O Projeto Comprova é uma iniciativa colaborativa e sem fins lucrativos liderada pela Abraji e que reúne jornalistas de 42 veículos de comunicação brasileiros para descobrir, investigar e desmascarar conteúdos suspeitos sobre políticas públicas, eleições, saúde e mudanças climáticas que foram compartilhados nas redes sociais ou por aplicativos de mensagens.
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Saúde

Investigado por: 2020-07-06

É verdadeiro que Bolsonaro tenha liberado auxílio de R$ 160 milhões a asilos proposto pelo Congresso

  • Comprovado
Comprovado
Projeto foi apresentado no plenário da Câmara pela deputada federal Leandre (PV-PR) em 14 de abril, aprovado pelo Congresso e sancionado pelo presidente da República em 29 de junho, último dia do prazo para tal, com quatro vetos
  • Conteúdo verificado: Texto publicado pelo site Pleno News alegava que o presidente Jair Bolsonaro teria liberado um fundo de R$ 160 milhões a asilos para auxiliar no combate à pandemia do novo coronavírus

É verdadeiro que o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) tenha liberado um fundo de R$ 160 milhões para asilos durante a pandemia de covid-19, conforme divulgado pelo site Pleno News em 30 de junho. O conteúdo, cuja verificação foi sugerida por leitores do Comprova e que teve ampla visualização nas redes sociais, diz que Bolsonaro sancionou uma lei que ajudaria Instituições de Longa Permanência para Idosos (ILPIs) no combate à doença.

A lei foi assinada pelo presidente em 29 de junho de 2020. A única informação que não consta do texto é que ela foi elaborada e aprovada pelo Congresso Nacional, apresentada pela deputada federal Leandre (PV-PR), antes de seguir para a sanção presidencial.

A notícia diz corretamente que a nova lei também foi assinada pelos ministros Walter Braga Netto (Casa Civil), Damares Alves (Mulher, Família e Direitos Humanos) e José Levi Mello do Amaral Júnior (Advocacia-Geral da União).

Como verificamos?

O Comprova pesquisou no site do governo federal se havia sido aprovada alguma lei sobre o tema e encontrou uma notícia do dia 30 de junho anunciando a assinatura da Lei 14.018. O texto fornece o link para o registro da assinatura no Diário Oficial da União, em 30 de junho.

Buscamos mais informações sobre a lei e encontramos na Agência Senado uma notícia explicando que o projeto teve origem na Câmara dos Deputados. Em uma busca rápida no site da Câmara foi possível encontrar a data em que o projeto foi apresentado pela primeira vez e todo o processo que percorreu, passando também pelo Senado Federal, até virar lei.

Para entender melhor como funciona a tramitação, o Comprova pesquisou, nos sites ligados aos órgãos legislativos, como são feitas as leis no país e quais passos devem ser executados ao longo do processo.

Verificação

O que é o fundo aos asilos?

A lei assinada prevê que a União destinará um auxílio financeiro de R$ 160 milhões para que Instituições de Longa Permanência para Idosos (ILPIs) possam se fortalecer no combate ao novo coronavírus. Para isso, podem ser utilizados recursos do Fundo Nacional do Idoso (FNI), gerenciado pelo Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Idosa, órgão que integra o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH).

O FNI financia ações relativas ao idoso que “assegurem os direitos sociais e criem condições para promover sua autonomia, integração e participação efetiva na sociedade”, segundo o governo federal.

A divisão dos valores a serem enviados a cada instituição caberá ao MMFDH e deve considerar o número de idosos atendidos em cada local. Mesmo as instituições que apresentam algum tipo de pendência, sejam débitos ou situação de inadimplência, terão direito a receber o auxílio.

Os valores recebidos devem ser utilizados em ações de prevenção e de controle da Covid-19 dentro dos asilos; compra de equipamentos de higiene de residentes e funcionários; compra de medicamentos e adequação dos espaços para isolar casos suspeitos ou leves da doença.

No texto de divulgação da assinatura da lei, o governo federal afirma que os recursos devem ser repassados a 2,6 mil asilos, que abrigam mais de 88 mil idosos em todo o país.

Quem está por trás do projeto?

No Brasil, para uma lei ser aprovada, diversas etapas devem ser cumpridas. Inicialmente, o projeto precisa ser aprovado pelo Congresso Nacional para, depois, ser sancionado ou vetado pelo presidente. Todo o regime de tramitação pode ser acompanhado nos sites da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, desde a apresentação da proposta até a assinatura da lei.

A presidência só pode apresentar um projeto de lei que tratar de matéria de administração pública – e, ainda, assim, o projeto precisa ser aprovado pelo Legislativo para virar lei.

No caso da lei que prevê auxílio aos asilos, o projeto foi apresentado no plenário da Câmara pela deputada federal Leandre (PV-PR) em 14 de abril de 2020. Depois de apresentado, normalmente ele seria distribuído para comissões temáticas e, posteriormente, para comissões especiais, mas em 29 de abril, Leandre pediu urgência na apreciação do projeto de lei – procedimento que poderia dispensar algumas destas etapas. A urgência foi concedida pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), em 6 de maio, e o texto foi submetido à votação no plenário da Casa.

A redação do relatório final foi aprovada em 20 de maio e o projeto de lei foi encaminhado ao Senado no mesmo dia. Sempre que um projeto é aprovado por uma das casas legislativas, ele deve ser submetido à análise da outra antes de seguir para o Executivo – um projeto aprovado pela Câmara, é encaminhado ao Senado, e vice-versa.

A aprovação do texto no plenário do Senado foi em 4 de junho. Após a votação de algumas emendas em separado, a redação final foi encaminhada para sanção presidencial em 9 de junho.

Qual o papel de Bolsonaro?

O artigo 66 da Constituição Federal prevê que o presidente tem um prazo de quinze dias úteis, a partir da data de recebimento, para analisar um projeto de lei aprovado pelo Congresso. Dentro deste período, pode vetar trechos do texto ou mesmo todo o conteúdo. Se, passados os quinze dias, não houver nenhuma manifestação por parte do presidente, o projeto é automaticamente sancionado.

A sanção do texto ocorreu na data-limite, dia 29 de junho. A lei foi publicada no Diário Oficial da União do dia 30 de junho. O texto aprovado teve quatro vetos em relação ao conteúdo enviado pelo Congresso Nacional.

Foi vetado que o repasse da verba fosse apenas para instituições sem fins lucrativos que estivessem inscritas nos Conselhos de Direito da Pessoa Idosa ou Conselhos de Assistência Social. A alegação do Planalto é de que a medida “contraria o interesse público ao limitar as instituições que serão contempladas pelo auxílio”.

Também foi retirado do texto o dispositivo que obrigava instituições beneficiadas a prestarem contas da aplicação dos recursos; segundo a interpretação do governo, a competência de fiscalização cabe ao Congresso Nacional, com o auxílio do Tribunal de Contas da União (TCU)

O terceiro item vetado determinava um prazo de 30 dias para o pagamento do auxílio às instituições. A Presidência afirmou que o processo de conferir quais instituições serão beneficiadas e direcionar o pagamento a elas demanda mais tempo que o proposto no projeto.

Por fim, o Planalto vetou prazo de 30 dias para que o Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos disponibilizasse a relação das unidades beneficiadas pelo auxílio, com informações como CNPJ e valores repassados. A justificativa é de que “já existem normativos que dispõem do assunto” e que isso pode ser consultado via Lei de Acesso à Informação.

Por que investigamos?

O Comprova investiga conteúdos com potencial de espalhar informações equivocadas ou fora de contexto e que obtenham ampla viralização. Muitos desses conteúdos são sugeridos pelos leitores, como é o caso desta nota publicada pelo site Pleno News. Trata-se de uma informação correta, ainda que não tenha sido explicado ao leitor que o projeto nasceu no Congresso Nacional.

Comprovado, para o projeto, é um fato verdadeiro e que apresenta conteúdo original publicado sem edição.

Até a publicação desta verificação, o texto teve 52.951 interações no Facebook, segundo a ferramenta de monitoramento Crowdtangle, tendo sido compartilhado por figuras públicas como o deputado federal Marco Feliciano (Republicanos-SP).

Diante da pandemia de covid-19, é necessário ter cuidado com as informações apresentadas pelo risco que podem oferecer à saúde pública. Desde que o Comprova passou a realizar checagens relacionadas ao novo coronavírus, diversos conteúdos tinham ligações com questões políticas e econômicas. Já foi desmentido que a Prefeitura de São Paulo tenha feito a compra de caixões sem licitação e que um homem tenha sido preso por criticar a compra de respiradores.

 

Política

Investigado por: 2020-07-04

Exército não refez todo o trecho da transposição do São Francisco inaugurado por Temer e Lula

  • Enganoso
Enganoso
É verdade que a ideia de transposição das águas do São Francisco remonta ao Império e que o exército participou da execução das obras. O texto que viralizou no WhatsApp, no entanto, engana ao afirmar que as obras ficaram abandonadas por dez anos e que o exército teria refeito trecho inaugurado por Temer e Lula. Veja outras informações checadas pelo Comprova
  • Conteúdo verificado: Texto que tem circulado no WhatsApp e nas redes sociais e que denuncia casos de corrupção na construção da transposição do Rio São Francisco e afirma que “o exército refez todo o trecho com concretagem adequada podendo assim ser finalmente inaugurada” pelo presidente Jair Bolsonaro.

Não é verdade que os governos dos ex-presidentes petistas Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff tenham abandonado por dez anos as obras da transposição do Rio São Francisco – depois de terem roubado R$ 7 bilhões dos cofres públicos. Essa alegação enganosa circula em texto no WhatsApp e em redes sociais. O boato afirma que o Exército teria refeito todo o trecho inaugurado em 2017, que teria “desmoronado” — mas isso também não é verdade. A mensagem dá a entender que os ex-presidentes Michel Temer, Lula e Dilma teriam feito questão de inaugurar uma obra ainda inacabada.

A construção, apesar de ter tido interrupções, não ficou parada por dez anos. Também é falso que um canal tenha desmoronado. O que ocorreu foi que o Eixo Leste, inaugurado por Temer, e depois por Lula e Dilma de maneira extraoficial, teve problemas de vazamentos. Enquanto a estrutura ficou sem água para realização de reparos, o concreto do leito chegou a rachar, deixando exposta a manta de impermeabilização. Mas o canal nunca desmoronou. Além disso, a inauguração feita por Bolsonaro ocorreu no Eixo Norte, distante 215 quilômetros de onde os ex-presidentes estiveram.

O texto traz algumas informações verdadeiras, como o fato de que a ideia da transposição partiu do Imperador Dom Pedro II. Realmente, os primeiros debates sobre a transposição começaram durante o período do Segundo Reinado. Também é verdade que as obras só tiveram início em 2007 e o primeiro trecho foi inaugurado em 2017. Além disso, é verdadeira a afirmação de que o Exército participou do início das obras e ainda atua no Eixo Leste.

O texto que viralizou também acusa a “esquerda” de embargar a obra pelos efeitos ambientais e diz que o Partido dos Trabalhadores “não fez nada além de superfaturar e roubar”.

Como verificamos?

Primeiro, buscamos na Internet matérias de jornais ou sites de órgãos públicos, como o Senado, que ajudassem a recontar a história da transposição do Rio São Francisco. Também lemos um relatório do Comitê Gestor da Bacia do São Francisco, que conta parte da história. E entrevistamos o engenheiro civil Francisco Jácome Sarmento, que atuou no projeto em três governos de partidos diferentes.

Em seguida, procuramos a comunicação do Exército Brasileiro para confirmar se a organização havia trabalhado na obra e em que trechos. Entramos em contato como Tribunal de Contas da União (TCU), a Controladoria Geral da União (CGU), a Polícia Federal (PF) e o Ministério Público Federal (MPF) em Pernambuco, Paraíba e Ceará para saber se foram realizados procedimentos ou operações relacionadas a possíveis casos de corrupção no empreendimento.

Por fim, procuramos o Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR), atual responsável pela obra de transposição. Também usamos recurso do Google Maps para descobrir a distância entre o trecho inaugurado pelo presidente Jair Bolsonaro, no último dia 26 de junho, e aquele que foi inaugurado pelo ex-presidente Michel Temer, e depois por Lula e Dilma Rousseff, em duas diferentes datas de 2017.

Verificação

A transposição

O Projeto de Integração do Rio São Francisco (PISF), popularmente conhecido como “transposição do São Francisco”, é uma obra hídrica de 477 quilômetros de extensão que levará água do rio para 390 municípios dos estados de Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará. A obra se divide em dois canais, o Eixo Leste e o Eixo Norte, e vai ter 13 aquedutos, nove estações de bombeamento e 27 reservatórios, segundo informações do Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR).

A criação de um canal que leve a água do São Francisco para banhar a região do Nordeste que não tem rios perenes já era uma proposta debatida desde o Império. Na época, porém, não havia recursos financeiros e tecnológicos para concretizar a construção. Ainda no século XIX, o engenheiro alemão Henrique Guilherme Fernando Halfeld percorreu o rio para estudar a viabilidade da obra.

O primeiro projeto técnico foi feito durante o regime militar, no governo João Figueiredo, pelo Ministério do Interior, conduzido por Mario Andreazza, segundo relatório produzido pelo Comitê Gestor da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco. No governo Itamar Franco, em 1994, um projeto básico foi elaborado pelo então Ministério da Integração Regional. Na época, o traçado tinha apenas o Eixo Norte. De acordo com o relatório, a transposição só passou a ter um Eixo Leste no governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB), quando um terceiro projeto foi elaborado, em 2000.

A construção dos canais só começou em 2007, no governo Lula (PT), após uma longa disputa jurídica. Francisco Jácome Sarmento, que integrou a equipe técnica da transposição nos governos Itamar, FHC e Lula, contou ao Comprova que liminares judiciais contra a construção foram concedidas em todos os estados que historicamente se opunham à transposição: Alagoas, Sergipe, Bahia e Minas Gerais. “Um belo dia, o STF [Supremo Tribunal Federal] chamou para si a responsabilidade de julgar todos os processos relativos à transposição; ao ser provocado pela AGU [Advocacia-Geral da União]. Foi quase um ano até que o ministro Sepúlveda Pertence desse um parecer monocrático, em março de 2007. Três meses depois, nós demos início à obra”, lembra.

Sarmento é engenheiro civil, professor da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) e autor dos livros “Transposição do Rio São Francisco – Realidade e obra a construir” (2005) e “Transposição do Rio São Francisco – Os bastidores da maior obra hídrica da América Latina” (2018).

Ao contrário do que diz o texto verificado pelo Comprova, a oposição ao projeto não partia apenas da esquerda, segundo conta Sarmento. Opositores do PT, como o ex-senador Antônio Carlos Magalhães (Bahia) e o ex-ministro do Meio Ambiente tucano José Carlos Carvalho (Minas Gerais), ambos de estados contrários ao projeto, também trabalharam contra. “Inicialmente, a gente tinha previsto uma obra que traria água do Rio Tocantins para alimentar o São Francisco. O ministro José Carlos Carvalho protegeu o trecho onde a água seria captada como área ambiental. Aquilo inviabilizou a alimentação do São Francisco. Depois, ele fez de tudo para criar o Comitê Gestor da Bacia do São Francisco. Porque mesmo que o projeto ressurgisse no futuro, a construção precisaria ser aprovada por esse comitê”, lembra.

Inaugurações

A obra atravessou os governos Lula e Dilma Rousseff (PT). O Eixo Leste foi o primeiro a ser inaugurado, em 10 de março de 2017, pelo então presidente Michel Temer (MDB). Na ocasião, Temer foi até a cidade de Sertânia (PE) para abrir a comporta do reservatório de Campos. Depois, seguiu para Monteiro (PB) para acompanhar a chegada das águas. Na cerimônia, o presidente descreveu o momento como “uma coisa emocionante”, que teria levado parte da comitiva a lacrimejar.

Nove dias depois, Lula e Dilma, já ex-presidentes, visitaram o trecho da obra de Monteiro para fazer o que chamaram de “inauguração popular” da obra. Os dois estiveram apenas em Monteiro e chegaram a discursar em cima de um palanque.

Mesmo depois de inaugurada, a transposição passou por problemas. O bombeamento de água chegou a ser interrompido por três meses por causa de vazamentos na barragem de Cacimba Nova, em Custódia (PE). Outra bomba passou nove meses em obras por falhas na barragem de Negreiros, em Salgueiro (PE). A falta de água no canal fez o concreto rachar.

No dia 26 de junho, o presidente Jair Bolsonaro fez a primeira inauguração no Eixo Norte da transposição. Ele acionou as comportas do Reservatório de Milagres, na cidade de Verdejantes (PE). De lá, as águas seguem para o Reservatório Jati, na cidade de Bela Vista (CE). O local onde Bolsonaro esteve fica a 215 quilômetros da cidade de Monteiro, onde Temer, Lula e Dilma estiveram.

Em um e-mail enviado ao Comprova, o Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR) informou que o Eixo Norte está com 97,49% de execução, com previsão de conclusão no primeiro semestre de 2021. Já o Eixo Leste tem execução de 97,11% e deve ser concluído no segundo semestre de 2020. Em ambos, faltam serviços complementares que, segundo a pasta, não comprometem a passagem da água pelos canais.

O Exército

Em 2007, foi o Exército que deu início às obras da transposição. Segundo Francisco Jácome Sarmento, o objetivo era garantir que o projeto saísse do papel. Em junho daquele ano, o canteiro de obras chegou a ser ocupado por movimentos sociais que temiam uma degradação do rio. A ocupação teve o apoio do então bispo de Barra (BA), dom Luiz Flavio Cappio, que havia feito duas greves de fome contra a construção dos canais.

Segundo Sarmento, o Exército teve um papel importante para garantir a segurança da obra e não na sua execução, uma vez que seus opositores ameaçavam invadi-la. O professor afirmou que a participação dos militares deu-se no sentido de “garantir a irreversibilidade das obras”.

Em nota enviada ao Comprova por e-mail, o Exército confirmou que atua no Projeto de Integração do São Francisco desde o início das obras. Segundo a assessoria, a Engenharia Militar construiu os dois canais de aproximação, que levam as águas até as primeiras estações de bombeamento de cada eixo, entre 2007 e 2016. Os militares também abriram e pavimentaram a estrada que dá acesso à estação de bombeamento do Eixo Leste.

Atualmente, o Exército executa obras obras complementares às barragens de Areias e Tucutu, nos Eixos Leste e Norte do projeto. Além disso, os militares têm pavimentado as estradas que dão acesso a duas estações de bombeamento. As obras têm previsão de término até 31 de dezembro de 2020.

Segundo o Ministério do Desenvolvimento Regional, o Exército foi convidado para dar início às obras pelo Canal de Aproximação e, depois, atuou na primeira barragem do Eixo Leste, por “questões de segurança nacional” e por “atrasos na conclusão de processos licitatórios”.

Denúncias de corrupção

Para apurar se existem denúncias de corrupção envolvendo os projetos de transposição do rio São Francisco, o Comprova entrou em contato com a Controladoria Geral da União (CGU), o Tribunal de Contas da União (TCU), o Ministério Público Federal (MPF) nos estados de Pernambuco, Paraíba e Ceará — onde ocorreram as obras —, e com a Polícia Federal.

Em resposta, a Polícia Federal informou que em 2015 foi declarada a Operação Vidas Secas – Sinhá Vitória, para apurar suspeitas de superfaturamento das obras de engenharia executadas por empresas em dois dos quatorze lotes da transposição do rio São Francisco.

Segundo a nota publicada na época no site da PF, os investigadores apuraram que empresários do consórcio responsável pela obra utilizaram empresas de fachada para desviar cerca de R$ 200 milhões das verbas públicas destinadas à transposição, no trecho que vai do agreste no estado de Pernambuco até a Paraíba. A nota diz, ainda, que as empresas de fachada utilizadas para esses desvios estariam em nome de um doleiro e um lobista investigados na Operação Lava Jato.

No dia da deflagração da Operação Vidas Secas, a PF realizou uma entrevista coletiva em que informou que as investigações sobre esses desvios começaram em 2014, a partir da análise de relatórios produzidos pelo TCU e pela CGU que apontaram indícios de superfaturamento em dois lotes das obras de transposição do rio São Francisco. A operação culminou na prisão temporária de Elmar Varjão, presidente da construtora OAS na época, e de executivos de outras empresas que participavam das obras. Além disso, a investigação revelou que as construtoras envolvidas utilizaram contas de Alberto Youssef e Adir Assad, presos no âmbito da Operação Lava Jato, para realizar os desvios.

Na resposta ao Comprova, a PF informou, ainda, que como as investigações são sigilosas, não é possível informar a existência de novas operações sobre este tema.

Sobre denúncias de corrupção envolvendo as obras de transposição do rio São Francisco, o MPF-PE informou por e-mail que não há questionamentos sobre a obra em andamento em Pernambuco. O MPF-CE e o MPF-PB não responderam nosso contato até a data de fechamento deste texto.

O TCU, também por e-mail, enviou ao Comprova três decisões recentes do tribunal que tratam do assunto. Nelas, o TCU identificou irregularidades na contratação das empresas responsáveis, na execução dos contratos e nas políticas que deveriam ser traçadas em conjunto pelos municípios beneficiados pelas obras.

A CGU não respondeu o contato do Comprova até o fechamento deste texto.

O texto verificado afirma que, no início, a obra era estimada em R$ 5 bilhões. E que outros R$ 7 bilhões foram “roubados dos cofres públicos”. Em e-mail enviado ao Comprova, o Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR) informou que o orçamento inicial previsto era de R$ 4,5 bilhões. Até o momento, já foram investidos R$ 10,9 bilhões. Só em custos ambientais, foram incorporados R$ 1,5 bilhões, o que a pasta considera “relevante para a revisão orçamentária”. A estimativa do custo final do projeto não foi informada pelo MDR.

A postagem também diz que, além do Exército, as empresas “Ecolog” e “Egrar” iniciaram a construção. O MDR enviou ao Comprova uma lista com dezenas de empresas que trabalharam no projeto. Mas nenhum dos nomes consta nessa lista.

O ministério também disse não ter conhecimento de desvios ou superfaturamento ocorridos na transposição e ressaltou que “as licitações e execução foram monitoradas e fiscalizadas pelos organismos de controle e os questionamentos apresentados por estes órgãos foram sanados”.

Por que investigamos?

O Comprova investiga conteúdos suspeitos sobre políticas públicas do governo federal de ampla repercussão em redes sociais. É o caso desse texto sobre o Projeto de Integração do Rio São Francisco (PISF), maior obra de infraestrutura hídrica do país, que deve atender 12 milhões de pessoas no semiárido nordestino. No Facebook, a versão desse texto postada pela página Amigos do Presidente teve 116 mil interações, segundo dados da plataforma Crowdtangle.

O Estadão Verifica e a Agência Lupa verificaram um conteúdo sobre o trabalho do exército nas obras da transposição do Rio São Francisco. O Estadão também mostrou que fotos dos canais da transposição foram usadas fora de contexto nas redes sociais.

Enganoso para o Comprova é todo conteúdo retirado de seu contexto original e usado em outro com o propósito de mudar o seu significado; induzindo a uma interpretação equivocada.

Saúde

Investigado por: 2020-07-03

Texto que lista 17 conselhos para a pandemia mistura dados corretos e informações falsas sobre o vírus

  • Enganoso
Enganoso
Comprova investigou um por um os 17 conselhos listados em corrente que viralizou no WhatsApp e que usa como base artigo de um site português. Veja o que descobrimos
  • Conteúdo investigado: uma corrente que circula no Whatsapp e traz uma lista de “17 conselhos” sobre a covid-19.

É enganoso o texto “17 conselhos para lidar com a pandemia da covid-19”, que vem sendo compartilhado em correntes de WhatsApp e que foi publicado originalmente em uma página do portal português Impala.pt. O conteúdo, que mescla informações corretas com outras total ou parcialmente incorretas, é um compilado de outras publicações – muitas com trechos que também já tinham sido distorcidos – que já circularam na internet.

Em uma primeira versão, o site havia publicado que a autoria de 17 conselhos – e não 15 – seria de Robert Ray Redfield, virologista, diretor do Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC), órgão do governo americano responsável por dar orientações à população sobre a pandemia de covid-19. O portal também associa o virologista à chefia da Clínica de Doenças Infecciosas da Universidade de Maryland, nos EUA – afirmação que não é verdadeira. Esse cargo pertence à Faheem Younus, que é professor da Universidade de Maryland e chefe do departamento de doenças infecciosas do centro médico Upper Chesapeake Health, associado à Universidade de Maryland.

Younus, em sua conta do Twitter, se dedica a esclarecer desinformações relacionadas à pandemia. E alguns dos conselhos presentes no texto, de fato, têm muita similaridade com o que ele já publicou – mas oito deles foram publicados no portal com erros de tradução, interpretação e com informações adicionais. Algum tempo depois, o portal Impala editou o texto publicado, modificando os conselhos de 17 para 15, alterando parte do conteúdo, retirando o nome de Robert Ray Redfield e deixando a autoria dos conselhos apenas como “Chefe da Clínica de Doenças Infecciosas da Universidade de Maryland, nos EUA”, sem mencionar Younus. O Comprova verificou, abaixo, os 17 conselhos, traduzidos para a língua portuguesa do Brasil, cuja fonte foi atribuída ao portal Impala.

Como verificamos?

Para entender se havia ocorrências desse conteúdo anteriores à publicação do portal Impala, o Comprova pesquisou nas redes sociais. Posts virais que replicaram o conteúdo com a configuração antiga, que mencionava Robert Ray Redfield, foram encontrados no Facebook. Também encontramos o perfil de um homem chamado Luís Martins, que aparece como membro da equipe na página do portal Impala no Facebook. Martins havia compartilhado o post dos conselhos em seu perfil com a configuração antiga – ou seja, com a foto de Redfield e o título “Covid-19: Os conselhos de um dos maiores especialistas do mundo”.

O Comprova também pesquisou em sites oficiais, contas verificadas no Twitter e perfis no Linkedin tanto quem é Robert Ray Redfield quanto quem seria o responsável pelo cargo da Universidade de Maryland mencionado no texto viral. E encontrou Faheem Younus, professor da universidade e chefe do departamento de doenças infecciosas do centro médico Upper Chesapeake Health, associado à Universidade de Maryland. A Universidade de Maryland foi contatada por e-mail e esclareceu que Younus não escreveu esse post viral. A assessoria da universidade também recomendou que a versão mais precisa de seus posicionamentos em relação a mitos sobre a covid-19 está em sua conta oficial do Twitter.

O Comprova, então, comparou os 17 conselhos com os posts do Twitter de Younus, esclarecendo eventuais desinformações. Por último, para avaliar a razoabilidade e a existência de evidências científicas nas afirmações do post viral, entrevistamos cinco especialistas no tema:

  • Bruno Ishigami, médico infectologista do Hospital Oswaldo Cruz, em Recife;
  • Jean Gorinchteyn, infectologista do Hospital Emílio Ribas;
  • Leonardo Weissmann, infectologista do Instituto de Infectologia Emílio Ribas e consultor da Sociedade Brasileira de Infectologia;
  • Patrícia Canto, pneumologista da Fiocruz;
  • Raquel Stucchi, infectologista da Unicamp e consultora da Sociedade Brasileira de Infectologia.

Para questionar o portal Impala sobre a procedência do conteúdo publicado, o Comprova tentou entrar em contato com a administração do site por e-mail e pelo Facebook, mas não obteve resposta até o fechamento desta verificação.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 3 de julho de 2020.

Verificação

Vírus C19?

A versão dos conselhos verificada pelo Comprova errava ao utilizar a expressão “o vírus de C19” diversas vezes. “C19 é uma sigla que tem sido usada por algumas pessoas para designar a doença covid-19. Mas o vírus é o Sars-Cov2, o novo coronavírus”, afirma Leonardo Weissmann, infectologista do Instituto de Infectologia Emílio Ribas e consultor da Sociedade Brasileira de Infectologia. Na versão atualizada, disponível no portal Impala.pt, não há nenhuma citação à nomenclatura.

O que dizem os conselhos e os especialistas?

O Comprova conversou com especialistas da área de infectologia e pneumologia. Segue, abaixo, o que eles dizem sobre cada um dos 17 tópicos publicados no texto do site Impala.pt.

1. Talvez tenhamos que morar com o C19 por meses ou anos. Não vamos negar ou entrar em pânico. Não vamos tornar nossas vidas inúteis. Vamos aprender a conviver com esse fato.

O doutor Younus não escreveu sobre isso no Twitter. Para o infectologista Bruno Ishigami, médico do Hospital Oswaldo Cruz, em Recife, a convivência do vírus por um longo período é o cenário “mais provável”. “Assim como aconteceu com o H1N1, zika, dengue, chikungunya. Essas doenças passam a fazer parte da nossa rotina. Comparando com o H1N1, que também é um vírus respiratório, deve acontecer um processo semelhante. O desenvolvimento da vacina e a incorporação da vacina contra a covid-19 no calendário vacinal para as pessoas consideradas do grupo de risco”, afirma.

Segundo ele, enquanto não tivermos uma vacina, as únicas medidas comprovadamente eficazes para combater a doença são o distanciamento social, o uso de máscara, evitar aglomerações e lavar as mãos.

2. Você não pode destruir os vírus C19 que penetraram nas paredes das células, bebendo galões de água quente – você só vai ao banheiro com mais frequência.

No Twitter, o doutor Younus escreveu que é falso que a ingestão de água quente possa eliminar o novo coronavírus. Segundo Ishigami, é possível que o novo coronavírus seja inativado pela água quente, por meio da destruição da partícula viral. No entanto, a temperatura necessária para que isso acontecesse é alta e causaria queimaduras. “Água e sabão e álcool a 70% também são capazes de inativar o vírus, mas nem por isso se recomenda que faça ingestão dessas substâncias pela toxicidade delas ao nosso organismo. Não existe nenhuma forma comprovadamente eficaz de eliminar o vírus dentro do nosso organismo, a ciência e os pesquisadores ainda estão tentando descobrir algum medicamento que seja capaz de fazer isso”, lembra o médico brasileiro.

3. Lavar as mãos e manter um distância física de dois metros é o melhor método para sua proteção.

O doutor Younus escreveu no Twitter que usar máscaras, evitar aglomerações, manter distância e lavar as mãos pode salvar vidas. Para o infectologista Bruno Ishigami, a afirmação do texto está parcialmente correta. “Eu adicionaria (…) evitar locais fechados com pouca circulação de ar, evitar locais com cantoria ou com muitas conversas como igrejas, praças de alimentação de shoppings, shows”, explica.

4. Se você não tem um paciente C19 em casa, não há necessidade de desinfetar as superfícies da sua casa.

O doutor Younus não escreveu sobre o cuidado com parentes no Twitter. De acordo com Ishigami, você pode manter a rotina de higiene da casa, sem a necessidade de cuidados extras, se não tiver um morador com covid-19. O médico lembra, porém, que algumas recomendações podem ser importantes para pessoas que têm saído de casa, principalmente àqueles que usam o transporte público. “Tentar dar uma maior atenção aos ambientes de entrada pela possibilidade, ainda que pequena de trazer o coronavírus da rua. Se possível, retirar tapetes, fazer higienização da entrada da casa com solução com água sanitária (uma parte de água sanitária para três partes de água), deixar calçados fora de casa, fazer higienização das mãos com água e sabão ou álcool gel, tomar banho ao chegar de casa e deixar os pertences (bolsas, sacolas) em alguma área específica”, diz o brasileiro.

5. Cargas embaladas, bombas de gás, carrinhos de compras e caixas eletrônicos não causam infecção. Lave as mãos, viva sua vida como sempre.

Esse texto é similar à recomendação do doutor Younus no Twitter. Segundo o médico Bruno Ishigami, a taxa de contaminação por superfícies como cargas embaladas e bombas de gasolina realmente é pequena. Mesmo assim, ele considera prudente fazer uma higienização com solução de água sanitária, como descrito na resposta anterior.

“Em relação a carrinhos de compras e caixas eletrônicos pela elevada circulação de pessoas que têm acesso a esse tipo de superfície, é recomendado higiene das superfícies pela instituição onde estão os carrinhos e o caixa. Além disso, é importante que ao ter contato com essas superfícies seja realizado higiene adequada das mãos com álcool gel ou água e sabão. Lembrem-se de usar máscara e evitar levar as mãos ao rosto, principalmente, quando estiverem em áreas com grande circulação de pessoas”, lembra ainda o infectologista.

6. C19 não é uma infecção alimentar. Está associado a gotas de infecção como a gripe. Não há risco demonstrado de que o C19 seja transmitido solicitando alimentos.

O médico Faheem Younus não publicou nada a respeito disso, mas, em conversa com o Comprova, Leonardo Weissmann, infectologista do Instituto de Infectologia Emílio Ribas e consultor da Sociedade Brasileira de Infectologia, confirma a afirmação. “Até o momento, nós não temos nenhuma comprovação de que o vírus seja transmitido por alimentos”, diz ele. Uma recomendação que ele destaca é higienizar os alimentos frescos. “Você sempre tem que lavar, independentemente de covid-19.”

7. Você pode perder o sentido do olfato com muitas alergias e infecções virais. Este é apenas um sintoma inespecífico de C19.

Faheem Younus escreveu sobre isso. O infectologista Weissmann confirma que a perda de olfato, e de paladar, pode acontecer “com o novo coronavírus e com outras infecções”.

8. Uma vez em casa, você não precisa trocar de roupa com urgência e tomar banho! Pureza é uma virtude, paranóia não é!

Em uma lista do que não fazer na pandemia, Younus publicou que é um mito que você precisa sempre trocar de roupa e tomar banho ao chegar. E acrescentou que as melhores medidas são lavar as mãos, distanciamento e evitar aglomerações. Entretanto, de acordo com Weissmann, o ideal é, sim, tomar banho ao chegar da rua. Patricia Canto, pneumologista da Fiocruz, reforça: “Em relação às roupas, a gente ainda sabe muito pouco sobre a propagação da covid-19. Temos algumas ideias, mas mais incertezas do que certezas. Então, precisamos ter excesso de cautela”, afirma ela. “Isso não deve ser encarado como paranóia, mas, sim, como medida de precaução.”

9. O vírus C19 não está no ar. Esta é uma infecção respiratória por gotículas que requer contato próximo.

Na mesma lista em seu Twitter, Younus escreveu apenas “mantenha uma distância segura”. Segundo Weissmann e Canto, a afirmação do post está incorreta, pois ignora o fato de que a transmissão do vírus é possível por superfícies, sem que a pessoa tenha contato com ninguém. “Há um consenso cada vez maior de que as fontes de infecção mais importantes sejam pelas vias aéreas, mais do que a questão de superfícies, mas a gente ainda tem que esperar novas avaliações para ver”, declara a pneumologista.

10. O ar está limpo, você pode caminhar pelos jardins (apenas mantendo sua distância de proteção física), pelos parques.

No dia 29 de março, Younus publicou em sua conta do Twitter uma afirmação similar a essa. Disse que é um mito que a transmissão do novo coronavírus se dá pelo ar. Na verdade, segundo o professor, trata-se de uma infecção por gotículas, o que requer contato próximo. “Nosso ar está LIMPO! Caminhe em um parque!”, tuitou o professor. Ele também acrescenta um print de um tuíte da Organização Mundial da Saúde, que diz que a covid-19 não é transmitida pelo ar.

Em entrevista ao Comprova, Jean Gorinchteyn, infectologista do Hospital Emílio Ribas, alertou que, mesmo com a abertura dos parques, “é importante manter o distanciamento social de pelo menos dois a cinco metros das pessoas, principalmente as que estão caminhando”. No caso das pessoas que estão correndo, segundo Gorinchteyn, o distanciamento mantido deve ser de nove metros – e sempre com máscara. “Lembrando que a duração das máscaras é de duas horas. Não mais do que isso”, disse o infectologista.

11. É suficiente usar sabão normal contra C19, não sabão antibacteriano. Este é um vírus, não uma bactéria.

Essa afirmação de fato consta no Twitter de Younus. Também em 29 de março, ele postou que é um mito que usar sabão antibacteriano – mais caro – é melhor na prevenção da covid-19 do que sabão regular. “CoronaVÍRUS não é uma bactéria, lembra?”, tuitou o professor.

Jean Gorinchteyn corroborou a eficácia de lavar as mãos apenas com água e sabão. E reforçou: “Mas nem sempre a gente tem a presença de uma torneira e um sabonete. Portanto, o álcool em gel faz essa parte.”

12. Você não precisa se preocupar com seus pedidos de comida. Mas você pode aquecer tudo no microondas, se desejar.

Younus, de fato, escreveu isso. Segundo ele, você pode pedir comida e, se mesmo assim continuar preocupado, pode aquecê-la por dois minutos no microondas. Para Gorinchteyn, você pode pedir comida também, mas precisa ter cuidado com o que é trazido por entregadores. “Vá de máscara, mantenha distanciamento e, quando pegar a sacolinha, fique muito atento para não colocar a mão na boca, no nariz e nos olhos”, diz ele. É importante também, antes da higienização com álcool em gel, jogar fora a sacola e lavar a mão com água e sabão.”

13. As chances de levar o C19 para casa com os sapatos são como ser atingido por um raio duas vezes por dia. Trabalho contra vírus há 20 anos — as infecções por gota não se espalham assim!

Essa dica foi realmente tirada da lista de Younus. Mas, de acordo com Gorinchteyn, “por uma medida higiênica”, o ideal é deixar os sapatos para fora ou higienizá-los. Ele ressalta que a medida passa a ter mais eficácia caso “você tenha crianças em casa e, principalmente aquelas que rastejam”.

14. Você não pode ser protegido contra o vírus tomando vinagre, suco de cana e gengibre! Estes são para imunidade, não para cura.

Em entrevista ao Comprova, Raquel Stucchi, infectologista da Unicamp e consultora da Sociedade Brasileira de Infectologia, afirmou que “até o momento, não existe nenhum alimento a que a gente possa atribuir algum papel na cura ou na prevenção da infecção pelo coronavírus”. Ou seja, não há evidências científicas de que vinagre, suco de cana ou gengibre tenham algum papel na prevenção ou no tratamento da covid-19.

Faheem Younus não publicou nada parecido com essa afirmação em sua conta no Twitter. Há alguns tuítes, porém, dizendo que não há evidências científicas de que diversos alimentos atuem no aumento da imunidade. Em 2 de junho, por exemplo, o professor afirmou que é um mito que “vitaminas C e D, zinco, canela, alho, açafrão, ervas, chás” aumentam a imunidade. “A maioria das pessoas saudáveis têm FORTE imunidade. Boas noites de sono, exercícios físicos e dietas balanceadas fortalecem ainda mais.”

15. Usar uma máscara por longos períodos interfere nos níveis de respiração e oxigênio. Use-o apenas na multidão.

A afirmação é falsa e não está na versão atualizada do texto publicado no portal Impala, que faz 15 em vez de 17 conselhos. No dia 25 de junho, Younus falou sobre o assunto no Twitter. Afirmou que é um mito que o uso de máscaras reduz o fluxo de oxigênio, aumenta níveis de dióxido de carbono, causa dores de cabeça e ativa o vírus. “Não faz sentido”, ele tuitou. “Máscaras não causam hipóxia ou retenção de CO2. Médicos/cirurgiões as utilizam há anos”.

Segundo Stucchi, “o uso correto de máscaras, feitas com tecido correto, que impeçam a passagem do vírus, mas que permitam a respiração, não leva a nenhum problema na respiração em si.” A infectologista, assim como outros especialistas entrevistados pelo Comprova em outras verificações, recomenda o uso de máscaras. “Nós devemos sempre usar as máscaras quando estivermos fora de casa e estivermos em locais que tenham possibilidade de aglomeração de pessoas – farmácias, supermercados, transporte público. Nos locais onde já flexibilizaram [o isolamento social], nos centros comerciais de rua ou de shoppings, sempre devemos usar as máscaras.”

A Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), ligada ao Ministério da Saúde, em documento publicado em 3 de abril, reforça que as máscaras “não fornecem total proteção contra infecções, mas reduzem sua incidência”. O órgão recomenda o uso do equipamento em locais públicos.

16. Usar luvas também é uma má idéia; o vírus pode se acumular na luva e ser facilmente transmitido se você tocar em seu rosto. Melhor apenas lavar as mãos regularmente.

A afirmação é verdadeira. Em sua conta do Twitter, no dia 22 de maio, Younus diz que usar luvas em locais públicos para prevenir a covid-19 é um mito. Segundo ele, na verdade, o vírus entra no organismo por meio da mucosa nasal, da garganta e dos olhos – e não pela pele. O professor acrescenta que as mãos com luvas “podem acumular mais germes, que podem acabar sendo transportados para o rosto”. Ele lembra da importância de lavar as mãos e recomenda que as pessoas dispensem as luvas, a não ser que estejam cuidando de um paciente com covid-19.

Stucchi corrobora com essa informação: “Usar luvas, realmente, não tem nenhum sentido”. A recomendação, segundo ela, é sempre higienizar as mãos. “O que frequentemente acontece é que a pessoa com luva acha que a luva é autolimpante – então ela coloca a mão com a luva em todos os locais, coça olho, sem higienizar.” Stucchi acrescentou que a indicação do uso de luvas existe apenas para profissionais da saúde, em determinados momentos da atenção ao paciente.

17. A imunidade é muito enfraquecida ao permanecer sempre em um ambiente estéril. Mesmo se você comer alimentos que aumentam a imunidade, saia regularmente de sua casa para qualquer parque / praia. A imunidade é aumentada pela exposição a patógenos, não por ficar em casa e consumir alimentos fritos / condimentados / açucarados e bebidas gaseificadas.

Tanto a relação com o professor Faheem Younus quanto a afirmação em si são falsas. Faheem Younus não publicou nada parecido com isso em sua conta no Twitter. Vale destacar que esse tópico não consta na versão atualizada do texto publicado no portal Impala, que recomenda 15 em vez de 17 conselhos.

“Nós sabemos que a nossa imunidade, mesmo o nosso desenvolvimento de bebê até a idade adulta, vai sendo adquirida conforme a gente vai se expondo aos antígenos, aos germes e aos microorganismos. Isso realmente é verdade”, afirmou Stucchi. “Agora, não é porque nós estamos em casa neste momento que nós teremos a nossa imunidade enfraquecida. Nós devemos ficar em casa porque nós não queremos que haja um grande número de pessoas contaminadas ao mesmo tempo pelo coronavírus.” Enquanto não há uma vacina contra a covid-19, segundo a infectologista, a única maneira de impedir o alto número de casos simultâneos é ficando em casa “na maior parte do tempo e sempre que possível.”

Por que investigamos?

O Comprova investiga conteúdos suspeitos que viralizam nas redes sociais. Quando o material aborda assuntos relacionados à covid-19, a verificação se torna ainda mais importante, pois coloca a saúde das pessoas em risco. O post compartilhado por uma usuária em 21 de junho e checado pelo Comprova recebeu 34,9 mil compartilhamentos no Facebook e até a publicação desta investigação foi visto mais de 1,4 milhão de vezes.

Seu conteúdo é perigoso porque distorce algumas recomendações de autoridades sanitárias, desinformando os leitores. O Comprova já publicou verificações de boatos que desestimulam o uso de máscara, afirmam que a covid-19 é uma trombose causada por bactéria e que a hidroxicloroquina pode descartar a necessidade de UTI.

Enganoso para o Comprova é quando um conteúdo é retirado de seu contexto original e utilizado de forma a modificar seu significado, induzindo a uma interpretação equivocada.

Outros veículos, como G1, Estadão e Boatos.org já haviam verificado o conteúdo de uma lista semelhante – que, como a primeira versão do texto do Impala.pt, creditava os “conselhos” a Robert Ray Redfield –, classificando-o como falso ou enganoso.

Saúde

Investigado por: 2020-07-02

Médico distorce informações sobre a covid-19 em vídeo

  • Enganoso
Enganoso
Não há evidências de que o uso de máscara torne o sangue ácido e, consequentemente, debilite o sistema imunológico e nem há comprovação da eficácia contra o novo coronavírus dos medicamentos citados pelo médico em vídeo que viralizou
  • Conteúdo verificado: Vídeo gravado pelo médico Ulysses José Guedes Gomes que viralizou no Facebook.

O médico Ulysses José Guedes Gomes faz afirmações enganosas sobre a pandemia em um vídeo que obteve mais de 385 mil interações no Facebook até o dia 2 de julho. Na gravação, ele diz, entre outros pontos, que “nosso país continua fazendo esse alarde, aumentando o número de mortos, criando atestados médicos”. Erra ao dizer que o uso da máscara “faz acidificar o sangue” e, consequentemente, “diminui o sistema imunológico”.

Gomes acusa “uma esquerda que ficou 30 anos no poder” de ter interesse de derrubar o país e defende o uso de medicamentos como a cloroquina e a ivermectina – que não têm eficácia comprovada contra o novo coronavírus e são apoiados pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido).

O Comprova verificou as afirmações e conversou com especialistas. Eles disseram que é incorreto que a máscara traz malefícios ao organismo, por exemplo. Os poros do tecido permitem as trocas gasosas, fazendo com que a respiração ocorra normalmente. Além disso, o uso prolongado de máscara em locais públicos é recomendado por autoridades sanitárias como a Organização Mundial da Saúde (OMS) e a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

Tentamos entrar em contato com o médico, mas ele não retornou nossas ligações.

Como verificamos?

Buscamos descobrir quem era o homem do vídeo, se era mesmo médico e qual seria sua especialidade. Com base na descrição dada por ele ao se apresentar, encontramos, numa busca pelo Google, outro vídeo com a mesma pessoa em uma postagem do empresário Luciano Hang no Facebook. Nos comentários, uma internauta o identificava como um ginecologista que atua em Taguatinga, no Distrito Federal.

A partir do nome e da especialidade, levantamos na busca do Conselho Federal de Medicina o registro do médico para tentar entrar em contato com ele. Paralelamente, procuramos pelas reportagens citadas no vídeo em buscas no Google e em redes sociais, com ferramentas como Tweetdeck e Crowdtangle.

Também procuramos pesquisas e orientações de autoridades em saúde que comprovassem as informações do vídeo. Fomos atrás de estudos sobre uso de hidroxicloroquina, cloroquina, azitromicina e ivermectina em tratamentos de covid-19, pesquisamos sobre o que se sabe a respeito da transmissão da doença por pessoas assintomáticas e, por fim, se há algum risco no uso de máscaras de proteção.

O Comprova também recorreu a checagens próprias a respeito dos assuntos citados, pois muitos deles foram temas recorrentes em outras investigações realizadas desde março deste ano.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 2 de julho de 2020.

Verificação

Quem é Dr. Ulysses?

O homem que aparece no vídeo se apresenta como “Dr. Ulisses, médico praticante da medicina regenerativa, bacharel em direito”. O Comprova buscou no Google por: “Dr. Ulisses, médico praticante da medicina regenerativa” e encontrou outro vídeo, com o mesmo homem, em uma postagem no Facebook do empresário Luciano Hang, dono das Lojas Havan, datada de 11 de abril.

Em um dos comentários do post, uma internauta identifica o médico como “Dr. Ulysses José Guedes Gomes, médico Ginecologista e Obstetra em Taguatinga, Distrito Federal”.

O Comprova fez outra busca no Google utilizando as informações fornecidas pela internauta e encontrou um homem que se candidatou a deputado distrital do Distrito Federal em 2018 pelo Partido Progressista (PP). Conferimos no DivulgaCand 2018, portal do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sobre candidaturas, as informações do candidato em questão.

O nome, a foto e as informações de profissão condizem com o que já havia sido levantado a respeito do médico. O registro do site oficial forneceu uma página dele no Facebook.

Além disso, o Comprova buscou no site do Conselho Federal de Medicina (CFM) o registro médico de Gomes, que apontou a situação dele como regular. Sua especialidade é ginecologia e obstetrícia e ele atende em Taguatinga, região administrativa do Distrito Federal.

O registro do CFM traz dois números de telefone. Ao ligar para um deles, o Comprova foi atendido por uma mulher que se identificou como Ana, confirmou ser o telefone do consultório e afirmou que o médico não se encontrava no momento. Ela disse que ele retornaria a ligação mais tarde mas, até a publicação desta checagem, ele não entrou em contato. O Comprova tentou ligar novamente para os dois números, mais de uma vez, e as chamadas não foram atendidas.

Mídia europeia denunciou Brasil?

No vídeo, Gomes afirma que o país está “criando atestados médicos com dados que na realidade não condizem com a causa mortis verdadeira”. Ele alega que as informações são de reportagens na Europa: “Portugal, a mídia está mostrando que o Brasil está alterando dados para poder manter a pandemia”.

Uma reportagem da emissora portuguesa RTP, transmitida no dia 21 de junho, diz, erroneamente, que hospitais no Brasil estão registrando incorretamente óbitos por covid-19. Não é apresentada nenhuma fonte oficial confirmando as alegações, apenas a história de uma pessoa que faleceu e teve a causa da morte questionada por um familiar, que diz não ter sido pela covid-19. O conteúdo vem se espalhando em perfis bolsonaristas desde a publicação.

“Há hospitais brasileiros que estão a registar como óbitos por Covid pessoas que não morreram de Covid. Em causa parecem estar subsídios dados pelo governo federal às câmaras e aos governos estaduais por cada vítima do novo coronavírus. Como há dinheiro a ganhar se declararem óbitos por Covid, muitos médicos registram como morte por Covid óbitos que nada têm a ver com a pandemia. A situação está a inflacionar o número de vítimas no país”, diz um trecho da reportagem.

O Comprova já realizou uma investigação desmentindo as informações usadas pela reportagem da RTP. A União disponibiliza verbas para que estados possam usá-las para o combate ao vírus, mas o valor não é definido de acordo com o número de mortes.

O vídeo também cita um jornal da Alemanha que teria mostrado o Brasil “com outros interesses fora do interesse realmente médico legal da coisa, protelando essa pandemia”. O Comprova realizou uma busca no TweetDeck e encontrou uma postagem que diz: “Jornal alemão diz que presidente Bolsonaro está correto e mostra que quarentena total é um erro gigantesco”.

No link, há um vídeo postado em 14 de maio no Instagram de Carmelo Neto, que se descreve como “Conselheiro Nacional de Juventude do Gov. Bolsonaro”. O vídeo mostra uma página de jornal com o título “Lockdown war ein riesenfehler”, que, em tradução livre, significa “Bloqueio foi um grande erro”.

O título em alemão leva até uma reportagem da revista alemã Bild, que apresenta a visão de especialistas questionando o regime de lockdown imposto na Alemanha – e não no Brasil, como sinalizado no vídeo.

Máscaras não acidificam o sangue

Gomes alega que a máscara abafa a respiração, que seu uso faz com que o indivíduo inale o próprio gás carbônico e que isso acidificaria o sangue.

Infectologistas consultados pelo Comprova em outra investigação desmentiram que as máscaras tornam o sangue ácido. Os profissionais afirmaram que o ar entra e sai através dos poros da máscara (ainda que não sejam visíveis) e que não há como inspirar o próprio gás carbônico.

A OMS listou algumas das desvantagens do uso contínuo da máscara, que pode agravar quadros de acne e provocar lesões na pele. Em relação à respiração, pode ocorrer algum tipo de dificuldade respiratória. No entanto, não há nada a respeito da inalação de gás carbônico ou acidificação do sangue.

A Anvisa reforça que o uso da máscara, embora não forneça total proteção contra o vírus, reduz sua incidência.

Assintomáticos transmitem doença

Pessoas que não apresentam sintomas da doença, mesmo que tenham contraído o novo coronavírus, podem transmiti-la. A conclusão é da OMS: “É possível pegar covid-19 de alguém com tosse leve e que não se sente doente. Alguns relatórios indicaram que pessoas sem sintomas podem transmitir o vírus. Ainda não se sabe com que frequência isso acontece”.

Um estudo publicado pela revista científica Nature em 30 de junho aponta que 40% dos transmissores do novo coronavírus são assintomáticos. A pesquisa foi realizada em Vo’, na província de Pádua, na Itália, onde 86% da população foi testada assim que foi determinada a quarentena na região, em fevereiro – a cidade possui 3.200 habitantes. Passadas duas semanas, 72% dos habitantes foram novamente testados. Nos dois momentos, cerca de 40% dos casos positivos não apresentaram sintomas.

Existem tratamentos eficazes?

Os medicamentos citados no vídeo são utilizados em tratamentos distintos. A hidroxicloroquina e a cloroquina são usadas em casos de malária e doenças autoimunes, como lúpus e artrite reumatóide. A azitromicina é um antibiótico e, portanto, é recomendada contra bactérias. Já a ivermectina é utilizada no tratamento de condições causadas por vermes e parasitas.

A OMS já divulgou que não há vacina ou medicamento específico para prevenir ou tratar a covid-19. Os tratamentos utilizados até então, segundo o órgão, são para “aliviar os sintomas” dos infectados.

No caso da cloroquina e hidroxicloroquina, o Ministério da Saúde assinalou que não há comprovação da eficácia da medicação em pacientes com o novo coronavírus. A observação se encontra em orientação divulgada pela pasta, no início de maio, autorizando o uso dos medicamentos em casos leves da doença: “ainda não há meta-análises de ensaios clínicos multicêntricos, controlados, cegos e randomizados que comprovem o benefício inequívoco dessas medicações para o tratamento da covid-19”. Em março, a Saúde já havia orientado o uso da cloroquina em quadros graves da doença.

Estudos divulgados por algumas das mais importantes revistas médicas do mundo questionaram a eficácia da cloroquina e da hidroxicloroquina contra a covid-19. Em maio, o Journal of the American Medical Association (Jama) e o British Medical Journal (BMJ) publicaram que pacientes tratados com as medicações, associadas ou não ao antibiótico azitromicina, não tiveram melhores resultados que aqueles que não receberam os mesmos remédios.

Um estudo da revista The Lancet foi alvo de polêmica após apontar as mesmas conclusões sobre o uso das medicações. Seu resultado motivou a OMS a interromper ensaios clínicos com a hidroxicloroquina por um período — os estudos foram retomados após a base de dados internacional utilizada pela pesquisa, fornecida pela empresa Surgisphere, ser questionada pela comunidade médica. Há uma auditoria apurando o caso.

A Food and Drug Administration (FDA), autoridade sanitária dos Estados Unidos, divulgou uma carta aberta, em abril deste ano, alertando a população a não usar remédios à base de ivermectina como tratamento contra a covid-19.

A ivermectina foi testada em estudo conduzido pelo médico Amit Patel, ligado ao Departamento de Bioengenharia da Universidade de Utah (EUA). Os resultados mostraram que entre os pacientes que precisavam de ventilação mecânica, apenas 7,3% dos que tomaram a medicação morreram — contra 21,3% dos que não utilizaram o medicamento. No entanto, o estudo afirma que os dados “não devem ser considerados conclusivos, pois fatores de confusão desconhecidos nem sempre podem ser contabilizados de maneira confiável, mesmo quando técnicas de correspondência de propensão são empregadas no desenvolvimento de grupos de controle.”

Além disso, os dados utilizados neste estudo sobre a ivermectina foram fornecidos pela empresa Surgisphere, a mesma envolvida na polêmica de estudos sobre hidroxicloroquina da Lancet.

Outro estudo sobre ivermectina, feito por pesquisadores da Monash University e do Hospital Royal Melbourne, na Austrália, demonstrou que o medicamento é capaz de matar o novo coronavírus in vitro em 48 horas. Apesar dos resultados, os próprios pesquisadores pediram cautela: eles alertaram para a necessidade de realizar testes clínicos que avaliem a eficácia do remédio fora do laboratório.

Por que investigamos?

O Comprova investiga conteúdos suspeitos que viralizam nas redes sociais. Quando o material aborda assuntos relacionados à covid-19, a verificação se torna ainda mais importante, pois coloca a saúde das pessoas em risco. O vídeo checado pelo Comprova tinha mais de 52 mil visualizações no Facebook até a publicação desta investigação e alcançou mais de 4 mil compartilhamentos.

Temas relacionados ao novo coronavírus têm sido usados politicamente, seja para reforçar narrativas ou desacreditar recomendações de cientistas, entre outras razões. O autor do vídeo já se candidatou a deputado distrital e, no caso do vídeo, ele fortalece o que tem dito Jair Bolsonaro (sem partido), que sempre se disse contra o lockdown, entre outros pontos que causaram polêmica por não terem respaldo científico.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado de seu contexto original e utilizado de forma a mudar o seu significado. No caso do vídeo, o autor menciona reportagens que foram feitas, embora não tenham sido respaldadas por nenhum órgão oficial. Ele cita ainda tratamentos que não tiveram a eficácia comprovada, induzindo quem o assiste a acreditar no uso das medicações como solução para a doença.

Desde o início da pandemia, o Comprova investigou boatos que minimizavam a gravidade do novo coronavírus. Um deles apontava a covid-19 como uma trombose provocada por bactéria, enquanto outro alegava que a principal causa das mortes na Itália não era a doença.

Soluções e tratamentos também foram alvos de checagens. O Comprova já desmentiu a existência de resultados em supostos estudos sobre tratamento com corticóide, um vídeo sobre a descoberta de um anticorpo, em Israel, que seria a solução contra o novo coronavírus, além de que o uso da hidroxicloroquina no início do tratamento descartava a necessidade de internação em Unidades de Tratamento Intensivo (UTI).

Saúde

Investigado por: 2020-07-01

É falso que Prefeitura de São Paulo tenha comprado 38 mil caixões sem licitação

  • Falso
Falso
Aquisição foi feita por pregão eletrônico e a compra das urnas já era prevista pela prefeitura, que adquiriu mais de 70 mil caixões no ano passado e optou por antecipar o recebimento neste ano em função da pandemia
  • Conteúdo verificado: Vídeo publicado em uma página no Facebook acompanhado de texto que diz que o prefeito de São Paulo, Bruno Covas, “previu milhares de mortes pela covid-19 e comprou 38 mil caixões sem licitação para enterrar o povo.”

É falsa a afirmação que circula em postagem na página Fiscal do Povo Wellington, no Facebook, alegando que o prefeito de São Paulo, Bruno Covas (PSDB), adquiriu 38 mil caixões sem licitação durante a pandemia de covid-19. A administração municipal obteve quantidade de urnas próxima da citada no post (37.109), mas, diferentemente do informado, todas as compras foram feitas por meio de pregão eletrônico que pode ser conferido online. Cinco dias após a publicação, o texto do post verificado foi editado e o conteúdo deixou de dizer que as compras haviam sido feitas sem licitação.

O vídeo que acompanha a postagem não diz onde e quando as imagens foram feitas. Somente após contato com a assessoria de comunicação da Secretaria Municipal de Subprefeituras de São Paulo foi possível confirmar que o vídeo foi gravado no centro de logística do Serviço Funerário Municipal (SFMSP).

A postagem acompanha o comentário de que “a previsão do prefeito deu errado”. No entanto, a compra das urnas já era prevista pela prefeitura, que adquiriu mais de 70 mil caixões no ano passado e optou por antecipar o recebimento neste ano em função da pandemia.

Como verificamos?

O Comprova pesquisou sobre o Plano de Contingenciamento Funerário da Prefeitura de São Paulo e encontrou um anúncio feito por Bruno Covas, em 23 de abril, mencionando a antecipação da aquisição de 38 mil urnas funerárias “para atender a capital nos próximos meses” em função do novo coronavírus. Procuramos o Serviço Funerário Municipal para questionar a respeito da compra dos caixões e recebemos, por e-mail, links com os detalhes das licitações. Conferimos os contratos junto a publicações no Diário Oficial da Cidade (DO). Nos contratos publicados no DO havia o número de um pregão eletrônico, que pudemos checar no e-negocioscidadesp, sistema de pesquisa sobre licitações do município.

Também procuramos em outras redes sociais o vídeo apresentado na postagem. Sem encontrar registros similares, contatamos a página que fez a publicação e não obtivemos retorno até a publicação desta investigação.

Pesquisamos a identidade do autor da página por meio de buscas pelo seu nome no Google e conferindo dados apresentados em registros oficiais no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Trata-se de um ex-candidato a vereador de São Paulo que integrou coligação de oposição ao PSDB nas eleições municipais de 2016.

Por fim, levantamos os dados oficiais a respeito da pandemia na capital paulista no site do governo do Estado de São Paulo e no site da Universidade Johns Hopkins.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 1º de julho de 2020.

Verificação

Por que a prefeitura comprou 38 mil caixões?

Serviços funerários são de monopólio da Prefeitura de São Paulo – cabe a administração municipal a compra de caixões, por exemplo. A quantidade de urnas funerárias adquiridas não é excepcional. A assessoria de comunicação da Secretaria de Subprefeituras informou que, em 2019, o Serviço Funerário comprou 72.579 urnas.

Os 38 mil caixões citados na legenda do vídeo já estavam previstos desde antes da pandemia, e tiveram a compra antecipada pelo Plano de Contingenciamento Funerário do órgão municipal.

Divulgado em 23 de abril, o plano previa uma série de medidas para garantir o funcionamento adequado do Serviço Funerário Municipal durante a pandemia de covid-19. Entre as medidas, foram anunciadas a ampliação no horário de sepultamentos diários e a abertura de 13 mil covas em três cemitérios.

Dados no site do SFMSP sobre contratos e convênios mostram que neste ano a prefeitura de São Paulo fechou quatro contratos para aquisição de 37.109 urnas funerárias. Diferentemente do informado pela publicação original, todos foram adquiridos por pregão eletrônico 033/SFMSP/2019. A modalidade escolhida foi “menor preço mensal estimado por lote”. O processo foi declarado aberto no DO em 13 de dezembro de 2019, ocorreu em 6 de janeiro deste ano, as empresas vencedoras foram convocadas em 22 de janeiro e a nota de empenho foi emitida em 21 de março.

O vídeo engana ao não informar que o fornecimento dos caixões já estava contratado antes da pandemia. Dois dos contratos tiveram aditamento para aumento de 25% dos valores em função da pandemia do novo coronavírus, conforme discriminado abaixo. O que a prefeitura fez no âmbito do Plano de Contingenciamento Funerário foi antecipar a entrega das urnas funerárias, que inicialmente deveria ocorrer de abril a outubro de 2020.

São Paulo na pandemia

Até o dia 1º de julho, a cidade de São Paulo registrou 7.258 óbitos pela doença e 129.328 casos confirmados. As informações são do boletim divulgado diariamente pelo Centro de Vigilância Epidemiológica do Estado de São Paulo. É o município com maior quantidade de mortes pela covid-19 em todo o estado, seguido por Guarulhos (693 óbitos), localizado na região metropolitana de São Paulo.

A postagem foi feita no mesmo dia em que a prefeitura anunciou que a capital passaria para a fase amarela do plano de contingência, com a reabertura de novos setores da economia. Com isso, a administração municipal permite o funcionamento, em horários restritos e respeitando medidas de distanciamento social e higienização, de bares, hotéis, restaurantes, salões de beleza e barbearias.

Dados coletados pela Universidade Johns Hopkins apontam que o estado de São Paulo é a segunda pior região no mundo em número de casos confirmados da covid-19, com 281.380 diagnósticos. Apenas o estado de Nova York, nos Estados Unidos, possui mais casos, com 394.079 infectados.

Quem é o autor da postagem?

A postagem que viralizou vem da página “Wellington Fiscal do Povo”, que pertence a um homem chamado Wellington e foi registrada como “Figura Pública” no Facebook. A página se propõe a fazer denúncias sobre questões cotidianas em bairros da Zona Leste de São Paulo, com o próprio Wellington gravando vídeos e tirando fotos de buracos de ruas, registrando falta de água em residências e divulgando vagas de emprego na página, por exemplo. Vários seguidores utilizam os comentários para apontar irregularidades nas áreas onde vivem e pedem que Wellington as denuncie nas redes. A página faz diversas críticas à prefeitura.

Em 1º de julho, cinco dias após a postagem ser feita, Wellington apagou o trecho que dizia que os caixões haviam sido comprados sem licitação.

No perfil, há duas formas externas de contato com Wellington, que não apresenta sobrenome na página: um e-mail e um número de telefone. O Comprova entrou em contato com a página por meio do chat do Facebook e pelo número do WhatsApp apresentado na rede social. No aplicativo de mensagens, Wellington chegou a escrever duas respostas mas apagou logo em seguida, ignorando os questionamentos sobre quem gravou os vídeos, onde foram feitos e como havia obtido informações a respeito da suposta compra de caixões sem licitação.

Como o email fornece o sobrenome “De Paulo”, o Comprova fez buscas rápidas no Google usando nome e sobrenome e encontrou a candidatura de Wellington de Paulo, registrado como “Wellington de Paula”, ao cargo de vereador pelo PSC em 2016. Ainda, viu que o mesmo candidato já havia sido lotado nos gabinetes dos ex-deputados Lelis Trajano e Fernando Capez na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp).

O histórico da página do Facebook aponta que ela foi criada em fevereiro de 2016 com o nome “Wellington de Paula” (o mesmo apresentado pelo candidato em 2016) e teve o nome alterado para Wellington de Paulo em 2019 — pouco antes de acrescentar a alcunha “fiscal do povo” no lugar do sobrenome. O perfil alega cursar “Gestão Pública” e “Gestão Hospital”.

No site do DivulgaCand de 2016, portal do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) no qual constam dados sobre todas as candidaturas, o Comprova encontrou o registro de Wellington, que teve a candidatura substituída antes da eleição, e confirmou nos documentos apresentados o mesmo endereço de e-mail fornecido na página do Facebook. Também conferimos se tratar do mesmo e-mail cadastrado no CNPJ apresentado pelo então candidato, disponível no site da Receita Federal.

O PSC entrou na coligação do PRB nas eleições municipais em São Paulo no ano de 2016. O candidato à prefeitura foi Celso Russomanno, com quem Wellington ostenta fotos ao lado em redes sociais. Russomanno liderou diversas pesquisas de intenção de votos, mas acabou em terceiro lugar no pleito, com 13,6% dos votos. João Doria (PSDB) foi o eleito. Ele renunciou após 15 meses para concorrer ao governo paulista em 2018, deixando o vice, Bruno Covas (PSDB), como prefeito.

As muitas críticas de Wellington à prefeitura são direcionadas a serviços e gastos públicos. Em um dos vídeos da página, Wellington reclama, em vídeo, que sua entrada no hospital de campanha do Anhembi foi barrada; ele alegou que pretendia fiscalizar o local. A gravação foi feita em junho, dois meses após um grupo de deputados estaduais invadir o local e provocar tumulto alegando que os leitos estavam vazios.

Por que investigamos?

O Comprova investiga conteúdos duvidosos de grande viralização nas redes sociais e que apresentam informações duvidosas sobre a pandemia de covid-19. É o caso deste vídeo, que até 1º de julho somava mais de 426 mil visualizações, 18 mil compartilhamentos e 3,3 mil interações no Facebook. O vídeo também foi compartilhado na página Amigos do Presidente e obteve mais de 2 mil interações.

Desde o início da pandemia do novo coronavírus, o Comprova já investigou boatos de que havia covas vazias em cemitérios para simular aumento de sepultamentos. Também já foram desmentidas notícias falsas de supostas denúncias de caixões vazios, parceria por vacina realizada antes da proliferação da doença e que hospitais recebiam quantias por cada óbito registrado como covid-19.

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o significado original; no caso do post, a única informação correta é de que a Prefeitura de São Paulo adquiriu 38 mil caixões.

Política

Investigado por: 2020-06-30

Publicação usa imagens antigas como sendo de obras do governo Bolsonaro

  • Falso
Falso
Imagens usadas em post que compara os governos petistas ao de Bolsonaro são anteriores à atual gestão. O Comprova também verificou que as imagens comparam locais diferentes
  • Conteúdo verificado: Meme compartilhado no Facebook com imagens que pretendem comparar a situação de vias nos 14 anos de PT com obras que seriam realizadas em 18 meses do governo de Jair Bolsonaro

É falsa a combinação de imagens amplamente compartilhada em redes sociais para mostrar uma suposta evolução de obras públicas entre os governos dos ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (2003 – 2011) e Dilma Rousseff (2011 – 2016), do PT, e os primeiros 18 meses de mandato do presidente Jair Bolsonaro (sem partido). Todas as fotografias atribuídas ao governo atual foram tiradas antes da posse de Bolsonaro.

Duas das imagens que supostamente retratam projetos de infraestrutura concluídos durante a gestão de Bolsonaro foram feitas, na verdade, nos mandatos de Lula e Dilma. Uma terceira foi publicada em um banco de imagens internacional anos antes da eleição de Bolsonaro.

As fotos comparadas nas publicações não mostram, ainda, os mesmos locais.

Como verificamos?

Para esta verificação pesquisamos a origem das seis fotos viralizadas utilizando os motores de busca reversa do Google e do TinEye.

A partir dos resultados encontrados, entramos em contato com os responsáveis pelos registros mais antigos de algumas das imagens para confirmar informações sobre o local e a data em que as fotografias foram feitas.

Também consultamos portais do governo e notícias para confirmar dados sobre as obras retratadas nas imagens.

Verificação

Estradas no Mato Grosso e no Pará

As primeiras duas fotos, que comparam uma estrada com veículos atolados na lama a uma rodovia asfaltada, não foram feitas no mesmo lugar nem mostram uma obra realizada pela gestão de Bolsonaro.

Com o mecanismo de busca reversa de imagens TinEye, encontramos registros da primeira foto em 2008. Fizemos a mesma pesquisa pelo Google, ajustando as configurações para obter resultados anteriores a 2009 — a busca encontrou esta apresentação de slides, publicada em janeiro de 2008.

Entramos em contato com a responsável pelos slides, Gislaine Manteli, por um e-mail listado na apresentação. Moradora da cidade de Nova Monte Verde, no Mato Grosso, ela informou que as fotos reunidas ali representavam a situação da rodovia MT-208 na época. Gislaine conta que os slides foram parte de uma mobilização do município para pressionar o governo estadual pela pavimentação da via.

De acordo com ela, hoje o trecho retratado nas fotos, que liga as cidades de Alta Floresta até Nova Bandeirantes, está quase completamente asfaltado. De fato, imagens de satélite do Google mostram longos segmentos pavimentados, com exceção de trechos perto de riachos.

A segunda imagem utilizada no post foi publicada no site do DNIT em 5 de fevereiro de 2010. A foto ilustra uma matéria sobre a pavimentação de 124 quilômetros da BR-163, entre Rurópolis e Santarém, no Pará. A obra foi realizada por um convênio com o Exército Brasileiro, com investimento de R$ 1,4 bilhão. Na época, o presidente era Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Esta foto já havia sido tirada de contexto em posts nas redes sociais, como mostra esta checagem da Agência Lupa.

Ferrovia fotografada em 2002 e foto de banco de imagens

A segunda comparação de fotos tampouco registra o antes e depois de uma mesma obra durante os “14 anos de PT” e os “18 meses de Bolsonaro”.

Uma busca reversa no Google pela imagem atribuída aos governos petistas, na qual é possível ver dois vagões de trem em uma área aparentemente abandonada, leva a um artigo publicado em 19 de novembro de 2008 no blog Música Sob Trilhos.

O texto, intitulado “Ferrovias no Brasil: Sucateamento completa 150 anos” é ilustrado com a imagem agora viralizada. Ao clicar na fotografia é possível identificar a marca d’água “Latuff 2002” no canto inferior direito.

Carlos Latuff, chargista carioca, manteve até 2017 um blog dedicado a compartilhar imagens de ferrovias no Brasil e no mundo.

Contactado pelo Comprova, Latuff confirmou ter tirado a imagem dos vagões de trem no final de 2002 — ano em que o país era governado por Fernando Henrique Cardoso (PSDB), e não pelo PT, como alegam as publicações viralizadas.

De acordo com o chargista, as imagens foram tiradas na oficina da companhia ferroviária MRS Logística no Horto Florestal, em Belo Horizonte, Minas Gerais. “São sucatas de locomotivas da antiga Rede Ferroviária Federal”, afirmou o fotógrafo.

Ao Comprova, Latuff enviou outras fotos que tirou no mesmo dia.

Já a foto que mostraria o estado desta ferrovia durante o governo Bolsonaro foi tirada do banco de imagens iStock, da empresa norte-americana Getty Images.

Embora o site não informe onde a fotografia foi feita, ela foi publicada no repositório em 13 de agosto de 2015 — anos antes da eleição de Jair Bolsonaro.

Uma busca reversa no Google mostra que a imagem é frequentemente utilizada por empresas de construção em diversos países, como Suíça, Itália e Alemanha, para ilustrar os serviços prestados pelas companhias.

Transposição do Rio São Francisco em 2011 e 2015

A terceira dupla de fotos também não mostra uma comparação entre o governo petista e a gestão de Bolsonaro. As duas imagens foram feitas durante o período em que Dilma Rousseff foi presidente (2011-2016).

O primeiro clique é do fotógrafo Wilson Pedrosa. A imagem foi publicada em matéria do Estadão de 4 de dezembro de 2011, assinada por Pedrosa e Eduardo Bresciani. A reportagem percorreu 100 quilômetros de obras da transposição do Rio São Francisco em Pernambuco — os jornalistas encontraram canais em deterioração e canteiros abandonados pelas empreiteiras responsáveis. A foto em questão mostra um trecho entre os municípios de Betânia e Custódia, em Pernambuco.

A segunda imagem foi publicada pela primeira vez em 13 de agosto de 2015 na conta do Ministério da Integração Nacional no site de compartilhamento de fotos Flickr. A legenda informa se tratar da Estação de Bombeamento 1 do Eixo Norte do Projeto de Integração do Rio São Francisco.

O Planalto anunciou na época que a obra em questão foi inaugurada em 21 de agosto de 2015. A estrutura bombeia água do Velho Chico por 45,9 quilômetros até o reservatório de Terra Nova, em Cabrobó, em Pernambuco.

Por que investigamos?

O Comprova investiga conteúdos duvidosos sobre políticas públicas do governo federal que apresentam ampla repercussão em redes sociais e aplicativos de mensagens. Este é o caso da comparação de imagens de obras, que obteve, até 30 de junho, mais de 13 mil compartilhamentos no Facebook, Instagram e Twitter.

Também é levada em consideração a relevância do conteúdo frente ao noticiário atual.

Neste caso, a viralização da combinação de fotos acontece alguns dias após o presidente Jair Bolsonaro inaugurar um trecho do Eixo Norte da transposição do Rio São Francisco — projeto de infraestrutura iniciado no primeiro mandato do ex-presidente Lula, que reivindica paternidade da obra. O tópico levou a primeiro plano o tema da evolução de obras públicas.

Falso, para o Comprova, é todo conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.

Esta combinação de fotos também foi verificada pela Agência Lupa.

Saúde

Investigado por: 2020-06-29

Hidroxicloroquina no início da covid-19 não descarta necessidade de UTI

  • Enganoso
Enganoso
Ao contrário do que diz médico nas redes sociais, há relatos de óbitos de pacientes que usaram hidroxicloroquina já no início dos sintomas. E não há comprovação de que o medicamento reduz o risco de morte pela covid-19
  • Conteúdo verificado: Tuíte de um médico que diz não ter visto nenhum paciente medicado com hidroxicloroquina no início dos sintomas que tenha evoluído para a fase crítica na UTI.

Um tuíte do dia 22 de junho, escrito pelo médico Allan Garcês, induz ao erro ao fazer crer que o uso da hidroxicloroquina nos primeiros sintomas de covid-19 impede que a doença siga para uma etapa mais severa. “Ainda não vi nenhum paciente que iniciou o tratamento com hidroxicloroquina no INÍCIO dos sintomas, ou seja, no INÍCIO da sua doença, que tenha evoluído para a fase crítica na UTI. FICA A DICA”, ele escreveu em seu perfil.

Estudos dos programas Solidariedade (da Organização Mundial de Saúde) e Recovery (do governo do Reino Unido) não conseguiram comprovar que a cloroquina e a hidroxicloroquina reduzam o risco de morte de pacientes com covid-19. A autoridade sanitária dos Estados Unidos, a Food and Drug Administration (FDA), suspendeu a autorização para uso emergencial dessas substâncias como tratamento do novo coronavírus no país.

No Brasil, o Ministério da Saúde permitiu o uso da cloroquina em pacientes graves no dia 23 de março e orientou o uso em casos leves no dia 20 de maio. A Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC) e a Sociedade Brasileira de Arritmias Cardíacas (Sobrac) criticaram a liberação para uso da droga na fase inicial da doença.

Para o médico Edson Carvalho, professor da Uninove e infectologista do Hospital Unimed e do Hospital Estadual de Bauru (SP), referência no tratamento de covid-19, a “suspeita” de Garcês não tem fundamento. Carvalho, que foi procurado pelo Comprova por recomendar a hidroxicloroquina, diz que tratou “vários” pacientes com hidroxicloroquina desde o início dos sintomas e, mesmo assim, viu eles evoluírem para casos mais graves – alguns, inclusive, morreram.

Como verificamos?

O Comprova buscou identificar os primeiros estudos que sugeriram o uso da cloroquina no tratamento de pacientes com covid-19 e as revisões feitas sobre eles. Também tentou saber como estudos clínicos conduzidos pela Organização Mundial de Saúde e pelo governo do Reino Unido vêm sendo interpretados por essas organizações. A equipe procurou o posicionamento sobre o remédio do governo dos Estados Unidos e do Brasil. Por fim, levantou o posicionamento de entidades como a Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC) e a Sociedade Brasileira de Arritmias Cardíacas (Sobrac).

Também procuramos testemunhos de pessoas que evoluíram para quadros graves da doença mesmo se tratando com a droga desde o início e, em pesquisas na internet, encontramos uma reportagem do site JCNet, de Bauru, com a história de Marília Buzalaf e seu marido, Cláudio, que, em março, ficou 21 dias no hospital – 11 deles intubado – por conta do novo coronavírus, e havia tomado hidroxicloroquina. No Facebook, descobrimos que ela é professora da Faculdade de Odontologia da USP em Bauru, no interior paulista, e, no site da instituição, conseguimos o e-mail dela. Entramos em contato e marcamos uma entrevista, realizada por telefone.

Após ouvir o relato de Marília, o Comprova pediu a ela o celular de Edson Carvalho, médico que cuidou do caso, para confirmar se o paciente havia sido realmente tratado com a hidroxicloroquina desde o começo dos sintomas.

Também tentamos, sem sucesso, falar com Allan Garcês, autor do tuíte. Ele não respondeu as mensagens diretas no Facebook nem no Instagram – seu Twitter não permite o envio de mensagens.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 29 de junho de 2020.

Verificação

O que dizem os estudos?

A cloroquina chegou a ser considerada como um possível tratamento de infecções por coronavírus nas epidemias de SARS e MERS. Na época, porém, não houve estudos em humanos que pudessem confirmar a eficácia da droga.

Em março deste ano, dias após a OMS classificar a covid-19 como uma pandemia, a medicação voltou ao debate a partir de um estudo conduzido por médicos do Sul da França que sugeriram usar a cloroquina para tratar o SARS-CoV-2. Esse estudo foi alvo de muitas críticas, seus resultados foram questionados e considerados anedóticos — termo da literatura médica que descreve casos isolados, que não representam comprovação científica. Em abril, a International Society of Antimicrobial Chemotherapy e a Elsevier, entidades responsáveis pela revista que publicou o artigo, emitiram um comunicado que reconheceu a existência de dúvidas quanto ao conteúdo do estudo e anunciaram um novo processo de revisão independente.

No dia 19 de março, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, classificou o medicamento como uma “mudança de jogo” no tratamento da covid-19 e anunciou que aprovaria o uso dele no país. Dois dias depois, o presidente Jair Bolsonaro disse que o laboratório do Exército aumentaria a produção de cloroquina no Brasil.

Em 25 de março, o Ministério da Saúde emitiu uma nota técnica autorizando o uso da cloroquina para tratar pacientes com casos graves de covid-19. Depois, em 20 de maio, o governo brasileiro passou a orientar o uso da cloroquina e da hidroxicloroquina no “tratamento medicamentoso precoce” de pacientes com covid-19, incluindo pessoas com sintomas leves da doença. No texto, o próprio Ministério da Saúde escreveu: “ainda não há meta-análises de ensaios clínicos multicêntricos, controlados, cegos e randomizados que comprovem o benefício inequívoco dessas medicações para o tratamento da covid-19”.

Naquela semana, a Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC) emitiu uma nota em que “não recomenda o uso da Cloroquina e Hidroxicloroquina associadas, ou não, à Azitromicina, enquanto não houver evidências científicas definitivas acerca do seu emprego”. O texto também orienta os médicos a realizarem eletrocardiogramas nos pacientes que optarem pelo tratamento, de modo a monitorar possíveis complicações cardíacas.

A Sociedade Brasileira de Arritmias Cardíacas (Sobrac) também lançou uma nota ressaltando a “ausência de evidências que apontem claramente o benefício do uso deste esquema terapêutico”. A entidade recomenda o acompanhamento dos pacientes que usem o medicamento para “prevenir a manifestação de eventos arrítmicos potencialmente fatais que podem ocorrer devido a efeitos adversos de um destes fármacos ou da associação entre eles ou com outros fármacos que também possam predispor a distúrbios elétricos cardíacos”.

No dia 5 de junho, pesquisadores do Recovery, estudo clínico conduzido no Reino Unido para encontrar medicamentos que combatam o novo coronavírus, afirmaram não haver benefício no uso da hidroxicloroquina em pacientes com covid-19. Dez dias depois, a Food and Drug Administration (FDA), autoridade sanitária americana, revogou a autorização de uso emergencial da cloroquina e da hidroxicloroquina para o tratamento da doença nos Estados Unidos. A organização afirmou na ocasião que, após realizar estudos, descobriu ser improvável que os medicamentos sejam efetivos no tratamento da covid-19. “Além disso, à luz de eventos adversos cardíacos graves e contínuos e de outros efeitos colaterais sérios, os benefícios conhecidos e potenciais de cloroquina e hidroxicloroquina não superam mais os riscos conhecidos e potenciais para o uso autorizado”, afirmou ainda.

A Organização Mundial da Saúde chegou a incluir a hidroxicloroquina na lista de medicamentos avaliados pelo estudo clínico Solidariedade, que testou drogas para combater a covid-19 em pacientes de 35 países. A OMS, porém, encerrou os testes com a hidroxicloroquina no dia 17 de junho por não ter sido capaz de identificar redução no número de óbitos entre os pacientes que usaram a droga.

A autoria do tuíte

Médico, Allan Quadros Garcês, conhecido como Allan Garcês, foi diretor do Departamento de Articulação Interfederativa da Secretaria-Executiva do Ministério da Saúde na gestão de Luiz Henrique Mandetta. Deixou o cargo para assumir como secretário estadual da Saúde de Roraima, posição que ocupou por 43 dias, entre janeiro e fevereiro deste ano. O Comprova procurou a Secretaria de Saúde para saber o motivo da exoneração, mas não recebeu resposta até o fechamento desta verificação.

Forte defensor da hidroxicloroquina, como mostra em seus perfis nas redes sociais, Allan se lançou ao cargo de ministro da Saúde após a saída de Nelson Teich, em maio. Na época, afirmou em seu Twitter que não havia sido sondado pelo Planalto, mas sabia que seu nome havia chegado “até lá”. No mesmo post, se diz “alinhado ao governo”, como é possível verificar em seus posts – muitos de apoio ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido).

Em 2018, ele foi candidato a deputado federal pelo PSL, mas não se elegeu. Antes, tentou se candidatar a vereador em São Luís, no Maranhão, pelo PMB em 2016, mas também não se elegeu. Em 2012, ficou como suplente da vaga de vereador pela mesma cidade, pelo PSDB.

Testemunho

Em entrevista ao Comprova, a professora de Odontologia da USP Bauru Marília Buzalaf contou que o seu marido, Cláudio, havia tido febre, dor no corpo e mal-estar por cinco dias quando procurou o Hospital Unimed, em Bauru, em março. “Falta de ar ele não teve”, disse. Ele fez o teste de covid-19 e, por ser cardíaco, acharam melhor interná-lo, mesmo sem o resultado do exame, que só sairia em cinco dias. “Naquele dia (da internação), o médico já tinha quase mandado a gente embora para casa depois de ter feito os exames”, afirmou Marília. Mesmo não considerando o caso grave, a equipe médica passou a tratar o paciente com hidroxicloroquina. O medicamento não fez efeito e, quatro dias depois, Cláudio foi para a UTI. No total, ele ficou 21 dias no hospital, até receber alta.

Casos médicos

O infectologista Edson Carvalho, que trabalha no Hospital Unimed e no Hospital Estadual de Bauru, e leciona na Uninove, disse ao Comprova que Cláudio estava na fase inicial da doença quando foi internado e passou a ser tratado com hidroxicloroquina. Acrescentou que teve vários pacientes que tomaram a droga assim que surgiram os sintomas e também tiveram o quadro agravado – alguns falecendo. O médico afirmou ainda que hoje tem “pelo menos quatro pacientes graves que tomaram o medicamento desde o começo e evoluíram com gravidade, com intubação, e que a hidroxicloroquina não fez a menor diferença no quadro clínico deles”.

Por que investigamos?

O Comprova investiga conteúdos suspeitos que viralizam nas redes sociais. Quando o material aborda assuntos relacionados à covid-19, a verificação se torna ainda mais importante, pois conteúdos enganosos podem colocar a saúde das pessoas em risco. O tuíte checado pelo Comprova tinha mais de 17 mil curtidas e foi retuitado 3.500 vezes.

Sem apresentar nenhuma prova, Allan Garcês engana ao insinuar que a hidroxicloroquina, se receitada no início dos sintomas de covid-19, evita que os pacientes evoluam para quadros mais graves. Desde os primeiros casos da doença no Brasil, os temas relacionados à pandemia têm sido usados para reforçar narrativas que se alinham ou contrariam o discurso do presidente da República, Jair Bolsonaro. No caso, o tuíte do médico segue a linha do chefe do Executivo, que sempre defendeu a cloroquina e a hidroxicloroquina como possíveis substâncias eficazes contra o novo coronavírus, descartando evidências científicas segundo as quais ainda não há nenhuma droga conhecida que combata com eficácia a doença. A polarização dos discursos em defesa do uso de medicamentos sem eficácia comprovada pode servir de incentivo à automedicação e causar efeitos colaterais danosos.

Desde o início da pandemia, o Comprova já realizou várias checagens sobre a cloroquina. Uma delas enganava ao afirmar que pesquisadores brasileiros usaram doses letais da medicação para matar os pacientes. Outra mentia ao afirmar que o prefeito de São Paulo, Bruno Covas, proibiu o uso da substância. Recentemente também mostrou que era enganoso um conteúdo que atribuía ao uso da cloroquina a situação da pandemia no Senegal.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor ou que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Política

Investigado por: 2020-06-29

Vídeo mostra queima controlada feita pelo Ibama, não incêndio provocado para culpar o presidente

  • Falso
Falso
A ação foi, na verdade, uma queima controlada, um procedimento previsto no Código Florestal para prevenir focos de incêndio de maiores proporções. Procurado pelo Comprova, o autor apagou a postagem
  • Conteúdo verificado: Post da página “Bolsonarianos Ceará”, com um vídeo e a legenda “Ibama provoca incêndio na mata para depois o presidente ser acusado”.

Um post faz acusações falsas sobre o Ibama ao afirmar que o órgão estaria promovendo um incêndio na mata “para depois o presidente ser acusado”. O autor da publicação usa um vídeo gravado de dentro de um carro em movimento que mostra um outro veículo com funcionários do Ibama queimando a mata da beira da estrada. No áudio da gravação, um homem diz estar entre as cidades de Sítio Novo e Montes Altos, no Maranhão, e insinua que o incêndio estaria sendo provocado pelo órgão para “poder derrubar o governo Bolsonaro”.

Procurado pelo Comprova, o Ibama afirmou que realizou uma ação na região no dia 20 de junho, mas que foi uma queima controlada, feita para combater focos de incêndio e prevista no Código Florestal.

O Comprova não conseguiu encontrar o autor do vídeo.

Como verificamos?

Para saber mais sobre a autoria do vídeo e confirmar o local onde ele foi gravado, o Comprova entrou em contato com a pessoa que assina as postagens na página “Bolsonarianos Ceará”, Jolnê Praxedes, por WhatsApp, pelo número disponibilizado no Facebook.

Também entramos em contato com o Ibama e enviamos o vídeo suspeito, além de consultar a Funai sobre o registro da ação e a presença de indígenas na região. O Google Maps foi utilizado para determinar o local onde o autor diz ter feito as imagens, e usamos ferramentas de busca de imagem para confirmar a aparência da viatura.

Verificação

Autoria do vídeo

A página “Bolsonarianos Ceará”, que publicou o vídeo no dia 21 de junho, é de um homem chamado Jolnê Praxedes. O Comprova entrou em contato com ele pelo WhatsApp, pelo telefone presente na própria página e nas postagens.

Perguntado sobre o vídeo, se conhecia a pessoa responsável pela filmagem ou se tinha confirmação do local onde as imagens foram feitas, Praxedes disse que participa de 80 a 100 grupos de política diferentes no WhatsApp, além de receber conteúdo de listas de transmissão, e que não se lembrava, exatamente, de onde tinha recebido o vídeo, que chegou como uma “denúncia”.

“Antes de publicar, procurei ver se tinha alguma coisa quanto à falsidade do vídeo, e não tinha. Sempre, eu procuro tomar esse cuidado”, afirmou, por mensagem de áudio. O dono da página bolsonarista ainda se dispôs, após o contato do Comprova, a apagar o conteúdo, caso a verificação demonstrasse que as informações eram falsas, e pediu que entrássemos em contato para avisá-lo do resultado da checagem. Pouco tempo depois do contato, porém, antes da publicação desta verificação, o vídeo já havia sido apagado da página do Facebook.

Também por mensagem no WhatsApp, Praxedes disse ao Comprova que a página tem outros administradores, mas ele é a única pessoa que aparece em vários vídeos, criticando pessoas vistas como “rivais” do governo de Jair Bolsonaro, como o ministro do Supremo Tribunal Federal Gilmar Mendes.

Nos posts mais recentes, as legendas incluem uma hashtag de apoio à pré-candidatura de Praxedes à Câmara Municipal de Fortaleza. Jolnê confirmou que pretende concorrer a um cargo nas próximas eleições, pelo Podemos. Ele já chegou a se registrar como candidato a deputado federal, pelo Partido Trabalhista Cristão (PTC), em 2018, mas acabou não concorrendo.

A página do Facebook, que tem quase 72 mil curtidas, foi criada em novembro de 2017, e publica mensagens de apoio ao presidente Bolsonaro e a outros políticos aliados.

Na publicação com o vídeo sobre as queimadas, Praxedes afirma que havia encaminhado o material ao presidente. Questionado pelo Comprova, disse que não enviou por não ter o contato direto do presidente.

O que diz o Ibama?

O Comprova procurou o Ibama e o órgão afirmou, por e-mail, que a ação mostrada no vídeo realmente ocorreu entre as cidades de Sítio Novo e Montes Altos. Foi realizada no dia 20 de junho, um dia antes da postagem de Praxedes, e era uma queima controlada, “utilizada durante o período chuvoso e no início do período seco (junho e julho) em locais com maior risco de ignição de fogo” para reduzir a “quantidade de combustível na seca, diminuindo drasticamente o risco de grandes incêndios florestais”.

A instituição afirmou que esse tipo de queima está previsto no Código Florestal. O texto descreve as situações nas quais o uso de fogo na vegetação é permitido. Entre as possibilidades está o “emprego da queima controlada em Unidades de Conservação, em conformidade com o respectivo plano de manejo e mediante prévia aprovação do órgão gestor da Unidade de Conservação, visando ao manejo conservacionista da vegetação nativa, cujas características ecológicas estejam associadas evolutivamente à ocorrência do fogo”.

Segundo o Ibama, “boa parte dos incêndios florestais iniciam nas beiras de estradas e a realização das queimas nesses locais, como no caso do vídeo, é prioritária”. O órgão disse ainda que a queima do dia 20 de junho foi informada aos órgãos competentes e teve acompanhamento da Polícia Militar do Maranhão “para garantir a segurança no trânsito da estrada”.

Funai

Antes de receber o relatório sobre a queimada preventiva do Ibama, o Comprova entrou em contato com a Fundação Nacional do Índio (Funai), questionando sobre o registro da ação e a presença de indígenas na região. A instituição não respondeu até o fechamento desta verificação, mas um documento enviado pelo órgão de defesa do meio ambiente confirma que a Funai participou da ação.

 

A operação

O Ibama enviou para o Comprova, por e-mail, o relatório da operação. No documento, descreve os detalhes da ação, que contou com dois servidores do órgão, um da Funai, dois policiais militares, dois supervisores de brigadas e 11 voluntários da Aldeia São José da TI Krika. O trabalho começou às 9 horas do dia 20 de junho e terminou às 14. O documento informa, “por fim, não ter havido nenhuma intercorrência durante toda a operação”. Parte da equipe atuou observando se havia animais em risco, mas não foi registrado “nenhum dano significavo à fauna e apenas benefício à flora”.

Por que investigamos?

O Comprova investiga conteúdos suspeitos de ampla repercussão em redes sociais, como a postagem de Praxedes, que tinha 119 mil visualizações no Facebook até o dia 24 de junho – um dia depois, após contato do Comprova, Praxedes apagou seu post.

Os autores do vídeo e da legenda enganam ao acusar o Ibama de incendiar um trecho de mata e levam a postagem para o lado político ao dizer que seria um fogo criminoso usado “para depois o presidente ser acusado”. Postado na página “Bolsonarianos Ceará”, o post servia para reforçar a defesa do presidente Jair Bolsonaro, que, no ano passado, foi criticado quando as queimadas na Amazônia bateram recorde dos últimos sete anos. O chefe do Executivo chegou a dizer, sem provas, que ONGs poderiam ter provocado queimadas na região. Ele também acusou o ator Leonardo DiCaprio de ter dado dinheiro para “tacar fogo na Amazônia”.

Falso, para o Comprova, é todo conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.

O G1 e o Boatos.org verificaram o vídeo e classificaram o conteúdo como falso.

Saúde

Investigado por: 2020-06-26

Prefeito de São Paulo não proibiu hidroxicloroquina e usou azitromicina no tratamento da covid-19

  • Falso
Falso
Ao contrário do que afirmam publicações nas redes sociais, a prefeitura de São Paulo nunca proibiu o uso de cloroquina, nem de sua forma menos tóxica, a hidroxicloroquina
  • Conteúdo verificado: Texto compartilhado por Facebook e Twitter acusando o prefeito de São Paulo, Bruno Covas, de deixar “muita gente morrer a (sic) míngua” ao “proibir a Hidroxicloroquina” e depois “confessar à mídia que fez uso do remédio que negou ao povo…”

Uma publicação com informações falsas sobre o prefeito de São Paulo, Bruno Covas (PSDB), viralizou no Twitter e no Facebook esta semana. Um dos perfis é de uma usuária que usa o apelido de “Tubaína Paschoal” e uma foto da deputada estadual Janaína Paschoal (PSL-SP). No post, ela afirma que Covas “deixou muita gente morrer a (sic) míngua ao proibir a hidroxicloroquina”, mas que o prefeito teria usado o medicamento para tratar a covid-19 quando foi infectado. A outra postagem, com o mesmo texto, é de uma conta que usa a foto, o nome e se descreve como uma “homenagem” ao general reformado Augusto Heleno, ministro do Gabinete de Segurança Institucional do Planalto, no Facebook.

Nenhuma das informações é verdadeira. A prefeitura de São Paulo nunca proibiu o uso de cloroquina, nem de sua forma menos tóxica, a hidroxicloroquina. O protocolo de atendimento de covid-19 no município, anunciado em 9 de abril, recomenda que o uso do medicamento seja feito com prescrição médica e consentimento do paciente ou da família. Uma recomendação técnica da Secretaria Municipal da Saúde, publicada em 17 de junho, lembra que ainda não existe um medicamento específico para o tratamento da covid-19. E, como não há evidências científicas que justifiquem o uso da cloroquina e da hidroxicloroquina contra o novo coronavírus, o uso deve ser evitado em pacientes com sintomas leves.

Bruno Covas, de 40 anos, anunciou que estava com covid-19 no dia 13 de junho. O prefeito, que trata um câncer no sistema digestivo, recebeu o diagnóstico depois de um exame de rotina. Em sua conta oficial no Instagram, afirmou que não teve sintomas como febre, dor ou falta de ar e que passaria dez dias isolado, trabalhando de casa. No dia 15, Covas publicou um vídeo em que esclareceu que, mesmo assintomático, estava tomando o antibiótico azitromicina por recomendação médica. “Remédio não é de esquerda ou de direita. Lamento que alguns queiram politizar a escolha do medicamento”, disse. No dia 24, mais uma vez numa mensagem gravada, Covas anunciou que estava recuperado e voltaria ao trabalho presencialmente na prefeitura.

Como verificamos?

Entramos em contato com a assessoria de imprensa da prefeitura de São Paulo para saber sobre o estado de saúde do Bruno Covas, como tinha sido feito o tratamento contra a covid-19 e se ele tinha tomado hidroxicloroquina. Por telefone, fomos informados que os detalhes do tratamento são de caráter pessoal do prefeito. E recebemos a sugestão de buscar as informações nas redes sociais de Bruno Covas. Ele publicou vídeos com atualizações ao longo dos dez dias de isolamento domiciliar.

Buscamos mais informações e documentos técnicos no site da Secretaria Municipal da Saúde, que segue recomendações da Secretaria Estadual da Saúde e do Ministério da Saúde.

Em seguida, levantamos quais foram os primeiros estudos a sugerir o uso de cloroquina e hidroxicloroquina em pacientes com a covid-19 e que revisões foram feitas sobre eles. Também consultamos documentos da Casa Branca e do Ministério da Saúde para explicar como a droga passou a ser adotada nos Estados Unidos e no Brasil. Buscamos também o posicionamento de entidades médicas sobre o uso do medicamento no país. Procuramos ainda informações sobre os status atuais de estudos sobre uso da droga para tratar a covid-19 conduzidos pela Organização Mundial da Saúde, governo do Reino Unido e pela autoridade sanitária americana.

Por fim, tentamos localizar os autores das publicações no Twitter e no Facebook. Ambos são perfis sem autoria declarada e não verificados. Por isso, não recebem mensagens privadas de desconhecidos. O contato com o perfil Tubaína Paschoal foi tentado por mensagem aberta e não houve resposta de nenhum dos dois até o fechamento desta reportagem. Já a página de homenagem a Augusto Heleno disponibiliza um e-mail e um telefone com prefixo 88, da região de Juazeiro do Norte, no interior do Ceará. Tentamos contato, mas o número estava desligado.

O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 26 de junho de 2020.

Verificação

O prefeito da capital paulista anunciou que estava com covid-19 no dia 13 de junho. Em um vídeo publicado no Instagram, Bruno Covas disse que depois de quatro testes negativos, dessa vez o resultado foi positivo. “A orientação do meu médico, já que eu não tenho nenhum sintoma, é ficar dentro de casa”, contou. Covas faz tratamento para um câncer no sistema digestivo desde outubro de 2019 e, por isso, faz parte do grupo de risco para novo coronavírus.

Ao longo de dez dias, o prefeito se manteve em isolamento domiciliar, trabalhando a distância. No dia 15, mais uma vez em vídeo, Covas esclareceu que permanecia sem febre, sem dor e sem falta de ar e que, por recomendação médica, estava tomando o antibiótico azitromicina. “Medicação a gente toma aquela prescrita pelo médico. Não se trata de remédio de esquerda nem direita. É lamentável ter que politizar a questão do remédio no país, isso não contribui em nada”, lamentou.

A azitromicina é um medicamento eficaz para o combate a bactérias, e não tem ação documentada contra vírus, como SARS-CoV-2. Associada à hidroxicloroquina, a droga é prescrita, de forma experimental, a pacientes infectados com o novo coronavírus. No caso do prefeito, somente a azitromicina pode servir para evitar infecções bacterianas oportunistas, já que Covas tem o sistema imunológico prejudicado por causa do tratamento contra o câncer. Nesta verificação, publicada pelo Comprova no dia 25 de junho, o médico Erich Vinícius de Paula explica que é difícil ter certeza que junto com o vírus não haja uma infecção bacteriana associada, mas alerta: “É muito importante entender que o antibiótico não é direcionado para tratar do vírus”.

Uso de cloroquina não é proibido

“Até o momento, não há vacina nem medicamento antiviral específico para prevenir ou tratar a covid-19”, explica a Organização Pan-Americana de Saúde, braço da Organização Mundial de Saúde (OMS) para as Américas. Uma das drogas em estudo é a cloroquina, usada para o tratamento de malária e doenças autoimunes como o lúpus (leia mais abaixo).

O texto verificado afirma que o prefeito proibiu a hidroxicloroquina na cidade. Essa informação é falsa. Em 9 de abril, Covas anunciou que a cloroquina passaria a fazer parte do protocolo de atendimento de pacientes diagnosticados com covid-19 no município. “Ainda não é possível ser uma política pública, pois não temos ainda pesquisas concluídas, mas havendo prescrição do médico e a concordância do paciente, a Secretaria Municipal de Saúde passou a integrar esse [a cloroquina] medicamento no protocolo de tratamento da covid-19”, afirmou Covas. Uma recomendação técnica foi publicada em 17 de junho, sugerindo uma “análise criteriosa do quadro clínico, o monitoramento do paciente, da resposta em relação à terapêutica selecionada e as reações adversas”. A prefeitura segue uma orientação da Secretaria Estadual da Saúde de São Paulo, para que a droga não seja prescrita para pacientes com casos leves. E, assim como sugere o Ministério da Saúde, a indicação deve ser feita por um médico com autorização do pacientes ou da família.

Cloroquina: o que dizem estudos e autoridades?

A cloroquina já havia sido considerada para tratamento de infecções de coronavírus após as epidemias de SARS e MERS. Mas, na época, não foram feitos testes clínicos em humanos para confirmar a eficácia da droga.

Em março deste ano, após a covid-19 ter sido declarada uma pandemia pela OMS, um estudo conduzido por médicos do Sul da França se tornou viral ao sugerir que a cloroquina poderia ser usada como tratamento para o SARS-CoV-2, o novo tipo de coronavírus descoberto no final do ano passado. Esse estudo foi alvo de diversas críticas e seus resultados foram questionados e considerados anedóticos, ou seja, se tratavam de casos isolados, sem comprovação científica. Mais tarde, em um comunicado, a International Society of Antimicrobial Chemotherapy e a Elsevier, responsáveis pela revista que publicou o artigo, reconheceram a existência de questionamentos quanto ao conteúdo e anunciaram um novo processo de revisão independente.

Em 19 de março, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, tratou do medicamento como uma “mudança de jogo” no tratamento da covid-19 e disse que aprovaria o uso dele no país. Dois dias depois, o presidente brasileiro Jair Bolsonaro anunciou que o laboratório do Exército aumentaria a produção de cloroquina.

No dia 25 de março, o Ministério da Saúde emitiu uma nota técnica autorizando o uso da cloroquina para tratar pacientes com casos graves de covid-19. Em 20 de maio, o governo brasileiro passou a orientar o uso da cloroquina e da hidroxicloroquina no “tratamento medicamentoso precoce” de pacientes com covid-19, incluindo pessoas com sintomas leves da doença na lista das que podem ser tratadas com a substância. Porém, o próprio Ministério da Saúde afirma no documento que “ainda não há meta-análises de ensaios clínicos multicêntricos, controlados, cegos e randomizados que comprovem o benefício inequívoco dessas medicações para o tratamento da covid-19”.

Dois dias depois, a Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC) emitiu uma nota em que “não recomenda o uso da Cloroquina e Hidroxicloroquina associada, ou não, a Azitromicina, enquanto não houver evidências científicas definitivas acerca do seu emprego”. O texto também orienta que, para os pacientes que optarem pelo tratamento, “sejam realizados eletrocardiogramas”, de modo a acompanhar possíveis complicações cardíacas.

A Sociedade Brasileira de Arritmias Cardíacas (Sobrac) também emitiu uma nota ressaltando a “ausência de evidências que apontem claramente o benefício do uso deste esquema terapêutico”. A Sobrac recomenda o monitoramento dos pacientes que façam uso do medicamento para “prevenir a manifestação de eventos arrítmicos potencialmente fatais que podem ocorrer devido a efeitos adversos de um destes fármacos ou da associação entre eles ou com outros fármacos que também possam predispor a distúrbios elétricos cardíacos”.

No dia 5 de junho, pesquisadores do Recovery, estudo clínico conduzido no Reino Unido para encontrar medicamentos para tratar a infecção pelo novo coronavírus, afirmaram não haver benefício no uso da hidroxicloroquina em pessoas com covid-19. Dez dias depois, a Food and Drug Administration (FDA), autoridade sanitária americana, revogou a autorização para um uso emergencial da cloroquina e da hidroxicloroquina para o tratamento da doença nos Estados Unidos. A organização alegou que, após o resultado de estudos, é improvável que os medicamentos sejam efetivos no tratamento da covid-19. “Além disso, à luz de eventos adversos cardíacos graves e contínuos e de outros efeitos colaterais sérios, os benefícios conhecidos e potenciais de cloroquina e hidroxicloroquina não superam mais os riscos conhecidos e potenciais para o uso autorizado”, afirmou ainda.

A Organização Mundial da Saúde também avaliou o uso da hidroxicloroquina como um dos medicamentos para o tratamento da covid-19 através do estudo clínico Solidariedade, que já recrutou pacientes em 35 países. Mas decidiu encerrar os testes com a hidroxicloroquina no dia 17 de junho por não ter sido capaz de identificar redução no número de óbitos entre os pacientes que fizeram uso da droga.

Por que investigamos?

O Projeto Comprova verifica conteúdos sobre a covid-19 que tenham grande alcance em redes sociais e grupos de mensagem. A desinformação é perigosa em uma pandemia, pois pode custar vidas. Nesse caso, o texto que acusa o prefeito de São Paulo de tomar proibir a hidroxicloroquina — causando assim a morte de cidadãos — e depois tomar o medicamento teve 11,7 mil interações (8,1 mil curtidas e 3,7 mil compartilhamentos) até o dia 26 de junho em postagem no Twitter, feita por uma conta que usa a foto da deputada estadual Janaína Paschoal (PSL-SP) e se descreve como uma página de “sátira” e paródia”. Mas o conteúdo postado por ela costuma ser de apoio ao presidente Jair Bolsonaro e a suas políticas de governo. As críticas ficam para políticos de esquerda ou que não fazem parte da base de apoio de Bolsonaro, como o ex-governador Ciro Gomes (PDT), o prefeito de Salvador ACM Neto (DEM) e, como no caso do post verificado, o prefeito Bruno Covas (PSDB). A publicação também engana ao dizer que Covas tomou hidroxicloroquina para tratar covid-19, estimulando o uso de uma droga que não tem eficácia comprovada cientificamente.

O conteúdo falso também repercutiu no Facebook. A postagem com o mesmo texto e a mesma foto de Covas foi publicado por um perfil que usa o nome e a foto do general reformado Augusto Heleno, chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República. De acordo com dados da plataforma Crowdtangle, a publicação teve ainda mais alcance, 25 mil visualizações até o dia 26, quando foi marcada como conteúdo falso pelo Facebook e, em seguida, apagada pelo autor. Neste caso a desinformação é ainda mais perigosa, porque atribui a mensagem falsamente a uma autoridade do governo federal.

Falso para o Comprova é todo conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.

A agência Aos Fatos também concluiu que o conteúdo dessas postagens é falso.

Política

Investigado por: 2020-06-26

Texto engana ao dizer que Trump indicou Weintraub ao Banco Mundial

  • Enganoso
Enganoso
Publicação também afirma equivocadamente que a instituição monitora o COAF e a Receita Federal e que, a mando do presidente americano, o ex-ministro da Educação brasileiro tenha escolta do FBI
  • Conteúdo verificado: publicação feita em um perfil pessoal no Facebook e também compartilhada em outras redes com o título “*UM PESADELO CHAMADO WEINTRAUB*”.

É enganosa a informação que circula em redes sociais de que o ex-ministro da Educação, Abraham Weintraub, teria sido nomeado diretor-executivo do Banco Mundial pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. O texto induz a acreditar que a nomeação de Weintraub ao cargo já foi aceita e que o mandatário americano teria participação direta no processo. Ainda, fornece informações equivocadas sobre o papel da instituição, como um suposto monitoramento do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF) e da Receita Federal.

Weintraub ainda não recebeu a chancela de outros países membros do Banco Mundial para assumir o cargo, conforme explicado pela própria instituição. O conteúdo viralizado nas redes também diz que o ex-ministro conta com escolta do FBI a mando de Trump, embora o Comprova não tenha encontrado nenhum registro que indique proteção especial ao ex-titular do MEC.

Como verificamos?

O Comprova fez uma busca em redes sociais, por meio das plataformas CrowdTangle e Tweetdeck, para tentar rastrear postagens relacionando indicações de Donald Trump a Abraham Weintraub e o FBI. O post mais antigo encontrado data de 20 de junho, em um grupo público do Facebook, mesmo dia em que o ex-ministro diz ter desembarcado nos EUA. Buscamos contato com o perfil do Facebook que realizou a postagem, mas não obtivemos retorno.

Levantamos, junto à assessoria de imprensa do Banco Mundial, quais as atribuições da entidade e se ela monitora instituições financeiras de outros países, como o COAF e a Receita Federal. Pesquisamos no site do órgão como funciona o processo de indicação a um cargo de diretor-executivo e quais tarefas são atribuídas a este posto.

Também apuramos como foi a entrada de Weintraub nos Estados Unidos por meio de publicações em veículos de imprensa e postagens do ex-ministro e de seu irmão em redes sociais. Buscamos no site do governo americano orientações sobre entrada de estrangeiros em meio à pandemia de covid-19 e procuramos o Departamento de Estado e o Departamento de Segurança Interna dos Estados Unidos, além do Itamaraty, para saber como Weintraub conseguiu chegar até o país. Apenas o Departamento de Estado respondeu aos nossos questionamentos.

Por fim, pesquisamos no site do FBI quais as responsabilidades do órgão de inteligência dentro do país e se isso inclui a escolta de autoridades estrangeiras. O Comprova também questionou a agência americana sobre uma possível proteção concedida a Weintraub, mas não obteve nenhum retorno.

Verificação

Indicado por Trump?

“Se muitos desejavam a saída do ministro da Educação de sua pasta, agora lamentam profundamente. O ex-ministro foi nomeado pelo Presidente Donald Trump como diretor executivo do Banco Mundial”, começam as publicações compartilhadas mais de 36 mil vezes em redes sociais desde o último dia 20 de junho.

Não há qualquer indício, no entanto, de que o presidente dos Estados Unidos tenha influenciado a nomeação de Weintraub ao Banco Mundial — que não é um órgão subordinado ao governo americano, mas uma instituição de desenvolvimento governada por 189 países membros.

Envolvido em polêmicas desde que assumiu o Ministério da Educação em abril de 2019, Weintraub renunciou ao cargo em 18 de junho deste ano, após desgaste político por afirmar que gostaria de ver presos os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), a quem chamou de “vagabundos”.

No vídeo em que anunciou sua saída da pasta, o economista também informou que havia recebido o convite para ser diretor do Banco Mundial, agradecendo ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido) por ter “referendado” a indicação.

No mesmo dia, o Ministério da Economia confirmou em nota oficial que o governo brasileiro oficializou a indicação de Weintraub para diretor executivo do grupo de países que o Brasil lidera no Banco Mundial. Não havia, no comunicado, qualquer menção ao presidente dos EUA, Donald Trump.

Questionado pelo Comprova se a indicação do ex-ministro brasileiro havia sido feita pelo mandatário norte-americano, o Banco Mundial afirmou, apenas, que “recebeu uma comunicação oficial das autoridades brasileiras” indicando Weintraub para o cargo.

A informação coincide com o processo de nomeação oficial detalhado no site da entidade.

O conselho administrativo do Banco Mundial possui 25 cadeiras. Destas, seis são indicadas diretamente pelos maiores acionistas da instituição, entre eles os Estados Unidos. O restante das cadeiras é ocupado por blocos divididos por critérios geopolíticos, chamados de “constituency”.

O grupo do Brasil é composto por oito outros países: Colômbia, República Dominicana, Equador, Haiti, Panamá, Filipinas, Suriname e Trinidad e Tobago. Estas são as nações que devem aprovar, ou não, a nomeação de Weintraub.

O nome do ex-ministro ainda não foi chancelado por estes países. Embora seja considerada uma formalidade, uma vez que o número de votos do Brasil supera o de todos os outros integrantes do “constituency”, Weintraub não foi oficializado, por enquanto, como diretor executivo do banco, como sugerem as postagens.

No último dia 24 de junho a Associação de Funcionários do Banco Mundial enviou uma carta ao Comitê de Ética da instituição pedindo a suspensão da indicação de Weintraub, até que seja conduzida uma investigação sobre falas preconceituosas do ex-ministro.

“De acordo com várias fontes, Weintraub publicou um tuíte de acusação racial que zomba do sotaque chinês (…) Weintraub deu declarações públicas contra a proteção dos direitos das minorias e a promoção da igualdade racial”, listou a associação, na carta. “Portanto, solicitamos formalmente ao Comitê de Ética que reveja os fatos subjacentes às múltiplas alegações, com vistas a suspender sua indicação até que essas alegações possam ser revisadas”, diz o pedido.

Banco Mundial monitora o COAF e a Receita Federal?

As publicações viralizadas afirmam, ainda, que o Banco Mundial tem acesso a todo o sistema financeiro do mundo e que monitora, inclusive, o COAF e a Receita Federal brasileira.

Por isso, sugerem as postagens, Weintraub teria “a chave dos segredos” e poderia monitorar todos aqueles que “tiveram laranjas” nas suas empresas ou “negociações dúbias”, se aprovado pela instituição: “Lula e seus filhos, juntos aos governadores e prefeitos corruptos”, listam as publicações.

Consultado pelo Comprova, o Banco Mundial classificou as afirmações como “incorretas”. “Ninguém do staff ou de qualquer board do Banco Mundial tem acesso a contas bancárias de terceiros”, acrescentou Juliana Braga, representante de Assuntos Externos da entidade, em Brasília.

O Banco Mundial tem como objetivo fornecer assistência financeira e técnica a países em desenvolvimento. Para isso, oferece empréstimos e créditos a juros baixos, além de bolsas. A instituição também facilita financiamentos e oferece recomendações sobre políticas.

Os diretores desta entidade se reúnem aproximadamente duas vezes por semana para supervisionar os negócios do Banco Mundial, incluindo a aprovação de empréstimos, de novas políticas, do orçamento administrativo e de estratégias de assistência a países, como explica o site da organização.

Proteção do FBI

O texto viralizado assegura, também, que Donald Trump solicitou que Weintraub seja colocado sob escolta do FBI “por tempo indeterminado”.

O FBI é uma agência de inteligência dos EUA que busca manter a segurança nacional por meio da proteção das leis do país. As investigações são focadas em violações da lei e monitoramento de possíveis ameaças. Ao todo, os EUA têm 17 agências de inteligência ligadas a departamentos distintos e com propósitos diferentes.

O Comprova entrou em contato com o FBI, tanto no escritório mantido no Brasil, dentro da embaixada de Brasília, quanto na sede em Washington, mas não obteve retorno até a publicação deste texto.

De acordo com o site do Departamento Nacional de Inteligência, diferentemente do que alega a postagem a respeito de Weintraub, a proteção a presidentes, chefes de estado e outras autoridades cabe ao Serviço Secreto — braço do Departamento de Segurança Interna (DHS) e que, embora possa atuar junto do FBI, funciona de forma separada.

É tarefa do Serviço Secreto, segundo o site oficial, fornecer proteção a “chefes de estado visitantes, ou outras autoridades, e cônjuges, além de outros estrangeiros ilustres que estejam visitando o país”.

Procurado por email, o DHS não respondeu a respeito da entrada de Weintraub nos EUA e se ele recebeu proteção do serviço de inteligência.

A ida de Weintraub aos EUA

Em 20 de junho — dois dias após o anúncio da saída de Weintraub do Ministério da Educação — o irmão do então ministro, Arthur Weintraub (que ocupa cargo de assessor especial da Presidência), publicou no Twitter que Abraham havia deixado o Brasil e desembarcado em Miami. A assessoria do MEC confirmou a informação aos veículos de imprensa no mesmo dia e declarou que ele havia pagado pela própria passagem e viajado em voo comercial.

A exoneração de Weintraub só foi publicada no Diário Oficial da União após a chegada dele aos EUA. O governo admitiu que o pedido de demissão veio depois da viagem. Em 23 de junho, o Diário Oficial publicou uma retificação da data da exoneração do ex-ministro, passando a demissão de 20 para 19 de junho.

Desde 24 de maio é vetada, nos EUA, a entrada de brasileiros ou viajantes que tenham passado pelo Brasil nos últimos 14 dias. Há uma lista de exceções fornecida pelas autoridades americanas, que inclui funcionários de governos estrangeiros, de organizações internacionais ou diplomatas — categoria na qual Weintraub, então ministro, se encaixava.

As demais entradas são permitidas a cidadãos norte-americanos e seus cônjuges, assim como filhos estrangeiros ou adotivos; pais e responsáveis de cidadãos americanos com menos de 21 anos; pessoas com residência permanente e legal nos EUA; irmãos estrangeiros de cidadãos americanos desde que ambos tenham menos de 21 anos; cidadãos estrangeiros que entram no país a convite de autoridades dos EUA para auxiliar no combate ao novo coronavírus; membros de tripulações aéreas ou marítimas (neste caso, são pessoas que já viajam sem visto de imigrante).

Não foi informado como Weintraub entrou nos EUA. Sem ocupar, ainda, cargo na diretoria do Banco Mundial, sua única forma de entrar no país, mesmo vindo do Brasil, seria por meio de um visto de autoridade ou mesmo uso do passaporte diplomático (este último também oferecendo risco de veto). Em ambos os casos, ele só teria a entrada permitida caso ainda fosse ministro.

O Comprova enviou um e-mail para o Departamento de Estado dos EUA, que controla entrada de estrangeiros no país, para saber se Weintraub utilizou um passaporte diplomático ou algum tipo de visto especial. O órgão informou que questões de visto são confidenciais e que não comentaria casos individuais. Ainda, acrescentou que exceções ao veto de entrada nos EUA cabem ao Departamento de Segurança Interna (conhecido pela sigla DHS).

Também procuramos o Itamaraty para saber como ocorreu a entrada de Weintraub nos EUA. Até o fechamento deste texto, não houve retorno.

Por que investigamos?

O Comprova investiga conteúdos duvidosos ligados a políticas públicas que apresentam ampla repercussão em redes sociais e aplicativos de mensagens. É o caso da postagem envolvendo o ex-ministro Abraham Weintraub. Até 25 de junho, o conteúdo teve 48.251 mil interações e 36.872 compartilhamentos no Facebook, 4,2 mil retuítes e 13,6 mil curtidas no Twitter e 709 visualizações, 33 curtidas e 8 descurtidas no Youtube.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado de seu contexto original e usado de modo a induzir outro significado. É o caso da postagem, que embora cite a indicação de Weintraub ao Banco Mundial, fornece a falsa informação de que ele já seria detentor do cargo e que teria chegado lá por indicação do presidente dos EUA, Donald Trump.

Apesar do alinhamento político e ideológico do presidente da República Jair Bolsonaro com Trump, não há nenhum indício da interferência do mandatário no processo de escolha da diretoria-executiva do Banco Mundial, conforme explicado ao longo desta investigação. Também não houve nenhuma confirmação de que Weintraub teria recebido algum tipo de tratamento especial em sua chegada aos EUA.

O conteúdo já foi considerado falso pelo site Boatos.org.

A desinformação em torno de procedimentos que envolvem organismos internacionais já foi alvo de outras checagens do Comprova. No ano passado, uma publicação creditava o atraso da entrada do Brasil na Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) a “retrocessos no combate à corrupção”.