O Projeto Comprova é uma iniciativa colaborativa e sem fins lucrativos liderada pela Abraji e que reúne jornalistas de 41 veículos de comunicação brasileiros para descobrir, investigar e desmascarar conteúdos suspeitos sobre políticas públicas, eleições, saúde e mudanças climáticas que foram compartilhadas nas redes sociais ou por aplicativos de mensagens.
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Política

Investigado por: 2023-10-20

Biden não disse que Lula deveria se preocupar com comida para brasileiros em vez da guerra

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Post engana ao afirmar que Joe Biden, presidente dos Estados Unidos, teria dito ao presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que ele deveria se preocupar em colocar comida nas mesas dos brasileiros, em vez de se preocupar com a guerra. A mensagem viralizou durante os embates entre os dois líderes a respeito da guerra entre Hamas e Israel. Há uma afirmação parecida, feita por um conselheiro de Biden em abril deste ano, no contexto da guerra entre Rússia e Ucrânia.

Conteúdo investigado: Vídeo no TikTok traz uma foto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e do presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, com os dizeres “Biden manda indireta para Lula e diz que ao invés dele se preocupar com a guerra ele deveria era se preocupar em por comida na mesa dos brasileiros”.

Onde foi publicado:TikTok, Instagram e YouTube.

Conclusão do Comprova: Um vídeo que viralizou após o início da guerra entre o grupo palestino Hamas e Israel engana ao afirmar que o presidente americano, Joe Biden, teria dito a Lula para se preocupar em colocar comida nas mesas dos brasileiros, e não com a guerra.

Houve um pronunciamento similar feito por um conselheiro do chefe de Estado americano em abril de 2023, mas tratava-se de uma resposta ao posicionamento de Lula a respeito da guerra na Ucrânia. Na ocasião, Juan Gonzalez, diretor sênior de Hemisfério Ocidental do Conselho de Segurança Nacional da Casa Branca, disse: “se perguntar a um brasileiro na rua qual é a opinião dele sobre a Ucrânia, ele diria que está pensando mais em colocar comida na mesa, nas chances de educação e oportunidades econômicas, do que no que alguns deles veem como um conflito na Europa que ocorre há 300 anos”.

A busca no Google pelas palavras-chave citadas na postagem, como “comida” e “guerra”, associadas aos nomes dos dois presidentes, não retornou qualquer resultado que confirmasse uma alegação recente a esse respeito. O resultado mais próximo a esse sentido é uma reportagem da Folha de S.Paulo, de abril de 2023, citando a fala de Juan Gonzalez.

As palavras-chave também foram pesquisadas em inglês e o retorno mais substancial da busca é sobre um encontro entre os dois presidentes, em 20 de setembro, em Nova York, quando ambos evitaram falar da guerra entre Rússia e Ucrânia e quando o ataque a Israel ainda não havia ocorrido.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. O post aqui verificado teve até 20 de outubro 724 mil visualizações no TikTok, 17,4 mil curtidas, além de receber 2,6 mil comentários e ser compartilhado mais de 3,8 mil vezes. No Instagram, a postagem teve mais 255 reações. No YouTube, foram 80 mil visualizações, 1 mil curtidas e 199 comentários.

Como verificamos: Utilizando o Google, buscamos combinações das palavras-chave supostamente ditas por Joe Biden, junto do nome dele e do presidente Lula. Enviamos e-mail para a Casa Branca, para a Embaixada dos Estados Unidos no Brasil e para o Ministério das Relações Exteriores brasileiro. Consultamos notícias relacionadas ao conflito entre Hamas e Israel e ao posicionamento do governo brasileiro sobre ele. Também buscamos o perfil responsável pela publicação em outras redes e encontramos contas no Kwai, Instagram e YouTube. Por fim, entramos em contato com o autor.

Biden não disse que Lula deveria se preocupar em pôr comida na mesa dos brasileiros

Uma busca no Google com as palavras-chave “guerra” e “comida”, associadas aos nomes dos presidentes Joe Biden e Lula, em português, não localizou qualquer notícia relacionada à alegação feita no post. O resultado mais próximo encontrado é uma reportagem da Folha de S.Paulo, de abril de 2023, quando uma declaração do presidente Lula a respeito de um suposto interesse dos Estados Unidos em incentivar a guerra entre Rússia e Ucrânia repercutiu no país norteamericano.

Na ocasião, o diretor sênior de Hemisfério Ocidental do Conselho de Segurança Nacional da Casa Branca, Juan Gonzalez, um dos principais conselheiros do presidente americano, Joe Biden, disse que países como o Brasil estão longe do conflito e, portanto, essa não era uma preocupação prioritária de seus cidadãos. Conforme ele, “se perguntar a um brasileiro na rua qual é a opinião dele sobre a Ucrânia, ele diria que está pensando mais em colocar comida na mesa, nas chances de educação e oportunidades econômicas, do que no que alguns deles veem como um conflito na Europa que ocorre há 300 anos”.

Gonzalez acrescentou que todos que assinaram a Carta da ONU têm responsabilidades e que países como o Brasil, que desempenham um papel de liderança pela paz, são bem-vindos, mas que a ideia de que os EUA não apoiam a paz ou têm algo a ver com o início da guerra não tem relação com os fatos. “Passamos todo o ano de 2021 tentando evitar que a guerra acontecesse e temos apoiado a paz”, declarou.

A mesma pesquisa por palavras-chave, mas feita em inglês, também não retorna declaração do presidente norte-americano no sentido alegado nas redes sociais. Os resultados mais recentes estão relacionados à notícia do encontro entre os presidentes, em 20 de setembro, em Nova York, durante a Assembleia Geral das Nações Unidas (ONU). Na ocasião, os dois evitaram falar sobre as diferenças entre os posicionamentos de ambos acerca da guerra entre Rússia e Ucrânia (PBS, AP News e ABC News). O conflito entre Hamas e Israel ainda não havia iniciado.

O Comprova procurou a Casa Branca, a Embaixada dos Estados Unidos no Brasil e o Ministério das Relações Exteriores, mas não recebeu respostas até o momento.

Como o Brasil se posiciona em relação ao conflito na Faixa de Gaza

O conteúdo aqui checado circula amplamente durante o conflito entre Hamas e Israel, dando a entender que Biden poderia ter criticado Lula sobre este assunto. O governo brasileiro, que apoia a criação de um estado palestino e a manutenção de Israel, estabelecido em 1948, tem defendido que as partes cessem ataques e que seja retomada uma negociação de paz.

Como presidente do Conselho de Segurança da ONU, o país já convocou mais de uma reunião sobre o assunto e tenta aprovar uma proposta que minimize a crise humanitária na região da Faixa de Gaza. Em 18 de outubro, foi votada a primeira, que defendeu pontos como a libertação imediata e incondicional dos reféns israelenses, a proteção de civis e da infraestrutura, a criação de um corredor humanitário, a saída segura de civis e a proteção de pessoal de assistência humanitária, além de condenar todas as formas de violência contra civis, incluindo os atos do Hamas.

A proposta recebeu 12 votos favoráveis, mas acabou vetada pelos Estados Unidos, um dos integrantes permanentes do conselho.

Conforme a embaixadora norte-americana, Linda Thomas-Greenfield, o motivo foi a resolução não mencionar claramente o direito de Israel de se defender. Já o embaixador do Brasil na ONU, Sergio Danese, disse que houve um esforço para acomodar posições diferentes e até opostas, com foco na situação humanitária. A partir disso, o ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, afirmou que é preciso aguardar a evolução dos fatos e ver se há condição de apresentar nova proposta, diferente da atual.

No dia dos ataques do Hamas a Israel, em 7 de outubro, o governo brasileiro publicou nota condenando os atos e manifestando solidariedade ao povo de Israel, reiterando o compromisso com a solução de dois Estados, com Palestina e Israel convivendo em paz e segurança, dentro de fronteiras mutuamente acordadas e internacionalmente reconhecidas.

No mesmo dia, no X (antigo Twitter), Lula disse ter ficado chocado com os ataques terroristas, expressou condolências aos familiares das vítimas e reafirmou o repúdio ao terrorismo em qualquer de suas formas. Ele defendeu, ainda, a retomada das negociações que conduzam a uma solução ao conflito e que garanta a existência de um Estado Palestino economicamente viável, convivendo pacificamente com Israel.

No dia 11, Lula publicou na mesma plataforma uma carta aberta ao secretário-geral da ONU, António Guterres, e à comunidade internacional, na qual fez um apelo em defesa das crianças palestinas e israelenses. No post, ele diz ser preciso que o Hamas liberte crianças israelenses sequestradas e que Israel cesse o bombardeio para que as crianças palestinas e suas mães deixem a Faixa de Gaza.

Após a oposição criticar a postura do governo brasileiro, que não classifica o Hamas como grupo terrorista, Mauro Vieira disse, em 18 de outubro, que não adotará a classificação até que a ONU o faça, posicionamento acatado historicamente pelo Brasil em relação a assuntos dessa natureza.

O que diz o responsável pela publicação: O Comprova entrou em contato com o autor da publicação via mensagem no Instagram, mas não obteve resposta.

O que podemos aprender com esta verificação: Uma tática usada pelos agentes de desinformação é o uso de declarações de autoridades sem a indicação da fonte. Neste caso, uma declaração com esse teor teria grande repercussão na mídia. É preciso sempre consultar veículos de comunicação de sua confiança e órgãos oficiais para atestar a veracidade da informação.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: Recentemente, o debate em torno da guerra entre Hamas e Israel, e o papel do Brasil no conflito, tem gerado desinformação. O Comprova já verificou que Lula depositou flores no Museu do Holocausto, ao contrário do que alega vídeo, que o Brasil doou R$ 25 milhões à Autoridade Palestina para ajuda humanitária, e não ao grupo terrorista e que o governo brasileiro assinou acordo de cooperação técnica com Autoridade Palestina, não com o Hamas. As relações diplomáticas do governo Lula também são constantemente alvo de desinformação. O Comprova checou que é falso que Lula não tenha sido convidado para evento de líderes promovido por Biden e que vídeo de projeção em prédio de Nova York com frase de apoio a Lula é de 2022.

Política

Investigado por: 2023-10-19

Governo Lula assinou acordo de cooperação técnica com Autoridade Palestina, não com o Hamas

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O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) não assinou, em setembro de 2023, um acordo de cooperação técnica com o grupo Hamas. O termo em questão foi celebrado com a Organização para a Libertação da Palestina (OLP), em nome da Autoridade Nacional Palestina (ANP), não tendo qualquer relação com o grupo extremista.

Conteúdo investigado: Vídeo com trecho de discurso do deputado federal Giovani Cherini (PL-RS), em sessão na Câmara dos Deputados, em que o parlamentar afirma que o Brasil está em cooperação técnica com o grupo extremista Hamas. O vídeo exibe o print de um decreto de setembro de 2023 que promulga acordo entre o governo federal e a Organização para Libertação da Palestina — a qual ele trata como “Autoridade de Libertação da Palestina”. Ele alega que o Hamas integra a organização.

Onde foi publicado: Kwai, Instagram e WhatsApp.

Conclusão do Comprova: O governo federal não firmou acordo de cooperação técnica com o Hamas, diferentemente do que alega um deputado federal. O parlamentar afirma ainda que o vínculo teria sido assinado com a “Autoridade de Libertação da Palestina”, entidade que sequer existe.

O decreto nº 11.695, de 11 de setembro de 2023, exibido pelo parlamentar em sua publicação, determina, na verdade, um acordo técnico do Brasil com a Organização para a Libertação da Palestina (OLP), em nome da Autoridade Nacional Palestina (ANP). A entidade é controlada pelo Fatah, um partido que é considerado o principal rival político do Hamas, pelo qual foi expulso da Faixa de Gaza em 2006.

Promulgado neste ano, o acordo foi aprovado também pela Câmara dos Deputados, em 8 de novembro de 2012, quando Cherini já era deputado. O parlamentar esteve presente, inclusive, na sessão em que houve aval ao texto. A votação na ocasião foi simbólica, sem registro da relação de votantes. Contudo, o partido dele à época, o PDT, encaminhou voto favorável. Além disso, ele não manifestou contrariedade ao acordo na data.

O parlamentar afirma no discurso que viralizou que a população judaica diminuiu desde que “foi criado, provisoriamente, a Palestina”. No entanto, o número de judeus no mundo aumentou desde a Segunda Guerra Mundial.

O acordo em questão pretende promover cooperação técnica em áreas consideradas prioritárias às duas partes, sem especificar quais são elas. Seriam feitas reuniões por via diplomática para estabelecer isso.

A Agência Brasileira de Cooperação (ABC), vinculada ao Ministério das Relações Exteriores, afirma que acordos desse tipo viabilizam o compartilhamento de conhecimentos, experiências e boas práticas entre países, com benefícios econômicos e sociais às duas partes. Atualmente, o Brasil tem parcerias bilaterais semelhantes à que assinou com a Autoridade Palestina com outros 80 países, incluindo Israel.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Até o dia 19 de outubro, a publicação no Kwai acumulava 3,5 mil curtidas e mais de 1,9 mil compartilhamentos. Na mesma data, a postagem no Instagram tinha 5,8 mil curtidas e havia sido compartilhada mais de 800 vezes. O conteúdo também vem sendo disseminado no WhatsApp.

Como verificamos: A verificação buscou no Google a afirmação “Brasil está em cooperação técnica com o Hamas”, o que resultou em links de checagens feitas por outros veículos (Aos Fatos, Estadão Verifica)

Também encontramos nas redes sociais do deputado federal Giovani Cherini a mesma alegação de existência do acordo entre Brasil e Hamas, feita durante pronunciamento em sessão na Câmara dos Deputados, do dia 10 de outubro.

O vídeo original do pronunciamento do parlamentar foi publicado em seu perfil oficial no Instagram. Em 18 de outubro, o deputado divulgou novo vídeo reafirmando a desinformação.

O Comprovou buscou também, via Google, o decreto nº 11.695, de 11 de setembro de 2023, que aparece como print no vídeo compartilhado nas plataformas Kwai, Instagram e WhatsApp. O documento está disponível no Diário Oficial da União, publicado em 12 de setembro de 2023.

Além disso, entramos em contato com o deputado e buscamos eventuais checagens anteriores que tratassem de conteúdos divulgados por ele.

Um levantamento da Agência Lupa de 2022 revelou que Giovani Cherini foi o parlamentar que mais disseminou desinformação sobre o coronavírus em discursos no plenário da Câmara dos Deputados ao longo de 2021. Também no primeiro ano de pandemia, o deputado afirmou, sem qualquer embasamento científico ou plausibilidade biológica, que o câncer do ex-prefeito de São Paulo Bruno Covas (PSDB), já falecido, teria sido agravado pelo uso de máscara, “porque as células precisam de respiração”.

OLP, Autoridade Palestina e Hamas não são a mesma coisa

Por ser um tema em evidência e que vem sendo utilizado por desinformadores para espalhar alegações falsas ou enganosas, o Comprova já detalhou que a Autoridade Palestina não é comandada pelo Hamas.

O deputado Giovani Cherini faz confusão ao citar a existência da suposta “Autoridade de Libertação da Palestina”, que incluiria o Hamas. O acordo técnico foi assinado, conforme destaca o decreto, com a Organização para a Libertação da Palestina (OLP), em nome da Autoridade Nacional Palestina (ANP), também conhecida apenas por Autoridade Palestina.

A OLP é um movimento político fundado em 2 de junho de 1964 por um grupo de palestinos no exílio em defesa da causa nacional palestina. Vários partidos integram a organização, entre eles o Fatah, principal líder da OLP, considerado mais moderado e com divergências históricas frente ao Hamas.

A OLP foi criada com o apoio da Liga Árabe, uma organização internacional que representa os países árabes, que dão suporte ainda hoje à causa palestina.

Já a ANP é uma autoridade que surgiu em 1994 como consequência dos Acordos de Oslo, firmados entre Israel e palestinos a contragosto do Hamas. A Autoridade tem poderes investidos pela OLP para atuar como um governo autônomo em territórios do que viria a ser o Estado da Palestina enquanto as negociações pela paz entre os dois grupos se desenvolviam.

Os Acordos de Oslo foram firmados à época com atuação de Yasser Arafat, que foi líder do Fatah, chefe da OLP em um primeiro momento e depois presidente da ANP até 2004, quando morreu.

Apesar de ter surgido com caráter provisório, por um período de cinco anos, a ANP permanece ativa até hoje, enquanto o Estado da Palestina não é reconhecido por toda a comunidade internacional. Atualmente, a ANP é comandada pelo presidente Mahmoud Abbas, também do Fatah. Ou seja, na contramão do que os posts levam a crer, a OLP, a ANP e o Hamas não são a mesma coisa.

A ANP deveria atuar como órgão interino de autogoverno em áreas da Cisjordânia e da Faixa de Gaza, conforme estabeleceram os Acordos de Oslo. Contudo, a autoridade administra hoje apenas a Cisjordânia. Já a Faixa de Gaza está sob controle do Hamas, que expulsou violentamente o Fatah da região em 2006, ao fundar um governo independente da ANP.

O grupo fundamentalista islâmico Hamas é considerado terrorista por países como Estados Unidos, Japão e as nações vinculadas à União Europeia. Já o Brasil, seguindo a classificação da ONU, não reconhece o Hamas como uma organização terrorista. Apesar do posicionamento neutro do país sobre o tema, Lula classificou os ataques recentes do grupo a Israel como “terroristas”.

O Hamas foi criado durante a Primeira Intifada palestina, um movimento contra a ocupação israelense da Cisjordânia e da Faixa de Gaza. Em sua carta fundadora, de 1988, o grupo rechaça a existência do Estado de Israel.

Deputado participou de aprovação do acordo

O decreto do governo federal que promulgou o acordo, exibido pelo deputado Giovani Cherini, menciona que o texto já havia sido aprovado pelo Congresso Nacional com o decreto legislativo nº 586, de 2012.

Esse decreto legislativo teve tramitação iniciada pela Câmara dos Deputados, com o Projeto de Decreto Legislativo (PDL) 44/2011, que foi aprovado em 8 de novembro de 2012. Na ocasião, Cherini era deputado federal e marcou presença na sessão extraordinária que tratou do texto, entre 385 parlamentares.

O portal da Câmara não exibe a lista de votantes na ocasião, uma vez que a votação foi simbólica. Neste tipo de votação, o presidente da sessão pede que os deputados que aprovam o projeto permaneçam como estão, conforme prevê o Regimento Interno da Casa.

Não há vídeos da sessão disponíveis no portal da Câmara. Há registro, contudo, de que o PDT, partido de Cherini à época, encaminhou voto favorável ao acordo. Apenas um deputado se inscreveu na ocasião como orador para falar do assunto, o delegado Protógenes (PCdoB-SP), que endossou a aprovação.

Deputado cita dados errados sobre população judaica

Giovani Cherini afirma, ainda em seu discurso sobre o suposto acordo do Brasil com o Hamas, que a população judia teria diminuído desde que “foi criado, provisoriamente, a Palestina”.

Ele não esclarece, contudo, qual o marco temporal que entende ser o de criação provisória da Palestina, definição que não tem consenso entre a comunidade internacional. Um movimento significativo mais recente sobre o tema é de 29 de novembro de 2012, quando a Organização das Nações Unidas (ONU) concedeu status de Estado observador não membro à Palestina. Israel e Estados Unidos foram contrários e até hoje mantêm a posição de não reconhecimento da existência de um Estado da Palestina.

Além disso, Cherini não cita a origem dos dados populacionais sobre os quais faz menção. Ele afirma que o número de judeus teria caído de 18 milhões para 15 milhões. A Biblioteca Virtual Judia adota estimativa mais recente, de 2022, de que há ao menos 15.253.500 judeus no mundo, maior número desde o fim da Segunda Guerra Mundial, em 1945, quando foram vítimas do Holocausto.

O que diz o responsável pela publicação: O Comprova tentou contato pelo e-mail do gabinete do deputado federal Giovani Cherini, mas não obteve retorno até esta publicação.

O que podemos aprender com esta verificação: Uma das táticas mais utilizadas por desinformadores é o uso de informações reais de forma distorcida ou intencionalmente fora do contexto para enganar e levar a uma interpretação diferente da verdadeira. A citação do Decreto 11.695/2023 gera uma suposta credibilidade. Nesses casos, é importante buscar fontes confiáveis e seguras para entender o que, de fato, está sendo informado, além de verificar se a alegação é verdadeira ou não.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: A informação de que o decreto citado no vídeo alvo desta checagem seria um acordo entre o Brasil e o Hamas já foi desmentida por Aos Fatos, Estadão e Terra. O Comprova também já mostrou que o Brasil doou R$ 25 milhões à Autoridade Palestina para ajuda humanitária, e não ao Hamas, ao verificar peça de desinformação que faz confusão semelhante entre os grupos.

 

Política

Investigado por: 2023-10-18

É enganoso vídeo que relaciona protestos em Pernambuco a Lula e à transposição do rio São Francisco

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É enganoso que o presidente Lula (PT) tenha fechado bombas da transposição do rio São Francisco que enviam água para reassentados do Sistema Itaparica, em Pernambuco. O sistema de irrigação não tem ligação com a obra da transposição – ele recebe água diretamente do Velho Chico. Além disso, o que ocorreu foi que o fornecimento de energia da região foi cortado – impedindo que as bombas enviassem água para a população e a agricultura – por um desentendimento entre a Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf) e a Eletrobras Chesf (Companhia Hidro Elétrica do São Francisco), que jogam a responsabilidade do desabastecimento uma para a outra.

Conteúdo investigado: Vídeo que circula nas redes sociais mostra diversos veículos parados em uma rodovia. O homem aparentemente responsável pela filmagem afirma que foi “fechada a estrada que passa por baixo da transposição, que acabou a água e fecharam as bombas”. Sobre a imagem, foi inserido o seguinte texto: “Acabou a água, fecharam as bomba [sic]. O amor venceu, pede água para papai do amor”. Na legenda da publicação, estão presentes hashtags como #forapt, #foralulacomunista e #foralulamentiroso.

Onde foi publicado: TikTok, Telegram e Whatsapp.

Conclusão do Comprova: Publicações relacionam, de forma enganosa, protestos realizados em Pernambuco, no dia 4 de outubro, com a transposição do rio São Francisco e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Os conteúdos investigados têm como base protestos realizados na BR-316, entre Petrolândia e Floresta, no sertão pernambucano. Sobre os vídeos, desinformadores imputaram, por meio de textos e legendas, que a razão dos protestos seriam ações de Lula, que teria supostamente fechado as bombas da transposição do rio São Francisco.

Na realidade, o protesto foi realizado por reassentados do Sistema Itaparica e teve por objetivo chamar a atenção do governo federal para a situação de desabastecimento de água nos Perímetros Irrigados da região após corte de energia elétrica no dia anterior, o que impediu o bombeamento da água.

O post já desinforma ao afirmar que o protesto tem a ver com a transposição do rio São Francisco, uma vez que o sistema não faz parte do Pisf (Projeto de Integração do São Francisco).

Além disso, como informou o G1, a energia foi cortada porque, segundo trabalhadores da região, a Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf) e a Eletrobras Chesf (Companhia Hidro Elétrica do São Francisco) não cumpriram um acordo.

Até 2014, quem administrava o Sistema Itaparica eram a Codevasf e a Chesf, mas esta última cessou a parceria. Então, quatro anos depois, a Codevasf ficou como única responsável até que, em setembro deste ano, a Codevasf determinou que a Chesf voltasse a assumir os gastos. Sobre o desabastecimento ocorrido no início de outubro, ficou um toma lá, dá cá: ao Comprova, a Codevasf afirmou que a responsabilidade pelas despesas de operação, manutenção e energia elétrica do sistema é da Chesf. Também ao Comprova, a Chesf afirmou que a responsabilidade é da Codevasf.

Então, embora a Codevasf seja uma empresa pública, do governo federal, não é possível afirmar que Lula mandou desligar a bomba.

Os reassentados permaneceram três dias sem energia nem água, quando o serviço foi restabelecido. Posteriormente, no dia 11, foi realizada uma audiência pública na Câmara dos Deputados para debater as dificuldades enfrentadas pelo Sistema Itaparica.

Nela, segundo o deputado federal Josias Gomes (PT-BA), vice-líder do PT na Câmara, ficou garantido que o Sistema Itaparica vai operar até o fim do ano e que serão discutidos os recursos para 2024.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. No TikTok, o vídeo tem 10 mil visualizações, mil curtidas e 118 comentários.

Como verificamos: Um outro post que usa trechos do mesmo vídeo da publicação verificada aqui continha outra gravação, do mesmo local, em que um homem discursava no protesto. No boné deste homem foi possível ler o nome “Rogério Novaes” e, a partir de uma busca no Google com as palavras “Rogério Novaes” e “protesto”, descobriu tratar-se do vice-prefeito de Petrolândia, em Pernambuco.

Com isso, a reportagem conseguiu concluir que a manifestação era na região de Petrolândia e encontrou notícias sobre o ato em sites locais e no G1.

O próximo passo foi mais uma busca no Google, desta vez por “sindicato”, “Petrolândia” e “protesto”. Alguns sites informavam que o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Petrolândia estava envolvido no protesto e, então, a partir de telefone informado no perfil do Instagram do órgão, a reportagem entrevistou Natanael Caetano da Silva, seu diretor-presidente.

A Codevasf e a Chesf também foram contatadas, por e-mail.

Onde e quando o vídeo foi gravado?

O vídeo foi gravado na BR-316, na altura do canal da transposição do Rio São Francisco, durante um protesto realizado por moradores dos perímetros irrigados do Sistema Itaparica, um conjunto de dez projetos de irrigação entre Pernambuco e Bahia. O sistema foi implantado pela Chesf no final da década de 1980, como compensação pelo deslocamento das populações rurais da região do lago da Usina Hidrelétrica Luiz Gonzaga.

Ao buscar o local no Google Maps, pode-se reconhecer que se trata do mesmo lugar mostrado na filmagem. Os moradores também realizaram protestos no Trevo do Ibó, no km 82 da BR-116.

Os protestos não eram contra o presidente Lula

O vídeo investigado é narrado pelo homem que realiza a filmagem. Em nenhum momento o presidente é mencionado pelo homem. No Instagram do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Petrolândia, é possível encontrar outros vídeos feitos durante os protestos, e legendas indicam que o protesto é contra a Chesf e a Codevasf, pela falta de pagamento da energia elétrica que ocasionou nos problemas enfrentados pelos moradores do Sistema.

Em entrevista ao Comprova, o presidente do sindicato, Natanael Caetano da Silva, reiterou que as manifestações foram realizadas em protesto às empresas e para pedir intervenção do governo federal na situação. “Após acontecer tudo isso, [o governo federal] paralisou duas obras da Codevasf e colocou R$ 25 milhões à disposição da Codevasf para pagar as contas de energia e fechar o resto do ano”, afirma o presidente.

“O que viralizou foi algumas falas fora de contexto de pessoas que estavam lá, e fizeram vídeos culpando o governo”, esclarece Silva.

A água utilizada nos perímetros irrigáveis é do Rio São Francisco, mas não vem da transposição. Como o nome indica, o Sistema Itaparica está ligado à antiga barragem de Itaparica, que posteriormente passou a se chamar Luiz Gonzaga. As famílias que antes habitavam a região onde hoje se encontra a barragem foram reassentadas nos projetos entre 1987 e 1988, enquanto a construção dos projetos de irrigação foi iniciada em 1994, muito antes do início da transposição do rio, que começou em 2007.

O que diz o responsável pela publicação: A reportagem tentou contato por meio de mensagem privada no TikTok, mas não obteve retorno até a publicação deste texto.

O que podemos aprender com esta verificação: Uma das táticas utilizadas por desinformadores é o uso de episódios reais, mas propagados fora do contexto original, para fazer alegações enganosas e falsas a respeito de um assunto de interesse público. Os vídeos acabam ganhando uma falsa credibilidade. Nesses casos, é importante buscar fontes confiáveis e seguras para entender o que, de fato, está sendo informado, além de verificar se a alegação é verdadeira ou não.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: A transposição do São Francisco é alvo frequente dos desinformadores. Este mês, mostramos que o protesto de garimpeiros na Bahia não foi motivado por falta de água, nem tem relação com governo Lula. Em maio, o Comprova mostrou que Bolsonaro não concluiu 84% das obras da transposição, como alegava vídeo. Anteriormente, explicamos o que é a transposição e por que ela gera dúvidas.

Política

Investigado por: 2023-10-18

Vídeo de hidrelétrica transbordando é antigo e não tem relação com desligamento de bombas do São Francisco

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Vídeo que viralizou no TikTok engana ao associar suposta ação do governo Lula (PT) em bloquear as águas do rio São Francisco com seca no Nordeste. A publicação mostra uma montagem com duas gravações com contextos diferentes e estabelece uma relação enganosa entre a falta de água e os protestos. Na verdade, há escassez de água em decorrência de seca e estiagem em alguns estados nordestinos. Além disso, o ato mostrado não tem relação com o fechamento de bombas.

Conteúdo investigado: Vídeo publicado no Tik Tok mostra o que seria uma usina hidrelétrica na região Nordeste do Brasil. Uma descrição afirma: “governo deixa o Nordeste sem água e vazão da água não tem para onde ir. Águas do São Francisco foram fechadas e está transbordando”. As imagens são da vista aérea de uma hidrelétrica, onde existem cachoeiras e muita água correndo. Posteriormente, o vídeo é cortado para outro contexto e situação, em que nordestinos estariam realizando “bloqueios em rodovias para a liberação da água do São Francisco”.

Onde foi publicado: Tik Tok.

Conclusão do Comprova: É enganoso vídeo que associa suposta ação do governo Lula (PT) em bloquear as águas do rio São Francisco com seca no Nordeste. A publicação no Tik Tok mostra uma montagem com duas gravações feitas em contextos diferentes e estabelece uma relação enganosa entre a falta de água e protestos no Nordeste. No primeiro vídeo, a abundância de água na hidrelétrica não foi causada pelo fechamento das bombas, mas sim pela cheia em função das chuvas de janeiro de 2023. Ao contrário, em outubro deste ano, foi registrada a escassez de água em decorrência de seca e estiagem em alguns estados da região. Além disso, não houve qualquer fechamento de bombas na usina e o protesto mostrado na segunda gravação não tem relação com as imagens iniciais.

Na primeira parte do vídeo verificado pelo Comprova, imagens aéreas do Complexo Hidrelétrico de Paulo Afonso, localizado no norte da Bahia, são utilizadas para afirmar que o governo Lula teria trancado as águas do São Francisco. Tais imagens retratam a hidrelétrica em um período de cheia, formando cachoeiras, algo que não tem relação com a transposição ou bloqueio das águas.

Por meio de nota, a Companhia Hidro Elétrica do São Francisco (Eletrobras Chesf), responsável pela usina hidrelétrica, confirmou que as imagens mostram o Complexo Hidrelétrico de Paulo Afonso, na Bahia. No início deste ano, o aumento da vazão do rio São Francisco fez reaparecer as cachoeiras, que possuem desnível de 80m de queda d’água. Por conta desse espetáculo natural, a região atraiu turistas, que realizaram visitas guiadas autorizadas pela própria Chesf. As quedas d’água de Paulo Afonso voltaram a ficar visíveis em 2022, após mais de dez anos de período de seca.

Já o segundo vídeo mostra, na verdade, um protesto realizado no dia 4 de outubro, no Km 82 da BR 116, próximo ao Trevo do Ibó, em Belém do São Francisco, no estado de Pernambuco. Na ocasião, agricultores dos projetos de irrigação Pedra Branca (BA), Fulgêncio (PE) e Brígida (PE) denunciaram a falta de água e energia nas localidades. Os projetos são atendidos pelo Sistema Itaparica, programa federal implementado na década de 1990 pela Chesf, para compensar as populações que tiveram que ser realocadas após a construção da usina hidrelétrica de Luiz Gonzaga, situada em Petrolândia (PE).

O corte de energia e água nos locais não têm relação com um suposto fechamento de bombas feito pelo governo federal. A responsabilidade do abastecimento, segundo o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Petrolândia (PE), é da Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf), uma empresa pública vinculada ao Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional (MDR). Até 2014, a companhia administrava o Sistema Itaparica em parceria com a Chesf. Após o fim do convênio, foi a Codevasf que assumiu a manutenção dos projetos de irrigação.

No entanto, uma resolução de 21 de setembro deste ano da Codevasf determinou que a administração do projeto voltasse para a Chesf. Ao Comprova, ambas as empresas enviaram notas atribuindo uma à outra a responsabilidade pela manutenção e operação dos projetos do Sistema Itaparica. O “toma lá, dá cá” já foi noticiado por outros veículos como a Folha de Pernambuco.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Até o dia 18 de outubro de 2023, o conteúdo investigado tinha 16,4 mil visualizações, 5,6 mil compartilhamentos e 1,5 mil comentários no Tik Tok.

Como verificamos: O Comprova analisou as imagens utilizadas em ambos os vídeos investigados e buscou identificar os locais onde foram gravadas e em quais contextos. Para analisar o primeiro vídeo, que mostra uma hidrelétrica vista de cima, a verificação usou o mecanismo de busca reversa do Google, utilizando o print do vídeo.

A pesquisa indicou imagens semelhantes e dessa forma foi possível identificar o Complexo Hidrelétrico de Paulo Afonso, localizado no norte do estado da Bahia. Foram encontradas diversas imagens, entre elas uma publicada no site da Chesf, empresa controladora da Eletrobras responsável pelo complexo.

Para analisar o segundo vídeo, a verificação usou também o mecanismo de busca reversa do Google, utilizando o print do vídeo. O resultado indicou diversas gravações semelhantes, além de uma matéria do G1 noticiando a manifestação. O ato ocorreu no dia 4 de outubro, no Km 82 da BR 116, próximo ao Trevo do Ibó, em Belém do São Francisco, no estado de Pernambuco.

O Comprova entrou em contato com o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Petrolândia (PE), uma das organizações envolvidas nos protestos. Através de visualização no Google Maps, foi possível identificar os locais onde os agricultores protestaram no dia 4 de outubro, em Belém do São Francisco. A verificação também solicitou posicionamento da Chesf e da Codevasf, empresas que até 2014 tinham convênio para manutenção dos projetos de irrigação de Pedra Branca (BA), Fulgêncio (PE) e Brígida (PE).

Além disso, o autor da postagem do Tik Tok foi contatado pelo Comprova, via mensagens no Facebook, o qual retornou à equipe. Não era possível falar com ele pelo próprio Tik Tok, pois a possibilidade de envio de mensagens estava bloqueada.

Governo Federal não “fechou” bombas do Rio São Francisco

De acordo com a assessoria de imprensa da Eletrobras Chesf, responsável pela usina, as imagens do Complexo Hidrelétrico de Paulo Afonso, na Bahia, são antigas e não mostram a grande quantidade de água represada por causa de um suposto fechamento das bombas. Segundo o órgão, a gravação retrata uma situação de cheia no rio São Francisco no início de 2023. Devido ao aumento da vazão, formam-se cachoeiras na região, que acabam se tornando pontos de visitação turística. A alegação já foi desmentida antes por outros veículos de verificação.

Apesar de a Usina Hidrelétrica de Paulo Afonso também ser de responsabilidade da Chesf , mesma empresa envolvida na falta de água nos projetos de irrigação Pedra Branca (BA), Brígida (PE) e Fulgêncio (PE), a Eletrobras nega que haja relação entre as cachoeiras e o protesto no Trevo do Ibó, no estado de Pernambuco.

Manifestação não tem relação com suposto fechamento de bombas

Em entrevista ao Comprova, o presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Petrolândia (PE), Natanael Caetano da Silva, informou que a manifestação em Belém do São Francisco, no Trevo de Ibó, foi realizada para cobrar o abastecimento das empresas Codevasf e Chesf e pedir intervenção do governo federal. “Após acontecer tudo isso, [o governo federal] paralisou duas obras da Codevasf e colocou R$25 milhões à disposição da Codevasf para pagar as contas de energia e fechar o resto do ano”, afirmou o sindicalista.

Durante audiência pública realizada pela Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural da Câmara dos Deputados, no dia 11 de outubro, Giuseppe Serra Seca Vieira, secretário nacional de Segurança Hídrica do Ministério da Integração e Desenvolvimento Regional (MDIR), afirmou que o órgão fez um aporte de R$ 20 milhões para a Codevasf.

Abastecimento nos projetos de irrigação

Pedra Branca (BA), Brígida (PE) e Fulgêncio (PE) estão entre os dez projetos de irrigação atendidos pelo Sistema Itaparica, um programa federal implementado na década de 1990 que abrange áreas localizadas entre a Bahia e Pernambuco. Ele foi criado junto à Chesf para compensar as populações que tiveram que ser realocadas após a construção da Usina Hidrelétrica de Luiz Gonzaga, em Petrolândia (PE). Os projetos têm foco na agricultura familiar.

No entanto, desde 2014, os projetos de irrigação atendidos pelo sistema vêm passando por diversos problemas. No dia 11 de outubro, uma audiência pública foi realizada pela Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural da Câmara dos Deputados, para debater as dificuldades enfrentadas pelos pequenos agricultores que vivem nas áreas cobertas pelo programa.

A Chesf repassava recursos para a Codevasf manter os projetos de irrigação, mas o convênio acabou em 2014. No ano seguinte, a Codevasf alegou problemas orçamentários e suspendeu contratos de assistência técnica. As informações foram compartilhadas pela secretária-executiva da área de gestão de empreendimentos de irrigação da Codevasf, Andréa Sousa, em depoimento durante a audiência pública na Câmara dos Deputados.

Com o fim do convênio entre a Chesf e a Codevasf, “as áreas irrigadas passaram a ser administradas pela 3ª Superintendência Regional da Codevasf, em Petrolina (PE), e pela 6ª Superintendência Regional da Codevasf, em Juazeiro (BA), com o apoio da Área de Gestão dos Empreendimentos de Irrigação da Codevasf, em Brasília”. A informação foi divulgada pelo Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional, por meio de notícia publicada no site do governo federal em dezembro de 2017.

Em nota enviada ao Comprova, a Codevasf afirmou que uma resolução da empresa, aprovada pela sua diretoria executiva em 21 de setembro deste ano, remeteu às Chesf “a responsabilidade pelas despesas de operação, manutenção e energia elétrica dos projetos, de modo a garantir o adequado funcionamento das infraestruturas de uso comum do sistema”.

A verificação também entrou em contato com a Eletrobras Chesf que, via nota encaminhada por email, alegou que “é da Codevasf a responsabilidade pela operação e manutenção dos bens que compõem a estrutura de uso comum dos perímetros irrigados de Itaparica, localizados nos estados de Pernambuco e da Bahia, bem como o pagamento da energia elétrica associada”.

O que diz o responsável pela publicação: Em resposta ao Comprova, o autor da postagem no Tik Tok afirmou que não foi ele quem gravou as imagens. Segundo o usuário, as imagens foram encontradas em blogs locais, que falam sobre o desabastecimento de água no Nordeste, algo que ele afirma não ser noticiado pela imprensa tradicional.

O que podemos aprender com esta verificação: A desinformação emerge de fontes que, por vezes, desmerecem a credibilidade dos veículos tradicionais de imprensa. É importante ficar em alerta diante de afirmações como “veja o que o jornalismo não mostra”. No caso do material verificado aqui, uma busca rápida no Google mostraria que a falta de água no Nordeste acontece em decorrência de seca e estiagem em alguns estados e não em razão do fechamento de bombas. Uma característica comum da desinformação é o uso de acontecimentos verdadeiros para estabelecer relações inadequadas que enganam e induzem leitores a interpretações erradas dos fatos. Além disso, discursos muito genéricos merecem atenção. No caso analisado, a afirmação é de que todo o Nordeste estaria sem água, uma região com diversos estados e municípios.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: Recorrentemente, a transposição do São Francisco é alvo de desinformação. Há menos de um mês, o Comprova explicou como a polarização intensifica a desinformação sobre a transposição do São Francisco, bem como já mostrou o porquê do assunto gerar dúvidas. Em uma outra verificação, já foi desmentida a informação enganosa de que Bolsonaro teria concluído 84% das obras da transposição do Rio São Francisco.

Política

Investigado por: 2023-10-18

Lula depositou flores no Museu do Holocausto, ao contrário do que alega vídeo

  • Falso
Falso
É falso que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tenha se recusado a levar flores ao Museu do Holocausto, em Jerusalém, durante visita a Israel em 2010. Reportagens, fotos e vídeos da época mostram o petista depositando uma coroa de flores no chão do Salão da Memória, onde estão gravados os nomes dos principais campos de concentração nazistas.

Conteúdo investigado: Vídeo em que um homem com sotaque estrangeiro afirma que Lula se recusou a deixar flores em visita oficial ao Museu do Holocausto, em Jerusalém. O homem também diz que o presidente levou flores ao túmulo do ex-chefe da Autoridade Nacional Palestina (ANP) Yasser Arafat. Sobre o vídeo estão imagens da bandeira de Israel e a inscrição: “e agora Lula é fake diz aí p povo…? (sic)”.

Onde foi publicado: TikTok.

Conclusão do Comprova: É falso que Lula tenha se recusado a levar flores ao Museu do Holocausto, em Jerusalém, como sugere um homem em vídeo compartilhado nas redes sociais. Em 16 de março de 2010, durante viagem presidencial a Israel, o presidente visitou o local e depositou uma coroa de flores com as cores do Brasil no chão do Salão da Memória, espaço onde estão gravados os nomes dos 22 campos de concentração e extermínio nazistas.

Lula também participou de duas cerimônias: acendeu uma chama em memória dos seis milhões de judeus mortos pelo regime nazista , para “reavivar a chama eterna”, e plantou uma muda de oliveira no bosque de Jerusalém, ação simbólica que representa a continuidade da vida e a crença divina. Foi a primeira visita de um chefe de Estado brasileiro a Israel, repetida em 2019 por Jair Bolsonaro (PL).

Além da alegação de não ter depositado flores no Museu do Holocausto, a pessoa no vídeo ainda afirma que Lula colocou flores no túmulo do líder palestino Yasser Arafat, morto em 2004. Essa afirmação é correta. De fato, o presidente foi a Ramallah, na Cisjordânia, visitar o mausoléu do ex-chefe da Autoridade Nacional Palestina (ANP) no dia seguinte à visita a Israel.

Falso: Conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma falsidade.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Até o dia 18 de outubro, a publicação no TikTok contava com 1,1 milhão de visualizações, 52,9 mil curtidas e 2.095 comentários.

Como verificamos: Em primeiro lugar, buscamos no Google pelas palavras-chave “Lula Museu do Holocausto”, encontrando uma série de verificações feitas por agências de checagem nos primeiros links de busca (UOL Confere, Boatos.org, Aos Fatos, Estadão Verifica, Lupa). Também encontramos, na mesma pesquisa, uma reportagem da antiga TV Nacional do Brasil publicada no canal oficial do governo no YouTube e matérias jornalísticas relatando a visita (g1, Jornal da Record, Folha, Efe e GaúchaZH).

Em seguida, buscamos por registros oficiais da viagem, encontrando fotografias na biblioteca da Presidência. Também tentamos entrar em contato com o autor da postagem. O Comprova ainda procurou pelo vídeo original, por meio da ferramenta de busca por imagens do Google, Yandex e TinEye, mas só encontrou o mesmo conteúdo publicado em diferentes contas do TikTok.

Lula depositou flores no Museu do Holocausto

Lula visitou o Museu do Holocausto em 16 de março de 2010, no segundo dia de sua viagem oficial a Israel. Na ocasião, o presidente compareceu ao local acompanhado da então primeira-dama, Marisa Letícia, e do então presidente israelense, Shimon Peres, ambos já falecidos.

A visita durou cerca de uma hora. É possível ver a entrega das flores nesta reportagem da TV Nacional do Brasil — que mais tarde se fundiu com a TV Brasil – publicada pelo canal oficial do governo federal.

A biblioteca da Presidência da República disponibilizou fotos da visita de Lula a Israel. Uma delas mostra o momento do depósito da coroa:

Reportagens do G1, da Folha de S.Paulo e de O Globo da época também repercutiram a visita. Na saída do local, Lula disse que conhecer o Museu do Holocausto e depositar flores era uma atitude “quase obrigatória a todo ser humano que quer governar uma nação”, segundo a BBC Brasil. O presidente ainda enfatizou: “A humanidade deve repetir todos os dias, quantas vezes for necessário, ‘nunca mais’, ‘nunca mais’, ‘nunca mais'”.

O roteiro é feito tradicionalmente pelos chefes de Estado que viajam a Israel, mas Lula foi o primeiro presidente brasileiro a realizar essa visita. Em 2019, o então presidente Bolsonaro (PL) viajou ao país e também participou das cerimônias.

Presidente também levou flores ao túmulo de Yasser Arafat

No vídeo que circula no TikTok, o homem diz que Lula teria deixado flores no túmulo do líder palestino Yasser Arafat, morto em 2004. Essa afirmação é verdadeira. No dia seguinte à viagem a Israel, o presidente desembarcou em Ramallah onde visitou o mausoléu do ex-chefe da Autoridade Nacional Palestina (ANP) e depositou uma coroa de flores no local. Durante a passagem pela Cisjordânia, Lula também se encontrou com o presidente da Autoridade Palestina, Mahmoud Abbas. As fotos da viagem, incluindo da visita ao túmulo de Arafat, estão disponíveis aqui.

À época, a Agência Brasil relatou que setores da sociedade israelense teriam ficado descontentes com o cancelamento da visita da comitiva brasileira ao túmulo de Theodor Herzl, fundador do sionismo – movimento que defende a existência de um Estado judeu e que levou à criação de Israel. Segundo a delegação brasileira, a não aceitação a esse evento foi por não ser comum e recorrente em viagens oficiais de chefes de Estado.

O que diz o responsável pela publicação: O TikTok não permite o envio de mensagens entre usuários que não se seguem mutuamente e, por isso, não foi possível contatar o autor da publicação. Tentamos buscar pelo perfil @mouraoliveira04 em outras redes sociais, mas não encontramos equivalência.

O que podemos aprender com esta verificação: Uma tática empregada por pessoas que costumam espalhar desinformação é o uso de vídeos em que não há identificação ou elementos que ajudem a reconhecer o autor das falas que estão repercutindo. Neste caso, o sotaque estrangeiro do homem que faz as acusações pode levar o espectador a crer que ele seja habitante da região e, consequentemente, tenha autoridade sobre o tema. Além disso, o conteúdo desinformativo foi compartilhado em um momento sensível, de acirramento de conflitos, o que é outra tática comum. Ao se deparar com publicações desse tipo, é importante consultar órgãos oficiais ou veículos de comunicação de sua confiança. Às vezes, uma simples busca pode sanar dúvidas sobre a veracidade do conteúdo.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: A verificação do conteúdo analisado também foi feita pelo UOL Confere. Outras publicações com a mesma alegação foram verificadas em outubro de 2023 pela Reuters e pela AFP. Além disso, em 2022, Aos Fatos, boatos.org, Estadão Verifica e Lupa também verificaram peças com a mesma temática.

Peças de desinformação envolvendo o nome do presidente Lula são comuns e já foram verificadas pelo Comprova. Recentemente, a iniciativa mostrou que o Brasil doou R$ 25 milhões à Autoridade Palestina para ajuda humanitária, e não ao Hamas, que vídeo não mostra Putin criticando Lula após encontro com Zelensky, que Lula não estava bêbado nem agarrou apoiadora como alegam publicações que usam vídeo manipulado e que vídeo de projeção em prédio de Nova York com frase de apoio a Lula é de 2022.

Saúde

Investigado por: 2023-10-17

Post de deputado engana sobre eficácia de vacinas ao usar dados imprecisos e fora de contexto

  • Enganoso
Enganoso
Post de deputado usa dados incompletos e imprecisos para sugerir de maneira enganosa que as vacinas contra a covid-19 não são eficazes. O número de mortes pela doença, isoladamente, não mostra a eficácia dos imunizantes. Seria indicado, conforme especialista consultado pelo Comprova, analisar quantos eram vacinados e não vacinados entre os mortos no período, método adotado por diversos estudos. Além disso, é preciso avaliar a taxa de letalidade, que é a quantidade de mortos entre os infectados.

Conteúdo investigado: Em post no X, deputado federal contesta a eficácia das vacinas contra a covid-19 ao fazer uso de números de mortes na pandemia em Taiwan, Austrália e Japão. Ele alega que, na ocasião em que os três países atingiram, respectivamente, uma cobertura vacinal de 78%, 77% e 81% da população, a quantidade subsequente de mortes pela doença foi muito maior do que o volume do período anterior àquelas taxas de vacinação. Em Taiwan, por exemplo, teriam ocorrido 21 vezes mais óbitos. “Aguardamos as explicações da OMS ou dos nossos ‘especialistas’ da grande mídia…”, escreve o parlamentar.

Onde foi publicado: X (antigo Twitter).

Conclusão do Comprova: Os dados de mortes por covid-19 no Japão, Taiwan e Austrália não mostram a ineficácia da vacinação contra o vírus que causa a doença, diferentemente do que afirma o deputado federal Osmar Terra (MDB-RS) em postagem.

Além de haver inconsistências nos dados apresentados pelo parlamentar, a comparação direta entre número de mortes e percentual geral de vacinados em intervalos diferentes de tempo não indica a eficácia, ou não, das vacinas. Isso porque não é possível saber pelas informações do post se os mortos por covid-19 pertenciam ao grupo de pessoas vacinadas ou que não receberam o imunizante.

Ao Comprova, o médico epidemiologista Sérgio de Andrade Nishioka, consultor da Fiocruz e da Organização Mundial de Saúde (OMS) para avaliação clínica de vacinas e professor aposentado da Universidade Federal de Uberlândia (UFU), afirma que um método adequado para análise, ao menos no período citado por Terra, seria comparar as taxas de letalidade de vacinados e não vacinados.

Um estudo sobre a pandemia na Austrália, um dos países citados por Terra, utilizou o método indicado por Nishioka e mostrou que a vacinação de idosos reduziu o risco de morte em 93% em comparação com idosos não vacinados. Entre a população geral, aqueles que não foram vacinados representaram apenas 4,6% dos casos de covid-19, mas 22,8% das mortes ocorreram entre pessoas que não receberam dose alguma.

um estudo publicado no The Lancet em agosto de 2022 mostrou que a vacinação reduziu em 67% as mortes por covid no Japão e em 33% o número de casos.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Até o dia 17 de outubro, a postagem tinha cerca de 101,1 mil visualizações, mil compartilhamentos e 3 mil likes.

Como verificamos: O Comprova encontrou a fonte dos gráficos citados pelo deputado federal Osmar Terra ao fazer a busca no Google pela frase “Total Coronavirus Deaths In Australia”, que dá título a um deles. Trata-se do site de estatísticas Worldometer. Não constam no mesmo portal, no entanto, os percentuais de vacinação mencionados pelo parlamentar, que também não descreveu a origem deles.

No site do Worldometer, há uma página dedicada a explicar as fontes e métodos do painel sobre covid-19. Ela não detalha, no entanto, a origem dos números sobre Taiwan e Japão. Há uma explicação genérica sobre ser feito uso de fontes governamentais e o monitoramento de relatórios de saúde.

A reportagem buscou então checar os números citados pelo deputado a partir dos painéis sobre covid-19 do Our World in Data e do Coronavirus Resource Center, este segundo da universidade norte-americana Johns Hopkins, que tornam explícitas com links as fontes dos dados reunidos por cada um.

O Comprova também fez uso de dados mencionados por fontes primárias para informações sobre covid-19 nos três países: o Centro de Controle de Doenças de Taiwan, o Departamento de Saúde e Envelhecimento da Austrália e o Ministério da Saúde, Trabalho e Bem-Estar do Japão.

Dados reais são diferentes do que alega post

O deputado Osmar Terra afirma que, 24 meses após o início da pandemia, a Austrália tinha 3.114 mortes por covid-19 e 77% da população completamente vacinada.

A data aludida por ele seria 11 de março de 2022, dois anos depois de a Organização Mundial de Saúde (OMS) ter declarado a pandemia de covid-19 (11 de março de 2020).

A Austrália ultrapassou o número de óbitos citado por Terra, no entanto, em 24 de janeiro de 2022, e não em 11 de março daquele mesmo ano, quando a pandemia faria 24 meses. Já o percentual da população vacinada com o esquema primário completo passou de ao menos 77% em 27 de janeiro de 2022.

O parlamentar também alega que o Japão chegou a 20.701 mortes por covid-19 e a 81% da população completamente vacinada em fevereiro de 2022, data que trata erroneamente como 24 meses após o início da pandemia (esse período só estaria completo em 11 de março daquele ano).

O Japão ultrapassou o número de óbitos citado por Terra em 15 de fevereiro de 2022. O país ainda passou a ter ao menos 81% da população vacinada com o esquema primário completo em 28 de fevereiro daquele mesmo ano.

O deputado federal ainda afirma que Taiwan contabilizou 873 mortes por covid-19 em 27 meses de pandemia, quando também alcançou 78% da população completamente vacinada.

Diferentemente do que alega o deputado, Taiwan passou desse número de mortes em 3 de maio de 2022, e não em 11 de junho daquele ano, quando fez 27 meses do início da pandemia. Além disso, o país passou a ter ao menos 78% da população com o esquema vacinal primário completo em 1º de maio de 2022.

O deputado federal Osmar Terra ainda faz menção a outros números de maneira confusa. Ele cita, por exemplo, que, nos 22 meses seguintes à data em que a pandemia completou 24 meses (ou seja, 11 de março de 2022), o número de mortes por covid-19 na Austrália teria saltado para 22.754.

No entanto, o período de 22 meses após a data de 11 de março de 2022 só estará completo em 11 de janeiro de 2024. Portanto, o intervalo citado por ele sequer está consolidado.

Comparação feita por deputado não permite contestar eficácia de vacina

O deputado também cita que, se as vacinas fossem eficazes, “deveriam diminuir as internações e mortes, mas aconteceu o contrário”. Ele não detalha, contudo, dados das internações às quais faz menção.

Além disso, os números efetivamente citados por ele não têm, isoladamente, significância estatística alguma para se chegar a uma conclusão sobre as vacinas serem eficazes ou não contra a covid-19.

O método adotado para isso por diferentes estudos é o de comparação das taxas de mortalidade (número de mortes em relação ao de pessoas) e de letalidade (número de mortes em relação ao de casos identificados) durante um mesmo período entre os não vacinados e as pessoas imunizadas, conforme explica o médico epidemiologista Sérgio de Andrade Nishioka ao Comprova.

“Começou a morrer mais, mas quem que estava morrendo? Ele [autor da postagem sobre as vacinas] não fala sobre esses dados, não dá essa informação, só diz que morreu, não diz se quem morreu foi vacinado ou não vacinado”, afirma o especialista, que reforça a necessidade da comparação: “Você só pode medir a efetividade de uma vacina se você comparar quem foi vacinado com quem não foi vacinado, senão não tem como você fazer essa comparação de uma maneira considerada válida”.

Nishioka ainda pondera que estudos mais recentes passaram a fazer comparações entre pessoas imunizadas com um primeiro esquema vacinal e as que já receberam alguma dose de reforço.

“A questão agora é que é muito difícil você ter pessoas que não foram vacinadas ou que não se infectaram naturalmente pelo Sars-Cov-2. Então, o que tem acontecido é que esses novos estudos têm utilizado o que se chama de eficácia relativa. Então você compara o vacinado com a nova vacina com o vacinado que recebeu a vacina anterior”, acrescenta o especialista.

Número de casos também aumentou, e não só o de mortes

O médico epidemiologista consultado pelo Comprova lembra ainda que Taiwan, Austrália e Japão são arquipélagos, o que permitiu a esses países um controle mais rigoroso na entrada de pessoas e, consequentemente, do coronavírus em um primeiro momento da pandemia, quando a cobertura vacinal da população ainda tinha percentuais baixos.

Taiwan, por exemplo, é reconhecida por ter tido uma resposta bem-sucedida à covid-19 durante os primeiros anos de pandemia. Foram adotadas fortes medidas de prevenção como fechamento de escolas sempre que haviam dois casos confirmados da doença, e quarentena de 15 dias para estrangeiros que chegavam ao país. No entanto, em abril de 2022, as autoridades passaram a adotar a estratégia de conviver com o vírus.

Já a Austrália ficou quase dois anos sem receber turistas internacionais. Em fevereiro de 2022, reabriu os aeroportos apenas para os viajantes vacinados. Naquele ano, o país também passou a adotar uma estratégia de convivência com o vírus, relaxando medidas de prevenção. Ambos os países citados tiveram picos de casos de covid-19 ao adotar políticas menos restritivas a respeito da pandemia.

Nishioka afirma ser necessário se atentar, portanto, ao fato de que não apenas o número absoluto de mortes, mas também o de casos em geral subiu nos intervalos de tempo comparados pela postagem do deputado federal Osmar Terra.

Isso ajuda a explicar a maior quantidade de óbitos subsequente ao alcance dos índices de cobertura vacinal destacados pelo parlamentar, embora a taxa de letalidade (relação entre mortes e número de casos identificados), não citada por ele, tenha apresentado queda junto do avanço da vacinação.

O gráfico abaixo mostra que, no Japão e na Austrália (dois dos países citados pelo deputado), a taxa de letalidade cai ao longo do tempo. O primeiro deles iniciou a aplicação de vacinas em 17 de fevereiro de 2021. Já o segundo começou o programa de vacinação no dia 21 daquele mesmo mês.

Ao analisar a taxa de letalidade, é preciso considerar ainda que, em períodos de maior pressão sobre o sistema de saúde, quando nem todas as pessoas infectadas conseguem acesso à testagem e diagnóstico, o número de casos pode estar subnotificado e, portanto, ser ainda maior.

“Além disso, foi a época em que começaram a surgir as primeiras variantes de preocupação, as que têm maior escape e que infectam mesmo as pessoas já vacinadas ou que já foram infectadas previamente”, completa o médico epidemiologista, referindo-se às ondas de covid-19 causadas, por exemplo, pela Ômicron, surgida em novembro de 2021 e contra a qual não havia imunizante específico no início de 2022.

O que diz o responsável pela publicação: O Comprova contatou o deputado Osmar Terra por email. Sua assessoria pediu número de telefone para que o deputado fizesse contato, mas ele não o fez até a conclusão desta checagem.

O que podemos aprender com esta verificação: Dados reais são frequentemente usados fora do contexto ou de maneira intencional para enganar e levar a uma interpretação diferente da verdadeira. No caso checado, o autor da publicação utiliza dados parciais e informações incompletas para inferir que as vacinas contra a covid-19 não são eficazes. Informações corretas a respeito das vacinas podem ser encontradas junto aos órgãos sanitários, sites de governos e junto à imprensa profissional.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: Desde o início da pandemia, Osmar Terra é autor recorrente de peças de desinformação sobre a eficácia de vacinas e as estratégias de combate à transmissão do coronavírus reconhecidas como efetivas pela comunidade científica, como o distanciamento social.

Em 2020, o Comprova mostrou que ele misturou, em um tuíte, dados corretos com outros imprecisos, exagerados ou não consolidados para criticar medidas de isolamento adotadas pelos estados brasileiros. Ainda naquele primeiro ano de pandemia, o deputado federal fez uso dos números de um único hospital em Porto Alegre para dizer que a covid-19 estava reduzindo em todo o Rio Grande do Sul.

Ele também já alegou enganosamente que expor a população ao vírus seria melhor que a imunização, sugeriu com dados descontextualizados que, no Rio Grande do Sul, haveria mais mortes de pessoas imunizadas e afirmou que as vacinas não tiveram impacto sobre a redução de óbitos, atribuindo isso à imunidade natural de infectados.

Recentemente, o Comprova mostrou, ao checar alegações de outros autores, que é falso que um estudo tenha provado que vacina da Pfizer modifica o código genético e que o Canadá não admitiu que as pessoas triplamente vacinadas contra a covid-19 tenham desenvolvido Aids.

Política

Investigado por: 2023-10-17

Protesto de garimpeiros na Bahia não foi motivado por falta de água, nem tem relação com governo Lula

  • Falso
Falso
É falso um vídeo compartilhado nas redes sociais mostrando, supostamente, um protesto no Nordeste do Brasil por conta da falta de água na região. O conteúdo falso sugere que o problema teria passado a ocorrer após a vitória de Lula (PT) nas eleições presidenciais de 2022. As imagens mostram, na verdade, uma manifestação realizada por garimpeiros em Santaluz, no interior da Bahia, em setembro de 2022, contra o fechamento de garimpos próximos a uma mineradora.

Conteúdo investigado: Vídeo mostra o que seria um protesto por falta d’água no Nordeste. Sobre o conteúdo, aparecem as inscrições: “Nordeste pede socorro” e “hoje só resta pedir desculpas a todos Patriota (sic)”. Um homem narra o conteúdo e, logo em seguida, aparece afirmando que a população da região não soube “agradecer os benefícios” alcançados à época do governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Ele ainda afirma que hoje resta o “sentimento de revolta”, dando a entender que o problema da falta d’água estaria ocorrendo por conta da vitória do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nas eleições de 2022.

Onde foi publicado: TikTok e Twitter.

Conclusão do Comprova: É falso que moradores da região Nordeste do Brasil tenham fechado uma estrada de terra em protesto contra o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) por conta da falta de água. Um vídeo que viralizou nas redes sociais usa imagens de uma manifestação ocorrida no interior da Bahia em 1º de setembro de 2022. Na ocasião, garimpeiros em Santaluz, cidade do interior da Bahia, fecharam o acesso à sede de uma mineradora em protesto contra o fechamento de garimpos ilegais na região, onde é feita a exploração de ouro.

O homem que narra as imagens iniciais do vídeo e que depois aparece falando para a câmera fala como se fosse um eleitor de Lula arrependido porque o presidente teria “zombado da cara dos patriotas”. Ele também passa a falsa impressão de que estaria participando do protesto, já que usa, por diversas vezes, o termo “nós”. Como foi possível verificar, os vídeos de viés político publicados por ele em sua conta no TikTok são de apoio a Jair Bolsonaro (PL) – muitos deles, inclusive, inflando a participação do ex-presidente no Projeto de Integração do rio São Francisco, obra constantemente alvo de desinformação.

No vídeo aqui investigado, ele afirma que os nordestinos foram “ingratos” com Bolsonaro e que não souberam dar valor quando tinham água no governo passado, já que agora não têm mais, o que é falso. Embora não cite diretamente o Projeto de Integração do São Francisco (PISF), também chamado de transposição do São Francisco, o argumento de que Bolsonaro levou água ao Nordeste – e que Lula a cortou – vem aparecendo em dezenas de vídeos nas redes sociais.

O Ministério da Integração Nacional e Desenvolvimento Regional (MIDR) informou que “não há nenhuma paralisação na oferta de água bruta nos estados do CE, PB, PE e RN, que são beneficiados pelo Projeto de Integração do Rio São Francisco”. Entretanto, 495 cidades de nove estados da região Nordeste tiveram situação de emergência por conta da seca ou estiagem reconhecida pelo governo federal.

O MIDR avalia a situação de cada um deles e libera recursos, de acordo com a necessidade, para “reconstrução de estruturas danificadas, socorro e assistência humanitária, restabelecimento de serviços essenciais e ações de recuperação/reconstrução”. Além disso, o órgão e o Exército realizam juntos a Operação Carro-Pipa, que atende atualmente mais de 1,5 milhão de pessoas em 416 municípios do Nordeste.

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma falsidade.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Até 17 de outubro de 2023, o conteúdo investigado tinha 134,4 mil visualizações no TikTok. Ele foi republicado no Twitter, onde apenas uma postagem acumulava mais de 184,5 mil visualizações até o mesmo dia.

Como verificamos: Primeiramente, foi feita uma busca reversa de imagens usando ferramentas como Yandex, Google Imagens e TinEye para tentar localizar registros originais do vídeo usado na publicação, sem sucesso. Em seguida, foram selecionados elementos na imagem que pudessem ajudar a identificar o local onde o vídeo havia sido gravado, a exemplo de placas de carro.

Em um trecho do vídeo, foi possível identificar um veículo de cor prata, com a placa JRO-8J27 e, com a ajuda do sistema Sinesp Cidadão, do Ministério da Justiça e Segurança Pública, descobriu-se que o carro era da cidade de Santaluz, no interior da Bahia

Depois, foram feitas pesquisas sobre protestos que pudessem ter ocorrido na mesma região onde o carro foi registrado, e assim o Comprova descobriu um protesto de garimpeiros, em setembro de 2022, em Santaluz. As imagens publicadas em matérias na imprensa local mostravam um lugar parecido com o do vídeo investigado, e elementos no vídeo também apareciam nas fotos publicadas na época.

Foi feito contato com o repórter fotográfico Raimundo Mascarenhas, do site Calila Notícias, na Bahia, que cobriu a manifestação dos garimpeiros em setembro de 2022, autor de diversas fotos do protesto, publicadas em vários sites da região.

O Comprova ainda acionou a Defesa Civil Nacional, vinculada ao MIDR, para obter informações sobre locais no Nordeste em situação de emergência por seca, estiagem ou que estejam sofrendo com problemas de abastecimento de água.

Vídeo mostra protesto de garimpeiros em 2022

Diferentemente do que diz a narração, o vídeo não mostra nordestinos arrependidos por votar em Lula protestando pelo direito à água, e, sim, garimpeiros que culpavam a mineradora Equinox Gold por uma operação da Polícia Federal ocorrida em 30 de agosto de 2022 – ou seja, antes da eleição do petista. Para eles, a empresa havia motivado a operação da PF que agiu para desarticular um garimpo ilegal que atuava há anos na região dos municípios de Santaluz, Cansanção, Monte Santo, Queimadas, Quijingue e Nordestina, todos na Bahia. Na ocasião, a PF cumpriu 12 mandados de busca em Cansanção e Monte Santo.

O local onde o protesto aconteceu, uma estrada de terra onde há diversos carros estacionados, além de pessoas bloqueando a passagem com pneus, é a via que dá acesso à sede da mineradora Equinox Gold, em Santaluz. A Equinox Gold iniciou a extração de ouro na mina de Santaluz em junho de 2021. A manifestação aconteceu a partir de 1º de setembro de 2022 e teve cobertura do site local Calila Notícias.

Em um trecho do vídeo investigado, é possível ver um Fiat Palio prata estacionado no sentido oposto no fluxo de veículos da estrada. A placa do carro é JRO-8J27, de Santaluz (BA). Foi a partir da imagem dele que o Comprova suspeitou que o protesto tivesse acontecido naquela cidade, ou naquela região. A partir da busca de notícias sobre protestos em Santaluz, os resultados foram de matérias publicadas a respeito do ato dos garimpeiros.

Além do Calila Notícias, outros sites do interior da Bahia noticiaram o protesto, incluindo o Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias de Extração, Pesquisa e Benefício de Ferro, Metais Básicos e Preciosos de Serrinha e Região (Sindimina), que também publicou fotos do episódio.

Embora o local fosse parecido, o Comprova não localizou exatamente o mesmo vídeo. Apesar disso, havia uma imagem mostrando outro carro no mesmo lugar, com placa de PKS-1732, um Jeep Compass branco de Quijingue (BA), cidade a apenas 71 quilômetros de Santaluz.

| ​​Crédito: Reprodução/Sinesp Cidadão

O Comprova conseguiu confirmar que o vídeo aqui investigado era mesmo do protesto de garimpeiros ao identificar uma árvore e uma barraca, em ângulos diferentes, tanto em uma imagem feito pelo fotógrafo Raimundo Mascarenhas, do Calila Notícia, quanto no vídeo investigado:

| Garimpeiros fecharam a estrada de acesso à mineradora Equinox Gold, em Santaluz (BA), a partir de 1º de setembro de 2022. Crédito: Raimundo Mascarenhas/Calila Notícias/Reprodução

| Vídeo publicado em conta no TikTok como sendo de protesto contra falta d’água no governo Lula mostra mesma árvore e barraca.

O repórter Raimundo Mascarenhas, do Calila Notícias, confirmou ao Comprova que o vídeo foi mesmo feito durante o protesto de garimpeiros em setembro de 2022 na estrada que dá acesso à Equinox Gold, e que um áudio falso foi inserido sobre a imagem. Ele afirmou ter acompanhado o protesto, durante todo o dia 1º de setembro do ano passado, e confirmou que não se tratava de um protesto contra o presidente Lula nem sobre acesso a água e, sim, contra o fechamento de garimpos na região.

Em 5 de setembro de 2022, o site Voz do Campo publicou o posicionamento oficial da Equinox Gold sobre a manifestação. A empresa negou que tivesse relação com a operação da PF que fechou garimpos ilegais. Na manifestação, garimpeiros diziam que não eram bandidos e pediam a legalização dos garimpos onde atuavam.

Nordeste tem 495 municípios em situação de emergência pela seca ou estiagem

Ao ser feita referência à falta de chuva, sobretudo na região Nordeste brasileira, é comum o uso das palavras seca e estiagem como sinônimos. Tecnicamente, no entanto, esses dois eventos climáticos têm características distintas.

Segundo definição da Secretaria de Defesa Civil (Sedec) do Ministério da Integração, a estiagem configura-se por um período extenso com poucas ou nenhuma chuva, que gera perda da umidade do solo maior do que a reposição. Há também, uma redução drástica ou atraso das chuvas em uma época em que foram previstas, de forma a comprometer a reserva de água da localidade. Está relacionada a dois fatores, quais sejam, o atraso superior a quinze dias do início da temporada de chuvas e a média mensal do volume de chuvas inferior a 60% das médias de longo período.

Já a seca, também segundo a Sedec, é a estiagem crônica que se prolonga. Para ser definido como seca, o fenômeno precisa trazer consequências não só ecológicas e econômicas, mas também sociais e culturais. Além da ausência de chuvas, as secas e as estiagens podem ser causadas por intervenção humana quando se maneja de modo inadequado corpos hídricos e bacias hidrográficas.

Dados do Sistema Integrado de Informações Sobre Desastres (S2ID), do Governo Federal, contabilizados até segunda-feira, 16 de outubro de 2023, revelam que 495 municípios da região Nordeste brasileira têm situação de emergência reconhecida pelo governo federal, sendo 19 em razão da seca e outros 476 por conta da estiagem.

Na Bahia, estado onde ocorreu o protesto dos garimpeiros, são 60 municípios em situação de emergência, todos por estiagem.

Após reconhecer a situação de emergência, o Ministério da Integração e Desenvolvimento Regional avalia pedidos de recursos e, conforme a necessidade, faz a liberação de valores para a reconstrução de estruturas danificadas, socorro e assistência humanitária, restabelecimento de serviços essenciais e ações de recuperação/reconstrução.

Os ministérios da Defesa e da Integração e Desenvolvimento Regional ainda mantêm uma cooperação técnica e financeira, denominada Operação Carro-Pipa, para realizar ações complementares de apoio às atividades de distribuição de água potável às populações atingidas por estiagem e seca. Isso ocorre tanto na região do semiárido nordestino, como na porção norte dos estados de Minas Gerais e Espírito Santo. Nesse contexto, o Exército Brasileiro atua como Órgão de Execução para planejamento e operacionalização das ações de apoio à distribuição de água potável.

No Nordeste, já foram utilizados 3.145 carros-pipa, que atenderam mais de 1,5 milhão de pessoas. Esta é uma das estratégias usadas para a convivência com o semiárido, assim como o Projeto de Integração do São Francisco também o é. Na região, os estados do Ceará, Paraíba, Pernambuco e Rio Grande do Norte recebem águas do Rio São Francisco por meio do PISF, e não há, segundo o MIDR, nenhuma paralisação na oferta de água bruta em nenhum desses estados.

O que diz o responsável pela publicação: O Comprova tentou contato com o autor do vídeo, identificado como “@joao.pires.ofic”, mas não há a possibilidade de enviar mensagem pelo TikTok, a menos que os usuários se sigam mutuamente.

O que podemos aprender com esta verificação: Uma das táticas utilizadas por desinformadores é o uso de episódios reais, mas propagados fora de seu contexto original, para fazer alegações enganosas e falsas a respeito de um assunto de interesse público. Os vídeos acabam gerando uma suposta credibilidade. Nesses casos, é importante buscar fontes confiáveis e seguras para entender o que, de fato, está sendo informado, além de verificar se a alegação é verdadeira ou não.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: O fornecimento de água no Nordeste é tema recorrente de desinformação em posts compartilhados nas redes sociais. O Comprova já realizou verificações relacionadas ao andamento das obras da transposição do Rio São Francisco, explicou o funcionamento do processo de captação e bombeamento de água para estados do Brasil e mostrou que o governo federal não bloqueou água na região. Também mostrou que a polarização intensifica a desinformação sobre o tema.

Contextualizando

Investigado por: 2023-10-13

Famílias retiradas de São Félix do Xingu ocupavam território indígena de forma irregular, segundo Justiça Federal

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Contextualizando
Vídeo que circula no TikTok afirma que governo federal estaria expulsando famílias que vivem há mais de 50 anos no território indígena Apyterewa, no município de São Félix do Xingu, no estado do Pará. Entretanto, o território passou por uma ação de desintrusão da terra, em cumprimento a um conjunto de decisões judiciais da Justiça Federal e do Supremo Tribunal Federal (STF). A operação consistiu na retirada de não indígenas que, segundo a Justiça, ocupam irregularmente parte das terras indígenas. O objetivo da operação foi devolver aos povos originários a posse e o direito de uso exclusivo de seus territórios. O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) abriu processo de cadastro e seleção das famílias que ocupam o território de forma irregular. O Incra informou que, caso os núcleos estejam aptos a integrar o Programa Nacional de Reforma Agrária, serão assentados em novas áreas. Até o momento, 95 famílias foram cadastradas.

Conteúdo investigado: Homem em vídeo afirma que o governo federal está expulsando famílias de um assentamento na região do Território Indígena Apyterewa, no município de São Félix do Xingu, no Pará. Na gravação, ele alega que o governo disse “não a todos os recursos que foram feitos para um acordo” e que mais de 2 mil famílias que sobrevivem no lugar estão sendo expulsas da região. As pessoas, conforme o autor do vídeo, teriam como provar que ocupam a região há 50 anos e que agora “querem que se torne terra dos originários, dos índios”.

Onde foi publicado: TikTok.

Contextualizando: No dia 2 de outubro, em cumprimento de um conjunto de decisões da Justiça Federal e do STF, foi realizada mais uma ação de desintrusão da Terra Indígena (TI) Apyterewa, situada no Pará. O objetivo da operação foi devolver aos povos originários a posse e o direito de uso exclusivo de seus territórios.

A operação consistiu na retirada de não indígenas que, segundo a Justiça, ocupam irregularmente parte das terras. O território foi homologado em 2007, antes mesmo que a tese do Marco Temporal fosse criada em 2009, com parecer da Advocacia-Geral da União (AGU) sobre a demarcação da reserva Raposa-Serra do Sol, em Roraima. Nesta época, foi usado o critério de que os povos indígenas só teriam direito de ocupar apenas as terras que ocupavam ou já disputavam em 5 de outubro de 1988, data de promulgação da Constituição. A tese foi considerada inconstitucional pelo STF em 21 de setembro de 2023.

No começo dos anos 2000, mais de mil famílias não indígenas ocuparam a terra indígena Apyterewa. Entre agosto de 2011 e maio de 2012, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) abriu processo de cadastro e seleção destas famílias.

Durante o novo processo de desintrusão, o Incra afirmou que disponibilizou uma equipe para cadastro das famílias que ocupam a área irregularmente. Até a quarta-feira,11, foram cadastradas 95 famílias, mas levantamento preliminar apontou que 10% dos cadastrados já haviam sido beneficiados pelo Incra e voltaram para a terra indígena. “O cadastro será colocado no banco de dados do Incra para avaliar a aptidão ao Programa Nacional de Reforma Agrária. As famílias aptas serão assentadas em novas áreas”, explicou por meio de nota.

O Instituto ressaltou que é responsável somente pelo cadastro para possível reassentamento, não cabendo ao órgão avaliar indenizações. Isso acontece por se tratar de uma terra indígena demarcada e a decisão judicial já está transitada em julgado para retirada dos invasores.

A operação é resultado de pedido feito pelo Ministério Público Federal (MPF) do Pará ao STF, no final de 2021, para suspender decisão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), que impedia a realização de operações para a retirada de pessoas consideradas pelo órgão como invasores da terra indígena. A sentença foi favorável à ação de reintegração de posse. Localizada no município de São Félix do Xingu, o local é de posse tradicional da etnia Parakanã. Conforme o MPF, a área vem sofrendo com o aumento gradual no número de invasores, desde sua homologação. A estimativa é que mais de 3 mil pessoas não pertencentes à etnia estejam residindo ilegalmente na região, ocupada por aproximadamente 1,4 mil indígenas.

Apesar de homologada em 2007, a TI Apyterewa é reconhecida como de posse tradicional dos indígenas desde 1992. Há pelo menos 30 anos o território é alvo de invasões para fins de grilagem de terras e mineração ilegal. Na ação de desintrusão, voltada para a retirada de não indígenas, as ocupações são classificadas pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) em duas categorias: de boa-fé e má-fé, conforme a Resolução nº. 220/2011.

Os ocupantes de boa-fé são aqueles que se instalaram no território até 31 de dezembro de 2001, data de publicação da Portaria nº 1.192/2001 do Ministério da Justiça, primeira a fixar os limites atuais da TI Apyterewa em 773 mil hectares. Conforme entendimento judicial, essas pessoas têm direito a receber indenização pelas modificações realizadas, por não saberem que se tratava de terra indígena. No entanto, todos os que ocuparam o território a partir de 2002 são considerados de má-fé, já que teriam conhecimento da área pertencente aos Parakanã. Por isso, o MPF aponta que essas famílias recebem “tratamento jurídico de invasores sem direito a indenização”.

Como o conteúdo pode ser interpretado fora do contexto original: Fora do contexto original, o vídeo pode causar interpretações distintas da realidade, sugerindo o confisco de terras de forma ilegal. Na publicação, um homem que aparece no vídeo afirma que pessoas que vivem no local há mais de 50 anos estão sendo expulsas pelo Governo Federal.

Contudo, o Comprova apurou que a retirada das pessoas faz parte de uma operação, em cumprimento de um conjunto de decisões da Justiça Federal e do STF, para retirar não indígenas que, segundo a Justiça, ocupam irregularmente parte das terras indígenas.

Ainda segundo a Justiça, o objetivo da operação foi devolver aos povos originários a posse e o direito de uso exclusivo de seus territórios.

O Incra abriu processo de cadastro e seleção das famílias que ocupam o território de forma irregular. O Incra informou que, caso os núcleos tenham aptidão para integrar o Programa Nacional de Reforma Agrária, serão assentados em novas áreas.

Por isso, antes de compartilhar qualquer conteúdo na internet, é importante conferir se as afirmações de vídeos divulgados nas redes sociais foram publicadas em canais oficiais ou por meio de veículos de comunicação.

O que diz o responsável pela publicação: O Comprova entrou em contato com a autora da postagem, mas não recebeu respostas até o momento da publicação desta reportagem. Já o homem que aparece nos vídeos não foi identificado até a publicação deste material.

Operação tentava tirar invasores de terras indígenas

Forças de segurança deflagraram, nesta segunda-feira, 2 de outubro, uma desintrusão de invasores de terras indígenas no Pará. Cerca de 150 agentes da Força Nacional e outros 60 policiais federais iniciaram a primeira etapa da operação de retirada de não indígenas da TI Apyterewa.

Segundo o governo federal, foram 9,7 mil itens apreendidos e o valor de R$ 1,8 milhão aplicado em multas aos infratores. Ao todo, três pessoas foram presas. O levantamento é resultado das ações realizadas no período de 1º a 7 de outubro. O objetivo era combater a ocupação ilegal na região. “Com apoio da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), o Governo Federal cumpre decisão judicial para garantir aos povos das duas Terras Indígenas o direito de usufruir de seu território de forma plena e integral”, afirma o governo.

Do total de itens apreendidos estão: 6 armas de fogo, 9 mil metros de arame, 150 metros de fio de alta-tensão, 202 botijões de gás, 145 litros de agrotóxico, 113 litros de gasolina, 8 máquinas leves e 2 pesados, 1 trator, 1, caminhão, 1 veículo, 2 motocicletas, 3 antenas de internet, além de maconha (70 gramas) e 3,5 metros cúbicos de madeira.

Em um trabalho conjunto, a equipe da operação também fiscalizou 15 estabelecimentos, entre comércios e propriedades, constatando 12 empregados sem registro e dois mantidos em condições de trabalho análogas à escravidão. Em nenhuma das inspeções foi constatada formalização de trabalho pelos empregadores. Foram realizadas ainda 5 notificações, 3 prisões e 1 Termo Circunstanciado de Ocorrência, referente a porte de anfetamina.

Conforme informações do jornal O Globo, um comunicado foi entregue aos invasores para que desocupassem imediatamente a área de maneira voluntária levando pertences e animais antes de a operação ter início. O panfleto cita o artigo 231 da Constituição Federal, sobre a demarcação, proteção e respeito aos bens das terras ocupadas pelos povos indígenas como obrigação da União.

Além de Secretaria Geral, Ministério dos Povos Indígenas, Funai, Força Nacional e Agência Brasileira de Inteligência (ABIN), também participam da operação Incra, Ibama, Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal, Centro Gestor e Operacional do Sistema de Proteção da Amazônia (Censipam), Comando Militar do Norte, Ministério do Trabalho e Emprego.

Território é alvo de invasão e desmatamento

O Incra informou que a Terra Indígena Apyterewa está localizada no município de São Félix do Xingu e tem área aproximada de 773 mil hectares. Ainda segundo o órgão, na TI existem 20 comunidades indígenas com uma população total estimada em 1.383 indígenas, de acordo com o censo do IBGE de 2022. O Incra comunicou que os principais atos ilícitos realizados na terra indígena, são a grilagem de terra, desmatamento e mineração ilegais.

O MPF ressalta que a permanência de ocupantes não indígenas na área aumenta o risco de conflitos e desmatamento na região. “O Ministério Público Federal está envolvido nessas ações para desintrusão das terras indígenas há mais de uma década, e é nosso interesse que isso ocorra da melhor forma possível, garantindo que todas as pessoas – todos os cidadãos brasileiros, indígenas ou não indígenas – tenham seus direitos assegurados, de forma tranquila e pacífica”, afirmou a coordenadora da Câmara de Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais do MPF (6CCR), Eliana Torelly, por meio de comunicado no site.

De acordo com levantamento do Imazon, o território é o que registrou a maior área de floresta desmatada na Amazônia Legal em 2022. Este é o 4º ano seguido que a TI Apyterewa ocupa a posição. Foi registrado um desmate de 80 km2 de vegetação em 2022. Somente nos últimos quatro anos, foram desmatados 324 km2, uma área superior ao território de Fortaleza, capital do Ceará.

Marco Temporal foi considerado inconstitucional

De acordo com a tese do Marco Temporal, rejeitada pelo STF no dia 21 de setembro de 2023, a data da promulgação da Constituição Federal, 5 de outubro de 1988, poderia ser utilizada para definir a ocupação tradicional de terras por comunidades indígenas, orientando as demarcações de territórios no Brasil.

A tese, que foi defendida por ruralistas, retrata a disputa pela posse de terra no país. Apesar da rejeição do STF, o Congresso aprovou, no dia 27 de setembro, o projeto de lei 2.903/2023 que fixa o ano de 1988 para determinar o reconhecimento de terras indígenas. O Comprova explicou o que é o Marco Temporal e o que muda com a decisão do STF e do Congresso.

Alcance da publicação: O vídeo compartilhado no TikTok somou 11,2 mil curtidas, 1778 comentários, além de 5,8 mil compartilhamentos até 13 de outubro.

Como verificamos: O Comprova consultou o Instituto Socioambiental (Organização da Sociedade Civil de Interesse Público) para compreender informações a respeito do número de habitantes, situação jurídica, área demarcada e hectares.

Também foram consultadas informações veiculadas pela imprensa relacionadas ao território de São Félix do Xingu, além de notas publicadas pelo Ministério Público Federal, Governo Federal, Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) e Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). O Incra respondeu aos questionamentos.

O Comprova também solicitou o posicionamento e informações da autora da publicação com relação às afirmações do vídeo. Utilizamos o Google Reverse para tentar identificar o homem que aparece na postagem. Contudo, a ferramenta não o reconheceu. Também não conseguimos identificar o autor do vídeo.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para publicações que obtiveram maior alcance e engajamento e que induzem a interpretações equivocadas. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: O território de São Félix do Xingu é alvo de disputa de terras e tornou-se objeto de desinformação em vídeos compartilhados nas redes sociais. O Estadão Verifica desmentiu o boato de que o presidente Lula teria fazendas na região. Com relação à demarcação de terras indígenas, o Comprova Explica detalhou o que é o Marco Temporal e o que está em risco para os povos originários.

 

Política

Investigado por: 2023-10-13

Brasil doou R$ 25 milhões à Autoridade Palestina para ajuda humanitária, e não ao Hamas

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Falso
Não é verdade que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) doou R$ 25 milhões ao grupo terrorista palestino Hamas, em 2010, durante seu segundo mandato como presidente da República. O valor foi autorizado pela Lei nº 12.292 de 2010, que prevê a doação de recursos à Autoridade Nacional Palestina, comandada pelo partido Fatah — oposição ao Hamas —, para a reconstrução da Faixa de Gaza após os conflitos entre Israel e o grupo fundamentalista islâmico.

Conteúdo investigado: Publicações afirmam que Lula doou R$ 25 milhões ao Hamas por meio de um decreto em 2010. Os posts vêm acompanhados de uma notícia publicada pela Câmara dos Deputados com o título: “Câmara aprova doação de R$ 25 milhões para a Palestina” e da captura de tela da Lei nº 12.292/2010, que autoriza o auxílio. Algumas das postagens citam antigas checagens sobre o tema, mas as categorizam como “mentiras”.

Onde foi publicado: X (antigo Twitter), TikTok e WhatsApp.

Conclusão do Comprova: Publicações afirmam, de forma enganosa, que, em 2010, o presidente Lula doou R$ 25 milhões ao grupo terrorista palestino Hamas, autor dos massacres a Israel em 7 de outubro. Os conteúdos investigados aqui têm como base uma lei, sancionada em 20 de julho de 2010, que autorizava a doação do recurso à Autoridade Nacional Palestina, órgão liderado pelo Fatah, e não para o Hamas. A verba era para auxiliar na reconstrução de Gaza, cidade inserida na região da Faixa de Gaza, após o conflito entre Israel e Hamas, entre o final de 2008 e início de 2009.

As publicações tratam a ANP e o Hamas como se fossem a mesma coisa, o que não é verdade. A Autoridade Palestina é um órgão de governo autônomo, criado para administrar territórios reivindicados por palestinos até o desenrolar das negociações de paz entre Israel e Palestina. Atualmente, o órgão controla a Cisjordânia, enquanto a Faixa de Gaza está sob domínio do Hamas.

Na época da doação, a Organização das Nações Unidas (ONU) fez um apelo para que a comunidade internacional fornecesse recursos para financiar a ajuda humanitária às vítimas. A entidade estimou que seriam necessários US$ 613 milhões para atender às demandas mais urgentes de compra de alimentos, água, abrigos, fornecimento de cuidados médicos e educação.

A desinformação já foi desmentida por agências de checagem e voltou a circular após os atentados terroristas do Hamas contra Israel, em 7 de outubro. O governo federal também publicou uma nota negando o financiamento ao grupo.

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma falsidade.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. No X, são dezenas de posts que disseminam essa desinformação. O Comprova compilou quatro, que chegaram a 101,5 mil visualizações em conjunto.

Como verificamos: O Comprova procurou informações sobre a doação citadas pelas publicações nos sites do Governo Federal e Câmara Legislativa, além de buscar a Lei nº 12.292, que trata da doação. Com buscas no Google, foi possível encontrar outras checagens sobre o tema (Estadão Verifica, Aos Fatos, UOL Confere e Fato ou Fake). O Comprova também tentou contato com os responsáveis pelas publicações.

Qual o contexto da doação?

Entre 2009 e 2010 o Congresso Nacional discutiu e aprovou um projeto de lei, de autoria do Poder Executivo, que autorizava a doação de R$ 25 milhões à Autoridade Nacional Palestina para auxiliar na reconstrução da Faixa de Gaza. A ajuda se deu no contexto do acirramento do conflito entre Israel e o grupo Hamas no território palestino, entre o final de 2008 e início de 2009, durante o segundo mandato de Lula. O confronto durou cerca de 20 dias e deixou mais de 1,3 mil mortos.

A lei foi sancionada em 2010. Na justificativa da proposta aprovada, o governo citou a estimativa da ONU de que seriam necessários US$ 613 milhões para prestar assistência nas áreas de alimentação, educação e saúde às vítimas na Palestina, além da reconstrução da estrutura da Cidade de Gaza, a maior do território.

À época, o então ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, afirmou que o recurso seria enviado a um fundo administrado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud). “É dinheiro para um fundo que vai trabalhar na reconstrução de Gaza. Não é dar dinheiro para um grupo ou outro, mas para um fundo administrado pelas Nações Unidas”, disse.

Ao contrário do que afirmam os posts, o valor não foi direcionado ao Hamas. Apesar de controlar a Faixa de Gaza desde 2007, o grupo negou qualquer interferência na gestão das doações para a reconstrução da área. Na realidade, a própria lei afirma que os recursos seriam doados à Autoridade Nacional Palestina, organização controlada pelo Fatah, partido contrário ao Hamas.

Autoridade Palestina não é comandada pelo Hamas

A Autoridade Palestina surgiu em 1994, como consequência dos Acordos de Oslo firmados entre Israel e palestinos. O órgão foi criado com o intuito de funcionar como um governo autônomo enquanto as negociações pela paz entre as nações se desenvolviam. Apesar de ter sido estabelecido que o órgão seria provisório (por um período de cinco anos), a Autoridade Palestina permanece ativa até hoje. Atualmente, ela é comandada pelo presidente Mahmoud Abbas, do Fatah, considerado um partido mais moderado e que historicamente possui divergências com o Hamas.

Em 2006, o grupo fundamentalista chegou a vencer o Fatah durante as eleições legislativas para a ANP. No entanto, os dois entraram em um conflito, que terminou com o Fatah expulso da Faixa de Gaza. O partido, por sua vez, assumiu o controle da Cisjordânia e rejeitou a administração Hamas, mantendo o domínio sobre a Autoridade Palestina. Portanto, na contramão do que os posts levam a crer, a ANP e o Hamas não são a mesma coisa.

O grupo fundamentalista islâmico Hamas é considerado terrorista por países como Estados Unidos, Japão e as nações vinculadas à União Europeia. Já o Brasil, seguindo a classificação da ONU, não reconhece o Hamas como uma organização terrorista. Apesar do posicionamento neutro do país sobre o tema, Lula classificou os ataques recentes do grupo a Israel como “terroristas”.

O texto do projeto de lei alvo de desinformação é categórico ao classificar a ANP como “único representante legítimo do povo palestino”: “O principal destinatário dos recursos doados será a Autoridade Nacional Palestina, na qualidade de único representante legítimo do povo palestino”.

Os conteúdos investigados já foram desmentidos por agências de checagem ao menos desde 2021 e voltaram a circular nesta semana, após a ofensiva do Hamas a Israel, no último dia 7 de outubro. O conflito já deixou mais de 3 mil mortos até a sexta-feira (13). O governo brasileiro condenou a ação e convocou uma reunião do Conselho de Segurança das Nações Unidas, presidido pelo Brasil, para discutir soluções.

O que diz o responsável pela publicação: Os perfis que publicaram conteúdos desinformativos sobre o tema costumam não aceitar receber mensagens pelo X. O Comprova conseguiu entrar em contato via e-mail com um dos responsáveis pela publicação. Ele seguiu afirmando, sem provas, que o recurso foi doado ao Hamas, e que a Palestina é comandada pelo grupo, o que não é verdade.

O que podemos aprender com esta verificação: Uma das táticas mais utilizadas por desinformadores é o uso de informações reais de forma distorcida para corroborar uma informação falsa. A citação da Lei nº 12.292/2010 gera uma suposta credibilidade. A menção de checagens já feitas sobre o tema, e a rejeição de que exponham a verdade, serve para desencorajar que o público busque esse trabalho para se informar.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: A suposta doação já foi verificada por G1, UOL Confere, Aos Fatos e Estadão Verifica. O envio de recursos do Brasil para o exterior é constantemente alvo de desinformação. O Comprova já checou que o país não enviou US$ 600 milhões para o agronegócio argentino e que é enganoso que o Brasil fará empréstimo à Argentina enquanto Lula bloqueia recursos da saúde e educação.

 

 

Saúde

Investigado por: 2023-10-11

Estudo não mostra que vacina da Pfizer modifica o código genético e que causará epidemias

  • Falso
Falso
É falsa a alegação de um médico de que um estudo sueco feito com a vacina da Pfizer tenha revelado que o imunizante modifica o código genético e que isso possa causar futuras epidemias de doenças autoimunes, câncer e infertilidade. Na verdade, a pesquisa mediu o efeito do imunizante em linhagens de células do fígado em laboratório, em condições experimentais, e não em humanos ou qualquer outro ser vivo, o que é apontado como limitador da pesquisa pelos próprios autores. Especialistas ouvidos pelo Comprova destacam que outros estudos atestam que não há a inoculação do DNA pela vacina. As doenças citadas pelo médico sequer aparecem no estudo.

Conteúdo investigado: Em um vídeo, o médico Alessandro Loiola afirma, citando um estudo, que vacinas vão causar, no futuro, “epidemia de doença cardiovascular, epidemia de doença autoimune, epidemia de câncer, e isso se daqui a uma ou duas gerações a gente não tiver uma epidemia de infertilidade junto, entre outras coisas” ao mudar o código genético das pessoas. Ele lista problemas de saúde que dizem estarem sendo causados pela vacina atualmente: trombofilia, trombocitopenia, AVC isquêmica, AVC hemorrágico, trombose arterial periférica, amputação de membros, mal cardíaco súbito e morte súbita. Afirma ainda que 99,9993% das crianças não apresentam qualquer sintoma ao pegarem covid-19.

Onde foi publicado: Facebook e Telegram.

Conclusão do Comprova: É falso que um estudo sueco feito com a vacina da Pfizer contra a covid-19 tenha revelado que o imunizante modifica o código genético e que isso vá causar epidemias de “doenças autoimunes, câncer e infertilidade”, como afirma médico em vídeo.

Os autores decidiram realizar uma pesquisa com células hepáticas após estudos pré-clínicos mostrarem efeitos hepáticos reversíveis em animais que receberam a injeção da Pfizer e por uma análise ter apontado que o RNA do SARS-CoV-2 pode ser transcrito reversamente e integrado no genoma das células humanas. O estudo aqui citado mede o efeito da vacina da Pfizer em linhagens de células do fígado em laboratório, em condições experimentais, e não em humanos ou qualquer outro ser vivo, o que é apontado como limitador da pesquisa pelos próprios autores. Além disso, não faz previsões a respeito de nenhuma doença.

Eles concluíram que a vacina entra nas células do fígado em meio de cultura seis horas após a administração e que surge DNA convertido a partir do RNA mensageiro em células hospedeiras, mas apontam não saber se o DNA convertido está integrado ao DNA das células, ou seja, se ele compromete o genoma. Especialistas ouvidos pelo Comprova destacam que outros estudos atestam que não há a modificação do DNA pela vacina.

Ao Comprova, a Pfizer afirmou que, até o dia 5 de outubro, distribuiu mais de 4,6 bilhões de doses da vacina ComiRNAty em mais de 181 países. Segundo a empresa, não há, até o momento, qualquer alerta de segurança ou preocupação, de modo que o benefício da vacinação segue se sobrepondo a qualquer risco.

O Ministério da Saúde reforçou que as vacinas passam por um rígido processo de avaliação de qualidade pelo Instituto Nacional de Controle de Qualidade em Saúde (INCQS) da Fundação Oswaldo Cruz, instituição responsável pela análise de qualidade dos imunobiológicos adquiridos e distribuídos pelo Sistema Único de Saúde (SUS).

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma falsidade.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. O vídeo aqui verificado teve 16,3 mil visualizações no Telegram. No Facebook, foram 31 mil compartilhamentos e 34 mil reações até 10 de outubro.

Como verificamos: Primeiro, localizamos e consultamos o estudo sobre o qual o médico se refere no vídeo. Em seguida, buscamos explicações dos autores da pesquisa sobre os resultados e de especialistas que pudessem comentá-los. Revisitamos também checagens anteriores do Comprova sobre a segurança da vacina da Pfizer e dados da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e do Ministério da Saúde, além de procurarmos a própria farmacêutica e analisarmos a bula do imunizante.

Estudo não prova mudança no código genético

No vídeo verificado, o médico cita o estudo “Transcrição reversa intracelular da vacina de mRNA BNT162b2 da Pfizer BioNTech COVID-19 in vitro em linhagem de células de fígado humano”, publicado em fevereiro de 2022, por pesquisadores da Universidade de Lund, da Suécia. O médico alega que a pesquisa demonstrou que a vacina modificou a expressão genética de uma linhagem de células, surgindo um novo padrão de DNA, e que essas alterações passaram para as células-filhas. A partir disso, o médico conclui que a vacina modifica o código genético e que isso seria transmissível à geração posterior da pessoa imunizada

Os autores investigaram o efeito do imunizante mRNA BNT162b2, fabricado pela Pfizer e BioNTech, na linhagem celular do fígado humano. Para tal, células Huh7, de uma linha originalmente retirada de um tumor de fígado, foram expostas à vacina in vitro e foi feita PCR quantitativa no RNA extraído das células. A Huh7 é uma célula imortal, capaz de se dividir indefinidamente e frequentemente utilizada como modelo para investigar cânceres e hepatite C. Já a PCR é uma proteína produzida no fígado, cuja concentração se eleva quando há um processo inflamatório em curso.

No ano passado, após o estudo ter sido acessado massivamente e discutido nas redes sociais, muitas vezes mal interpretado, a Universidade de Lund publicou uma página com explicações de dois dos autores, os professores Yang de Marinis e Magnus Rasmussen.

Conforme De Marinis, o estudo mostra que a vacina entra nas células do fígado seis horas após a administração e que surge DNA convertido a partir do RNA mensageiro em células hospedeiras, mas Rasmussen destaca que estas descobertas foram observadas em placas de Petri e em condições experimentais, portanto, não se sabe se o DNA convertido está integrado ao DNA das células, o que, sim, poderia trazer alguma consequência caso se comprovasse.

Eles ressaltam, também, as limitações do estudo. De acordo com Rasmussen, as linhagens celulares são diferentes das células dos organismos vivos, portanto, é importante que investigações semelhantes sejam feitas em humanos. “É importante ter em mente que as células do fígado neste estudo são geneticamente mais instáveis ​​do que as nossas próprias células do fígado”.

De Marinis acrescenta que não se sabe se o que foi observado nesta linhagem celular também poderia acontecer em células de outros tecidos. Por fim, eles afirmam não haver qualquer razão para alguém mudar a decisão de se vacinar com base na pesquisa e defendem a realização de mais pesquisas sobre o assunto.

Assim como os autores pontuam, Patrícia Almeida, hepatologista do corpo clínico do Hospital Israelita Albert Einstein, destaca se tratar de um estudo in vitro, ou seja, em que é utilizada uma linhagem de célula carcinogênica (retirada de um tumor) e isso foge do que acontece normalmente no corpo humano. “O hepatócito tem um ciclo de replicação completamente diferente de um ciclo de uma célula carcinogênica, que é bem mais ativa em multiplicação”, explica.

Segundo ela, o estudo demonstra que ocorre uma penetração de RNA mensageiro no tecido hepático, mas que isso já é esperado porque o fígado é quem faz a metabolização do que entra no corpo, inclusive a vacina da covid-19. Conforme ela, a pesquisa não demonstra que ocorreu uma modificação do código genético. “É encontrado RNA mensageiro na célula, mas não é comprovada a transcrição e incorporação dessa informação genética do vírus no nosso genoma, no nosso código genético, então se o estudo não traz essa informação, quiçá afirma que isso vai passar para nossa descendência”, afirma.

A hepatologista explica que o DNA está no núcleo da célula, então para o RNA mensageiro se ligar a ele, teria que passar pela membrana nuclear e, em seguida, através de um sistema de chave e fechadura, conseguir acessar o núcleo, o que não existe na vacina. “O RNA mensageiro não tem toda a informação genética viral e, mesmo que ele entrasse, haveria necessidade de tradução dessa linguagem para DNA, para que ele fosse inoculado. Ou seja, mesmo que existisse a transcrição reversa, ainda teria que ser integrado esse material genético ao DNA, para isso é necessária outra enzima, a integrase, que também não está presente na vacina. Assim, a probabilidade do RNA mensageiro alterar o DNA do paciente é nula”, diz.

O médico Renato Kfouri, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), também ressalta que não há a possibilidade de uma vacina que usa RNA mensageiro, como a da Pfizer, alterar o DNA de uma pessoa, que fica guardado no núcleo da célula. “O número de estudos é gigantesco mostrando que não há nenhuma possibilidade de incorporação de material genético no genoma de ninguém. Não modifica a expressão genética e não interfere no longo prazo”, disse.

O Comprova já esclareceu, anteriormente, que as vacinas contra a covid-19 não causam danos ao DNA de quem é vacinado.

Possibilidade de haver epidemias não é citada na pesquisa

Após afirmar que a vacina modifica o código genético, o médico cuja fala aqui é verificada declara aguardar pra ver “a desgraça que isso vai fazer no sistema linfocitário, no sistema macrofágico e no ‘sistema natural killer’”, referindo-se às células NK, que fazem parte do sistema imune e têm como função reconhecer o patógeno invasor e destruí-lo. Ele alega, com base do estudo sueco, que devem surgir epidemias de doença cardiovascular, doença autoimune e de câncer. Também especula que, em “uma ou duas gerações”, poderá haver uma epidemia de infertilidade.

Nenhuma dessas doenças ou previsões é citada no estudo. Renato Kfouri afirma que não há “plausibilidade biológica” na ideia de que a vacina poderia trazer algum transtorno no futuro, como os citados no vídeo, porque a proteína de RNA mensageiro da vacina se desintegra rapidamente.

Patrícia Almeida destaca que é impossível definir qualquer risco da vacina a partir do estudo apresentado, assim como seria impossível um estudo desta natureza apontar que existirão epidemias de outras doenças em decorrência do imunizante. A médica destaca que existem vários questionamentos em relação à genotoxicidade desde o surgimento das primeiras vacinas feitas de RNA mensageiro, mas que a inoculação do DNA é algo improvável cientificamente.

Efeitos colaterais graves e covid em crianças

Os efeitos colaterais provocados pelas vacinas podem ser encontrados nas bulas dos imunizantes, que estão disponíveis no site da Anvisa.

No caso da Pfizer, as reações mais comuns (ocorrem em 10% dos pacientes) são consideradas leves, como dor e inchaço no local de injeção, cansaço, dor de cabeça, diarreia e dor muscular, dor nas articulações, calafrios e febre. Já a miocardite (infecção das fibras do coração) e a pericardite (inflamação do revestimento externo do coração), consideradas reações graves, são tidas como muito raras, ocorrendo em menos de 0,01% dos pacientes.

Procurada pelo Comprova, a Pfizer afirma que, normalmente, os casos de pericardite e miocardite ocorreram com mais frequência em homens mais jovens, após a segunda dose da vacina e em até 14 dias após a vacinação. Reações foram menos relatadas em crianças com 5 a menos de 12 anos de idade do que em adolescentes de 12 a 17 anos. Sobre o problema, a empresa declara ainda que geralmente os casos são leves e os indivíduos tendem a se recuperar dentro de um curto período de tempo, embora não informe qual, após o tratamento padrão, que pode incluir compressa fria se houver dor no local da aplicação e ingestão de analgésico em caso de febre e dores na cabeça e no corpo, além de repouso. A Pfizer solicita que após a vacinação, a pessoa deve ficar alerta para sinais de miocardite e pericardite, como falta de ar, palpitações e dores no peito, e procurar atendimento médico imediato, caso ocorram.

A empresa disponibilizou um portal para comunicação de informações relacionadas a relatos de eventos adversos para facilitar o contato com a empresa e o monitoramento de farmacovigilância.

Diferentemente do que afirma o médico, crianças podem desenvolver doenças graves associadas à covid-19, principalmente a Síndrome Inflamatória Multissistêmica Pediátrica (SIM-P).

O Instituto Butantan ressalta que ela atinge majoritariamente crianças não vacinadas. Um estudo internacional também mostrou que crianças não vacinadas são mais propensas a desenvolver sintomas graves de covid-19, representando 90% dos casos moderados a graves da doença entre o público pediátrico.

Pfizer diz que não há alerta de preocupação

Sobre os comentários do médico, o Comprova procurou a Pfizer para que a empresa comentasse as acusações. A Pfizer informou que não comenta estudos que não sejam de autoria dela e declarou que já distribuiu, até o dia 5 de outubro, mais de 4,6 bilhões de doses da vacina ComiRNAty em mais de 181 países. Segundo a empresa, não há, até o momento, qualquer alerta de segurança ou preocupação, de modo que o benefício da vacinação segue se sobrepondo a qualquer risco.

A empresa ressalta que agências regulatórias pelo mundo como a Federal Drug Administration (FDA), a Agência Europeia de Medicamentos (EMA) e a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) autorizaram o uso da vacina contra a Covid-19, baseadas em avaliações robustas e independentes de dados científicos sobre qualidade, segurança e eficácia, incluindo o estudo clínico da fase 3. Esse estudo procedeu com a administração da vacina a milhares de pessoas, para que fosse demonstrada a sua eficácia e segurança, ou seja, que a vacina é capaz de proteger os indivíduos com o mínimo possível de reações adversas.

A empresa também informou que dados de estudos de mundo real complementam as informações dos estudos clínicos e proporcionam evidência adicional de que a vacina fornece proteção eficaz contra formas graves da doença.

Na mesma linha, segue o Ministério da Saúde, que também considera que os benefícios do uso da vacina superam os seus possíveis riscos.

De acordo com a pasta, a probabilidade de eventos adversos graves causados pelas vacinas é muito menor do que o risco das doenças e suas complicações. O ministério salienta que, como qualquer outro medicamento, as vacinas não estão livres de provocar eventos adversos e, por isso, está atento e acompanhando todos os casos notificados como Eventos Supostamente Atribuíveis à Vacinação ou Imunização, para rápida resposta à população.

Sobre reações oriundas da vacina, a Pfizer disse ao Comprova que realiza habitualmente o acompanhamento de relatos de potenciais eventos adversos de seus produtos, mantendo sempre informadas as autoridades, de acordo com a regulamentação vigente nos países onde é aplicada. A empresa disponibilizou um portal para comunicação de informações relacionadas a relatos de eventos adversos para facilitar o contato com a empresa e o monitoramento de farmacovigilância.

Ministério da Saúde reforça segurança das vacinas

Ao Comprova, o Ministério da Saúde informou que todas as vacinas ofertadas pelo Programa Nacional de Imunizações (PNI) são seguras e possuem autorização de uso pela Anvisa, após terem demonstrado eficácia e segurança favoráveis em estudos clínicos. O órgão também afirma que as vacinas passam por um rígido processo de avaliação de qualidade pelo Instituto Nacional de Controle de Qualidade em Saúde (INCQS) da Fundação Oswaldo Cruz, instituição responsável pela análise de qualidade dos imunobiológicos adquiridos e distribuídos pelo Sistema Único de Saúde (SUS).

Sobre os possíveis efeitos colaterais provocados pela ComiRNAty, a pasta declarou que a Anvisa é o órgão responsável pelo recebimento de relatórios de segurança das vacinas. Além dela, o PNI coordena o Sistema Nacional de Vigilância (SNV) de Eventos Supostamente Atribuíveis à Vacinação ou Imunização (ESAVI), cuja fonte de dados são as notificações de casos suspeitos que são realizadas por qualquer profissional de saúde do Brasil, por meio do sistema de informações e-SUS Notifica. Dessa forma, o PNI realiza o monitoramento da ocorrência de ESAVI de forma contínua e sistemática, permitindo a detecção de sinais de segurança e a avaliação do benefício-risco das vacinas recomendadas e em uso no país.

O Ministério da Saúde reforça que para a avaliação e investigação de ESAVI graves, raros ou inusitados foi criado um Comitê Interinstitucional de Farmacovigilância de Vacinas e outros Imunobiológicos (Cifavi) com participação da Anvisa, Instituto Nacional de Controle de Qualidade em Saúde (INCQS) e especialistas de diversas modalidades médicas e de saúde pública, coordenado pela pasta ministerial.

O que diz o responsável pela publicação: O Comprova enviou um pedido de posicionamento ao número de WhatsApp controlado pela equipe do médico Alessandro Loiola, que faz as alegações aqui verificadas, mas não teve resposta até o momento.

O que podemos aprender com esta verificação: O post verificado lança dúvidas sobre a segurança das vacinas contra a covid-19, que são alvo frequente de desinformação. Para passar um ar de seriedade e comprovação sobre o que está dizendo, o autor cita um estudo real, mas omitindo considerações importantes dos pesquisadores sobre o assunto, além de acrescentar informações que não estão na pesquisa. As pesquisas científicas ficam disponíveis para consulta online e, como no caso aqui verificado, frequentemente são abordadas em entrevistas e reportagens de veículos profissionais de imprensa ou de instituições, como universidades, que buscam traduzir as informações para o público leigo.

Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: Alegações semelhantes sobre o estudo sueco foram checadas no ano passado por Reuters e AP News. Anteriormente, o Comprova demonstrou que vacinas não injetam “DNA alienígena” nas pessoas, que é falso que elas causem danos irreversíveis ao DNA e que Bill Gates tenha comprado ações da Coca-Cola para inserir vacinas com mRNA na bebida.