O Projeto Comprova é uma iniciativa colaborativa e sem fins lucrativos liderada pela Abraji e que reúne jornalistas de 41 veículos de comunicação brasileiros para descobrir, investigar e desmascarar conteúdos suspeitos sobre políticas públicas, eleições, saúde e mudanças climáticas que foram compartilhadas nas redes sociais ou por aplicativos de mensagens.
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Saúde

Investigado por: 2022-02-07

Maioria dos infectados pela ômicron não foi vacinada, ao contrário do que afirma médico

  • Falso
Falso
São falsas as afirmações de um médico que nega a epidemia de influenza no Brasil e diz que a variante ômicron infectou mais as pessoas vacinadas contra covid-19. Ao contrário do que diz o profissional, o Ministério da Saúde e o Conselho Nacional de Saúde (CNS) reconhecem o aumento de casos de influenza, em especial da variante H3N2 e vários estados declaram epidemia ou surto da doença. Já em relação à covid, estudos mostram que a maior parte dos infectados pela ômicron não foram vacinados.
  • Conteúdo verificado: Vídeo de um médico contestando a veracidade da epidemia de influenza no Brasil e sugerindo que pessoas vacinadas contra o coronavírus são mais suscetíveis a contaminação pela variante ômicron.

São falsas as afirmações difundidas pelo médico Rubens Amaral em um vídeo no Instagram e no Telegram. Ele nega a epidemia de influenza no Brasil e diz que pessoas vacinadas contra a covid-19 estão mais vulneráveis à variante ômicron.

O profissional afirma que, como os sintomas causados pela ômicron são semelhantes aos da gripe, as pessoas contaminadas pela H3N2 estariam, na verdade, infectadas com a variante do coronavírus.

O médico ainda recomenda o tratamento precoce, que não tem eficácia comprovada.

Ao contrário do que diz Amaral, o Ministério da Saúde e o Conselho Nacional de Saúde reconhecem o aumento de casos de influenza, em especial da variante H3N2, e vários estados já declararam situação de epidemia ou surto da doença.

Em relação à covid, estudos feitos nos Estados Unidos mostram que a maior parte dos infectados pela ômicron não foram vacinados. Além disso, segundo um estudo realizado pelo Imperial College de Londres, o risco de reinfecção por covid-19 pela ômicron na comparação com a delta é maior para não vacinados (6,4 vezes) do que para vacinados (5 vezes). O resultado do estudo foi destacado em um relatório da Organização Mundial da Saúde (OMS) sobre o avanço da variante publicado em janeiro. 

Embora pessoas vacinadas possam se infectar com a ômicron, não há nenhuma evidência científica que comprove que a variante contamine de forma mais expressiva essas pessoas. Inclusive, caso contaminados com a cepa, indivíduos vacinados devem ter sintomas leves justamente pela proteção dos imunizantes.

O Comprova entrou em contato com o médico, questionando as fontes utilizadas por ele para embasar o que é dito no vídeo aqui verificado, mas não houve retorno até a publicação desta checagem.

Todo conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original é classificado como falso pelo Comprova..

Como verificamos?

O primeiro passo da verificação foi a busca por dados oficiais a respeito da disseminação da gripe influenza no Brasil para dimensionar a ocorrência de casos da doença no verão.

Para isso, procuramos informações nos sites oficiais de autoridades sanitárias, como o Conselho Nacional de Saúde, a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), o Instituto Butantan, o Ministério da Saúde e a Organização Mundial da Saúde (OMS). Também entramos em contato com o Ministério da Saúde.

O segundo passo foi encontrar estudos científicos a respeito da variante ômicron do coronavírus e sua relação com o sistema imunológico de pessoas vacinadas. Sobre essa temática foram utilizadas pesquisas da Agência de Segurança de Saúde do Reino Unido, do Instituto Nacional de Doenças Comunicáveis (NICD) e do Centro de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos.

Além disso, entrevistamos o diretor do laboratório de imunologia do Instituto do Coração do Hospital das Clínicas (Incor), Jorge Kalil, para esclarecer sobre a infecção pela cepa ômicron e o perfil das pessoas infectadas pela variante.

Por fim, o Comprova entrou em contato com o autor do vídeo, o médico Rubens Amaral, por meio de telefone disponível em suas redes sociais, mas não obteve retorno até o fechamento desta verificação.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 7 de fevereiro de 2021.

Verificação

Epidemia de influenza no Brasil

Embora o médico negue que há uma epidemia de influenza no Brasil no verão, o Conselho Nacional de Saúde e secretarias de saúde de estados como Paraná reconhecem a situação. O aumento de casos de gripe — em especial da variante H3N2 — é reconhecido também pelo governo federal.

Em uma publicação nas redes sociais, o secretário-executivo do Ministério da Saúde, Rodrigo Cruz, afirma que a cepa Darwin, da influenza H3N2, foi registrada em vários estados.

“Estamos enfrentando tanto o vírus da #GripeH3N2, como a #Covid19, em que ambos atacam o sistema respiratório e apresentam sintomas bem parecidos”, escreveu.

Em dezembro de 2021, 17 estados notificaram aumento incomum dos casos de influenza. Pelo menos 11 estados registraram mortes pela variante H3N2.

Em nota enviada ao Comprova, o Ministério da Saúde informou que o padrão de sazonalidade da influenza varia entre as regiões do país, sendo mais marcado naquelas com estações climáticas definidas, ocorrendo com maior frequência nos meses mais frios e em locais de clima temperado.

Por este motivo, espera-se um aumento de casos no outono e inverno, o que não impede a circulação da H3N2 em outras épocas do ano, devido às diferenças geográficas e climáticas.

O órgão explica que para verificar se existe uma epidemia, é preciso avaliar os dados da doença e suas características epidemiológicas locais, sendo através de uma série histórica (avaliando os dados de anos anteriores, o conhecimento e comportamento da doença) ou por meio de uma análise epidemiológica minuciosa (dados de tempo, pessoa e lugar).

“Em 2021, a partir do mês de outubro, mesmo com a pandemia do SARS-CoV-2, começou a ser observada a circulação dos vírus influenza de maneira intensificada e com predominância do vírus influenza A (H3N2) – indicando um início de sazonalidade de temporalidade atípica em algumas unidades federadas do país, podendo ser configurada como uma epidemia, ou surtos localizados de influenza A (H3N2) e que já se encontra em redução”, diz a nota.

Em entrevista ao Comprova, o diretor do laboratório de imunologia do Instituto do Coração do Hospital das Clínicas (Incor), Jorge Kalil, diz que epidemias e surtos de influenza são incomuns no verão. Apesar de terem sintomas parecidos com os da covid, testes laboratoriais, explica Kalil, são capazes de diagnosticar o vírus.

“São feitos diagnósticos moleculares ou celulares para identificar a influenza. Ela realmente é incomum no verão, é uma anormalidade”, disse.

Em entrevista à Agência FioCruz de Notícias em dezembro de 2021, o pesquisador do Laboratório de Vírus Respiratórios e do Sarampo da Fiocruz Fernando Motta disse que um dos fatores que ajuda a entender o aumento dos casos de influenza é a combinação de uma circulação reduzida do vírus influenza em 2020 com a baixa adesão à campanha de vacinação em 2021.

No ano passado, o Brasil vacinou 72,1% do público-alvo, quando a meta era 90%. Vale lembrar que o imunizante contra a influenza, na época, não incluía a cepa H3N2. Os dados são do Ministério da Saúde. A campanha de imunização começou em abril e se estendeu até setembro diante da baixa adesão.

Ômicron entre vacinados

Outra afirmação falsa feita pelo médico é a de que a ômicron “aparece mais em pessoas picadas”, em referência a quem se vacinou contra covid-19. Ele chega a dizer que “as pessoas picadas têm um sistema imunológico que facilita a penetração da ômicron nelas”.

Jorge Kalil explica que, comprovadamente, a maior parte das pessoas que foram hospitalizadas ou morreram em decorrência da infecção pelo coronavírus foram as não vacinadas, o que refuta a alegação do médico de que a nova cepa apareceria mais em indivíduos imunizados.

Isso não significa, no entanto, que pessoas vacinadas não possam se contaminar com a ômicron. Segundo o especialista, a capacidade da variante ômicron escapar aos “anticorpos antigos” (gerados pela vacinação ou pela infecção por variantes anteriores) é alta, porém não total. Isso significa que pessoas vacinadas podem se contaminar com a cepa, mas o imunizante contribuirá para um quadro mais leve da doença.

“A resposta imunológica que você tinha pode ser mais fraca, é o que acontece com essas variantes. A vacina inicial dá uma imunidade e depois essas variantes escapam da resposta imune. Os anticorpos que você tem para bloquear essa contaminação não são mais ativos. Mas a gente sempre tem uma resposta celular. Essa resposta somada aos anticorpos que sobraram depois dessas mudanças na célula humana ainda são suficientes para deixar a doença mais leve”, diz.

Uma pesquisa do Instituto Nacional de Doenças Comunicáveis, da África do Sul, mostrou que a ômicron é menos grave que as outras variantes do coronavírus. Segundo o estudo, a onda gerada por essa variante teve menos casos graves e isso está associado à vacinação e a proteção conferida por infecções anteriores.

No dia 12 de janeiro, a Casa Branca, dos Estados Unidos, divulgou dois gráficos com base em informações do Departamento de Saúde de Nova York, referentes aos meses de outubro, novembro e dezembro de 2021 (veja abaixo).

| Gráfico mostra o número de casos e hospitalizações pela covid-19 entre pessoas vacinadas e não vacinadas. Fonte: Governo dos Estados Unidos. Imagem capturada em 2 de fevereiro às 16h54.

Desde o primeiro caso da ômicron registrado nos EUA, em 1º de dezembro, o número de infecções em pessoas não vacinadas foi de cerca de 500 para cada 100 mil habitantes, para mais de 3 mil para cada 100 mil habitantes em 19 de dezembro. Entre os vacinados, a taxa que se aproximava de zero, foi para 500 no mesmo período.

Em duas semanas, as hospitalizações decorrentes da ômicron entre os não vacinados aumentaram de cerca de 30 (para cada 100 mil habitantes), em 5 de dezembro, para 80 (para cada 100 mil habitantes). Entre os vacinados, o índice, que era quase zero, teve uma pequena alteração e ficou abaixo de 10.

O médico Jorge Kalil explica que a ômicron pode infectar pessoas vacinadas, mas que a maioria dos contaminados deve ter sintomas leves justamente pela proteção dos imunizantes.

“Existem algumas pessoas que apesar de terem sido vacinadas podem se infectar com a ômicron e ter doença leve. Agora, se você olhar qualquer estatística no mundo, você vai ver que 90 a 95% das pessoas que estão hospitalizadas ou vieram a morrer não são vacinadas, apesar de elas serem uma porção pequena da população”, pontua.

Outro estudo realizado nos Estados Unidos pelo CDC e publicado em janeiro de 2022 mostrou que as pessoas não vacinadas no país apresentaram um risco 53 vezes maior de morte por covid-19 em comparação com as pessoas vacinadas com duas e três doses.

Com a ômicron, o risco entre quem não se vacinou foi 13 vezes maior em relação aos imunizados. A dose de reforço apresentou taxa de proteção de 90% contra a variante.

O estudo “Effectiveness of a Third Dose of mRNA Vaccines Against COVID-19″ (Eficácia de uma terceira dose de vacinas do mRNA contra a COVID-19, tradução livre), do CDC, concluiu que pessoas vacinadas com dose de reforço são menos propensas a serem infectadas pela ômicron. A pesquisa foi publicada em 28 de janeiro deste ano.

Um segundo estudo, publicado na Revista Médica Jama em 21 de janeiro deste ano, mostrou que a dose de reforço ajudou a evitar que as pessoas adoecessem com a ômicron. A pesquisa avaliou pouco mais de 13 mil casos da variante nos EUA e descobriu que as chances de desenvolver uma infecção sintomática eram 66% menores para pessoas que receberam reforço em comparação com aquelas que receberam apenas duas injeções.

Uma verificação sobre o mesmo tema foi feita pela Agência Lupa em novembro de 2021. Segundo a Lupa, na época, não havia evidências científicas suficientes que comprovassem uma relação entre a nova variante ômicron e a vacinação. Além disso, não há nenhuma pesquisa que tenha concluído que a cepa é mais severa entre as pessoas totalmente imunizadas contra a covid-19.

Quem é Rubens Amaral

Rubens Amaral é formado em Medicina pela Faculdade de Ciências Médicas de Santos. Tem mestrado em Educação pela Universidade Católica de Santos, é especialista em nefrologia, fisiologia do exercício na saúde pela USP e coach pelo Instituto Brasileiro de Coaching.

Apoiador do presidente Jair Bolsonaro, Rubens Amaral é contrário à aplicação de vacinas para combater a covid-19 e já incentivou, repetidamente, o uso de ivermectina como tratamento precoce contra a doença, o que não tem eficácia comprovada pela ciência.

Em dezembro de 2021, o Comprova investigou uma afirmação enganosa do médico sobre a eficácia das vacinas frente ao surgimento de novas variantes do coronavírus.

Por que investigamos?

O Comprova verifica informações suspeitas que tenham viralizado nas redes sociais ou aplicativos de mensagens sobre políticas públicas, eleições presidenciais e a pandemia de covid-19. O conteúdo checado foi compartilhado no Instagram e no Telegram, tendo alcançado mais de 47 mil visualizações.

As opiniões do médico dão fôlego aos discursos contrários à imunização e à ciência, e contribuem para o aumento da desconfiança sobre as vacinas. Devido aos alcance que as publicações de Amaral têm nas redes sociais, informações falsas a respeito das vacinas e da pandemia são compartilhadas e difundidas por milhares de pessoas.

A eficácia e a segurança dos imunizantes já foram amplamente defendidas e comprovadas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e pelo Ministério da Saúde. Além de prevenir quadros graves da doença, as vacinas reduzem as chances de contaminação e transmissão do vírus.

Ao longo da pandemia, o Comprova fez diversas verificações que refutam falas e conteúdos compartilhados na internet que desacreditam a ciência e impactam negativamente no combate ao coronavírus. Alguns exemplos são as verificações a respeito da proteção das máscaras contra a epidemia de H3N2, que é falsa a afirmação de um médico sobre o vírus da covid ser parcialmente desconhecido e que as vacinas são “lixo”, e que a ômicron existe e não é um conceito criado apenas para esconder os efeitos adversos das vacinas contra o coronavírus.

Outra fala do médico Rubens Amaral também já foi verificada pelo Comprova. Na ocasião, foi confirmado que, ao contrário do que afirmou o profissional, as vacinas contra a covid-19 continuam sendo eficazes mesmo com o surgimento de novas variantes do vírus.

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado.

Saúde

Investigado por: 2022-02-04

É enganoso vídeo que usa limão para desacreditar testes de covid-19

  • Enganoso
Enganoso
É enganoso um vídeo em que uma mulher obtém um resultado positivo em teste rápido de antígeno para covid-19 usando o suco de um limão. Ela sugere que isso prova que os testes são falsos. Uma especialista ouvida pelo Comprova explica que a acidez do limão pode interagir de modo incorreto com reagente do teste. O mecanismo é feito para entrar em contato com material humano, como a saliva, e deve seguir regras estritas de manuseio para garantir o resultado correto.
  • Conteúdo verificado: Vídeo que circula em grupos do WhatsApp, Twitter e Facebook, em que uma mulher faz um teste rápido de antígeno para Sars-CoV-2 usando o suco de um limão e, após obter resultado positivo, diz que a fruta “está com covid”. Ao final, ela pede que as pessoas “acordem”, sugerindo que os testes para detecção da doença são falsos.

Um vídeo que circula nas redes sociais engana ao sugerir que os testes rápidos de antígeno para detectar a covid-19 são falsos, tendo como base a aplicação em um deles de suco de limão. Esse tipo de mecanismo foi desenvolvido para entrar em contato com material humano, como a saliva ou fluidos da cavidade nasal. As especificações do fabricante dizem que o uso tem que ser feito de forma adequada, seguindo todos os passos corretamente, sob o risco de inviabilizar o resultado.

Especialistas ouvidos pelo Comprova explicam que o uso de outras substâncias, como o limão, pode interferir de forma incorreta no reagente. Segundo uma hipótese, a causa da alteração no resultado é a acidez da fruta, que é superior à dos fluidos humanos.

No Reino Unido, pais foram alertados de que os estudantes estavam utilizando substâncias similares para “burlar” os testes e serem liberados das aulas. Também há vários vídeos no TikTok, aplicativo bastante usado por adolescentes, que ensinam a usar outras substâncias para conseguir falsos positivos no exame de antígenos.

Apesar disso, quando utilizados corretamente, testes rápidos são uma ferramenta importante para que as pessoas saibam quando devem se isolar e evitar a transmissão do vírus. Por isso, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) liberou, em 28 de janeiro deste ano, a comercialização de autotestes de antígeno em território nacional como estratégia inicial de triagem no controle da pandemia.

O vídeo foi considerado enganoso porque utiliza dados imprecisos e confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Como verificamos?

Inicialmente, procuramos por imagens de testes rápidos de covid-19 no Google para tentar encontrar algum com a mesma embalagem que aparece no vídeo. A partir daí, conseguimos identificar que se tratava de um teste de antígeno da marca Genrui. Em novas pesquisas, descobrimos falhas nos testes fabricados pela empresa no exterior e um alerta de farmacovigilância emitido pela Anvisa em relação a eles. A partir desse alerta, foi possível descobrir que a empresa responsável pelo registro dos produtos da Genrui Biotech no Brasil é a 1000Medic, com sede no Paraná. Entramos em contato com a 1000Medic e com a Genrui por e-mail e WhatsApp, mas não tivemos retorno de nenhuma delas.

Por meio de buscas on-line, encontramos informações sobre jovens tentando usar alimentos para burlar os testes de antígeno no exterior. Como as notícias indicavam que as informações eram muitas vezes compartilhadas através do TikTok, fizemos uma procura pelas hashtags citadas e encontramos vídeos semelhantes ao investigado na plataforma. Também fizemos pesquisas para entender como funciona cada teste para detecção da covid-19. No site da 1000Medic, encontramos as especificações do exame utilizado no vídeo.

Entrevistamos especialistas para tentar entender por que o teste reagiu positivamente em contato com o limão. Ouvimos a bióloga Maíra Mello Rezende Valle, professora adjunta do Departamento de Fisiologia da Universidade Federal do Paraná (UFPR), e o farmacêutico Miler Heleno Teixeira, gerente responsável pelos testes na Drogaria Pacheco de Juiz de Fora, em Minas Gerais.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 4 de fevereiro de 2022.

Verificação

Qual o teste usado no vídeo?

Em determinado ponto do vídeo, é possível observar a embalagem do teste, com um detalhe lateral marcante. Uma comparação com as embalagens de testes de antígenos utilizados no Brasil nos levou ao kit fabricado pela empresa Genrui e, conforme as imagens, é possível notar a semelhança na cor e no desenho dos rótulos.

 

O Comprova entrou em contato com a 1000Medic, responsável pela importação e distribuição dos produtos da Genrui Biotech no Brasil, bem como com a companhia chinesa, mas não teve retorno até a publicação desta verificação.

Em 7 de janeiro deste ano, a Autoridade Nacional do Medicamento e dos Produtos de Saúde (Infarmed), órgão de farmacovigilância do governo de Portugal, emitiu um comunicado dizendo ter sido informada de 550 incidentes de falso positivo com os testes da Genrui na Irlanda. Por isso, os testes dessa marca seriam recolhidos em Portugal, embora no país, até o momento, houve o registro de apenas sete casos de falso positivo entre 7 milhões de autotestes da fabricante distribuídos ao mercado.

Em 28 de janeiro, a Infarmed disse que, após investigação feita pela fabricante, concluiu-se que o problema dos falsos positivos teria ocorrido por causa de contaminação durante o processo de fabricação da solução de diluente usada em dois lotes específicos: 20211008 e 20211125. À época, os dois lotes estavam sendo recolhidos do mercado europeu.

No Brasil, em 9 de outubro de 2020, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) emitiu um alerta de tecnovigilância em relação a testes de covid-19 da Genrui. No caso brasileiro, o pedido era apenas para que fossem atualizadas as informações sobre a sensibilidade do produto, que havia sido reportada de modo incorreto nas instruções de uso de um lote específico: 20200505.

“O fabricante foi informado, investigou o ocorrido e concluiu que as informações das instruções de uso foram baseadas no estudo clínico inicial, que apresentou resultado de 100% para sensibilidade e especificidade. Porém, após novos estudos, observou-se variação nos referidos parâmetros, que não havia sido considerada para a elaboração das instruções de uso. Portanto, as instruções de uso foram atualizadas com as informações corretas dos parâmetros”, diz o texto emitido pela Anvisa.

O que dizem os especialistas?

De acordo com os especialistas procurados pelo Comprova, a reação mostrada no vídeo é enganosa na medida em que acontece um desvio de finalidade do teste. Para os profissionais, embora a reação química apresentada gere um resultado positivo, isso não significa que os testes não sejam confiáveis ou seguros.

Maíra Mello Rezende Valle destaca que o resultado apresentado no vídeo, embora possa ser verdadeiro, não indica a presença da covid-19, uma vez que a variação de pH (nível de acidez ou basicidade) pode alterar a sensibilidade do teste.

A pesquisadora explica que os testes rápidos, como o de antígeno (que é utilizado no vídeo), têm anticorpos capazes de reagir à presença do vírus. Quando a amostra coletada é colocada na solução própria para testagem, acontece a quebra do vírus em partículas menores. A solução, em contato com a lâmina, gera uma reação química que provoca a mudança da cor da linha.

(O teste) tem o anticorpo acoplado na lâmina e quando você coloca um antígeno que vem, por exemplo, com a sua saliva ou com o seu sangue, ele vai aglutinar ali e vai gerar uma cor que é aquela linhazinha. Só que esses anticorpos são substâncias químicas também, principalmente proteínas. A proteína muda a conformação dela de acordo com o pH. (…) O que é o limão? É uma substância extremamente ácida; ele tem ácido cítrico”. Valle explica, então, que esse uso do limão é responsável por burlar o teste, fazendo com que apareça a linha indicadora do positivo. A pesquisadora ressalta, no entanto, que “não necessariamente existe positividade no teste”.

O farmacêutico Miler Heleno Teixeira ressalta que os testes para covid-19 foram criados especificamente para testagem humana. Uma vez que o produto é colocado em contato com outras substâncias, como o suco de limão, o resultado pode ser afetado. “A pessoa que fez o teste (no vídeo) com limão provocou uma reação que não é normal, sinalizando positivo. Mas é um resultado inconclusivo, não quer dizer que o limão tenha covid”.

Embora o resultado apresentado no vídeo seja positivo, Teixeira ressalta que não é possível estabelecer relações únicas entre o ácido e o resultado apresentado.

Como funcionam os testes de antígeno

Os testes de antígeno usam o chamado método de fluxo lateral à base de ouro coloidal para detectar a proteína do nucleocapsídeo (que é uma parte específica da composição do SARS-CoV-2). Os testes de fluxo lateral são usados para diversos fins e, em geral, são considerados bastante confiáveis. O mais comum deles é o teste de gravidez através da urina.

Segundo documento da Secretaria de Ciência, Tecnologia, Inovação e Insumos Estratégicos em Saúde, ligada ao Ministério da Saúde, os testes de antígeno apresentam confiabilidade entre 85 e 90% em seus resultados, sendo ainda maior em pacientes com carga viral elevada, testados até o quinto ou sétimo dia da doença.

No caso dos testes desenvolvidos para detectar os antígenos, o princípio é estimular uma reação imunológica dos anticorpos que estão fixados na lâmina. Quando essa reação é desencadeada, a faixa muda de cor – por isso, o processo é chamado de cromatografia.

Em outras palavras, quando a substância a ser analisada (por exemplo, a saliva, após mergulhada em solução própria, para promover a quebra do vírus) é colocada no local indicado, ela se mistura ao conteúdo ali presente e o composto vai migrando, através da membrana que cobre a lâmina, até atingir uma linha revestida com o anticorpo monoclonal para o SARS-CoV-2. Se essa linha se tornar visível, quer dizer que foi produzida uma reação imunológica, e o resultado indica que a pessoa tem o vírus em sua saliva.

Os testes de anticorpos, por sua vez, têm a janela de testagem maior e o fluido coletado é o sangue, pois nele são produzidos os anticorpos em resposta ao contato com o antígeno. Assim, é possível determinar se a pessoa foi, no passado, infectada e, em reação, desenvolveu os referidos anticorpos.

Jovens no exterior descobrem como burlar autotestes

Em 24 de junho de 2021, um e-mail da escola Gateacre, na cidade de Liverpool, Inglaterra, foi encaminhado aos pais, pedindo para que ficassem atentos no momento de seus filhos realizarem os testes em casa. O aviso se deu após professores ouvirem rumores de que alunos haviam descoberto como burlar os resultados utilizando sucos de frutas, para que indicassem uma falsa infecção pelo vírus e, assim, não precisassem comparecer às aulas. Poucos dias antes, a Gateacre havia suspendido as aulas de algumas turmas depois de alunos terem testado positivo para covid-19.

No Reino Unido, os autotestes foram adotados nacionalmente com a reabertura das escolas em 8 de março do 2021. Alunos e funcionários da educação precisam se testar duas vezes por semana e, no caso de resultado positivo para o teste rápido de antígenos, devem realizar uma confirmação no prazo máximo de 48 horas através do teste RT-PCR.

Casos semelhantes ao de Liverpool foram relatados pela imprensa britânica, apontando para essas táticas de burlar os testes descobertas pelos jovens.

Desde o ano passado, uma onda de vídeos compartilhados no TikTok mostra estratégias para obter falsos resultados positivos por meio do teste de antígenos. Após denúncias por veículos britânicos, a plataforma parece ter apagado os vídeos que aparecem na busca pela hashtag #fakecovidtest, conforme noticiado pelo portal iNews em julho de 2021.

Contudo, ao procurarmos pela hashtag #covidtestchallenge no aplicativo, ainda é possível encontrar alguns vídeos demonstrando o uso de refrigerantes e sucos industrializados para obter falsos positivos. No TikTok está compartilhado também o vídeo com a testagem do limão, que chegou até nós pelo WhatsApp.

Diante dos fatos, uma equipe de cientistas da Universidade de Liverpool conduziu um estudo, disponibilizado em 5 de julho de 2021 na plataforma medRxiv e ainda não revisado por pares, em que foram analisados testes de antígeno da empresa Innova Med Group, distribuídos no Reino Unido, utilizando 14 amostras de refrigerantes e sucos prontos, a fim de observar os resultados. Ao todo, dez amostras mostraram resultado positivo ou uma leve marcação da faixa que indica infecção pelo vírus. A testagem foi reproduzida em dois lotes diferentes do produto, obtendo os mesmos resultados.

De acordo com os pesquisadores, o estudo não permite concluir que exista alguma relação especificamente entre a acidez das bebidas e o resultado de falso positivo, nem cita os mecanismos agindo para que isso aconteça. A análise da água com gás não ativou reações, o que excluiu a gaseificação como responsável. Também foram verificados quatro adoçantes utilizados em bebidas, nenhum deles obtendo falso positivo.

Contexto dos autotestes no Brasil

O conteúdo verificado foi divulgado em meio a um contexto de desencontros entre o governo federal e a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) em relação à liberação dos autotestes de covid-19. A alternativa, mais ágil e prática, uma vez que se trata de um produto com o qual o próprio cidadão pode realizar todas as etapas de testagem sem precisar da ajuda de profissionais, gerou diversas discussões e só foi autorizada pela Anvisa no dia 28 de janeiro deste ano.

As tentativas de liberar o autoteste começaram ainda no início do ano, quando, no dia 13 de janeiro, o Ministério da Saúde encaminhou uma nota técnica para a Anvisa com justificativas para a aprovação. O documento explica que essa é uma estratégia complementar ao Plano Nacional de Expansão da Testagem, que foi lançado em setembro de 2021. O motivo para o pedido foi um aumento expressivo no número de infecções, causado pela chegada da variante ômicron do coronavírus no País. Segundo a pasta, esses testes podem ser excelentes como triagem e para permitir que pessoas infectadas se isolem. Já no dia 19, a Anvisa adiou a decisão sobre liberação dos autotestes cobrando mais informações do Ministério, como dados a respeito da notificação de casos positivos, da falta de regulamentação e de política pública. Somente no dia 21, a Anvisa e o Ministério da Saúde fizeram a primeira reunião para discutir a aprovação dos autotestes.

O empecilho para a aprovação tem relação com a Resolução da Diretoria Colegiada 36/2015 da Anvisa, que proíbe a realização de autotestes em caso de doenças infectocontagiosas que têm notificações compulsórias, abrindo exceção apenas para casos em que o Ministério da Saúde propõe uma política pública para servir de base. Para a Anvisa, no entanto, não houve essa apresentação por meio da pasta. No dia 26 de janeiro, então, a agência recebeu o documento formal com a inserção dos autotestes no Plano Nacional de Expansão da Testagem para Covid-19, dando o aval no dia 28.

No site da Anvisa, um documento de perguntas frequentes sobre os autotestes de covid-19 esclarece diversas dúvidas sobre o assunto. Uma das afirmações da agência é que “é importante destacar que os testes rápidos de antígeno aprovados para uso profissional não podem ser utilizados como autotestes por usuários leigos. Estes produtos podem apresentar diferenças quanto ao desempenho, o tipo de amostra a ser utilizada (que pode requerer treinamento profissional) e nas orientações das instruções de uso, trazendo risco à saúde e à confiabilidade do resultado se utilizados por pessoas não qualificadas”. A Anvisa ainda ressalta, ao longo de todo o documento, que o autoteste precisa ser utilizado como uma espécie de triagem para que o isolamento seja feito o quanto antes, quebrando assim a transmissão do vírus e reforça a necessidade de se buscar atendimento em um serviço de saúde para confirmar o diagnóstico.

Por que investigamos?

O Comprova verifica conteúdos suspeitos sobre a pandemia de covid-19, as políticas públicas do governo federal e as eleições de 2022 que tenham viralizado nas redes sociais. Quando se trata de temas relacionados à covid-19, a checagem se torna ainda mais necessária, visto que a desinformação sobre a doença pode levar as pessoas a não acreditarem nas recomendações das autoridades sanitárias e se expor a riscos desnecessários.

O vídeo verificado aqui foi sugerido pelos leitores do Comprova através do WhatsApp, onde circulou. Sugestões como esta podem ser encaminhadas pelo número (11) 97045-4984, ou clicando neste link. Conteúdos muito parecidos foram verificados por Aos Fatos, Boatos.org e Fullfact.

Nos últimos dias, o Comprova desmentiu informações falsas sobre a pandemia, mostrando que máscaras impedem a proliferação da covid-19 e não atrapalham a respiração e que não há registro de mortes de crianças causadas pela vacina contra a covid-19 no Brasil. Também explicou aos leitores por que eventos adversos graves pós-vacinação são raros e os benefícios da imunização superam os riscos.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; ou o conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Esta verificação foi feita por jornalistas que participam do Programa de Residência no Comprova

Saúde

Investigado por: 2022-02-04

É falso que vacinas tenham causado “milhares de mortes”; protestos em vídeo viral são contra passaporte vacinal

  • Falso
Falso
São falsas as informações dos vídeos que afirmam mostrar uma manifestação contra “milhares de mortes e efeitos adversos das vacinas”, em frente ao prédio da Pfizer, em Paris. Os protestos que aparecem nas imagens foram realizados na capital francesa e em Estocolmo, na Suécia, e são contra a exigência do passaporte vacinal. Não há qualquer menção a "milhares de mortes" com relação confirmada com as vacinas por parte das agências sanitárias internacionais.
  • Conteúdo verificado: Dois vídeos que circulam nas redes sociais mostram protestos em diferentes ângulos — imagens aéreas e terrestres — com a seguinte legenda: “Prédio da Pfizer cercado em Paris, o povo grita assassinos, devido às milhares de mortes e efeitos adversos das vacinas. Isso a Globo não mostra”.

São falsas as informações de dois vídeos compartilhados no TikTok e no Facebook que afirmam que o prédio da farmacêutica Pfizer foi cercado em Paris, na França, em um protesto contra as “milhares de mortes e efeitos adversos das vacinas”. Os vídeos mostram dois protestos diferentes — um na Suécia e outro na França —, mas nenhum dos atos tinha como pauta supostas mortes e efeitos adversos provocados pelos imunizantes. Nas duas ocasiões, as pessoas se manifestaram contra a exigência do passaporte vacinal.

O primeiro vídeo, visualizado mais de 63 mil vezes no TikTok antes de ser apagado pelo usuário na quinta-feira (3), foi gravado em Estocolmo, na Suécia, no dia 22 de janeiro de 2022. A legenda inserida na imagem mente duas vezes: primeiro, ao dizer que o ato ocorreu em frente ao prédio da Pfizer em Paris, e novamente ao dizer que o motivo da manifestação eram mortes e reações adversas provocadas pela vacina.

O segundo vídeo, compartilhado no Facebook, realmente mostra uma manifestação em frente à sede da Pfizer em Paris, no dia 29 de janeiro de 2022. Mas a legenda também mente sobre o motivo do protesto. Ele também era contra o passaporte vacinal, instituído na França em 24 de janeiro.

Consultadas pelo Comprova, a Agência Europeia de Medicamentos (EMA), a Food and Drug Administration (FDA) e a Organização Mundial da Saúde (OMS) não identificaram “milhares de mortes” relacionadas às vacinas. E afirmam que a grande maioria dos efeitos adversos são leves e de curta duração, sendo raros os casos graves.

Procurado, o autor da postagem no TikTok afirmou que recebeu o conteúdo por um grupo de WhatsApp e repostou. Após contato do Comprova, o vídeo foi excluído. Já a mulher que fez a publicação no Facebook não respondeu às mensagens.

O Comprova classificou esses conteúdos como falsos porque alteram a pauta dos protestos de modo deliberado, para espalhar uma mentira.

Como verificamos?

O Comprova buscou confirmar, inicialmente, a realização dos eventos que aparecem nos vídeos e suas pautas. Buscas reversas na internet a partir das imagens, consultas no Google sobre os protestos e a análise das características dos locais no Google Street View levaram à identificação de manifestações em Paris, na França, e em Estocolmo, na Suécia.

As buscas levaram aos vídeos originais, por meio dos quais foi possível identificar as pautas das manifestações e seus organizadores. Nos protestos, nas reportagens que cobriram os eventos e nas páginas dos responsáveis pelos atos não há qualquer menção a “milhares de mortes e efeitos adversos das vacinas”.

Em seguida, o Comprova buscou dados oficiais sobre efeitos adversos das vacinas e possíveis mortes relacionadas aos imunizantes. Foram procurados, por e-mail, a EMA, a OMS, a FDA e o CDC.

Também procuramos o governo francês e a Pfizer, que é citada nas postagens. Tivemos respostas da EMA, da FDA, da OMS e da Pfizer.

Por fim, o Comprova entrou em contato com os autores das publicações.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 4 de fevereiro de 2022.

Verificação

Vídeo no TikTok mostra ato em Estocolmo, não em Paris

Um dos conteúdos checados é um vídeo publicado no TikTok que mostra imagens de um protesto com a legenda “Prédio da Pfizer cercado em Paris, o povo grita assassinos, devido às milhares de mortes e efeitos adversos das vacinas. Isso a Globo não mostra”. O vídeo, entretanto, mostra um protesto ocorrido em Estocolmo, na Suécia, e não em Paris.

A partir do mecanismo de busca reversa, o Comprova encontrou o vídeo original, publicado no dia 22 de janeiro pela página de um grupo sueco chamado Frihetsrörelsen — Movimento de Liberdade, em tradução livre.

Buscando por notícias locais sobre o protesto na Suécia, os resultados retornaram uma matéria do Svenska Dagbladet, que informa que, no dia 22, ocorreram manifestações em Estocolmo e Gotemburgo contra o passaporte da vacina. A primeira reuniu entre 8 e 9 mil participantes, que partiram da praça Norrmalmstorg e marcharam ao longo de Hamngatan até a praça Sergel.

Ao buscar por esses locais no Google Street View, foi possível identificar prédios, placas e outros elementos que correspondiam às imagens do vídeo. Dessa forma, confirmamos que o protesto não ocorreu em frente ao prédio da Pfizer em Paris e, sim, em Estocolmo.

Além disso, as notícias locais afirmam que as manifestações de Estocolmo e Gotemburgo ocorreram contra o passaporte da vacinação, não pelas “milhares de mortes e efeitos adversos das vacinas”, como sustenta o vídeo. As publicações da página do movimento também não fazem menção a mortes supostamente relacionadas às vacinas. Um novo protesto, que também visa a revogação do passaporte da vacina, foi convocado para o dia 19 de março.

Atos na França e em frente ao prédio da Pfizer

O outro vídeo, postado no Facebook, realmente mostra uma manifestação em Paris, em frente ao edifício sede da Pfizer, mas, novamente, as pessoas não protestavam naquela ocasião contra supostas mortes e efeitos adversos das vacinas, e sim contra o passaporte vacinal.

As manifestações aconteceram no dia 29 em diversos pontos da França. Tanto a imprensa francesa quanto a internacional (1, 2, e 3) noticiaram os atos. O jornal Le Parisien publicou que o Ministério do Interior calculou em 30 mil pessoas o número de manifestantes em 162 atos espalhados pelo país naquele sábado.

Na capital, Paris, foram cerca de 5,3 mil pessoas em quatro atos distintos, sendo um deles uma marcha até o prédio sede da Pfizer, na Av. du Dr Lannelongue. Este vídeo da agência Ruptly, mostra os manifestantes próximos ao edifício sede da farmacêutica, mesmo local onde foi feito o material postado no Facebook. O vídeo fala em cerca de 250 participantes.

Segundo a imprensa local, atos contra o passaporte vacinal já vinham acontecendo no país nas semanas anteriores e os do dia 29 de janeiro aconteceram poucos dias depois de a exigência do documento entrar em vigor, em 24 de janeiro.

Os dados divulgados pelo Ministério do Interior mostraram, contudo, um número menor de manifestantes e de atos em todo o país. Se no dia 29 foram 30 mil pessoas em 162 manifestações, no final de semana anterior tinham sido 38 mil manifestantes em 171 protestos espalhados por toda a França.

Mortes e reações adversas não foram pauta das manifestações

Diferente do que afirma a tarja inserida nos dois vídeos aqui verificados, “milhares de mortes e efeitos adversos” provocadas pelas vacinas não faziam parte da pauta dos atos realizados no dia 22 de janeiro em Estocolmo e no dia 29 em Paris. Todos os textos encontrados pelo Comprova na imprensa francesa e até as imagens dos cartazes que aparecem no protesto são contrários ao passaporte vacinal.

No caso dos atos ocorridos na França, há pelo menos três organizadores. O grupo Union Citoyenne pour la Liberté, cuja logomarca aparece em faixas nos protestos, os chamados coletes amarelos e o candidato à presidência pelo partido de direita Patriots, Florian Philippot.

Um texto publicado no portal francês InfoDuJour, uma convocação favorável aos atos do dia 29 de janeiro e que se refere à política de saúde da França como “estúpida, restritiva e enganadora”, diz que os atos são contra a política sanitária e contra o presidente Emmanuel Macron. Os atos ocorreram a 75 dias do primeiro turno das eleições presidenciais na França, sem mencionar mortes ou reações adversas pelas vacinas.

Dados sobre mortes e reações adversas

Agência Europeia de Medicamentos (EMA)

A informação de “milhares de mortes e efeitos adversos das vacinas”, que acompanha os vídeos, não procede. Na página sobre informações de segurança das vacinas autorizadas na Europa, a EMA afirma que “a vasta maioria dos efeitos colaterais adversos conhecidos são leves e de curta duração”, e que casos graves são “extremamente raros”.

A EMA é responsável pela avaliação científica, supervisão e monitoramento da segurança dos medicamentos em utilização nos países da União Europeia (UE) e do Espaço Econômico Europeu (EEE). São 30 países no total, incluindo França e Suécia, onde ocorreram as manifestações que aparecem nos vídeos aqui verificados.

A agência afirma que todas as vacinas autorizadas para uso na Europa são seguras e efetivas no combate à covid-19. São elas: ComiRNAty (Pfizer/BioNTech), COVID-19 Vaccine Janssen, Vaxzevria (AstraZeneca) e Spikevax (Moderna).

“Elas foram avaliadas em dezenas de milhares de participantes em ensaios clínicos e atenderam aos padrões científicos da EMA para segurança, eficácia e qualidade”, diz a agência.

Na página com informações sobre a vacina da Pfizer, à qual se referem os vídeos aqui verificados, a EMA informa que os efeitos adversos mais comuns do imunizante são geralmente leves e moderados, e incluem dor e inchaço no local da injeção, cansaço, dor de cabeça, dores musculares e nas articulações, calafrios, febre e diarreia.

No último boletim da EMA sobre segurança das vacinas, de 20 de janeiro, a agência informa que estudos estão em andamento para confirmar outro possível evento adverso: a síndrome de extravasamento capilar (Capillary leak syndrome) – um distúrbio caracterizado pelo vazamento de fluido dos vasos sanguíneos, causando inchaço dos tecidos e queda da pressão arterial.

Não há alertas da EMA sobre risco de morte relacionado a qualquer efeito adverso da vacina.

Vacina da Pfizer na Europa

Segundo a EMA, foram aplicadas 545 milhões de doses da vacina da Pfizer na população dos países da UE e do EEE, entre 21 de dezembro de 2020, quando o imunizante foi autorizado, e 2 de janeiro deste ano.

Os dados sobre supostos eventos adversos das vacinas são coletados no sistema EudraVigilance, que recebe notificações espontâneas de indivíduos e agentes de saúde. De acordo com a EMA, esses dados são avaliados pelo Comitê da Farmacovigilância da agência (Prac, sigla em inglês) para a detecção de possíveis comportamentos inesperados.

Segundo dados do EudraVigilance, foram espontaneamente notificados 522 mil casos de supostos eventos adversos após a vacina da Pfizer, sendo 6.490 desses com resultado final morte. Os números aparecem no último boletim de segurança das vacinas, e são acompanhados da seguinte observação:

“O fato de alguém ter tido um problema médico ou ter morrido após a vacinação não significa necessariamente que isso tenha sido causado pela vacina. Isso pode ter sido causado, por exemplo, por problemas de saúde não relacionados à vacinação”.

Já o site do EudraVigilance traz a seguinte ressalva em relação às notificações espontâneas de eventos adversos:

“As informações neste site referem-se a efeitos colaterais suspeitos, ou seja, eventos médicos que foram observados após a administração das vacinas COVID-19, mas que não estão necessariamente relacionados à vacina ou tenham sido causados ​​​​por ela. Esses eventos podem ter sido causados ​​por outra doença ou estar associados a outro medicamento tomado pelo paciente ao mesmo tempo”.

A informação é reforçada em troca de e-mail entre a EMA e o Comprova:

Neste vídeo, a EMA afirma que as notificações de casos suspeitos de efeitos colaterais pós-vacinação “são, frequentemente, não relacionados à vacina”.

Sobre a análise desses dados, a agência afirma que:

“A avaliação científica da EMA leva em consideração muitos outros fatores, como o histórico médico do paciente, a frequência da suspeita de reação adversa na população vacinada em comparação com a frequência na população geral e se é biologicamente plausível que a vacina possa ter causado o evento. Apenas uma avaliação detalhada de todos os dados disponíveis permite tirar conclusões robustas sobre os benefícios e riscos das vacinas covid-19”.

Food and Drug Administration (FDA)

O Comprova também fez contato com a Food and Drug Administration (FDA), a agência reguladora de medicamentos norte-americana. Por e-mail, a FDA informou que técnicos da agência e do Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) identificaram, inicialmente, em abril de 2021, três mortes por trombose com síndrome de trombocitopenia (TTS) associada à vacina da Janssen. Os casos foram verificados em um universo de 6,8 milhões de doses aplicadas nos EUA.

A última atualização no site do Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC), dos Estados Unidos, de 31 de janeiro deste ano, aponta nove mortes por trombose com síndrome de trombocitopenia (TTS) associadas à vacina da Janssen, em um total de 18,1 milhões de doses aplicadas do imunizante. O número corresponde a 0,00005% do total de casos.

As vacinas em utilização nos EUA são a ComiRNAty (Pfizer/BioNTech), Spikevax (Moderna) e Janssen COVID-19 Vaccine.

Assim como a EMA, o FDA e o CDC classificam as vacinas contra a covid-19 como seguras e efetivas no combate à covid-19.

O que diz a Pfizer

Procurada pelo Comprova, a Pfizer informou por e-mail estar ciente dos relatos a respeito da manifestação ocorrida em Paris, em frente ao prédio da farmacêutica, mas que não conhece as razões do ato naquele local.

Sobre mortes e reações adversas provocadas pela vacina, informou que “a Pfizer encara com muita seriedade os eventos adversos potencialmente associados à vacina ComiRNAty. A companhia acompanha de perto todos os eventos e coleta informações relevantes para dividir com autoridades reguladoras globais”.

Em nota, acrescentou que “a Pfizer já distribuiu globalmente mais de 2,7 bilhões de doses da vacina ComiRNAty em mais de 168 países ao redor do mundo e não há, até o momento, qualquer alerta de segurança ou preocupação, de modo que o benefício da vacinação segue se sobrepondo a qualquer risco”.

Dados no Brasil

No Brasil, a análise sobre possíveis efeitos adversos e mortes relacionadas às vacinas foi divulgada pelo Ministério da Saúde no boletim epidemiológico nº 90, de 20 de novembro de 2021. O documento cita 11 mortes relacionadas às vacinas, 0,3% das reações graves notificadas ao Ministério da Saúde até aquele momento. Os casos estão relacionados à síndrome de trombose com trombocitopenia. Do total de vítimas, oito foram vacinadas com doses da AstraZeneca e três com Janssen, conforme mostrou o Comprova.

OMS: benefícios superam os riscos

Em resposta ao Comprova, a Organização Mundial da Saúde (OMS) afirmou, por e-mail, que as vacinas contra a covid-19 são constantemente avaliadas em relação aos benefícios versus riscos.

“A observação consistente até agora, em todos os países, foi que os benefícios das vacinas superam em muito os riscos”, diz a OMS.

O que dizem os autores

A equipe do Comprova entrou em contato com os autores das postagens. O homem que publicou o vídeo no TikTok, identificado como Marconi Americano, diz que recebeu o conteúdo em um grupo do WhatsApp e que repostou no TikTok. Também afirmou que não é o autor da legenda que aparece no vídeo. Marconi afirma que assim que soube das “inverdades”, apagou o post.

O vídeo, de fato, foi apagado do aplicativo após o contato do Comprova. Porém, segue disponível no perfil do Facebook de Marconi com a legenda “Prédio da Pfizer cercado em Paris, o povo grita assassinos, devido às milhares de mortes e efeitos adversos das vacinas. Isso a Globo não mostra.” Na publicação, o homem ainda marcou o deputado Carlos Jordy, as deputadas Carla Zambelli e Bia Kicis e o presidente Jair Bolsonaro.

O Comprova também procurou a autora do post no Facebook, Elza Elice Monfradini, mas não tivemos resposta até o momento.

Por que investigamos?

O Comprova investiga conteúdos suspeitos que tenham relação com a pandemia, políticas públicas do governo federal e eleições. O foco são publicações virais que têm grande alcance nas redes sociais e podem causar desinformação.

As postagens compartilhadas no TikTok e no Facebook aqui verificadas acumulavam mais de 63 mil interações nas duas redes, antes de o vídeo do TikTok ser retirado do ar pelo usuário, na tarde da última quinta-feira, 3. Embora eles mostrassem imagens de protestos que realmente aconteceram, as duas postagens enganavam ao afirmar que as pessoas se manifestaram contra mortes e reações adversas graves provocadas por vacinas. Os atos eram, na verdade, contra o passaporte vacinal.

O MonitoR7 também checou a veracidade do vídeo do protesto ocorrido em frente ao prédio da Pfizer. Publicações que questionam a segurança das vacinas são constantemente checadas pelo Comprova. Recentemente, a equipe mostrou que os efeitos adversos à vacinação são raros e os benefícios superam os riscos e que não há registro de mortes de crianças causadas por vacinas contra a covid-19 no Brasil.

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.

Saúde

Investigado por: 2022-02-03

Médicos reafirmam: máscaras impedem proliferação da covid-19 e não atrapalham respiração

  • Falso
Falso
É falso conteúdo de vídeo que afirma que o uso prolongado das máscaras contra a covid-19 pode afetar o sangue e aumentar os riscos de contágio. A afirmação esconde que isso só seria possível em caso de asfixia total, o que não acontece com o uso das máscaras em nenhuma hipótese.
  • Conteúdo verificado: Vídeo compartilhado no Facebook, Twitter, WhatsApp e Telegram afirma que as máscaras retém o gás carbônico expelido na respiração, fazendo com que o usuário volte a inalá-lo. Isso causaria uma acidificação do sangue, o que tornaria usuários de máscaras mais suscetíveis a infecções pelo novo coronavírus.

São falsas as afirmações feitas em vídeo postado no Facebook, Twitter e no Telegram, segundo as quais o uso prolongado de máscaras de proteção individual pode acidificar o sangue e aumentar as chances de contágio pelo coronavírus.

De acordo com estudos e especialistas ouvidos pelo Comprova, o uso correto das máscaras reduz a transmissão do vírus.

As máscaras são feitas de material poroso, que permite a passagem do oxigênio consumido e o gás carbônico produzido durante a respiração. O que as máscaras impedem é a passagem de gotículas, pequenas partículas que ficam no ar e que carregam o vírus.

O material usado na produção das máscaras é submetido a testes que mostram que os poros têm capacidade de barrar as gotículas e permitir a passagem dos gases.

Procurado pelo Comprova, o site Corpur Iuris, que divulgou o vídeo investigado nessa checagem, não respondeu o contato feito por e-mail, pelo próprio site e pelo telefone da advogada indicada no site.

O Comprova classifica a afirmação de que as máscaras podem causar danos à saúde das pessoas como falsa porque utiliza dados imprecisos, fora de contexto, para levar as pessoas a uma conclusão que não é verdadeira.

Como verificamos?

O vídeo verificado aqui foi primeiramente divulgado em um canal no Telegram. O Comprova entrou em contato com os responsáveis para checar as fontes de informação utilizadas na produção do material, mas não obteve resposta.

Em seguida, o Comprova pesquisou as diretrizes das autoridades de saúde sobre o uso das máscaras, que são recomendadas pela Organização Mundial da Saúde (OMS), pela Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS) e pelo Ministério da Saúde.

Também procuramos infectologistas, que relataram aspectos médicos e científicos sobre o uso de máscaras.

Por fim, analisamos estudos sobre o uso prolongado de máscaras, como este do Memorial Hospital de Miami, que mostra que não há alteração significativa no consumo de oxigênio e produção de gás carbônico.

Verificação

Máscaras não prejudicam a respiração

As máscaras, assim como a higiene das mãos, são uma das maneiras de prevenir o contágio pelo coronavírus, segundo recomendações do Ministério da Saúde. Ao contrário do que informa o vídeo aqui verificado, as máscaras não retêm o gás carbônico produzido durante a respiração.

O material utilizado na fabricação das máscaras, sejam elas cirúrgicas, descartáveis ou caseiras de pano, é poroso – ou seja, contém furos grandes o suficiente para que as moléculas de oxigênio e gás carbônico passem de um lado para o outro e pequenas o bastante para impedir que as gotículas que carregam o coronavírus passem.

Estudos como este, do Memorial Hospital de Miami, mostram que a respiração não é prejudicada pela utilização de máscaras. Os voluntários foram submetidos a exercícios de diferentes intensidades com e sem máscara, e os níveis de oxigênio e gás carbônico mantiveram as variações esperadas mesmo em pessoas com problemas respiratórios.

O que dizem os especialistas?

Especialistas entrevistados apontaram que não há qualquer fundamento científico à ideia de que o uso de máscaras causa riscos à saúde. Segundo eles, o item deve ser, sim, usado como medida de prevenção ao contágio.

De acordo com o médico infectologista Marcus Guerra, diretor do Hospital Tropical do Amazonas, não existe sustentação à teoria de que as máscaras acidificam o sangue ou facilitam a proliferação do vírus.

“Não há fundamento. O ar expirado contendo CO2 não é reinspirado novamente. Vários trabalhos científicos já desclassificaram conteúdos que mencionam essa possibilidade”, explica.

Sobre a afirmação de que o fortalecimento do sistema imunológico é suficiente para proteger as pessoas do coronavírus, o médico ressalta que não procede.

“O sistema imunológico é altamente específico. Para ele reagir a um invasor, rápido e eficientemente, é preciso que ele tenha sido estimulado anteriormente. Este é o papel das vacinas já existentes no calendário vacinal do Programa Nacional de Imunização”, ressalta Marcus.

Segundo o médico Nelson Barbosa, infectologista que atuou na crise de falta de oxigênio no Amazonas durante a pandemia de covid-19, as máscaras cumprem o seu papel de prevenção sem prejuízo à saúde do corpo. “Nem teríamos a diminuição da transmissão sem o uso contínuo delas”, diz o médico.

Ele também discorda quando se fala que apenas fortalecer o sistema imunológico já impede a ação do coronavírus. “O fortalecimento do sistema imunológico atenua os efeitos deletérios da infecção pelo Sars-CoV-2, mas não impede a sua infecção”, concluiu.

Usar máscara não acidifica o sangue

O vídeo investigado pelo Comprova afirma que usar as máscaras por um período longo faz com que o sangue fique mais ácido devido à alta quantidade de gás carbônico absorvida durante a respiração.

Além da informação não ser verdadeira, devido ao material usado na produção das máscaras permitir tanto o oxigênio do ambiente quanto o gás carbônico exalado ultrapassar o filtro, a informação também é falsa porque a quantidade necessária de gás carbônico a ser inalada para que houvesse alteração significativa no pH do sangue só seria possível em caso de asfixia ou de completa vedação, como ao respirar dentro de um saco plástico, como explica esse estudo da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

Além disso, alterações pequenas na acidez do sangue são niveladas pelo próprio organismo, como mostra um estudo produzido por cientistas da Universidade de São Paulo (USP) e da Universidade Estadual Paulista (Unesp).

Por que investigamos?

O Comprova verifica conteúdos suspeitos que circulam nas redes sociais, que tenham relação com a pandemia, políticas públicas do governo federal ou as eleições de 2022. O foco são publicações que têm grande alcance. O vídeo checado nesse texto tinha ao menos 6 mil interações logo que postado no Facebook e 2 mil interações no Twitter, além de ter circulado por aplicativos como Telegram e WhatsApp.

Outras agências de checagem como Fato ou Fake, Veja, Estadão e Lupa e até mesmo o canal da ONU no YouTube já fizeram checagens sobre o mesmo tema ou semelhantes, assim como o próprio Comprova fez em ao menos quatro ocasiões, explicando como as máscaras protegem contra a epidemia do H3N2, mostrando que as máscaras não tornam o sangue ácido, que é enganoso um estudo mostrando que as máscaras seriam ineficazes e que as autoridades e estudiosos recomendam o uso de máscara.

Para o Comprova, falso é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.

Política

Investigado por: 2022-02-02

Pontes na BR-158 foram construídas durante governo Bolsonaro

  • Comprovado
Comprovado
Foi comprovada a veracidade das informações de um vídeo que afirma que três pontes de concreto, localizadas em um trecho da BR-158, entre os municípios de Redenção e Santana do Araguaia (PA), foram construídas durante o governo de Jair Bolsonaro (PL). O conteúdo circula no Facebook e no Twitter. O Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) confirmou o local das construções e afirmou que todas tiveram serviços iniciados em 2020, segundo ano do mandato do presidente Bolsonaro.
  • Conteúdo verificado: Em um vídeo gravado em modo selfie, um homem identificado em legenda como “Chimbica na área” mostra três pontes de concreto que ele afirma estarem localizadas em um trecho da rodovia BR-158, próximo ao município de Redenção (PA). Ele faz elogios ao presidente Jair Bolsonaro (PL) e ao ministro da Infraestrutura, Tarcísio Gomes de Freitas, a quem atribui as obras.

É verdadeiro o conteúdo de um vídeo que afirma que três pontes de concreto, localizadas em um trecho da rodovia BR-158 entre os municípios de Redenção e Santana do Araguaia, ambos no Pará, foram construídas durante o governo de Jair Bolsonaro (PL). O conteúdo, produzido por um homem identificado como Chimbica, circula no Facebook e no Twitter. A verificação do vídeo foi solicitada por leitores do Comprova.

Em nota ao Comprova, o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) confirmou o local das construções e afirmou que todas tiveram serviços iniciados em 2020, segundo ano do mandato do presidente Bolsonaro. Duas delas, que cruzam o igarapé Água Preta e o rio Itamarati, tiveram as obras concluídas em 2021; a terceira, que atravessa o rio Araras, ainda está em construção. O órgão não informou qual a previsão de término da obra.

O Comprova fez contato com Chimbica por meio de um perfil no Facebook, mas não recebeu resposta até a publicação desta verificação.

O vídeo foi classificado como comprovado porque apresenta um fato verdadeiro.

Como verificamos?

Por meio da comunicação entre veículos jornalísticos que colaboram com o Comprova, recebemos a indicação de uma publicação anterior do Estadão Verifica sobre um post do TikTok que aparentava ter sido filmado em um dos locais que aparecem no vídeo de Chimbica. Nesse outro post, um usuário afirma que uma das pontes de concreto na BR-158, na região de Redenção (PA), foi construída durante o governo de Jair Bolsonaro (PL).

O Estadão confirmou que a informação era verdadeira, entrando em contato com o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit). O órgão identificou a ponte que aparece no vídeo do TikTok como sendo a que atravessa o igarapé Água Preta, e informou que outras duas obras avançavam na região, cruzando os rios Araras e Itamarati.

O Comprova entrou em contato com o Dnit para checar se essas três pontes eram as mesmas que apareciam no vídeo aqui verificado, e confirmar que todas foram construídas durante o governo Bolsonaro. Também fizemos contato por e-mail e Instagram com a Prefeitura de Redenção (PA), mas não obtivemos resposta.

Para identificar o autor do vídeo, fizemos uma busca no Google pelos termos “Chimbica”, “Chimbica na área” e “Chimbica Pará”. Encontramos no site DiárioCidade o registro de um candidato a vereador em Redenção (PA), nas eleições de 2016, que se identificava como Chimbica nas urnas. O candidato, de nome completo Ivanildo Oliveira Dias, aparentava (pela foto disponível) ser o mesmo homem que gravou o vídeo na BR-158.

Procuramos por seu cadastro no site de Divulgação de Candidaturas e Contas Eleitorais, no espaço designado aos nomes que pleitearam vaga na Câmara de Redenção em 2016. Nesse site, de responsabilidade do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a equipe encontrou as informações da candidatura de Chimbica. Analisando os documentos disponibilizados pelo TSE nesta página, encontramos o número do título de eleitor, o que possibilitou verificar, por meio do sistema do tribunal, que Chimbica é filiado atualmente ao MDB.

Buscamos então nas redes sociais por “Chimbica Dias” e encontramos perfis no Instagram e no Facebook, onde o mesmo vídeo aqui verificado havia sido publicado, em 21 de janeiro de 2022. Tentamos contato por meio do Facebook, mas não obtivemos resposta.

Verificação

As obras

A BR-158 começa na cidade de Redenção, no Pará, e passa pelos estados de Mato Grosso, Goiás, Mato Grosso do Sul, São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. A rodovia termina em Santana do Livramento (RS), na fronteira do Brasil com o Uruguai. Devido ao fato de atravessar o país de Norte a Sul, é uma via estratégica para o escoamento da produção agrícola de Mato Grosso, sendo conhecida como “corredor da soja”.

De acordo com o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), em nota encaminhada ao Comprova no dia 1º de fevereiro, o vídeo verificado mostra três pontes localizadas na BR-158, entre os municípios de Redenção e Santana do Araguaia, no Pará. Duas delas, que cruzam o igarapé Água Preta e o rio Itamarati, tiveram as obras concluídas em 2021; a terceira, que atravessa o rio Araras, ainda está em construção. O órgão não informou qual a previsão de término da obra. Ainda segundo o departamento, todas as pontes tiveram os serviços iniciados em 2020.

Desta forma, o conteúdo aqui verificado é verdadeiro: conforme diz o autor do vídeo, as estruturas foram construídas durante o governo de Jair Bolsonaro, que tem Tarcísio Gomes de Freitas como ministro da Infraestrutura desde o início da gestão (o Dnit é uma autarquia vinculada ao Ministério da Infraestrutura).

Histórico

Em agosto de 2019, o Ministério da Infraestrutura divulgou que Tarcísio havia assinado a ordem de serviço para construir a ponte de concreto igarapé Água Preta, localizada no trecho da BR-158 entre Redenção e a divisa com Mato Grosso. O evento contou com a presença de lideranças políticas dos dois estados e representantes do setor produtivo.

Na época, o ministério afirmou que a obra era essencial para garantir o escoamento da produção do Centro-Oeste, incrementar a logística e promover a infraestrutura do sudeste do Pará. Segundo a pasta, aquela seria a primeira de seis pontes que seriam construídas pelo governo federal. A verificação só encontrou informações sobre obras em três pontes.

Antes da construção da nova estrutura no igarapé Água Preta, eram frequentes os acidentes no local, causados pelas pontes inacabadas, pavimentação precária e falta de sinalização, segundo informações do site Correio de Carajás. Um comunicado publicado no site da Prefeitura de Redenção reagiu de forma positiva ao anúncio da obra, afirmando que se tratava do fim das “pontes assassinas” na BR-158.

Em outubro de 2021, o Dnit divulgou que a obra sobre o igarapé Água Preta estava praticamente concluída. Em relação à ponte do rio Itamarati, a autarquia informou que as vigas tinham sido lançadas e as equipes estavam preparando a concretagem. Já a obra da ponte sobre o rio Araras estava em fase de cravação das estacas da fundação.

O vídeo e seu autor

O Comprova identificou que o responsável pelas imagens verificadas é Ivanildo Oliveira Dias, de 44 anos, também conhecido como Chimbica Dias. O vídeo foi publicado originalmente no perfil do autor, no dia 21 de janeiro.

No início do vídeo, o homem informa a data e local da gravação: 19 de janeiro de 2022, em um trecho da BR-158 que liga Redenção a cidades como Santana do Araguaia e ao estado de Mato Grosso. Ele aponta por cima do ombro para uma ponte de madeira ao fundo e afirma que a estrutura era usada por motoristas “há 30 anos”. Em seguida, ele vira a câmera para outro lado e mostra uma ponte de concreto asfaltada. Ele atribui a obra a Bolsonaro e Tarcísio de Freitas, fazendo elogios ao presidente e ao ministro.

O vídeo tem um corte e o homem aparece novamente mostrando uma ponte em construção na BR-158 e volta a fazer elogios aos gestores. Após outro corte, Chimbica mostra outra ponte de madeira e, em seguida, uma estrutura de concreto ao lado. Ele afirma que o empreendimento está pronto, faltando apenas o asfalto. Ao longo do vídeo, o homem também faz ataques ao PT, partido do ex-presidente Lula, pré-candidato à Presidência e principal rival de Bolsonaro nas eleições de 2022.

Natural de Redenção, Chimbica foi candidato a vereador da cidade em 2016 pelo PTC (Partido Trabalhador Cristão), sigla pequena de direita e ideais conservadores. Como resultado, foi suplente. No entanto, no site da Câmara Municipal de Redenção não há registro sobre ele ter chegado a assumir cadeira na Casa durante a legislatura.

Dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) mostram que Chimbica foi do PTC até o ano de 2020, quando se filiou ao MDB, onde atualmente tem cadastro regular. No registro de candidatura não há informações sobre sua profissão.

O Comprova tentou contato com o autor do vídeo por meio do Facebook, mas não houve retorno até a publicação desta verificação.

Por que investigamos?

O Comprova investiga conteúdos suspeitos que tenham relação com a pandemia, políticas públicas do governo federal e eleições. São escolhidas publicações suspeitas que têm grande alcance nas redes sociais e aplicativos de mensagem.

No caso deste vídeo relacionado às pontes da BR-158, o tema é pertinente à eleição deste ano e às políticas públicas da União, pois trata de obras de infraestrutura — uma das principais frentes de atuação do governo de Jair Bolsonaro, pré-candidato à reeleição. O conteúdo atingiu quase 8.000 visualizações no Twitter e no Facebook até o dia 2 de fevereiro de 2022. A verificação desse vídeo foi solicitada por leitores do Comprova pelo formulário disponível no site.

O Comprova também verificou recentemente outras postagens relacionadas à eleição, como o caso do vídeo que engana ao dizer que o Facebook restringiu compartilhamento de conteúdo pró-Bolsonaro. A equipe também verificou que mesmo sem biometria, o eleitor poderá votar em 2022.

Postagens falsas relacionadas a obras públicas são comuns. O Comprova já verificou, por exemplo, que o asfalto que cedeu na BR-319, no Amazonas, não foi obra do governo Bolsonaro. A equipe também investigou uma postagem que mentiu ao dizer que Bolsonaro está distribuindo aos estados máquinas que Dilma doaria a países africanos e um vídeo que omitiu ações de governos anteriores para exaltar obras da atual gestão na Transamazônica.

Houve também o caso de outro post viral com fotos reais de obras do governo federal na BR 116 no Ceará.

Para o Comprova, comprovado é um fato verdadeiro; evento confirmado; localização comprovada; ou conteúdo original publicado sem edição.

Saúde

Investigado por: 2022-02-01

Estudo não permite concluir que proteção após infecção é melhor que vacinação, ao contrário do que diz deputada

  • Enganoso
Enganoso
É enganosa a publicação da deputada federal Carla Zambelli (PSL-SP) que usa os títulos de duas reportagens para dizer que a contaminação pela covid-19 é mais eficaz que a vacina. O estudo citado por uma das matérias não permite essa conclusão e aponta que a vacinação é a forma mais segura de combater a doença.
  • Conteúdo verificado: Uma publicação da deputada federal Carla Zambelli (PSL-SP) que traz recorte de dois títulos de notícias que lidos em sequência sugerem que o presidente Jair Bolsonaro (PL) acertou ao afirmar, em junho de 2021, que a infecção pelo coronavírus é “mais eficaz” na prevenção do vírus do que a vacinação. Ela usa uma reportagem sobre uma pesquisa nos Estados Unidos para justificar a afirmação. Na legenda, a deputada coloca “Jair Messias Bolsonaro acerta novamente!”.

São enganosas as publicações feitas no Instagram, Facebook e Twitter pela deputada federal Carla Zambelli que trazem uma montagem com o título de duas notícias para sugerir que a infecção prévia pelo vírus da covid-19 traria maior proteção do que a vacina.

Uma das matérias citadas pela deputada menciona um estudo publicado pelo Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos Estados Unidos, em janeiro deste ano. A pesquisa, feita entre maio e novembro de 2021, compara a taxa de casos de covid entre vacinados e não vacinados.

A partir da análise de casos positivos nos estados da Califórnia e de Nova York, o estudo de fato mostra que durante um curto período as pessoas reinfectadas tiveram mais proteção que as vacinadas, mas isso não significa que a imunidade natural seja mais eficaz do que a vacinação nem que essa é uma boa estratégia.

Os responsáveis pelo estudo deixam claro que esses dados fazem parte de uma literatura científica que tenta encontrar mais informações a respeito do comportamento do vírus – que segue circulando e, portanto, se modificando. Na discussão do estudo, os pesquisadores relatam que seus dados não mostraram redução da imunidade obtida via infecção, mas mencionam que outros estudos chegaram a conclusões diferentes. Assim, afirmam que “mais estudos são necessários para estabelecer a duração da proteção contra infecção anterior por tipo de variante, gravidade e sintomatologia, inclusive para a variante Ômicron”.

Além disso, os cientistas explicam que a infecção em pessoas não vacinadas “aumenta o risco de doença grave, hospitalização, sequelas de longo prazo e morte” e concluem, ao contrário de Jair Bolsonaro, que “a vacinação é a estratégia primária e mais segura para prevenir infecções pelo SARS-CoV-2, complicações associadas e transmissões”.

Na montagem, a deputada usa o título da matéria publicada pela Istoé para dizer que Bolsonaro tinha razão sobre a tese da imunização natural. A deputada Carla Zambelli foi procurada pelo Comprova e por meio de sua assessoria reafirmou a posição de que o título da matéria resume a pesquisa.

A imunidade natural, defendida na postagem, não é recomendada por especialistas. A infectologista Ana Helena Germoglio define essa estratégia como uma “grande loteria”, porque pode trazer várias complicações para a saúde e até a morte, e diz que a vacinação é o método que produz anticorpos programados, capazes de combater uma infecção pelo coronavírus.

Para o Comprova, o conteúdo é enganoso por tirar informações do contexto original para induzir o leitor a uma interpretação diferente daquela concluída no estudo.

Como verificamos?

Para a verificação, o Comprova primeiro procurou as duas matérias citadas (Istoé) e (Poder360) nas publicações da deputada federal. A equipe também buscou pelo vídeo do presidente Jair Bolsonaro que baseia a reportagem do Poder360. No caso da Istoé, a reportagem procurou pelo conteúdo original, que é da AFP.

O segundo passo foi encontrar o estudo citado pela reportagem da AFP. A equipe consultou o site do Centers for Disease Control and Prevention (Centro de Controle e Prevenção de Doenças, CDC) e localizou a pesquisa.

A reportagem também conversou com a infectologista Ana Helena Germoglio sobre a tese levantada pela publicação de que a infecção pela covid é mais eficaz que a vacinação.

Por fim, a deputada Carla Zambelli foi procurada e questionada sobre a publicação.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 31 de janeiro de 2022.

Verificação

Publicação da deputada e matérias citadas

A publicação da deputada federal Carla Zambelli é uma montagem com os títulos de duas matérias. A primeira delas é um conteúdo do Poder360 publicado no dia 17 de junho de 2021 com título “Bolsonaro diz que contaminação é ‘até mais eficaz’ que a vacina contra covid”.

A fala ocorreu durante uma live semanal do presidente no dia 17 de junho de 2021. Na ocasião, ele comentava um parecer solicitado ao Ministério da Saúde para desobrigar o uso de máscaras por pessoas que já tinham sido infectadas pelo vírus da covid-19 ou vacinadas.

Em seguida, Bolsonaro afirma estar “vacinado” por ter se contaminado anteriormente. “Eu estou vacinado, entre as aspas. Todos que contraíram o vírus estão vacinados. Até de forma mais eficaz que a própria vacina, porque pegou o vírus para valer”, disse.

O presidente comparou a proteção derivada da infecção com a eficácia das vacinas e deu o exemplo da CoronaVac, que apresenta taxa de 50% de proteção. Segundo o chefe do Executivo, o primeiro grupo estaria mais protegido que os vacinados.

Apesar da fala de Bolsonaro questionando a eficácia da Coronavac, o imunizante tem uso aprovado pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) e é usado também na imunização de crianças contra covid-19 no Brasil. Um estudo do Instituto Butantan na cidade de Serrana, em São Paulo, mostrou que após a imunização de 75% da população adulta com essa vacina, houve queda nos casos, internações e hospitalizações pela doença.

A matéria do Poder360, citada na publicação da deputada, ouviu especialistas que rebateram a fala de Bolsonaro, tanto em relação à dispensa do uso de máscaras, quanto à tese de que a infecção é mais eficaz que a vacinação.

Os profissionais entrevistados reforçaram a necessidade da imunização combinada com medidas de prevenção, como o uso de máscaras, para conter a transmissão da covid-19 no país.

O segundo conteúdo citado na publicação de Zambelli é uma matéria da AFP, republicada pelo site Istoé Dinheiro no dia 19 de janeiro deste ano e atualizada no dia seguinte. O título é “Imunidade natural foi mais potente que vacina durante onda da variante delta nos EUA, diz estudo”. Sem citar o nome da pesquisa ou seus responsáveis, a matéria diz que a análise tem respaldo do CDC.

O texto original da agência de notícias francesa foi publicado no dia 18 e passou por duas alterações. A versão mais atualizada é do dia 20 e incluiu no conteúdo uma limitação a respeito dos resultados do estudo e menção a outras pesquisas sobre a imunidade natural. Essa mudança não foi publicada pelo site da Istoé e não aparece na publicação de Zambelli.

O estudo

O estudo foi publicado no Relatório Semanal de Morbidade e Mortalidade (MMWR) do Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos Estados Unidos. A pesquisa foi disponibilizada online no dia 19 de janeiro. O título é “COVID-19 Cases and Hospitalizations by COVID-19 Vaccination Status and Previous COVID-19 Diagnosis” — California and New York, May–November 2021(Casos e hospitalizações de COVID-19 por status de vacinação COVID-19 e diagnóstico anterior de COVID-19 — Califórnia e Nova York, maio a novembro de 2021, em livre tradução).

O estudo foi elaborado com dados sobre a covid coletados entre 30 de maio e 30 de novembro de 2021 na Califórnia e em Nova York. Os dois estados foram escolhidos por concentrarem percentuais elevados de mortes pela doença. A pesquisa analisou casos apenas em maiores de 18 anos e dividiu as pessoas em quatro grupos:

1) Não foram vacinados e não tiveram covid-19

2) Vacinados e que nunca pegaram covid-19

3) Não vacinados e que tiveram covid-19

4) Vacinados e que tiveram covid-19

Os pesquisadores afirmam que, durante o período do estudo, a incidência de covid-19 em ambos os estados foi maior entre pessoas não vacinadas e sem diagnóstico prévio (grupo 1) em comparação aos outros três grupos.

Na primeira semana de maio, a taxa de casos de covid foi 19,9 vezes menor na Califórnia e 18,4 vezes, também inferior, em Nova York entre o grupo 2 (vacinados que nunca pegaram covid) em comparação ao grupo 1 (não se vacinaram e não tiveram a doença).

Esse cenário também foi verificado na comparação do grupo 1 com o 3 e o 4 na taxa de casos e também nas hospitalizações. Essa situação se manteve até a variante delta se tornar a predominante no país no final de junho e início de julho do ano passado.

Em outubro, em comparação com pessoas do grupo 1, as taxas de casos de covid entre pessoas vacinadas e sem diagnóstico (grupo 2) anterior foram 6,2 vezes (Califórnia) e 4,5 vezes (Nova York) menores.

As taxas também foram substancialmente mais baixas entre os dois grupos com diagnósticos anteriores de covid-19 em relação ao grupo 1, incluindo 29,0 vezes (Califórnia) e 14,7 vezes menores (Nova York).

Durante o mesmo período, em comparação com as taxas de hospitalização entre pessoas não vacinadas sem diagnóstico prévio, as taxas de hospitalização na Califórnia seguiram um padrão semelhante.

Para os pesquisadores, esses resultados demonstram que a vacinação protege contra a infecção e hospitalizações e que contrair o vírus também diminui a chance de reinfecção.

Limitações do estudo

Os pesquisadores fazem ressalvas importantes sobre os dados apresentados no estudo. A primeira é de que a análise foi feita antes do surgimento da ômicron, por isso os resultados não podem ser aplicados à situação atual.

Além disso, a pesquisa foi concluída antes da aplicação das doses de reforço na maior parte das pessoas, então não reflete o benefício imunológico dessas doses.

Outro apontamento é que a análise não levou em conta o tempo de aplicação da vacina, mas apenas o período do diagnóstico anterior.

Há ainda falta de clareza sobre a não infecção de pessoas que não tiveram diagnóstico para covid. Isso porque os dados coletados da Califórnia e de Nova York não levam em conta todos os tipos de testagens — os número de teste de antígeno foram apenas levantados de Nova York e não há informações sobre os positivados que fizeram somente o autoteste.

Outro ponto de destaque é que o estudo exclui do cálculo pessoas que morreram e que, em sua maioria, segundo os pesquisadores, era de não vacinados.

Imunidade e vacinação

De acordo com o estudo, os dados sugerem que a vacinação protege contra a covid-19 e a hospitalização decorrente da doença, e que sobreviver a uma infecção anterior protege contra uma reinfecção.

Os pesquisadores ressaltam que a proteção derivada da infecção passou a ser maior depois que a variante delta tornou-se predominante, o que coincidiu com o declínio precoce da imunidade induzida pela vacina em muitas pessoas.

Reforçam ainda que a vacinação continua sendo a estratégia mais segura para prevenir infecções e transmissão do vírus, assim como as complicações associadas.

“A vacinação primária contra covid-19, doses adicionais e doses de reforço são recomendadas pelo Comitê Consultivo de Práticas de Imunização do CDC para garantir que todas as pessoas elegíveis estejam em dia com a vacinação covid-19, que fornece a proteção mais robusta contra infecção inicial, doença grave, hospitalização, sequelas a longo prazo e morte.”

A infectologista Ana Helena Germoglio explica que a imunidade natural nunca foi uma recomendação defendida pelos especialistas.

“Na verdade, se deixar ser infectado por um vírus que pode ter vários desfechos, se você não estiver completamente imunizado, é uma grande loteria”, diz.

Germoglio esclarece que, ao contrário da tese defendida pela postagem, a imunização natural não garante proteção maior que a vacina. Os imunizantes, explica, estimulam a produção do que ela classifica como anticorpos neutralizantes, que são diferentes do que a infecção pela doença vai ser capaz de gerar.

“[Os anticorpos neutralizantes] são aqueles que realmente defendem a pessoa contra a doença. Por isso que é importante a vacina, mas essa estratégia de imunização natural, não”, comenta.

O que diz a deputada

Procurada pela equipe do Comprova, a deputada Carla Zambelli, por meio de sua assessoria, reafirmou o que foi dito na postagem. “Para nós, portanto, os cientistas que fizeram o estudo e afirmaram exatamente o que está no título da matéria da Istoé, também acertaram”, escreveram.

A equipe disse ter lido o estudo e que as ressalvas feitas pelos pesquisadores não foram publicadas “porque não se trata de uma matéria jornalística ou científica, mas de lembrar uma opinião que julgamos acertada”.

Por que investigamos?

O Comprova investiga conteúdos suspeitos que tenham relação com a pandemia, políticas públicas do governo federal e eleições. O foco são publicações virais que têm grande alcance nas redes sociais e podem causar desinformação.

No caso da postagem da deputada Zambelli, o conteúdo recebeu 19 mil curtidas e 4 mil compartilhamentos no Facebook e Twitter. A informação de um estudo foi usada de forma enganosa para endossar uma fala do presidente Jair Bolsonaro que disse que a imunidade adquirida pela contaminação pelo coronavírus é mais eficaz que a vacinação. Além da pesquisa não chegar a essa conclusão, as vacinas contra a covid são consideradas efetivas por autoridades sanitárias no controle do vírus.

O Comprova já mostrou em verificações anteriores que as vacinas contra a covid-19 são seguras e desmentiu outra publicação da deputada Zambeli que enganou ao associar a morte por miocardite de um jogador à vacinação contra a covid.

Enganoso, para o Comprova é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Comprova Explica

Investigado por: 2022-01-31

Entenda por que eventos adversos graves pós-vacinação contra a covid-19 são raros e benefícios superam os riscos

  • Comprova Explica
Comprova Explica
Os benefícios da vacina contra a covid-19 superam em muito o risco de eventos adversos graves. O Ministério da Saúde aponta que 92% das reações registradas desde o início da vacinação foram classificadas como não graves. Já a queda da mortalidade de pacientes com covid-19 no SUS foi de 37% no país. O risco de óbito pela doença é 56 vezes maior do que o risco de ocorrência de um evento adverso relacionado à vacinação. Apesar dos avanços, a campanha infantil tem esbarrado em leis conflitantes sobre a obrigatoriedade da imunização.
  • Conteúdo analisado: Diversas publicações feitas em redes sociais têm questionado efeitos adversos graves e até mortes ocorridas após a vacinação por imunizantes disponíveis. Essas dúvidas têm sido manifestadas nas redes por pessoas que temem a vacinação, mas também são usadas por grupos antivacinas para criar pânico e rejeição à imunização.

Desde o início da vacinação contra a covid-19 no Brasil, quase a totalidade (92%) dos eventos adversos relacionados aos imunizantes foi classificada como não grave, segundo o Ministério da Saúde. Os relatos mais comuns são de cansaço, tosse, calafrios, dor no local da aplicação, coceira, hematoma, febre, dor no corpo, diarreia, náusea, dores musculares e nas articulações e dor de cabeça.

Em pouco mais de um ano de campanha, os benefícios podem ser vistos de forma prática. A queda da mortalidade de pacientes hospitalizados com covid-19 no SUS, por exemplo, foi de 37% em todo o país. Um estudo do governo federal mostra que o risco de óbito pela doença é 56 vezes maior do que o risco de ocorrência de um evento adverso relacionado à vacinação.

O mesmo documento apontou que os efeitos de menor gravidade pelos imunizantes estão concentrados na faixa etária de 25 a 44 anos. Já a população idosa apresentou a maior taxa de reações consideradas graves, em especial aqueles com mais de 75 anos de idade.

As vacinas AstraZeneca/Fiocruz e Coronavac respondem pela maior parte das notificações, seguidas das doses da Janssen e Pfizer, respectivamente. A maioria das reações leves teve início no período de 48 horas após a vacinação. Nos casos graves, esse intervalo foi maior, de 17 dias.

Os dados da pesquisa foram coletados entre 18 de janeiro e 25 de outubro de 2021. O texto pondera que as comparações devem levar em conta a proporção da cobertura vacinal de cada imunizante. Os três primeiros meses da campanha nacional não contaram com doses da Pfizer, por exemplo. Nem os seis primeiros meses tiveram Iotes da Janssen disponíveis, o que poderia explicar, em parte, a grande diferença das taxas de reações.

Do início da vacinação até novembro de 2021, o Ministério da Saúde informava 11 óbitos relacionados à vacinação em um universo de 194.278.194 doses aplicadas no mesmo período. O órgão não incluiu, nesta análise, as doses aplicadas em São Paulo. O total de doses administradas em todo o país, incluindo o estado, era de aproximadamente 295 milhões até o dia 22 de novembro de 2021.

[O parágrafo acima foi atualizado em 1º de fevereiro para corrigir o número de doses aplicadas no período, dado que estava incorreto na primeira versão deste texto]

O Comprova solicitou ao Ministério da Saúde e à Anvisa os dados atualizados sobre eventos já comprovados que tenham relação com as vacinas contra a covid-19, mas não obteve retorno. No dia 25 de janeiro a reportagem também fez o pedido via Lei de Acesso à Informação (LAI) e o governo tem 20 dias para responder, o que ainda não ocorreu.

Entre as crianças, a vacina pode reduzir em seis vezes a chance de complicação por covid-19, de acordo com dados levantados nos Estados Unidos, país onde há o maior número de jovens imunizados. Os casos reportados de miocardite são raros: a incidência é de 9 a cada 100 mil doses aplicadas (0,009%).

Todas as vacinas ofertadas pelo Programa Nacional de Imunizações que têm autorização de uso pela Anvisa passam por um rígido processo de avaliação de qualidade pelo Instituto Nacional de Controle de Qualidade em Saúde (INCQS) da Fiocruz. O PNI existe desde 1973 e é considerado referência mundial em campanhas de vacinação pela Organização Pan-Americana da Saúde (Opas), braço da Organização Mundial da Saúde (OMS) nas Américas.

Quais os benefícios e riscos das vacinas?

Como qualquer medicamento, vacinas podem causar reações. A coordenadora do Núcleo Técnico de Produtos Biológicos do INCQS, Maria Aparecida Affonso Boller, explica, em entrevista ao site do órgão, que antes de as doses serem enviadas ao PNI, as amostras são separadas para um controle da qualidade que garante a segurança e eficácia dos lotes. Nesta fase, são realizados testes de potência, estabilidade, esterilidade, pH, volume, entre tantos outros.

Na vida real, a vacina contra a covid-19 tem sido comprovadamente eficaz no combate à doença. Um levantamento da Secretaria de Saúde de São Paulo feito no Instituto de Infectologia Emílio Ribas mostrou que a probabilidade de óbito foi 14 vezes maior em pessoas sem a vacinação, em comparação com quem estava com o esquema completo. A chance de hospitalização também foi maior entre os não vacinados: nove em cada dez pacientes internados não tinham tomado nenhuma dose nos meses em que o estudo foi feito.

Ao Comprova, o médico pediatra Juarez Cunha, presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), observa que um número muito grande de pessoas já recebeu as vacinas ao redor do mundo – mais de 10 bilhões de doses foram aplicadas – e os eventos adversos na imensa maioria são leves a moderados. “Não significa que eventos adversos graves não possam acontecer com qualquer dessas vacinas. Podem acontecer, mas são raros”.

O Ministério da Saúde cita como possíveis complicações tromboses venosas, miocardite e pericardite, síndromes neurológicas como a síndrome de Guillain-Barré, encefalite, hemorragias cerebrais, arritmia, infarto agudo do miocárdio, embolia pulmonar, entre outros. Ainda assim, estes eventos são muito raros, ocorrendo, em média, 1 caso a cada 100 mil doses aplicadas, com risco significativamente inferior à chance de complicações pela própria covid-19.

O boletim epidemiológico com o dado mais recente de óbitos relacionados à vacina é de novembro de 2021 e traz informações preliminares. O documento cita 11 mortes, 0,3% das reações graves notificadas ao Ministério da Saúde até aquele momento. Os casos estão relacionados à síndrome de trombose com trombocitopenia. Do total de vítimas, oito foram vacinadas com doses da AstraZeneca e três com Janssen.

Os especialistas lembram que as vacinas também são uma ferramenta de combate às mutações do vírus. Hoje, são cinco as variantes de preocupação, segundo a OMS: Alpha, Beta, Gamma, Delta e Ômicron. As taxas de eficácia das vacinas para essas mutações variam de 68% a 98%, dependendo da fabricante.

Casos especiais: miocardite, pericardite, trombose com trombocitopenia e Guillain-Barré

Miocardite e Pericardite

Em julho de 2021, a Anvisa informou que os Estados Unidos relataram a ocorrência de casos de miocardite (inflamação do músculo cardíaco) e de pericardite (inflamação do tecido que envolve o coração) após a vacinação contra covid-19 com imunizantes de plataforma de RNA mensageiro (RNAm), que inclui o produto da Pfizer utilizado no Brasil.

Sobre os riscos destas complicações, a farmacêutica explicou que os diagnósticos são raros e ocorrem dentro de 14 dias após a vacinação, mais frequentemente depois da segunda dose, e em homens mais jovens.

No Brasil, foram 90 notificações de eventos adversos com alguma menção a miocardite ou pericardite em 11 meses de campanha. Pouco mais da metade (53%) ocorreu após a aplicação da vacina da Pfizer; outros 31% com AstraZeneca, e 15%, Coronavac. Desse total, 7 evoluíram a óbito, mas todos tiveram a pericardite descartada como causa da morte pelo Ministério da Saúde.

Trombose com trombocitopenia

A incidência aproximada de casos de trombose com trombocitopenia é de 1 caso a cada 100 mil doses aplicadas, ou seja, 0,001% dos indivíduos vacinados. Devido à raridade das ocorrências, ainda não foi possível identificar fatores de risco associados à síndrome.

A maioria dos países na Europa relata casos da doença em pessoas que receberam a vacina de vetor viral não replicante, como é o caso da AstraZeneca, e mais recentemente nos Estados Unidos com a vacina da Janssen.

No Brasil, até 4 de outubro de 2021, o Ministério da Saúde identificou 77 notificações individuais de eventos adversos com menção a quadros compatíveis com trombose e trombocitopenia.

Desse total, 18 foram considerados como associação causal consistente (incluindo 11 óbitos), 17 como indeterminado (6 óbitos), 7 como inconsistente ou coincidente (1 óbito), 11 como inclassificáveis (4 óbitos) e 24 ainda estavam em investigação na época.

Um dos casos registrados que resultou em óbito é do advogado Bruno Graf, de 28 anos, que faleceu em Santa Catarina em agosto de 2021 e cujo caso ganhou alcance nas redes sociais. Segundo boletim epidemiológico, Bruno sentiu calafrios, sensação febril e cefaleia no dia 23 de agosto, e morreu três dias depois. O documento afirma que o quadro foi desencadeado por uma trombose de sistema nervoso central com plaquetopenia associada.

O mesmo boletim aponta outra morte, de uma mulher de 27 anos, como tendo relação causal com as vacinas para covid-19. Ela apresentou febre, dor abdominal e dor nas costas em 10 de setembro e faleceu em 23 de setembro, também por trombose com trombocitopenia. Ambos os óbitos foram associados à vacina Astrazeneca.

Guillain-Barré

Em julho de 2021, a Anvisa emitiu alerta sobre casos raros de Síndrome de Guillain-Barré pós-vacinação. Os eventos adversos foram relacionados às vacinas AstraZeneca, Janssen e Coronavac.

Até aquele momento, haviam sido feitas 27 notificações de suspeitas de relação da doença com a vacina da Astrazeneca, além de três casos com a vacina da Janssen e outros quatro com a Coronavac, totalizando 34 registros. Segundo a Anvisa, a doença também está relacionada a doses aplicadas contra Influenza.

Trata-se de um distúrbio neurológico autoimune raro, no qual o sistema imunológico danifica as células nervosas. A maioria das pessoas se recupera totalmente. O principal risco é quando ocorre o acometimento dos músculos respiratórios e, nesse caso, a síndrome pode levar à morte.

Quais reações outras vacinas podem causar?

O Programa Nacional de Imunização inclui 45 vacinas para todas as faixas etárias da população brasileira. O Comprova pesquisou como se comportam algumas delas em relação aos efeitos adversos graves: a da gripe, a tríplice viral e a da febre amarela.

Anualmente, cerca de 80 milhões de brasileiros são vacinados contra a Influenza, dose produzida pelo Instituto Butantan. As reações mais comuns são dor de cabeça, mialgia, mal-estar, fraqueza, calafrios e febre.

O presidente da SBIm diz que reações de maior gravidade são raras, mas há, por exemplo, a chance de uma anafilaxia, uma alergia grave. “Há possibilidade de cinco casos de anafilaxia a cada milhão de doses aplicadas [contra a gripe]; são números muito parecidos entre as vacinas que a gente já utiliza e a vacina da covid”.

Já a bula da tríplice viral, que combina sarampo, rubéola e caxumba, descreve a possibilidade incomum – entre 0,1% e 1% dos imunizados – de inflamação no ouvido, gânglios linfáticos inchados, especialmente no pescoço, nas axilas e na virilha, perda de apetite, nervosismo, choro anormal, insônia, conjuntivite, bronquite, tosse, inchaço das glândulas que produzem a saliva, diarreia e vômito.

No caso da vacina contra a febre amarela, a dose tem um perfil particular por ser atenuada. “Ela pode ter como efeito grave uma doença semelhante à doença que a vacina protege, diferente da vacina da covid. E podem ser quadros graves. Mas é importante salientar que a imensa maioria dos eventos adversos são leves a moderados, como febre, dor no local, mal-estar, cansaço, o que pode acontecer com qualquer uma das vacinas que a gente usa, inclusive a da covid”, segundo Juarez Cunha.

Durante os estudos também foi identificada a possibilidade rara – entre 0,01% e 0,1% dos vacinados – de reações alérgicas e convulsões associadas à febre. Relatos pós-comercialização apresentaram outras reações raras como meningite; síndrome similar ao sarampo, síndrome similar à caxumba; epididimite e parotidite; síndrome de Guillain Barré, entre outras.

Vacinas pediátricas são seguras?

A cada dois dias uma criança morreu por complicações da covid-19 no Brasil em 21 meses de pandemia, até 6 de dezembro de 2021. Em números absolutos, foram 301 vítimas na faixa etária de 5 a 11 anos. O número de casos da doença neste público ultrapassa a marca de seis mil.

Para além das complicações diretas da infecção, o Ministério da Saúde também alerta para os registros de Síndrome Inflamatória Multissistêmica Pediátrica associada à covid-19 em crianças e adolescentes de zero a 19 anos. Até janeiro de 2022, foram confirmados 1.466 casos, com 88 óbitos. A maioria tinha nove anos de idade e 25% delas apresentava doenças prévias, como obesidade e cardiopatias.

Apesar dos números, o Brasil ficou atrás de países da Europa e dos Estados Unidos para dar início à vacinação infantil. As primeiras doses pediátricas da Pfizer começaram a ser aplicadas no início de janeiro de 2022, e a Coronavac foi incorporada à campanha quase um mês depois. Ambas receberam autorização da Anvisa.

O infectologista Juarez Cunha, que é médico pediatra, explica que nos estudos conduzidos pela Pfizer não foram demonstrados eventos adversos graves relacionados ao público infantil. Destaca, contudo, que os estudos utilizam de 2 mil a 5 mil participantes, e que o cenário pode mudar quando milhões de doses passam a ser aplicadas.

De acordo com o The New York Times, desde novembro de 2021, os Estados Unidos vacinaram totalmente mais de 5 milhões de crianças na faixa etária de 5 a 11 anos. O médico destaca que a farmacovigilância do país é muito rigorosa e, como esperado, identificou apenas eventos adversos leves a moderados. “Nenhum relato de morte causada pela vacina”, afirma.

A campanha americana também mostrou que crianças imunizadas contra a covid-19 têm seis vezes menos chances de contrair a doença com gravidade. Cunha acrescenta: “Vacinar a criança protege não apenas ela, mas tem grande possibilidade de, assim, evitar a transmissão para outras pessoas, colegas de escola ou mesmo família”.

O que diz a legislação sobre vacinação infantil?

Com o início da vacinação infantil no Brasil, pais, responsáveis e autoridades têm debatido se a campanha contra a covid-19 nesse público deveria se tornar obrigatória. De acordo com o primeiro parágrafo do artigo 14 do Estatuto da Criança e Adolescente, a imunização em menores de 18 anos é exigida caso haja recomendação feita pelas entidades sanitárias, como é o caso da Anvisa.

Uma decisão no Supremo Tribunal Federal de janeiro deste ano orientou os Ministérios Públicos que acompanhem casos de pais que se recusam a vacinar os filhos contra a covid-19. O procurador-geral de Justiça de São Paulo, Mário Sarrubbo, disse ao Comprova que uma das punições possíveis é a perda temporária da guarda. Na avaliação da promotoria, deve prevalecer o direito à saúde, como previsto no ECA.

Ao mesmo tempo, o STF entende que a vacinação não deve ser forçada, permitindo a recusa do usuário, mas também possibilitando a restrição de atividades previstas em lei.

Pessoas contrárias à campanha infantil contestam a exigência alegando que a Lei n°6259 de 30 de outubro de 1975 torna obrigatórias apenas as vacinas que estão no Programa Nacional de Imunização, que é de responsabilidade do Ministério da Saúde.

Em janeiro deste ano, porém, o governo anunciou a inclusão da dose pediátrica no Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a Covid-19 (PNO), e não no PNI. A própria pasta diz que a imunização da faixa etária de 5 a 11 anos não é obrigatória.

Nestes casos, explica o procurador-geral de Justiça de São Paulo, é usada a Lei de Introdução ao Código Civil, que aborda regras conflitantes. O texto determina que “uma lei posterior revoga uma lei anterior”. Assim, entende o jurista, o ECA, que é de 1990, tem a preferência. Outro ponto disposto na Lei de Introdução ao Código Civil é que uma lei genérica pode ser revogada por uma lei específica, como é o caso do estatuto.

Por que investigamos?

O Comprova faz a verificação de conteúdos suspeitos que tenham viralizado sobre pandemia, políticas públicas do governo federal e eleições.

Desde o início da vacinação contra a covid-19, as redes sociais foram tomadas por dúvidas sobre eficácia das vacinas e também sobre os possíveis riscos de eventos adversos. Este Comprova Explica tem o objetivo de informar sobre esses tópicos.

As vacinas têm a eficácia e a segurança testadas e comprovadas por diversos órgãos e entidades, como a Anvisa, FDA, dos Estados Unidos, e EMA, da Europa.

Desde o início de 2021, o Comprova checou diversas peças de desinformação sobre os imunizantes empregados no Brasil contra a covid-19.

Alguns exemplos de verificação são a que demonstra ser falsa a declaração de um médico afirmando que as vacinas são “lixo”, a que informa que o Ministério da Saúde descartou a relação entre a morte de um adolescente e a vacina e ser falsa uma postagem que dizia que as vacinas causavam dano ao sistema imunológico, entre outras que podem ser conferidas aqui, aqui, aqui e aqui.

Esta reportagem considerou os dados sobre vacinas e a covid-19 disponíveis até 31 de janeiro de 2022.

Saúde

Investigado por: 2022-01-31

Não há registro de mortes de crianças causadas por vacinas contra a covid-19 no Brasil

  • Falso
Falso
É falso que uma menina tenha morrido na Bahia após se vacinar contra a covid-19 como afirmam vídeos compartilhados em redes sociais. Segundo o Ministério da Saúde, nenhuma criança ou adolescente com menos de 18 anos veio a óbito no Brasil em consequência de evento adverso pós-vacinação. A Secretaria Estadual de Saúde da Bahia também afirma não haver registro de morte de criança em decorrência da aplicação da vacina, ou mesmo casos em investigação que se enquadrem no perfil das meninas mostradas nos vídeos.
  • Conteúdo verificado: Vídeos, áudio e fotos que circulam no Facebook, no Instagram e no WhatsApp dizem que uma menina morreu após receber o imunizante contra a covid-19. Em outro vídeo, que circula por WhatsApp, é feita uma edição que une trechos de dois desses vídeos com os dizeres: “Mais uma criança veio a óbito” e a imagem de uma seringa.

É falso que uma menina tenha morrido após ser vacinada contra a covid-19 no Brasil. Em nota enviada ao Comprova no dia 27, o Ministério da Saúde disse que ninguém com menos de 18 anos faleceu após receber o imunizante no país.

Os vídeos que circulam na internet mostram crianças passando mal em dois momentos: vomitando em um balde e se queixando de dores em um leito hospitalar. As características físicas são aparentemente distintas. Esses vídeos foram compartilhados separadamente, com a atribuição de nomes diferentes às crianças.

Porém, há uma versão editada, que circula por WhatsApp, que une os dois trechos, dando a entender que seriam imagens de uma mesma menina e que ela teria morrido como consequência da aplicação da vacina contra a covid-19.

Nos diferentes conteúdos que circulam, as meninas são chamadas por vários nomes e há informações desencontradas sobre as cidades de origem. Mas em um dos vídeos é possível ver, ao lado de uma delas, um menino que usa o uniforme escolar da rede municipal de Salvador, na Bahia.

A Secretaria Estadual de Saúde da Bahia informou ao Comprova que o estado não registrou nenhuma morte decorrente de evento adverso pós-vacinação. O Estado também disse que não há nenhum caso em investigação que se enquadre no perfil de uma pessoa do sexo feminino com menos de 18 anos.

O painel da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que registra os eventos suspeitos de farmacovigilância, diz que o único caso suspeito registrado na Bahia para a vacina da Pfizer foi de um homem adulto.

Outras mensagens sugeriam que uma das meninas teria sido atendida em Manaus. A Secretaria de Saúde do município foi procurada, e informou ao Comprova que não há registro de evento adverso grave pós-vacinação em menores de 18 anos na cidade. O painel da Anvisa aponta que, até o momento, não há nenhum caso de reação adversa suspeito para o imunizante da Pfizer em todo o estado do Amazonas.

O Comprova ouviu a mulher cujo número de WhatsApp aparece em algumas postagens compartilhando o áudio que seria da mãe da criança. Ela disse desconhecer a família e afirmou que recebeu o conteúdo de outros grupos e apenas o compartilhou porque estava em busca de informações sobre o episódio.

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado.

Como verificamos?

Primeiro, procuramos por informações nos conteúdos suspeitos que pudessem nos indicar de onde eram as meninas que aparecem no vídeo e nas fotos e seus nomes. Além do uniforme da rede municipal de Salvador, algumas mensagens indicavam que ela poderia ter sido atendida no Hospital Estadual Costa do Cacau, que fica na cidade de Ilhéus, na Bahia, ou no Hospital Santa Izabel, uma Santa Casa em Salvador. Dois comentários no Instagram sugeriam que as imagens de ao menos uma das meninas seriam de Manaus, no Amazonas.

O Comprova procurou o Ministério da Saúde, a Anvisa, o Conselho Estadual de Saúde baiano e as secretarias de saúde da Bahia, de Salvador e de Manaus, em busca de informações sobre eventos adversos graves associados à vacinação em pessoas do sexo feminino que tivessem menos de 18 anos.

Também procuramos por e-mail o Instituto Brasileiro de Desenvolvimento da Administração Hospitalar (IBDAH), que administra o Hospital Estadual Costa do Cacau, e o Hospital Santa Izabel pelo número de WhatsApp disponível no site.

O Comprova ainda procurou o Ministério Público do Estado da Bahia a respeito do compartilhamento dos vídeos.

Entramos em contato por WhatsApp com o número da mulher que, segundo alguns dos conteúdos, teria compartilhado o áudio associado à mãe de uma das crianças.

Por fim, buscamos os perfis que compartilharam as imagens das crianças e um outro que postou um vídeo que, supostamente, seria o relato da tia de uma das meninas negando a relação da morte com a vacina contra a covid-19.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 31 de janeiro de 2021.

Verificação

Nenhuma criança morreu após a vacinação

Embora os conteúdos investigados afirmem que a menina teria morrido após a vacinação, o Ministério da Saúde enviou uma nota ao Comprova afirmando que “não há registros de óbitos por causalidade com as vacinas covid-19 em menores de 18 anos” no Brasil.

A Secretaria Estadual de Saúde disse, também por meio de nota, que a Bahia não teve nenhum óbito decorrente de eventos adversos pós-vacinação até 27 de janeiro de 2022. Afirmou, ainda, que nenhuma menor de 18 anos do sexo feminino foi atendida no Hospital Regional Costa do Cacau, que pertence à rede estadual, com caso grave de reação adversa pós-vacinação.

Em um segundo contato, o Comprova insistiu para saber se havia algum caso de menor de 18 anos do sexo feminino em investigação. A pasta disse que não há nenhum caso com essas características em análise.

O Conselho Estadual de Saúde da Bahia afirmou não ter recebido informações sobre um caso suspeito de uma menina que tenha morrido após evento adverso relacionado à vacinação.

Já a assessoria de imprensa da Secretaria de Saúde de Salvador disse não haver registro de atendimento na rede municipal do caso mostrado no vídeo em que aparece, ao lado da criança, um menino com uniforme escolar da cidade.

Em resposta ao Comprova por e-mail, o Ministério Público da Bahia disse não ter tomado conhecimento sobre o compartilhamento dos vídeos. O órgão pediu que o material fosse encaminhado para o Centro de Apoio de Defesa da Criança e do Adolescente (Caoca), “para que o Ministério Público da Bahia possa apurar os fatos e tomar as devidas providências”.

A Anvisa e o instituto que administra o Hospital Costa do Cacau não responderam. Ao site Ilhéus 24 horas, a unidade de saúde disse que a morte da menina era falsa. O WhatsApp do Hospital Santa Izabel afirmou que o contato da assessoria de imprensa só poderia ser passado ligando para o número fixo da instituição, que não atendeu.

Como os conteúdos suspeitos já circulavam na Internet no dia 20 de janeiro, as meninas em questão só poderiam ter recebido a vacina Comirnaty, da farmacêutica Pfizer, uma vez que a autorização para aplicação da CoronaVac em menores de 18 anos só foi concedida pela Anvisa no dia 20.

Um painel no site da Anvisa registra as notificações de casos suspeitos por farmacovigilância em todo o país para vacinas e medicamentos. Na Bahia, a única reação adversa após aplicação da Comirnaty foi de um homem adulto, na faixa etária entre 18 e 44 anos, cuja notificação ocorreu em novembro de 2021.

No Amazonas, nenhum caso suspeito de eventos adversos relacionados à Comirnaty foi reportado à Anvisa.

As meninas

Nenhum dos conteúdos suspeitos diz qual o sobrenome das meninas. E cada um cita um nome diferente para a criança. No vídeo que foi compartilhado por uma página como sendo da tia de uma delas, a suposta parente também não cita o nome da menina. Sem essas informações, não foi possível identificar as crianças e confirmar com exatidão se as imagens mostram indivíduos distintos ou a mesma criança.

Procurado, o perfil que compartilhou o vídeo da suposta tia disse que retirou o conteúdo de um grupo do Telegram, mas não soube informar qual. E acrescentou não ter informações sobre a família e o local em que a postagem original do vídeo foi feita pela suposta tia, que, no vídeo, nega relação da morte com a vacina e pede para que parem de compartilhar a imagem que seria de sua sobrinha num leito hospitalar.

O Comprova tentou buscas reversas pelo conteúdo a partir dos prints retirados do vídeo, mas não encontrou outras postagens do material.

Por WhatsApp, o Comprova conversou com a mulher que compartilhou um áudio que seria da mãe da menina. Mas ela disse não conhecer a família, apenas compartilhou conteúdos que recebeu em outro grupo porque estaria em busca de mais informações sobre o caso.

Informações semelhantes também foram ditas em postagens de outros perfis que compartilharam o material nas redes sociais.

Também não foi possível localizar a criança por meio dos comentários deixados nas postagens, já que cada um trazia informações diferentes em relação aos nomes e locais em que as imagens teriam sido gravadas.

Por que investigamos?

O Comprova investiga conteúdos suspeitos sobre a pandemia, políticas públicas e eleições que tenham viralizado nas redes sociais. Juntos, os conteúdos investigados aqui tiveram mais de 3 mil interações só no Facebook.

Quando o conteúdo trata da pandemia, a verificação é ainda mais necessária, porque a desinformação pode levar as pessoas a deixarem de se proteger e se exporem a riscos de infecção. Isso fica ainda mais evidente pelo fato de os vídeos, imagens e áudio circularem no momento em a vacinação chega a crianças de 5 a 11 anos.

O site Boatos.org publicou uma checagem sobre os vídeos, negando a veracidade. Recentemente, o Comprova mostrou que o Ministério da Saúde descartou a relação entre a vacina e a morte de um adolescente em João Pessoa; que o vídeo de um pai desesperado é antigo, foi filmado no Amazonas e não tem relação com a vacina; e que uma publicação enganosa distorce dado de estudo alemão para criticar a vacinação infantil.

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.

Saúde

Investigado por: 2022-01-28

Deputada engana com montagem que associa miocardite de jogador à vacina contra covid

  • Enganoso
Enganoso
É enganosa a montagem publicada pela deputada federal Carla Zambelli (PSL) no Facebook com títulos de reportagens dando a entender que o jogador canadense Alphonso Davies, do Bayern de Munique (Alemanha), teve miocardite por conta da vacina contra covid-19. Na realidade, o jogador teve miocardite como consequência da doença, como atesta publicamente o próprio clube.
  • Conteúdo verificado: Em uma montagem publicada no Facebook, a deputada Carla Zambelli destaca títulos de três reportagens que, lidos em sequência, sugerem que um jogador do Bayern de Munique desenvolveu miocardite após tomar vacina contra a covid-19. Na legenda, ela faz o comentário: “Notícias que falam por si só! Tirem suas conclusões!”.

É enganoso o post publicado pela deputada federal Carla Zambelli no Facebook, no qual ela faz uma montagem com títulos de reportagens dando a entender que o jogador canadense Alphonso Davies, do Bayern de Munique (Alemanha), teve miocardite por conta da vacina contra a covid-19. O jogador teve este problema após contrair a doença, como mostra a íntegra de uma das notícias destacadas pela parlamentar. A conclusão sobre o diagnóstico do jogador foi divulgada oficialmente pelo Bayern de Munique.

No post publicado no Facebook, a deputada enfatiza o conteúdo com o comentário “Notícias que falam por si só! Tirem suas conclusões!”. Em contato com o Comprova, a assessoria de Carla Zambelli negou que ela tivesse relacionado este caso de miocardite à vacinação, mas foi esse o entendimento de diversos seguidores que comentaram o post da deputada.

O Comprova classificou o conteúdo como enganoso, porque tira de contexto as informações sobre a miocardite e o diagnóstico feito no jogador do Bayern de Munique, induzindo a conclusões equivocadas.

Como verificamos?

Para realizar a verificação, procuramos as reportagens utilizadas por Carla Zambelli na montagem enganosa para entender o contexto em que foram publicadas e também o que os textos na íntegra diziam.

Na sequência, buscamos dados oficiais de órgãos como a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), o Ministério da Saúde, o Food and Drug Administration (FDA) — equivalente à Anvisa nos Estados Unidos — e o Programa Nacional para as Doenças Cérebro-Cardiovasculares da Direcção-Geral da Saúde, órgão de saúde do governo de Portugal.

Também foram procurados especialistas, informações no site oficial do Bayern de Munique e a deputada que publicou a montagem.

Verificação

Títulos tirados de contexto levam a falso entendimento

A montagem publicada pela deputada traz as imagens dos títulos de três textos diferentes. O primeiro é uma reportagem da agência alemã Deutsche Welle, de 22 de novembro de 2021, com a manchete “Bayern de Munique pune jogadores não vacinados”, que discute a possibilidade de o clube multar atletas que escolham não tomar a vacina e percam dias de trabalho caso tenham covid-19. Essa é uma situação prevista na legislação local e envolve corte de salário de funcionários não imunizados que faltarem ao trabalho por causa de infecção pela covid-19.

O segundo texto é um alerta da Anvisa publicado em seu próprio site no dia 9 de julho de 2021, com o título “Anvisa alerta sobre risco de miocardite e pericardite pós-vacinação”. Ali, a agência informou que o norte-americano FDA relatou a ocorrência de casos raros de miocardite (inflamação do músculo cardíaco) e de pericardite (inflamação do tecido que envolve o coração) após a vacinação contra covid-19 com imunizantes de plataforma RNA mensageiro (RNAm), como as vacinas da Pfizer e da Moderna. O texto destaca que esses problemas podem ser efeitos adversos das vacinas, mas mantém a recomendação da imunização, uma vez que os “benefícios superam os riscos” e que os dados sugerem a maior incidência em jovens e de forma leve.

O terceiro texto é uma reportagem do site Globo Esporte, de 14 de janeiro de 2022, com o título “Alphonso Davies é diagnosticado com miocardite e precisa ser afastado no Bayern de Munique”. O texto é claro ao informar que o lateral-esquerdo teve a inflamação no coração como desdobramento da infecção pela covid-19, e não por conta da vacinação. No mesmo dia, o Bayern de Munique confirmou o afastamento de Alphonso Davies dos treinamentos por conta de miocardite. O técnico do Bayern, Julian Nagelsmann, falou oficialmente sobre o caso. “No exame de acompanhamento que fazemos com todos os jogadores infectados, encontramos sinais de miocardite leve em Alphonso. Ele está sem treinar. O ultrassom revelou que não é tão dramático o caso, mas ele vai precisar ficar fora pelas próximas semanas porque isso leva um tempo para recuperar”, explicou o treinador.

Ao jornal canadense The Star, o empresário do jogador, Nick Househ, afirmou no mesmo dia que Davies estava completamente vacinado, tendo tomado a dose de reforço em dezembro.

A notícia de que o atleta do Bayern de Munique teve covid-19 também era conhecida desde 5 de janeiro, quando o clube alemão anunciou que Davies testou positivo.

Esses dois fatos públicos – que Davies teve covid-19 e que a miocardite teve como origem a doença – não aparecem na montagem publicada por Zambelli em 15 de janeiro de 2022. A deputada é integrante da bancada de apoio ao presidente Jair Bolsonaro (PL) e, assim como ele, tem uma atuação marcada pela divulgação de conteúdos contrários à vacinação contra covid-19. Em dezembro de 2021, por exemplo, a Agência Lupa mostrou que a parlamentar usou conteúdo falso para atacar a vacinação de crianças contra a doença.

Procurada pelo Comprova, a assessoria da deputada negou que ela tenha afirmado que o problema de miocardite enfrentado por Alphonso Davies tivesse relação com a vacina. Segundo a assessoria, a parlamentar postou uma informação que é um alerta da própria Anvisa sobre o risco de miocardite e pericardite. “Não houve qualquer afirmação dela de que foi devido à vacina”, comunicou.

Os títulos das matérias publicados de forma isolada, sem o conteúdo completo e de maneira consecutiva, levaram, no entanto, ao falso entendimento de que o jogador canadense desenvolveu uma doença cardíaca após se vacinar.

O comentário com mais interações no post de Zambelli no Facebook é de uma usuária que diz não ter tomado a vacina e que afirma estar observando “vários casos de mortes e reações da vacina”, que a “mídia não mostra”, deixando “o povo” sem saber “o que fazer”. Uma outra usuária diz: “Se não toma, não pode jogar. Se toma e fica com problema, não pode jogar. Tá osso!”

Ambos comentários foram respondidos por Zambelli. No primeiro caso, ela disse: “Devemos sempre defender a nossa liberdade! Sem ela não podemos fazer nada.” No segundo caso, afirmou: “Bem complicado não é mesmo? Por isso sigo defendendo a nossa liberdade!”

| Captura de tela da troca de mensagens de Carla Zambelli com uma usuária do Facebook feita em 28 de janeiro de 2022.

Em nenhum momento, a parlamentar esclareceu à leitora que o problema do jogador canadense fora detectado após ele ter contraído covid-19, e não depois de ter se vacinado. A deputada também não informa seus seguidores que a miocardite eventualmente relacionada à vacinação tende a ter uma recuperação rápida e que o risco de uma pessoa ter miocardite após contrair covid-19 supera em muitas vezes o risco de isso ocorrer como efeito adverso da vacinação.

Miocardite e covid-19

Diversos especialistas apontam, utilizando estudos variados, que o risco de se desenvolver miocardite após a vacinação é bem inferior ao risco de ter esse problema após contrair a covid-19.

Em setembro de 2021, por exemplo, o Centro de Controle e Prevenção de Doenças, ligado ao FDA norte-americano, publicou um estudo segundo o qual a incidência da miocardite em vacinados é de 9 casos a cada 100 mil enquanto em pessoas que tiveram a doença e não se vacinaram são de 150 casos para cada 100 mil.

Segundo o infectologista André Ricardo Araújo da Silva, médico do Grupo Prontobaby e professor da Universidade Federal Fluminense, a miocardite é uma inflamação do músculo do coração, o miocárdio. “Os sintomas geralmente são dor no peito, sensação de palpitação. A pessoa pode sentir falta de ar como alguma coisa apertando”, afirmou ao Comprova.

Em 4 de janeiro de 2022, durante uma audiência pública sobre a vacinação contra a covid-19 de crianças e adolescentes, realizada pelo Ministério da Saúde, o representante da Sociedade Brasileira de Pediatria, Marco Aurélio Sáfadi, comentou essa questão. “Um evento adverso que foi observado é a ocorrência da miocardite entre os vacinados. Mas é importante que se compreenda se esse risco é diferente pela própria covid-19. Mesmo nos grupos com mais casos de miocardite com a vacinação, os números são dezenas de vezes inferiores ao risco de miocardite atribuído à própria covid-19”, explicou o médico.

No último dia 25, um documento do Programa Nacional para as Doenças Cérebro-Cardiovasculares, da Direcção-Geral da Saúde, um órgão do governo de Portugal, concluiu que a “miocardite após vacinação é muito rara e geralmente ligeira, com rápida recuperação, parece não ter sequelas e atinge particularmente rapazes na adolescência e jovens adultos”, segundo o jornal Público.

Em julho do ano passado, o subcomitê para covid-19 do Comitê Consultivo Global da Organização Mundial da Saúde (OMS) sobre Segurança de Vacinas (GACVS) emitiu uma declaração sobre notificações de miocardite e pericardite após vacinas de mRNA contra covid-19.

O subcomitê também revisou dados da Austrália, Canadá, Israel e EUA e observou que alguns, mas não todos os dados, sugeriram maior incidência de miocardite após uma segunda dose da vacina da Moderna (Spikevax) do que a vacina da Pfizer (Comirnaty) em homens jovens, embora o risco geral seja pequeno. Observou ainda que a miocardite pode ocorrer após a infecção pelo vírus da covid-19 e que as vacinas de mRNA têm um benefício claro na prevenção de hospitalização e morte pela doença.

Os dados disponíveis sugerem que o curso imediato da miocardite e pericardite após a vacinação com ambos os imunizantes é geralmente leve e responde ao tratamento. O acompanhamento dos casos continua em andamento pelos órgãos locais e também entidades independentes para determinar os resultados a longo prazo. Os indivíduos vacinados devem ser instruídos a procurar atendimento médico imediato se desenvolverem sintomas indicativos de miocardite ou pericardite, como dor torácica persistente, falta de ar ou palpitações após a vacinação.

De acordo com o professor da Universidade Federal Fluminense, em alguns casos de covid, a inflamação é uma das complicações. “A covid-19 é uma doença respiratória que provoca sintomas de gripe em 85% dos casos, que evoluem de forma satisfatória. De 10% a 15% dos pacientes têm efeitos leves e moderados e, dentro deste grupo, a gente tem como uma das complicações as alterações cardiovasculares, incluindo a miocardite e fenômenos embólicos, como a trombose. A incidência exata ainda não é conhecida, tem diversos estudos que mostram um percentual pequeno”, disse o médico.

Ainda segundo o especialista, estudos apuram se a miocardite pode também ter relação causal com a vacina. “Já tem relatos na literatura casos que aconteceram em diferentes lugares do mundo, de pessoas que apresentaram inflamação após serem imunizadas. Só que essa relação causa e efeito é meio complicada, é preciso tirar todas as outras causas possíveis, tirar coincidências temporais, nem sempre isso é possível”, diz André Ricardo.

Israel realizou um estudo com cerca de 5 milhões de pessoas que aponta uma incidência duas vezes maior em desenvolver a miocardite em pessoas que receberam as vacinas da Pfizer e da Moderna, desenvolvidas com a tecnologia do RNA mensageiro. Foram identificados 136 casos de miocardite entre os 5 milhões de pacientes.

Por que investigamos?

O Comprova tem o compromisso de investigar conteúdos suspeitos que tenham relação com a pandemia, políticas públicas do governo federal e eleições. A equipe tem como foco as publicações virais, que tiveram grande alcance nas redes sociais e podem causar desinformação.

A postagem da deputada ultrapassou as 30 mil interações até o dia 28 de janeiro e foi editada de forma que induz o leitor a questionar a eficácia da vacina e ainda alerta para um perigo de forma equivocada.

O Comprova já havia demonstrado anteriormente que as vacinas da Pfizer trazem menor risco de miocardite do que a covid-19 e que a segurança das mesmas foi assegurada por diversas agências reguladoras pelo mundo.

Enganoso: Conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Eleições

Investigado por: 2022-01-27

Mesmo sem biometria, eleitor poderá votar em 2022

  • Falso
Falso
É falsa a afirmação de que será exigido cadastro de biometria para votar nas eleições gerais de 2022. Publicações com variações dessa mesma mensagem têm sido divulgadas por perfis pró-Bolsonaro no Facebook, Twitter e WhatsApp, alertando para um suposto prazo para realizar o cadastramento, que se encerraria em 4 de maio. A data, na verdade, refere-se ao prazo para regularizar o título de eleitor. Um texto no site do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) esclarece que o cadastro biométrico está suspenso desde 2020 devido à pandemia de covid-19, e que “nenhuma eleitora ou eleitor que não realizou o cadastramento será proibido de votar”.
  • Conteúdo verificado: Postagem no Facebook afirma que o prazo para registrar biometria para as eleições de 2022 se encerra em 4 de maio. O texto sugere que o cadastro é obrigatório para poder votar, e afirma que a informação não tem sido divulgada para barrar apoiadores do presidente Jair Bolsonaro (PL). O autor pede que a publicação seja compartilhada “para alcançar o maior número possível de eleitores da direita”.

É falsa a afirmação de que será exigido cadastro de biometria para votar nas eleições gerais de 2022. Publicações com variações dessa mesma mensagem têm sido divulgadas por perfis pró-Bolsonaro no Twitter, no Facebook e também por WhatsApp, sugerindo a existência de um “complô” do TSE com a mídia tradicional para ocultar essa informação dos apoiadores do atual presidente, impedindo que votem por sua reeleição.

As postagens alertam que em 4 de maio se encerraria o suposto prazo para registrar a biometria. A data, na verdade, refere-se ao prazo para regularizar o título de eleitor.

Um texto sobre o boato no site do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) informa que o cadastro biométrico está suspenso desde 2020 devido à pandemia de covid-19, e que “nenhuma eleitora ou eleitor que não realizou o cadastramento será proibido de votar”.

O Comprova procurou o autor de uma postagem com mais de 4 mil interações no Twitter por e-mail, WhatsApp e perfis no Facebook, mas não obteve resposta até a publicação desta verificação.

O conteúdo foi classificado como falso porque apresenta uma mentira, sem fundamento na realidade, para gerar confusão sobre o processo eleitoral.

Como verificamos?

O Comprova iniciou esta checagem buscando as informações em canais oficiais do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e de Tribunais Regionais Eleitorais (TREs) de diferentes estados brasileiros a respeito do processo de cadastramento biométrico. O sistema foi um mecanismo criado pela Justiça Eleitoral para tornar o processo eleitoral brasileiro ainda mais seguro.

Conforme o TSE, a adoção da biometria — usada pela primeira vez na eleição de 2008, em três cidades brasileiras — reduziu significativamente a intervenção humana no processo de votação. A urna só é liberada para votação quando o leitor biométrico identifica as impressões digitais do eleitor, as quais são verificadas eletronicamente a partir do banco de dados unificado da Justiça Eleitoral.

Por causa da pandemia da covid-19, o processo de cadastramento biométrico no país precisou ser suspenso. A medida foi determinada pelo TSE, por meio da Resolução nº 23.615/2020, para prevenir a infecção pelo vírus.

O Comprova verificou também os prazos estipulados no calendário eleitoral de 2022 e as datas que devem ser observadas pelos partidos, candidatos e eleitores. A data mencionada na publicação alvo desta checagem [4 de maio] diz respeito ao prazo limite para que eleitores realizem operações de transferência do local de votação e revisão de qualquer informação constante do Cadastro Eleitoral.

Nessa segunda-feira (24 de janeiro), pela viralização de conteúdos com mesmo teor do post checado nesta verificação, o TSE e outros TREs de todo o país divulgaram informações em seus canais oficiais (site e redes sociais como o Facebook), classificando como falsas as alegações de que o eleitor que não realizar o cadastramento biométrico até 4 de maio estará impedido de votar na eleição, seja em primeiro (2 de outubro) ou segundo turno (30 de outubro).

O projeto de checagens também conversou com a advogada atuante em direito público e defesa de mulheres Maíra Recchia.

Verificação

Biometria suspensa

O texto verificado pelo Comprova, compartilhado por um perfil pessoal no Facebook, e propagado no WhatsApp e outras redes sociais, afirma que o cadastro eleitoral encerra em 4 de maio de 2022 e, de forma equivocada, aponta que quem não tiver registrado a biometria até esta data não poderá votar.

No entanto, o próprio TSE, em um release publicado na tarde de segunda-feira (24), informou que o eleitor sem biometria não será impedido de votar em 2022. Reiterou, ainda, que o cadastro biométrico continua suspenso em todo o país.

Além disso, todas as informações relativas à biometria, assim como a suspensão do cadastramento em função da pandemia da covid-19 foram divulgadas pelo TSE em seus canais oficiais (site e redes sociais). As mesmas informações também foram publicadas por Tribunais Regionais Eleitorais de diferentes partes do país.

Impressão digital

A advogada atuante em direito público e defesa de mulheres Maíra Recchia explicou ao Comprova que a biometria é uma forma de identificar o eleitorado pela impressão digital. “[A biometria] veio para conferir maior agilidade no processo de identificação daquele(a) que irá votar. Nesse formato, a urna só é liberada para votação quando o leitor biométrico identifica as impressões digitais da eleitora ou do eleitor, após o competente cadastramento biométrico na Justiça Eleitoral”, esclareceu.

Recchia enfatiza, assim como os órgãos eleitorais, que em virtude da pandemia da covid-19 o cadastramento biométrico foi suspenso, mas que aqueles que não se cadastraram continuam aptos a votar conforme a resolução do TSE número 23.669/2021.

“Essa resolução trata dos atos gerais do processo eleitoral, e dispõe que a carteira de identidade, identidade social, passaporte ou outro documento de valor legal equivalente, inclusive carteira de categoria profissional reconhecida por lei, certificado de reservista; carteira de trabalho e carteira nacional de habilitação são documentos suficientes para comprovar a identidade do(a) eleitor(a) e permitir o exercício do voto. Ou seja, quem ainda não se cadastrou biometricamente basta (portar um desses documentos)”, disse.

Por que investigamos?

O Comprova investiga conteúdos suspeitos sobre pandemia, políticas públicas e eleições. O projeto observa os dados de viralização e o impacto desses conteúdos para decidir pela verificação. Nos últimos anos, tem se tornado comum a circulação de mensagens e informações falsas com o intuito de descredibilizar e tumultuar o processo eleitoral no país.

A mesma publicação analisada nesta checagem do Comprova teve variações divulgadas por perfis pró-Bolsonaro no Facebook, Twitter e WhatsApp. Todas sugerem a existência de um “complô” entre o TSE e a mídia tradicional para ocultar uma suposta obrigatoriedade de realização de cadastramento biométrico para participação no processo eleitoral deste ano.

O suposto “complô” teria o objetivo de afastar das urnas apoiadores do presidente Bolsonaro, impedindo uma possível reeleição. Uma das postagens teve mais de 4.000 interações.

A segurança no sistema eleitoral é um dos principais alvos de desinformação hoje nas redes sociais. O conteúdo aqui verificado também foi investigado pelo Boatos.org, G1, Agência Lupa e desmentido pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Para o Comprova, falso é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.