que ele já recebia remuneração básica bruta acima de R$ 30 mil (R$ 30.496,83). A lista não apresenta, contudo, a informação sobre o cargo ao qual se referia o pagamento.
A postagem cita, ainda, Carlos Alberto Brilhante Ustra, cujo nome não consta na lista que apresenta os 101 militares com o cargo de marechal. Ao buscar pelo nome dele, entretanto, o Comprova localizou duas pensões pagas para as filhas, ambas associadas ao cargo de marechal. A remuneração bruta recebida por cada uma é de R$ 15.307,90.
Na resposta do Ministério da Defesa ao Comprova não foi citada a situação específica do coronel, que não alcançou o posto de general enquanto esteve na ativa. Um email solicitando uma explicação para o caso foi encaminhado à assessoria de comunicação e a reportagem aguarda retorno.
Os dados referentes às pensões a militares só foram disponibilizados no Portal da Transparência recentemente, após a Fiquem Sabendo, agência de dados especializada na Lei de Acesso à Informação (LAI), protocolar denúncias junto ao Tribunal de Contas da União (TCU).
Autor
O conteúdo foi publicado no site “Boletim do Brasil”, que se apresenta no Facebook como site de notícias e mídia e em um link para financiamento coletivo como um espaço de “boletins diários de notícias rápidas e opinião, boletins cativantes mostrando o que a mídia tradicional tenta esconder de você”.
É mantido por Fernando Takeshi Nascimento, que compartilhou o link no grupo Bolsonaro 2022 BR, de apoio à reeleição do presidente. Procurado pelo Comprova, Fernando afirmou acreditar, “sem dúvidas”, que exista “uma guerra institucional ou uma tensão nas instituições, mas não no sentido do cargo”.
Ele disse , ainda, que o conteúdo publicado por ele revela que a promoção é referente a proventos. “A informação de que marechais são nomeados em nome (sic) de Guerra é um complemento, que não deixa de ser verdade, segundo o próprio estatuto dos militares”, diz, linkando a explicação para “marechal” na Wikipedia.
Declarou também ter modificado a legenda que utilizou no Facebook ao compartilhar o link. Antes do contato, questionava “sabia que marechais são nomeados em tempos de guerra?”. Depois, a legenda passou a ser outra pergunta: “Eai (sic), o que acharam?”.
Por que investigamos?
Em sua quarta fase, o Comprova checa conteúdos suspeitos sobre políticas públicas do governo federal, pandemia e eleições que tenham atingido alto grau de viralização. Conforme a ferramenta Crowdtangle, o conteúdo aqui verificado, que envolve o nome do presidenciável Jair Bolsonaro, teve 21.526 interações no Facebook.
Bolsonaro tem criticado frequentemente o sistema eleitoral brasileiro e feito recorrentes ataques ao Supremo Tribunal Federal (STF). No âmbito militar, tem se aproximado de atividades junto às Forças Armadas. Nesta semana, assistiu à demonstração de manobras táticas da Operação Formosa 2021, que contou com a participação das três forças, e seis dias antes de um desfile do comboio com veículos blindados e armamentos da Marinha, no Planalto.
Desta forma, a aparição do cargo de marechal junto aos nomes dos militares acendeu o alerta de que estes estariam sendo promovidos em preparação para uma guerra, o que não é o caso, já que a nomeação se dá apenas para fins de remuneração. Conteúdos enganosos e falsos sobre o assunto deslegitimam o debate acerca das ações do presidente.
Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.
É enganoso post no Twitter que diz que o Centro de Controle de Doenças (CDC) dos Estados Unidos recomendou a suspensão da imunização com a vacina da Janssen. A interrupção ocorreu em abril e, no mesmo mês, a vacinação foi retomada.
Conteúdo verificado: Post no Twitter, publicado em agosto, afirma que o Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos Estados Unidos acaba de aconselhar a suspensão da aplicação da vacina contra a covid-19 da Janssen. A publicação compartilha uma reportagem do jornal El País de abril.
É enganosa a postagem feita pelo empresário e presidente do diretório estadual do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) em São Paulo, Otávio Fakhoury, no Twitter afirmando que a aplicação da vacina da Janssen acabou de ser suspensa pelo Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos Estados Unidos. Na verdade, a interrupção do uso do imunizante ocorreu em 13 de abril e durou apenas 10 dias. Portanto, quando o empresário fez o tuíte, a situação já havia sido normalizada havia pelo menos quatro meses.
A publicação ainda diz que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) deveria se manifestar sobre o caso. Porém, o imunizante só começou a ser utilizado no Brasil em junho, quando as primeiras doses chegaram ao país e a aplicação já tinha sido retomada nos Estados Unidos.
O Comprova entrou em contato com Otávio Fakhoury pelo Facebook e pelo Instagram. Logo após a solicitação de contato, o post foi excluído e substituído por outro no qual ele alega que a suspensão temporária seria prova do caráter experimental das vacinas – o que também é enganoso.
Por meio da assessoria de imprensa do empresário, ele entrou em contato com a reportagem e afirmou que o primeiro post foi um erro e que, ao perceber, ele excluiu a publicação e fez uma nova com a correção. Quanto à afirmação de que a vacina é experimental, Fakhoury disse se referir ao fato do imunizante ter sido aprovado em caráter emergencial. Além disso, afirmou que os posts em seu Twitter se tratam de opinião e não têm a intenção de espalhar mentiras ou enganar ninguém.
Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor. O fato do autor do tuíte ter apagado a publicação considerada enganosa não interrompe a investigação do Comprova. Esta verificação está sendo publicada para esclarecimento das pessoas que tiveram acesso ao tuíte enganoso.
Como verificamos?
O Comprova leu a notícia compartilhada pelo empresário para ver se seu contexto original foi respeitado e notou que ela era antiga. Em vista disso, consultou os sites dos órgãos reguladores citados para conferir o desfecho do caso envolvendo o imunizante da Janssen.
A reportagem assistiu à sessão da CPI da Pandemia para entender o contexto da publicação do empresário e a sua relação com o que foi dito pelo senador Rogério Carvalho (PT-SE). O parlamentar disse que Fakhoury não perdia a oportunidade de desinformar sobre as vacinas.
Por fim, procuramos o empresário para comentar.
O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 16 de agosto de 2021.
Em 13 de abril, o Centro de Controle de Doenças e a Agência de Alimentos e Medicamentos (FDA), as duas agências regulatórias dos Estados Unidos, emitiram uma nota conjunta para suspender temporariamente a aplicação da vacina produzida pela Janssen. A nota dizia que haviam sido relatados seis casos de uma mistura rara de coágulos com queda no número de plaquetas.
Àquela altura, 6,8 milhões de pessoas já haviam recebido a vacina. Os casos eram um por milhão de vacinados. Como isso poderia ser sinal de um efeito colateral extremamente raro, a pausa foi sugerida para que os técnicos pudessem investigar os casos.
Isso é um procedimento normal de segurança. As vacinas passam por rigorosos testes em milhares de voluntários que avaliam a eficácia e a segurança delas. Mesmo assim, ainda é possível que elas tenham efeitos colaterais extremamente raros, que só poderiam aparecer quando a vacina é aplicada em milhões de pessoas. Por isso, os órgãos regulatórios mantêm mecanismos de vigilância dos efeitos colaterais mesmo após a autorização.
A pausa da aplicação durou dez dias. Em 23 de abril, os dois órgãos divulgaram que o estudo dos casos permitiu concluir que os coágulos realmente estavam relacionados com a vacina da Janssen. No entanto, reconheceram que a chance deles ocorrerem é “muito baixa” e determinaram a retomada da aplicação.
“A FDA considera que os benefícios conhecidos são maiores do que os riscos conhecidos em indivíduos acima dos 18 anos”, informou a agência. Ela também anunciou que manteria o sistema de vigilância para detectar eventuais aumentos nos riscos trazidos pelo imunizante. A possibilidade de coágulos foi incluída na bula como um efeito colateral muito raro (abaixo de 1 caso para cada 10 mil).
Por telefone, Fakhoury disse que o primeiro post, que dava a entender que a suspensão da vacina tinha ocorrido recentemente, foi um erro e que ao perceber ele excluiu a publicação e fez uma nova com a correção.
Vacinas em uso foram testadas e aprovadas
Em seu segundo tuíte, o empresário alega que as vacinas são “experimentais”. Fakhoury disse se referir ao fato do imunizante ter sido aprovado em caráter emergencial e que os posts em seu Twitter se tratam de opinião. “Eu faço opinião, não trato como a publicação de um jornal. Eu não sou contra a vacina. A vacina tem que ser disponibilizada a todos, mas os riscos têm que ser explicados e cada um decide se vai tomar. Ninguém quer mentir ou enganar ninguém. Eu tenho opiniões e tem gente que não gosta”, afirmou.
No Brasil, quatro vacinas estão aprovadas para uso pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). A Pfizer e a AstraZeneca têm autorização para uso definitivo. Já Coronavac e Janssen têm autorização para uso emergencial.
De acordo com a Anvisa, nesse tipo de autorização, as vacinas continuam a ser avaliadas e só podem ser usadas pelo governo, não podendo ser comercializadas por clínicas e laboratórios. Apesar da autorização ser concedida de forma mais rápida, a agência exige que o imunizante tenha finalizado todos os testes e comprovado sua eficácia e segurança.
Já a FDA explica que a aprovação em caráter emergencial é mais rápida, mas todos os dados disponíveis são avaliados antes de concedê-la. “Uma vez submetida, o FDA avaliará a solicitação e determinará se os critérios legais relevantes foram atendidos, levando em consideração a totalidade das evidências científicas sobre a vacina que estão disponíveis.” Entre esses critérios, estão dados de segurança e eficácia.
Todas as vacinas em uso já terminaram as três fases de testes em humanos exigidas pela Anvisa e pelas principais agências reguladoras do mundo. A Janssen terminou os testes em janeiro de 2021 e conseguiu uma eficácia global de 66%; a Coronavac também finalizou os testes em janeiro e conseguiu a eficácia de 50,38%; a Pfizer terminou os testes ainda em novembro de 2020 e conseguiu eficácia de 95%; e a AstraZeneca em janeiro, com 82% de eficácia.
O autor do post
Otávio Fakhoury é um empresário e financista apoiador do presidente Jair Bolsonaro (sem partido). Desde julho de 2021, é também presidente do diretório estadual do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) em São Paulo.
Em sua quarta fase, o Comprova verifica conteúdos suspeitos sobre pandemia, políticas públicas do governo federal e eleições que viralizam nas redes. O post verificado aqui teve mais de 1,5 mil interações no Twitter antes de ser apagado.
Conteúdos enganosos que tentam desacreditar as vacinas são perigosos porque podem levar a população a colocar a saúde em risco.
Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.
A Polícia Federal não concluiu, em um inquérito, que houve invasão às urnas eletrônicas ou fraude no sistema de votação. O ataque hacker ao TSE, investigado pela PF e mencionado pelo presidente Bolsonaro, só atingiu o sistema interno do Tribunal, sem comprometer as eleições.
Conteúdo verificado: Postagens virais no Instagram e Facebook, além de um vídeo no YouTube, afirmam que o presidente tem provas sobre a insegurança das urnas eletrônicas – se referindo a documentos sigilosos de uma investigação da Polícia Federal publicados por Bolsonaro no Twitter.
Não é verdade que um inquérito da Polícia Federal prove que as urnas eletrônicas brasileiras já foram invadidas ou que já houve qualquer fraude no sistema eleitoral.
As alegações circulam em postagens enganosas no Facebook e Instagram, além de terem sido repetidas por um youtuber, em vídeo que viralizou.
Todos se referem aos documentos publicados pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) nas redes sociais, que se tratam, de fato, da investigação da PF sobre um ataque hacker ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Nem as publicações, nem o chefe do executivo mencionam, porém, que a invasão foi ao sistema interno do TSE, sem qualquer implicação na segurança das urnas eletrônicas – que contam com dispositivos adicionais de proteção.
Não há no inquérito nenhum dado relevante ou que comprove as alegações. Em reportagem publicada pela Folha de S. Paulo, as fontes ouvidas — estudiosos do tema e um participante da investigação — confirmaram que não há prova de fraude ou de mudanças no código-fonte do software de votação.
A Polícia Federal foi procurada, mas disse apenas, por email, que não comenta inquéritos em andamento.
O Comprova considera as postagens enganosas, porque usam dados imprecisos ou que induzem a uma interpretação diferente da intenção de seu autor.
Como verificamos?
Primeiramente, assistimos à entrevista concedida pelo presidente ao programa Pingos nos Is, da Jovem Pan, para saber melhor sobre as alegações feitas por ele.
Em seguida, analisamos o conteúdo dos documentos publicados por Bolsonaro em sua conta oficial no Twitter: o inquérito 1.468, da Polícia Federal, que investiga a invasão do sistema GEDAI; o relatório do TSE sobre o caso; o ofício da denúncia de fraude e o email do servidor hackeado. Nesta sexta-feira (13) os documentos não estavam mais disponíveis nos links disponibilizados pelo presidente.
Depois, buscamos o posicionamento do TSE a respeito das alegações e entramos em contato com a Polícia Federal para tentar obter mais detalhes a respeito do inquérito. O Tribunal havia publicado uma nota sobre o assunto, mas a PF disse que não se pronuncia a respeito de investigações que estão em andamento — apesar de ter confirmado que o documento publicado pelo presidente é verdadeiro.
Procuramos por especialistas em segurança digital e no sistema eletrônico de votação e, ainda, por reportagens já publicadas em outros veículos sobre o assunto.
Tentamos contato com os responsáveis pelas postagens, por email e mensagem nas próprias redes sociais onde o conteúdo foi publicado, mas não tivemos retorno até a conclusão desta verificação.
Verificação
Urnas não foram comprometidas
Não há, nos documentos divulgados por Bolsonaro, qualquer conclusão que aponte para a insegurança das urnas eletrônicas ou para a possibilidade do processo de votação ter sido afetado.
A investigação foi aberta pela Polícia Federal em 8 de novembro de 2018, na Superintendência Regional do Distrito Federal, após ser acionada pelo TSE. A motivação foi a suposta invasão de um hacker ao Sistema Gerenciador de Dados, Aplicativos e Interface com a Urna Eletrônica (GEDAI-UE) – aplicativo que permite a instalação na urna das listas com os nomes e dados dos candidatos, junto com o software do sistema de votação, além de registrar a presença dos eleitores –, e ainda o acesso a documentos sigilosos do Tribunal Superior Eleitoral. O caso foi descoberto a partir de uma reportagem do jornalista Felipe Payão, do Portal TecMundo, que foi contatado pelo hacker.
Em 210 páginas, o inquérito mostra que foram adotadas várias diligências diferentes pela Polícia Federal e pelo Ministério Público Federal para a investigação do caso, mas não há conclusão ou suspeita de que as urnas eletrônicas tenham sido comprometidas.
Na reportagem publicada pela Folha a respeito do assunto, os especialistas ouvidos também ressaltam que o inquérito não tem nenhuma conclusão neste sentido. “E, mesmo se o atacante tivesse obtido acesso de escrita ao repositório de códigos-fonte interno do TSE, o Git [sistema de controle] tem algumas salvaguardas contra modificações no repositório central de códigos: ele guarda o histórico de alterações, e não é possível alterar o histórico antigo. Então, seria possível detectar se houve modificação pelo invasor”, diz o professor Paulo Matias, do Departamento de Computação da Universidade Federal de São Carlos.
Nesta quinta-feira (12), o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), acolheu uma notícia-crime do TSE e mandou investigar Bolsonaro por suposto vazamento de dados sigilosos em relação ao inquérito da PF.
Código-fonte não é sigiloso
O caso de 2018 também foi alvo de uma sindicância interna do TSE, cujos documentos constam no inquérito. Em um ofício que trata das consequências da invasão, o secretário de Tecnologia da Informação do Tribunal, Giuseppe Dutra Janino, afirma que “o código-fonte do GEDAI-UE, acompanhado de seus binários compilados, permite a importação de dados; contudo, o software de urna utilizado não tem as assinaturas oficiais da lacração, o que fica evidenciado pelo LED de segurança da urna e pelos procedimentos de verificação de hash, que são resumos digitais realizados para garantir que os códigos lacrados são os mesmos que auditados, e assinatura; também não seria possível a geração de um boletim de urna válido para a totalização a partir disso”.
O código-fonte do software de votação, que corresponde ao programa inserido na urna eletrônica, é sempre analisado por técnicos dos partidos políticos, Polícia Federal, Ministério Público Federal e entidades como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Não se trata, portanto, de um arquivo sigiloso.
Em entrevista à Jovem Pan, Bolsonaro chegou a afirmar que no período de abril a outubro de 2018 o código-fonte esteve na mão de um hacker, e que, por isso, poderia ter “acontecido tudo, aperta 17 e sai nulo”. Em entrevista à Folha, Diego Aranha, professor do Departamento de Ciência da Computação da Universidade de Aarhus, na Dinamarca, contesta a hipótese levantada pelo presidente. “É naturalmente falso o argumento de que a posse do código-fonte é suficiente para provocar fraude. Se fosse o caso, os fiscais de partidos políticos que possuem acesso ao código-fonte nas dependências do TSE estariam fraudando as eleições a torto e a direito desde o princípio, o que não é nada razoável de se assumir”, afirma.
Por que investigamos?
Em sua quarta fase, o Comprova checa conteúdos suspeitos sobre governo federal, pandemia e eleições que tenham atingido alto grau de viralização. As afirmações aqui verificadas tiveram ao menos 20,6 mil interações no Instagram e o vídeo foi visualizado 445,9 mil vezes no YouTube.
Conteúdos que questionam a credibilidade do sistema eleitoral brasileiro por meio de informações manipuladas e enganosas corroboram as acusações, sem fundamentos, que o presidente faz constantemente à autenticidade do processo eleitoral. Desde o início do voto eletrônico no Brasil, em 1996, nenhum caso de fraude foi identificado e comprovado.
Para o Comprova, um conteúdo é enganoso quando confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano, porque usa dados imprecisos e induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor, além de ter sido retirado do contexto original e usado em outro, com alterações no significado.
Post no Instagram usa um vídeo de 2018, de um guincho tombado ao socorrer blindado do Exército, para fazer crer que o acidente ocorreu em 10 de agosto deste ano, quando houve desfile de tanques em Brasília.
Conteúdo verificado: Vídeo mostra um blindado do Exército sendo socorrido por um guincho e, em seguida, o veículo de socorro tomba. Na legenda do post viral, está a descrição: “Este é o exército do capetão Bolsonaro a caminho do desfile para pressionar a aprovação do voto impresso hoje”, dando a entender que se trata de uma gravação feita no último dia 10 de agosto, quando houve um desfile de blindados em Brasília.
É falso o conteúdo de uma postagem viral no Instagram que apresenta um vídeo de um blindado do Exército tombado à margem de uma rodovia e um outro veículo militar que, ao socorrê-lo, também vira. No texto que acompanha a imagem, o autor afirma que se trata do “Exército do capetão Bolsonaro a caminho do desfile para pressionar a aprovação do voto impresso.”
O desfile de blindados e a votação mencionados no post ocorreram na terça-feira (10), porém, o acidente com o veículo militar foi registrado três anos antes, em 2018, numa estrada de Bela Vista, em Mato Grosso do Sul, como mostra reportagem do G1.
O Exército e o perfil que divulgou o vídeo foram procurados, mas não se manifestaram até a publicação deste texto. O Comprova classificou o conteúdo como falso porque se trata de teor inventado para disseminar uma mentira.
Como verificamos?
Como o conteúdo verificado apresenta um vídeo, o primeiro passo foi conferir se a imagem já havia sido publicada anteriormente. Para tanto, o Comprova fez uma pesquisa reversa pelo Google Imagens e também usando a ferramenta TinEye. Os dois recursos levaram a páginas que já haviam divulgado o vídeo, algumas delas em 2018, e, portanto, antes do desfile de blindados registrado esta semana em Brasília.
Na pesquisa sobre o assunto, a reportagem chegou a outra verificação relacionada ao vídeo, feita pelo G1, que também classificou o conteúdo como falso.
O Exército foi consultado sobre o episódio, mas não respondeu aos contatos da reportagem, por e-mail e telefone. A reportagem também enviou mensagem privada via Instagram para o perfil @esquerdavalente, que publicou o conteúdo aqui verificado, mas não obteve retorno.
Verificação
O acidente
O vídeo apresentado na postagem é de um acidente registrado em 13 de agosto de 2018 na rodovia MS-384, em Bela Vista, no Mato Grosso do Sul. Reportagem da época feita pelo G1 aponta que dois veículos militares se envolveram na ocorrência. O primeiro tombou na estrada e um guincho foi acionado para desvirar a viatura, mas acabou tombando também.
Segundo o site da Globo, os dois veículos eram do 10° Regimento de Cavalaria Blindada e “um militar teve ferimentos leves e recebeu atendimento médico de imediato”.
O desfile
Embora também integrante das Forças Armadas, o Exército não promoveu o desfile com blindados da última terça-feira (10), mas, sim, a Marinha. A parada militar ainda apresentou armamentos e foi realizada na Esplanada dos Ministérios, com o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) acompanhando o evento da rampa do Palácio do Planalto.
Não há registro de que algum veículo tenha se envolvido em acidente a caminho ou na saída da apresentação, como sugere o conteúdo verificado.
O desfile militar foi bastante criticado por opositores do governo, que viram na manifestação uma tentativa de intimidação, sobretudo porque foi realizado na mesma data em que a Câmara Federal apreciou a PEC do voto impresso, uma proposta de emenda constitucional defendida pelo presidente, que previa a impressão de cédulas que pudessem ser conferidas pelo eleitor, independentemente do meio empregado para o registro dos votos.
Voto impresso
A PEC do voto impresso já havia sido rejeitada por comissão especial na Câmara, mas, na última terça-feira, foi levada a plenário para apreciação de todos os parlamentares. Como se tratava de emenda constitucional, precisaria dos votos de ⅗ dos 513 deputados para ser aprovada, ou seja, pelo menos 308 a favor.
Contudo, a proposta defendida por Bolsonaro não obteve a votação necessária e foi arquivada, impondo uma derrota política ao presidente. Após o resultado, ele voltou a criticar o sistema eleitoral brasileiro e a lançar dúvidas sobre a segurança da urna eletrônica.
Bolsonaro e seus seguidores constantemente atacam as instituições, como a Justiça Eleitoral e o Supremo Tribunal Federal (STF), e o presidente ainda usa boatos para alegar fraude nas urnas e até para ameaçar a realização das eleições em 2022. Essa conduta o colocou no centro de investigações da Justiça sobre fake news.
Por que investigamos?
Em sua quarta fase, o Comprova checa conteúdos suspeitos sobre o governo federal, eleições e pandemia que tenham atingido alto grau de viralização. O conteúdo verificado aqui foi visualizado mais de 11,4 mil vezes no Instagram até 13 de agosto.
Bolsonaro tem feito manifestações que são consideradas golpistas por opositores e entidades, como a insistência em criticar o sistema eleitoral brasileiro. O desfile militar desta semana foi visto como mais uma tentativa de pressionar outros poderes e politizar o Exército. Conteúdos falsos sobre o ocorrido, entretanto, deslegitimam o debate acerca dos movimentos do presidente.
Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.
É enganoso o tuíte de uma médica que utiliza dados de um hospital israelense para afirmar, sem provas, que o Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos Estados Unidos mente em relação ao número de pessoas não-vacinadas internadas com covid-19.
Conteúdo verificado: Infectologista utiliza dados apresentados pelo diretor de um hospital em Israel para afirmar, em post no Twitter, que o Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) norte-americano mente em relação à porcentagem de não vacinados hospitalizados por covid-19.
É enganosa a postagem feita por uma médica infectologista no Twitter alegando que o Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos Estados Unidos mente em relação à porcentagem de pessoas não vacinadas internadas com covid-19 no país. A autora do tuíte tira de contexto números apresentados por Kobi Haviv, diretor-médico do Herzog Hospital de Jerusalém, à emissora local Canal 13 sobre uma nova onda da doença em Israel.
Na fala, Haviv afirma que 90% dos pacientes atendidos no Herzog já tinham sido vacinados e que a efetividade da vacina está diminuindo. É possível perceber que há uma interrupção na fala do médico no vídeo postado no Twitter e compartilhado por contas de diversos países.
No mesmo tuíte, a médica destaca números apresentados por Kobi Haviv, escreve que Israel vacinou 62% de sua população e questiona por que nos Estados Unidos, onde o CDC afirma que 97% dos hospitalizados com covid são pessoas não vacinadas, seria diferente.
É fato que ambos os países têm observado aumento no número de casos de covid-19, inclusive entre imunizados, principalmente em decorrência da variante delta. Enquanto os Estados Unidos afirmam que a maior parte dos hospitalizados é composta por pessoas não vacinadas, Israel apresenta dados absolutos contendo mais pessoas imunizadas entre as internadas. Entretanto, a partir dos dados relativos, considerando a taxa de 100 mil habitantes, o país possui um maior número de hospitalizados dentre as pessoas não vacinadas.
Embora o post utilize números apresentados pelo médico na entrevista, omite que a unidade hospitalar onde ele trabalha atende predominantemente pessoas idosas, maior faixa etária vacinada no país, aumentando, assim, a quantidade de pessoas vacinadas atendidas.
O Ministério de Saúde israelense informou que a mais recente onda de contaminações se dá, em parte, por causa da diminuição na proteção das pessoas vacinadas em janeiro e fevereiro. Com base nisso, o órgão passou a recomendar uma terceira dose para os idosos.
O post também não contextualiza o que Kobi Haviv fala sobre o assunto em pelo menos mais duas entrevistas – uma para a mesma emissora de TV e outra para uma rádio local, todas na mesma semana: ele defende a vacinação, reforça o poder da vacina em proteger as pessoas em casos mais graves e aconselha, inclusive, a aplicação da terceira dose. Desta forma, a médica abre espaço para que os seguidores – mais de 34 mil – interpretem que os imunizantes são ineficazes, como fica claro em grande parte dos comentários criticando a política de vacinação durante a pandemia.
A reportagem tentou falar com a profissional pelo Twitter, onde ela fez a postagem, mas o perfil mantém fechado o canal para mensagens privadas. Uma mensagem solicitando um meio de contato foi deixada na postagem. O Comprova classificou o conteúdo como enganoso porque ele retira informações de contexto e as utiliza de modo a confundir.
Como verificamos?
O primeiro passo foi fazer uma busca reversa de imagens de frames do vídeo compartilhado no Twitter pela médica, sem resultados. Contudo, buscando no Google pelos termos citados, como o nome do médico entrevistado, encontramos o mesmo vídeo em duas plataformas distintas: o YouTube e o UGETube – site norte-americano mantido pelo grupo Utah Gun Exchange para comércio de armamentos e munição.
Também localizamos um vídeo com conteúdo similar no Facebook. O material foi postado às 10h13 do dia 23 de julho de 2021 pela conta oficial do Herzog Hospital. O tema da entrevista é o mesmo daquele aqui verificado, ela foi concedida à mesma emissora de TV e para a mesma jornalista – Sivan Cohen Saban –, mas é possível perceber que os vídeos são diferentes porque Sivan usa roupas de cores distintas nos dois vídeos e faz saudações diferentes nas duas ocasiões.
| Vídeo compartilhado no Twitter
| Vídeo postado na conta do Herzog Hospital no Facebook
As entrevistas foram concedidas em hebraico e, por isso, pedimos que duas pessoas que falam o idioma assistissem aos dois vídeos e traduzissem o conteúdo. Os vídeos foram vistos pelo historiador Magide Jarallah Dracoulakis Nunes e pelo rabino Gilberto Ventura, fundador do Sinagoga sem Fronteiras, que faz o acolhimento, a nível nacional, das comunidades brasileiras dos descendentes dos judeus forçados pela inquisição.
Ambos afirmaram que o conteúdo das entrevistas eram similares, mas também apontaram informações contidas no vídeo postado no Facebook do hospital que não aparecem nas imagens que viralizaram nas redes.
Também fizemos uma busca pelo nome do médico em hebraico – קובי חביב – na ferramenta de busca de notícias do Google e localizamos textos em veículos de mídia de Israel que repercutiam as declarações feitas por Kobi Haviv, sobre o mesmo assunto, na rádio 103 FM de Israel. A entrevista concedida a Anat Davidov no dia 27 de julho tem cerca de 10 minutos de duração.
Foram analisados os dados atuais da pandemia nos Estados Unidos e em Israel, por meio das plataformas dos governos e pela imprensa. Para isso, foi necessária a ajuda da ferramenta de tradução do Google, já que muitas informações estavam em hebraico.
Entramos em contato, ainda, com o Herzog Hospital, com o CDC, com o Ministério da Saúde de Israel e com o médico Shimshon Erdman, diretor do Departamento de Relações Internacionais com a América Latina da Associação Médica de Israel. Por fim, tentamos contactar a autora do tuíte. Apenas o Ministério da Saúde de Israel e Shimshon Erdman retornaram ao nosso contato por e-mail.
O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 13 de agosto de 2021.
Verificação
O vídeo e os números
O tuíte verificado foi postado por uma médica infectologista brasileira. No post, ela destaca alguns números e compartilha um link que leva a um vídeo de 42 segundos no qual o chefe do Herzog Hospital de Jerusalém, Kobi Haviv, é entrevistado pela jornalista Sivan Cohen Saban, do Canal 13 de Israel, e afirma que de 85% a 90% das pessoas hospitalizadas na unidade estão totalmente vacinadas.
No vídeo compartilhado, há uma legenda em inglês sobreposta à chamada feita pela própria emissora. O Comprova não conseguiu localizar o vídeo original, mas encontrou outras duas entrevistas concedidas pelo mesmo médico entre os dias 23 e 27 de julho deste ano.
A postagem feita pela médica destaca os números informados por Kobi Haviv – de 85% a 90% dos hospitalizados sendo pessoas vacinadas – e acrescenta um segundo dado, de que 95% desses pacientes hospitalizados eram vacinados e tinham quadro grave. Este percentual aparece na legenda original em hebraico feita pela emissora de TV. Pedimos, então, que o rabino Gilberto Ventura, do Sinagoga sem Fronteiras, confirmasse se o médico menciona esse número em sua fala. O rabino afirma que não, e que o número citado pelo médico no vídeo que viralizou é de 90% de vacinados internados.
A autora do tuíte usa estes números para questionar por que o quadro nos Estados Unidos seria diferente do de Israel, afirmando que o CDC mente ao dizer que 97% dos casos de hospitalizados são de pessoas não vacinadas. A infectologista não apresenta, contudo, dados que comprovem o que diz.
Médico defende as vacinas
Embora a maior parte dos números apresentados pela médica tenham, de fato, sido ditos por Kobi Haviv, ela não contextualiza as informações, o que faz parecer que o diretor do Herzog Hospital é contrário à vacinação, e isso não é verdade. Em entrevistas concedidas à mesma emissora de TV e à rádio 103 FM, Havivi afirma que a maioria dos pacientes graves do hospital foi vacinada e que esperava por um aumento no número de casos quando a equipe acompanhou a variável B.1.617.2 (Delta) agindo na Itália.
Ele acredita que a efetividade das vacinas tem diminuído e informa que a maioria dos pacientes tem mais de 70 anos e que mais de 90% estão vacinados. Diferentemente do que sugere o post feito pela médica, o diretor da unidade defende a vacinação, ressalta que muitos infectados permanecem com quadros leves graças à vacina e se coloca favorável à aplicação de uma terceira dose, o que já está ocorrendo em Israel
Estas informações estão em um texto publicado pelo jornal Ma’ariv, um diário dos mais vendidos do país, que compartilhou, além dos dados, o áudio da entrevista concedida por ele à rádio 103 FM no dia 27 de julho.
O Comprova entrou em contato com a unidade hospitalar, via Facebook, mas não houve retorno. Também solicitou ao Ministério da Saúde israelense detalhes sobre o atendimento no local e se o diretor é considerado uma autoridade em saúde no país, mas não obteve resposta para este ponto.
O médico Shimshon Erdman, diretor do Departamento de Relações Internacionais com a América Latina da Associação Médica de Israel, disse ao Comprova que a unidade dirigida por Kobi Haviv é um centro que trata pacientes com problemas de saúde agravados pela idade e que o médico indica que os pacientes e a equipe recebam uma terceira dose da vacina, o que já está acontecendo.
Por se tratar de um centro especializado, é natural que receba maior número de pessoas vacinadas, visto que esta é a faixa etária com a maior cobertura vacinal em Israel até o momento, segundo o painel de dados (abaixo) relacionados à doença no país, atualizado no dia 12 de agosto.
A plataforma demonstra o número de pacientes ativos e em estado grave, de acordo com as faixas etárias da população e conforme as condições de imunização de cada uma, apresentando, inclusive, a comparação entre a incidência de pacientes para cada 100 mil residentes em cada etapa de imunização: totalmente vacinado; parcialmente vacinado; e não vacinado.
Apesar da maioria dos pacientes ter sido totalmente vacinada, segundo os números absolutos, quando a análise é feita a partir dos números relativos, conforme orientou o Ministério da Saúde de Israel à reportagem, e considerando a taxa de 100 mil habitantes, é possível perceber um maior número de hospitalizados dentre as pessoas não vacinadas no país.
| Números relativos
| Números absolutos
Como explica reportagem do Viva Bem UOL, o sistema imune inicia um processo de declínio progressivo aos 20 anos e as pessoas tornam-se mais vulneráveis às doenças ao final da vida, o que explica a maior vulnerabilidade dos idosos à covid.
Shimshon Erdman também afirma que os vacinados não sofrem com a gravidade da doença, mas, quanto menores os antígenos, mais difícil será lutar contra a contaminação. Assim como Kobi Haviv, ele diz apoiar a aplicação da terceira dose.
Israel vê aumento de infecções diante da variante delta
No início de julho, o Ministério da Saúde de Israel relatou que a efetividade da vacina da Pfizer – imunizante mais aplicado no país – contra infecções e casos sintomáticos de covid-19 havia caído para 64% desde 6 de junho. O órgão destacava, contudo, que a vacina continuou tendo 93% de efetividade na prevenção de hospitalizações e casos graves da doença. “Consideramos a vacinação a ferramenta mais eficaz no combate à pandemia”, afirmou o ministério ao Comprova.
Em uma checagem publicada pelo Comprova, em 5 de agosto, a pasta informou que a mais recente onda de contaminações começou em meados de junho e avaliou que o aumento no número de contágios se dá, em parte, por causa da diminuição na proteção das pessoas vacinadas em janeiro e fevereiro. Com base nisso, o órgão passou a recomendar uma terceira dose para os idosos.
O site do órgão mantém uma aba sobre a aplicação desta terceira dose da vacina, explicando os motivos e informando que, entre os infectados, estão crianças, a maioria não vacinada, e também uma parcela imunizada, incluindo com morbidade particularmente grave entre adultos com 60 anos ou mais.
O governo explica que o benefício esperado da administração da terceira dose é baseado em estudos conduzidos por fabricantes de vacinas, os quais apontam que uma terceira dose após a dose basal causa um impulso que aumenta o nível de anticorpos, a qualidade e a duração no corpo. O resultado é um aumento na capacidade dos anticorpos em protegerem contra o vírus.
Ao Comprova, o médico Shimshon Erdman explicou que Israel enfrenta um impulso muito agressivo da pandemia com números que eram registrados desde o início da pandemia. “É enormemente contagioso, com um aumento gráfico assustador, dobrando os números de semana para semana, e também criando a sensação de que se a população não respeitar as indicações não haverá reação diferente que fazer o encerramento total das atividades”, alerta.
O país também vê o número de casos crescer. Em 27 de julho, o CDC divulgou orientações atualizadas sobre a necessidade de aumentar urgentemente a cobertura de vacinação da covid-19 e uma recomendação para que todos em áreas de alta transmissão usem máscara em locais públicos fechados, mesmo aqueles totalmente vacinados.
O principal motivo foi uma reversão na trajetória descendente dos casos, tendo sido observado um aumento rápido e alarmante no caso de covid e nas taxas de hospitalização em todo o país ao longo do mês.
De acordo com o órgão, no final de junho a média móvel em sete dias era de 12 mil casos confirmados. Em 27 de julho, entretanto, essa média atingiu mais de 60 mil casos, sendo considerada maior que a existente antes da vacina estar amplamente disponível.
Outro motivo foi o surgimento de novos dados de que a variante delta é mais infecciosa e está levando a uma maior transmissibilidade quando comparada a outras variantes, mesmo em indivíduos já vacinados, sendo atualmente a cepa predominante do vírus nos Estados Unidos.
Um estudo divulgado pelo centro, por exemplo, apontou que em julho de 2021, após vários eventos públicos em um condado de Barnstable, Massachusetts, 469 casos de covid foram identificados entre pessoas que viajaram para a cidade entre os dias 3 e 17 de julho. Destes, 346 (74%) ocorreram em pessoas totalmente vacinadas. Os testes identificaram a variante delta em 90% das amostras de 133 pacientes. No total, cinco pessoas foram hospitalizadas, quatro delas vacinadas, e não houve óbitos.
O CDC afirma que as vacinas são altamente eficazes, inclusive contra a variante delta, na prevenção do agravamento da doença e morte, mas não são 100% eficazes e algumas pessoas totalmente vacinadas são infectadas.
| Mapa de risco dos Estados Unidos em 11/08 (Fonte: CDC)
Quem postou?
O tuíte foi postado pela médica Roberta Lacerda Almeida de Miranda Dantas, que possui registro emitido pelo Conselho Regional de Medicina do Rio Grande do Norte, tendo como especialidade a infectologia. Ela mantém um canal com 32 mil inscritos no YouTube, no qual afirma trazer “novidades” e responder “perguntas sobre temas de saúde e tratamento imediato para a covid-19”.
Ela defende o “tratamento precoce” contra a covid, com o uso de medicamentos como ivermectina, azitromicina e hidroxicloroquina, que não têm eficácia comprovada contra a doença, tendo sido convidada, inclusive, a debater o tema, em maio deste ano, em reunião da Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara dos Deputados.
O Comprova tentou falar com a profissional pela plataforma na qual fez a postagem, mas o espaço para envio de mensagens está fechado. Foi deixada uma resposta à publicação solicitando um meio de contato.
Por que investigamos?
Em sua quarta fase, o Comprova verifica conteúdos suspeitos sobre pandemia, políticas públicas do governo federal e eleições que viralizam nas redes. A postagem aqui verificada foi curtida 1,7 mil vezes, além de ter sido retuitada 439 vezes.
Conteúdos enganosos envolvendo as vacinas e autoridades e órgãos de saúde podem levar a população a rejeitar as recomendações de combate à pandemia e, assim, colocar-se em risco.
Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações ou que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor.