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Investigado por: 2022-06-28

É falso que PT seja responsável por drone que lançou produtos químicos em Minas Gerais

  • Falso
Falso
É falso que drone que lançou produtos químicos em evento de Lula e Alexandre Kalil em Minas Gerais foi contratado pelo Partido dos Trabalhadores (PT). Em vídeo, pastor diz que investigação da Polícia Civil apontou que equipamento pertencia a uma empresa de propaganda e que operador disse à polícia que imagens seriam usadas na propaganda petista. O caso é apurado pelo Ministério Público Federal (MPF), que desmentiu a versão.

Conteúdo investigado: Vídeo em que pastor evangélico do Paraná afirma que drone usado para lançar fezes e urina em público de evento com Lula em Minas Gerais foi contratado pelo próprio PT, que pretendia usar imagens em propaganda eleitoral.

Onde foi publicado: YouTube

Conclusão do Comprova: É falso o conteúdo de um vídeo publicado no YouTube por um pastor evangélico do Paraná em que ele afirma que o drone usado para jogar fezes e urina no público de um evento com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o ex-prefeito de Belo Horizonte Alexandre Kalil (PSD) em Uberlândia (MG), no dia 15 de junho, foi contratado pelo próprio PT. O Ministério Público Federal (MPF), que investiga o caso, desmentiu a fala e disse que, “segundo o apurado até o momento, não há nenhuma indicação que sustente tais ilações”. O drone foi usado para lançar agrotóxico no local, e não fezes e urina.

A fala do pastor Sandro Rocha, que já teve outro conteúdo verificado pelo Comprova, foi feita durante uma live transmitida em 22 de junho passado. Em meio a outras declarações, Rocha usou menos de dois minutos para afirmar que foi o próprio PT quem contratou o drone “para se fazer de vítima, para fazer propaganda política contra o Bolsonaro”. Ele atribui a falsa informação à Polícia Civil de Minas Gerais, que teria prendido o operador do drone e este, por sua vez, teria dito que recebeu ordens de lançar excrementos para que o ato fosse filmado e as imagens fossem usadas na propaganda política petista.

O Comprova procurou a Polícia Civil. A corporação respondeu que, na verdade, quem investiga o caso é o Ministério Público Federal. O MPF disse que a investigação está em fase inicial, mas adiantou que a fala do pastor não se sustenta. O PT denunciou o caso ao Ministério Público Estadual em Minas Gerais e o procurador-geral, Jarbas Soares Junior, também desmentiu a falsa acusação pelo Twitter.

Fotos feitas no local no momento da prisão dos três operadores do drone mostram que o equipamento estava em uma caminhonete Hilux branca, na qual havia um adesivo do atual presidente Jair Bolsonaro (PL). As imagens foram feitas pelo fotógrafo freelancer Wladimir Raeder no momento em que a Polícia Militar de Minas Gerais prendeu os três suspeitos.

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma falsidade.

Alcance da publicação: O vídeo no YouTube que contém a declaração falsa tinha 115 mil visualizações até o final da manhã desta terça-feira (28).

O que diz o autor da publicação: O autor da publicação, o pastor evangélico Sandro Rocha, foi procurado através do e-mail oficial da Igreja do Porto de Cristo, que ele coordena, em Guaratuba, no Paraná, mas não houve resposta até a publicação desta checagem.

Como verificamos: Primeiro, buscamos no Google pelas palavras “drone”, “PT”, “Lula”, “Kalil”, “Minas Gerais”, “Polícia Civil” e “presos”. O resultado levou a reportagens sobre o ataque feito com o lançamento de um produto químico agrícola com o uso de um drone durante um evento com a participação de Lula e de Kalil. Dentre as publicações, as da CNN, G1, O Tempo, Estadão, Folha, Yahoo e Valor.

Inicialmente, acreditava-se que fezes e urina tinham sido jogadas no público, por conta do odor. Depois, se descobriu que o drone havia jogado um agrotóxico no público. Três pessoas foram presas em flagrante pela Polícia Militar de Minas Gerais, mas foram liberadas após assinarem um Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO).

O Comprova, então, passou a buscar reportagens sobre os presos na ocasião. Foram três homens: Rogério Luiz Parreira, Charles Wender Oliveira Souza e Daniel Rodrigues de Oliveira. Nenhuma das matérias citava participação do PT ou mencionava que eles eram apenas operadores do drone por trás de uma empresa de propaganda.

Uma das matérias, publicada pelo Diário do Centro do Mundo (DCM), mostra uma fotografia de uma caminhonete Hilux branca com drones na carroceria e um adesivo do presidente Bolsonaro na parte de trás, pouco abaixo do nome e do modelo do carro – do lado direito.

O Comprova, então, buscou informações sobre o carro e procurou por outras imagens do evento que também mostrassem o mesmo veículo, o que levou a fotos feitas pelo fotógrafo freelancer Wladimir Raeder. A reportagem entrou em contato com o fotógrafo, que enviou três fotos feitas no local durante a prisão em flagrante do suspeito – uma mostra o adesivo e outra mostra a placa do carro.

Foram procuradas ainda as polícias Civil e Militar de Minas Gerais, o Ministério Público Federal em Minas, a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) – que regulamenta os drones –, o PT e acessado o perfil no Twitter do procurador-geral de Justiça de Minas Gerais, Jarbas Soares Junior, além do autor do vídeo.

O ataque com drone

O lançamento de um produto químico com drone durante um evento político em Minas Gerais aconteceu no dia 15 de junho deste ano, na Universidade do Triângulo Mineiro (UniTri), na cidade de Uberlândia. O evento de Lula como pré-candidato à presidência da República contou também com a participação de Alexandre Kalil, que é pré-candidato ao governo do estado de Minas e tem apoio do petista. A princípio, as pessoas atingidas gritavam que estavam jogando fezes e urina, mas a Polícia Militar informou se tratar de um produto agrícola.

Três homens foram presos em flagrante no local pela PM. Eles estavam em uma caminhonete Hilux branca com drones na carroceria e disseram que tinham jogado veneno no público. Um vídeo publicado nas redes sociais mostra as mãos de um homem operando o drone, enquanto eles conversam e dão risada sobre o ato. Em dado momento, um deles diz para aumentar a vazão do produto, enquanto o outro responde que está no máximo e que só jogou dois litros. Eles riem ao constatarem que as pessoas estão gritando. Um dos homens diz para jogar o produto no palco e na arquibancada.

Uma foto divulgada pela Polícia Militar de Minas Gerais foi usada pela imprensa local, mas não mostra informações como a placa do carro, apenas a cor. O drone está na carroceria do veículo que, segundo mostram a foto publicada pelo DCM e as outras, feitas pelo fotógrafo Wladimir Raeder, tem placa de Itumbiara (GO), cidade a 133 quilômetros de Uberlândia. A informação foi acessada pelo Comprova através do aplicativo Sinesp Cidadão, do Ministério da Justiça e Segurança Pública.

Preso por estelionato

Um dos suspeitos presos em flagrante no local se chama Rodrigo Luiz Parreira, de 38 anos. Agropecuarista, ele é conhecido como “Rodrigão Treta” e já possui passagens pela polícia, inclusive uma condenação em primeira instância por estelionato em Minas Gerais e outra por roubo em Goiás, onde nasceu.

Pelo crime de estelionato, Parreira foi condenado a dois anos e seis meses de prisão, mas a pena foi convertida em alternativa. Ele foi acusado de integrar uma quadrilha de desvio de cargas. Durante o processo, disse que era “perseguido” pela polícia. À Folha e ao Estadão, o advogado de Parreira não se manifestou sobre a prisão por estelionato, disse que o cliente é réu primário e que já foi absolvido de uma condenação.

Ele se refere, provavelmente, a uma ação em que o Ministério Público de Minas Gerais denunciou o cliente, junto com outras pessoas, de intermediar a venda de uma carga roubada de uma grande loja de roupas em um posto de combustíveis de Jaraguá (GO). O juiz que o absolveu, Márcio José Tricotti, de Uberlândia, disse que as provas eram frágeis. A sentença ainda pode ser alvo de recurso.

Investigação do MPF e MP-MG

No vídeo aqui investigado, o pastor evangélico atribui à Polícia Civil de Minas Gerais a informação de que o drone teria sido contratado pelo próprio PT para “se fazer de vítima”. Contudo, não é a Polícia Civil que investiga o caso, e sim o Ministério Público Federal, já que o caso, a princípio, envolve drone, que é regulamentado pela Anac, na esfera federal.

Mesmo assim, o Comprova consultou a Polícia Civil sobre as declarações do pastor. A corporação respondeu por e-mail que “a investigação ficou a cargo do Ministério Público Federal por se tratar, a matéria, de competência da Justiça Federal”.

Também por e-mail, o MPF em Minas respondeu que, “até o momento, não há nenhuma indicação que sustente tais ilações”, em referência às afirmações feitas pelo pastor.

O Partido dos Trabalhadores, acusado pelo autor do vídeo de ter contratado uma empresa de propaganda para lançar o produto por meio de drone e usar as imagens em peças de campanha, negou as acusações. “O PT não contratou as pessoas, a acusação é caluniosa. As pessoas que operavam o drone foram presas no dia e o PT acompanha o caso para que elas sejam punidas”, disse o partido, através da assessoria de imprensa.

Na ocasião, o PT acionou o Ministério Público Estadual (MPMG), que também investiga o episódio. No Twitter, o procurador-geral de Justiça no Estado, Jarbas Soares Junior, também desmentiu a acusação feita no vídeo.

A denúncia ao MPMG foi feita pelo deputado federal Reginaldo Lopes (PT-MG) no dia 20 de junho. Segundo o procurador-geral, o caso foi sorteado para o promotor Marco Aurélio Nogueira, que está apurando a denúncia.

A Anac informou que, até o momento, não foi acionada pelos investigadores do caso, mas que “está à disposição para prestar os esclarecimentos necessários, caso seja demandada”.

Foto mostra adesivo de Bolsonaro

O Diário do Centro do Mundo, um portal digital que se identifica como sendo de esquerda, publicou com exclusividade uma imagem da picape onde estava o drone usado na ação. O carro possui um adesivo com o rosto do presidente Jair Bolsonaro. O site atribuiu a informação e a fotografia em que aparece nitidamente o adesivo a um dos policiais que participou da abordagem e que pediu para não ser identificado.

O Comprova consultou a Polícia Militar sobre a alegação do vídeo. Depois, solicitou informações também sobre eventuais fotografias feitas pela corporação que mostrassem o adesivo. Em nota, a PM respondeu apenas que o caso foi encaminhado ao MPF em Uberlândia, mas não respondeu sobre imagens.

Entretanto, uma matéria publicada pelo G1 Triângulo e Alto Parnaíba usava uma fotografia do momento da prisão, creditada ao fotógrafo Wladimir Raeder.

| Polícia Militar de Minas Gerais prendeu em flagrante três suspeitos de operar o drone. Crédito: Wladimir Raeder

A reportagem entrou em contato com o fotógrafo e solicitou imagens feitas no local no dia do ato. Raeder as enviou à equipe, junto com os metadados. As fotos foram feitas no dia 15 de junho de 2022 às 16:23:38 e às 16:23:56, como mostram os metadados abaixo:

O fotógrafo explicou que aguardava o início do evento quando notou uma movimentação e correu para ver o que estava acontecendo. Foi quando ele subiu num muro de um condomínio fechado e conseguiu registrar o momento em que policiais a bordo de duas viaturas da PM de Minas Gerais prenderam em flagrante três suspeitos de operar o drone.

Mesmo com baixa nitidez por causa do zoom máximo, é possível observar em duas das imagens enviadas pelo fotógrafo tanto a placa do carro quanto o adesivo de Bolsonaro que aparecem na foto publicada pelo DCM (clique para comparar as fotos). A marca de poeira que aparece um pouco acima do nome do carro também é similar.

| Uma das fotos enviadas por Wladimir Raeder mostra placa do veículo e marca de poeira, que também aparecem na imagem do DCM. A outra mostra partes do drone. Crédito: Wladimir Raeder

Por que investigamos: O Comprova investiga conteúdos suspeitos sobre a pandemia de covid-19, políticas públicas do governo federal e as eleições presidenciais de 2022 que viralizaram nas redes sociais. O vídeo aqui verificado traz informações falsas a respeito de um ataque real feito em um evento de um pré-candidato à presidência da República e, sem provas, atribui a ação ao próprio PT. Ao dizer que a informação veio da Polícia Civil, o que não é verdade, o autor passa aos seus espectadores a falsa sensação de que a acusação tem base em fatos, o que não é a realidade aqui.

Outras checagens sobre o tema: O Comprova já mostrou como um vídeo antigo foi usado para afirmar que Lula e Alckmin foram hostilizados em Porto Alegre, que um protesto de indígenas na Bahia era por melhorias na educação, e não por verba para ato contra Bolsonaro, e que pessoas gritavam a favor de Lula e não contra ele em vídeo na Sapucaí. O mesmo conteúdo aqui verificado já foi checado pelo Boatos.Org, pela agência Aos Fatos e pela AFP Checamos.

O autor do vídeo já foi verificado pelo Comprova. Em outro vídeo, ele disse que “a maior reserva de gás natural do mundo” foi encontrada no Paraná durante o governo Lula, mas que o ex-presidente criou o Parque Nacional do Iguaçu no local para impedir a exploração da commodity e privilegiar a compra de gás da Bolívia, em benefício do ex-presidente boliviano Evo Morales. O Comprova mostrou que a afirmação era falsa e que o Parque Iguaçu, além de não ter reserva de gás, foi criado por Getúlio Vargas, não por Lula.