Política

Investigado por: 2025-02-12

Vídeo é tirado de contexto para dizer que trechos da bíblia serão banidos de redes sociais

  • Enganoso
Enganoso
Post retira de contexto trecho de um vídeo antigo em que a jornalista Daniela Lima, então âncora na CNN Brasil, comentava uma postagem publicada pelo ex-deputado federal Deltan Dallagnol. A edição do vídeo faz parecer que era da jornalista e não do deputado a alegação de que trechos da bíblia serão proibidos porque podem ser interpretados como discurso de ódio.

Conteúdo investigado: Post com vídeo da jornalista Daniela Lima, no programa CNN 360º, dizendo que trechos da bíblia serão proibidos porque podem ser interpretados como discurso de ódio. Sobre a imagem, é aplicado o texto “Exemplo de discurso e pessoa recrutada pela USAID para propagar mentiras e defender a censura da direita no Brasil”.

Onde foi publicado: Instagram, X e Facebook.

Conclusão do Comprova: É enganoso um post nas redes sociais que retira de contexto o trecho de um vídeo com comentário feito pela jornalista Daniela Lima para atribuir a ela uma fala que, na verdade, é do ex-deputado federal Deltan Dallagnol, no contexto da discussão do Projeto de Lei 2630/2020, o PL das Fakes News.

O trecho em questão foi retirado de uma fala de Daniela no programa CNN 360° veiculado no dia 1º de maio de 2023. No vídeo, a partir dos 58 minutos e 28 segundos, ela comenta sobre um pronunciamento do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) a favor do fim da desinformação. Na sequência, a jornalista discorre sobre a pressão das big techs e dos setores conservadores do Congresso Nacional contra o Projeto de Lei, que atualmente está travado no legislativo, e sobre a desinformação que estava sendo propagada a fim de posicionar critãos contra o texto.

A partir de uma hora, dois minutos e 22 segundos, Daniela expõe a pressão dos parlamentares evangélicos para o não andamento do projeto e diz que vai citar um político que pautou uma grande discussão na semana anterior. Então, emenda: “Ele disse: trechos da bíblia serão proibidos de circular porque podem ser interpretados como discurso de ódio. Trechos que falam contra a população LGBTQIA+. E se você repetir, na rua, o que ele tá querendo que você possa dizer na internet, você pode ser indiciado por homofobia. Que prega a submissão da mulher ao seu marido. Oi? Século 21. Eu pago as contas da minha casa.” Na época, a fala de Dallagnol gerou repercussão e chegou a ser desmentida pelo Comprova.

Nesta semana, o vídeo voltou a circular nas redes sociais do verador Carlos Bolsonaro (PL-RJ).. Na publicação, ele escreve que a fala da jornalista é “um exemplo de discurso e pessoa recrutada pelo USAID [Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional] para propagar mentiras e defender a censura da direita no Brasil”.

Recentemente, a USAID, responsável por 40% dos programas de ajuda humanitária do mundo, tem sido alvo de ataques do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, e do bilionário Elon Musk. No Brasil, a Agência também tem sido alvo de desinformação.

O Comprova entrou em contato com o gabinete do vereador Carlos Bolsonaro por e-mail, mas até a publicação deste texto, não houve resposta.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Carlos Bolsonaro tem 3,2 milhões de seguidores no Instagram e a publicação em questão já possuía 9,7 mil comentários até o dia 12 de fevereiro. No Facebook, o post acumula 1,2 mil compartilhamentos. No X, o vídeo alcançou mais de 100 mil visualizações e 6 mil curtidas.

Fontes que consultamos: O Comprova consultou o vídeo completo do programa CNN 360º veiculado no dia 1º de maio de 2023 e disponível no YouTube. Além disso, buscou as versões dos textos do PL 2630/2020 a fim de averiguar o que estava descrito na proposta sobre manifestações religiosas.

Desinformação propagada por ex-deputado

Em abril de 2023, a informação de que trechos da bíblia seriam banidos das redes sociais começou a circular na internet por meio de publicações do então deputado federal Deltan Dallagnol. No X, Facebook e Telegram, a mensagem ganhou repercussão diante do debate sobre o PL 2630/2020.

Dallagnol alegava que, caso aprovado, o PL das Fake News seria responsável por censurar a fé. Em posts alarmistas, ele convocava cristãos a impedir a votação do projeto na Câmara dos Deputados. Mas na realidade o texto deixava claro que manifestações religiosas não seriam impactadas pela legislação.

O artigo 6º do texto inicial previa que não seriam restritas manifestações artísticas, intelectuais ou de conteúdo satírico, religioso, político, ficcional ou literário. A última versão do PL, entregue pelo relator Orlando Silva (PCdoB-SP) ainda no mês de abril, também não citava a proibição de trechos bíblicos.

À época, o relator chegou a anunciar mudanças no texto para deixar ainda mais explícito que o PL não tinha a intenção de vedar citações da bíblia. Nas redes sociais, Orlando Silva publicou um vídeo gravado com a presença do deputado Cezinha da Madureira (PSD-SP), ex-coordenador da Frente Parlamentar Evangélica, para esclarecer que o projeto não pretendia censurar a prática religiosa.

Um ano depois, em abril de 2024, o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), anunciou o engavetamento do PL 2630/2020. Na ocasião, ele também divulgou que seria criado um grupo de trabalho para debater um novo projeto de regulamentação das redes sociais no Brasil.

Por que o Comprova investigou essa publicação: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas, saúde, mudanças climáticas e eleições e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: O Estadão já verificou que houve manipulação no vídeo em que a jornalista Daniela Lima aparece comentando sobre o PL das Fake News. O Comprova desmentiu o boato de que o Projeto de Lei iria proibir versículos bíblicos nas redes sociais e também mostrou que é falsa uma imagem que circula pela internet do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, com o boné da Agência.

Notas da comunidade: Até a publicação desta verificação, o X não havia acrescentado notas da comunidade à postagem em questão.