Política

Investigado por: 05/09/2025

Reunião entre China, Rússia e Índia não era em cúpula do Brics e não excluiu Brasil do bloco

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Post que viralizou usou reunião da Organização para a Cooperação de Xangai, da qual o Brasil não faz parte, para afirmar que o país estava sendo vítima de isolamento internacional

Brasil e África do Sul não foram excluídos do Brics, grupo econômico que reúne os países emergentes, nem há indícios de que sejam alvo de uma coalizão de outros países do bloco para remodelar a aliança. As afirmações foram feitas em uma publicação na rede social X.

O post analisado pelo Comprova tira de contexto imagens de uma reunião da Organização para a Cooperação de Xangai, composta por China, Rússia, Índia e outros países, para sugerir que as nações estariam fazendo um novo arranjo político para excluir Brasil e África do Sul do Brics. A publicação não cita a fonte das informações e tenta sugerir que esse seria o motivo da ausência dos líderes do Brasil e África do Sul do encontro. O texto é acompanhado de um vídeo com um comentário da CNN Brasil que traz imagens dos líderes de China, Rússia e Índia na cúpula da Organização para a Cooperação de Xangai, entidade de países asiáticos da qual o Brasil não faz parte.

Não há registros de negociações de China, Rússia e Índia para excluir o Brasil do Brics, nem de que esse assunto tenha sido discutido na cúpula da Organização para Cooperação de Xangai. As últimas demonstrações entre os países do bloco foram de apoio no contexto de enfrentamento às sanções e sobretaxas impostas pelos Estados Unidos. A China já sinalizou que está disposta a se unir ao Brasil para fortalecer o Brics e “resistir a atos de intimidação”. A mensagem foi publicada pelo porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, Lin Jian, na rede social X, conforme noticiou o portal g1.

Ao Comprova, o Ministério das Relações Exteriores acrescentou que o Brasil inclusive exerce a presidência rotativa do Brics ao longo de 2025, “cabendo-lhe organizar as reuniões do agrupamento”, e reforçou que o país não é membro da Organização para a Cooperação de Xangai, que tem caráter regional. Segundo reportagem da CNN Brasil, para a recente cúpula foram convidados líderes da Ásia Central, Oriente Médio, Sul e Sudeste Asiático.

O texto também afirma que, além do Brasil, a África do Sul seria outro alvo de exclusão do Brics. O motivo seria o fato de o país estar se tornando “campo de genocídio ‘em massa’ com grupos radicais matando os grandes fazendeiros da região”. A afirmação não é verdadeira e repete teoria já afirmada pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, em reunião com o líder da África do Sul, Cyril Ramaphosa, em maio deste ano. Tratam-se de alegações que circulam há muitos anos entre grupos de direita e que já foram desmentidas em reportagens de veículos como BBC News e g1.

A reunião recente entre os líderes de China, Rússia e Índia chamou a atenção por unir as três potências, sobretudo os chefes de China e Índia, tradicionais rivais comerciais no Oriente. Os dois países vêm se aproximando em resposta às punições econômicas de Trump. Na cúpula sediada pelo país, a China se apresentou como alternativa de líder global, contrapondo-se à política de sanções americanas a países estrangeiros.

Organização para a Cooperação de Xangai x Brics

A Organização para a Cooperação de Xangai é formada por 10 membros-plenos: China, Rússia, Índia, Bielorrússia, Cazaquistão, Irã, Paquistão, Quirguistão, Tajiquistão e Uzbequistão. Outros 16 países são observadores ou parceiros de diálogo.

Já o Brics foi composto inicialmente por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. Incorporou mais seis novos membros nos últimos anos e tem ganhado evidência à medida em que se contrapõe às políticas isolacionistas e de embate ao multilateralismo dos Estados Unidos, lideradas por Donald Trump. A última cúpula do Brics ocorreu em julho deste ano e foi sediada justamente pelo Brasil, no Rio de Janeiro. O Brasil prepara ainda uma reunião virtual com países do bloco para a segunda semana de setembro para discutir o comércio global em meio às novas tarifas norte-americanas.

A atual presidente do Banco do Brics também é brasileira. A ex-presidente da República Dilma Rousseff foi reconduzida ao cargo em março deste ano, com aval do presidente russo Vladimir Putin, como mostrou publicação da Agência Brasil.

Quem criou o conteúdo investigado pelo Comprova

A publicação foi feita por uma usuária no X que tinha 6,5 mil seguidores até a publicação deste texto. Ela se define no perfil como empreendedora, “apaixonada pela pátria e pelo conhecimento, sem partido de estimação e alérgica ao PT e ao comunismo”. A conta possui diversas publicações de teor político e de apoio a teses do grupo bolsonarista. A postagem analisada teve 148 mil visualizações até a publicação desta verificação. O Comprova tentou contato com a autora, mas o perfil no X não permite o envio de mensagens.

Por que as pessoas podem ter acreditado

A publicação usa como uma das táticas misturar informações verdadeiras, como o vídeo da CNN que mostra a abertura da cúpula da Organização para Cooperação de Xangai, com afirmações falsas, como a tentativa de expulsar Lula e o Brasil do Brics e o suposto “genocídio” na África do Sul.

A estratégia é comum em conteúdos de desinformação. As fontes das supostas informações também não são informadas. A postagem apela ainda à linguagem polarizadora, ao afirmar que “Lula é um grande problema para qualquer pessoa no mundo”.

No X, usuários fizeram comentários pedindo que o Grok, ferramenta de inteligência artificial da rede social, confirmasse se as informações eram reais, o que sugere que as pessoas podem ter acreditado na publicação. O Comprova já mostrou que esse tipo de recurso não deve ser usado para confirmar a veracidade de informações, pois pode falhar.

Fontes que consultamos: Pesquisas em veículos jornalísticos e institucionais sobre conteúdos da Organização para a Cooperação de Xangai e o Brics, e contato com o Ministério das Relações Exteriores.

Por que o Comprova investigou essa publicação: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas, saúde, mudanças climáticas, eleições e golpes virtuais e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: O Comprova já mostrou que a China não rompeu com o Brasil em meio a disputa comercial com os EUA, que o New York Times não noticiou suposta investigação de Trump contra Eduardo Bolsonaro e que Trump não ameaçou enviar tropas contra Alexandre de Moraes.

Notas da comunidade: A publicação analisada não tinha notas da comunidade até a conclusão desta verificação.