Ônibus escolar de programa federal custam R$ 421,9 mil, e não R$ 1,8 milhão, como alega vídeo viral
- Política
- Valor citado em vídeo viral é falso. Documentos oficiais e fabricantes desmentem aumento irregular nos custos do Programa Caminho da Escola.
Diferentemente do que afirma um vídeo que circula nas redes sociais, os ônibus escolares do Programa Caminho da Escola não sofrem alteração de preço de R$ 600 mil para R$ 1,8 milhão quando são entregues a diferentes estados. O valor atualizado do veículo, segundo o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) e a fabricante Iveco, é de R$ 421.971,65, em resposta à checagem do mesmo conteúdo ao Estadão Verifica e conforme consta na Ata de Registro de Preços nº 8/2023, documento disponível no Portal da Transparência.
O conteúdo verificado mostra um homem filmando um ônibus com o logotipo do governo federal e a inscrição “Caminho da Escola”, enquanto afirma que os veículos teriam o preço aumentado irregularmente ao longo da entrega. Ele menciona que os ônibus sairiam da fábrica por R$ 600 mil e teriam a nota fiscal trocada para R$ 1,8 milhão, sugerindo desvio de recursos públicos.
Para o Comprova, a Controladoria-Geral da União (CGU) informou que o FNDE solicitou, em 2023, uma análise sobre os riscos envolvidos na definição da quantidade de veículos a serem adquiridos pela Ata nº 8/2023. O documento foi homologado em dezembro de 2023, sem constatação de impropriedades ou irregularidades. A CGU também iniciou, no segundo semestre de 2025, o planejamento de fiscalizações em nove estados, com trabalho de campo previsto para novembro.
O Tribunal de Contas da União (TCU) afirmou que não há processos em andamento sobre o tema. O único processo relacionado a ônibus escolares foi aberto em 2018 e encerrado em 2020, sem relação com o caso atual.
No vídeo, o autor diz que estaria saindo da fábrica da Mascarello, no Paraná, com destino a Recife. Em nota, a prefeitura de Recife disse que “a informação não é verdadeira, pois a última compra de veículos ocorreu no ano de 2017. Nos últimos três anos, outros três veículos foram repassados pelo governo do estado”. O município reforça, inclusive, que não há qualquer processo licitatório em curso para tal compra. O Comprova tentou contato com a empresa Mascarello e não obteve retorno.
Quem criou o conteúdo investigado pelo Comprova
A publicação investigada foi compartilhada por perfis e páginas com forte viés político, frequentemente alinhados a narrativas de oposição ao governo federal. Esses perfis costumam usar conteúdos sensacionalistas para mobilizar seguidores e gerar engajamento.
O vídeo teve 74,2 mil visualizações e 5 mil curtidas. Ao analisar os perfis que compartilham esse tipo de conteúdo, observa-se um padrão de disseminação de conteúdos que visa desacreditar instituições públicas, gerar indignação e polarização política e reforçar narrativas ideológicas alinhadas a grupos de oposição ao governo atual.
Tentamos contato com o autor do post, mas até o momento da publicação deste texto não houve retorno. O Comprova não conseguiu contatar o perfil que compartilhou o mesmo conteúdo no X, pois ele não permite envio de mensagens.
Por que as pessoas podem ter acreditado
O vídeo pode convencer porque combina recursos visuais e narrativos que sugerem autenticidade e indignação moral. O narrador grava imagens de veículos novos, destacando detalhes concretos. Ao dizer “olha aí, é zero, não tem nem placa” , cria-se a ilusão de uma prova. A fala é espontânea e coloquial, reforçando a impressão de testemunho “de dentro”.
Além disso, o uso de números aparentemente precisos (“R$ 600 mil aqui”, “1 milhão e 800 mil em Brasília”, “10 unidades só hoje”) confere uma falsa sensação de exatidão, embora não exista fonte ou documento que comprove os valores. O vídeo também menciona locais reais (Recife, Brasília, Paraná), o que ajuda a narrativa na realidade e aumenta sua verossimilhança.
Ao insinuar um esquema de corrupção (“a nota é trocada”, “imagina a farra de dinheiro”), o narrador desperta indignação moral, uma emoção para impulsionar o engajamento nas redes. A viralização do conteúdo, por sua vez, reforça o efeito de verdade: quanto mais o vídeo circula, mais ele parece legítimo, mesmo sem qualquer evidência verificável.
Fontes que consultamos: Prefeitura de Recife, Iveco, FNDE e Estadão Verifica.
Por que o Comprova investigou essa publicação: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas, saúde, mudanças climáticas, eleições e golpes virtuais e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.
Outras checagens sobre o tema: O Comprova já fez outras checagens sobre políticas educacionais e mostrou, por exemplo, que os ônibus com adesivo “Escolar” em evento do PT pertenciam a empresas privadas e estavam autorizados a transportar apoiadores da legenda. Mostrou ainda que o Fies foi criado no governo de Fernando Henrique Cardoso.
Notas da comunidade: Não havia “notas da comunidade” nas postagens no X até a publicação deste texto.