O Projeto Comprova é uma iniciativa colaborativa, apartidária e sem fins lucrativos liderada pela Abraji e que reúne jornalistas de 42 veículos de comunicação para zelar pela integridade da informação que molda o debate público. O objetivo é oferecer à audiência uma compreensão clara e confiável dos acontecimentos e contribuir para a integridade do ambiente digital e para uma sociedade mais bem informada e resiliente à desinformação e a golpes e fraudes virtuais.
Filtro:

Política

Investigado por: 23/10/2025

Foto em que Zezé Di Camargo pede liberdade para Bolsonaro foi gerada por IA

Política
Apesar de já ter se manifestado em favor da anistia aos condenados pelo 8 de janeiro, não há registros de que o cantor tenha levantado cartaz e vestido blusa em apoio ao ex-presidente.

Circula no X uma foto na qual o cantor Zezé Di Camargo aparece supostamente segurando um cartaz pedindo liberdade para o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), condenado à prisão por atentar contra a democracia, e vestindo uma camisa escrita “Eu apoio Bolsonaro”. A imagem não é verdadeira e foi gerada por inteligência artificial.

No dia 17 de outubro, o cantor chegou a levantar uma camisa pedindo anista para os presos acusados de participarem dos atos antidemocráticos de 8 de janeiro. No entanto, não estava com a camisa azul nem segurando cartazes, diferentemente do alegado na publicação.

Apesar de ser parecido com o cantor, o rosto na foto do post tem traços um pouco diferentes dos do artista, aparentando ser mais jovem. Além disso, a banda aparece tocando normalmente ao fundo, sem olhar para Zezé. São indicativos de que houve uma mistura de imagens com alterações digitais.

O Comprova submeteu a imagem à ferramenta SynthID, que consegue identificar se uma foto foi feita por humanos ou gerada por inteligência artificial do Google. A plataforma detectou uso de IA na parte central da imagem, onde aparecem o rosto semelhante ao do cantor, a camisa e o cartaz.

Como o Comprova explicou em junho, ferramentas de detecção de inteligência artificial podem falhar em buscas e checagens, mas, neste caso, a plataforma utilizada é do Google e mostrou que a imagem foi feita com outras ferramentas do próprio Google.

| Captura de tela da ferramenta SynthID. Na imagem à direita, é possível ver em azul as partes que foram geradas por IA.

A imagem também foi analisada pelo especialista em Segurança da Informação Gilberto Sudré a partir da ferramenta Foto Forensics. O especialista também encontrou sinais de adulteração (abaixo). “As marcas brancas indicam que esses objetos foram incluídos posteriormente na imagem”, explicou.

Além disso, por meio da busca reversa de imagens, tanto do Google Lens, como de ferramentas como TinEye, Yandex e Bing, não foram encontradas fotos semelhantes com Zezé Di Camargo com o cartaz declarando apoio explícito ao ex-presidente. A busca reversa é uma pesquisa que usa uma imagem em lugar de palavras para localizar imagens semelhantes publicadas na internet. Quando encontradas, elas servem para comparação ou para obter informações de contexto, como local e data de publicação, por exemplo.

Nas redes sociais do cantor e nas de fã-clube do artista também não foram localizados registros. O Comprova entrou em contato com Zezé Di Camargo, por meio da assessoria do cantor, mas não obteve retorno até a publicação deste texto.

Quem criou o conteúdo investigado pelo Comprova

O perfil que fez a publicação se identifica como de direita e bolsonarista, tendo 78,7 mil seguidores no X. As postagens fazem críticas ao governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), à esquerda e ao Supremo Tribunal Federal (STF).

A publicação analisada teve, até o dia 22 de outubro, 38 mil visualizações, seis mil curtidas, mil compartilhamentos e 306 comentários.

Por que as pessoas podem ter acreditado

O uso de inteligência artificial fez com que o rosto da foto ficasse semelhante ao de Zezé Di Camargo. Somado a isso, o fato do cantor já ter se manifestado politicamente em outras ocasiões a favor de Bolsonaro e de opositores do PT pode ter feito com que as pessoas acreditassem que ele teria declarado apoio novamente ao ex-presidente.

Nas eleições de 2014, o cantor pediu votos para Aécio Neves (PSDB), que disputava a presidência com Dilma Rousseff (PT). Em outubro de 2022, fez parte do grupo de sertanejos que se reuniu com Bolsonaro em Brasília antes do segundo turno das eleições presidenciais daquele ano.

Fontes que consultamos: As ferramentas SynthID, Google Lens, TinEye, Yandex e Bing, além da assessoria do cantor.

Por que o Comprova investigou essa publicação: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas, saúde, mudanças climáticas, eleições e golpes virtuais e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: O uso de inteligência artificial para manipular imagens é uma tática muito utilizada por desinformadores. A AFP, por exemplo, já mostrou que um vídeo no qual Zezé Di Camargo aparecia declarando apoio a Lula havia sido criado digitalmente.

O Comprova já fez checagens semelhantes e mostrou que o vídeo em que Ivete Sangalo elogia o petista foi criado com IA, assim como a suposta gravação na qual Celso Amorim teria abraçado Nicolás Maduro.

Notas da comunidade: No X, não havia sido incluída nenhuma nota pela comunidade até a publicação desta verificação.

Política

Investigado por: 22/10/2025

Governo dos EUA não cancelou o visto do general Paiva

Política
Não há registros oficiais ou declarações que confirmem a afirmação de uma postagem segundo a qual o visto do comandante do Exército teria sido cancelado pela Casa Branca. Além disso, o Exército afirmou que a informação é falsa.

Diferentemente do que diz um post no X, o visto do general Tomás Paiva não foi cancelado pelo governo dos EUA. O conteúdo verificado mostra uma foto do militar e um texto, com alguns erros de português, alegando que o visto do general foi cancelado pelo atual secretário de Estado dos Estados Unidos, Marco Rubio. O Comprova não encontrou nenhuma publicação de Rubio sobre o assunto.

Os EUA cancelaram os vistos dos ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes e Luís Roberto Barroso, de servidores ligados ao Ministério da Saúde e do próprio ministro Alexandre Padilha, e do advogado-geral da União, Jorge Messias. Em todos os casos de cancelamento de vistos, a informação foi divulgada em sites oficiais do governo americano. Não há registros envolvendo o nome de Paiva.

O Comprova também procurou o Centro de Comunicação Social do Exército para verificar se haveria alguma sanção a Paiva. Em resposta, a assessoria declarou que a informação é inverídica e lamentou “publicações especulativas e irresponsáveis” divulgadas nas redes sociais.

Ao checar o site do Departamento de Estado americano, a reportagem constatou que a mais recente nota que cita representantes brasileiros foi divulgada no dia 16 de outubro. Ela trata da reunião entre Marco Rubio, o representante de Comércio dos EUA Jamieson Greer, e o chanceler brasileiro Mauro Vieira.

O ato mais recente do governo dos EUA que envolve sanções a cidadãos do Brasil ocorreu em 22 de setembro, quando a esposa do ministro do STF Alexandre de Moraes, Viviane Barci de Moraes, foi adicionada ao rol de afetados pela Lei Magnitsky.

É sabido, contudo, que bolsonaristas fizeram uma articulação política que visava incluir Paiva na relação de pessoas sujeitas à punição com o cancelamento do visto americano, conforme noticiado pelo Estadão em setembro

Foi anunciado, à época, que o procedimento estava sendo analisado pela administração dos EUA. O argumento era que o general teria um vínculo estreito com o ministro Alexandre de Moraes.

Quem criou o conteúdo investigado pelo Comprova

O perfil que publicou o conteúdo costuma compartilhar postagens de teor político e provocativo, frequentemente críticas a autoridades e instituições brasileiras. O tom da publicação é sensacionalista e parece buscar engajamento e polarização.

Não foi possível confirmar se o responsável pela publicação é o autor original da imagem ou apenas a republicou de outra fonte. Até o momento, não houve resposta ao contato para verificar as fontes ou as intenções por trás da postagem.

Por que as pessoas podem ter acreditado

A publicação usa várias táticas para enganar e convencer o público. Ela menciona nomes verdadeiros, como o senador americano Marco Rubio e o general brasileiro Tomás Miguel Ribeiro Paiva, o que dá aparência de credibilidade, mesmo sem apresentar provas. Ao usar figuras conhecidas e cargos reais, o texto faz parecer que a informação veio de uma fonte confiável.

O tom usado é firme e urgente, com frases como “hoje eu cancelo o visto” e “a partir de hoje ele está proibido”, o que passa a ideia de que a decisão já foi tomada e que se trata de um fato confirmado. Essa linguagem enfática reduz a chance do leitor questionar ou buscar uma checagem.

A imagem do general fardado reforça a sensação de seriedade e autoridade, dando ao post aparência de um comunicado oficial. O conteúdo mistura informações verdadeiras (nomes e cargos reais) com uma informação falsa (o suposto cancelamento do visto), o que confunde o público e torna o boato mais convincente.

Em resumo, a publicação é convincente porque combina aparência de autoridade, emoção, repetição e ausência de fontes verificáveis, levando muitas pessoas a acreditar e espalhar uma informação completamente falsa.

Fontes que consultamos: Canais oficiais do Departamento de Estado dos EUA, UOL, G1, Estadão e o Centro de Comunicação Social do Exército.

Por que o Comprova investigou essa publicação: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas, saúde, mudanças climáticas, eleições e golpes virtuais e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: O projeto Comprova verificou e desmentiu a alegação de que os filhos de Barroso teriam sido deportados dos Estados Unidos ou estariam foragidos. O UOL Confere e o Aos Fatos também publicaram checagens sobre o mesmo tema, concluindo que as informações são falsas.

Notas da comunidade: Não havia notas da comunidade nas postagens no X até o fechamento desta verificação.

Política

Investigado por: 21/10/2025

Imposto sobre prêmio de fisiculturista Ramon Dino é retido nos EUA e pode ser compensado no Brasil

Política
O fisiculturista teve 30% do valor retido na fonte nos Estados Unidos, e esse imposto pode ser compensado no Brasil, conforme a lei vigente.

Diferentemente do que sugere uma publicação feita nas redes sociais, o governo brasileiro não vai cobrar 27,5% de imposto sobre o prêmio recebido pelo fisiculturista Ramon Dino após vencer o Mr. Olympia 2025, realizado nos Estados Unidos. O conteúdo analisado dá a entender que o Ministério da Fazenda, chefiado por Fernando Haddad, seria responsável por reter o valor, quando, na realidade, a tributação deve ocorrer nos Estados Unidos, onde o atleta foi premiado.

A postagem analisada mostra uma montagem com fotos de Fernando Haddad e Ramon Dino, acompanhada do texto: “Após vencer o Mr. Olympia, Ramon Dino deve ganhar um prêmio equivalente a R$ 550 mil. Do total, o governo brasileiro cobrará 27,5% de impostos. Essa é a maneira como o Estado trata seus atletas”. Ela distorce um dado verdadeiro — a existência da alíquota máxima do Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF) — ao atribuir falsamente ao ministro a criação ou imposição dessa cobrança. A regra é antiga, prevista em lei desde 1998, e se aplica a todos os contribuintes brasileiros, sem relação com decisões recentes do governo. No entanto, o prêmio foi pago nos Estados Unidos, país que retém 30% de imposto de renda na fonte sobre valores pagos a artistas e atletas estrangeiros, conforme a Publicação 515 (2025) e o Form 1042-S do Internal Revenue Service (IRS), órgão equivalente à Receita Federal americana.

No Brasil, o manual Perguntas e Respostas do IRPF 2024, da Receita Federal, confirma que o imposto pago no exterior pode ser compensado no Brasil até o limite do que seria devido aqui (27,5%). Como a alíquota americana é superior, não há imposto adicional a pagar no país, desde que o atleta comprove o recolhimento nos EUA. Em nota enviada ao Comprova, a assessoria do Ministério da Fazenda encaminhou posicionamento da Receita Federal, que afirma: “Não compete à Receita Federal decidir quem será ou não tributado, isso é previsto por leis aprovadas pelo Congresso Nacional”. O Ministério também destacou que a tabela progressiva do IRPF não foi alterada durante a atual gestão e que nenhuma medida nova foi criada por Haddad. A Receita reforçou que a tributação de atletas segue as mesmas regras aplicadas a todos os contribuintes.

O Comprova entrou em contato com o Instituto Mises Brasil, responsável pela publicação analisada, e com o atleta Ramon Dino. Não houve resposta até a publicação desta verificação.

Quem criou o conteúdo investigado pelo Comprova

A publicação foi feita pelo Instituto Mises Brasil, organização que se apresenta como uma “think tank, organização com objetivo de disseminar conhecimentos sobre diversos assuntos, voltada à produção e à difusão de estudos econômicos e de ciências sociais que promovam os princípios de livre mercado e de uma sociedade livre”. Em suas redes sociais e site oficial, o instituto compartilha conteúdos alinhados ao liberalismo econômico e ao antiestatismo, além de defender posições contrárias a ideologias associadas à esquerda, como o marxismo, e à intervenção estatal na economia.

O perfil possui mais de 62 mil seguidores no X e costuma publicar mensagens críticas a políticas públicas, à tributação e à atuação do governo federal. O post verificado foi publicado em 14 de outubro de 2025 e, até 20 de outubro, já havia registrado 3,2 milhões de visualizações na plataforma, além de milhares de curtidas, republicações e comentários com críticas à carga tributária.

A linha editorial e as publicações do Instituto Mises Brasil indicam uma intenção de crítica ideológica ao Estado e à atuação do governo federal, frequentemente explorando temas econômicos em tom político. Nesse caso, a associação entre a imagem de Fernando Haddad e o prêmio esportivo de Ramon Dino reforça uma narrativa de oposição à intervenção estatal e à tributação, ainda que sem base factual.

Por que as pessoas podem ter acreditado

A publicação utiliza a tática da descontextualização ao afirmar que “o governo brasileiro cobrará 27,5% em impostos” sobre o prêmio, sugerindo que o Estado brasileiro pune atletas de sucesso. Além disso, observa-se o uso de apelo à emoção e exagero/alarmismo, reforçando a narrativa de que o atleta é penalizado por seu esforço, com frases como “essa é a maneira como o estado trata seus atletas”. Essa linguagem estimula sentimentos de injustiça e indignação, levando o público a reagir impulsivamente contra a carga tributária nacional, sem considerar os aspectos legais internacionais envolvidos.

O que dizem os especialistas?

A publicação analisada induz o público à crença de que o governo brasileiro teria taxado o prêmio do fisiculturista Ramon Dino, quando, na realidade, trata-se da aplicação normal das regras de tributação internacional. O caso envolve dois sistemas distintos — o dos Estados Unidos, onde o prêmio foi pago, e o do Brasil, onde o atleta é residente fiscal. O advogado tributarista Carlos Eduardo Navarro, ouvido pelo Comprova, explicou que a premiação recebida no exterior é considerada rendimento tributável no Brasil, devendo ser declarada como tal, ainda que o imposto já tenha sido pago em outro país.

“É claro que, a depender do que a pessoa tem de outros rendimentos ou despesas, ela pode restituir toda ou parte desse valor. Então, é como se fosse um rendimento do trabalho: uma pessoa que recebe seu salário e, no ano seguinte, faz a declaração pode ter que complementar ou restituir a tributação inicial”.

Segundo Navarro, a legislação brasileira permite o abatimento do imposto pago no exterior, desde que ele tenha sido recolhido ao governo federal americano — o que impede a bitributação.

“Agora, da perspectiva do direito internacional, também é verdadeiro que eventual tributação federal — e esse é um aspecto importante — sofrida nos Estados Unidos pode ser abatida do tributo brasileiro. Ele poderia lançar um crédito referente à tributação que tenha ocorrido lá, mas apenas sobre a parcela federal do imposto, porque os Estados Unidos também cobram imposto de renda em nível estadual. Eu não sei em qual estado ocorreu o campeonato, mas é provável que ele sofra duas exigências: uma do fisco federal e outra do fisco estadual. E ele só pode compensar aqui a parcela federal.”

O Mr. Olympia 2025 aconteceu no Resort World Las Vegas, em Nevada. De acordo com a organização Tax Foundation, Nevada é um dos poucos estados do país que não cobram imposto de renda dos seus cidadãos, sejam eles norte-americanos ou estrangeiros. Isso significa que a exigência para Ramon seria apenas pagar a taxa nacional, de 30%.

O advogado esclareceu ainda o funcionamento do carnê-leão, sistema utilizado por contribuintes brasileiros para declarar rendimentos obtidos no exterior, independentemente do valor ter sido trazido ao país.

“O carnê-leão é usado quando não há retenção de imposto na fonte. Vamos pensar numa pessoa que é empregada sob regime CLT: a empresa faz a retenção, e ela não precisa pagar o carnê-leão. Em regra, o sistema serve para duas situações importantes — quando o contribuinte recebe de uma pessoa física, que não faz retenção de IR, ou quando recebe rendimentos do exterior”.

Navarro também comentou o erro de interpretação em declarações da esposa do atleta, que afirmava que o imposto só seria devido se o valor fosse transferido ao Brasil.

“O Brasil não tributa o dinheiro que vem; tributa o dinheiro ganho, independentemente do país. Ou seja, o Dino terá de pagar imposto no Brasil, via carnê-leão, mesmo que não traga o dinheiro. O fato gerador é o recebimento — se ele recebeu o valor em outubro, precisa declarar e pagar o imposto referente a este mês, trazendo ou não o valor. Se trouxer no ano seguinte, nada muda”.

Por fim, o advogado afirmou que, caso os 30% retidos nos Estados Unidos sejam integralmente de natureza federal, o valor será suficiente para quitar o imposto devido no Brasil, sem necessidade de pagamento adicional.

“Ele deve declarar o crédito do imposto pago nos Estados Unidos. E como lá a alíquota é maior do que a brasileira, provavelmente não terá recolhimento adicional a fazer”.

A explicação do tributarista confirma que não há nova cobrança de imposto criada pelo governo brasileiro e que o valor já retido nos Estados Unidos cobre integralmente a tributação devida, desde que o atleta apresente os comprovantes do IRS à Receita Federal.

Fontes que consultamos: Ministério da Economia, Receita Federal do Brasil, IRPF 2024, Internal Revenue Service (1, 2) e advogado tributarista Carlos Eduardo Navarro.

Por que o Comprova investigou essa publicação: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas, saúde, mudanças climáticas, eleições e golpes virtuais e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: O Comprova desmentiu, em 2024, que o Governo Federal impôs tributos sobre as medalhas recebidas por atletas na Olimpíada de Paris. Além disso, falas e ações do ministro Fernando Haddad são frequentemente alvo de desinformação nas redes. O projeto já checou, por exemplo, um post que inventava uma declaração em que ele culpava exclusivamente a gestão anterior por problemas econômicos e mostrou que Haddad defendeu estabilidade no serviço público com regras de desempenho, e não o fim dela.

Notas da comunidade: A nota da comunidade anexada por usuários do X informa que o prêmio é de US$ 100 mil, que os Estados Unidos retêm 30% de imposto na fonte sobre prêmios pagos a não residentes (conforme IRS Publication 515 e Form 1042-S) e que esse valor pode ser compensado no Brasil, de acordo com o IRPF 2024. O conteúdo da nota está correto e confirma o mesmo contexto verificado pelo Comprova, ajudando a corrigir a desinformação original publicada pelo Instituto Mises Brasil.

Política

Investigado por: 20/10/2025

Relato de advogado não prova que ordem de prisão contra mulher que vive nos EUA foi ilegal

Política
A acusação de que o ministro Alexandre de Moraes, do STF, ignorou os trâmites legais de cooperação no caso de Flávia Cordeiro Magalhães não se sustenta diante das evidências disponíveis.

Não há provas de que o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes tenha ignorado trâmites formais de cooperação jurídica e penal internacional ao pedir a prisão de uma brasileira que mora nos Estados Unidos.

Flávia Cordeiro Magalhães diz ter cidadania americana e morar nos Estados Unidos há mais de 20 anos. O advogado dela, Paulo Faria, afirmou que agentes da Polícia Federal (PF) teriam ido ao país norte-americano para vigiá-la e prendê-la à revelia das autoridades locais, o que seria ilegal. O Comprova entrou em contato com Faria, mas ele não apresentou provas do que disse.

Segundo professores de Direito Internacional e Penal da Universidade de São Paulo (USP) e da Universidade Federal Fluminense (UFF), consultados pelo Comprova, os elementos do relato do advogado – caso de fato constem no processo – levam a crer o contrário do que ele afirma: que os trâmites legais de cooperação internacional foram seguidos por Moraes (detalhes mais abaixo).

Flávia passou a ser investigada pela PF após publicar em sua conta no X, em 15 de junho de 2023, que Moraes teria visitado o chefe do Primeiro Comando da Capital (PCC), Marcola, na cadeia. “O narco-tráfico (sic) está dentro do STF”, escreveu na postagem. O ministro nunca visitou o criminoso, como mostrou checagem do site Aos Fatos.

Em 8 de fevereiro de 2024, Alexandre de Moraes determinou a prisão preventiva de Flávia pelos crimes de associação criminosa e incitação ao crime. “A investigada insiste no descumprimento de decisões por mim anteriormente proferidas ao continuar divulgando notícias fraudulentas nas redes sociais”, justificou Moraes. No mandado, aparece ainda o nome Flávia Magalhães Soares, que consta na cidadania americana de Flávia, segundo ela afirma em vídeo nas redes sociais.

A alegação de que Moraes determinou que a PF fosse aos EUA vigiar e prender Flávia foi feita por Paulo Faria nas redes sociais. A postagem atingiu mais de 700 mil visualizações e 4 mil compartilhamentos no X. O relato dele deu origem a uma série de outros posts e foi repercutido por Flávia em entrevistas. Em pelo menos uma delas, Flávia diz que a ordem de Moraes não era para a PF prendê-la nos EUA, mas sim sequestrá-la.

Segundo Faria, Flávia foi incluída no chamado inquérito das fake news, que tramita sob sigilo no STF e tem Moraes como relator. O advogado diz ter tido acesso recente aos autos, onde consta, segundo ele, prova de que o ministro do STF determinou a ordem ilegal. O Comprova pediu a Faria acesso a esses documentos, mas o advogado não quis compartilhá-los.

O Comprova procurou o STF, que não comentou, sob o argumento de que “os processos citados na postagem tramitam em sigilo”. A PF não respondeu.

Quem criou o conteúdo investigado pelo Comprova

Paulo Faria é advogado de Flávia e também do ex-deputado federal Daniel Silveira, que foi condenado pelo STF, em 2022, a oito anos e nove meses de prisão pelos crimes de ameaça ao Estado Democrático de Direito e coação no curso do processo. Atualmente, Silveira cumpre pena em regime aberto.

Flávia Magalhães se descreve em seu perfil no X, no qual tem mais de 78 mil seguidores, como pernambucana, cidadã americana, republicana e conservadora. E diz lutar para que todos tenham liberdade de expressão. Ela faz parte do movimento evangélico Yes Brazil USA, que já organizou eventos com o ex-presidente Jair Bolsonaro em Orlando, nos EUA, como uma motociata em junho de 2022 e uma palestra em fevereiro de 2023. Na ocasião, Bolsonaro fez seu primeiro discurso como ex-presidente e incentivou apoiadores a questionar o resultado das urnas.

Recentemente o Comprova mostrou que era enganosa uma postagem de Flávia que alegava que correntistas corriam risco de perder dinheiro em caso de sanção dos EUA contra a instituição.

Por que as pessoas podem ter acreditado

O post insinua a existência de uma ação coordenada e ilegal de autoridades brasileiras nos Estados Unidos e cita documentos para dar uma aparência de autenticidade ao que afirma, mas sem apresentá-los. O tom de indignação e sensação de injustiça constituem intenso apelo emocional capaz de mobilizar internautas contra uma figura específica, no caso, Alexandre de Moraes. A estratégia pode reduzir o senso crítico e favorecer o compartilhamento impulsivo. O tom de descoberta de algo que Moraes supostamente buscava esconder pode levar as pessoas a acreditarem no relato.

Advogado não fornece prova do que alega

O Comprova consultou o Banco Nacional de Medidas Penais e Prisões do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e encontrou apenas o mandado de prisão preventiva expedido por Moraes contra Flávia em 8 de fevereiro de 2024. O mandado é válido até 2030.

O advogado de Flávia afirma que o ministro teria decretado a prisão dela “na calada da noite” do dia 30 de dezembro de 2023, mas não há registro disso no banco do CNJ.

Em contato com o Comprova, o advogado disse que o mandado de prisão teria sido encaminhado ao Oficialato da Polícia Federal em Miami, um posto da corporação brasileira que atua junto ao Immigration and Customs Enforcement (ICE) – o órgão americano responsável pelo controle de imigração e alfândega.

Segundo Faria, o mandado teria sido enviado por um delegado responsável pelo setor de Coordenação-Geral de Cooperação Policial Internacional (CGCPOL-DCEPF). O ofício também teria sido mandado à Embaixada dos EUA em Brasília.

O Comprova não conseguiu confirmar essas informações nem com a PF, nem com o ICE, nem com a Embaixada. Segundo Faria, os documentos constam dos autos do processo sigiloso contra Flávia, ao qual a reportagem não teve acesso.

No relato ao Comprova, o advogado conclui que, se houve encaminhamento da ordem de prisão a um agente da PF em Miami, é para que a ordem seja cumprida. Em caso contrário, o agente estaria cometendo o crime de prevaricação. É assim que Faria sustenta a afirmação de que o STF, na pessoa de Moraes, deu sim ordem para que a PF prendesse Flávia em solo americano.

Mas os professores de Direito consultados pelo Comprova afirmam que a conclusão não faz sentido e não caberia falar em crime de prevaricação neste caso (entenda abaixo).

Já sobre a alegação de que a PF “vigiou” Flávia nos Estados Unidos, o advogado explica que se baseia em declarações dela própria. Flávia teria ouvido de pessoas que estavam em uma manifestação política em Fort Lauderdale, na Flórida, em novembro de 2024, que a PF estaria no local para vigiá-la.

Faria afirmou que a pessoa que vigiava Flávia naquela ocasião foi identificada. “Tomaremos as medidas cabíveis em Miami, e repassando as informações às autoridades americanas, inclusive fotos e nome”, afirmou.

Flávia pode ser processada pela Justiça brasileira

O Comprova consultou o professor de Direito Penal da Universidade Federal Fluminense (UFF) Rodrigo de Souza Costa, a professora de Direito Penal da Universidade de São Paulo (USP) Helena Lobo da Costa e a doutora em Direito Internacional Cynthia Soares Carneiro, professora da Faculdade de Direito de Ribeirão Preto da USP.

Todos explicaram que a PF e o STF podem sim investigar e processar uma pessoa que vive no exterior, seja ela estrangeira ou naturalizada estrangeira. Mas desde que tenha cometido crime no Brasil ou com efeitos no país.

Caso seja expedido um mandado de prisão, os professores afirmaram que o procedimento a ser seguido é o de cooperação penal internacional via pedido de extradição ao país em que o acusado se encontre – pedido este que pode ou não ser deferido.

Da mesma forma, explicam, é necessária autorização do Estado estrangeiro para que agentes brasileiros possam realizar investigações no exterior.

Elementos apontam trâmites legais

Na avaliação dos professores consultados, os elementos informados pelo advogado Paulo Faria levam a crer que os trâmites legais de cooperação internacional foram seguidos.

“Ele está relatando os trâmites de um pedido de extradição”, disse Cynthia Carneiro. “A comunicação que é relatada pelo advogado é entre as instituições que compõem a Interpol. Não tem nada de abusivo ou ilegal”.

Segundo a professora, a Coordenação-Geral de Cooperação Policial Internacional (CGCPOL-DCEPF) é o órgão da PF que administra a cooperação jurídica internacional e integra a Organização Internacional de Polícia Criminal (Interpol).

No organograma da PF, consta que o setor é vinculado à Diretoria de Cooperação Internacional (página 26 do PDF).

O ICE é a polícia migratória americana. O órgão consta vinculado ao Oficialato da PF em Miami no site da organização brasileira. No site do ICE, aparece notícia de colaboração entre o órgão e a PF.

A Embaixada dos EUA em Brasília, também citada pelo advogado como tendo recebido o mandado de prisão contra Flávia, pode ter participação necessária em pedidos de extradição, de acordo com Cynthia.

“Como o pedido de extradição pode demandar acordos entre os Estados, é necessária a participação da Embaixada nesta modalidade de cooperação jurídica internacional, pois só o embaixador pode assinar acordos internacionais”, explicou a especialista em Direito Internacional.

Rodrigo Costa acrescenta: “Se o trâmite se dá a partir do delegado responsável pela área de cooperação policial internacional, isso é um indício de que, se há alguma ação sendo feita, ela está sendo (feita) a partir de trâmite junto às autoridades americanas”.

Helena Lobo vai no mesmo sentido. “Não me parece que um policial brasileiro pegou o mandado embaixo do braço para tentar prendê-la nos Estados Unidos. As informações são de comunicação entre autoridades ligadas à cooperação internacional”.

Sobre crime de prevaricação levantado por Faria caso um agente da PF não cumprisse uma suposta ordem ilegal de Moraes, Rodrigo Costa diz que a alegação não faz sentido: “Ordens ilegais não devem ser cumpridas, não há que se falar em prevaricação”.

Fontes que consultamos: O Comprova analisou postagens nas redes sociais e consultou o advogado Paulo Faria. Além de buscar o STF e a PF, a reportagem também buscou a Embaixada dos Estados Unidos, que pediu para que as questões fossem remetidas às autoridades brasileiras. A Procuradoria-Geral da República (PGR) respondeu que o Ministério Público Federal (MPF) não comenta processos sob sigilo. O Ministério da Justiça, também procurado, disse que “não se manifesta em relação a casos concretos e individualizados, pois correm sob sigilo de acordo com a Lei Geral de Proteção de Dados”. Já o ICE não respondeu.

Por que o Comprova investigou essa publicação: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas, saúde, mudanças climáticas, eleições e golpes virtuais e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: Sobre o caso de Flávia Magalhães, o Comprova mostrou no ano passado que Alexandre de Moraes não cometeu crime ao determinar a prisão dela.

Notas da comunidade: Não havia notas nas postagens no X até o fechamento desta matéria.

Contextualizando

Investigado por: 17/10/2025

Entenda impacto dos juros altos no financiamento rural

Contextualizando
Publicações alegam que governo federal teria deixado de conceder apoio e não tomado medidas para reduzir endividamento dos agricultores.

Conteúdo analisado: Publicação alega que os produtores rurais estão desistindo de plantar por estarem mais endividados do que em anos anteriores e enfrentando maior dificuldade para ter acesso a crédito. Diz ainda que o governo federal teria “virado as costas” para quem produz alimentos, prejudicando o agronegócio com juros altos e falta de incentivo.

Onde foi publicado: X.

Contextualizando: Uma publicação atribui ao governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) a responsabilidade por um suposto abandono dos produtores rurais endividados em razão das altas taxas de juros.

De fato, a taxa Selic foi mantida em 15% ao ano, o maior patamar desde 2006. No entanto, esse índice é decidido pelo Comitê de Política Monetária (Copom), um órgão independente, e não pelo governo federal, como sugere a publicação. Além disso, também não é verdade que o crédito rural e outras medidas para apoiar pequenos e médios agricultores tenham deixado de ser implementadas.

Em julho de 2025, o governo federal lançou uma nova edição do Plano Safra, que abrange linhas de crédito como o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) e o Programa Nacional de Apoio ao Médio Produtor Rural (Pronamp). Já em setembro, criou uma linha de crédito para liquidar operações de agricultores cujas atividades foram prejudicadas por eventos climáticos adversos.

O que ocorreu foi que o patamar de crédito previsto pelo governo federal não cresceu acima da inflação no Plano Safra 2025/2026. A estimativa é de R$ 516,2 bilhões, apenas R$ 8 bilhões a mais do que no ciclo anterior (R$ 508,6 bilhões em 2024/2025) — um aumento nominal de 2%, inferior à inflação acumulada do período, estimada em 5,32%. A Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) criticou o reajuste, considerando-o insuficiente diante do aumento dos custos de produção.

Para efeito de comparação, em 2023 foram disponibilizados R$ 471,2 bilhões. Já em 2022, no então governo de Jair Bolsonaro (PL), foram concedidos R$ 364 bilhões aos produtores rurais.

O economista Eduardo Araújo, mestre em Políticas Públicas pela Universidade de Oxford, ouvido pelo Comprova, destaca que o volume total de crédito rural concedido continua em patamar elevado, com cerca de R$ 380 bilhões no ciclo 2024/2025, contra R$ 248 bilhões em 2020/2021, um crescimento nominal de aproximadamente 54%, de acordo com dados do Boletim do Crédito Rural e do Programa de Garantia da Atividade Agropecuária (Proagro), do Banco Central.

Enquanto o Plano Safra representa o volume autorizado e as condições de financiamento anunciadas pelo governo, o boletim do Banco Central mostra quanto desse crédito foi efetivamente executado pelos agentes financeiros ao longo do ciclo.

Ao comparar o montante empenhado em 2024/2025 com o ciclo anterior 2023/2024, nota-se uma leve queda no montante de crédito rural concedido. Um dos fatores, segundo o economista, é a alta taxa de juros.

“É verdade que houve uma leve redução em relação ao pico do ciclo anterior (2023/2024), mas isso está mais relacionado ao custo dos juros, que seguem em níveis historicamente altos, do que a uma restrição deliberada de crédito”, ressalta.

Eduardo Araújo avalia, no entanto, que os juros em alta não podem ser entendidos como o único fator que afeta essa desaceleração.

“O que observamos é um conjunto de elementos que explicam essa leve desaceleração: o ciclo de expansão anterior já vinha em ritmo forte, o que naturalmente impõe um limite de crescimento; há também um cenário econômico mais conservador, que leva o produtor a planejar com mais cautela suas operações de financiamento; e fatores externos, como a instabilidade nos mercados internacionais e as tensões comerciais entre Estados Unidos e China, que afetam a confiança e os preços de exportação”, contextualiza.

Produtores relatam maior dificuldade em acessar crédito

Ao Comprova, o assessor técnico da CNA Guilherme Rios afirmou que os produtores, em especial os de menor porte, têm relatado um endurecimento por parte dos agentes financeiros em conceder crédito, em razão do atual cenário de endividamento, passando a exigir garantias reais mesmo em operações de menor porte. “Além disso, os limites de crédito ofertados estão menores em comparação à última safra, reforçando um ambiente de maior cautela entre as instituições financeiras”, disse.

A percepção dos produtores diz respeito à mudança implementada em junho pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), órgão composto pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad; pela ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet; e pelo presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo.

O Proagro deixou de cobrir parte dos médios produtores. O limite de enquadramento no seguro rural, que cobre eventuais inadimplências dos produtores que contraem empréstimos, caiu de R$ 270 mil para R$ 200 mil por ano agrícola.

Em nota, o Banco Central (BC) informou que a redução do limite permitirá a concentração do programa na agricultura familiar e a abertura de espaço para ampliar o seguro rural a produtores recorrentemente afetados por eventos climáticos, sem impacto no orçamento do Proagro.

Guilherme Rios destacou, por fim, que as taxas anunciadas no Plano Agrícola e Pecuário 2025/2026, especialmente para médios e demais produtores, estão mais elevadas em comparação às da safra anterior. “O PAP 2024/2025 foi lançado com a taxa Selic em 10,5% ao ano, enquanto o atual plano safra foi anunciado com uma Selic de 15% ao ano, ou seja, com cenários econômicos distintos”, manifestou.

Qual o real impacto da alta nos juros

Na avaliação do economista, o aumento das taxas de juros impacta o produtor rural, mas esse efeito pode ser parcialmente atenuado pelo próprio funcionamento do sistema de crédito rural, que opera com subsídios e equalização de taxas definidos pelo governo federal.

“Na prática, o Tesouro Nacional cobre parte dos juros cobrados pelos bancos, permitindo que os produtores acessem recursos com custos menores do que os de mercado — especialmente nas linhas do Pronaf (agricultura familiar) e Pronamp (médios produtores)”, entende.

A alta na taxa de juros gera, segundo o professor, um efeito difuso sobre o agronegócio e a economia em geral, mas o mecanismo de subsídios do crédito rural ajuda a proteger, em parte, os produtores, especialmente os de menor porte. Ainda assim, pode ocorrer algum tipo de endividamento e, nesse caso, algum impacto sobre novas contratações de crédito.

Diante desse cenário, o economista defende uma leitura equilibrada da situação, considerando que a evolução do crédito rural no país reflete múltiplas variáveis econômicas e conjunturais e não pode ser explicada somente por uma dimensão de gestão ou política específica.

“O que existe hoje é um cenário de ajuste pontual, não de retração estrutural. O crédito rural segue crescendo no longo prazo, e o sistema continua bem abastecido de recursos, especialmente nas linhas direcionadas e com apoio público”, pondera.

Eduardo Araújo destaca, por fim, que não há indícios de que o governo atual tenha alterado o modelo estrutural do crédito rural, uma vez que os programas continuam operando nas normas do Manual de Crédito Rural e das diretrizes do Conselho Monetário Nacional (CMN).

“O que se observa são acréscimos complementares — como linhas especiais para renegociação de dívidas ou alívio temporário para produtores com dificuldade — e ajustes regulatórios, especialmente no Plano Safra 2025/2026 (por exemplo, exigência de zoneamento climático para custeio). Ou seja, houve adaptações pontuais, mas não uma mudança radical na concessão de crédito.”

O Ministério da Agricultura foi procurado, mas não respondeu até a publicação deste texto.

Fontes consultadas: O economista Eduardo Araújo, o assessor da CNA Guilherme Rios, documentos sobre o Plano Safra 2025/2026, boletins do Banco Central e reportagens sobre o tema.

Por que o Comprova contextualizou este assunto: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas, saúde, mudanças climáticas e eleições. Quando detecta nesse monitoramento um tema que está sendo descontextualizado, o Comprova coloca o assunto em contexto. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Para se aprofundar mais: O Comprova já publicou outros conteúdos relacionados à concessão de crédito. Explicou, por exemplo, o que mudou no financiamento da Caixa e o que isso diz sobre a situação do banco e a medida provisória voltada a trabalhadores CLT.

Política

Investigado por: 17/10/2025

Ônibus escolar de programa federal custam R$ 421,9 mil, e não R$ 1,8 milhão, como alega vídeo viral

Política
Valor citado em vídeo viral é falso. Documentos oficiais e fabricantes desmentem aumento irregular nos custos do Programa Caminho da Escola.

Diferentemente do que afirma um vídeo que circula nas redes sociais, os ônibus escolares do Programa Caminho da Escola não sofrem alteração de preço de R$ 600 mil para R$ 1,8 milhão quando são entregues a diferentes estados. O valor atualizado do veículo, segundo o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) e a fabricante Iveco, é de R$ 421.971,65, em resposta à checagem do mesmo conteúdo ao Estadão Verifica e conforme consta na Ata de Registro de Preços nº 8/2023, documento disponível no Portal da Transparência. 

O conteúdo verificado mostra um homem filmando um ônibus com o logotipo do governo federal e a inscrição “Caminho da Escola”, enquanto afirma que os veículos teriam o preço aumentado irregularmente ao longo da entrega. Ele menciona que os ônibus sairiam da fábrica por R$ 600 mil e teriam a nota fiscal trocada para R$ 1,8 milhão, sugerindo desvio de recursos públicos.

Para o Comprova, a Controladoria-Geral da União (CGU) informou que o FNDE solicitou, em 2023, uma análise sobre os riscos envolvidos na definição da quantidade de veículos a serem adquiridos pela Ata nº 8/2023. O documento foi homologado em dezembro de 2023, sem constatação de impropriedades ou irregularidades. A CGU também iniciou, no segundo semestre de 2025, o planejamento de fiscalizações em nove estados, com trabalho de campo previsto para novembro.

O Tribunal de Contas da União (TCU) afirmou que não há processos em andamento sobre o tema. O único processo relacionado a ônibus escolares foi aberto em 2018 e encerrado em 2020, sem relação com o caso atual.

No vídeo, o autor diz que estaria saindo da fábrica da Mascarello, no Paraná, com destino a Recife. Em nota, a prefeitura de Recife disse que “a informação não é verdadeira, pois a última compra de veículos ocorreu no ano de 2017. Nos últimos três anos, outros três veículos foram repassados pelo governo do estado”. O município reforça, inclusive, que não há qualquer processo licitatório em curso para tal compra. O Comprova tentou contato com a empresa Mascarello e não obteve retorno.

Quem criou o conteúdo investigado pelo Comprova

A publicação investigada foi compartilhada por perfis e páginas com forte viés político, frequentemente alinhados a narrativas de oposição ao governo federal. Esses perfis costumam usar conteúdos sensacionalistas para mobilizar seguidores e gerar engajamento.

O vídeo teve 74,2 mil visualizações e 5 mil curtidas. Ao analisar os perfis que compartilham esse tipo de conteúdo, observa-se um padrão de disseminação de conteúdos que visa desacreditar instituições públicas, gerar indignação e polarização política e reforçar narrativas ideológicas alinhadas a grupos de oposição ao governo atual.

Tentamos contato com o autor do post, mas até o momento da publicação deste texto não houve retorno. O Comprova não conseguiu contatar o perfil que compartilhou o mesmo conteúdo no X, pois ele não permite envio de mensagens.

Por que as pessoas podem ter acreditado

O vídeo pode convencer porque combina recursos visuais e narrativos que sugerem autenticidade e indignação moral. O narrador grava imagens de veículos novos, destacando detalhes concretos. Ao dizer “olha aí, é zero, não tem nem placa” , cria-se a ilusão de uma prova. A fala é espontânea e coloquial, reforçando a impressão de testemunho “de dentro”.

Além disso, o uso de números aparentemente precisos (“R$ 600 mil aqui”, “1 milhão e 800 mil em Brasília”, “10 unidades só hoje”) confere uma falsa sensação de exatidão, embora não exista fonte ou documento que comprove os valores. O vídeo também menciona locais reais (Recife, Brasília, Paraná), o que ajuda a narrativa na realidade e aumenta sua verossimilhança.

Ao insinuar um esquema de corrupção (“a nota é trocada”, “imagina a farra de dinheiro”), o narrador desperta indignação moral, uma emoção para impulsionar o engajamento nas redes. A viralização do conteúdo, por sua vez, reforça o efeito de verdade: quanto mais o vídeo circula, mais ele parece legítimo, mesmo sem qualquer evidência verificável.

Fontes que consultamos: Prefeitura de Recife, Iveco, FNDE e Estadão Verifica.

Por que o Comprova investigou essa publicação: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas, saúde, mudanças climáticas, eleições e golpes virtuais e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: O Comprova já fez outras checagens sobre políticas educacionais e mostrou, por exemplo, que os ônibus com adesivo “Escolar” em evento do PT pertenciam a empresas privadas e estavam autorizados a transportar apoiadores da legenda. Mostrou ainda que o Fies foi criado no governo de Fernando Henrique Cardoso.

Notas da comunidade: Não havia “notas da comunidade” nas postagens no X até a publicação deste texto.

Política

Investigado por: 16/10/2025

Não há evidências de que seja real um áudio atribuído a Haddad sobre “compra de apoio”

Política
Fala foi divulgada por influenciador conhecido por difundir áudios falsos e, segundo perito, tem indícios de adulteração.

Ao contrário do que mostra vídeo publicado nas redes sociais, o ministro Fernando Haddad não afirmou que “taxará tudo” e “tem muita gente para comprar apoio” até as eleições de 2026. Postagens no Instagram e Facebook analisadas pelo Comprova mostram um homem reproduzindo áudio atribuído a Haddad, mas que foi desmentido pelo Ministério da Fazenda e contestado por um perito.

No início do vídeo, o criador da publicação afirma que “o Lula te enganou mais uma vez”. Para sustentar o argumento, coloca uma gravação do seu celular, com o suposto áudio, no qual o ministro teria dito que “em ano de eleição, tem muita gente para comprar apoio”, mencionando a Globo e influenciadores digitais.

O Comprova não encontrou registros públicos de que Haddad teria feito essas declarações, o que seria esperado diante da gravidade do assunto. Em nota, o Ministério da Fazenda afirmou que se trata de conteúdo “claramente falso, com manipulação feita por Inteligência Artificial”. “A mesma prática criminosa usada em outras montagens com esse tipo de edição”, aponta o comunicado.

Consultado pelo Comprova, o perito e cientista forense Mauricio de Cunto destacou que o áudio possui fortes indícios de adulteração. “A fala tem baixa expressividade, uma taxa de elocução, um ritmo de fala muito quadradinho, ou seja, a pessoa não pensa para falar, não pensa para respirar”, afirmou.

“Tem esse problema do ritmo, tem o problema semântico, ou seja, o que ele está falando? Ou seja, é lógico ele estar falando isso? É claro que não”, opinou. “O ritmo, a entonação e a prosódia são estranhas, ou seja, é como se ele estivesse lendo um texto que não tem emoção.”

Quem criou o conteúdo investigado pelo Comprova

O dono do perfil analisado costuma fazer vídeos dele mesmo comentando sobre notícias e acontecimentos na política brasileira e norte-americana, com manifestações em apoio à direita, ou seja, a favor do presidente Donald Trump e contra Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e integrantes do Governo Federal. A publicação em questão teve cerca de 52,8 mil curtidas no Instagram e 117 mil visualizações no Facebook, até o dia 15 de outubro.

Além disso, ele também fez outras publicações checadas por portais de verificação de fatos. Em 5 de setembro, o Estadão publicou uma matéria destacando ser falso um áudio que o homem divulgou, em que o apresentador William Bonner teria dito que ajudou a eleger Lula em 2022. Já em 4 de setembro, o mesmo veículo apontou ser falsa outra gravação mostrada pelo homem, na qual o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes teria ameaçado o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União), em caso também investigado pelo Uol.

O dono da conta também já foi checado pelo Aos Fatos. Ele exibiu áudios falsos em que os ministros do STF Luís Roberto Barroso e Moraes supostamente lamentam ter sido sancionados pelos Estados Unidos com a Lei Magnitsky.

O Comprova tentou contato com o autor da postagem, mas não obteve retorno até a publicação deste texto. O espaço está aberto para manifestações.

Por que as pessoas podem ter acreditado

O conteúdo é convincente, pois o criador do vídeo apresenta um áudio de uma fala supostamente dita por Haddad, agregando credibilidade. As declarações possuem fortes indícios de manipulação, com falas que estimulam sentimentos de indignação moral, como “Vai ter mais taxação para o cidadão e o trabalhador”. O criador do vídeo também faz apelos emocionais, como ao afirmar que “o Lula te enganou mais uma vez”.

A informação em questão também não aparece em nenhum veículo de imprensa profissional e, portanto, tende a não ser verídica.

Fontes que consultamos: Ministério da Fazenda e o perito e cientista forense Mauricio de Cunto; checagens do Estadão [1] [2], Aos Fatos e Uol

Por que o Comprova investigou essa publicação: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas, saúde, mudanças climáticas, eleições e golpes virtuais e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: O Comprova já realizou outras checagens envolvendo Haddad, como quando postagens tiraram de contexto uma fala dele sobre servidores públicos e inventaram uma declaração de que o ministro teria culpado exclusivamente a gestão anterior por problemas econômicas.

Contextualizando

Investigado por: 15/10/2025

Vídeos tiram de contexto fala de Haddad sobre tributação das apostas online

Contextualizando
Postagens no TikTok e no X fazem parecer que o ministro criticou Bolsonaro por “cobrar poucos impostos”, mas ele se referia apenas à ausência de tributos sobre empresas de bets.

Conteúdo analisado: Vídeos nas redes sociais afirmam que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, teria dito que o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) “cobrou poucos impostos”, em uma suposta crítica à política tributária do governo anterior. As postagens utilizam trechos editados de uma entrevista coletiva concedida pelo ministro no Senado Federal em 7 de outubro de 2025, omitindo o contexto no qual a fala foi feita.

Onde foi publicado: TikTok e X.

Contextualizando: A declaração de Haddad foi feita em 7 de outubro de 2025, durante entrevista coletiva à imprensa no Senado Federal, quando o ministro comentava a Medida Provisória nº 1.303/2025, que trata da tributação de aplicações financeiras, ativos virtuais e apostas de quota fixa (bets).

Na fala completa, Haddad explicou que a Receita Federal teria dificuldade em cobrar retroativamente os tributos de casas de apostas que atuaram no país sem regularização, pois o governo anterior não havia feito essa cobrança. Ele afirmou que:

“O governo anterior, como vocês sabem, não cobrou os impostos devidos pelas bets. Toda atividade econômica tem que ser tributada, independentemente da regularização”, disse Haddad.

O ministro se referia à ausência de tributação sobre empresas estrangeiras de apostas que operaram no Brasil sem fiscalização formal. Em seguida, explicou que a MP 1.303/2025 previa um programa de repatriação desses recursos, com cobrança de 30% sobre os valores não declarados, sendo 15% de imposto e 15% de multa.

Durante a coletiva, Haddad disse que o governo busca “corrigir distorções na arrecadação e na tributação de setores que ficaram sem cobrança adequada”, como o das apostas online, e que o objetivo é regularizar o setor sem aumentar a carga tributária sobre o consumo ou o trabalho. A MP também previa ajustes em outras áreas, como a tributação de aplicações financeiras e criptoativos, a revisão de isenções sobre títulos como LCI e LCA e mudanças na Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) de fintechs e cooperativas de crédito. A medida, porém, foi derrotada no Congresso (ver abaixo).

O que mostram os vídeos investigados?

Ao suprimir o trecho anterior e o posterior, o vídeo omite o contexto e permite que o público interprete a fala como uma crítica geral à cobrança de impostos durante o governo Bolsonaro. Neste caso, a técnica de cherry-picking (escolha seletiva) é evidente: ao destacar somente a parte da fala que menciona o “governo anterior” e “impostos devidos”, sem a explicação de que se trata do setor das apostas online, o vídeo direciona a interpretação do público, sugerindo uma crítica ampla à política tributária do governo Bolsonaro. Essa manipulação sutil, mas eficaz, explora a tendência de as pessoas confiarem em trechos de vídeos autênticos sem buscar o contexto completo, aumentando a probabilidade de desinformação ser aceita e compartilhada.

Já o vídeo publicado pelo PL Nacional no TikTok reforça a distorção por meio de edição. O conteúdo começa com a narração “O que Bolsonaro fez foi um absurdo”, intercala o mesmo recorte da fala de Haddad e termina com a frase “Bolsonaro, o único que te cobrou menos e te entregou mais”, sobre risadas do ex-presidente e uma manchete sobre superávit.

A montagem cria uma narrativa política que contrapõe ambos os governos e faz parecer que Haddad criticou o fato de Bolsonaro “cobrar menos impostos da população”, quando, na verdade, o ministro se referia apenas à falta de tributação das empresas de apostas online. Ao comparar o vídeo completo com o recorte usado nas redes, é possível afirmar que ambos os conteúdos retiram a fala de contexto — o do X por recorte e omissão, e o do TikTok por edição e montagem narrativa, distorcendo o sentido original.

Além disso, o vídeo do TikTok faz uso explícito de apelo à emoção e polarização, elementos comuns em peças de desinformação de cunho político. A narração inicial com a frase “O que Bolsonaro fez foi um absurdo”, seguida de uma montagem que inclui risadas e slogans de impacto, serve para provocar reações emocionais nos apoiadores do ex-presidente e desativar o pensamento crítico.

Ao associar Haddad à ideia de aumento de impostos de forma genérica, o conteúdo busca fortalecer uma narrativa já existente entre parte do público, explorando o viés de confirmação. Essa manipulação de discurso contribui para a erosão da confiança no debate público, dificultando a compreensão de políticas complexas como a tributação de setores digitais e a regulação de apostas online, além de inflamar ainda mais o ambiente político polarizado.

O partido foi procurado pelo Comprova, mas não retornou até a publicação desta verificação.

O que dizem as leis sobre o tema?

A lei nº 13.756/2018, sancionada no governo Michel Temer, criou no Brasil a modalidade de apostas de quota fixa, conhecidas como bets. A norma determinou que a regulamentação do setor ficaria a cargo do Ministério da Fazenda, o que não ocorreu durante o governo Bolsonaro. Sem essa regulamentação, as empresas estrangeiras que operavam no país permaneceram sem autorização formal e sem recolhimento estruturado de tributos nacionais.

Já a lei nº 14.790/2023, sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em dezembro de 2023, regulamentou o mercado de apostas. O texto estabeleceu que somente empresas com sede no Brasil e autorização do Ministério da Fazenda podem explorar o serviço, fixou regras de integridade, prevenção à lavagem de dinheiro e determinou a tributação de 15% sobre prêmios líquidos, além de taxas mensais de fiscalização. A lei também impôs medidas de transparência e segurança, exigindo identificação de apostadores e controle de movimentações financeiras dentro do sistema bancário nacional.

Por fim, a Medida Provisória nº 1.303/2025, mencionada por Haddad, complementava o marco regulatório ao prever um programa de repatriação de recursos de empresas que atuaram antes da regulamentação e ao propor ajustes tributários mais amplos, como a tributação de aplicações financeiras, criptoativos e offshores. Vale ressaltar, porém, que no dia 8 de outubro, a Câmara dos Deputados retirou de pauta a medida provisória.

Editada como uma alternativa ao aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). Com a retirada, a MP não poderá ser votada pelo Senado e perderá a validade. O deputado Carlos Zarattini, relator da matéria, havia feito alterações no texto, retirando itens como o aumento da alíquota sobre as bets, que previa um aumento de 12% para 18% sobre a receita bruta das apostas.

O que dizem os especialistas?

A doutora Melissa Guimarães Castello, procuradora do Estado do Rio Grande do Sul, professora de Direito da PUCRS e presidente de instituição voltada à área tributária, explica que o período entre 2019 e 2022 era de “muita incerteza” sobre a possibilidade de tributação das apostas online. Ela integrou a equipe técnica que elaborou o projeto de reforma da tributação do consumo (IBS e CBS) e assessorou, indiretamente, o ministro da Fazenda, nesse contexto.

“Naquele momento regulatório, as bets não possuíam uma presença física no Brasil. Então, a maioria delas tinha um CNPJ que não fazia atividade de jogos, até porque não podia. […] Seria muito difícil exigir imposto de renda e contribuição social sobre o lucro líquido, porque a empresa não tinha presença aqui no Brasil.”

Ela acrescenta que há uma teoria jurídica, a teoria da continuidade da atividade, segundo a qual os lucros remetidos ao exterior entre 2019 e 2022 poderiam ser considerados parte da operação atual das empresas no Brasil, o que abriria margem para cobrança retroativa.

“Mas é uma teoria, tanto dizer, assim, pode tributar, quanto dizer que não pode tributar. É uma zona muito cinza. Qualquer resposta que dê tudo ou nada aqui está errada. Se o governo resolvesse tributar retroativamente entre 2019 e 2022, como parece que houve uma intenção aqui na negociação política, eles teriam, certamente, que enfrentar um contencioso, e quem ia decidir ao fim e ao cabo seria o Supremo Tribunal Federal.”

Sobre o imposto devido por apostadores, a especialista explica que ele já era previsto em lei, mas não havia como fiscalizar e cobrar.

“O imposto de renda à pessoa física (IRPF) é devido quando uma pessoa física recebe renda do exterior. Então, quando ele jogava naquela bet que estava sediada fora do Brasil e ganhava um prêmio, teoricamente teria que pagar imposto de renda. Qual é a impossibilidade técnica do governo ali? Fiscalizar e controlar isso. Então, eu tenho um rendimento que vem diretamente do exterior e não enxergo isso do ponto de vista do governo; logo, não tenho como fiscalizar e cobrar. É por isso que a lei de 2023 atribui às bets a responsabilidade de reter na fonte e pagar esse IRPF.”

Ela destaca que a Lei nº 14.790/2023 solucionou esse problema ao obrigar as empresas a reter o imposto na fonte.

“O governo não podia, antes de 2023, obrigar ela a fazer isso, porque não era uma pessoa jurídica estabelecida no Brasil. Mas, por outro lado, tinha o consumidor pessoa física como devedor desse tributo. Veio a regulamentação, obrigou a empresa a estar estabelecida no Brasil. Estabelecida no Brasil, ela passa a ser contribuinte responsável por reter na fonte e repassar esse imposto de renda devido pelo consumidor.”

Por isso, para Melissa, a nova lei trouxe um avanço regulatório e tributário:

“A regulamentação que veio pela 14.790 viabilizou uma fiscalização adequada dos serviços e, antes disso, a gente ficava num cenário de grande incerteza. […] No momento pós-Lei 14.790, o governo viabiliza a vinda delas para cá operando dentro do Brasil e, por consequência, gerando lucros, gerando receita e gerando toda uma arrecadação tributária no país.”

Por fim, ela ressalta que o desafio de tributar serviços digitais não é exclusivo de um governo:

“Nenhum governo, seja de esfera federal, estadual ou municipal, consegue cobrar tributos na importação direta de intangíveis digitais por pessoa física. […] Colocar na conta do governo anterior ou do governo atual é meio que generalizado. Todos têm esse problema. […], mas a fala de Haddad, como omissão regulatória que impediu a cobrança, me parece que está certíssima. Então, pode se dizer que houve omissão regulatória nos dois governos, que impediu a cobrança no período antes de 2024.”

O Comprova entrou em contato com o Ministério da Fazenda e com a Receita Federal para confirmar se há dados oficiais sobre arrecadação de tributos do setor de apostas entre 2019 e 2022, se foram feitas tentativas de cobrança retroativa e qual é a estimativa de valores que poderão ser recuperados com o programa de repatriação previsto na MP 1.303/2025. Até a publicação deste texto, não houve resposta.

Fontes consultadas: A procuradora e professora Melissa Castello, a entrevista coletiva de Fernando Haddad à CNN Brasil em 7 de outubro de 2025, a Lei nº 13.756/2018, a Lei nº 14.790/2023 e a Medida Provisória nº 1.303/2025.

Por que o Comprova contextualizou este assunto: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas, saúde, mudanças climáticas e eleições. Quando detecta nesse monitoramento um tema que está sendo descontextualizado, o Comprova coloca o assunto em contexto. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Para se aprofundar mais: Falas e ações de Haddad são frequentemente são alvo de desinformação. O Comprova já desmentiu, por exemplo, um post que inventava declaração do ministro culpando exclusivamente a gestão anterior por problemas econômicos e que o ele defendeu estabilidade com regras de desempenho no serviço público, e não o fim da estabilidade.

Além disso, o Comprova demonstrou que um vídeo inseriu um áudio editado em entrevista com Marília Gabriela e que dados falsos foram usados em post que atribuiu a Haddad uma fala sobre impossibilidade de pagar o funcionalismo. Já sobre o tema das apostas, o projeto verificou ser falso que o número de apostas na Mega-Sena tenha caído após o crescimento das bets.

Contextualizando

Investigado por: 13/10/2025

Governo não atendeu integralmente pedido da BYD sobre taxa de importação de carros elétricos

Contextualizando
Postagens alegam que o governo brasileiro beneficiará a montadora chinesa BYD em detrimento das já estabelecidas na indústria nacional caso seja aprovada a redução de taxa de importação para veículos eletrificados desmontados. No entanto, o governo não atendeu ao pleito de forma integral e decidiu por uma alternativa que, na avaliação de consultores ouvidos pelo Comprova, não privilegiou nenhum dos lados.

Conteúdo analisado: Postagens dizem que o governo federal negocia pelas costas a redução de impostos para importação de veículos eletrificados desmontados pela empresa BYD. A medida, segundo os posts, destruiria a indústria nacional, formada por montadoras estabelecidas no Brasil e que produzem aqui desde os anos 1950, com perda de milhares de empregos e investimentos bilionários.

Onde foi publicado: TikTok.

Contextualizando: Uma disputa recente entre montadoras tradicionais do mercado e a chinesa BYD, de carros elétricos e híbridos, vem repercutindo nas redes sociais. Ela envolve pleitos feitos pelos dois lados ao governo federal relativos a tarifas de importação de veículos eletrificados desmontados. Postagens sobre o tema viralizaram no TikTok, com alegações de que o Brasil “negocia pelas costas” com a China e “está prestes a assinar uma sentença de morte à indústria automobilística”. Neste Contextualizando, o Comprova detalha o que estava em jogo e qual foi a decisão do governo.

Carta das montadoras contra pedido da BYD

O caso ganhou repercussão após as montadoras Volkswagen, Toyota, Stellantis e General Motors tornarem pública carta enviada ao presidente Lula (PT) dias antes da reunião do Comitê Executivo de Gestão da Câmara de Comércio Exterior (Gecex-Camex), em 30 de julho, para deliberar sobre pleitos da BYD. A montadora chinesa havia reivindicado, em fevereiro, a redução temporária de imposto de importação para automóveis semimontados (Semi Knocked Down ou SKD) e desmontados (Completely Knocked Down ou CKD) de 20% para 10%, no caso dos carros híbridos, e de 18% para 5%, no caso dos veículos elétricos.

Nesses modelos, kits pré-montados ou peças são exportados para o país de destino para receber acabamento final — neste caso, na linha de montagem que a BYD está construindo em Camaçari, na Bahia. Segundo o consultor automotivo Milad Neto, a estratégia é comum na indústria e consiste em uma etapa de transição entre a importação e a produção nacional.

Na carta enviada ao presidente em 15 de julho, as montadoras diziam que a indústria nacional de automóveis sofreria “forte abalo” caso fosse aprovada a redução, o que, segundo elas, impactaria diretamente a demanda por autopeças e mão de obra local. “(A medida) representaria, na verdade, um legado de desemprego, desequilíbrio da balança comercial e dependência tecnológica”, diz trecho da carta.

Em entrevista ao Estadão, o presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), Igor Calvet, disse que a redução pleiteada pela BYD comprometeria a projeção de investimentos de R$ 180 bi da indústria automotiva. “Se mudar as regras do jogo, as empresas instaladas no país reavaliam, obviamente, todos os investimentos que foram anunciados”, disse o presidente da Anfavea, que representa as montadoras.

Reação da BYD

A BYD divulgou uma resposta em 30 de julho, na mesma data da reunião do Gecex-Camex. No texto, intitulado “Por que a BYD incomoda tanto?”, a empresa se diz “atacada por concorrentes obsoletos”, aos quais se refere como “dinossauros”. Segundo a carta da BYD, as montadoras, em tom dramático, se dirigiram ao presidente da República “implorando para ele abortar a inovação”.

Ainda de acordo com a BYD, sua proposta “não é um atalho nem uma esperteza fiscal”, diz. “Não é nenhuma novidade, outras montadoras já adotaram a mesma prática antes de ter a produção completa local”, destaca a montadora chinesa.

Decisão do governo

Em meio à disputa, o governo decidiu contemplar, em parte, os dois lados. Não reduziu as taxas de importação de veículos eletrificados desmontados, mas criou uma cota com alíquota zero, por um prazo de seis meses, para a importação dos modelos até atingir o valor de US$ 463 milhões. Por outro lado, reduziu o prazo para elevar a alíquota ao teto de 35% — agora previsto para janeiro de 2027, e não mais para julho de 2028.

“Com a antecipação do cronograma, o Gecex busca adequar a política tarifária aos investimentos esperados para os próximos anos no setor automotivo do país, trazendo novas tecnologias para o consumidor e cada vez mais adensamento à cadeia produtiva nacional”, diz a nota do governo.

Embora a medida não atenda integralmente ao desejo das montadoras, que defendiam a antecipação para julho de 2026, Igor Calvet considerou que a decisão é aceitável. “[A mudança] é o máximo aceitável sem colocar em risco os investimentos atuais e futuros da cadeia automotiva nacional. Nós esperamos que essa discussão esteja definitivamente encerrada, sem qualquer possibilidade de renovação”, afirmou, em comunicado.

Decisão não privilegia nenhum dos lados

Na avaliação de Milad Neto, o governo foi “imparcial”, por não atender integralmente os dois lados, e “tendencioso” a beneficiar a indústria nacional. “Ao não reduzir a taxa de importação de desmontados como pedido pela BYD, o governo deu um aviso: ‘olha, quer ter algum benefício? Produza aqui’”, diz Neto.

Para o consultor automotivo, a antecipação da elevação da alíquota para 35% vai encarecer os eletrificados chineses e, por consequência, dar mais tempo para a indústria nacional poder se desenvolver e fazer frente à nova realidade do mercado. “A decisão do governo, a meu ver, está correta. Não prejudica nenhum dos lados e fomenta o nosso desenvolvimento”, diz Neto.

Ele acrescenta: “Não permitindo que qualquer indústria, seja ela chinesa ou de outra origem, somente monte o veículo no Brasil, o que não agrega em nada, a decisão do governo exige que haja uma troca de tecnologia com a cadeia produtiva nacional, estimulando o parque tecnológico brasileiro”.

Já para o conselheiro para a indústria da mobilidade Ricardo Bacellar, a decisão do governo representa um “perde-perde” para os dois lados. Na avaliação dele, o ponto central que deveria ser discutido, tanto pela BYD quanto pelas outras montadoras junto ao governo, é a carga total de impostos que incide sobre toda a cadeia automotiva nacional, o que trava o desenvolvimento da indústria.

“O chamado ‘custo Brasil’ é muito alto já há um bom tempo”, diz Bacellar, que comanda o canal “Papo de Garagem” no YouTube. “Este é o real problema, que não foi discutido. Essa disputa entre lado A e lado B por tarifas de importação não ajuda em nada. Perde-se tempo e energia e não se discute o que realmente interessa”.

Fontes consultadas: Notícias na imprensa e pronunciamentos no site do governo federal e no canal da Anfavea no YouTube. O Comprova também ouviu o consultor automotivo Milad Neto e o conselheiro para a indústria da mobilidade Ricardo Bacellar.

Por que o Comprova contextualizou este assunto: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas, saúde, mudanças climáticas e eleições. Quando detecta nesse monitoramento um tema que está sendo descontextualizado, o Comprova coloca o assunto em contexto. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Para se aprofundar mais: Sobre a indústria automotiva, o Comprova mostrou recentemente que a Toyota suspendeu atividades devido a temporal e não por suposta crise, que um vídeo inventou fechamento de montadoras e fez falsa projeção de desemprego e que carros da BYD foram cedidos a órgãos públicos dentro da lei, não em troca de benefícios.

Comprova Explica

Investigado por: 10/10/2025

O que são os scams, golpes ou fraudes virtuais, e como se proteger

Comprova Explica
Golpistas têm aprimorado seus métodos para fraudes na internet; estimativas indicam que scams causam prejuízo trilionário no mundo.

Comprova Explica: Com o aperfeiçoamento de tecnologias de inteligência artificial, golpistas têm aproveitado para induzir consumidores e internautas a realizarem pagamentos ou fornecer informações pessoais. O scam pode ser usado em diferentes tipos de golpe, inclusive alguns sobre os quais o Comprova já falou, como fraudes aplicadas por mensagens de texto, o smishing e o golpe do “pix errado”.

O scam é uma estratégia de golpe ou esquema ilegal aplicado principalmente no ambiente digital. Ela se aproveita de vulnerabilidades legais e psicológicas para ganhos de dados pessoais, dinheiro e outros bens das vítimas. Este tipo de fraude é considerado uma das principais ameaças do espaço virtual e pode ser aplicado de diferentes maneiras, como vendedores on-line que comercializam itens falsificados ou inferiores aos anunciados, ofertas de emprego mentirosas, promoção de investimentos com promessas de alto retorno, entre outras.

Qualquer pessoa pode ser vítima de um scam. De acordo com o relatório “Anti-Scam Handbook v2.0”, produzido pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (UNDP), a suscetibilidade de risco para cair em golpes considera múltiplas dimensões de identidade, como idade, educação e status socioeconômico.

“Anatomia” dos golpes

O relatório da UNDP mostra, na página 66, o “Mapa da Jornada”, uma ferramenta para mapear o passo a passo das fraudes, a partir das perspectivas do golpista e da vítima.

A “jornada” do golpista possui fases anteriores à realização do golpe, como definir quais serão os esquemas de pagamento e pesquisar os perfis e comportamentos dos alvos, passando pelas interações iniciais com táticas de persuasão, até a conclusão do pagamento. Depois, os criminosos apagam vestígios de suas atividades.

Já as etapas do processo associadas aos alvos incluem a motivação para engajar com o vendedor, como o desejo de comprar algum objeto, e, por fim, o encontro virtual com o golpista. Após o pagamento, a vítima pode perceber a fraude ou ser informada de outra forma sobre o scam e sofrer consequências sociais ou pessoais, em meio à tentativa de recuperar a perda.

O documento ainda explica que golpes compartilham várias táticas psicológicas de manipulação, explorando gatilhos emocionais universais como medo, excitação ou urgência para anular o pensamento racional. Criminosos que anunciam opções de investimentos financeiros prometem altos e rápidos retornos financeiros, um poderoso motivador para pessoas em situação de vulnerabilidade.

Outra característica comum é o esquema de taxas antecipadas, ou seja, a promessa de uma grande recompensa, como um prêmio, doação ou empréstimo em troca do pagamento de uma taxa adiantada.

De acordo com o advogado Márcio Stival, especialista em direito digital, a pressa e a emoção são dois pilares da maioria dos scams. “Os criminosos tentam fazer a pessoa agir rápido, sem pensar, dizendo que é uma promoção que vai acabar logo, um problema com a conta ou um pedido urgente de um amigo. Também costumam prometer vantagens muito boas para parecerem irresistíveis. É sempre bom lembrar que, se a oferta parece boa demais para ser verdade, provavelmente é um golpe”, explica.

Tipos de golpes

O relatório da UNDP apresenta diferentes tipos de scams, aplicados via canais online e de telecomunicação. Veja, a seguir, os mais comuns:

Golpes de engenharia social: quando criminosos usam táticas de persuasão para induzir indivíduos a divulgar informações sensíveis ou transferir fundos. Nesses casos, golpistas tendem a se passar por familiares, amigos e agentes públicos para exigir pagamentos de imediato. Esta modalidade pode ser feita por meio de telefones, redes sociais e e-mails.

Golpes de e-commerce: falsos vendedores oferecem produtos a preços baixos. As vítimas ou não recebem os bens ou recebem itens falsificados ou de qualidade inferior. Alguns exemplos são lojas on-line falsas que imitam marcas respeitáveis ou vendedores que bloqueiam as vítimas após receberem o pagamento.

Golpes de investimento: nesta modalidade, golpistas atraem internautas a operações financeiras falsas, com promessas de retornos altos e rápidos. Elas podem ser executadas em grupos de investimento fraudulentos, plataformas de jogos de azar online fakes ou esquemas de pirâmide disfarçados.

Golpes de empregos falsos: quando criminosos oferecem oportunidades de emprego para extorquir dinheiro de candidatos ou coletar informações pessoais deles.

Golpes de caridade falsa: solicitações fraudulentas de doações, frequentemente durante crises, em que os fundos são desviados.

Inteligência artificial usada em golpes

O uso de inteligência artificial por parte de golpistas tem se tornado uma ferramenta cada vez mais comum na sofisticação de fraudes, por meio da criação de conteúdos realistas, como vídeos e áudios.

Os criminosos também podem utilizar o recurso para elaborar mensagens realistas de phishing, quando se passam por instituições confiáveis para roubar informações ou dinheiro dos internautas. Este é um dos golpes mais comuns aplicados no Brasil, conforme o advogado. “Também são frequentes os golpes de investimento com promessas de lucro rápido, as vendas falsas em redes sociais, a clonagem de WhatsApp e os golpes envolvendo o Pix. Muitos golpistas também criam páginas ou perfis falsos para enganar pessoas e empresas.”

Prejuízo global

De acordo com a Aliança Global Anti-Scam (GASA), as perdas globais com golpes digitais ultrapassaram US$ 1,03 trilhão no último ano (cerca de R$ 5,49 trilhões na cotação atual), o que representa mais de 1% do PIB mundial. A estimativa ainda é considerada conservadora, já que muitos scams não são reportados.

O relatório ainda aponta que o prejuízo é significativamente maior em países em desenvolvimento, que chegam a perder 3% a 4% dos seus PIB em comparação a países desenvolvidos, onde as perdas podem ser inferiores a 0,2%.

Segundo dados divulgados pela Serasa Experian, o Brasil registrou quase 7 milhões de tentativas de fraude no primeiro semestre de 2025, o que representa um aumento de quase 30% em relação ao mesmo período do ano anterior, aponta Márcio Stival.

“Isso significa que ocorre, em média, uma tentativa de golpe a cada poucos segundos no país. A maior parte dessas fraudes tem como alvo o setor bancário e os emissores de cartões, mas o comércio eletrônico e os serviços digitais também aparecem entre os mais atingidos. Esses números mostram que o golpe virtual já se tornou uma ameaça constante para o consumidor brasileiro e reforçam a importância de medidas preventivas, como a verificação de informações antes de qualquer transação e o uso de autenticação em dois fatores nas contas online.”

Além do aspecto financeiro, os scams também podem ter impactos sociais e psicológicos nas vítimas, causando sentimentos como depressão, vergonha, ansiedade e, em casos extremos, pensamentos suicidas, além de tensões em relações familiares. Além disso, as fraudes podem reduzir a confiança da população em instituições como bancos e governos.

Como se proteger?

Márcio alerta que a melhor forma de se proteger de scams é desconfiar de tudo que parecer muito urgente e vantajoso. “Nunca clique em links recebidos por mensagens ou e-mails sem verificar a origem. Sempre confirme informações pelos canais oficiais das empresas e evite compartilhar códigos de verificação ou dados pessoais. Ter senhas diferentes e ativar a verificação em duas etapas nas contas ajuda bastante a evitar invasões”, disse.

A Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) detalha formas para os consumidores se prevenirem de golpes na internet:

-Diminuir a exposição de dados pessoais nas redes.

-Tomar cuidado com a coleta de informações privadas, minimizando o uso de cookies, arquivos de texto que sites enviam ao internauta para lembrar informações sobre você, como login, preferências e o conteúdo.

-Apagar histórico de navegação, de tempos em tempos. Além disso, é importante criar senhas fortes, atualizá-las de tempos em tempos, evitar salvá-las no navegador e ativar a autenticação de dois fatores.

Além disso, a UNDP sugere campanhas de conscientização para segurança on-line, sistemas de detecção de fraude para evitar golpes de e-commerce, filtros de spam para monitoramento de atividades suspeitas na internet e suporte aos cidadãos que perderam dinheiro por causa de um scam.

Soluções

Ainda conforme o relatório da UNDP, o combate aos scams por parte das autoridades deve ser feito de forma multifatorial, com medidas como o estabelecimento de centros anti-scam nacionais, para coordenar esforços entre governo, polícia e setor privado, até uma cooperação internacional, por causa da natureza global dos golpistas, através de tratados e acordos entre países.

O documento também aponta que bancos e instituições financeiras devem adotar políticas focadas na proteção dos consumidores, resguardando-os de transações irregulares e aprimorando seus sistemas de segurança.

Fontes consultadas: Relatório do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (UNDP), Anatel, Aliança Global Anti-Scam (GASA), Serasa e o advogado Márcio Stival.

Por que o Comprova explicou este assunto: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas, saúde, mudanças climáticas e eleições. Quando detecta nesse monitoramento um tema que está gerando muitas dúvidas e desinformação, o Comprova Explica. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Para se aprofundar mais: O Comprova já fez outras checagens sobre golpes virtuais recorrentes, como fraudes aplicadas por mensagens de texto, o smishing, o “pix errado” e o golpe do cupom falso.