É falso que levantamento tenha revelado que Bolsonaro roubou R$ 400 bilhões dos cofres públicos
- Falso
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- É falso que um levantamento tenha revelado que o presidente Jair Bolsonaro (PL) roubou R$ 400 bilhões dos cofres públicos como afirma uma mulher em vídeo publicado no TikTok. A mesma cifra foi mencionada por Henrique Meirelles, presidente do Banco Central no governo Lula e ministro da Fazenda no governo Temer, ao falar sobre uma projeção do rombo no orçamento que o atual chefe do Executivo deixará para 2023.
Conteúdo investigado: Vídeo em que criadora de conteúdo afirma que, segundo levantamento, Jair Bolsonaro (PL) roubou R$ 400 bilhões dos cofres públicos brasileiros.
Onde foi publicado: TikTok e Instagram.
Conclusão do Comprova: É falso que o presidente Bolsonaro tenha roubado R$ 400 bilhões dos cofres públicos. Uma criadora de conteúdo desinforma ao dizer que, “segundo levantamento”, o chefe do Executivo teria roubado esse valor. A cifra a que ela se refere foi mencionada por Henrique Meirelles em uma entrevista à GloboNews em 24 de outubro, quando ele avaliava o rombo orçamentário que será deixado pelo atual governo.
Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma falsidade.
Alcance da publicação: O Comprova investiga conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Até o dia 14 de novembro, o vídeo tinha 1,5 milhão de visualizações no TikTok, 114,9 mil curtidas e mais de 58,3 mil compartilhamentos.
O que diz o responsável pela publicação: Entramos em contato com Viliane Estrela, responsável pelo vídeo, por e-mail, mas ela não havia respondido até a publicação desta verificação. Não foi possível contactá-la pelo TikTok, pois essa rede social só permite troca de mensagens entre perfis que se seguem mutuamente.
Como verificamos: O primeiro passo foi pesquisar no Google pelas palavras “Bolsonaro”, “roubou” e “R$ 400 bilhões”. Não houve qualquer resultado relacionado ao roubo dessa quantia e ao atual presidente do Brasil. A busca retornou matérias que repercutiram a fala de Henrique Meirelles (em entrevista à GloboNews, em 24 de outubro), sobre um rombo desse montante, como as da Revista Fórum e Brasil 247. Então, na sequência, procuramos por “Henrique Meirelles”, “rombo” e “R$ 400 bilhões”, e obtivemos como resultado as publicações anteriores, bem como uma matéria do Correio Braziliense sobre o assunto.
Também verificamos o Twitter de Henrique Meirelles. E, por fim, entramos em contato com a assessoria de imprensa da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), pedindo como fonte um economista para explicar os valores mencionados pelo ex-presidente do Banco Central. O indicado foi o professor Marco Antônio Rocha, do Instituto de Economia.
A análise de Henrique Meirelles
Em 24 de outubro, o ex-presidente do Banco Central escreveu em sua conta no Twitter: “Uma das primeiras missões que o próximo governante do país terá que enfrentar em 2023 será avaliar o real tamanho do rombo orçamentário que o aguarda”. Ele explica na sequência seu raciocínio e, num dos tuítes, repete o que havia falado na entrevista televisiva: “Na minha avaliação, esse rombo está muito mais próximo de R$ 400 bilhões, como estimam entidades independentes, do que dos R$ 150 bi que o atual governo está calculando”. Alguns dias depois, a declaração turbinou as postagens no Twitter com a hashtag “Jair quebrou o Brasil”. O termo foi o mais mencionado em postagens feitas durante toda a tarde do dia 4 de novembro na plataforma.
PEC kamikaze e o calote dos precatórios
Quando Henrique Meirelles citou, no Twitter, o rombo aproximado de R$ 400 bilhões, informou também que para mensurar melhor os números se faz necessária a avaliação dos efeitos de medidas que violaram o teto fiscal no atual governo, como a PEC Kamikaze e o calote dos precatórios.
A PEC criou estado de emergência e contornou a legislação eleitoral, para que o governo pudesse ultrapassar o limite de teto de gastos e conceder benefícios financeiros em ano de eleição presidencial. A PEC Kamikaze (PEC 1) substituiu a PEC dos Combustíveis (PEC 16). Esta última tinha o objetivo de criar subsídios para baixar o preço da gasolina e impactava outras ações envolvendo, por exemplo, o vale-gás. Com mais abrangência, incluindo os que existiam na PEC 16 (dos combustíveis), a PEC 1 foi criada para destravar programas sociais e aumentar a concessão de benefícios.
A PEC 1 foi articulada para garantir ajustes de valores de programas até dezembro de 2022. É com ela que o governo consegue pagar, entre outros benefícios sociais, o Auxílio Brasil de R$ 600, a bolsa-caminhoneiro de R$ 1 mil e a bolsa-taxista mensal de R$ 200 até o fim do ano. Além disso, a proposta também incluiu o vale-gás com valor dobrado de R$ 120 a cada dois meses.
Sobre o calote dos precatórios, também citado por Meirelles, trata-se da PEC que permitiu o parcelamento no pagamento de precatórios a partir de 2022. A proposta também alterou a regra do teto de gastos.
Os precatórios são dívidas da União que envolvem pessoas físicas, jurídicas, estados e municípios reconhecidas em decisões judiciais definitivas. Elas não são mais passíveis de recursos e devem ser pagas pelo governo.
Na época em que a PEC dos Precatórios foi promulgada, em dezembro de 2021, o governo divulgou que conseguiu abrir espaço superior a R$ 106 bilhões no orçamento para pagar o Auxílio Brasil, até então de R$ 400.
Desvendando os R$ 400 bilhões
Professor do Instituto de Economia da Universidade de Campinas (Unicamp), Marco Antônio Rocha explica que os valores citados por Meirelles se referem a algumas projeções sobre “buracos” existentes e despesas que não foram orçadas na Lei Orçamentária de 2023. E que não se trata de uma cifra exata. Tudo depende do que se leva em consideração, logo, o montante pode ir de R$ 150 bilhões, conforme estimativas do próprio governo, até números bem altos, como os R$ 400 bilhões cravados pelo ex-presidente do Banco Central. “Isso não é um número exato, depende do que você considera prioritário, em relação a dotações orçamentárias que seriam necessárias, fundamentais para o Estado funcionar. Mas também inclui políticas públicas, verbas de custeio, de investimento e outras despesas que podem ser postergadas, lógico que com algum prejuízo à população”, diz Rocha.
Segundo ele, o tamanho desse cálculo depende muito do que se considera como buracos no orçamento de 2023 deixados pelo governo Bolsonaro. “Se apenas o Auxílio Brasil, verbas como a Farmácia Popular, verbas de políticas que são direitos, aí a cifra é um pouco menor. Se inclui obras que serão paralisadas, recuperação de verbas de custeio, entre outras, esse número pode até chegar a um valor superior a R$ 400 bilhões”, afirma Marco Antônio Rocha.
Os valores serão conhecidos com o trabalho da equipe de transição e o rombo orçamentário deverá receber uma complementação que dependerá também da negociação política feita pelo futuro governo. “Mesmo a cifra não chegando a R$ 400 bilhões, pode-se dizer que os buracos no orçamento de 2023 deixados pelo governo Bolsonaro foram bem altos, na casa de algumas centenas de bilhões”, ressalta o professor da Unicamp. “Depende do cálculo que se faz e da forma como se olha o problema, incluindo questões que são promessas de campanha, eventualmente do futuro governo, que precisam de complementação orçamentária também. Mas, não incluindo as futuras promessas de campanha, a cifra já se aproxima do valor de R$ 400 bilhões, de algumas centenas de bilhões.”
O que pode ser considerado “rombo” nas contas públicas
“O governo não tem um cofre em que ele saca dinheiro e, de repente, o dinheiro some. Todas as despesas têm que ser orçadas e negociadas com o Congresso. Quando Bolsonaro joga uma lei orçamentária que é muito aquém da necessidade, ele empurra a negociação para o outro governo. E o outro governo terá que negociar esse espaço orçamentário”, explica o docente do Instituto de Economia da Unicamp, Marco Antônio Rocha. “O tamanho do rombo depende, agora, de quanto a gestão Lula está disposta a negociar em relação a esse espaço orçamentário: R$ 150 bilhões, ou, incluindo todas essas questões, uma cifra bem alta”, acrescenta.
“Isso significa que o que o novo governo vai tirar agora em termos de negociação política, precisará retornar ano que vem, por exemplo, em forma de crédito extraordinário e outras formas de negociar a complementação orçamentária”, destaca o economista da Unicamp. “Tudo depende de como se olha a política envolvida nesse acordo. Há uma dimensão política muito grande nesse processo e de como se interpreta a ideia do rombo e o tamanho dele”, lembra Marco Antônio Rocha. Isso sem perder de vista que dentro do orçamento já estão comprometidas muitas despesas relacionadas ao custeio de instituições públicas, como universidades, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). E tudo isso requer recomposição. “Se começar a colocar todas as questões, tudo que foi desmontado em termos orçamentários pelo governo Bolsonaro, se chega a uma cifra bem alta. Óbvio que o governo não precisa negociar isso tudo numa tacada só, mas é isso que define se o valor é R$ 200 bilhões, R$ 400 bilhões ou até uma cifra maior.”
Por que investigamos: O Comprova checa conteúdos suspeitos que viralizaram nas redes sociais sobre a pandemia de Covid-19, políticas públicas do governo federal e eleições presidenciais. Nesta verificação, o vídeo verificado induz quem o acessa a um entendimento de que o presidente Jair Bolsonaro roubou R$ 400 bilhões dos cofres públicos do Brasil. Material como este engana a população e colabora para o crescimento da desinformação.
Outras checagens sobre o tema: Sobre o presidente Bolsonaro, o Comprova já realizou checagens como o conteúdo apurado como falso e que concluiu que o presidente não disse que vai acabar com 13º e hora extra, ao contrário do que afirmava vídeo. Também sobre Bolsonaro, outra apuração concluiu que um vídeo foi editado para parecer que Bolsonaro apoia namoro com meninas de 10 anos. Recentemente, o Comprova também analisou e concluiu como material inventado suposto comunicado oficial da Petrobras confirmando que os preços dos combustíveis foram congelados até 30 de outubro.