Imagem mostra boneco de plástico em protesto, e não corpo carregado só por uma mão
- Enganoso
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- Post usou uma foto feita em um ato realizado nos Estados Unidos para minimizar a extensão da pandemia do novo coronavírus
Uma fotografia que mostra uma pessoa carregando o que seria uma figura humana envolta em um saco plástico preto está sendo compartilhada nas redes sociais com o objetivo de desacreditar o número de mortes pela covid-19. A legenda da imagem diz que as pessoas estariam “levando o corpo só com uma mão” e afirma que deveriam “tentar disfarçar melhor”.
A fotografia original não mostra corpos de verdade e não foi tirada em um enterro. Ela foi registrada pelo fotógrafo Cristobal Herrera no dia 27 de maio, durante uma manifestação na cidade de Miami, nos Estados Unidos. O protesto fez um funeral simbólico, no qual os sacos plásticos representavam pessoas que haviam morrido de covid-19 no passado. Ou seja, a fotografia não mostra pessoas levando um corpo só com uma das mãos.
Até o dia 27 de maio, quando a fotografia foi feita, os Estados Unidos tinham confirmado mais de 100 mil mortes e 1,69 milhão de infecções pelo novo coronavírus de acordo com o painel mantido pela Universidade Johns Hopkins.
Por que investigamos?
O Comprova verifica conteúdo suspeito que tem grande alcance nas redes sociais. Vídeos e fotografias desacreditando a ciência e a gravidade da pandemia do novo coronavírus têm circulado nas redes trazendo desinformação para a população e dificultando o controle da doença.
Nesta verificação, a publicação analisada infere que o corpo mostrado na fotografia seria falso e utiliza essa afirmação para desacreditar o número de mortos pela pandemia. De fato, como mostramos na verificação, é um corpo “falso” – mas que não serve para provar nenhum ponto em relação ao número de mortos. O “corpo” foi feito com sacos plásticos e utilizado para representar pessoas reais que morreram por conta da covid-19 nos Estados Unidos.
Para o Comprova, o conteúdo enganoso é aquele retirado do contexto original e usado em outro com o propósito de mudar o seu significado; que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.
Como verificamos?
O Comprova fez uma busca reversa de imagem no Google e encontrou a mesma fotografia publicada em centenas de sites. As publicações mais antigas foram encontradas no site da Agência Lusa e da Agência EPA. As duas são agências de jornalismo que vendem fotografias e outros conteúdos para jornais ao redor do mundo. Em ambos os casos, a imagem estava creditada ao fotógrafo Cristobal Herrera e continha mais algumas informações — teria sido tirada no dia 27 de maio de 2020 no parque Torch of Friendship.
A partir destas informações, pesquisamos no Google sobre o evento e encontramos imagens da fotógrafa Chandan Khanna, da Agência AFP, mostrando outros ângulos do que parecia ser o mesmo evento. De acordo com a legenda, as fotografias eram de um protesto organizado pela New Florida Majority (NewFM) e os sacos plásticos pretos estariam representando corpos em um funeral simbólico. Pesquisamos nas redes sociais da NewFM e encontramos outros vídeos e fotografias dos atos realizados no dia 27 de maio. Também encontramos uma transmissão ao vivo feita neste dia a partir do parque Torch of Friendship — que, posteriormente, ficou salva como um vídeo.
Entramos em contato e conversamos com o fotógrafo Cristobal Herrera via Instagram e Facebook. Também procuramos a NewFM por Instagram e por e-mail, mas até a publicação desta verificação não recebemos resposta.
Verificação
A legenda que acompanha a fotografia afirma que a pessoa estava “levando o corpo só com uma mão”. Também diz que “podiam tentar disfarçar melhor” — esse comentário foi feito com o intuito de desacreditar a pandemia e o número de mortos pela covid-19, doença causada pelo novo coronavírus. Uma busca reversa da imagem no Google mostrou que a fotografia original foi capturada pelo fotógrafo Cristobal Herrera no dia 27 de maio de 2020 no parque Torch of Friendship, na cidade de Miami, na Florida, nos Estados Unidos.
Neste dia, o movimento estadunidense New Florida Majority (NewFM) organizou um protesto contra a reabertura da economia no estado da Flórida. Os manifestantes organizaram um funeral simbólico e colocaram sacos plásticos pretos para representar os corpos de pessoas que morreram pela covid-19. Durante o evento, eles fizeram uma transmissão ao vivo que, posteriormente, ficou salva no Facebook como um vídeo. Nela, é possível perceber que se trata do mesmo local — o parque Torch of Friendship — em que a fotografia foi tirada.
Por mensagem, o fotógrafo Cristobal Herrera confirmou que a imagem foi feita durante o protesto. “São corpos falsos. A legenda das fotografias é bem clara sobre a imagem. Mas algumas vezes isso [a confusão em relação à imagem] acontece porque as pessoas não leem as legendas”, afirmou Herrera. “Eles [os manifestantes] me disseram que foi um longo processo para fazer os corpos simbólicos”, complementou.
Em outros vídeos e fotografias feitos no mesmo dia, publicados pela NewFM e também pela Agência AFP, é possível observar os mesmos “corpos simbólicos” retratados na fotografia de Herrera.
Contexto
Desde o começo da pandemia do novo coronavírus, circulam nas redes sociais diversas narrativas que têm como objetivo negar ou relativizar os efeitos da covid-19. O Comprova já verificou publicações que, supostamente, mostravam covas abertas sem enterros, redução no número de mortes depois de operação policial e número de casos menor que o oficial.
Desta vez, a publicação verificada infere de maneira equivocada, a partir de uma fotografia verdadeira, que estariam enterrando “corpos falsos”. No começo de maio, diversas publicações que mostravam caixões vazios ou “cheios de pedras” foram checadas por agências independentes. O objetivo é desacreditar o número de mortos divulgados pelo Ministério da Saúde. Até o dia 8 de junho, o Brasil já tinha 37.134 mortos pela covid-19.
Alcance
O usuário responsável pelo post enganoso apagou a publicação, mas até isso ocorrer o conteúdo já tinha sido compartilhado mais de 10 mil vezes no Facebook.