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Política

Investigado por: 25/09/2025

Artistas não receberam dinheiro público para participar de ato político; valores de repasses à Cultura são públicos

Política
Recursos obtidos por Daniela Mercury e Wagner Moura são públicos, regulares e resultam de mecanismos legais de fomento à cultura.

Diferentemente do que alega vídeo publicado no TikTok, o governo federal não colocou sob sigilo repasses feitos por meio de editais e leis de incentivo à cultura a artistas que participaram dos atos contra a PEC da Blindagem e o projeto que anistia condenados pelos ataques de 8 de janeiro, realizados em 21 de setembro.

Na publicação, um homem exibe imagens da cantora Daniela Mercury e do ator Wagner Moura durante as manifestações ocorridas em Salvador (BA) e sugere que eles só teriam comparecido por terem recebido apoio do governo federal, uma vez que ela teria conseguido patrocínio da Caixa Econômica Federal, para o espetáculo “Uma Chica”, e ele, angariado R$ 17,5 milhões do Ministério da Cultura para a produção dos filmes “Agente Secreto” e “Marighella”, entre 2023 e 2025.

A verificação mostrou que os projetos dos dois artistas de fato foram contemplados com recursos públicos, mas não houve sigilo nem repasses feitos em desacordo com a lei. No caso de Daniela Mercury, o apoio não veio da Lei Rouanet (Lei nº 8.313/1991), mas de edital público do Programa de Ocupação dos Espaços da Caixa Cultural. Em resposta ao Comprova, a Caixa confirmou que a artista recebeu R$ 800 mil para o projeto “Daniela Mercury canta Chico Buarque”, valor referente a oito apresentações em Brasília e Salvador.

Essas informações não estão em sigilo. Elas constam tanto na plataforma de transparência da instituição como nos registros oficiais do programa, que listam o número de Pronac do projeto, a empresa proponente e as cidades de realização. Portanto, é incorreto afirmar que houve ocultação dos valores, uma vez que o patrocínio é público e o resultado do edital, assim como outros dados, podem ser consultados no site da própria instituição.

Quanto a Wagner Moura, não houve repasse via Lei Rouanet, uma vez que a legislação não permite financiamento de longas-metragens, apenas curtas e médias, conforme explicou o Ministério da Cultura ao Comprova.

As produções mencionadas tiveram autorização de captação pela Lei do Audiovisual (Lei nº 8.685/1993), mecanismo específico para o cinema, e a soma de autorizações nesse período de aproximadamente R$ 17,5 milhões, conforme consta no portal de consulta de projetos audiovisuais da Ancine, que permite ver os valores captados por cada obra beneficiada.

Esses recursos não são transferidos automaticamente: dependem de captação junto a patrocinadores, aplicação conforme o projeto e posterior prestação de contas. Portanto, é enganoso afirmar que houve ocultação de valores ou direcionamento irregular. O Ministério da Cultura também ressaltou que, além das leis de incentivo fiscal, existem outros instrumentos de fomento geridos pela Funarte, como programas de memória, difusão, formação e chamadas públicas.

Desde o início da atual gestão, mais de 80 editais foram lançados para contemplar projetos em todas as regiões do país, incluindo iniciativas como o Prêmio Mestras e Mestres das Artes.

Vale ressaltar que a Lei Rouanet funciona por meio de renúncia fiscal, permitindo que empresas e pessoas físicas destinem parte do Imposto de Renda devido a projetos culturais aprovados pelo Ministério da Cultura, sem repasse automático a artistas.

A Lei do Audiovisual, também baseada em renúncia fiscal, é restrita ao cinema e às séries e permite aportes como patrocínio, com retorno de imagem, ou investimento, que dá ao incentivador participação nos lucros da obra.

Já a Lei Paulo Gustavo (Lei Complementar nº 195/2022) foi criada em caráter emergencial após a pandemia e destinou R$ 3,86 bilhões do orçamento federal ao setor cultural, repassados a estados e municípios, que lançaram editais para selecionar projetos locais, sendo que as iniciativas tinham que ser executadas até o fim de 2024.

Por fim, a Política Nacional Aldir Blanc de Fomento à Cultura (Lei nº 14.399/2022) tem caráter permanente e prevê até R$ 3 bilhões por ano repassados pela União a estados, municípios e Distrito Federal, para aplicação em editais ou em ações culturais diretas, como festas populares, manutenção de espaços e apoio a agentes culturais.

Em todos os casos, os recursos dependem de apresentação de projetos, seleção em editais, monitoramento e prestação de contas. Não existe repasse automático de “milhões” a artistas individuais, como sugere o vídeo.

Quem criou o conteúdo investigado pelo Comprova

O conteúdo investigado foi publicado em 21 de setembro por um perfil no TikTok com mais de 48 mil seguidores, dedicado a críticas ao governo federal e alinhado a pautas da direita. Até o dia 22, o vídeo acumulava mais de 178 mil visualizações.

O Comprova entrou em contato com o criador para questionar quais seriam suas fontes. Nas respostas, ele afirmou que as informações poderiam ser encontradas em registros públicos, como o Diário Oficial e a página de patrocínios da Caixa, mas não apresentou links nem documentos que comprovassem os valores mencionados.

Em outro momento, diante de nova solicitação de comprovação, respondeu de forma evasiva, dizendo apenas “se vira cara, você não é jornalista”.

O perfil solicita doações via Pix para custear sua ida a manifestações políticas, o que reforça o vínculo com mobilização partidária e ajuda a explicar o interesse em disseminar esse tipo de conteúdo.

Por que as pessoas podem ter acreditado

O vídeo utiliza conteúdo enganoso e descontextualização para sustentar a acusação de que artistas estariam recebendo milhões em recursos públicos em troca de apoio político ao governo federal.

A narrativa é construída com base em meias-verdades: os artistas de fato acessaram mecanismos públicos de incentivo à cultura — o que é legal e regulamentado —, mas o vídeo distorce esse fato ao omitir que tais recursos não são repassados automaticamente, exigem aprovação de projeto, captação junto a patrocinadores e prestação de contas.

A peça ainda recorre a apelos emocionais e ao uso da falsa equivalência, ao comparar os incentivos culturais (que têm natureza e função distintas) com benefícios sociais como o Bolsa Família e o auxílio-gás. Essa comparação tem o claro objetivo de instigar ressentimento social e reforçar uma visão de “privilégios para artistas e migalhas para o povo”.

O autor do vídeo, alinhado a pautas da direita e ativo em mobilizações políticas, demonstra interesse em polarizar o debate e minar a credibilidade de opositores ao governo anterior, promovendo uma visão distorcida do funcionamento das políticas públicas de fomento à cultura.

O uso de linguagem sarcástica (“uma bagatelazinha”, “pão e circo”) reforça o caráter persuasivo e manipulador da mensagem. Trata-se, portanto, de uma peça típica de desinformação com viés ideológico, que ignora deliberadamente os fatos para inflamar a opinião pública.

Fontes que consultamos: Caixa Econômica Federal, Ministério da Cultura, plataforma Salic, Portal da Transparência da Caixa, plataforma da Ancine e as leis nº 8.313/1991 (Lei Rouanet), nº 8.685/1993 (Lei do Audiovisual), nº 195/2022 (Lei Paulo Gustavo) e nº 14.399/2022 (Política Nacional Aldir Blanc).

Por que o Comprova investigou essa publicação: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas, saúde, mudanças climáticas, eleições e golpes virtuais e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: É comum que postagens nas redes sociais usem as leis de incentivo à cultura como alvo de desinformação. O Comprova já verificou em outras ocasiões conteúdos que distorciam o funcionamento da Lei Rouanet e de outros mecanismos de fomento. Em março de 2023, mostramos que Ludmilla não receberia R$ 5 milhões da Rouanet, como afirmava um tuíte. Em novembro do mesmo ano, verificamos que um produtor cultural não viajou a Portugal com dinheiro da lei, diferentemente do que alegava um vídeo. Em abril de 2024, checamos uma sátira que dizia que um ator importava alimentos da Europa com verba da Rouanet. Já em julho de 2024, desmentimos que Malu Mader e a TV Globo tivessem recebido recursos para uma novela. Também esclarecemos, em setembro de 2024, a diferença entre valores aprovados e os efetivamente captados por projetos, e em agosto do mesmo ano mostramos que Anitta, Diogo Nogueira e outros artistas não receberam “milhões” da Rouanet para apoiar Lula.

Política

Investigado por: 24/09/2025

Frase atribuída a Paulo Guedes sobre caminhões-pipa é montagem

Política
Publicação tenta vincular ex-ministro a discurso sobre exploração da seca, mas não há registro de que ele tenha feito tal declaração.

Não há registro de que o ex-ministro Paulo Guedes tenha declarado que “se não fosse Bolsonaro, os nordestinos jamais saberiam que foram deixados propositalmente sem água para serem explorados por caminhões-pipa de famílias poderosas”, diferentemente do que afirmam postagens no X, Facebook, Instagram e Threads. As postagens não citam fontes e apresentam uma montagem, que simula uma publicação do economista em uma rede social.

A liberação de água da Transposição do São Francisco chegou a ser pausada em novembro de 2022, ainda no governo Jair Bolsonaro (PL), devido a uma fissura na estrutura da Estação de Bombeamento de Salgueiro (PE), o que exigiu manutenção. Interrupções semelhantes já ocorreram em outros momentos, inclusive durante o governo Lula, geralmente motivadas por obras técnicas e ajustes operacionais.

Já a postagem verificada pelo Comprova circula na plataforma X em um perfil que publicou a suposta fala atribuída a Paulo Guedes, depois replicada por outra conta. A publicação original aparece com a legenda “Paulo Guedes” e o @Guedes.apoio, com foto do ex-ministro, mas esse usuário não existe na rede social, indicando montagem. Guedes não possui perfil oficial no X (antigo Twitter). O Comprova tentou contato com o ex-ministro, mas não obteve resposta.

O Comprova já investigou outros conteúdos falsos atribuídos a Guedes, o que indica uma recorrência na criação de contas e publicações enganosas que buscam associar o ex-ministro a declarações que não foram feitas por ele.

A Transposição do Rio São Francisco

A ideia de uma transposição existe desde a época do imperador Dom Pedro II. O projeto nasceu em 1985, mas só saiu do papel em 2007. A obra começou a ser executada nos governos do Partido dos Trabalhadores (PT) e foi continuada por administrações seguintes, sofrendo atrasos ao longo dos anos.

A transposição conecta o Rio São Francisco a bacias hidrográficas menores para levar água a mais de 12 milhões de pessoas em quatro estados do Nordeste: Pernambuco, Ceará, Paraíba e Rio Grande do Norte.

Quem criou o conteúdo investigado pelo Comprova

O conteúdo foi publicado em 15 de setembro por um perfil no X, mas aparece em postagens em outras redes como Facebook, Instagram e Threads. O perfil no X tem mais de 51 mil seguidores e costuma divulgar conteúdos políticos com tom crítico e provocativo a Lula e ao PT. Até o dia 24 de setembro esse post tinha 260 mil visualizações. O Comprova não conseguiu contato com o titular do perfil.

Por que as pessoas podem ter acreditado

A publicação utiliza táticas de persuasão para parecer crível e incentivar o compartilhamento. A principal delas é a atribuição de autoridade, ao colocar a declaração na boca de uma figura pública conhecida e com relevância política, como Paulo Guedes. Isso faz com que a mensagem tenha um peso maior, especialmente para aqueles que já têm uma visão política alinhada à do ex-ministro.

A publicação passa a ideia de que a população foi propositalmente enganada e que uma conspiração estaria por trás da falta de água no Nordeste, história que gera engajamento. A postagem apela a uma reação emocional e pretende ativar uma desconfiança pré-existente, o que a torna mais convincente.

Fontes que consultamos: Reportagens publicadas no UOL, verificações do Comprova e o portal do MDR (Ministério do Desenvolvimento Regional).

Por que o Comprova investigou essa publicação: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas, saúde, mudanças climáticas, eleições e golpes virtuais e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: O Comprova já publicou diversas verificações e conteúdos explicativos sobre a Transposição do São Francisco, entre eles: Post engana ao afirmar que a Operação Carro-Pipa foi abandonada pelo governo federal, Trecho da Transposição no Ceará está seco por falta de demanda e não foi abandonado como afirmam postagens, Polarização intensifica desinformação sobre a transposição do Rio São Francisco | Como verificamos, Entenda a transposição do São Francisco e por que ela gera dúvidas e É falso que Lula tenha inaugurado obra da transposição do São Francisco já inaugurada por Bolsonaro.

Notas da comunidade: A publicação no X não exibia Notas da comunidade até a publicação desta verificação.

Comprova Explica

Investigado por: 23/09/2025

Adultos que moram com os pais não serão notificados pela Receita Federal

Comprova Explica
Posts desinformam ao dizer que filhos poderão cair na malha fina por não declarar imóvel em que vivem.

Conteúdo analisado: Posts dizendo que “adultos que moram com os pais serão notificados pela Receita Federal em 2026”.

Comprova Explica: A instituição do Cadastro Imobiliário Brasileiro (CIB), também chamado de “CPF dos Imóveis”, previsto pela Reforma Tributária, tem sido alvo de discussão nas redes sociais. Algumas publicações afirmam que a Receita Federal passará a notificar, a partir de 2026, adultos que moram com os pais ou em imóveis sem contrato formal de aluguel, uma vez que seria possível cruzar as informações e identificar quem não declarou a despesa. Porém, o órgão já negou que isso vá ocorrer.

O CIB faz parte do Sistema Nacional de Gestão de Informações Territoriais (Sinter) e prevê agregar informações cadastrais de imóveis rurais e urbanos, públicos ou privados, inscritos nos respectivos cadastros de origem, como o Cadastro Nacional de Imóveis Rurais (CNIR), administrado pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra).

Segundo a Receita Federal, o objetivo é criar um cadastro com um código identificador único, válido em todo o território nacional, como se fosse um CPF para cada unidade imobiliária, com georreferenciamento, visando a obter maior transparência e consistência na fiscalização.

Consultado pelo Comprova, o advogado tributarista Edwar Barbosa Felix afirmou que a cobrança de imposto de renda sobre aluguéis sempre existiu. Desta forma, se há locação e recebimento de aluguel, há a obrigação legal de declarar o recebimento e recolher o tributo, tanto na legislação atual como a partir da Reforma Tributária.

“No caso de pais e filhos, que tenham contrato de locação entre si, portanto, nada muda, pois sempre foi devido imposto de renda”, observou.

no caso dos adultos que moram na casa dos pais sem pagar, não haverá a cobrança de imposto de renda. Sendo assim, a cessão de um imóvel gratuitamente para um amigo, parente ou similar não se constitui em uma prática ilegal, existindo ferramentas jurídicas para que o ocupante do imóvel e o proprietário fiquem protegidos. “A razão é simples: não há locação e não há recebimento de aluguel”, salientou.

O tributarista destacou que a evolução tecnológica tem permitido à Receita Federal identificar diversas situações em que se omitia o recebimento de aluguel, tornando eventuais fraudes cada vez mais difíceis de serem escondidas. Com o novo sistema será possível detectar inconsistências e omissões em rendimentos de aluguel, titularidade ou transações imobiliárias.

Algumas publicações também alegaram que esse novo sistema da Receita Federal poderia levar ao aumento no valor do IPTU, uma vez que a proposta é haver um único valor venal (preço estimado pelo poder público para uma transação à vista) para cada imóvel e, como as prefeituras não costumavam atualizar o valor venal regularmente, o imposto era cobrado sobre uma base de cálculo defasada.

Como o Comprova mostrou, a tendência é que com a fiscalização automática do Sinter, o valor venal passará a refletir o preço real de mercado. O resultado é que, embora a alíquota não mude, a base de cálculo poderá ser maior e, nesse caso, levar a um aumento no valor final do IPTU a ser pago.

Sobre isso, o tributarista enfatizou que a reforma tributária sancionada em janeiro de 2025 destinou aos chefes dos Executivos municipais a faculdade de atualizar a base de cálculo dos valores dos imóveis por meio de seu valor real e não mais venal, o que pode gerar aumento ou redução tributária, a depender da valorização ou desvalorização imobiliária.

Em nota divulgada no início de setembro, o Ministério da Fazenda afirmou que “não procedem informações que têm circulado sobre um suposto aumento da tributação de locações e vendas de imóveis com a Reforma Tributária”.

O vídeo analisado exibe um print do site “Diário do Comércio Mix”, de uma matéria com o título “Adultos que moram com os pais serão notificados pela Receita Federal em 2026”, publicada em 20 de setembro. A matéria, no entanto, não está mais disponível no portal. Já em 22 de setembro, o site publicou um outro texto sobre o tema, com o título “É fake que adultos que moram na casa dos pais serão notificados pela Receita Federal em 2026”.

Fontes consultadas: Ministério da Fazenda, Receita Federal e o advogado tributarista Edwar Barbosa Felix.

Por que o Comprova explicou este assunto: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas, saúde, mudanças climáticas e eleições. Quando detecta nesse monitoramento um tema que está gerando muitas dúvidas e desinformação, o Comprova Explica. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Para se aprofundar mais: As mudanças no mercado imobiliário provocadas pela Reforma Tributária se tornaram alvo de desinformação nas redes sociais. O Comprova já explicou o que muda, por exemplo, na cobrança do aluguel e também já mostrou que a nova legislação não prevê taxa de 25% em compra e venda de imóveis, diferentemente do que afirmava post.

Comprova Explica

Investigado por: 22/09/2025

PEC sobre fundo de reparação racial não acaba com a categoria parda

Comprova Explica
A proposta, criticada por aliados de Bolsonaro e movimentos sociais e tratada nas redes como "PEC do Fim dos Pardos", destina R$ 20 bilhões para projetos voltados à população negra, que, para o Estatuto da Igualdade Racial, inclui pessoas pretas e pardas.

Conteúdo analisado: Publicações nas redes sociais sobre a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 27/2024, que prevê a criação de um fundo nacional para promover a igualdade racial.

Comprova Explica: A PEC 27/2024, de autoria do deputado federal Damião Feliciano (União-PB), tem sido alvo de discussões nas redes sociais. O texto prevê instituir o Fundo Nacional de Reparação Econômica e de Promoção da Igualdade Racial, estimado em R$ 20 bilhões. Mas, ao tratar pretos e pardos como “população negra brasileira”, gerou críticas do Movimento Pardo Mestiço Brasileiro e levou o deputado federal Hélio Lopes (PL-RJ) a apresentar um requerimento de audiência pública à Câmara, tratando o projeto como “PEC do Fim dos Pardos”.

A estrutura da PEC segue as diretrizes do Estatuto da Igualdade Racial (Lei Nº 12.288), aprovado pelo Congresso em 2010, durante o segundo mandato de Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O texto definiu a população negra no país como o conjunto de pessoas que se autodeclaram pretas e pardas.

Nem todos os pardos concordaram com a definição do estatuto na época e, agora, reacendem o debate criticando o texto do fundo, que usa o mesmo termo da lei para se referir a pretos e pardos. Em meio às críticas, há alegações de que a proposta poderia levar ao fim a categoria parda nos censos do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o que foi negado pelo órgão.

Em resposta ao Comprova, a instituição declarou que a proposta não discute classificações e que até onde sabe, não existe uma classificação oficial entre negros, pretos e pardos, uma vez que nas pesquisas domiciliares feitas pela instituição, os próprios entrevistados informam se pertencem ou não a um dos cinco grupos de cor ou raça listados no questionário: preto, pardo, amarelo, indígena ou branco.

“Trata-se de uma classificação para fins estatísticos apenas. Eventualmente, outras instituições utilizam essa classificação, ou parte dela, como referência”, apontou.

Parte das críticas à PEC foi levantada pelo Movimento Pardo Mestiço Brasileiro, fundado por Leão Alves, em Manaus, no início dos anos 2000. O grupo é contrário a unir pretos e pardos em uma mesma categoria, a dos negros, por entender que pessoas pardas nem sempre se entendem como negras, mas ainda assim, podem sofrer dificuldades ao longo da vida por não serem brancas.

Uma pesquisa realizada pelo Datafolha em 2024 mostrou que 6 em cada 10 pardos não se consideram negros por diversas razões, como o fato de fazerem parte de famílias multirraciais, não se identificarem com a identidade política negra e não sofrerem o mesmo nível de discriminação que pessoas pretas.

O Movimento Pardo Mestiço Brasileiro ganhou espaço na política com a chegada de Jair Bolsonaro (PL) à presidência. No início de 2022, o grupo conseguiu uma vaga no Conselho Nacional de Promoção da Igualdade Racial, após ter a candidatura aprovada pela então ministra dos Direitos Humanos, Damares Alves, como mostrou a BBC Brasil em setembro daquele ano.

Em entrevista dada ao veículo, Leão Alves disse que se considera pardo e não negro, justificando que pardo seria qualquer um que tenha mistura racial, não necessariamente com pessoas de pele preta, podendo ser, inclusive, alguém de pele bem clara. Isso porque em Manaus, onde ele nasceu, há o maior percentual de pessoas pardas do país, uma vez que a escravidão mais presente na região foi a dos indígenas e não a africana, conforme assinalado na reportagem.

Durante as eleições de 2022, o movimento declarou apoio à reeleição de Bolsonaro e, após a posse de Lula em 2023, deixou de participar do conselho. Agora, essa proximidade com setores da direita reaparece com a entrada de Hélio Lopes, aliado do ex-presidente, que reforça o argumento de que a proposta “absorve compulsoriamente a população parda”.

O parlamentar alega que a medida pode acarretar apagamento estatístico, político e cultural da identidade parda, com reflexos diretos em políticas públicas, levantamentos censitários e no exercício da autodeclaração étnico-racial, algo que já foi negado pelo IBGE.

Na mesma linha, surgiram publicações nas redes sociais alegando que a PEC “aniquilaria” a população mestiça e que não garantiria a ela direito a indenizações e acesso ao fundo e a cotas raciais. O temor levantado é de que hoje o país conta com 45,3% de pardos e 10,2% de pessoas pretas, segundo o Censo de 2022, e que no momento em que o fundo considera todos como negros, a população parda seria excluída de programas sociais.

Procurado pelo Comprova, o deputado federal Orlando Silva (PCdoB-SP), titular da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania, que aprovou a proposta, discorda do apelido de “PEC do Fim dos Pardos” e afirma que os questionamentos sobre uma alteração na classificação de raças do Brasil “não fazem nenhum sentido”.

“O IBGE estabeleceu como conceitos demográficos: branco, pardo, preto e amarelo. Negro, como conceito sociológico, é a soma de pretos e pardos. Pardo é o que historicamente chamamos de população miscigenada. Falar de PEC do Fim dos Pardos é mera narrativa”, afirma.

“Inclusive, pretos e pardos como expressão dos negros, já está na nossa Constituição que prevê, no mínimo, 30% dos recursos do fundo eleitoral para financiar candidaturas negras, de pretos e pardos, e a lei eleitoral também fala de candidaturas negras, de pretos e pardos, cujos votos contam dobrado para efeito de formação de fundo eleitoral”, disse.

A doutora em sociologia e pesquisadora Nina Fola, por sua vez, argumenta que as discussões sobre reparação racial no Brasil são marcadas pela tensão e que o país sempre negou esse histórico, com o objetivo de manter os privilégios das pessoas brancas. Ela classificou o apelido de “PEC do Fim dos Pardos” como ardiloso contra discussões que o movimento social negro tem pautado.

“Hoje em dia, essa discussão da parditude, que é uma discussão que com certeza é necessária, foi levantada principalmente pelas pessoas indígenas, também pautada pelo movimento social, mas entendo que esse argumento é ardiloso, violento e tenta fragilizar a opinião pública sobre isso, que é a reparação financeira pela historicidade da presença negra na Constituição”, afirmou.

O Comprova tentou contato com o criador da PEC, mas não obteve retorno até a publicação do texto.

De onde viriam os recursos para o fundo

O fundo tem por finalidade promover a “igualdade de oportunidades e a inclusão da população negra brasileira”, conforme o texto aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ).

A expectativa é que os recursos sejam obtidos a partir de indenizações de empresas que comprovadamente lucraram com a escravidão da população negra brasileira; doações internacionais; dotações orçamentárias da União; e outras fontes previstas em lei. Eles deverão financiar projetos voltados à promoção cultural, social e econômica da população negra brasileira.

A proposta estabelece que a União deve destinar, no mínimo, R$ 20 bilhões ao fundo, com um vigésimo desse valor sendo aportado a cada ano. Além disso, essas despesas não estariam sujeitas aos limites orçamentários estabelecidos por outras leis. A PEC também prevê a criação de um Conselho Consultivo e de Acompanhamento para o fundo, com representantes do poder público e da sociedade civil.

Fontes consultadas: Textos da PEC 27/2024 e do requerimento 118/2025, Estatuto da Igualdade Racial, reportagens sobre o assunto, além da doutora em sociologia e pesquisadora Nina Fola e do deputado federal Orlando Silva (PCdoB-SP).

Por que o Comprova explicou este assunto: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas, saúde, mudanças climáticas e eleições. Quando detecta nesse monitoramento um tema que está gerando muitas dúvidas e desinformação, o Comprova Explica. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Para se aprofundar mais: O Comprova já produziu outros conteúdos relacionados a discussões raciais, como a que explicou que o livro “O Avesso da Pele” foi aprovado no governo Bolsonaro e escolhido por uma escola para ser trabalhado por estudantes do ensino médio, e a verificação que mostrou que Lula se encontrou com liderança religiosa da Nigéria em evento de igualdade racial, não com ‘feiticeiro’.

Saúde

Investigado por: 22/09/2025

Teoria de ‘turbocâncer’ é desinformação e não tem base científica

Saúde
Especialistas e órgãos de saúde afirmam que a expressão não é reconhecida pela medicina e que não há evidências que associem o câncer às vacinas contra a covid-19.

Post no X desinforma ao dizer que estaria ocorrendo uma “pandemia global de turbo câncer (sic) em jovens”. A publicação usa trecho do programa “The Charlie Kirk Show” de 3 de junho, em que o influenciador Charlie Kirk, assassinado em 10 de setembro, conversa com o médico e empresário Patrick Soon-Shiong. Nele, Soon-Shiong diz estar vendo pela primeira vez “criança de dez anos com câncer de cólon”, “um adolescente de 13 anos com câncer pancreático metastático” e casos de câncer de ovário em “jovens de 20, 21 anos”, e chama isso de “turbocâncer”. O médico associa o problema, entre outros pontos, à covid-19 e às vacinas de prevenção da doença.

O termo utilizado por ele surgiu na pandemia e é uma teoria da conspiração que associa o surgimento de casos de câncer às vacinas contra a covid-19, principalmente as de mRNA, como as da Pfizer e da Moderna. Como verificado pelo Comprova, a expressão “turbocâncer” não é reconhecida pela comunidade científica e médica. “Trata-se de uma expressão sensacionalista, sem base em evidências”, diz João Viola, coordenador de Pesquisa e Inovação do Instituto Nacional de Câncer (INCA).

Em abril do ano passado, o Ministério da Saúde publicou um texto dizendo se tratar de desinformação. Após chamar o “turbocâncer” de “teoria enganosa”, o órgão negou a relação entre imunizantes e câncer. “É importante esclarecer que não há qualquer evidência que sugira que a imunização possa causar câncer, levar à recorrência da doença ou, ainda, acelerar a progressão”, disse o ministério.

O mesmo dizem João Viola e Carlos Gil Ferreira, diretor médico da Oncoclínicas&Co, grupo dedicado ao tratamento do câncer na América Latina, e presidente do Instituto Oncoclínicas. “Não há nenhum registro médico ou estudo científico publicado que comprove aumentos significativos inesperados de câncer em adolescentes após a aplicação da vacina contra a covid-19”, afirmou Ferreira ao Comprova.

“Os estudos e a vigilância pós-vacinação realizados pelas principais autoridades de saúde, como a Organização Mundial da Saúde (OMS) e a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), indicam que as vacinas são seguras e eficazes”, disse Viola.

Como ele explica, “o câncer é uma doença complexa e multifatorial, e suas causas são variadas, envolvendo fatores genéticos, ambientais e biológicos”, sem ligação com imunizantes.

Em dezembro do ano passado, em um comunicado dizendo que a “desinformação pode matar”, o Ministério da Saúde voltou ao tema. “Nenhum imunizante aprovado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e ofertado à população contém substâncias tóxicas que causam câncer, eles não provocam mutações em células e não geram tumores cancerígenos”, afirmou o órgão.

Segundo a OMS, “autoridades regulatórias monitoram continuamente o uso das vacinas”, “reações graves (a elas) são extremamente raras” e, a partir de dados, conclui-se que elas “permanecem seguras em todo o mundo”.

Sobre a afirmação de Soon-Shiong de que os casos de câncer entre jovens seriam novidade, Ferreira diz: “Casos raros de câncer em crianças e adolescentes, incluindo o câncer de pâncreas, são, infelizmente, conhecidos pela medicina, mas não há dados que sugiram que estejam em ascensão de forma extraordinária ou relacionados à vacinação contra a covid-19”.

Citado por Soon-Shion, o câncer de pâncreas metastático em crianças, segundo Ferreira, “é extremamente raro, mas isso não implica que seja algo sem precedentes.”

Procurada pelo Comprova, a Pfizer, que produz vacina de mRNA, disse monitorar a imunização e que “dados de estudos de mundo real complementam as informações dos estudos clínicos e proporcionam evidência adicional de que a vacina fornece proteção eficaz contra formas graves da covid-19”. Também afirmou que “a vacina não tem nenhuma relação com doenças oncológicas (câncer), tampouco existem evidências científicas para tal associação”.

A reportagem também tentou contato com a Moderna, outra fabricante deste tipo de imunizante, mas não houve resposta até a publicação deste texto.

Quem criou o conteúdo investigado pelo Comprova

O autor da página, que tem 56,8 mil seguidores no X, afirma em sua descrição: “Neste perfil, você não ouvirá apenas o que deseja, mas sim a verdade. É hora de acordar, ou você pode acabar sendo devorado pelos lobos”.

Entre os posts publicados, há conteúdos a favor do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e do presidente norte-americano Donald Trump e também antivacina. Até 22 de setembro, a publicação verificada aqui tinha sido visualizada mais de 155,8 mil vezes.

O Comprova tentou contato com o autor, mas não houve resposta até a publicação deste texto.

Por que as pessoas podem ter acreditado

O movimento antivacina ganhou força na pandemia e pessoas que o seguem têm mais facilidade para acreditar em posts como este. Já quem não acredita pode mudar de ideia com posts como o verificado aqui porque o autor da publicação usa as declarações de um médico, o que passa a ideia de credibilidade.

Na legenda do post, ele afirma que Soon-Shiong fez um alerta e, no fim, usa o emoji de “atenção” seguido da frase: “Quando médicos veteranos dizem que nunca viram nada parecido, é sinal de que não estamos diante de coincidências — mas de consequências”. As escolhas não são à toa. Desinformadores sabem que, quando conseguem gerar preocupação, apelando à emoção, a chance de quem os lê se interessar pelo assunto e ficar no post, sem refletir se aquilo faz sentido ou não, é maior. No caso deste trecho, o post sugere uma ameaça iminente e grave sem apresentar evidências que comprovem a relação de causa e efeito.

Outro trecho em que o autor apela à emoção é quando escreve que “o mundo estaria diante de uma pandemia global de ‘turbocâncer’ em jovens”. Além disso, quando o assunto é saúde infantil, o post já gera naturalmente uma preocupação natural das pessoas.

O fato de o autor usar trecho do programa de Kirk também faz as pessoas se interessarem. Mesmo quem não conhecia o influenciador passou a saber quem ele foi após seu assassinato, amplamente divulgado.

Fontes que consultamos: Ministério da Saúde, João Viola, do INCA, Carlos Gil Ferreira, da Oncoclínicas&Co, OMS, Pfizer e reportagens sobre o tema.

Por que o Comprova investigou essa publicação: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas, saúde, mudanças climáticas, eleições e golpes virtuais e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: Desde o primeiro ano da pandemia, o Comprova já publica verificações mostrando que as vacinas de covid-19 não têm relação com casos de câncer. Em outubro daquele ano, mostrou não ser verdade que os imunizantes causem câncer, danos genéticos ou “homossexualismo”. Entre as diversas checagens sobre o tema, publicou também que as vacinas não causam câncer nem têm relação comprovada com herpes-zóster e que não carregam “fungos do câncer”. Diante de tantas mentiras, o Comprova publicou mais recentemente como a desinformação sobre vacinas distorce dados e compromete a confiança pública.

Notas da comunidade: A publicação analisada não tinha notas da comunidade até a conclusão desta verificação.

Política

Investigado por: 19/09/2025

Vídeo em que Ivete Sangalo elogia Lula foi criado com inteligência artificial

Política
Houve manipulação de uma entrevista dada pela artista ao “Sem Censura”, da TV Brasil.

A cantora Ivete Sangalo não afirmou que Luiz Inácio Lula da Silva (PT) foi o único presidente que teve coragem de “peitar o império” e de “mandar um recado duro para quem sempre humilhou o Brasil”, diferentemente do que mostra vídeo no YouTube. A publicação foi feita no contexto da crise diplomática entre o governo brasileiro e os Estados Unidos devido à taxação de 50% anunciada por Donald Trump.

O vídeo mostra a cantora em um programa de auditório concedendo uma entrevista e supostamente destacando avanços na economia brasileira promovidos ao longo dos três mandatos de Lula e criticando a decisão do governo norte-americano de taxar produtos brasileiros e quem apoiou a medida.

Para checar se a cantora realmente teria feito tais declarações, o Comprova localizou a gravação da entrevista e constatou que se trata do programa “Sem Censura”, da TV Brasil, disponibilizado no YouTube. A transmissão ocorreu em 20 de janeiro de 2025, com apresentação da jornalista Cissa Guimarães e participações do cantor Márcio Victor, da banda Psirico, e da atriz Maíra Azevedo.

Nas mais de duas horas de entrevista, Ivete aborda temas como a sua trajetória profissional, vida pessoal, relação com o Carnaval, características da Bahia e empoderamento feminino, sem nenhuma menção a assuntos de política ou a Lula.

No vídeo original, a qualidade da imagem é mantida e é possível fazer uma leitura labial clara do que Ivete diz, o que não ocorre no vídeo editado em que a cantora teria supostamente defendido Lula. Além da voz robotizada, os lábios dela ficam borrados quando as falas são ditas, um indicativo de que houve uso de inteligência artificial para manipular a gravação e inserir mensagens que ela não disse.

A partir da gesticulação das mãos da Ivete, é possível determinar que o trecho do vídeo adulterado foi retirado dos 25 minutos e 50 segundos do vídeo original, em que ela fala: “Meu amor, essa mulher cozinha muito. Você acha que eu vou pegar o meu dinheiro que eu tô ganhando com minhas metas para comprar essas comidas mal feitas aqui?”, referindo-se a uma frase que disse a uma conhecida sobre uma quentinha feita pela sua mãe, na época em que trabalhava em um shopping.

Além disso, as mesmas imagens que aparecem neste trecho são repetidas no fim do vídeo adulterado, entre os 43 e os 47 segundos, mostrando Ivete fazendo os mesmos gestos. A tática, de repetir trechos de vídeos, é muito usada por desinformadores.

Mesmo já tendo concluído se tratar de um vídeo com áudio adulterado, o Comprova usou a ferramenta Hiya, que detectou uma probabilidade de 98% de que o áudio do vídeo tenha sido gerado por inteligência artificial. Outra análise, feita no programa Audacity, atestou que o áudio possui momentos de silêncio absoluto, sem barulhos de ruídos do ambiente, mais um sinal de que o som foi manipulado digitalmente.

Procurada pelo Comprova, a assessoria de imprensa da Ivete Sangalo informou que o vídeo “é uma mentira” e o áudio “é falso”.

Quem criou o conteúdo investigado pelo Comprova

O vídeo foi publicado em 30 de agosto por um perfil que faz vídeos de apoio a Lula, que conta com mais de 199 mil inscritos. Até o dia 19 de setembro, a postagem tinha quase 1,9 milhão de visualizações e cerca de 5,7 mil comentários. Em contato com o Comprova, o dono do perfil afirmou que o clipe está “em vários lugares das redes sociais”, como o TikTok e Instagram.

Por que as pessoas podem ter acreditado

O post usa as imagens de uma entrevista verdadeira concedida por Ivete e um áudio com voz semelhante à da cantora, com fortes declarações favoráveis ao atual presidente.

Além disso, como o material foi alterado digitalmente, é necessário que quem assistiu tenha algumas noções de como imagens podem ser adulteradas com inteligência artificial para suspeitar que o conteúdo não seja verídico, o que nem sempre ocorre.

Desta forma, é importante ficar atento a possíveis sinais de adulteração, uma vez que é comum que imagens de figuras públicas sejam manipuladas dessa forma.

Fontes que consultamos: O vídeo original da entrevista no YouTube, as ferramentas Hiya e Audacity, a assessoria de imprensa da artista e outras verificações sobre o assunto.

Por que o Comprova investigou essa publicação: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas, saúde, mudanças climáticas, eleições e golpes virtuais e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: UOL Confere, Estadão Verifica e AFP Checamos também analisaram o vídeo e constataram que houve adulteração nas imagens. O Comprova, por sua vez, já fez outras checagens relacionadas à taxação, e mostrou que o Pix era alvo de investigação comercial dos EUA, mas não podia ser taxado por Trump e que não havia indícios de que o presidente norte-americano tinha tarifado o Brasil por compra de diesel russo.

Comprova Explica

Investigado por: 16/09/2025

Mudanças no aluguel com a Reforma Tributária: O que proprietários e locatários precisam saber

Comprova Explica
O IBS e o CBS, novos impostos que vão substituir os existentes, vão promover alterações para proprietários e locatários a partir de 2026

Conteúdo analisado: Posts a respeito das mudanças na cobrança de impostos sobre o aluguel que entram em vigor em 2026.

Comprova Explica: A reforma tributária trará novidades significativas para o setor de aluguel. O principal ponto da Lei Complementar nº 214/2025 é a introdução de dois novos impostos: o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), que incidirão sobre os rendimentos de aluguel. Com a novidade, posts nas redes sociais têm trazido informações desconexas sobre o assunto e, com isso, a seção Comprova Explica traz detalhes sobre o que deve mudar.

Para o proprietário

Atualmente, pessoas físicas que recebem aluguel pagam Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF), com alíquotas entre 15% e 27,5%, conforme a tabela progressiva do Imposto de Renda. Pessoas jurídicas arcam com IRPJ, CSLL, PIS e COFINS, com uma carga tributária efetiva em torno de 15%, dependendo do regime tributário.

Com a reforma, pessoas físicas continuarão pagando o IRPF. “Não haverá incidência dos novos tributos quando a locação for realizada por pessoa física que não exerça atividade imobiliária, tal como já ocorre hoje”, afirma o Ministério da Fazenda.

O IBS e a CBS serão cobrados apenas de quem possuir mais de três imóveis alugados e tiver uma receita anual superior a R$ 240 mil (R$ 20 mil mensais) com aluguéis. As estimativas, segundo o Ministério da Fazenda, apontam que a carga tributária combinada do IBS e da CBS sobre os aluguéis pode variar entre 25% e 27%, mas há redutores previstos. Existe um desconto de 70% na base de cálculo, o que reduz a alíquota efetiva.

Para locações residenciais, haverá um abatimento mensal adicional de R$ 600 no valor do aluguel que servirá para calcular o imposto. Por exemplo, se um contrato de aluguel for de R$ 2,6 mil, o imposto será calculado sobre R$ 2 mil.

Para pessoas jurídicas

O PIS e o Cofins, que hoje incidem sobre a receita de aluguéis de pessoas jurídicas (com alíquotas de 3,65% ou 9,25%, dependendo do regime), serão substituídos pelo IBS e pela CBS. A alíquota nominal do IBS e da CBS está estimada em torno de 25% a 27%. No entanto, a lei prevê uma redução de 70% na base de cálculo, o que diminui a alíquota efetiva para cerca de 8% a 10%.

Portanto, espera-se que a carga tributária sobre a receita bruta do aluguel aumente em relação aos tributos atuais para as empresas que pagam PIS/Cofins.

Para o locatário

Embora IBS e CBS incidam diretamente sobre a receita do proprietário, é provável que o aumento da carga tributária seja repassado ao locatário, já que, pelo novo sistema, o imposto poderá ser acrescido ao valor do aluguel.

“O imposto será cobrado de forma que o locatário saiba quanto pagará exatamente”, diz Moira Toledo, vice-presidente de Administração Imobiliária e Condomínios do Secovi-SP (Sindicato das Empresas de Compra, Venda, Locação e Administração de Imóveis Residenciais e Comerciais de São Paulo).

Quando as mudanças entram em vigor?

As novas regras tributárias começarão a ser implementadas gradualmente a partir de 2026, com um processo de majoração das alíquotas até que o novo regime esteja totalmente consolidado em 2033.

É fundamental que proprietários e locatários mantenham-se informados sobre as atualizações legislativas para se preparar financeiramente para as mudanças.

Fontes consultadas: O advogado tributarista Bruno Tadeu Radtke Gonçalves, Moira Toledo, do Secovi-SP, Rodrigo Antonio Dias, membro do Conselho Jurídico do Secovi-SP, Ministério da Fazenda, Secretaria Municipal da Fazenda de São Paulo e reportagens sobre o assunto.

Por que o Comprova explicou este assunto: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas, saúde, mudanças climáticas e eleições. Quando detecta nesse monitoramento um tema que está gerando muitas dúvidas e desinformação, o Comprova Explica. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Para se aprofundar mais: Sobre a Reforma Tributária, o Comprova já publicou recentemente detalhes sobre como a modernização de cadastros pode reajustar seu IPTU e que o texto dela mantém a livre negociação de preços de imóveis.

Política

Investigado por: 12/09/2025

Governo não criou benefício exclusivo para dependentes de álcool

Política
Segundo o INSS e ministérios, o alcoolismo só pode ser considerado em análises individuais de benefícios já existentes, como o BPC e o auxílio-doença. Não existe "Bolsa Alcoólatra".

Ao contrário do que afirma uma postagem nas redes sociais, o governo federal não criou um benefício chamado “Bolsa alcoólatra”. Não existe no Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) ou em qualquer política pública vigente um programa que pague, automática ou especificamente, um salário mínimo a pessoas com dependência de álcool. A publicação investigada foi feita em 8 de setembro no X . O post usa emojis e uma montagem com a logomarca do INSS e a foto de um homem bebendo para afirmar que o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) teria lançado o benefício.

Consultados pelo Comprova, a Secretaria de Comunicação Social da Presidência (Secom), o Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social (MDS) e o Ministério da Previdência Social (MPS) negaram a existência de um novo programa. Os órgãos esclareceram que pessoas com alcoolismo podem, em alguns casos, ter acesso a benefícios já previstos em lei — como o auxílio por incapacidade temporária, a aposentadoria por incapacidade permanente (ambos incluídos na Lei nº 8.213/1993) e o Benefício de Prestação Continuada (BPC). Este último, garantido pela Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS – Lei nº 8.742/1993), paga um salário mínimo a idosos com 65 anos ou mais e a pessoas com deficiência em situação de vulnerabilidade social, desde que cumpram os requisitos de renda e sejam aprovadas em perícia médica e social.

O BPC não prevê o alcoolismo como critério automático para a concessão, mas já houve decisões judiciais isoladas em que a dependência severa de álcool foi reconhecida como deficiência, permitindo o acesso ao benefício. Esses casos, no entanto, dependem da análise individual da Justiça e exigem provas, sejam testemunhais ou periciais, conforme previsto nas regras do programa. Não se trata, portanto, de uma política pública específica voltada a dependentes de álcool.

O MDS explicou ainda que mantém o Programa de Cuidado e Acolhimento de Usuários e Dependentes de Álcool e Outras Drogas, regulamentado pela Portaria nº 3.588/2017, que financia vagas em comunidades terapêuticas para tratamento e reinserção social. Esse programa, porém, não prevê repasse direto de renda aos acolhidos.

Assim, a alegação de que o governo Lula teria criado uma “Bolsa alcoólatra” distorce informações sobre o BPC e outros benefícios já existentes, apresentando-os como se fossem um programa novo. O que há, de fato, são mecanismos previdenciários e assistenciais que podem ser aplicados em casos específicos de incapacidade causada pelo alcoolismo, mas que não equivalem à criação de uma bolsa exclusiva para dependentes, como diz a publicação investigada.

Quem criou o conteúdo investigado pelo Comprova

O conteúdo foi publicado por um perfil no X que tem mais de 57 mil seguidores e costuma divulgar conteúdos políticos em tom crítico e provocativo. Até 11 de setembro, a postagem havia alcançado cerca de 1,5 milhão de visualizações, com 956 compartilhamentos.

Questionado pelo Comprova, o perfil alegou que a informação havia sido retirada de uma suposta matéria publicada em julho – o texto usado como fonte também contém desinformação. O interesse aparente é gerar engajamento e repercussão política ao associar o governo federal e o INSS a um programa inexistente, explorando uma narrativa polêmica para ampliar alcance.

Por que as pessoas podem ter acreditado

A publicação apresenta a informação de forma simples e direta e sensacionalista, sem contexto. O uso da frase Novo benefício do INSS garante salário mínimo de R$ 1.518 para pessoas que tiveram a capacidade de trabalho afetada pelo ALCOOLISMO” passa a ideia de novidade e oficialidade, reforçada pela presença da logomarca do INSS e pela imagem de um homem bebendo, o que cria uma associação visual manipuladora que confere credibilidade ao enunciado. Esse enquadramento explora o viés de confirmação de parte do público, que já tem desconfiança em relação aos programas sociais e está predisposto a acreditar que o governo estaria “premiando” dependentes em vez de valorizar quem trabalha.

Além disso, a publicação utiliza conteúdo enganoso e falsa conexão a um suposto benefício do INSS. O uso de emojis e a expressão “Bolsa alcoólatra” reforçam ainda o apelo emocional e a ironia, tornando a mensagem mais impactante e convincente para quem consome conteúdo em redes sociais de forma rápida e sem verificação.

Fontes que consultamos: Secretaria de Comunicação Social da Presidência, Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social (MDS), Ministério da Previdência Social, pesquisa em veículos jornalísticos, legislação vigente (Lei nº 8.213/1991, Lei nº 8.742/1993 e Portaria nº 3.588/2017), decisões judiciais do TRF-4.

Por que o Comprova investigou essa publicação: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas, saúde, mudanças climáticas, eleições e golpes virtuais e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: É comum que postagens nas redes sociais usem o INSS como alvo de desinformação. O Comprova já verificou em outras ocasiões conteúdos que exploravam a entidade com alegações infundadas. Em maio de 2025, mostramos que Lula não derrubou a lei de combate a fraudes no INSS — a norma de 2019 continua em vigor e as alterações que flexibilizaram parte de suas regras foram sancionadas ainda no governo Bolsonaro, em 2022. Também verificamos boatos de que o governo teria confirmado uma lista de 800 mil idosos que perderiam benefícios, o que não corresponde à realidade.

Notas da comunidade: Na publicação verificada, o X exibiu uma nota de contexto adicionada por usuários da plataforma. A nota informa que não há nenhum novo benefício no INSS, esclarece que o BPC existe desde 1993 e o auxílio-doença desde 1991, ambos pagos apenas em situações de incapacidade. Explica ainda que, no caso do alcoolismo, apenas quando há alterações mentais a condição pode ser reconhecida como incapacitante. A nota também traz links para legislações e páginas oficiais do governo (Planalto, INSS e Previdência), oferecendo ao público informações verificáveis e contextualizadas.

Contextualizando

Investigado por: 11/09/2025

Constituição brasileira não permite construção de bomba nuclear

Contextualizando
Vídeo descontextualiza fala de ministro de Minas e Energia sobre defesa e soberania nacional.

Conteúdo analisado: Vídeo descontextualiza declaração do ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, sobre a necessidade de o Brasil investir mais em energia nuclear para fins de defesa e soberania nacional, para alegar que o país pretende construir uma arma nuclear.

Onde foi publicado: YouTube.

Contextualizando: Uma declaração do ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, feita no dia 5 de setembro sobre o uso de energia nuclear para fins de defesa da soberania nacional gerou especulação nas redes sociais na última semana. Em cerimônia de posse de novos diretores da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), no Rio de Janeiro, Silveira afirmou que o Brasil precisa investir mais em energia nuclear.

“Um país que é gigante pela própria natureza, que tem 11% da água doce do planeta, clima tropical, solo fértil e tantas riquezas minerais, precisa levar muito a sério a questão nuclear. No futuro, nós vamos precisar dessa tecnologia também para a defesa nacional”, afirmou.

Logo, a declaração virou mote para um vídeo no YouTube que especula, sem apresentar qualquer prova disso, que o Brasil estaria produzindo em segredo uma arma nuclear para fazer frente aos Estados Unidos sob o comando de Donald Trump. Após a repercussão da fala, o ministro disse em nota que falava do uso da energia nuclear para fins pacíficos, que é como a legislação brasileira permite, hoje, que esse tipo de energia seja utilizada no país.

Atualmente, de acordo com o artigo 21 da Constituição de 1988, toda a atividade nuclear em território nacional só pode ocorrer para fins pacíficos e mediante aprovação do Congresso. A extração e o monopólio do urânio são exclusivos das Indústrias Nucleares do Brasil (INB), uma empresa pública vinculada ao Ministério de Minas e Energia.

O Brasil também é signatário do Tratado sobre a Não Proliferação de Armas Nucleares, assinado em Londres, Moscou e Washington, em 1968, e promulgado em 1998, no Decreto nº 2.864. Através dele, se compromete a não fabricar, ou por outros meios adquirir armas ou outros artefatos explosivos nucleares, e a não procurar ou receber qualquer assistência para fabricação desses itens.

Além disso, o país ainda assinou outros dois acordos: Tratado para a Proscrição das Armas Nucleares na América Latina e no Caribe (Tratado de Tlatelolco-1967); e Tratado para Proibição de Armas Nucleares (2017). Ou seja, seria preciso uma mudança na legislação brasileira, inclusive na Constituição, para permitir que o país construísse uma arma nuclear.

De acordo com a Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN), o Brasil não tem interesse em fazer essa mudança para permitir a eventual construção de uma bomba nuclear. “Não interessa ao Brasil possuir armas nucleares. Esse é um ônus que só expõe o País a questionamentos internacionais e à perda da posição de país pacifista e defensor das soluções diplomáticas”, diz nota enviada ao Comprova.

Como funciona a legislação brasileira para atividade nuclear?

A exploração de energia nuclear no Brasil é exclusividade da União, conforme estipula a Constituição de 1988. O artigo 21 determina que compete exclusivamente à União “explorar os serviços e instalações nucleares de qualquer natureza e exercer monopólio estatal sobre a pesquisa, a lavra, o enriquecimento e reprocessamento, a industrialização e o comércio de minérios nucleares e seus derivados”. Isso significa que nenhuma empresa privada – nacional ou estrangeira – pode explorar esse tipo de atividade no território nacional.

O mesmo artigo define que qualquer atividade nuclear no país só pode ser feita para fins pacíficos e mediante autorização do Congresso Nacional. Caso haja essa permissão, a tecnologia pode ser usada para pesquisa e uso nas áreas agrícolas, industriais e médicas.

Vale ressaltar ainda que, em 1998, durante o governo de Fernando Henrique Cardoso, o Brasil publicou o Decreto nº 2.864, que promulgou o Tratado sobre a Não-Proliferação de Armas Nucleares, assinado em Londres, Moscou e Washington, em 1º de julho de 1968. Cabe à Agência Internacional de Energia Atômica monitorar se os Estados estão honrando seus compromissos legais internacionais previstos no Tratado de Não-Proliferação Nuclear, do qual o Brasil é signatário.

Onde é usada a produção nuclear do Brasil?

Conforme as Indústrias Nucleares do Brasil disseram ao Comprova, a energia nuclear produzida no país “é utilizada para produção de eletricidade, na medicina, no meio ambiente, na engenharia, na produção de radiofármacos, na agricultura, na conservação de alimentos, na esterilização de materiais diversos e na pesquisa”.

No caso da produção de urânio, o monopólio do Brasil é da INB, que atua em nome da União. “Vinculada ao Ministério de Minas e Energia, [a INB] atua na cadeia produtiva do minério – o chamado ‘ciclo do combustível nuclear’ – que inclui a mineração, o beneficiamento, o enriquecimento isotópico de urânio, a fabricação de pó, pastilhas e componentes metálicos, assim como a montagem dos elementos combustíveis que suprem as usinas nucleares brasileiras produtoras de energia elétrica”.

A CNEN diz ainda que o Brasil tem duas usinas nucleares de geração de energia entre as mais eficientes do mundo em função da quantidade de kWh que entregam ao sistema elétrico brasileiro, o que ajuda a reduzir o risco de apagões e de uso de bandeiras tarifárias. “Se tivéssemos de 10 a 12 usinas, além de Angra 1 e 2, esses eventos não ocorreriam mais no país”, explica a comissão.

O portal de dados abertos da CNEN mostra que, até 10 de setembro de 2025, havia 2.183 instalações radioativas autorizadas pela comissão em funcionamento no Brasil. A maior parte corresponde a medidores nucleares fixos, usados na indústria (495 instalações autorizadas), seguida de equipamentos para medicina nuclear (462) e de radioterapia (306).

Fontes consultadas: O Comprova acessou notícias sobre a declaração do ministro, sobre a legislação a respeito do assunto no país e consultou as Indústrias Nucleares do Brasil e a Comissão Nacional de Energia Nuclear. 

Por que o Comprova contextualizou esse assunto: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas, saúde, mudanças climáticas, eleições e golpes virtuais e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

O vídeo foi publicado em 8 de setembro no YouTube por uma conta seguida por 73,3 mil pessoas e até a publicação desta verificação contava com 93 vídeos publicados, somando mais de 6,2 milhões de visualizações. A publicação verificada alcançou 98,1 mil visualizações, 4,9 mil curtidas e 791 comentários. O autor foi procurado, mas não respondeu até a publicação deste texto.

O autor constrói uma narrativa que mistura fatos verdadeiros, como a existência de usinas nucleares no país e cientistas voltados a pesquisar sobre o desenvolvimento do ciclo do urânio, com falas do ministro de Minas e Energia sobre o uso de energia nuclear na defesa, mas sem a devida contextualização.

Para embasar as alegações presentes no vídeo, o narrador cita como fonte os bastidores do Palácio do Planalto e justifica a ausência de declarações públicas e claras sobre o tema como uma estratégia do governo brasileiro para não chamar atenção de outros países, como os Estados Unidos.

Essa estratégia de não contextualizar os assuntos pode levar a quem assiste a entender que há uma evolução da tecnologia no país em curso voltada à construção, por exemplo, de uma arma nuclear. Além disso, há a construção de um discurso que endossa a posição crítica ao governo norte-americano adotada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em meio à crise diplomática entre Brasil e Estados Unidos, devido à taxação sobre produtos brasileiros anunciada por Trump.

Nas descrições dos vídeos, o criador do canal coloca primeiramente a chave Pix, solicitando apoio para continuar produzindo os conteúdos. Só abaixo, é informado que as histórias contadas no canal são obras de ficção, desenvolvidas exclusivamente com propósito de entretenimento. Para ver esse aviso, no entanto, é necessário clicar na opção “mais”.

O autor alega ainda que, qualquer coincidência com nomes, situações ou acontecimentos reais é totalmente acidental e que não há intenção de representar ou associar essas narrativas a pessoas, fatos ou instituições.

No entanto, como não há esse alerta ao longo dos mais de 12 minutos do vídeo e a explicação não aparece de forma visível no início da descrição, muitos espectadores podem acabar acreditando no que é narrado. Isso pode ser comprovado por meio dos comentários, onde há manifestações em concordância ao que foi exibido, sinalizando apoio a Lula e critica a Trump.

Para se aprofundar mais: O Comprova já mostrou que o Brasil não forneceu urânio ao Irã, nem exporta o metal com fins bélicos; e também publicou não ser verdade que o governo federal vendeu a maior reserva de urânio do país à China.

 

Atualização: Esta verificação foi atualizada em 12 de setembro, às 11h14, para incorporar informações recebidas após a publicação de uma primeira versão da Comissão Nacional de Energia Nuclear.

Política

Investigado por: 10/09/2025

Drex foi criado pelo BC, que é independente do governo, e não acaba com a poupança

Política
Posts também desinformam ao dizer que moeda digital acabaria com dinheiro físico

O Drex, versão digital do real brasileiro, não foi criado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), não substituirá o dinheiro em espécie e nem impedirá que os brasileiros mantenham contas de poupança em bancos, ao contrário do que afirmam vídeos publicados no TikTok e no Instagram.

As postagens investigadas alegam que, quando implementado, o Drex eliminará cédulas e moedas, permitirá ao governo monitorar todas as transações, impedirá o acúmulo de recursos e ainda fará o dinheiro “expirar”, restringindo o uso a determinadas localidades, em um modelo comparado a “países socialistas”. Também indicam que entraria em vigor em janeiro de 2026. Nenhuma dessas informações encontra respaldo em documentos oficiais.

Em resposta ao Comprova, o Banco Central afirmou que é o responsável pelo desenvolvimento do Drex e destacou que o projeto é conduzido pela autarquia, sem envolvimento da Presidência; não terá impacto sobre a manutenção de poupança; e segue em fase de testes. Em fevereiro de 2025, o BC publicou o Relatório da 1ª fase do Piloto Drex, abordando arquitetura, privacidade e segurança.

Verificado pelo Comprova, o documento não menciona qualquer plano de substituir o dinheiro físico, impedir poupança ou restringir o uso da moeda, como alegam as postagens. O relatório da 2ª fase, que reuniu casos de uso propostos por instituições financeiras e empresas de tecnologia, está em elaboração e deve ser divulgado em breve, segundo a instituição. Já a 3ª fase, prevista para começar ainda em 2025, terá como foco principal a eficiência no uso de ativos como garantia em operações de crédito.

A autora dos posts verificados afirma ainda que o “dinheiro em papel vai acabar”, mas segundo o BC, o Drex será uma opção adicional ao real físico, operado em plataforma digital e intermediado por instituições financeiras autorizadas. O objetivo é ampliar a eficiência e a segurança das transações, com uso de contratos inteligentes que só concluem uma operação quando todas as condições forem cumpridas. Trata-se, portanto, de uma opção adicional, e não um substituto para cédulas, moedas ou contas já existentes.

Quem criou o conteúdo investigado pelo Comprova

Os vídeos com as alegações sobre o Drex foram publicados em 3 de setembro pela influenciadora Carla Cout, que se apresenta como missionária, comunicadora, cantora e terapeuta. Ela mantém o perfil @carlacoutoficial1 no TikTok, com mais de 136 mil seguidores e 891 mil curtidas, e o perfil @carlacoutoficial no Instagram, com cerca de 2,8 mil seguidores. Nas descrições, afirma ser “militante da direita e do bolsonarismo”.

A publicação verificada alcançou cerca de 392 mil visualizações no TikTok até 10 de setembro, além de 17 mil curtidas, 15 mil compartilhamentos e 2.537 comentários. No Instagram, o mesmo vídeo somava cerca de 34 mil visualizações.

Por que as pessoas podem ter acreditado

O conteúdo pode ter convencido parte do público porque usa uma informação real — a existência do projeto Drex — e a insere em um cenário distorcido de vigilância e repressão. Essa técnica de descontextualização dá aparência de plausibilidade à narrativa, pois o público já ouviu falar da moeda digital, mas desconhece detalhes técnicos sobre seu funcionamento.

Além disso, o vídeo utiliza exagero e alarmismo, afirmando que “acabou seus sonhos” e que o dinheiro “vai expirar”, o que gera medo imediato e desativa o pensamento crítico. O apelo emocional é reforçado com comparações ao comunismo e à Venezuela, referências que ativam memórias negativas em parte da audiência e fortalecem o sentimento de urgência.

A fala também inclui ataques à credibilidade do presidente e polarização, colocando o governo como inimigo do povo. Isso dialoga diretamente com grupos já críticos ao governo federal e ativa o viés de confirmação, levando essas pessoas a aceitar a mensagem sem checar informações oficiais.

Fontes que consultamos: Banco Central do Brasil, pesquisa em veículos jornalísticos, verificação anterior do Comprova, postagens nas redes sociais, relatório da 1ª fase do Drex e comunicado da Secretaria de Comunicação Social.

Por que o Comprova investigou essa publicação: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas, saúde, mudanças climáticas, eleições e golpes virtuais e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: O Comprova já mostrou que o Drex não mudaria o sigilo bancário nem representaria um instrumento de controle social pelo governo, além de ter publicado na seção Comprova Explica como funciona a moeda digital. O projeto também checou a informação enganosa de que o recurso seria utilizado para arrecadar impostos diretamente de transações digitais.