O Projeto Comprova é uma iniciativa colaborativa e sem fins lucrativos liderada pela Abraji e que reúne jornalistas de 42 veículos de comunicação brasileiros para descobrir, investigar e desmascarar conteúdos suspeitos sobre políticas públicas, eleições, saúde e mudanças climáticas que foram compartilhados nas redes sociais ou por aplicativos de mensagens.
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Investigado por: 2019-08-20

Imagem de matança de baleias não foi capturada na Noruega

  • Contexto Errado
Contexto Errado
A foto foi tirada em Tórshavn, capital das Ilhas Faroé, território dinamarquês. O registro foi feito pelo fotógrafo Jan Egil Kristiansen durante a caçada anual de baleias-piloto, em 2004.

Está fora de contexto a fotografia que circula nas redes sociais sobre suposta matança de baleias promovida pela Noruega. Segundo publicações localizadas pelo Comprova no Instagram e no Twitter, o país nórdico é “hipócrita” por se preocupar com o meio ambiente no Brasil enquanto promove a caça dos animais.

A foto em questão, na verdade, foi tirada em outubro de 2004 em Tórshavn, capital das Ilhas Faroé, território dinamarquês localizado no Atlântico Norte. A imagem foi publicada no Flickr do fotógrafo Jan Egil Kristiansen com o título “Grindadráp” (caçadas, no idioma feroês).

Esta verificação do Comprova investigou a origem e o contexto da foto divulgada nos perfis @direitaopressao, no Instagram, e @elzaaraujoyaho1, no Twitter.

Como verificamos

O Comprova utilizou ferramentas de busca reversa de imagem, como o Google Imagens e o TinEye, e consultou os arquivos do Wayback Machine, ferramenta que registra capturas de tela de sites na internet, e do Flickr.

A equipe também entrou em contato com o fotógrafo Jan Egil Kristiansen, responsável pelo clique da caçada nas Ilhas Faroé, e buscou informações no site oficial do governo do arquipélago e da Dinamarca.

‘Hipocrisia’

As postagens no Instagram e no Twitter destacam uma suposta “hipocrisia” da Noruega em criticar políticas ambientais brasileiras enquanto permite a caça de baleias em seu território. Para isso, utilizam uma fotografia de pescadores matando os animais em uma praia cuja água está manchada de sangue.

Diferentemente do que é informado pelas publicações que viralizaram nas redes sociais, a imagem não foi tirada na Noruega, e sim em um território da Dinamarca, no Atlântico Norte.

Por meio da ferramenta de busca reversa de imagem TinEye, que permite fazer buscas por imagens semelhantes publicadas na internet, o Comprova localizou uma publicação de 2009, atualmente fora do ar, no site BuzzFeed. Com auxílio da ferramenta Wayback Machine, que grava versões antigas de conteúdos publicados na internet, a equipe conseguiu reler o artigo, que também comentava sobre as caçadas de baleia nas Ilhas Faroé. Contudo, não havia menção ao responsável pelo registro.

A partir dessas informações, o Comprova filtrou resultados da busca reversa no Google Imagens para resultados que fizessem menção ao termo “Faroe Islands” e encontrou uma publicação no Flickr de uma mulher chamada Miriam Godet que creditava a imagem ao fotógrafo Jan Egil Kristiansen.

O post também continha um link que redirecionava para o perfil profissional do fotógrafo na rede social, onde a foto foi originalmente publicada. O álbum no qual a foto está inserida se chama “Grindadráp” (caçadas, no idioma feroês) e o clique foi feito no dia 09 de outubro de 2004 em Tórshavn, capital das Ilhas Faroé.

O Comprova, então, entrou em contato com Jan pelas redes sociais. Em mensagem via Facebook, ele reiterou as informações encontradas pela equipe. “Confirmo a data e o lugar nas Ilhas Faroé, que não fazem parte da Noruega desde 1814. Também gostaria de acrescentar que não vejo nada de errado em comer carne de baleia-piloto, e que a maioria dos noruegueses provavelmente concorda com isso”, escreveu. Ele, que atua como freelancer, ainda comentou que “tirou a foto por conta própria” e depois vendeu a diferentes veículos de comunicação.

A equipe também descobriu que a imagem está à venda pela agência GettyImages por valores entre US$175 a US$ 499.

Prática milenar

De acordo com o site do governo das Ilhas Faroé, “as formas locais e tradicionais de agricultura e caça, incluindo a caça costeira de baleias-piloto, permitiram às Ilhas Faroé manter um grau relativamente alto de autossuficiência na produção local de alimentos”. O texto ainda diz que “é considerado bom senso econômico e ambiental aproveitar ao máximo os recursos naturais que estão disponíveis localmente”.

Um hotsite do governo dedicado a esta prática afirma que “a condução, encalhe, matança e distribuição de baleias-piloto são totalmente regulamentadas por leis. As capturas são compartilhadas entre os participantes e a comunidade local”.

Caça a baleias na Noruega

Apesar da imagem compartilhada nas redes sociais não ter sido tirada na Noruega, a prática é comum no país. Conforme afirma o próprio governo, em seção de seu site, a baleação começou a funcionar novamente em 1993, depois de cinco anos parada. “Na Noruega, a caça às baleias sempre foi feita em combinação com a pesca tradicional. A baleeira norueguesa é sustentável e legal. A gestão de recursos da Noruega é baseada no princípio do uso sustentável dos recursos naturais. A colheita de recursos marinhos, incluindo baleias, é baseada em critérios científicos.”

O Comitê Científico da Comissão Internacional Baleeira (IWC), responsável pela conservação de baleias e regulamentação da caça, proibiu a caça comercial em todo o mundo. Noruega e Islândia não aderiram, mas informam o número de animais capturados. Anualmente, são estabelecidas quotas com base nos procedimentos desenvolvidos pelo IWC.

Em sua resposta ao Comprova, Jan ainda explicou a diferença entre a caça na Noruega e no arquipélago onde mora. “A baleação norueguesa ocorre em mar aberto, não nas praias como aqui nas Ilhas Faroé”, escreveu.

Repercussão nas redes

A publicação de @elzaaraujoyaho1 obteve 798 RTs e 1,5 mil curtidas. No Instagram, a publicação de @direitaopressao obteve 9.522 likes até o dia 20 de agosto.

O Estadão Verifica, parceiro do Comprova, e a Agência Lupa também desmentiram conteúdos semelhantes.

Contexto

O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, afirmou no dia 17 de maio que parte dos projetos do Fundo Amazônia – iniciativa que capta doações não reembolsáveis da Noruega e da Alemanha para ações de prevenção, monitoramento e combate ao desmatamento – apresentaram irregularidades após análise preliminar. Ele também afirmou que proporia a revisão de critérios de contratações.

A Embaixada da Noruega, que responde por 94% das doações, respondeu, em nota, não ter sido informada pelo governo sobre proposta de mudança no programa. Ainda, garantiu que estava satisfeita com a atual gestão, feita pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), e com a seleção de seus projetos em andamento.

Com a divulgação de dados que mostram aumento do desmatamento na Amazônia, a ministra alemã do Meio Ambiente, Svenja Schulze, anunciou em entrevista ao jornal “Tagesspiegel”, em 10 de agosto, que congelaria projetos de proteção florestal na Região Amazônica no valor de R$ 155 milhões de reais.

Um dia depois, Bolsonaro comentou a decisão e disse que a Alemanha “vai deixar de comprar à prestação a Amazônia”. No dia 14, o presidente deu uma sugestão aos europeus. “Eu queria até mandar recado para a senhora querida Angela Merkel, que suspendeu 80 milhões de dólares pra Amazônia. Pega essa grana e refloreste a Alemanha, tá ok? Lá está precisando muito mais do que aqui.”

Antes, em 7 de agosto, o ministro Salles havia afirmado que a Noruega possui passivos ambientais e desqualificou as cobranças que o país tem feito às mudanças no Fundo. “A Noruega é o país que explora petróleo no Ártico, eles caçam baleia. E colocam no Brasil essa carga toda, distorcendo a questão ambiental”, declarou.

Dois dias depois, a nação nórdica emitiu nota para afirmar que “está comprometida a continuar com a gestão responsável, prudente e sustentável dos seus recursos petrolíferos”. A indústria petrolífera norueguesa, declarou, “é líder global em padrões de saúde, segurança e proteção ambiental”. Contudo, no dia 15, o ministro norueguês do Clima e Meio Ambiente, Ola Elvestuen, anunciou que o país suspendeu o repasse de 300 milhões de coroas norueguesas, o equivalente a R$ 133 milhões, para ações contra o desmatamento no Brasil.

De acordo com o jornal norueguês Dagens Næringsliv, Elvestuen considera que o Brasil quebrou o acordo para financiar medidas de desmatamento. Questionado sobre a decisão, Salles disse que as negociações sobre o destino do fundo ainda estão em andamento e que, por isso, vê como “natural” a decisão de reter repasses à iniciativa.

No domingo, 18, o presidente Jair Bolsonaro compartilhou vídeo em seu perfil no Twitter atribuindo à Noruega uma caça de baleias. As imagens, no entanto, foram feitas pela ONG Sea Shepherd UK, que desmentiu o uso incorreto das gravações e esclareceu que elas foram feitas nas Ilhas Faroé.

Verificação

Investigado por: 2019-08-20

A partir de imagem verdadeira, postagem enganosa exagera extensão de trecho em obras na BR-381

  • Enganoso
  • Localização verificada
Enganoso
É enganosa a descrição de um vídeo sobre a BR-381, segundo a qual a filmagem divulgada teria sido feita em um trecho muito maior do que o real
Localização verificada
Vídeo que mostra obras na BR-381 inauguradas após a posse de Bolsonaro é verdadeiro e correspondente à localização alegada

Uma página de apoio ao presidente Jair Bolsonaro no Facebook compartilhou um vídeo com imagens de um trecho recém-asfaltado da BR-381 e o descreve na legenda como se fosse outro, três vezes maior.

O vídeo é verdadeiro e mostra trechos asfaltados e um túnel da BR-381 entre Nova Era e Antônio Dias, em Minas Gerais. A distância entre as duas cidades é de 35 km. Na descrição enganosa, o trecho é apresentado como sendo entre Belo Horizonte e João Monlevade, também ligadas pela BR-381, mas distantes 115 km.

A BR-381 é popularmente conhecida como “Rodovia da Morte” devido ao grande número de acidentes que ocorrem na estrada. O trecho entre Belo Horizonte e João Monlevade, citado na descrição enganosa da postagem no Facebook, tem uma média de um acidente por dia, segundo dados da Polícia Rodoviária Federal (PRF).

Esta checagem do Comprova investigou os dados de uma publicação da página Bolsonaro Bahia no Facebook.

Como verificamos

Para investigar essa publicação, o Comprova consultou o site do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT), do Ministério de Infraestrutura, reportagens publicadas pela imprensa sobre as referidas obras, a página da empresa que realizou a obra dos túneis e o YouTube e tentou contato com o proprietário da página e com o autor do vídeo.

Você pode refazer o caminho da verificação do Comprova usando os links para consultar as fontes originais ou visualizar a documentação que reunimos.

Vídeo da BR-381

Inicialmente, a legenda da postagem com o vídeo diz que o trecho liberado para o tráfego fica entre Belo Horizonte e João Monlevade. Mas, ao ouvir o vídeo, nota-se que o autor da gravação fala que o trecho filmado corresponde ao caminho entre os municípios de Nova Era e Antônio Dias.

Nesse caso, o autor do vídeo está correto.

O mapa abaixo mostra a localização e a distância das quatro cidades.

Para confirmar o que efetivamente estava sendo filmado, o Comprova fez contato com a página Bolsonaro BAHIA, que postou o conteúdo, e com seu administrador, André Meirelles, a fim de encontrar a fonte primária da gravação, mas não obteve resposta.

Posteriormente, ao acessar o YouTube e colocar as palavras-chave “Nova Era Antônio Dias” chegou-se a um vídeo com a mesma duração e mostrando o mesmo trecho postado pelo usuário Bruno Cesar em 21 de julho de 2019.

No Facebook, o Comprova encontrou o perfil de Bruno ao fazer uma busca por seu nome e fez contato com ele. Além de ter publicado em seu perfil o mesmo vídeo viralizado, em 22 de julho deste ano, ele ainda fez uma advertência na legenda: “Obs = Só quis expressar minha satisfação com o andamento das Obras e a redução dos trechos perigosos NÃO TEM NADA A VER COM POLÍTICA, SÓ ESPERO QUE O TÍTULO DE RODOVIA DA MORTE ACABE”.

O usuário, entretanto, não respondeu.

Um dia antes, em 21 de julho, Bruno havia publicado um vídeo da mesma estrada com a seguinte descrição: “Muito feliz por passar no túnel entre Nova Era e Antônio Dias já mostram um certo progresso na BR-381”.

Reportagens comprovam inauguração de trecho da BR-381

O Comprova encontrou reportagens de veículos da imprensa que registraram a inauguração da obra em 19 de julho deste ano no trecho que compreende Antônio Dias e Nova Era, mencionada pelo autor do vídeo.

Uma matéria publicada no site do Diário do Aço, que cobre a região do Vale do Aço, em Minas Gerais, afirma que o ministro da Infraestrutura, Tarcísio Gomes de Freitas, inaugurou um trecho da duplicação da rodovia BR-381, na localidade de Antônio Dias. Lá, explica que “o trecho integra o chamado ‘binário pista nova’ […], onde estão localizados também dois túneis no sentido Nova Era”.

O DNIT e o Ministério da Infraestrutura também publicaram notícias sobre a inauguração e liberação para o tráfego em 19 de julho deste ano. Entretanto, como é possível ver na página da própria rodovia, os túneis citados já estavam finalizados desde outubro de 2015.

Contudo, a conclusão do binário pista nova era a condição para a liberação do trânsito “em cerca de 12 km de pista simples”, incluindo a passagem pelos túneis Prainha e Antônio Dias. Isso se dá porque o binário pista nova e os dois túneis são de obras e lotes diferentes: o primeiro faz parte do 3.1 e o segundo, do 3.3.

Essa obra teve início em maio de 2014, durante o governo de Dilma Rousseff, como aponta esta matéria do jornal Estado de Minas.

Comparação de imagens para verificação da localização

Para confirmar que o trecho mencionado pelo autor do vídeo realmente correspondia às imagens mostradas, o Comprova pesquisou outras gravações do trecho publicadas por usuários em dias próximos.

Abaixo, pode-se ver uma reprodução do vídeo viralizado (à esquerda), em que aparece o túnel Antônio Dias, e a captura de tela (à direita) da gravação do usuário Minas Gerais Pelo Mundo do mesmo túnel. Em ambas as imagens veem-se as mesmas marcas na construção.

Em e-mail ao Comprova, o DNIT confirmou a localização da filmagem e declarou que esta foi feita “certamente no trecho de pista nova do Lote 3.1”. Também assinalou que, de acordo com a fala do usuário, as imagens foram feitas “na semana de 21 a 27 de julho deste ano”.

A duplicação à qual o autor do vídeo se refere ainda não foi concluída. Segundo o DNIT, “foram entregues 15 quilômetros do lote 3.1 de pista nova e com piso de concreto. A pista está funcionando como um desvio de obra e nos dois sentidos. Isso ocorre para que seja feita a modernização do trecho já existente. Os desvios são realizados nos quilômetros 303 e 314 e os motoristas têm acesso aos túneis Antônio Dias e Prainha”.

O DNIT também explicou que após a modernização da pista antiga, o trecho já liberado passará a ser de pista dupla, com os veículos trafegando apenas no sentido Governador Valadares – Belo Horizonte, direção oposta à vista na filmagem.

No site oficial da obra da BR-381 é possível ver o outro lado do túnel Antônio Dias, com uma placa indicativa, cujo sentido do tráfego passará a valer após a duplicação mencionada.

A iniciativa Nova 381, movimento do setor empresarial de Minas Gerais com o objetivo de promover o desenvolvimento socioeconômico do estado a partir da BR-381, tem um site em que registra o andamento das obras da estrada, que vai de Governador Valadares até Belo Horizonte, passando por, dentre outras cidades, Antônio Dias e Nova Era.

A BR-381 corta a Região Metropolitana do Vale do Aço (RMVA), popularmente conhecida como Vale do Aço. O local é composto por quatro municípios (Coronel Fabriciano, Ipatinga, Santana do Paraíso e Timóteo), além de mais 24 cidades metropolitanas, dentre elas Antônio Dias. O nome da região advém dos complexos de indústrias siderúrgicas, que precisam da BR-381 para que ocorra o escoamento da produção.

O trecho da BR-381 ao qual se refere a descrição do vídeo, entre Belo Horizonte e João Monlevade, está previsto para ser duplicado pela iniciativa privada em processo de concessão que será realizado em 2020 pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) e que está em fase de audiências públicas. A rodovia será concedida em um pacote com a BR-262, no trecho entre Vitória (ES) e João Monlevade.

Repercussão nas Redes

O Comprova verifica conteúdos duvidosos sobre políticas públicas do governo federal que tenham grande potencial de viralização.

O post com o vídeo que mostra a rodovia BR-381 foi publicado em 5 de agosto de 2019 pela página Bolsonaro Bahia e contou até o dia 19 de agosto com mais de 4,8 mil compartilhamentos e 150 mil visualizações.

Verificação

Investigado por: 2019-08-16

É enganoso vídeo que fala sobre “recado final” de militares ao STF

  • Enganoso
Enganoso
Não há comprovação de que o alto comando das Forças Armadas esteja pressionando a corte em nome do ministro da Justiça, Sergio Moro. Tanto o Exército quanto o STF negam o episódio

É enganoso um vídeo publicado no YouTube sobre um suposto clima de suspense no Supremo Tribunal Federal (STF) atribuído a um “duro recado” que o alto comando do Exército teria mandado aos ministros. Segundo o rumor, os militares teriam alertado os integrantes da corte para que não “mexessem” com o atual ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro.

O vídeo em questão é composto por uma sequência de fotos dos ministros do Supremo, de integrantes do governo, do presidente Jair Bolsonaro (PSL) e de militares fardados. As imagens são acompanhadas por um áudio no qual a narradora mistura fatos verídicos e falsos para construir a tese do “recado”.

O vídeo é favorável a Moro. Diz que ninguém “mexe” com ele por causa de sua “autoridade, respeito, caráter e popularidade” e que, se “mexerem com Moro”, a briga será “grande e feia”.

Esta verificação do Comprova investigou os dados do vídeo publicado no canal BR Notícias no YouTube.

Como verificamos

Para fazer esta apuração o Comprova entrou em contato com as assessorias de organizações e pessoas citadas no vídeo. São elas: o Exército, o STF, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), o vice-presidente Hamilton Mourão (PRTB), e com o canal que divulgou o vídeo no YouTube.

A equipe também conversou com o ex-candidato a governador do Distrito Federal, general Paulo Chagas (PRP), com um advogado criminalista e consultou reportagens feitas sobre as afirmações que constam no vídeo.

Você pode refazer o caminho da verificação usando os links para consultar as fontes originais ou visualizar a documentação que reunimos.

O “recado”

A narradora do vídeo afirma que o alto comando do Exército mandou um duro recado para o Supremo e, a partir daí, “um grande clima de suspense pairou no ar”. De acordo com a narração, trata-se de uma notificação de um general para que “ninguém mexesse” com Moro na questão dos vazamentos das conversas entre ele e procuradores da força tarefa da Lava Jato.

Ao Comprova, o coronel Guerra, chefe da assessoria de imprensa do Exército, disse por telefone que o “duro recado” citado no vídeo “não ocorreu e é falso”. Por meio de sua assessoria, o Supremo também negou ter recebido qualquer “recado” de integrantes do Exército.

Mourão

Além do rumor de origem não identificada, o vídeo também especula sobre o “recado” ter sido dado ao Supremo pelo vice-presidente da República, Hamilton Mourão (PRTB). A assessoria de imprensa do general da reserva nega que ele tenha dado qualquer “recado” à corte superior e afirma que os fatos descritos no vídeo são inverídicos.

É enganoso que Mourão tenha mandado qualquer recado aos ministros do STF caso eles interferissem a respeito das conversas atribuídas a Moro. A narrativa do vídeo mescla afirmações feitas pelo vice-presidente, como a defesa da operação Lava Jato, com o discurso falso que o militar teria ameaçado a Suprema Corte. O vice-presidente não deu declarações sobre interferências a serem feitas no STF caso os ministros “mexessem com Moro”, mas defendeu a operação Lava Jato publicamente.

Mourão também disse que Moro é de “ilibada confiança” do presidente Bolsonaro e defendeu a privacidade das comunicações do ministro.

FHC

Outra figura pública citada no vídeo por ter defendido Moro foi o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB). A narradora diz que o tucano “saiu em defesa de Moro” e disse que o vazamento não passa de uma “tempestade em copo d’água”.

Ao Comprova, a assessoria do Instituto Fernando Henrique disse que o ex-presidente não saiu em defesa de Moro, o que ele fez foi comentar o caso ao ser questionado por um repórter.

Os processos julgados por Moro

O vídeo afirma que alguns ministros disseram “em off” para a reportagem que nada poderia anular os julgamentos da Lava Jato. A expressão “em off” é utilizada no jornalismo quando o repórter não revela quem foi a fonte que lhe passou a informação – isso é feito para preservar o informante.

De acordo com o vídeo, o pior que poderia acontecer seria Sergio Moro ser convidado à Suprema Corte para dar explicações ao “Conselho Superior de Censura”, já extinto. Para verificar esta afirmação, o Comprova entrevistou João Paulo Boaventura –advogado criminalista, sócio do escritório Boaventura Turbay Advogados.

Boaventura disse que o Conselho foi extinto na Constituição de 1988. “Hoje ele é aquele setor do Ministério da Justiça que faz classificação etária de programas de televisão, filmes, etc.”.

Apesar de Moro não ter de dar explicações ao Supremo, como afirma o vídeo, o ministro foi convidado e compareceu a uma sessão no Senado Federal, em 19 de junho, e a outra na Câmara dos Deputados, em 2 de julho.

Lava Jato

O áudio do vídeo está correto quando afirma que o Ministério Público Federal (MPF) diz que a operação Lava Jato é o maior caso de lavagem de dinheiro já apurado no Brasil.

De acordo com o site do MPF, a investigação é realmente a maior deflagrada até hoje e mira um esquema de corrupção que já dura pelo menos 10 anos e envolveu grandes empresas como a Petrobras e a Odebrecht.

Repercussão nas redes

Até o dia 15 de agosto, o vídeo postado no canal BR Notícias, do YouTube, foi visualizado por mais de 327 mil pessoas. De acordo com o Crowdtangle, uma ferramenta de monitoramento de redes sociais, a gravação obteve mais de 22 mil interações no Facebook até a mesma data.

Contexto

Em 9 de junho de 2019, o portal The Intercept começou a divulgar conversas do aplicativo Telegram atribuídas ao ministro Sergio Moro. Nas mensagens, o ex-juiz teria orientado os membros do Ministério Público sobre como agir com relação à operação. Esse tipo de comunicação é considerada ilegal pela Constituição brasileira e pelo Código de Processo Penal.

Depois do vazamento, houve especulações sobre o que aconteceria com os processos julgados por Moro enquanto era juiz federal da 13ª Vara Federal em Curitiba – antes de assumir o cargo no governo Bolsonaro. O pedido de suspeição contra Moro na condenação do ex-presidente Luiz inácio Lula da Silva (PT), apresentado ao STF em dezembro de 2018, ganhou força após as reportagens. A defesa do petista alega que Moro foi parcial no julgamento de Lula.

O vídeo enganoso foi publicado em 10 de agosto, em meio a uma campanha contra o STF que convoca um ato de protesto para o próximo dia 25, cujos alvos são os ministros da corte. Diversas postagens dessa campanha, detectadas no monitoramento do Comprova, pedem o fechamento do STF.

No fim do vídeo analisado, a narradora pede a “intervenção militar” e a imposição do artigo 142 da Constituição contra o STF.

A redação do artigo 142 é objeto de uma leitura enganosa por parte dos apoiadores de uma “intervenção militar”, segundo os quais as Forças Armadas poderiam fechar o Congresso ou Supremo e, ainda assim, estar dentro da lei. Ocorre, no entanto, que o artigo 142 da Constituição não permite tal ofensiva.

Uma ação desse tipo configuraria um golpe de Estado, pois, de acordo com a Constituição Federal, nenhum representante eleito pode ser destituído a não ser por deliberação da maioria absoluta do Poder Legislativo. Uma ação deste tipo configuraria um golpe de Estado, .

O artigo se restringe às diretrizes sobre o funcionamento das Forças Armadas. Esse artigo serve de base para a Lei Complementar 97, de 1999, e o Decreto 3897, de 2001, que regulam as chamadas missões de Garantia da Lei e da Ordem (GLO). As GLOs são realizadas exclusivamente por ordem da Presidência da República e ocorrem nos casos em que há o esgotamento das forças tradicionais de segurança pública.

A intervenção federal, por sua vez, é um mecanismo previsto no artigo 34 da Constituição. Ela pode ser decretada pelo governo federal nos estados e no Distrito Federal e depende de autorização do Legislativo, ou seja, da Câmara dos Deputados e do Senado Federal. A medida, no entanto, não prevê o fechamento do Congresso. No caso do Rio de Janeiro, que passou por uma intervenção militar recentemente, a prerrogativa colocou os órgãos de segurança pública do Estado sob o comando de um general do Exército.

Um outro vídeo, publicado em março de 2019, adotou estratégia semelhante à utilizada no vídeo investigado nesta verificação – fala em supostos avisos e ultimatos de militares ao Supremo.

Na ocasião, o “recado” não teria sido dado em defesa de Moro, mas sim para impedir a eventual soltura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O vídeo falava em um “aviso final” que o general da reserva Paulo Chagas, que se candidatou ao governo do Distrito Federal, teria dado ao STF.

Tal aviso envolveria o julgamento de mérito sobre a prisão em segunda instância, que estava marcado para 10 de abril de 2019. Uma mudança na jurisprudência (atualmente a favor do cumprimento da pena após sentença confirmada em segunda instância) poderia beneficiar Lula, até então condenado por Moro e o TRF-4. O ex-presidente só seria condenado em terceira instância no caso triplex em abril.

Ainda em abril, especificamente no dia 4, o ministro Dias Toffoli, presidente do STF, atendeu a pedido da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e tirou o julgamento da prisão em segunda instância da pauta da Corte, sem data fixada para retornar até o momento. O assunto, no entanto, pode voltar a ser examinado em alguma sessão sem pauta definida.

A base do vídeo para a argumentar que os militares tinham ameaçado o STF é um texto publicado em 30 de março de 2019 por Chagas. Ao Comprova, o general disse que o post é uma adaptação de um texto originalmente publicado em 2017. O texto original é muito parecido com o replicado na corrente. No entanto, Chagas diz que a parte do “aviso final” ao STF foi inserida pelo autor do post que viralizou.

Política

Investigado por: 2019-08-14

Artigo enganoso associa mais armas a menos violência; texto traz perspectiva incompleta de estatísticas sobre o Brasil e os EUA

  • Enganoso
Enganoso
Pesquisas realizadas por universidades nos Estados Unidos e no Brasil indicam o contrário. O artigo também usa dados incorretos sobre o Brasil.

É enganoso um artigo compartilhado nas redes sociais com a alegação de que mais armas podem reduzir os índices de violência. Pesquisas realizadas por universidades nos Estados Unidos e no Brasil indicam o contrário.

O artigo usa números de armas e homicídios dos Estados Unidos, mas fornece dados incorretos sobre o Brasil.

A publicação original foi feita após dois atentados com armas de fogo nos Estados Unidos que resultaram em 31 mortos. O texto acusa a mídia de hipocrisia e a esquerda de ser oportunista por relacionarem a permissividade com a posse de armas à violência.

O Comprova calculou a correlação entre a força ou fraqueza relativa das legislações estaduais sobre armamentos e a taxa de mortes por armas de fogo nos estados americanos, estatística que também inclui acidentes e suicídios. O resultado encontrado aponta que quanto mais forte a regulamentação antiarmas, menor o índice de mortes por armas de fogo.

Esta verificação do Comprova investigou os dados de um texto publicado no site Jornal da Cidade Online.

Como verificamos

O Comprova verificou as alegações feitas no post com dados de instituições como Small Arms Survey, Organização Mundial da Saúde (OMS), FBI, Giffords Law Center, Departamento de Justiça norte-americano, Suprema Corte dos Estados Unidos, Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e Fórum Brasileiro de Segurança Pública. O Comprova também entrou em contato com o autor da publicação.

Você pode refazer o caminho da verificação usando os links para consultar as fontes originais ou visualizar a documentação que reunimos.

Armas e homicídios no Brasil e nos Estados Unidos

É verdadeiro que os Estados Unidos são o país mais armado do mundo, com 393 milhões de armas, mais do que as 300 milhões indicadas no texto do Jornal da Cidade Online. O país também está em primeiro lugar como a nação com mais armas entre seus cidadãos: há 120,5 armas para cada 100 habitantes. Mais de uma por pessoa e duas vezes mais do que o Iêmen, que está em segundo lugar e tem uma taxa de 52,8 armas per capita.

O Brasil é o sétimo do ranking, com 17,5 milhões de armas. Valor bem acima do exposto no texto, de menos de 1 milhão. Considerando o número de armas entre os cidadãos, há 8,3 para cada 100 habitantes.

Os dados são do último relatório da organização Small Arms Survey, de 2017, cujos estudos, envolvendo 178 países, são usados por governos do mundo inteiro para desenvolver políticas públicas. A organização é ligada ao Graduate Institute of International and Development Studies, de Genebra (Suíça).

A taxa de homicídios no Brasil é 4,8 vezes maior do que a dos Estados Unidos. Enganosamente, o texto afirma que é seis vezes maior.

Por aqui, há 31,3 homicídios a cada 100 mil habitantes e por lá, 6,5 a cada 100 mil. Os dados são de relatório de 2017 da Organização Mundial da Saúde (OMS) (expostos na página 55).

 

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Relação entre armas e violência

A premissa do texto é de que mais armas podem reduzir os índices de violência. No entanto, a maioria das pesquisas sustenta o contrário: que dificultar a compra reduz as mortes por arma de fogo.

Um estudo feito na Universidade de Columbia e publicado em 2016 no periódico Epidemiologic Reviews revisou os resultados de 130 pesquisas feitas em 10 países, de 1950 a 2014. Resultado: políticas que restringem o acesso a armas resultaram em menor violência nos países.

Em 2018, mais pessoas morreram por armas do que por acidentes de carro nos Estados Unidos, mostrou o CDC, equivalente à Anvisa norte-americana.

Há também uma revisão feita no Brasil pelo professor do Insper e pesquisador na área em análise econômica do direito Thomas Conti. Ele analisou 61 pesquisas sobre o assunto – muitas delas, revisões de outros estudos – e descobriu que 90% delas indicam que mais armas não estão associadas a menos crimes. Os critérios de seleção foram estudos publicados nos últimos cinco anos, em revistas científicas de alto padrão. Ele afirma que os estudos que defendem que mais armas combatem a violência têm falhas na metodologia.

Ainda no Brasil, há três grandes estudos que analisam a relação entre armas de fogo e violência: Mapa da Violência, o Atlas da Violência e Anuário Brasileiro da Segurança Pública. Todos apontam que maior circulação de armas está associada a mais violência.

Daniel Cerqueira, coordenador do Atlas da Violência e pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada (Ipea), órgão do governo federal, afirmou ao Comprova que as evidências internacionais e brasileiras apontam que as armas estão relacionadas à violência. Ele também destacou que a realidade dos Estados Unidos precisa ser comparada com a de outros países desenvolvidos — neste caso, o país tem índices de violência acima dos registrados em nações europeias.

“As pesquisas internacionais mostram que a arma conspira contra a segurança da própria família, que aumenta as chances de os vizinhos sofrerem violência, aumenta as chances de a arma cair no mercado ilegal e inclusive de o lar da família ser alvo de interesse de criminosos em busca das armas”, aponta o pesquisador, doutor em Economia pela PUC-Rio e um dos maiores especialistas do Brasil na relação entre economia do crime e segurança pública. “Os poucos estudos que apontaram o contrário caíram em descredibilidade por erros técnicos, foram refeitos e chegou-se a resultados contrários”, acrescenta.

O estudo mais recente em andamento e com grande abrangência está sendo tocado por um dos mais respeitados pesquisadores sobre os impactos de armas de fogo no mundo, o professor John J. Donohue, da Universidade de Stanford, nos Estados Unidos. A metodologia de análise inclui aquela usada por autores que defendem que mais armas reduzem a violência. Em junho de 2019, um artigo com os resultados foi publicado. Ao analisar os efeitos da flexibilização do porte de armas em diferentes Estados norte-americanos (lá, cada estado tem autonomia para decidir sobre o tema), os pesquisadores descobriram que facilitar o porte de armas aumentou de 13% a 15% a taxa de crimes violentos após 10 anos de as leis terem sido flexibilizadas.

Nos Estados Unidos, os dados também indicam que armas de fogo em casa são um risco para crianças e adolescentes. Este estudo de 2018 feito por pediatras da Universidade de Stanford, na Califórnia, mostra que ferimentos por arma são a segunda principal causa de morte de jovens nos Estados Unidos – os dados usados são do próprio governo federal. Em estados onde comprar armas é mais fácil, o risco é duas vezes maior do que onde há mais obstáculos para comprá-las. Um dos autores do estudo diz que uma criança norte-americana tem 82 vezes mais chances de morrer com um tiro do que uma criança de qualquer outro país desenvolvido.

Há ainda outro problema nos Estados Unidos: quem tem armas de fogo em casa tem 10,4 vezes mais chances de morrer por suicídio, mostrou estudo publicado no American Journal of Epidemiology em 2004. Historicamente, o maior número de mortes por armas de fogo nos EUA ocorre por suicídio, a 10ª maior causa de morte no país. Os dados do CDC ainda mostram que metade dos norte-americanos que se suicidaram em 2017 usaram justamente uma arma de fogo.

O aumento de armas na população está também associado com o aumento de armas no mercado irregular, aponta o Atlas da Violência, publicado em 2019 no Brasil. O documento cita os resultados da CPI das Armas, realizada na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro. O estudo apurou que, entre 2005 e 2015, 17,6 mil armas legais foram desviadas para o mercado paralelo, das quais 86% tinham sido compradas de forma legal para civis e militares.

Legislação sobre armas nos Estados Unidos

O texto do Jornal da Cidade Online faz uma comparação enganosa entre cidades dos Estados Unidos, afirmando que Chicago e Baltimore são as mais violentas e que têm legislações mais restritivas para o acesso a armas.

Baltimore, em Maryland, é a 4ª cidade com índice mais alto de assassinatos nos Estados Unidos (22 por 100 mil habitantes) e Chicago, em Illinois, fica na 20ª posição (9 a cada 100 mil). Os dados são das estatísticas mais recentes compiladas pela agência federal de inteligência americana, o FBI, de janeiro a junho de 2018. A taxa mais alta de homicídio é de St. Louis, no Missouri (26 mortos a cada 100 mil habitantes).

Se considerarmos os índices de crimes violentos (homicídio, estupro, assalto e agressão corporal grave), a cidade mais violenta dos Estados Unidos é Detroit, no Michigan (934 casos por 100 mil habitantes). Baltimore está na 5ª posição do ranking (839 casos a cada 100 mil habitantes) e Chicago só aparece em 30º (479 registros por 100 mil habitantes).

Embora Baltimore e Chicago tenham leis de porte e venda de armas mais restritivas, elas não são as mais rígidas do país. Maryland e Illinois estão, respectivamente, no 4º e 8º lugar do ranking do Giffords Law Center, organização que advoga pelo controle de armas de fogo e classifica a legislação dos estados americanos com notas de A a F (sendo a primeira mais restritiva e a segunda, mais permissiva). A entidade leva em consideração aspectos como verificação de antecedentes e regulamentos de segurança.

A distribuição das cidades com números de criminalidade mais altos não se divide de forma uniforme em relação à rigidez da legislação estadual sobre armas de fogo. Entre as 30 cidades americanas com maior índice de crimes violentos, 12 estão localizadas em estados com nota “F” no ranking Giffords, cinco em estados com notas “D” e “D-”, quatro em estados com notas “C” e “C-”, duas em um estado com nota “B+” e sete em estados com notas “A” e “A-”.

Quando comparamos a taxa de homicídios com a rigidez em relação à legislação de armas, observamos que entre as 30 cidades com índices mais altos de assassinatos, nove estão em estados com nota “F”, ou seja, são mais permissivas; 11 em estados com notas “D” e “D-”, cinco em estados de notas “C+”, “C” e “C-”, uma em um estado com nota “B+” e quatro em estados com notas “A” e “A-”.

O que se pode concluir desses dados é que os exemplos de Baltimore e Chicago são anedóticos, e não são indicadores de tendências nos Estados Unidos em geral. As cidades que estão no topo das mais violentas do país, Detroit e St. Louis, ficam em estados com legislação relativamente mais frouxa em relação a armas: Michigan (nota “C”, 16º lugar no ranking Giffords) e Missouri (nota “F”, 47º lugar).

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No ranking do Giffords Law Center, Maryland tem nota “A-”, o que indica uma legislação relativamente restritiva. Entre as exigências, está a checagem de antecedentes para compra e transferência de pistolas e a proibição de venda de mais de uma arma em um período de 30 dias. Para obter licença para comprar um revólver, é preciso completar um curso de segurança.

As regras mais rígidas para porte de armas de fogo no estado americano foram aprovadas em 2013, com o Firearm Safety Act. No ano passado, foram estabelecidas normas ainda mais duras, de acordo com o Giffords Law Center.

É importante ressaltar que uma parte considerável das armas utilizadas em crimes em Maryland é importada de outros estados. A Divisão de Álcool, Tabaco, Armas de Fogo e Explosivos (ATF, na sigla em inglês) do Departamento de Justiça americano registrou que, em 2017, 53% das armas rastreadas em Maryland foram compradas em outros estados dos EUA, a maior taxa de importação da nação — a média do restante do país é 29%.

Segundo a ATF, os armamentos vieram de unidades da federação como Virginia (nota “D”), Pennsylvania (“C+”), West Virginia (“F”) e Georgia (“F”), que têm legislação mais frouxa que Maryland, segundo o ranking do Giffords Law Center.

Illinois tem nota “B+” e fica na 8ª posição entre os 50 estados americanos no ranking Giffords. Assim como Maryland, é preciso passar por uma checagem de antecedentes antes de adquirir uma licença para portar armas, que dura 10 anos. Há ainda uma lei de proteção a crianças que proíbe deixar armas destrancadas ao alcance de menores de 14 anos. O estado, no entanto, não exige o registro de armas de fogo nem impõe restrições à compra de múltiplos armamentos.

De forma semelhante ao que ocorre em Maryland, Illinois também tem taxa alta de importação de armas de outros estados. Segundo relatório da ATF de 2017, 52% das armas rastreadas utilizadas em crimes vieram de unidades da federação diferentes. Indiana (nota “D-”), Wisconsin (“C-”) e Missouri (“F”) são as fontes mais frequentes de armas, todos estados com legislação mais permissiva, de acordo com avaliação do Gifford Law Center.

O departamento de polícia da cidade de Chicago também produziu um documento sobre a origem das armas empregadas em crimes. O levantamento aponta uma tendência consistente de uma década em que a maioria das armas de fogo ilegais recuperadas em Chicago são rastreadas a estados com menos regulação de armas de fogo. No caso da cidade, quase 60% do armamento usado em crimes vinha de outras unidades da federação.

Usar Chicago como exemplo de cidade em que o controle de armas de fogo não funcionaria já foi uma tática empregada pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, e pela ex-porta-voz da Casa Branca Sarah Huckabee Sanders. Como ressaltou a rádio americana NPR, esse argumento também ecoa em sites de direita, como o Breitbart. Essa alegação, no entanto, já foi desmentida por agências de fact checking dos Estados Unidos, como Politifact.

De acordo com o Politifact, a reputação de Chicago como uma cidade com alta restrição ao porte e venda de armas vem de 1982, quando foi banida a posse de revólveres nos limites municipais. Essa proibição caiu em 2010, com uma decisão da Suprema Corte americana baseada na Segunda Emenda da Constituição do país. Em 2013, o estado de Illinois afrouxou sua legislação sobre armas, permitindo o porte não ostensivo de armas.

Em geral, o estado americano que tem a legislação considerada mais restritiva em relação ao porte e à posse de armas é a Califórnia. Todas as vendas de armamentos e munições precisam passar por verificação de antecedentes; vendedores e compradores devem ter licenciamento; há registros permanentes de armas de fogo; existe proibição de armamentos de alto calibre; autoridades locais têm liberdade de impor ainda mais restrições sobre o assunto.

O Mississippi fica em último lugar no ranking do Giffords Law Center, o que quer dizer que o estado tem a legislação considerada mais permissiva em relação ao porte e à posse de armas. Donos de armamentos não precisam ter licença ou registrar suas armas; não há limite no número de armas que pode se comprar de uma só vez; não há verificação de antecedentes na transação de armas entre duas partes privadas.

A organização pró-controle de armas observou uma correlação entre os estados com legislação mais permissiva e a taxa de mortes por armas de fogo. O Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos Estados Unidos compila essas estatísticas de mortalidade, que incluem acidentes, auto-defesa e suicídio, além de crimes violentos.

Existe correlação entre duas variáveis quando elas caminham juntas. O Comprova calculou a correlação entre a nota do Giffords Law Center e a taxa de mortes por armas de fogo, em uma escala que vai de -1 a 1. Em termos estatísticos, quanto mais próximo o resultado for de 1, maior a correlação — considera-se que ela é “forte” quando fica entre 0,70 e 0,89. A correlação encontrada foi de -0,78, o que quer dizer que quanto mais forte a legislação antiarmas, menor a taxa de mortes por armas de fogo.

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Violência nos Estados Unidos e na Suíça

A publicação do Jornal da Cidade Online faz uma comparação entre os índices de violência de cidades dos Estados Unidos governadas por democratas e republicanos.

De fato, a maioria das cidades mais violentas dos Estados Unidos são governadas por democratas. Segundo estatísticas de crimes mais recente do FBI, de janeiro a junho de 2016, dentre as 20 cidades com maior índice de criminalidade violenta, apenas uma tinha um prefeito republicano — Wichita, no Kansas. Outras três tinham governo apartidário — caso de Springfield, no Missouri, San Bernardino, na Califórnia, e Beaumont, no Texas.

Entre as 20 cidades com menor índice de criminalidade violenta, sete são democratas e seis, republicanas.

O mesmo é observado quando a taxa considerada é a de homicídios. Entre as 20 primeiras, apenas uma tem prefeito republicano: Westminster, no Colorado. Dentre as 32 cidades com taxa de homicídio zero, sete são democratas e cinco, republicanas.

Mas isso quer dizer que ter um prefeito democrata aumenta a violência de uma cidade? Não necessariamente. Ao refletir sobre o assunto, é preciso ter em mente dois conceitos importantes que cientistas usam ao olhar para dados estatísticos: correlação (quando dados de diferentes contextos aumentam ou sobem junto, indicando que um fenômeno está ligado a outro) e causalidade (quando os dados indicam que um fenômeno causa outro).

O site Spurious Correlations (correlações absurdas, em inglês) traz alguns exemplos de ligações que não fazem nenhum sentido. Uma delas é que o número de crianças afogadas em piscina cresce quando é lançado no cinema um filme com o ator Nicholas Cage.

Apenas com os dados apresentados no texto publicado pelo Jornal da Cidade, não podemos afirmar de forma categórica que a correlação entre cidades democratas e taxa de violência seja espúria. Segundo o cientista político Guilherme Jardim, é possível que este seja um caso em que existam “variáveis de confusão”. São fatores terceiros que podem influenciar na correlação entre um elemento e outro.

“Outros fatores podem estar causando, ao mesmo tempo, a eleição de democratas”, afirma Jardim. “Por exemplo, fatores populacionais, raciais, regionais e de pobreza.”

Um artigo na revista National Review explora esse assunto. Um dos elementos a levar em conta é que, em geral, grandes centros urbanos nos EUA são democratas. Das 100 maiores cidades do país, 62% são governadas por este partido. E há exemplos muito diferentes nesse grupo: Baltimore, em Maryland, tem alta taxa de crimes violentos; mas Austin, no Texas, tem índice baixo de violência e também é democrata.

As duas cidades têm características muito diferentes. Por exemplo, enquanto Baltimore tem população majoritariamente negra (61,9%), Austin é composta principalmente por brancos (47,7%) e hispânicos ou latinos (34,2%). Baltimore tem taxa de pobreza de 22,4%, com renda média de US$ 47 mil por ano. Em Austin, esses valores são de 15,4% e US$ 67 mil, respectivamente. Esses elementos podem influenciar, de maneiras distintas, os índices de criminalidade.

A relação entre armas e criminalidade é complexa: pesquisadores do tema afirmam que o crime ocorre por vários fatores, incluindo desigualdade social, acesso a armas, poucos policiais na rua, entre outros.

O texto do Jornal da Cidade Online alega ainda que, retiradas as cidades democratas, a taxa de homicídios dos Estados Unidos seria comparável à da Suíça. Consultado, o autor do artigo não mostrou estatísticas que corroborem essa comparação. O índice de assassinatos suíço é um dos mais baixos da Europa, de 0,5 a cada 100 mil habitantes segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). Nos Estados Unidos, essa taxa é de 6,5 por 100 mil habitantes.

Áreas com restrições às armas

A publicação do Jornal da Cidade Online alega ainda que a restrição às armas em algumas áreas contribuiria para um maior número de ataques.

O Washington Post fez em maio de 2018 a checagem de uma declaração do presidente Donald Trump que usava a mesma informação: ele afirmou que 98% dos ataques aconteceram em lugares onde as armas são proibidas.

O jornal apontou que Trump se baseou em um estudo da organização Crime Prevention Research Center (CPRC). A página foi atualizada e no dia 13 de agosto apontava que 94% dos ataques desde 1950 aconteceram em “Gun-Free Zones”. Consultando o site Wayback Machine, no entanto, é possível ver que em maio deste ano o índice apontado era de 97,8%.

Um estudo da Everytown for Gun Safety, citado pelo Washington Post, apontou que 10% dos ataques entre 2009 e 2016 aconteceram em áreas com restrição às armas. As duas pesquisas, no entanto, não podem ser comparadas por terem metodologias diferentes, como o número de vítimas para que seja considerado um ataque, e terem sido realizadas em períodos distintos.

Com exceção das escolas, que estão na legislação nacional, a definição das normas sobre essas localidades cabe a cada um dos estados.

A publicação do Jornal da Cidade Online relaciona a política de restrição de armas a Joe Biden, adversário de Trump nas eleições de 2020. Em 1990, foi aprovada uma legislação que criava as “Gun-Free School Zones”, que proibia a posse de armas em áreas escolares. O presidente era George H. W. Bush, do Partido Republicano, e Biden estava no Congresso.

Em 1994, durante o governo de Bill Clinton, do Partido Democrata, houve uma nova mudança nas leis criminais, que é relacionada politicamente ao nome de Joe Biden nos Estados Unidos. A lei tem um capítulo sobre armas, mas não estabelece outras zonas, além das escolas, onde as armas são proibidas. O trecho sobre as “Gun-Free School Zones”, porém, estabelece que crimes envolvendo drogas e armas são problemas nacionais. Além disso, frisa que a violência em áreas escolares tem como consequência a queda na qualidade da educação, que tem impacto na economia dos Estados Unidos.

Pena de morte

A publicação do Jornal da Cidade Online ainda critica políticas de esquerda e afirma que “terrorista merece a pena de morte”. Esses trechos não foram verificados pelo Comprova por serem opinativos.

Repercussão nas Redes

O artigo foi divulgado pelo site Jornal da Cidade Online em 6 de agosto e desde então obteve 488 compartilhamentos nas contas de Facebook e Twitter da própria publicação, segundo a ferramenta de medição Crowdtangle. Somando ao engajamento em outras contas, esse conteúdo obteve 1,3 mil interações até o dia 14 de agosto. Os principais divulgadores foram páginas de direita e de apoiadores do presidente Jair Bolsonaro.

Contexto

O texto foi publicado no dia 6 de agosto, após dois ataques nos Estados Unidos, um em El Paso, no Texas, e o outro em Dayton, no estado de Ohio. O primeiro deixou 22 mortos e o segundo terminou com nove mortos.

Em entrevista depois dos atentados, o presidente Jair Bolsonaro (PSL) afirmou a jornalistas que “não é desarmando o povo que você vai evitar isso aí”.

No Brasil, o porte de armas é proibido desde o Estatuto do Desarmamento, Lei 10.826, de 22 de dezembro de 2003, quando o presidente era Luiz Inácio Lula da Silva (PT). As exceções são integrantes das Forças Armadas, policiais (federais, rodoviários federais, ferroviários federais, civis e militares), bombeiros militares, auditores fiscais e tributários, entre outras categorias. Para a posse, alguns dos requisitos eram a declaração da efetiva necessidade e a apresentação de documentos como comprovação de ocupação lícita, residência certa, capacidade técnica e aptidão psicológica.

Em 2005, um referendo retirou o artigo 35 do estatuto, que previa a proibição da comercialização de armas de fogo e munição. Os outros trechos da lei, no entanto, não foram alterados na consulta popular.

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O Estatuto do Desarmamento revogou a lei 9.437/1997, do governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB), que criava o Sistema Nacional de Armas (Sinarm). Essa lei não proibia o porte de arma, apenas limitava ao “requerente comprovar idoneidade, comportamento social produtivo, efetiva necessidade, capacidade técnica e aptidão psicológica para o manuseio de arma de fogo”.

O Mapa da Violência de 2016 apontou que as taxas de homicídios nos estados são heterogêneas e, enquanto São Paulo e Rio de Janeiro, maiores centros urbanos do país, tiveram trajetória de queda, no Norte e no Nordeste houve um aumento. “Continuando o processo iniciado em meados da década de 1990, agora reforçado pelos controles impostos pelo Estatuto do Desarmamento, se consolida a tendência de queda nos grandes polos da violência tradicionais e seu deslocamento para municípios do interior e/ou novos polos”, aponta a pesquisa. As vítimas são predominantemente homens e jovens. Além disso, enquanto o número de vítimas negras aumentou, o de brancas diminuiu.

Em 2019, Jair Bolsonaro assinou sete decretos flexibilizando a posse e o porte de armas. O primeiro foi o 9.685, de 15 de janeiro de 2019, que mudava as regras para a posse. Esse texto foi revogado pelo decreto 9.785, de 7 de maio de 2019, que, por sua vez, foi alterado pelo decreto 9.797, de 21 de maio de 2019.

No dia 18 de junho, o Senado Federal rejeitou o decreto 9.785. Foi aprovado o Projeto de Decreto Legislativo 233/2019, do senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), sustando o texto de Bolsonaro. O presidente criticou a decisão no Twitter.

O decreto de 7 de maio flexibilizava o porte de armas a 20 categorias profissionais, entre elas advogados, políticos com mandato e jornalistas especializados na cobertura policial, e ampliava de 50 para 5 mil o número de munições permitidas. O texto de 21 de maio alterava pontos polêmicos no primeiro, revogando, por exemplo, o artigo que abria a possibilidade de portar armas em aviões.

O texto do PDL, que sustou o decreto, seguiria para análise da Câmara, mas, no dia 25 de junho, Bolsonaro revogou o decreto e publicou os 9.844 (revogado), 9.845, 9.846 e 9.847, de 25 de junho de 2019. Foi apresentado no dia 26 de junho o PL 3723/2019, que tramita em regime de urgência.

O projeto de lei acaba com a proibição do porte de arma e afirma que ele é “pessoal, intransferível e será concedido para” diversas categorias, como caçadores e colecionadores. Além disso, prevê a possibilidade de regulamentar o porte para outras profissões.

Já tramitava na Câmara desde 2012 o PL 3722 (com 132 projetos apensados), do deputado Rogério Peninha Mendonça (MDB-SC), que revoga o Estatuto do Desarmamento.

Verificação

Investigado por: 2019-08-13

Montagem enganosa atribui a Bolsonaro obras na BR-163 feitas no governo Dilma

  • Falso
Falso
Uma montagem de fotos sobre os estágios das obras na BR-163 durante os governos do PT e de Bolsonaro é falsa, pois usa imagens de 2017 e 2015, anteriores à posse do atual presidente

É falsa uma montagem feita com duas fotos para comparar a situação da rodovia BR-163 nos governos petistas e no atual, do presidente Jair Bolsonaro (PSL). No conjunto de imagens, a foto de cima, da estrada em situação precária, é atribuída aos “16 anos de PT”; a de baixo, da estrada em pavimentação, é creditada aos “7 meses de Bolsonaro”. As fotos, porém, não correspondem aos períodos citados.

Esta verificação do Comprova investigou os dados de uma montagem encontrada pelo nosso monitoramento nas páginas “O Mito” e “Bolsonaro Bahia”, do Facebook.

Como verificamos

Para esta verificação, o Comprova submeteu as fotos usadas na montagem ao mecanismo de busca de imagens do Google, funcionalidade que procura na internet outras versões de uma mesma imagem. Consultamos também reportagens sobre a obra e nos sites do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT), do Ministério da Infraestrutura e da concessionária que administra um dos trechos da BR-163.

Você pode refazer o caminho da verificação do Comprova usando os links para consultar as fontes originais ou visualizar a documentação que reunimos.

O Comprova descobriu que as fotografias usadas na montagem com os dizeres “16 anos de PT” e “7 meses de Bolsonaro” não foram capturadas nos momentos alegados. A imagem de cima é de 2017 e a de baixo, de 2015.

As duas fotos usadas na comparação são efetivamente da rodovia BR-163, mas elas também não comparam os mesmos trechos.

A foto de cima foi feita na região do município de Trairão, no estado do Pará, cuja obra de pavimentação é de responsabilidade do DNIT em convênio com o Exército brasileiro e a Polícia Rodoviária Federal (PRF).

A imagem de baixo, por sua vez, foi capturada dois anos antes, na parte da rodovia que fica no Mato Grosso, conforme confirmou ao Comprova a concessionária Rota do Oeste, responsável pelas obras de pavimentação entre os municípios mato-grossenses de Itiquira e Sinop.

BR-163/PA

A fotografia dos caminhões parados em um atoleiro, vista na parte superior da montagem, teve o seu primeiro registro encontrado pela equipe do Comprova em uma matéria publicada pelo site do Jornal Folha do Progresso, de 27 de fevereiro de 2017. Foi recebida pelo veículo por meio do aplicativo de mensagens instantâneas WhatsApp, segundo a sua descrição.

De acordo com a reportagem na qual se encontra a foto, o Exército havia ido para o trecho da BR-163 em Trairão após as fortes chuvas que atingiram a região no mês de fevereiro, como mostra esta matéria do portal G1.

Um dia depois, em 28 de fevereiro de 2017, o Ministério de Infraestrutura publicou uma notícia informando que o Exército e a PRF – em conjunto com o DNIT, responsável pelas obras no trecho em questão da BR-163 – estavam se dirigindo ao local para a manutenção da rodovia.

Em março do mesmo ano, o Ministério de Infraestrutura também informou sobre os níveis operacionais do trecho – entre as comunidades de Santa Luzia e Bela Vista do Caracol – locais igualmente mencionados pelo Jornal Folha do Progresso.

Em 2017 o presidente que estava no poder era Michel Temer, do MDB, que assumiu o cargo após Dilma Rousseff, do PT, ser submetida a um processo de impeachment em 2016.

Em e-mail ao Comprova, o DNIT afirmou que o trecho de Trairão, no Pará, já está asfaltado. “A BR 163/PA, desde a divisa com o Mato Grosso até o Porto de Miritituba, tem a extensão de 706 quilômetros. Atualmente, essa extensão está praticamente toda pavimentada, restando pouco mais de 39 quilômetros a serem pavimentados. São 37 quilômetros do segmento sob a responsabilidade do Exército e 2,5 quilômetros sob responsabilidade de uma empresa contratada. O trecho sob responsabilidade do Exército está dividido em 4 lotes de obras. O cronograma prevê a conclusão dos serviços até o final de 2019, deixando a rodovia trafegável e sem pontos críticos”, disse o DNIT.

BR-163/MT

A fotografia de baixo, que mostra um trecho de estrada sendo pavimentado, foi tirada em junho de 2015, conforme a confirmação da concessionária Rota do Oeste ao Comprova por e-mail.

De acordo com a explicação, a foto da realização da pavimentação consta no banco de dados do setor de Comunicação da empresa, arquivada no sistema em 17 de junho de 2015, às 18h12”.

Segundo a assessoria da concessionária, “a imagem é referente à matéria Rota do Oeste inicia pavimentação da segunda etapa de duplicação, que na época foi divulgada à imprensa para informar sobre o andamento das obras de duplicação da BR-163, na região sul de Mato Grosso.

No site da Rota do Oeste, a matéria explica que o trabalho foi realizado no quilômetro 74 da BR-163 e marcava o aniversário de um ano de obras da concessionária na rodovia.

Em 2015, Dilma Rousseff estava em seu segundo mandato no comando do Brasil, diferentemente do que foi afirmado no meme viralizado.

Repercussão nas Redes

O Comprova verifica conteúdos duvidosos sobre políticas públicas do governo federal que tenham grande potencial de viralização.

A publicação da montagem com as fotografias da BR-163 foi postada na página do Facebook “O Mito” em 5 de agosto de 2019 e até o dia 12 do mesmo mês já contava com mais de 700 compartilhamentos e quase 1.000 interações. O post não aparece mais na página “Bolsonaro Bahia”. Na captura de tela feita pelo Comprova, no dia 5 de agosto, a publicação já havia sido compartilhada 8,8 mil vezes.

O AFP Checamos, Aos Fatos e a Agência Lupa já haviam feito checagem das fotografias da BR-163 anteriormente.

Verificação

Investigado por: 2019-08-09

Contratos de empresa do presidente da OAB com estatais não foram obtidos em licitação, mas são regulares

  • Enganoso
  • Evidência comprovada
Enganoso
Artigo diz que escritório de Felipe Santa Cruz recebeu recursos de estatal sem licitação, mas omite que o tipo de contrato firmado dispensa processos licitatórios
Evidência comprovada
Os contratos existem, foram firmados com Petrobras e Serpro e podem ser verificados nos portais da transparência das estatais

É enganoso um artigo compartilhado nas redes sociais sobre os contratos do escritório do presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz, com a Petrobras e o Serviço Federal de Processamento de Dados (Serpro) durante a gestão da ex-presidente Dilma Rousseff (PT).

O texto omite o fato de que os tipos de contratos firmados com as empresas dispensam licitação. Portanto, não houve nesse aspecto irregularidade na contratação.

Um outro post, feito no Twitter e sobre o mesmo tema do artigo, informa sobre os valores do contrato. Eles são verdadeiros. A mensagem também afirma que o governo Bolsonaro prometeu romper com os contratos ainda em vigor. Na última terça-feira, 6 de agosto, Santa Cruz foi informado pela Petrobras da suspensão do contrato vigente com a estatal.

Esta verificação do Comprova investigou os dados de três publicações encontradas pelo nosso monitoramento: um tuíte do perfil @profeborto, um post no site Jornal da Cidade Online e outro no site Caneta.org.

Como verificamos

O Comprova consultou dados dos contratos nos portais da transparência da Controladoria-Geral da União e da Petrobras, conferiu as legislações federais que dispõem sobre as normas para licitações da administração pública, checou o regulamento do procedimento licitatório da Petrobras e fez contato com o escritório de advocacia de Santa Cruz.

Você pode refazer o caminho da verificação do Comprova usando os links para consultar as fontes originais ou visualizar a documentação que reunimos.

Serpro

O contrato com o Serpro, assinado em 2014 e com vigência até 21 de dezembro de 2019, refere-se à defesa da empresa pública perante o Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região e o Tribunal Superior do Trabalho nos autos do processo nº 0132000-50.1989.5.01.0016.

Para esse contrato, foram feitos três pagamentos, no total de R$ 1,3 milhão. As parcelas foram de R$ 300 mil em março de 2015, R$ 876.000,27 em 10 de setembro de 2018 e a retenção de impostos no valor de R$ 91.421,34, em 18 de outubro de 2018.

O serviço foi prestado sem licitação visto que a modalidade de contratação do escritório de Santa Cruz é classificada como “inexigível”.

Segundo a lei de licitações (Lei 8666/93), a contratação de serviços técnicos, entre eles a defesa de causas judiciais ou administrativas, não exige a realização de processo licitatório. Isto está previsto no inciso II do Art. 25 da lei e no inciso V do art. 13.

Petrobras

Caso semelhante ao Serpro é identificado nos contratos do escritório de advocacia Stamato, Santa Cruz e Saboya Advogados com a Petrobras (atenção: para fazer a consulta por esse link deve-se utilizar o número do contrato. Eles são informados a seguir). A empresa tem o mesmo CNPJ da Santa Cruz Scaletsky Advogados.

Com a Petrobras, a empresa de Santa Cruz teve dois contratos firmados no valor total de R$ 2,5 milhões. Na terça, 6 de agosto, Santa Cruz informou que a estatal cancelou o contrato.

Segundo o Portal da Transparência, o contrato no valor de R$ 1,5 milhão (número 4600407072) foi assinado em maio de 2013 e tinha vigência até janeiro de 2020. Ele se referia à defesa da empresa em ação movida pelo Sindicato dos Petroleiros do Norte Fluminense.

Já o outro contrato (número 4600444383), no valor de R$ 1 milhão, vigorou, também segundo o Portal da Transparência, de junho de 2014 a junho de 2019. Ele se referia à representação da estatal em três ações rescisórias.

De acordo com a OAB, ambos contratos ainda estavam vigentes e seriam encerrados apenas com o fim do processo, apesar de as informações do portal apontarem a data de término em junho de 2019 para um deles. A entidade, porém, disse não poder encaminhar cópia dos contratos, sob a justificativa de que são sigilosos.

A Petrobras disse por telefone que não comentaria. Solicitada a confirmar por email, não respondeu até a publicação deste texto.

Ao todo, os dois contratos com a Petrobras somam R$ 2,5 milhões, e ambos também foram enquadrados como “inexigíveis”. A possibilidade está amparada no Decreto 2.745/1998, assinado pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que estabelece o Regulamento do Procedimento Licitatório Simplificado da Petrobras.

Dispensa de licitação

A legislação permite a dispensa de licitação em casos de “inviabilidade fática ou jurídica de competição”, como casos de defesa de causas judiciais ou administrativas da estatal.

Somados, os contratos da Petrobras (R$ 2,5 milhões) e os pagamentos realizados pelo Serpro (R$1,3 milhão) chegam ao valor aproximado referido no tuíte que viralizou.

Tanto o contrato com o Serpro quanto os contratos com a Petrobras foram feitos com o mesmo CNPJ (11.820.663/0001-79). No entanto, constam no Portal da Transparência três razões sociais diferentes para o referido CNPJ, isso porque a empresa teve seu quadro de sócios e nome alterados no período. Segundo comprovante de CNPJ emitido pela Receita Federal, a razão social atual da empresa é “Felipe Santa Cruz Advogados”.

Nos contratos assinados com a Petrobras, em maio de 2013 e junho de 2014, a razão social que consta no site da estatal é “Stamato, Santa Cruz e Saboya Advogados”. Já no contrato assinado com o Serpro em 2014, consta a razão social “Santa Cruz Scaletsky Advogados”.

Fim dos contratos

Publicações nas redes sociais informam que Bolsonaro prometeu romper com os contratos ainda em vigor de Santa Cruz. O Comprova não localizou reportagens nas quais o presidente prometia rever os acordos específicos do advogado com o Serpro e a Petrobras, mas Santa Cruz anunciou na terça-feira, 6, que a Petrobras suspendeu o contrato com seu escritório.

Santa Cruz classificou a iniciativa como “perseguição política” e disse que irá ajuizar uma ação de reparação de danos contra a estatal.

Procurados pelo Comprova, o Palácio do Planalto e a Petrobras informaram que não iriam comentar o assunto.

Repercussão nas redes

O Comprova verifica conteúdos duvidosos sobre políticas públicas do governo federal que tenham grande potencial de viralização.

O post sobre os contratos de Santa Cruz foi publicado no Twitter pelo perfil @profeborto em 31 de julho e teve 167 compartilhamentos até o dia 8 de agosto.

Uma versão anterior desse conteúdo foi publicada no dia 13 de fevereiro deste ano no site Jornal da Cidade Online com autoria de “Otto Dantas”, identificado como articulista e repórter. Uma reportagem da agência Aos Fatos apontou indícios que o perfil é falso e que a foto anteriormente utilizada para apresentar Dantas foi retirada do banco de imagens Shutterstock.

Outra versão do texto que circula nas redes sociais foi publicada em 8 de fevereiro pelo site Caneta.org e acumulava, até o dia 8 de agosto, mais de 130 mil interações no Facebook, segundo a ferramenta Crowdtangle.

O Estadão Verifica já havia feito a checagem dessas informações em 13 de fevereiro de 2019.

Contexto

O presidente da OAB tem sido alvo de boatos e desinformações nas redes sociais desde a sua posse, em janeiro deste ano, por declarações contrárias ao governo e seu histórico de desavenças com Bolsonaro.

Em 2016, quando era presidente da seccional da OAB no Rio de Janeiro, Santa Cruz foi ao Supremo Tribunal Federal (STF) pedir a cassação do mandato do então deputado federal após a exaltação de Bolsonaro ao coronel Brilhante Ustra durante a votação do impeachment de Dilma Rousseff.

No último dia 29, Bolsonaro disse que poderia explicar a Santa Cruz como o pai dele desapareceu durante a ditadura militar (1964-1985). O presidente da OAB levou o caso ao Supremo e o ministro Luís Roberto Barroso deu prazo de quinze dias para Bolsonaro se explicar, caso queira.

O Comprova verificou que Fernando Augusto de Santa Cruz Oliveira foi vítima do regime e não de guerrilheiros da esquerda, conforme relatório oficial da Comissão Nacional da Verdade (CNV), criada em 2011 para investigar violações aos direitos humanos cometidas pelo Estado.

Outra informação que tem circulado nas redes e que o Comprova verificou é a filiação de Santa Cruz ao PT. Na lista de filiações partidárias disponível no site do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), de fato consta que o advogado foi filiado ao partido no Rio de Janeiro de maio de 2001 a fevereiro de 2009. Além disso, Santa Cruz foi candidato a vereador pelo PT nas eleições de 2004.

Verificação

Investigado por: 2019-08-08

Mudanças no Código de Trânsito não estão em vigor e projeto aguarda aprovação

  • Falso
Falso
É falso que a validade da CNH passou de 5 para 10 anos, que a pontuação limite para suspensão da carteira dobrou e que os exames necessários para sua emissão podem ser feitos com qualquer médico. Essas medidas fazem parte de um Projeto de Lei proposto pelo governo, mas não estão em vigor.

São falsas as afirmações de que a validade da Carteira Nacional de Habilitação (CNH) passou de 5 para 10 anos, que a pontuação limite para suspensão do documento dobrou e que os exames necessários para sua emissão podem ser feitos com qualquer médico. Essas medidas, que foram listadas em publicações amplamente compartilhadas nas redes sociais, realmente fazem parte de um Projeto de Lei (PL) proposto pelo Poder Executivo, mas não estão em vigor.

No último dia 4 de junho, o presidente Jair Bolsonaro entregou ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), o PL 3267, que propõe diversas alterações no Código de Trânsito Brasileiro.

No entanto, para entrar em vigor, o projeto precisa passar pela análise de uma Comissão Especial da Câmara e pelo Senado Federal. Até o fechamento desta matéria, a Comissão em questão ainda não estava totalmente formada. Ou seja, a implementação imediata das medidas mencionadas na postagem é inviável.

Como verificamos

Para esta verificação, o Comprova consultou a íntegra do PL 3267, a ficha de tramitação do texto e a página oficial de Comissões Temporárias da Câmara dos Deputados. Além disso, entramos em contato com as assessorias de imprensa do Ministério da Infraestrutura, da Presidência da República e da Câmara.

A afirmação falsa de que as medidas propostas no Projeto de Lei do governo já estão em vigor foi encontrada pelo Comprova em ao menos duas publicações virais no Facebook. Até as 15h30 desta 5ª feira (8.ago.2019), uma delas foi compartilhada 7,7 mil vezes. Foi postada originalmente em um perfil que compartilha críticas aos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), à esquerda, defende a operação Lava Jato e o presidente Jair Bolsonaro.

A segunda é composta por um vídeo da coletiva de imprensa concedida por Bolsonaro no dia em que entregou o PL ao Congresso. A postagem, feita pela página do blog pessoal de Clarice Borsa Agnes, foi compartilhada mais de 8 mil vezes.

Caminho percorrido pelo PL

Um dia depois de ser apresentado pelo governo, o projeto foi encaminhado às Comissões de Seguridade Social e Família (CSSF); Desenvolvimento Econômico, Indústria, Comércio e Serviços (CDEICS); de Trabalho, de Administração e Serviço Público (CTASP); de Viação e Transportes (CVT) e de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC).

Como o projeto foi enviado para mais de três Comissões de mérito, foi determinada a criação de uma Comissão Especial de 34 membros para unificar a análise do PL.

No entanto, essa Comissão ainda não está totalmente formada, impedindo a análise da proposta. Em uma página do site da Câmara dos Deputados, é possível verificar que os líderes partidários ainda precisam indicar 5 membros titulares e 12 suplentes para completar a Comissão (consulta em 8.ago.2019).

Procurada pelo Comprova, a assessoria da Câmara dos Deputados informou que o prazo regimental para que sejam feitas estas indicações é de cinco sessões deliberativas –limite há muito ultrapassado. De acordo com a assessoria, o prazo é apenas uma orientação e não há repercussões caso não seja cumprido.

Enquanto isso, contudo, o trâmite do PL não avança.

Contexto

Veja as principais mudanças propostas pelo governo.

Principais pontos da proposta

Apesar de não estarem em vigor, as medidas listadas na publicação estão entre os principais pontos da proposta do governo, que altera a lei 9.503, de 1997.

Pela legislação atual, o candidato à CNH precisa realizar exames de aptidão física e mental junto ao Detran de seu Estado. As avaliações, que visam a identificar se o futuro motorista está apto a assumir esta responsabilidade, são pagas e de exclusividade do órgão executivo de trânsito. No Rio de Janeiro, por exemplo, a taxa para realização do exame é de R$ 289,36.

Se o PL em questão for aprovado, esses exames poderão ser realizados com qualquer médico. Procurado pelo Comprova, tanto o Planalto, quanto o Ministério da Infraestrutura informaram que esta mudança permitirá que o candidato faça as avaliações com um médico de seu plano de saúde, ou ainda com um profissional vinculado ao Sistema Único de Saúde (SUS). “A intenção é que com essa mudança, haja uma redução ou mesmo eliminação de custos para o cidadão”, afirmou a pasta em nota.

Ainda de acordo com a lei atual, esses exames precisam ser renovados a cada cinco anos, ou a cada três anos para condutores com mais de 65 anos. O PL altera esses prazos para 10 e cinco anos, respectivamente, ampliando a validade da CNH. As carteiras de habilitação já expedidas também terão o prazo de validade prorrogado.

Exames toxicológicos

O PL também revoga o artigo 148-A da lei 9.503, que estabelece a exigência de exames toxicológicos para emissão e renovação da CNH nas categorias C, D e E (para condução de veículos de carga e de passageiros). O texto que acompanha o Projeto de Lei, assinado pelo ministro da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas, justifica a mudança afirmando que estes exames são “caríssimos” e que há, em alguns casos, “dúvidas sobre a exatidão”.

Como mencionam as publicações viralizadas, a proposta do governo também dobra o número de pontos limite para que o motorista tenha a CNH suspensa, passando de 20 pontos no período de um ano para 40 pontos no mesmo espaço de tempo.

Cadeirinha

Além disso, o Projeto de Lei flexibiliza a punição para algumas violações de trânsito, como a não utilização da cadeirinha no transporte de crianças com até sete anos e meio.

Atualmente, motoristas que forem flagrados andando com crianças dentro desta faixa etária sem o dispositivo de segurança respondem por infração gravíssima, perdendo sete pontos na CNH e pagando multa de R$ 293,47, como determinado pela resolução 277 do Conselho Nacional de Trânsito (Contran). Se o PL for aprovado, a punição passa ser apenas uma advertência por escrito.

Opinião pública

Pesquisa do Datafolha publicada em julho deste ano mostra que a maioria da população rejeita as propostas previstas neste Projeto de Lei. Segundo o levantamento, 56% são contra aumentar de 20 para 40 o número de pontos que o motorista pode acumular na CNH. Já a proposta de acabar com a multa para motoristas que transportarem crianças sem o dispositivo de segurança necessário é rejeitada por 68% dos entrevistados.

No geral, 41% dos brasileiros acreditam que o trânsito se tornará mais violento se as propostas do governo Bolsonaro forem aprovadas, contra 21% que consideram que haverá mais segurança.

Saiba mais

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Verificação

Investigado por: 2019-08-06

É falso que conselho de políticas de drogas era aparelhado; atas comprovam a diversidade de opiniões

  • Falso
Falso
As atas das reuniões mostram que os representantes da sociedade civil que faziam parte do Conad possuíam diversidade de posicionamentos em relação às políticas de drogas

Diferentemente do que afirma postagem que viralizou nas redes sociais, o Conselho Nacional de Política sobre Drogas (Conad) não era aparelhado por membros da sociedade civil. A análise das atas e registros das reuniões de 2006 a 2018 mostra que seus integrantes apresentavam opiniões diversas sobre diferentes pontos da política de drogas.

No texto viralizado, consta que “os chamados ‘especialistas’ e grupos da ‘sociedade’, que aparelhavam o Conad (Conselho Nacional de Política sobre Drogas), foram dissolvidos pelo governo Bolsonaro.” Ele ainda afirma que esse aparelhamento contava com “médicos, juristas, psicólogos, cientistas e antropólogos”.

Como verificamos

Para verificar se existia aparelhamento no Conad, o Comprova leu e analisou mais de 30 atas e registros das reuniões realizadas de 2006 a 2018. Também foram consultadas as resoluções do conselho e seu regimento. Além disso, os verificadores solicitaram posicionamentos oficiais dos representantes das categorias profissionais e do terceiro setor e entrevistaram alguns dos ex-conselheiros. [Os links para esses documentos estão no final deste post].

Segundo a postagem, “as políticas dos governos passados apoiavam – e ainda apoiam — a liberação e o consumo das drogas no Brasil”. De fato, as atas mostram que havia membros do Conad que defendiam a descriminalização das drogas, no entanto, a posição não era majoritária nem chegou a ser tema de votação no conselho em todo período analisado.

Desde 2006, após um decreto do governo Lula, o Conad passou a ter 27 cadeiras, das quais 13 foram destinadas a representantes da sociedade civil — oito privativas de determinados grupos e conselhos profissionais e quatro que eram indicadas pelo governo para mandatos de dois anos.

Em 22 de julho de 2019, o atual presidente Jair Bolsonaro assinou o decreto nº 9.926, que reduziu a participação de representantes da sociedade civil no Conad.

Qual era posição da sociedade civil em relação à descriminalização das drogas

Dentre os oito grupos que possuíam cadeiras fixas no Conad, dois (o Conselho Federal de Serviço Social e a União Nacional dos Estudantes) se posicionam abertamente a favor da descriminalização das drogas. Apenas um deles se declarou abertamente contra: o Conselho Federal de Medicina (CFM).

Em resposta ao Comprova, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e o Conselho Federal de Enfermagem (CFE) afirmaram em nota não ter posicionamento consolidado sobre o tema. Pela análise das atas, não foi identificado posicionamento das entidades quanto à descriminalização.

O Conselho Federal de Psicologia (CFP), o Conselho Nacional de Educação (CNE) e a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) tampouco se posicionaram abertamente quanto ao tema nas reuniões. O Comprova entrou em contato com as três organizações repetidas vezes, no entanto, até a publicação desta reportagem, o CFP não respondeu à pergunta quanto à descriminalização e não houve retorno da CNE e da SBPC.

Apesar de não se manifestarem quanto à descriminalização, em reunião de 2009, o representante da SBPC Elisaldo Luiz de Araújo Carlini defendeu o uso medicinal da cannabis e, em setembro de 2015, o representante do CFP propôs este tema para discussão.

Conforme consta em ata de 15 maio de 2012, a secretária-executiva do Conad à época sugeriu a criação de um grupo de trabalho para discutir o tema. Na ocasião, o então representante da Polícia Federal no Conselho disse que não julgava interessante participar do GT, devido ao posicionamento da PF quanto ao tema. “Acho que fica mais tranquilo a discussão sem a nossa presença, vamos colocar assim. Tudo bem?”

Em resposta, o então representante do Conselho Federal de Medicina afirmou que, independentemente da posição, a participação do órgão era importante. “O trabalho consiste na discussão de vieses e dos cenários possíveis”, disse.

Nessa mesma reunião, o médico ainda questionou o conteúdo de gibis feitos pela Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas (Senad). De acordo com a ata, o médico afirmou que existia “anuência para a liberação da maconha e a ‘satanização’ do crack” no encarte. A secretária respondeu que o Senad possuía materiais específicos a respeito da maconha.

Entre os representantes do meio artístico o único que chegou a se pronunciar a respeito do tema foi o ator Marcos Frota, que, em reunião em 28 de agosto de 2012, registrou ser contra a liberação das drogas.

Como os representantes da sociedade civil eram renovados ao longo do tempo, o Comprova entrou em contato apenas com os membros que faziam parte do conselho neste ano e foram excluídos pelo decreto de Bolsonaro.

Quais foram as decisões do Conad desde 2006

Ao todo, o Conad teve três resoluções oficiais desde 2006. A primeira delas, no entanto, não passou pelo crivo dos representantes da sociedade civil.

Apesar de ter sido publicada oficialmente em 2010, a decisão do Conad favorável ao uso da Ayahuasca para fins religiosos foi tema de votação no conselho em 6 de dezembro de 2006. Antes, portanto, da primeira reunião em que a sociedade civil passou a fazer parte da composição do Conad, em 27 de junho de 2007.

Comunidades terapêuticas

A segunda resolução do Conad, publicada em 2015, trata do marco regulatório das comunidades terapêuticas, categoria de organização que trata dependência química e que passou a constar na Política Nacional de Drogas no governo Bolsonaro. A questão foi tema de diversas reuniões do Conad.

Comunidades terapêuticas são entidades privadas sem fins lucrativos. Elas se diferenciam de outros serviços de atendimento a pessoas nessas condições por promoverem terapias que incluem trabalho e práticas religiosas, como rezas. As comunidades terapêuticas têm a meta de fazer com que o usuário problemático de drogas se torne abstêmio e se reintegre socialmente.

Ao mesmo tempo em que o Conad contava com representantes da sociedade civil, como o Conselho Federal de Psicologia (CFP) e o Conselho Federal de Serviço Social (CFESS), que se colocaram repetidamente contra a transferência de recursos públicos para essas instituições, as duas cadeiras reservadas ao terceiro setor foram majoritariamente ocupadas por pessoas ligadas a organizações de comunidades terapêuticas.

Exemplos disso são a Fazenda da Esperança, o Conselho Estadual de Comunidades Terapêuticas, a Federação Brasileira de Comunidades Terapêuticas (Febract) e a Confederação Nacional de Comunidades Terapêuticas (Confenact).

Durante os doze anos de trabalho do Conad, também ocuparam as cadeiras do terceiro setor organizações como o Sesi, o Sindicato dos Psicólogos de SP e a ONG Lua Nova.

Em março de 2014, foi constituído um Grupo de Trabalho (GT) para discutir a regulamentação das comunidades terapêuticas. Após quase um ano de debates e duas audiências públicas, a resolução foi aprovada, com abstenção do representante do Ministério da Saúde. Não consta em ata quem votou a favor e quem votou contra a proposta.

Em 2016, a resolução foi questionada na Justiça pelo Ministério Público Federal (MPF) e revogada pelo próprio Conad. Isso porque, para o MPF, a decisão alterava a política de saúde, algo que não era da competência do conselho. Já no governo Temer, em 2018, após a União recorrer da decisão da justiça e conseguir uma sentença favorável, a resolução voltou a valer.

Política de abstinência

Ao longo dos doze anos de atas analisadas, foram identificadas discussões sobre políticas de abstinência em contraposição à política de redução de danos, que era defendida nos governos Lula e Dilma.

Ao contrário da abstinência, tratamentos que utilizam política de redução de danos não exigem necessariamente que os dependentes abandonem por completo o uso de drogas.

A terceira e última resolução do Conad, aprovada em março de 2018, antecipou parte das mudanças instituídas em 2019 pela nova Política Nacional de Drogas. Esta resolução se baseou no Projeto de Lei 37 apresentado em 2013 por Osmar Terra, na época deputado federal.

Segundo notícia publicada na época, no site do Ministério da Justiça, o texto aprovado consolidou uma guinada na política da abstinência no Brasil. “A orientação central da Política Nacional sobre Drogas deve considerar aspectos legais, culturais e científicos, em especial a posição majoritariamente contrária da população brasileira quanto a iniciativas de legalização de drogas”, diz um trecho da resolução.

De acordo com os registros, as categorias dos psicólogos, assistentes sociais e antropólogos se manifestaram repetidamente como sendo contrárias a políticas de abstinência. Em reunião de agosto de 2012, o representante do Conselho Federal de Psicologia afirmou que “propostas de tratamento para qualquer tipo de droga, voltadas à abstinência como única possibilidade, estão fadadas ao fracasso”.

Ao mesmo tempo, representantes de comunidades terapêuticas, assim como médicos, no geral, se colocavam contra a redução de danos. O então representante do Conselho Federal de Medicina (CFM) afirmou em reunião de setembro de 2010 que alguns aspectos dessa política não atendiam à necessidade de se fazer uma repressão efetiva às drogas. “Muitas vezes a impressão é de que há um consentimento social, uma tolerância para o consumo das substâncias ilícitas”, disse.

Conforme consta em registro de reunião em outubro de 2016, após críticas ao marco regulatório aprovado pelo Conad, o então representante da Confederação Nacional de Comunidades Terapêuticas (Confenact), Egon Schlüter, afirmou: “não consta a palavra abstinência na resolução, nós lutamos pelo direito de a pessoa dependente escolher. O nosso atendimento é voluntário e a qualquer momento ela pode desistir”. Como explicou em entrevista ao Comprova, a Confenact é favorável à política de abstinência como objetivo final do tratamento e, à redução de danos apenas como meio de levar a pessoa ao tratamento.

O texto falso foi publicado pelo site Jornal da Cidade Online e, conforme dados do plugin Crowdtangle do Facebook, teve até a data de 6 agosto mais de 5,9 mil curtidas e 1,8 mil compartilhamentos na rede social. O material foi compartilhado por páginas como Direita São Paulo e Bolsonaro News BR.

Contexto

O decreto que reduziu a participação da sociedade civil no Conad foi publicado um mês depois da aprovação pelo Senado de projeto que promoveu alterações na política nacional de drogas.

Entre as mudanças estão a incorporação das comunidades terapêuticas ao Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas (Sisnad) e a volta da abstinência como objetivo do tratamento da dependência química. O projeto é de 2013 e de autoria do ex-deputado federal e atual ministro da Cidadania, Osmar Terra.

Ao longo dos anos, os representantes do Conad debateram inúmeras vezes sobre a regulamentação das comunidades terapêuticas e também sobre as políticas de redução de danos e de abstinência. Como o Comprova verificou, não havia consenso entre os conselheiros nesses temas.

Em 2016, Osmar Terra passou a representar o Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário no Conad e, conforme consta em ata, fez críticas à política de drogas então em vigor: “O problema nosso é que a nossa lei é uma lei mal feita, ela é uma lei de ideias liberais”.

Figura-chave para aprovação da resolução do Conad de 2018, que já definia a política de abstinência como prioridade antes de ela se tornar lei, foi ele quem apresentou o texto da resolução ao Conselho e reiterou, inúmeras vezes, a urgência de deliberação. “Precisamos dar uma resposta à sociedade, não podemos mais adiar essa decisão, temos que avançar, dar um passo adiante”, afirmou, segundo consta em ata.

Em reunião em 1º de fevereiro de 2018, parte dos representantes da sociedade civil se colocou contra a votação da proposta. A representante do CFESS defendeu realização de audiências e consultas públicas para debater o tema com a população. A SBPC e a CNE alertaram para ausência de mecanismos para aprimorar a política de drogas que envolvessem áreas da educação. As organizações criticaram, ainda, a falta de pesquisas para embasar as discussões da proposta. Já a Confenact defendeu que a votação não fosse interrompida, uma vez que o conteúdo da proposta já havia sido divulgado.

Após um pedido coletivo de vista, o Conad adiou a votação, que foi realizada em 1º de março de 2018. A resolução foi aprovada por 16 votos a favor e quatro contra. Desde então, o Conad só se reuniu uma vez, em junho de 2018.

Categorias da sociedade civil que deixaram de fazer parte do Conad

Conselhos com direito a indicar um representante:

Representantes indicados pelo próprio Governo (mandato de dois anos)

  • 2 representantes do terceiro setor
  • representante do meio artístico
  • representante da imprensa
  • antropólogo

Onde acessar as atas das reuniões:

Saiba mais

Bolsonaro reduz participação da sociedade em conselho de políticas sobre drogas

Como as comunidades terapêuticas ganham força no Brasil

Senado aprova projeto que altera política nacional de drogas

Verificação

Investigado por: 2019-08-06

É falsa a corrente que acusa a Embaixada do Brasil nos EUA de ser “reduto do PT”

  • Falso
Falso
O Comprova não encontrou nenhuma evidência de que exista na Embaixada uma sala de reuniões batizada com o nome de Marielle Franco, que o local exiba nas paredes a inscrição "Lula Livre", que tenha patrocinado manifestações em favor do ex-presidente Lula ou que sirva de abrigo para integrantes do MST

É falso que a Embaixada do Brasil em Washington, nos Estados Unidos, seja um “reduto do PT'” (Partido dos Trabalhadores), que tenha batizado uma sala de reuniões com o nome de Marielle Franco e que tenha sido usada politicamente para apoiar a esquerda, como afirma uma corrente que circula no WhatsApp e nas redes sociais.

Segundo o texto, o presidente Jair Bolsonaro teria escolhido o filho Eduardo Bolsonaro, deputado federal pelo PSL de São Paulo, para ser o novo embaixador em Washington para que ele ”faxinasse” o órgão. A corrente faz acusações sobre as quais não há evidências em outras fontes de informação.

O texto acusa a Embaixada de batizar uma sala de reuniões com o nome de Marielle Franco, vereadora carioca assassinada em 2018, e de exibir nas paredes a inscrição “Lula Livre”, em referência à prisão do ex-presidente. A peça também acusa a Embaixada de ter patrocinado manifestantes que reivindicam a soltura de Lula e abrigado integrantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). A fonte dessas informações, segundo a corrente, seria um advogado brasileiro que vive em Washington e “muitas vezes precisa ir à Embaixada” para “resolver assuntos de outros brasileiros”.

Como verificamos

Para fazer esta verificação, o Comprova entrou em contato com a Embaixada em Washington, com o Itamaraty e com o MST. Foram também consultadas jornalistas brasileiras que trabalham na capital americana e três outros brasileiros que residem na cidade e frequentam a Embaixada. Além disso, buscamos informações sobre as despesas da Embaixada no Portal da Transparência do governo federal e levantamos fotos do local nas redes sociais e no Google Maps.

A Embaixada do Brasil em Washington afirmou ao Comprova por e-mail que as informações divulgadas na corrente “são patentemente falsas” e não têm “nenhum fundamento”. Afirmou que é um órgão oficial do governo brasileiro, que não conta com inscrições de cunho político, não recebe ou apoia atos políticos de qualquer sorte nem “oferece espaço para a realização de reuniões que não sejam relacionadas diretamente às suas atividades oficiais”.

A Embaixada também ressalta que não tem setor consular, ou seja, não atende a brasileiros para resolver problemas pessoais (como renovar visto ou pedir segunda via de passaporte), competência que hoje cabe a outro órgão, o Consulado-Geral do Brasil em Washington. A informação contradiz o conteúdo do texto que viralizou, segundo o qual um advogado teria “descoberto” o viés de esquerda do órgão por causa de visitas feitas para resolver contratempos de clientes brasileiros. A Embaixada afirma que trata exclusivamente de assuntos de política externa, com o objetivo de “defender os interesses do Brasil nos EUA”. No local trabalham servidores do chamado Serviço Exterior Brasileiro.

A resposta da Embaixada foi corroborada por outros brasileiros consultados pelo Comprova.

As correspondentes em Washington Beatriz Bulla, do Estadão, e Marina Dias, da Folha
de S. Paulo, afirmam que nunca viram escritos de “Lula Livre” nas paredes nem souberam de salas com o nome de Marielle Franco em nenhum dos prédios da Embaixada. “Posso dizer com segurança que isso é boato”, disse Marina, correspondente desde março.

André Borges, conselheiro da diretoria do Banco Interamericano de Desenvolvimento, disse ao Comprova poder “afirmar categoricamente que nunca viu ou ouviu menção a nenhum dos pontos mencionados no texto” que viralizou, incluindo as acusações relacionadas ao MST. Ele respondeu à reportagem enquanto estava a caminho de uma reunião na Embaixada.

O Comprova fez uma ronda nas principais redes sociais em busca de fotos internas da Embaixada e não encontrou nenhuma imagem ou relato de usuário que corrobore o conteúdo do texto. É possível conferir fotos cuja localização é a Embaixada do Brasil em Washington no Instagram e no Facebook (é preciso clicar nas setas ao lado das fotos para ver as imagens seguintes). O Google Maps também disponibiliza fotos do local.

Nunca ouvi dizer de [a Embaixada] dar contribuição financeira para protestos, nunca me foi oferecido e nunca chegou a mim notícia de alguém que tenha recebido”, também contou ao Comprova Livia Lopes, professora na George Washington University. Ela diz que tem contato frequente com órgão brasileiro para firmar parcerias em projetos acadêmicos. “Nunca vi membros do MST por lá nem de nenhum movimento social. A Embaixada em geral recebe autoridades e ‘notáveis’ para eventos oficiais, mas que duram poucas horas”, disse.

“Diplomatas e funcionários têm linhas ideológicas e preferências distintas, mas noto que todos são respeitosos com a figura do presidente no poder”, continuou ela, que diz ter começado a frequentar a Embaixada durante o mandato de Dilma Rousseff (PT). “Os diplomatas ali são profissionais com décadas de experiência, dedicados ao aprofundamento da relação entre Brasil e Estados Unidos”, acrescentou Roberta Braga, que é diretora associada no Atlantic Council, think tank que atua com assuntos internacionais.

A Embaixada afirmou ao Comprova que não publica agenda ou calendário de atividades oficiais, mas divulga as principais ações do órgão em um boletim mensal por email. De outubro de 2015 a junho de 2019, mês da edição mais recente do boletim, não foram divulgadas atividades relacionadas ao MST ou a outra organização de esquerda.

Alguns dos eventos em destaque nesse tempo foram a eleição de Bolsonaro, em outubro de 2018, reuniões de grupos multilaterais, visitas de autoridades brasileiras aos EUA, ciclos de palestras sobre temas do país e apresentações culturais, entre outros. No último mês, a Embaixada divulgou chamadas para uma cerimônia sobre as vítimas do comunismo para o 30º aniversário da queda do Muro de Berlim, que marcou o início da derrocada da antiga União Soviética (1917-1991) e da polarização entre comunismo e capitalismo no mundo.

Ao Comprova, Gilmar Mauro, integrante da coordenação nacional do MST, afirmou que insinuar que a Embaixada tenha apoiado o movimento é “um absurdo”. “Nenhum membro do MST ficou hospedado na Embaixada em Washington, e nunca tivemos nenhum financiamento de nenhuma Embaixada de nenhuma parte do mundo”, disse. Ele contou que a organização realizou manifestações nos EUA e que seus integrantes com frequência participam de debates no país, mas por meio de “apoio de amigos”, não de órgãos oficiais.

Ao lado de outros grupos, integrantes do MST, sob o movimento de nome Amigos do Brasil, realizaram um ato em frente à Embaixada em Washington em junho de 2017. Eles protestavam na época contra atos de repressão no Brasil a manifestações que criticavam o governo do ex-presidente Michel Temer (MDB). Apesar de ter acontecido em frente ao órgão, o evento não teve apoio institucional da Embaixada, mas de movimentos sociais.

“Protestos [na Embaixada] em geral vejo organizados pela sociedade civil”, disse Livia Lopes ao Comprova. “Como ocorre com a sociedade americana e as questões que os afetam, também a comunidade brasileira protesta quando não está satisfeita.”

As despesas da Embaixada em Washington, de 2012 até julho de 2019, podem ser consultadas (veja como) no Portal da Transparência do governo federal. Para verificar se o órgão financiou algum protesto no Brasil em favor da liberdade do ex-presidente Lula, preso em abril de 2018, o Comprova consultou dados do portal desde aquele mês até o presente. Não foram encontradas entre as despesas referências a alguma manifestação de esquerda no Brasil, mas a gastos com folha de pagamento, material e eventos no órgão.

Bolsonaro e membros do governo foram à Embaixada

Em março deste ano, Bolsonaro fez uma visita oficial aos EUA acompanhado de uma vasta comitiva: seu filho, Eduardo Bolsonaro, presidente da Comissão de Relações Exteriores da Câmara; os ministros Ernesto Araújo (Relações Exteriores), Paulo Guedes (Economia), Sergio Moro (Justiça e Segurança Pública), Augusto Heleno (Gabinete de Segurança Institucional), Tereza Cristina (Agricultura), Marcos Pontes (Ciência e Tecnologia) e Ricardo Salles (Meio Ambiente); e Filipe Martins, assessor especial da Presidência para assuntos internacionais.

O primeiro compromisso da delegação, na noite do dia 17, foi um jantar com o então embaixador do Brasil nos EUA, Sérgio Amaral, ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior no governo de Fernando Henrique Cardoso e à frente da Embaixada desde 2016. O evento contou ainda com a presença de Olavo de Carvalho, que mora em Richmond, estado da Virgínia. O presidente postou em suas redes sociais uma foto em que aparece com Filipe Martins, Carvalho, o chanceler Araújo e o filho Eduardo com a legenda “Jantar na embaixada do Brasil nos EUA”. Martins retuitou e comentou: “Grande dia!”.

Eduardo foi menos econômico e escreveu em sua página no Facebook: “Privilégio poder participar deste momento, na minha opinião histórico: encontro de Jair Messias Bolsonaro com Olavo de Carvalho. Foi um jantar agradável, um bate-papo à vontade propiciado pelo embaixador do Brasil nos EUA Sérgio Amaral. Grande noite!”. O chanceler Ernesto Araújo chegou a dar uma entrevista coletiva na Embaixada, além de ter postado foto no Twitter.

Nem Bolsonaro nem Eduardo, Araújo, Olavo de Carvalho ou algum outro ministro relatou ter visto o termo “Lula livre” nas paredes do local ou uma sala com o nome de Marielle Franco. Tampouco relataram ter encontrado na Embaixada um “reduto do PT”.

Por e-mail, o Comprova perguntou ao Itamaraty se o conteúdo da corrente que viralizou é verdadeiro, considerando que o ministro das Relações Exteriores e outros integrantes do órgão frequentaram a Embaixada em Washington. Em resposta, o órgão afirmou que as “informações” do texto enviado pelo Comprova “não procedem”. A assessoria de Eduardo Bolsonaro também foi procurada, mas não enviou resposta até a publicação deste texto.

A corrente que viralizou foi divulgada pela página Notícias Servseg e por perfis pessoais no Facebook e no Twitter. A corrente também transitou em grupos de WhatsApp acompanhados pelo Monitor de WhatsApp da Universidade Federal de Minas Gerais, que mapeia conteúdo viral em grupos públicos do aplicativo. Além do Comprova, o Boatos.org verificou o texto.

Contexto

Deputado federal e presidente da Comissão de Relações Exteriores da Câmara, Eduardo Bolsonaro virou assunto no dia 11 de julho, quando o pai disse em entrevista a jornalistas que indicaria o “Zero Três” para o cargo de embaixador do Brasil nos Estados Unidos. O cargo está vago desde 10 de abril, quando o chanceler Ernesto Araújo demitiu o diplomata Sérgio Amaral, à frente da Embaixada desde 2016.

Historicamente, o cargo de embaixador é ocupado por diplomatas de carreira do Itamaraty, como mostra esta reportagem do portal Huffpost Brasil. Advogado e escrivão da Polícia Federal, o filho do presidente não tem formação internacional. Ao responder sobre suas qualificações, o deputado disse:

“Já fiz intercâmbio, já fritei hambúrguer lá nos EUA, no frio do Maine, estado que faz divisa com o Canadá. No frio do Colorado, numa montanha lá, aprimorei meu inglês. Vi como é o trato receptivo do norte-americano para com os brasileiros. Então acho que é um trabalho que pode ser desenvolvido. Certamente precisaria contar com a ajuda dos colegas do Itamaraty, dos diplomatas, porque vai ser um desafio grande. Mas tem tudo para dar certo”,

A indicação de Eduardo Bolsonaro para a Embaixada do Brasil em Washington ainda precisa passar pela aprovação do Senado.

A Embaixada do Brasil em Washington

A Embaixada do Brasil em Washington, principal representação diplomática nos EUA, dedica-se a defender os interesses brasileiros no país. É considerada fundamental para a execução da política externa brasileira – atraindo investimentos e promovendo o comércio exterior – e para integrar o Brasil a temas importantes da agenda internacional.

É também considerada uma das Embaixadas mais estratégicas para o Ministério das Relações Exteriores, devido à longa tradição na diplomacia entre Brasil e EUA, ao grande poder econômico e militar norte-americano e à influência do país nas Américas. Os
Estados Unidos também são o país com a maior comunidade brasileira no exterior.

A Embaixada divide-se em dois prédios. A residência do Embaixador, um prédio clássico onde vive o chefe do órgão, nomeado pelo presidente da República, e a Chancelaria, edifício modernista onde fica o corpo de funcionários. Ali trabalham diplomatas e integrantes do chamado Serviço Exterior Brasileiro, corpo de servidores federais que representam o Brasil nos Estados Unidos. Estão também na Embaixada representantes de outros órgãos da administração federal, como o Ministério da Defesa, a Polícia Federal e a Receita Federal.

Saiba mais

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Confira detalhes da Embaixada do Brasil nos EUA (Estadão)

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Além da Casa Branca: a importância da embaixada do Brasil em Washington (Exame)

Política

Investigado por: 2019-08-01

É falso que Bolsonaro anunciou fim das cotas nas universidades federais

  • Falso
Falso
A informação do vídeo se refere a um edital de vestibular específico para transexuais e travestis que foi suspenso em uma universidade. A decisão não afeta outros processos seletivos nem a política de cotas de outras instituições de ensino

Um vídeo com o título “BOLSONARO ANUNCIA FIM DAS COTAS NAS UNIVERSIDADES FEDERAIS E REV0LTA ESQUERDISTAS” viralizou no YouTube. Essa alegação é falsa.

A publicação utiliza trechos de gravações de um café da manhã de Bolsonaro com a bancada evangélica e um discurso do deputado federal Otoni de Paula (PSC-RJ), além de citar, sem contexto, uma reportagem do jornal O Globo. O vídeo encerra com a afirmação de que o presidente teria acabado com as cotas nas instituições federais.

O Comprova apurou que a informação do vídeo, na verdade, se refere a um edital de vestibular específico para transexuais e travestis da Universidade da Integração da Lusofonia Afro-Brasileira (Unilab), suspenso após questionamentos da Procuradoria Federal ligada à universidade e que faz parte da estrutura da Advocacia-Geral da União (AGU). A decisão não afeta outros processos seletivos nem a política de cotas de outras instituições de ensino.

Como verificamos

O Comprova checou as informações publicadas no vídeo com o Ministério da Educação, editais de vestibulares de universidades federais, incluindo o da própria Unilab, o parecer da Procuradoria-Geral ligada à instituição sobre o processo seletivo e as legislações que preveem a autonomia universitária e o uso de cotas para ingresso no ensino superior. Também foram consultados vídeos gravados pelo Palácio do Planalto e da sessão plenária da Câmara dos Deputados na qual Otoni de Paula fez seu discurso.

As imagens que aparecem no vídeo enganoso são do dia 11 de julho, durante um café da manhã de Bolsonaro com a bancada evangélica (o vídeo não pode ser aberto pelo Google Chrome). Questionado pelo deputado Otoni de Paula sobre o vestibular da Unilab, Bolsonaro responde (2min44seg) que “será analisado” e diz que vai “passar para o ministro Weintraub”. Bolsonaro opina que “coisas absurdas vêm acontecendo dada a autonomia das universidades”.

Outra cena exibida no vídeo é de um discurso de Otoni de Paula na Câmara dos Deputados, no mesmo dia, sobre a decisão da Unilab de abrir um vestibular específico para transexuais e travestis. O vídeo está disponível no site da Casa legislativa e, para assistir, é necessário clicar em “reproduzir” ao lado do nome de Otoni de Paula que aparece às 23h38min.

Em um trecho do vídeo verificado pelo Comprova (aos 3min47seg), aparece a imagem da notícia da suspensão do vestibular publicada em O Globo no dia 16 de julho. No título: “MEC intervém e universidade federal suspende o vestibular para trans, diz Bolsonaro”. O anúncio da suspensão foi feito por Bolsonaro em seu perfil no Twitter.

Procurado pelo Comprova, o Ministério da Educação afirma em nota que apenas “questionou a legalidade do processo seletivo” da Unilab via Procuradoria-Geral da República.

“A motivação se deu pelo fato de que a Lei de Cotas não prevê vagas específicas para o público-alvo do citado vestibular. A universidade não apresentou parecer com base legal para elaboração da política afirmativa de cotas, conforme edital lançado. Por esta razão, a Unilab solicitou o cancelamento do certame”, afirma a pasta.

O edital do vestibular foi divulgado sem que tivesse sido apresentado à Procuradoria-Federal junto à Unilab. O parecer só foi elaborado pelo procurador-chefe, Felipe Grangeiro de Carvalho, em 15 de julho de 2019, na véspera do cancelamento do processo seletivo.

O documento não cita nenhuma intervenção do Ministério da Educação nem do governo federal no edital. O parecer foi elaborado em resposta a um questionamento da reitoria da Unilab e conclui pela suspensão do edital do vestibular específico, decisão que não afeta outros processos seletivos de outras instituições.

Ao Comprova, a Unilab afirma que “oficialmente, portanto, só houve ação da nossa própria procuradoria”. Em nota divulgada após a suspensão do edital, a instituição afirma que o parecer da procuradoria “expressou o entendimento de que o edital vai de encontro à Lei de Cotas e aos princípios da razoabilidade, proporcionalidade e da ampla concorrência em seleções públicas”.

A Unilab foi a primeira universidade a propor um vestibular exclusivo a candidatos transgêneros e intersexuais, mas cotas específicas a esses públicos já foram utilizadas em processos seletivos de outras instituições. É o caso da Universidade Federal do Sul da Bahia, a Universidade Federal do ABC e a Universidade Federal da Bahia.

Outras instituições garantem cotas semelhantes em editais de seleção para programas de mestrado e doutorado.

Vestibular era para vagas que não foram preenchidas pelo Sisu

O vestibular da Unilab seria o primeiro no país exclusivo para pessoas transgêneras e intersexuais. Eram oferecidas 120 vagas para início no segundo semestre deste ano que haviam ficado ociosas, ou seja, que não foram preenchidas através do Sistema de Seleção Unificada (Sisu). Todas eram para a graduação presencial, em 15 cursos, oferecidos no Ceará (nas cidades de Redenção e Acarape) e na Bahia (em São Francisco do Conde).

A universidade funciona desde 2011 e afirma ter “como missão institucional específica formar recursos humanos para contribuir com a integração entre o Brasil e os demais países membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), especialmente os países africanos”. Ao todo, a instituição oferece 25 cursos de graduação.

Constituição garante autonomia universitária

A autonomia das universidades e instituições de ensino federais é assegurada pela Constituição de 1988, que prevê em seu Art. 207: “As universidades gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial, e obedecerão ao princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão”. Ou seja, os processos de seleção são definidos pela própria universidade, desde que amparados pela legislação vigente, independentemente do governo.

O uso de cotas, por sua vez, é instituído pela Lei 12.711/12 (“Lei das Cotas”), que determina o mínimo de 50% das vagas em cada processo seletivo a candidatos que tenham cursado integralmente o ensino médio em escolas públicas. De acordo com a legislação, a porcentagem de vagas destinadas a pessoas autodeclaradas pretas, pardas e indígenas e pessoas com deficiência deve seguir, no mínimo, a proporção respectiva de pretos, pardos, indígenas e pessoas com deficiência na população da unidade da Federação onde está instalada a instituição.

A Lei das Cotas, no entanto, não especifica a reserva de uma determinada porcentagem de vagas para pessoas transgêneros e intersexuais. Na verdade, a legislação não faz diferenciação envolvendo a orientação sexual dos candidatos, apenas sua autodeclaração racial e se concluiu o ensino médio em escola pública.

Quem é o autor do vídeo

O vídeo é do canal O Jacaré de Tanga, que tinha 802,3 mil inscritos no Youtube no dia 31 de julho e foi criado em 30 de janeiro de 2017. Feita em 26 de julho, a publicação em que é anunciado enganosamente o fim das cotas teve mais de 179 mil visualizações e 35 mil curtidas até o dia 31 de julho.

O autor do vídeo é Felipe Lintz, apoiador do presidente Jair Bolsonaro. Ele era coordenador nacional do Movimento Brasil Livre (MBL) e deixou o grupo em 2017. Em uma entrevista publicada no Youtube, ele e outro integrante do canal, Felipe Ferreira, são questionados sobre a saída do movimento. A justificativa é de que “se decepcionaram”. Desde 2018, a página vem fazendo publicações com críticas a lideranças do MBL, como o deputado federal Kim Kataguiri (DEM-SP) e o vereador de São Paulo Fernando Holiday (DEM).