O Projeto Comprova é uma iniciativa colaborativa e sem fins lucrativos liderada pela Abraji e que reúne jornalistas de 42 veículos de comunicação brasileiros para descobrir, investigar e desmascarar conteúdos suspeitos sobre políticas públicas, eleições, saúde e mudanças climáticas que foram compartilhados nas redes sociais ou por aplicativos de mensagens.
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Política

Investigado por: 2019-10-01

Terras indígenas em Rondônia não foram vendidas a empresa irlandesa

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Falso
Contrato foi anulado pela Justiça e era, na verdade, para venda de créditos de carbono

É falso um texto compartilhado no Facebook afirmando que terras indígenas em Rondônia teriam sido vendidas para uma organização irlandesa e que a negociação teria sido anulada pela Justiça.

Na realidade, um contrato para a venda de créditos de carbono, celebrado entre uma empresa irlandesa e uma associação indígena, foi suspenso em 2012 por decisão judicial provisória, a pedido da Advocacia Geral da União (AGU).

O contrato previa que a empresa irlandesa teria os direitos sobre os créditos de carbono gerados pela preservação da floresta pelos indígenas nos trinta anos seguintes. No entendimento da Justiça, os termos do acordo seriam ilegais e abusivos.

Caso fosse um contrato de venda, ele também seria considerado ilegal, pois a Constituição não permite a venda de terras indígenas.

O contrato foi assinado em 2011 pela irlandesa Celestial Green Ventures PL e a Associação Indígena Awo “Xo” Hwara, organização que é apontada no documento como representante das terras indígenas de Igarapé Lage, Rio Negro-Ocaia e Igarapé Ribeirão, localizadas em Guajará-Mirim, em Rondônia. A Celestial Green Ventures já havia feito negociações semelhantes no mesmo período com outros povos indígenas.

O valor total do contrato era de US$ 13 milhões, que seriam pagos à associação indígena em parcelas anuais de US$ 445 mil, ao longo de 30 anos. No entanto, nada chegou a ser pago, porque a venda de créditos de carbono foi anulada pela Justiça Federal em Rondônia em 2012, a pedido da AGU.

Um dos argumentos foi de que a Fundação Nacional do Índio (Funai) não participou da articulação. Segundo a legislação, as terras são de uso exclusivo dos indígenas e o aproveitamento dos recursos só pode ser efetivado se o governo federal concordar.

A anulação do contrato foi confirmada em 2018, decisão a que se refere o texto verificado pelo Comprova. O processo transitou em julgado em junho de 2019, ou seja, não cabe mais recurso.

Esta verificação do Comprova analisou um texto publicado no site Terça Livre, compartilhado em uma página de apoio ao ministro Sergio Moro e pela página República de Curitiba no Facebook.

Falso para o Comprova é o conteúdo divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.

Como verificamos

Para esta verificação, o Comprova consultou o andamento do processo de número 0012239-70.2012.4.01.4100 no site da Justiça Federal em Rondônia [Para visualizar os documentos, você deve acessar a área “inteiro teor”].

Além disso, entramos em contato com as assessorias de imprensa da Funai e da AGU e ouvimos Pedro Soares, gerente de REDD+ (Redução das Emissões por Desmatamento e Degradação) da ONG Instituto de Conservação e Desenvolvimento Sustentável da Amazônia (Idesam).

Também foi contatado Raul Silva Telles do Valle, diretor de Justiça Socioambiental da ONG internacional World Wide Fund for Nature, conhecida pela sigla WWF.

O Comprova não conseguiu acesso à íntegra do contrato entre a Celestial Green e a Associação Indígena Awo “Xo” Hwara.

Através de pesquisas pelo CNPJ da empresa no site da Receita Federal, foi possível encontrar dois cadastros de 1997 com o nome da associação, um deles inativo desde 2008 e o outro ativo. Porém, o Comprova não conseguiu contato com a entidade através dos telefones que estão disponíveis.

Você pode refazer o caminho da verificação do Comprova usando os links para consultar as fontes originais.

O que é o mercado de créditos de carbono

O mercado de créditos de carbono do Redd (Redução das Emissões por Desmatamento e Degradação) prevê que uma entidade pode pagar outra por ela ter evitado a emissão de gases que provocam o efeito estufa (por meio de ações como a redução do desmatamento). Cada crédito é equivalente ao aquecimento global causado por uma tonelada métrica de dióxido de carbono (CO2).

O Redd é um mecanismo voltado para o pagamento daqueles que preservam florestas, reconhecendo que mantê-las de pé ajuda a conter a emissão de gases estufa. O conceito vem sendo desenvolvido desde 2003 nas Conferências do Clima organizadas pela ONU. Umas das discussões é de que maneira países desenvolvidos podem remunerar países em desenvolvimento que conservam suas florestas.

Por que o contrato foi anulado?

Segundo as decisões dos juízes, há dois argumentos principais para a anulação do contrato: o fato de que a lei prevê consulta às comunidades indígenas nas negociações e que a Funai deveria ter sido contatada. Para isso, usam como base o artigo 8º do Estatuto do Índio e o artigo 231 da Constituição Federal.

Também foi apontado que o uso das terras indígenas é exclusivo dos povos indígenas e que, apesar do direito ao uso, as terras são da União.

A juíza Laís Durval Leite, responsável pela sentença de 2018, avaliou que não pode haver exploração comercial das terras indígenas, pois, ao garantir esse direito, o objetivo é de preservar a cultura e as tradições desses povos. A juiza classificou ainda como “abusiva” a cláusula do contrato “que impede o uso da terra, dos rios e dos lagos pelos seus ocupantes tradicionais”.

Em entrevista ao Comprova, Pedro Soares, gerente de REDD+ do Idesam, afirmou que os projetos de Redd deveriam prever apenas ações para redução de desmatamento ilegal e atividades que não vão contra o plano de gestão dessas terras. “Qualquer coisa fora disso, que vá restringir atividades tradicionais, é errada e não pode ser feita dentro de um contrato do tipo”, disse.

Em entrevista ao Comprova, o diretor de Justiça Socioambiental da WWF, Raul Silva Telles do Valle, afirmou que, em geral, indígenas deveriam ter o direito de comercializar créditos de carbono de suas terras. “Se eles têm o direito de usar a terra, eles podem decidir se pode desmatar ou não. (…) Assim como, se explorar madeira, eles que vão vender. (…) Nessa mesma lógica, o carbono não é algo em si, mas é a ação de abrir mão de desmatar e de isso ser reconhecido por terceiros como um benefício para a humanidade”, afirmou.

Em 2012, antes da primeira decisão que suspendia o contrato, a Funai consultou a Advocacia-Geral da União (AGU) sobre a possibilidade de vender créditos de carbono em terras indígenas. A AGU afirmou que era necessário debater a questão para definir leis e políticas públicas a respeito.

A AGU apontou risco nesse tipo de contrato por questões como a dificuldade de confirmar que essas organizações indígenas representem os povos indígenas envolvidos, além de “violações que têm sido verificadas à autonomia e aos direitos dos povos indígenas”.

Tanto a Constituição Brasileira, quanto a Convenção 169 da OIT (Organização Internacional do Trabalho), que trata de povos indígenas e tribais, preveem a criação de um protocolo de que defina o que deve ser considerado consulta oficial a um povo indígena. O protocolo das terras indígenas envolvidas no contrato foi publicado na última sexta-feira (27).

O que é a Celestial Green Ventures?

A Celestial Green Ventures era uma empresa que dizia se dedicar a financiar projetos de compensação de carbono, ou seja, iniciativas de reflorestamento ou preservação de florestas com o objetivo de compensar a emissão de gás carbônico por empresas. A informação está em documento enviado pela Celestial Green Ventures para o site de jornalismo investigativo Agência Pública em 2012.

De acordo com reportagem do Estado de S. Paulo de 2012, no mesmo período, a Funai registrava 30 projetos semelhantes. Deles, 16 eram com a empresa irlandesa.

Segundo dados disponíveis no site do Companies Registration Office, órgão do governo irlandês para registro de empresas, a Celestial Green Ventures foi criada em Dublin, capital irlandesa, em 2010, mas foi liquidada em 2016.

Em que contexto foi feito o contrato?

Os contratos entre a Celestial Green e diferentes povos indígenas foram feitos no contexto do avanço do debate sobre o Redd, que seria uma recompensa em dinheiro a governos, pessoas jurídicas ou projetos que tenham reduzido sua emissão de gases estufa, por meio da redução do desmatamento.

Um dos mecanismos do Redd é o mercado voluntário de créditos de carbono – chamado assim porque os créditos obtidos por meio dele não podem ser considerados nas metas de redução de emissões que os países tenham que cumprir. Nele, pessoas jurídicas e projetos podem vender créditos de carbono fiscalizados por entidades independentes da ONU.

O que diferencia o mercado voluntário do mercado obrigatório (ou regulado) é que ele não está atrelado aos acordos internacionais vigentes. Para o Redd, isso muda em 2020, quando entra em vigor o Acordo de Paris, e ele passará a integrar o mercado regulado.

De acordo com Pedro Soares da ONG Idesam, o contrato da Celestial Green era um projeto mal-intencionado e mal feito. “Ela (a empresa) tentou se aproveitar de um mecanismo (Redd) em construção para um benefício próprio. A gente acredita que, se houvesse regulamentação de Redd no Brasil, esse projeto [da Celestial Green] nunca teria chegado no estágio em que chegou”, afirmou Soares.

O que a legislação brasileira diz a respeito do Redd?

Não existe legislação federal no Brasil que defina as regras de Redd, tampouco suas particularidades em relação a povos indígenas. Alguns estados, como Acre, Rondônia, Amazonas e Mato Grosso, criaram leis estaduais sobre o tema.

Em 2015, a portaria nº 365 do Ministério do Meio Ambiente instituiu o Programa de Monitoramento Ambiental dos Biomas Brasileiros e, no ano seguinte, o governo brasileiro lançou sua Estratégia Nacional para REDD+. Apesar disso, não há lei que especifique as regras de como isso deve ocorrer.

Mercado obrigatório de crédito de carbono

O mercado obrigatório de créditos de carbono consiste atualmente no Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), que entrou em vigor em 2005 e foi previsto pelo Protocolo de Kyoto. O MDL é regulado pela ONU. Por meio dele, países desenvolvidos apoiam projetos de redução de emissões de gases estufa em países em desenvolvimento, como o Brasil, com o objetivo de cumprir suas metas ambientais.

Repercussão nas redes

O Comprova verifica conteúdos duvidosos sobre políticas públicas do governo federal que tenham grande potencial de viralização.

O texto foi publicado no site Terça Livre no início de setembro, mas só foi compartilhado nas páginas República de Curitiba e Sérgio Moro no dia 26. Até o dia 1 de outubro, tinha 6 mil compartilhamentos e 3,3 mil curtidas na primeira e 2,7 mil compartilhamentos e 4,9 mil curtidas na segunda.

Política

Investigado por: 2019-09-27

Greta Thunberg não estuda na escola mais cara do mundo nem possui um veleiro; verificamos esses e outros boatos sobre ela

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Falso
Publicações em redes sociais tentam desqualificar jovem ativista sueca ao apontar posses e relações pessoais que ela não tem. Apoiadores do governo Bolsonaro reproduziram falsidades contra Greta no momento em que o Brasil tem sido criticado por sua atuação no meio ambiente

Após discursar, na segunda-feira (23), na Cúpula do Clima da Organização das Nações Unidas (ONU), a jovem sueca Greta Thunberg, de 16 anos, tem sido alvo de uma série de boatos e especulações em redes sociais. Os conteúdos, importados de outros países para o Brasil, atacam a credibilidade da ativista e de sua família.

As publicações, sem lastro na realidade, afirmam que a família de Greta tem iate e motorista particular, que Greta estuda na escola mais cara do mundo, que o pai é um cientista social gay que abandonou as filhas e acusam a mãe de ser uma lésbica satanista, entre outras inverdades.

Esta verificação do Comprova analisou conteúdos publicados nas páginas Comandante Viegas e Mulheres Unidas A Favor de Bolsonaro no Facebook e nos sites Estudos Nacionais e Pleno News.

Falso para o Comprova é o conteúdo divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.

Foto no trem é montagem

Uma das montagens falsas viralizadas na internet – e que foi inclusive compartilhada pelo deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL- SP) – mostra Greta fazendo uma refeição a bordo de um trem. Na janela, está um grupo de crianças negras sentadas em um tronco de árvore.

A montagem, que ganhou variações após o tuíte do deputado, usa uma foto que Greta publicou em seu Twitter em 22 de janeiro de 2019, com a legenda “Lunch in Denmark” (almoço na Dinamarca, em português).

Já a foto das crianças negras é de um slideshow inserido em uma reportagem publicada pela agência de notícias Reuters em 30 de agosto de 2007, sobre a comunidade de Korosigna, na República Centro-Africana.

Na mesma postagem compartilhada por Eduardo Bolsonaro, além da montagem, o filho do presidente Jair Bolsonaro inclui a imagem de um texto que diz que Greta é “financiada pela Open Society de George Soros”. Em resposta a seguidores que apontaram que a imagem era falsa, Eduardo postou link para um texto sobre a suposta relação de Greta com Soros.

O texto, no entanto, não traz nenhuma ligação direta de Greta com Soros ou com alguma entidade financiada pelo empresário.

Para relacionar Greta a Soros, o texto menciona o fato de ela aparecer em eventos junto da ativista alemã Luisa Neubauer, e que, também segundo a publicação, seria “porta-voz de uma ONG fundada com o dinheiro da Open Society, do bilionário George Soros”.

Luisa Neubauer é, de fato, jovem embaixadora da ong One, que tem entre seus financiadores a Open Society Foundations, fundada em 1993 por Soros.

No entanto, o nome de Greta não está listado entre as pessoas, organizações e grupos que receberam bolsas da Open Society.

Ela estuda na escola mais cara do mundo?

Em outra publicação, o texto afirma ironicamente que Greta Thunberg teve a infância roubada, em referência ao discurso da sueca na ONU, mas que estuda na escola mais cara do mundo. Isso não é verdade: ela era aluna de uma instituição pública e hoje está sem estudar, após tirar um ano sabático para dedicar-se ao ativismo pelo meio ambiente.

Até junho, Greta estava no nono ano da escola Kringlaskolan, em Estocolmo, conforme publicou em seu próprio Instagram, um dia após a formatura. Contatada pelo Comprova, a instituição confirmou que não há cobrança de mensalidade. A escola divulgou em setembro, em seu perfil no Facebook, uma entrevista de Greta à televisão americana na qual se refere à adolescente como ex-aluna. Além disso, a escola mais cara do mundo é a Le Rosey, na Suíça, com anuidade de £ 99,498 (R$ 509,78 mil), segundo levantamento do jornal britânico The Telegraph.

Greta tem um veleiro de 2 milhões?

A publicação afirma que a adolescente tem um veleiro de 2 milhões, sem especificar em qual moeda seria. Na verdade, Greta não tem um veleiro. A viagem que a ativista fez do Reino Unido a Nova York, onde mais tarde discursaria na ONU, foi de graça, oferecida pelo filho da princesa Caroline de Mônaco, Pierre Casiraghi, e pelo velejador profissional alemão Boris Herrmann, como afirmou o grupo Boris Herrmann Racing em comunicado e conforme noticiaram os jornais franceses Le Monde, Paris Match e Le Figaro. Greta, em seu Twitter, anunciou que havia ganhado uma carona para a viagem.

A sueca não usa avião desde 2015 para evitar a forte emissão de gases poluentes. A imagem que circula nas redes sociais, mostrando Greta em um veleiro, foi publicada em 27 de agosto no Instagram da própria Greta, com a legenda: “Dia 14. 119 milhas de Manhattan. Vento bastante leve ao sul de Long Island”. Na embarcação, estavam também o pai de Greta, Svante, e o documentarista Nathan Grossman.

Tem motorista particular para dirigir a Mercedes de seu pai?

A mesma publicação afirma que o pai de Greta tem um motorista particular. No entanto, o Comprova não encontrou nenhuma imagem ou informação na imprensa internacional ou nas redes sociais de Greta (1 e 2), do Instagram da irmã, Beata, do pai e da mãe registrando que Svante Thunberg tenha uma Mercedes ou motorista particular. A única foto envolvendo carro foi postada em 2018 pelo pai de Greta, do banco de carona, em seu Twitter, mas não é possível identificar que veículo é.

Há, nas redes sociais da família, duas menções a “motorista”, mas nenhuma delas se refere a Svante ter uma Mercedes e um motorista particular.

A mais recente é de 2018, quando o apresentador de um debate promovido pela The United Planet Faith & Science Initiative (UPFSI) brinca, em 0:52, que o pai de Greta é “relações públicas, motorista, protetor” da filha.

A menção mais antiga a um motorista é de 2015: durante uma viagem em turnê no Japão, a mãe de Greta, a cantora de ópera Malena Ernman, publicou uma foto que mostra um homem de traços asiáticos, vestido de terno, ao lado de um veículo preto. Na legenda, ela brinca com o fato de ter um motorista e evidencia que a família não tem um profissional para conduzi-los: “Meu motorista! É apenas no Japão, nos EUA e no @partajofficial que você vai de limusine a todos os lugares”. Partaj é um programa de comédia da televisão sueca, para o qual ela foi convidada no mês anterior e fez uma atuação.

Gasta milhares de dólares em compras em shoppings?

Para não agredir o ambiente, Greta já afirmou que não compra novos produtos, a não ser que seja absolutamente necessário. Uma análise nas redes sociais de Greta não indica nenhuma imagem com compras – há apenas fotos da natureza e de manifestações em favor da proteção do meio ambiente.

A família de Greta

Outra publicação que viralizou nas redes sociais foi sobre a origem da família de Greta. O texto dizia que o “pai, cientista social gay, foi morar com o namorado na Alemanha” e que a “mãe, lésbica satanista, dá aulas sobre aborto para adolescentes e fez campanha para Hillary [Clinton]” (candidata à Presidência dos EUA em 2016). Ainda, o texto concluía que Greta é “fruto do desajuste psicomoral (sic) causado por essa extrema esquerda vagabunda na família ocidental”.

O Comprova investigou a origem da família da ativista. Seu pai, Svante Thunberg, é um ator de novelas e filmes nascido na cidade de Boo, na ilha de Värmdo, na Suécia, em 10 de junho de 1969. Ele é filho de Olof Thunberg, diretor e ator de cinema, e de Mona Andersson, também atriz. Toda a família de atores é conhecida na Suécia e, recentemente, Svante deixou a carreira para cuidar da carreira de ativista da filha Greta. Por influência da filha, o ator virou vegetariano e depois vegano (confira neste vídeo a partir de 06:08 na entrevista com Greta e seu pai, Svante).

Svante é casado desde 2004 com a mãe de Greta, a cantora de ópera Malena Ernman, nascida como Sara Magdalena Ernman em 4 de novembro de 1970, em Uppsala, cerca de 70 km a norte de Estocolmo. Ela é filha de Lars Ernman e Eva Arvidsson. Malena ficou famosa na Europa pela participação no tradicional concurso de música Eurovision Song Contest, na edição de 2009, sediada em Moscou, na Rússia. A cantora de ópera terminou em 4º lugar na competição com a composição “La Voix”. Em 2016, largou sua carreira bem-sucedida e parou de andar de avião a pedido da filha Greta, pois o estilo de vida sustentável que eles pregavam não condizia com a quantidade de voos que Malena pegava para se apresentar ao redor do mundo. Malena também é membro da Academia Real de Música Sueca, como é possível verificar fazendo uma busca rápida por “Ernman, Malena” neste link.

O casal ainda tem outra filha, Beata Ernman Thunberg, nascida em 2005, que também é cantora como a mãe. A família vive em Estocolmo, de acordo com um site sueco de registro de pessoas.

O texto da publicação ainda dizia que a mãe de Greta havia feito campanha para a candidata à presidência dos Estados Unidos, Hillary Clinton, nas eleições de 2016. Malena compartilhou em sua página oficial no Facebook, em 8 de junho de 2016, um link com uma notícia sobre a candidata. O artigo, do site do jornal sueco Aftonbladet, falava sobre a vitória presumida da candidata nas primárias do partido Democrata nos estados da Califórnia, de Nova Jérsei e do Novo México. Com isso, ficava impossível para o outro candidato democrata, Bernie Sanders, ser escolhido pela sigla para concorrer à presidência. Neste dia, Hillary Clinton foi a primeira mulher na história dos Estados Unidos a ser escolhida como uma das principais candidatas à presidência do país. O artigo do jornal sueco falava sobre a comemoração de Hillary em relação a este ‘marco’ e a mãe de Greta, Malena, compartilhou o link do artigo. Não encontramos nenhum outro registro na internet que a mãe de Greta Thunberg tenha feito qualquer tipo de campanha política para a candidata Hillary Clinton.

Contexto

Uma onda de desinformação e ataques a Greta Thunberg ganhou corpo nas redes sociais a partir da segunda-feira, 23 de setembro, quando a ativista discursou na Cúpula do Clima, em Nova York, nos EUA. Organizado pelas Nações Unidas, o evento reúne todos os anos nações, especialistas e a sociedade civil para discutir planos e ações de combate à crise climática.

A fala de Greta, que viralizou, acusa os líderes mundiais de terem traído a atual geração de crianças e adolescentes por não terem agido o suficiente diante do aquecimento global. “Vocês vêm até nós, os jovens, em busca de esperança. Como ousam?”, criticou. “Vocês roubaram meus sonhos e minha infância com suas palavras vazias. Mas eu tenho sorte. Há pessoas que estão sofrendo, estão morrendo, ecossistemas inteiros estão entrando em colapso.”

Uma das principais vozes contra a crise climática, a ativista ganhou notoriedade em 2018, quando, aos 15 anos, decidiu boicotar a aula às sextas-feiras para protestar diante do Parlamento da Suécia. Sozinha, ela segurou um cartaz no qual pedia que os políticos agissem contra o aquecimento global. A ação, que se repetiu nas semanas seguintes, logo trouxe adeptos, tornando-se então um enorme movimento jovem internacional que ficou conhecido como #FridaysForFuture (sextas-feiras pelo futuro).

Não deveríamos estar falando sobre nenhum outro assunto [além da crise do clima]”, disse Greta em uma apresentação TED na Suécia em 2018. Ela defende que é preciso pensar um modelo econômico não poluente e livre da dependência de combustíveis fósseis.

Antes de chegar à Cúpula do Clima, Greta esteve em diversas capitais europeias, discursando aos parlamentares, e foi recebida pelo Papa Francisco e pelo secretário-geral das Nações Unidas, o português António Guterres. A jovem ajudou a articular, entre março e setembro deste ano, duas greves mundiais de jovens pelo clima — a mais recente, na última sexta-feira (20), reuniu cerca de 4 milhões de pessoas em mais de cem países. Por seu trabalho de combate à crise climática, ela foi também indicada ao Nobel da Paz.

Ativista enfrenta onda de ataques

Os ataques à garota vieram de comentaristas, políticos e seus apoiadores em diversos países. As ofensas mais comuns desqualificam a sueca por sua idade, seu gênero, por supostamente ser rica e por e seu comportamento — Greta é diagnosticada com síndrome de Asperger, um tipo leve de autismo. Há também quem desqualifica suas ideias, considerando que não seriam dela.

Ao menos 13 links de verificações sobre Greta apurados por agências de checagem no Brasil e em outros países foram localizados pelo Comprova até quinta-feira (26). Os boatos viralizaram entre milhares de pessoas em locais como Alemanha, EUA, Turquia e Índia.

Uma reportagem do BuzzFeed News americano mostra que, além da sueca, outras ativistas adolescentes que se juntaram aos protestos pelo clima têm sido atacadas e assediadas nas redes sociais. Algumas delas recebem insultos pessoais constantemente e seus perfis tornam-se alvo de campanhas de destruição, que podem incluir o hackeamento de contas e a divulgação de dados pessoais. Alguns casos incluem ameaças de morte às crianças.

Uma parte significativa dos ataques, boatos e ofensas a Greta e outras adolescentes vem de figuras públicas e militantes virtuais ligados ao negacionismo climático – nome que se dá à negação do aquecimento global, apesar das evidências científicas. Uma reportagem publicada no site DeSmog Blog e replicada pela revista Teen Vogue mostra que pessoas que impulsionaram ataques contra a ativista sueca estão ligadas a grupos radicais pró-mercado, uma rede que tem laços firmes com a indústria de combustíveis fósseis.

Entre as figuras públicas que atacaram Greta estão políticos de extrema direita como o britânico Arron Banks, que insinuou que “acidentes de iate costumam acontecer em agosto” – mês em que a sueca viajou de barco da Europa aos EUA, o canadense Maxime Bernier, que afirmou que a ativista deveria ser “denunciada e atacada“, e o comentarista conservador indiano, com atuação nos EUA, Dinesh D’Souza, que comparou Greta a crianças que estampavam peças de propaganda na Alemanha nazista. Outro comentarista conservador, convidado para falar na Fox News, nos EUA, a chamou ainda de “doente mental”, em referência ao Asperger.

Após o discurso de Greta na ONU, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, ironizou a ativista. “Ela parece uma jovem garota muito feliz, ansiosa por um futuro brilhante e maravilhoso. Que coisa boa de se ver!”, disse ele na terça, 24 de setembro, no Twitter. Na presidência dos EUA, Trump se mostra hostil à preservação do meio ambiente e a ações pelo clima. Greta trocou a descrição na bio do seu perfil no Twitter ironizando o comentário do presidente norte-americano.

“Os haters estão mais ativos do que nunca, indo atrás de mim, da minha aparência, meu comportamento e minhas diferenças. Eles têm todas as mentiras e teorias da conspiração imagináveis”, disse Greta sobre os ataques. “Não entendo por que adultos escolhem passar o tempo zombando e ameaçando crianças por promoverem a ciência, quando poderiam fazer algo de bom. Acho que eles devem simplesmente se sentir tão ameaçados por nós.”

Ataques a Greta no Brasil

O deputado federal e filho do presidente Bolsonaro, Eduardo, tuitou na quarta-feira, 25 de setembro, a imagem falsa de Greta Thunberg no trem e um texto falso que afirma que a ativista é financiada por George Soros. Ele ironizou um trecho do discurso da sueca na Cúpula do Clima em que ela diz que “vocês roubaram minha infância”, referindo-se à crise climática.

Ataques do presidente e de sua família a ativistas e ambientalistas não são inéditos. Ao menos desde a campanha eleitoral, em 2018, Jair Bolsonaro critica os “ecoxiitas”, apelido pejorativo para ambientalistas, e a atuação de ONGs na Amazônia. Ele se elegeu falando em priorizar o desenvolvimento econômico no lugar do meio ambiente, defendendo a expansão da agropecuária e a mineração em terras indígenas, por exemplo. Seus três filhos Eduardo, Carlos e Flávio, todos políticos em exercício, negam o aquecimento global.

Ao se eleger ao Planalto, Bolsonaro reduziu as competências administrativas do ministério e cortou recursos para órgãos como o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e para áreas como o combate ao desmatamento e à mudança do clima. Ele também assinou um decreto que flexibilizou a cobrança de multas por crimes ambientais. Além disso, demitiu servidores da pasta e reduziu a participação civil em conselhos da área.

A manifestação mais recente de Bolsonaro sobre o meio ambiente ocorreu na terça-feira (24), em discurso a outras nações na Assembleia Geral da ONU. Ele reivindicou a soberania brasileira sobre a Amazônia, difundindo mentiras sobre a floresta e as políticas ambientais no Brasil. “É uma falácia dizer que a Amazônia é patrimônio da humanidade”, defendeu.

Ele também afirmou que o Brasil é um dos países que mais preservam o ambiente. Além disso, Bolsonaro atacou o cacique Raoni, liderança indígena que critica o governo.

Repercussão nas redes

O Comprova verifica conteúdos duvidosos sobre políticas públicas do governo federal que tenham grande potencial de viralização. Os conteúdos sobre Greta Thunberg foram verificados porque o Brasil está, nas últimas semanas, no centro das discussões sobre meio ambiente, em função das queimadas e desmatamento na Floresta Amazônica, cujo combate depende de políticas públicas do Planalto. Muitos boatos sobre o tema foram checados nas últimas semanas pelo Comprova – veja outras checagens aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui e aqui

Conteúdos sobre Greta também foram checados por Estadão Verifica, AFP, Aos Fatos, Uol, Folha, Agência Lupa (1, 2 e 3), Boatos.org, E-Farsas e Fato ou Fake.

As publicações falsas sobre Greta Thunberg foram encontradas nas páginas Comandante Viegas e Mulheres Unidas A Favor de Bolsonaro. Até a sexta-feira, 27 de setembro, cada uma das postagens tinha mais de oitocentos compartilhamentos.

Saiba mais

Como jovens se mobilizam pelo clima no Brasil e no mundo (Nexo)

Política

Investigado por: 2019-09-25

Post atribui a Maia declaração falsa sobre votações no Congresso

  • Falso
Falso
Post que atribui a Maia a declaração "O Congresso não é obrigado a ouvir o povo" é falso. A fala foi distorcida e vem sendo usada pelo menos desde 2016 em ataques ao presidente da Câmara

Uma imagem publicada no Facebook na madrugada de segunda-feira, 23 de setembro, distorceu uma fala do presidente da Câmara, deputado federal Rodrigo Maia (DEM-RJ), dita há quase três anos.

O post atribui a Maia a seguinte declaração: “O Congresso não é obrigado a ouvir o povo. Isto aqui não é como um cartório onde a gente carimba o que o povo está pedindo”.

No entanto, Maia não disse que a Câmara não é obrigada a ouvir o povo, mas que a Casa tem independência para debater. “Nós não podemos aceitar que a Câmara dos Deputados se transforme num cartório carimbador de opiniões de parte da sociedade, que são democráticas, que são respeitadas, mas que a Câmara de Deputados tem toda a legitimidade para ratificar, para modificar ou até para rejeitar”, ele disse. “Nós aqui não somos obrigados a aprovar tudo que chega a este Plenário.”

A declaração correta está disponível no site da Câmara e em um vídeo do discurso publicado na página do próprio Rodrigo Maia no Facebook em 1º de dezembro de 2016 (a partir de 4min32s).

A declaração falsa vem sendo usada pelo menos desde 2016 em ataques a Maia, com diferentes motivações e contextos.

Esta verificação do Comprova analisou conteúdos publicados em um perfil pessoal e no grupo Equipe do Bolsonaro de Plantão, no Facebook, e no perfil Nando Moura_Oficial no Twitter.

Falso para o Comprova é o conteúdo divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.

Como verificamos

Para verificar esta publicação, o Comprova consultou os registros de discursos feitos em plenário disponíveis no site da Câmara dos Deputados, assim como o vídeo publicado na página de Maia no Facebook.

O Comprova também recorreu a verificações feitas anteriormente por Estadão e O Globo sobre a mesma frase distorcida.

Você pode refazer o caminho da verificação do Comprova usando os links para consultar as fontes originais.

O que disse Rodrigo Maia

A fala original de Maia foi dita em 30 de novembro de 2016, depois que a Câmara votou o pacote de dez medidas contra a corrupção proposto pelo Ministério Público Federal (MPF). Na ocasião, em uma votação de madrugada, os deputados derrubaram quase todos os pontos do projeto.

A menção mais antiga à frase distorcida que o Comprova conseguiu encontrar está em um texto do site Chumbo Gordo. Pelo site, não é possível saber a data exata em que o texto foi publicado. O link traz apenas a informação de que foi publicado “há 3 anos”.

No entanto, o link do Chumbo Gordo com a frase errada de Maia também cita conteúdos publicados na imprensa nos dias seguintes à votação do pacote anticorrupção, como uma coluna de Vinicius Mota na Folha do dia 5 de dezembro de 2016 e uma notícia do UOL de 6 de dezembro de 2016. A menção a esses textos pode servir como referência do momento em que a declaração distorcida foi publicada — provavelmente no começo de dezembro de 2016. No Facebook, a página do Chumbo Gordo compartilhou o texto no dia 7 daquele mês.

A postagem do Chumbo Gordo sugere que a frase de Maia de que “o Congresso não é obrigado a ouvir o povo” foi publicada na coluna de Vinicius Mota. A coluna de Mota, no entanto, não traz nenhuma referência à frase. Para verificar se em algum momento a Folha publicou sobre o assunto, o Comprova buscou pela frase creditada a Maia e por termos relacionados a ela na busca do Google (veja nos links 1, 2, 3 e 4) e entre as publicações de novembro a dezembro de 2016 no site do jornal. Não foi encontrado nenhum registro.

De lá para cá, a distorção da fala de Maia foi usada para criticar o deputado em diversas ocasiões e por diferentes motivos.

Em agosto de 2017, conforme noticiou O Globo, a frase voltou a circular nas redes logo antes de a Câmara votar — e rejeitar — uma denúncia criminal contra o então presidente Michel Temer (MDB).

Já neste ano, em fevereiro, a reeleição de Maia para o comando da Câmara fez a frase enganosa voltar a circular, mostrou o Estadão Verifica.

No fim de março, o presidente da Câmara anunciou que o pacote anticrime proposto pelo ministro da Justiça, Sergio Moro, não era prioridade na Casa — e a declaração distorcida foi vista novamente no Twitter e em grupos bolsonaristas no WhatsApp.

Agora, a frase reapareceu depois que a Câmara aprovou, na última quarta-feira (18), projeto de lei que afrouxa regras para o uso de dinheiro público em despesas de partidos e candidatos. Para entrar em vigor, o texto ainda precisa ser sancionado por Bolsonaro — o que foi tema de verificação feita pelo Comprova.

Uma busca no Twitter revela que uma das imagens usadas em posts com a hashtag #MaiaTraidordaPatria (que chegou ao topo dos assuntos mais comentados da rede depois da aprovação do projeto) é justamente a que traz a frase enganosa. A imagem foi publicada no Twitter, entre outros usuários, pelo youtuber Nando Moura, que apoia o governo Bolsonaro. Moura tem mais de 300 mil seguidores no Twitter.

Repercussão nas redes

O Comprova verifica conteúdos duvidosos sobre políticas públicas do governo federal que tenham grande potencial de viralização.

O post de Nando Moura no Twitter com a frase atribuída a Maia foi publicado no dia 19 e, até a tarde do dia 25, teve 3,5 mil retuítes.

A mesma imagem com a frase também foi publicada no Facebook em um perfil pessoal na madrugada de segunda, 23 de setembro. Até o dia 25, o post teve 7,6 mil compartilhamentos.

Política

Investigado por: 2019-09-24

É enganosa publicação que associa foto de lixo e entulhos a baderna feita por estudantes na UFSC

  • Enganoso
Enganoso
Entulhos foram acumulados em frente ao prédio após um mutirão de limpeza realizado por estudantes em greve na universidade

É enganosa publicação nas redes sociais que associa fotografias de pichações e entulhos de lixo em frente a um prédio da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) a baderna na universidade pública. O lixo foi acumulado em frente ao prédio após um mutirão de limpeza feito por estudantes em greve na universidade. Alguns dias depois, o lixo foi retirado do local.

As pichações também são verdadeiras, porém o Comprova não conseguiu identificar quando foram feitas. O registro mais antigo das pichações no prédio é de novembro de 2012, segundo um artigo no site oficial da Universidade.

Conforme mostra reportagem do telejornal produzido por alunos de Jornalismo da UFSC, a limpeza foi realizada no dia 11 de setembro por estudantes que ocuparam o prédio e decidiram concentrar ali atividades da greve estudantil, iniciada no dia 10. A mobilização é contra os cortes orçamentários do governo federal nas universidades públicas.

A informação de que os entulhos foram resultado do mutirão de limpeza feito após o início da greve foi repassada por três estudantes entrevistados pelo Comprova e confirmada pela UFSC no Twitter. O lixo foi retirado da entrada do prédio no dia 20, segundo estudantes ouvidos pelo Comprova, o que pode ser atestado em imagens enviadas por eles (veja a seguir).

A pedido do Comprova, o estudante de Jornalismo da UFSC Gabriel Vieira foi ao prédio onde estavam os entulhos e fez um vídeo, às 7h53 do dia 20, do lado de fora do edifício, que mostra o lixo sendo removido por uma empresa de limpeza não identificada. Ele também fez uma fotografia do lugar no mesmo dia, mas no final da tarde, apontando que o prédio estava limpo de novo. A informação da data, associada ao local, está nos metadados dos arquivos checados pelo Comprova.

A fotografia dos entulhos viralizou ao lado de outras imagens que mostram pichações nas paredes do centro de convivência, prédio da UFSC que abriga o Diretório Central dos Estudantes (DCE) e uma agência dos Correios, mas antes acomodava também uma livraria e outras áreas de lazer. Ao menos desde 2010, o centro está abandonado, segundo a UFSC, por falta de recursos para infraestrutura. O Comprova não encontrou o autor das imagens das pichações, mas fotos no Google Maps e no Instagram e outras imagens feitas no local para o Comprova confirmam que o prédio está depredado pelo menos há quatro anos.

O Comprova verificou o conteúdo de um tuíte publicado pelo empresário Luciano Hang no Twitter e de um post da página República de Curitiba no Facebook.

Procurada, a assessoria de imprensa do empresário afirmou por e-mail que as fotos foram recebidas de “um aluno que não quer se identificar para não sofrer represália”.

Enganoso para o Comprova é o conteúdo que confunde ou que seja divulgado para confundir, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Como verificamos

Para esta verificação, o Comprova entrou em contato com o estudante de História Marco Antonio Marcon Pinheiro Machado, representante do DCE da universidade, e os alunos de jornalismo Luiza Morfim e Gabriel Vieira, além das assessorias de imprensa da UFSC e de Luciano Hang. Também usamos a busca reversa de imagens do Google, que permite encontrar imagens semelhantes que já tenham sido publicadas na internet, e pesquisamos fotos do centro de convivência no Google Street View e na ferramenta de localização do Instagram, fazendo uma busca com os termos “centro de convivência UFSC” na rede social.

Você pode refazer o caminho da verificação do Comprova usando os links para consultar as fontes originais ou visualizar a documentação que reunimos.

O que há no centro de convivência

Construído em 1979, o centro de convivência é um dos prédios mais antigos da universidade, que foi fundada em 1960. De acordo com a UFSC, os espaços foram desativados aos poucos desde o início dos anos 2000: o restaurante, por exemplo, fechou em 2006 e a galeria de arte deixou de abrigar exposições em 2015. Hoje, apenas o DCE e os Correios funcionam no prédio.

Uma publicação na conta oficial da instituição no Twitter foi feita no dia 19 de setembro, após a viralização das fotos da pichação. O texto informa que o acesso ao prédio foi bloqueado devido à necessidade de obras estruturais. “Como estamos enfrentando uma escassez de recursos, especialmente para obras, não foi possível reformá-lo. Uma parte do prédio, no térreo, é liberada para uso”, explicava o tuíte. “Como toda estrutura sem uso em qualquer cidade do Brasil, o prédio sofreu invasões e foi vandalizado ao longo dos anos, tendo suas paredes pichadas, janelas quebradas e estruturas de metal furtadas”.

A página República de Curitiba diz que R$ 1,7 bilhão são pagos por ano “para sustentar esta corja”. O valor se aproxima, mas não corresponde ao último orçamento da UFSC. Em 2019, é de R$ 1,5 bilhão e o bloqueio foi de R$ 60 milhões. O orçamento deste ano está dividido em: R$ 1,3 bilhão para pessoal e encargos sociais, mais R$ 227 milhões para outras despesas correntes e R$ 25 milhões para investimentos.

O orçamento executado em 2018 foi de R$ 1,67 bilhão e em 2017 foi de R$ 1,58 bilhão. Os números referentes a todos os anos desde 2008 estão no site da própria universidade.

A administração da universidade confirma na postagem que o lixo visto na imagem era resultado do mutirão de limpeza feito pelos estudantes. Os alunos que estão em greve ocuparam o prédio “para concentrar as atividades da greve estudantil”.

O centro de convivência passou por reformas pontuais. Como mostram textos publicados no site da UFSC, em 2012, foram investidos R$ 90 mil em uma revitalização do prédio para que a 11ª Semana de Pesquisa e Extensão (Sepex) pudesse ser realizada no espaço. Naquele momento, a maior parte do centro já havia sido desativada para uma reforma no telhado, iniciada em abril de 2010 e concluída em fevereiro de 2011, com um custo de R$ 374,6 mil.

A ex-reitora Roselane Neckel negou, em 2014, que o prédio estivesse abandonado, mas reconheceu que faltavam projetos complementares para a reforma do prédio. Há cinco anos, ela previa lançar uma licitação para a obra, o que nunca foi feito.

A mesma entrevista mostra que os problemas do lixo e das pichações são antigos. Segundo ela, em junho de 2012, quando assumiu a gestão da universidade, foram retiradas 12 caçambas de lixo. “Sobre a pichação é uma coisa complicada. Há um grupo de estudantes em trabalho de oficinas, que fazem grafitagem. Pediram para usar o espaço que estava aberto. Não foi invadido. Está ocupado por estas oficinas”, disse.

Em 2016, a universidade fez uma investigação sobre “manifestações nazistas de cunho racista em pichações” encontradas em uma das salas do centro de convivência.

Pichações são anteriores à greve e o lixo é proveniente de um mutirão de limpeza

Pelo Google Maps, é possível ver o prédio por fora. Na foto tirada em janeiro de 2019, o prédio realmente está pichado e com papéis colados nas paredes. Parece abandonado.

No registro mais antigo do local, datado em julho de 2017, as pichações já haviam sido feitas e os vidros já estavam quebrados.

No entanto, por meio do aplicativo, não é possível ver os sacos de lixo e a sujeira acumulada em nenhuma das fotos. Pela posição da banca de jornais, é provável que a foto compartilhada por Luciano Hang tenha sido tirada do outro lado do prédio.

No mapa da universidade, o centro de convivência é o que aparece com o número 10, onde ficam os Correios e o DCE.

O Comprova também pesquisou no Instagram as fotos que haviam sido publicadas no centro de convivência. Uma foto de 2015 já mostrava a mesma pichação em uma das paredes do prédio retratada em uma das imagens da publicação da página República de Curitiba.

Numa busca de imagem reversa no Google, enquanto procurávamos imagens semelhantes àquelas do tuíte de Hang, encontramos um artigo do jornal local ND Florianópolis de 2014, que já mostrava pichações no prédio do Centro de Convivência da universidade. A equipe do Comprova entrou em contato com a redação do site em busca de mais informações e eles nos passaram contatos de alunos do DCE.

O aluno de História e membro do DCE Marco Antonio Marcon Pinheiro Machado confirma que as pichações nas paredes são mesmo antigas e podem ter sido feitas por qualquer um, já que o campus é aberto ao público. Marco ainda reitera que os estudantes realizaram o mutirão de limpeza iniciado no dia 11 de setembro e que o lixo mostrado nas fotos estava sendo removido do local no dia 19 de setembro.

A equipe do Comprova entrou em contato com Luiza Morfim, estudante de Jornalismo da UFSC, que também confirma que o mutirão de limpeza ocorreu durante a greve na universidade e que o prédio está abandonado e com pichações há pelo menos cinco anos. Luiza passou o contato de Gabriel Vieira, aluno de Jornalismo, que fez um vídeo da limpeza na manhã do dia 20 de setembro e, no fim da tarde do mesmo dia, um colega dele fez uma imagem mostrando que todo o lixo havia sido removido pelos funcionários da limpeza.

Qual o desempenho da UFSC

Na sua publicação no Twitter, Luciano Hang afirma que “enquanto a maioria dos brasileiros paga seus estudos com dificuldade, quem tem a oportunidade de estudar em uma federal faz esta baderna”. Diferentemente do que o tuíte sugere, a UFSC é bem avaliada em diferentes rankings.

No ranking mundial da revista britânica Times Higher Education, divulgado em setembro de 2019, a universidade é a quinta brasileira mais bem colocada.

Além disso, a UFSC tem nota máxima (5) no Índice Geral de Cursos (IGC), medido pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), órgão ligado ao Ministério da Educação (MEC).

Neste link, é possível acessar o Conceito Enade (baseado no Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes) dos cursos da universidade, cujas notas também vão até 5.

A instituição é a sexta colocada no Ranking Universitário da Folha, com nota final 92.3 (de 100). Nessa classificação, é a 7ª em ensino e internacionalização, 8ª em pesquisa, 13ª em inovação e 26ª em mercado.

Contexto

As imagens do centro de convivência da UFSC viralizaram após o início de uma greve organizada por estudantes que protestam contra bloqueios no orçamento da universidade determinados pelo MEC. Eles estão parados desde o dia 10 e devem ficar assim por tempo indeterminado, segundo postagem do DCE no Facebook.

A UFSC está entre as universidades mais afetadas pelo contingenciamento de recursos
das instituições federais de ensino superior anunciado em abril pelo MEC. Os bloqueios, que atingem as chamadas despesas não obrigatórias, dependem da arrecadação do governo, que afirma não ter recursos para bancar os gastos previstos no orçamento de 2019. A medida é temporária, segundo o Planalto, mas já afeta as atividades universitárias.

Até setembro, houve corte de R$ 60,1 milhões (35%) dos recursos antes previstos para despesas não obrigatórias da UFSC. A medida atinge o custeio de água, energia, infraestrutura, contratação de serviços terceirizados, pesquisa e atividades de extensão, entre outros. Para o secretário de Planejamento e Orçamento da instituição, Vladimir Arthur Fey, se os valores não forem desbloqueados a UFSC não funcionará até o fim do ano.

Além de reivindicar o fim dos bloqueios, a greve estudantil na UFSC protesta contra o Future-se, projeto apresentado em julho pelo governo federal para incentivar as universidades a captar recursos privados, diante da crise no orçamento das instituições.

Repercussão nas redes

O Comprova verifica conteúdos duvidosos sobre políticas públicas do governo federal que tenham grande potencial de viralização.

As imagens do centro de convivência da UFSC foram publicadas por Luciano Hang no Twitter no dia 16 de setembro e, até o dia 23, acumulavam 1,3 mil retuítes e mais de 5,8 mil curtidas. A página República de Curitiba, no Facebook, publicou as fotografias da universidade no dia 18 de setembro. Até o dia 23, eles tinham 1,1 mil compartilhamentos.

Saiba mais

O que é um corte orçamentário e quando ele é usado (Nexo)
Qual o plano do MEC para as universidades federais captarem recursos privados (Nexo)
Bloqueio de verba afeta serviços oferecidos na Universidade Federal de Santa Catarina (G1)
UFSC tem site de checagem sobre notícias referentes à instituição (UFSC)

Política

Investigado por: 2019-09-24

É falso que Davi Alcolumbre tenha ameaçado paralisar reforma da Previdência se houver protesto pela CPI da Lava Toga no dia 25

  • Falso
Falso
Em evento, o presidente do Senado mencionou uma possível paralisação das reformas. Ele, porém, não o fez em tom de ameaça e nem se referia às manifestações do dia 25, mas a uma hipotética decisão da maioria dos brasileiros

É falso que o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), ameaçou paralisar a aprovação da reforma da Previdência se houver manifestação, no dia 25 de setembro, a favor da instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar integrantes do Supremo Tribunal Federal — batizada como CPI da Lava Toga.

O texto viralizado utiliza um tuíte que atribui ao senador a fala: “se os brasileiros se manifestarem pela CPI da Lava Toga, a gente para as reformas”, que teria como fonte o Broadcast, serviço de notícias ao vivo do Grupo Estado.

No entanto, nem o tuíte nem o material publicado pelo Broadcast fazem menção às manifestações que estão sendo chamadas para esta quarta-feira (25). Apesar de ter, de fato, abordado uma possível paralisação das reformas, o presidente do Senado não se referia às manifestações, mas a uma decisão da maioria dos brasileiros.

O Comprova teve acesso ao áudio completo do evento “E agora, Brasil?”, realizado na quinta-feira, 19 de setembro, no qual Alcolumbre falou a jornalistas que seria preciso decidir o que é prioritário para o país: a reforma da Previdência ou a instauração da CPI. As declarações a seguir podem ser ouvidas aos 3:07 e 4:17 deste arquivo de áudio e se referem ao trecho do evento a que o Broadcast faz menção e que foi publicado no Twitter.

“Se o Brasil escolher, se tiver uma enquete, e os 200 milhões de brasileiros pedirem a CPI da Lava Toga, que é uma injustiça pelo nome, a gente para as reformas.(…) Qual é prioridade dos brasileiros? Eu acho que é a reforma da Previdência. Ou 120 dias de uma CPI no Senado não vai paralisar o Senado?”

O Comprova verificou o conteúdo de um texto do site Movimento Avança Brasil.

Falso para o Comprova é um conteúdo divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.

Como verificamos

O texto viralizado usa como fonte um tuíte do perfil do empresário Henrique Bredda, no qual consta: “Se os brasileiros se manifestarem por CPI da Lava Toga, a gente para as reformas – Broadcast 19/9”.

Primeiramente o Comprova buscou pelo termo Alcolumbre no site do Broadcast e chegou a um texto do dia 19, referente a evento “E agora, Brasil?”, do qual Alcolumbre participou e que foi realizado pelo jornal Valor Econômico e pelo jornal O Globo, em Brasília. O texto, no entanto, não mencionava manifestações ou paralisação das reformas.

A única referência ao tema era o seguinte trecho: “Alcolumbre reforçou ser contra a criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar o STF, a chamada CPI da Lava-Toga”.

O Comprova entrou então em contato com Daniel Weterman, jornalista do Broadcast responsável pelo texto, e com o autor do tuíte, Henrique Bredda. O último enviou uma foto da mensagem recebida pelo Broadcast Político, serviço de cobertura em tempo real disponível apenas para assinantes, na data referida.

Já o jornalista confirmou o envio da mensagem, porém destacou que Alcolumbre não fez nenhuma menção às manifestações do dia 25 – o que o Comprova pôde verificar ao ouvir o áudio com a gravação do evento.

Você pode refazer o caminho da verificação do Comprova usando os links para consultar as fontes originais ou visualizar a documentação que reunimos.

O que é a CPI da Lava Toga?

Desde fevereiro deste ano, senadores buscam a instalação de uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) para investigar a atuação dos tribunais superiores, que ficou conhecida como CPI da Lava Toga. O primeiro requerimento de instalação foi feito em fevereiro pelo senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE).

O objetivo da CPI é responsabilizar juízes togados (juiz com formação jurídica obrigatória, ocupante do cargo em caráter vitalício), especialmente do Supremo Tribunal Federal (STF), suspeitos de crimes e irregularidades. Se comprovados esses desvios, os ministros podem ser afastados do cargo, uma vez que o Senado é o único órgão que pode pedir o impeachment de integrantes do Supremo.

Como a CPI da Lava Toga envolve o Senado?

Desde então, senadores tentam instalar a CPI, que depende do apoio de ao menos 27 parlamentares da Casa (de um total de 81), além do aval do presidente do Senado, Davi Alcolumbre, que não é favorável à ideia. Movimentos de apoio à Operação Lava Jato defendem a iniciativa, mas os filhos do presidente Jair Bolsonaro, em especial o senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), têm atuado para barrar seu avanço.

Desde o início do ano, Alcolumbre tem segurado reiterados requerimentos para criação da comissão parlamentar de inquérito.

No evento da última quinta, o presidente do Senado foi claro ao se posicionar, mais uma vez, contrariamente à criação da CPI da Lava Toga. Como a Folha noticiou, o presidente do Senado afirmou: “Continuo me manifestando contrário a ela [a CPI]. Precisamos ter consciência do momento que estamos vivendo. Eu sou contrário, acho que o Brasil não precisa disso. O Brasil espera muito mais que uma CPI para enfraquecer as instituições, porque, no final, isso é para enfraquecer todos nós”.

Quais os últimos acontecimentos referente à CPI da Lava Toga?

Na semana passada, Flávio Bolsonaro pediu para colegas não apoiarem a CPI. Ele foi o único dos quatro senadores do PSL que não assinou a petição pela abertura da comissão, o que gerou uma cisma dentro do partido. O deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) compartilhou em suas redes, no dia 15 deste mês, um vídeo da youtuber Paula Marisa contra a instalação da CPI.

Segundo a senadora Juíza Selma (Podemos-MT), que deixou o PSL na semana passada, tanto Alcolumbre quanto Flávio Bolsonaro teriam pedido que ela retirasse sua assinatura do requerimento que solicita a criação da CPI.

Nas redes sociais, está sendo convocada manifestação em favor à CPI, a ser realizada no dia 25 de setembro, em Brasília. Entre as pautas aparecem também o apoio à Lava Jato e o veto à lei de abuso de autoridade.

Parlamentares dizem que a resistência da família Bolsonaro se deve a um acordo com o Supremo. Em julho, o ministro Dias Toffoli suspendeu todas as investigações criminais que usam dados do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) e de outros órgãos de controle. O pedido havia sido feito pela defesa de Flávio no caso “Queiroz”, que apura irregularidades supostamente cometidas pelo filho de Jair Bolsonaro quando Flávio era deputado estadual no Rio de Janeiro, além de funcionários do seu gabinete na Alerj, sendo Fabrício Queiroz o mais célebre deles.

Votação da Previdência

Nesta terça, 24 de setembro, Alcolumbre decidiu adiar a votação do primeiro turno da reforma da Previdência para a próxima semana. No horário em que o tema seria votado, ele reuniu líderes partidários e foi ao STF (Supremo Tribunal Federal) conversar com o presidente do Judiciário, Dias Toffoli, para apresentar um recurso à decisão do ministro Luís Roberto Barroso que, na semana passada, determinou busca e apreensão em endereços do líder do governo no Senado, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE).

Com o novo adiamento, a PEC só deve ser apreciada na CCJ e, em primeiro turno, no plenário, na terça-feira (1º de outubro). O segundo turno, inicialmente programado para 10 de outubro, agora está previsto para um elástico prazo de “primeira quinzena de outubro”.

Repercussão nas redes

O Comprova verifica conteúdos duvidosos sobre políticas públicas do governo federal que tenham grande potencial de viralização.

Esta checagem verificou texto do site Movimento Avança Brasil, que teve até o dia 23 de setembro mais de 63 mil interações, sendo 12,5 mil compartilhamentos e 22,8 mil comentários.

Eleições

Investigado por: 2019-09-19

Mudanças na lei eleitoral não valerão para 2020 se Bolsonaro aguardar até o fim do prazo para vetos

  • Evidência comprovada
Evidência comprovada
É verdade que, se o presidente da República aguardar até o final do prazo para vetar o projeto que altera lei eleitoral, a eleição de 2020 será disputada com as regras atuais

Um tuíte que viralizou nas redes sociais sugere ao presidente Jair Bolsonaro (PSL) engavetar o projeto de lei 5029/19 —aprovado nesta quarta-feira, 18 de setembro, pela Câmara dos Deputados— e, no último dia do prazo, vetá-lo totalmente. Dessa forma, segundo a postagem, “Rodrigo Maia não vai ter tempo de derrubar o seu veto e a lei não vai valer na próxima eleição”.

É verdade que, se Bolsonaro esperar até o último dia do prazo para vetar a lei, as regras aprovadas não valerão para as eleições municipais de 2020. Isso ocorreria mesmo se o Congresso (formado por Câmara e Senado) decidisse derrubar o veto, porque, para valer nas eleições municipais do ano que vem, qualquer medida legislativa sobre as regras eleitorais tem de estar em vigor antes de 4 de outubro deste ano.

No entanto, mesmo que Bolsonaro vetasse o projeto com tempo hábil para o Congresso decidir sobre a medida antes do dia 4, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, não poderia derrubar o veto sozinho, como indica o tweet verificado. Nem mesmo a própria Câmara poderia sozinha derrubar o veto. Apenas uma sessão conjunta da Câmara e do Senado pode apreciar e deliberar sobre o veto presidencial.

O Comprova verificou o conteúdo de um tuíte publicado pelo perfil @VemPraRua_br.

Evidência comprovada para o Comprova é quando a veracidade de um conteúdo é confirmada sem que reste margem de dúvida.

Como verificamos

Para verificar esta publicação, o Comprova conferiu a regras de tramitação legislativa na Constituição Federal e textos explicativos sobre o veto no site do Congresso.

Além disso, verificamos o status do projeto de lei na ficha de tramitação e se ele constava na lista de matérias aguardando sanção presidencial.

Você pode refazer o caminho da verificação do Comprova usando os links para consultar as fontes originais ou visualizar a documentação que reunimos.

Quanto tempo o presidente tem para vetar um projeto de lei?

O prazo para o presidente sancionar ou vetar um projeto de lei é de 15 dias úteis, contando a data do recebimento do PL pela Presidência.

Apesar de ter sido aprovado pela Câmara nesta quarta (18), o projeto precisa ser oficialmente enviado à Presidência para que o prazo de 15 dias comece a contar, o que ainda não aconteceu.

Esse prazo está definido no primeiro parágrafo do artigo 66 da Constituição Federal.

Se o projeto fosse recebido pelo presidente ainda nesta quinta (19), ele teria até o dia 9 de outubro para sancioná-lo, vetá-lo ou vetá-lo parcialmente.

É verdade, portanto, que, caso o presidente espere até o último dia do prazo para veto, o Congresso não terá tempo de derrubá-lo e fazer com que a lei em questão esteja valendo nas eleições de 2020.

Segundo a ficha de tramitação do PL, ele ainda está “Aguardando envio ao Poder Executivo”. Tampouco ele consta na página das matérias que estão aguardando sanção presidencial.

Quem pode derrubar o veto do presidente?

Se o presidente vetar parcialmente a lei, os trechos vetados voltam para análise do Congresso Nacional, que tem então até 30 dias corridos para analisá-los, em sessão conjunta da Câmara e do Senado. Já os trechos sancionados são publicados e viram lei.

Caso os vetos sejam mantidos, a lei fica como saiu da Presidência. Caso sejam derrubados, os trechos antes vetados passam a integrar a lei.

Para que o veto do presidente seja rejeitado, é necessária a maioria absoluta dos votos de deputados e senadores, ou seja, 257 votos de deputados e 41 votos de senadores, computados separadamente.

Além disso, não caberia ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia, convocar uma sessão conjunta. Apenas o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), pode convocá-la.

Segundo o regimento do Congresso, caso seja convocada uma sessão conjunta, ela deve ocorrer na terceira terça-feira do mês ou na terça-feira seguinte à convocação.

Além disso, se os vetos presidenciais forem rejeitados pelo Congresso, o presidente ainda tem o prazo de até 48 horas para promulgar a lei. E, caso não promulgue nesse prazo, a promulgação pode ser feita pelo presidente do Senado.

Contexto

O tuíte acompanhado da hashtag “VetaBolsonaro” faz referência ao projeto de lei 5029/19, aprovado nesta quarta, 18 de setembro, pela Câmara dos Deputados, que afrouxa o controle sobre o uso das verbas públicas pelos partidos.

Entre as medidas aprovadas pela Câmara estão a permissão da contratação de consultoria contábil e advocatícia para ações de interesse partidário relacionadas exclusivamente ao processo eleitoral, sem que isso conte para o limite de gastos das campanhas.

Pessoas físicas também poderão bancar esses gastos em valores superiores às doações eleitorais que podem fazer hoje. Segundo especialistas, isso amplia as brechas ao caixa dois.

Em carta aberta, mais de 20 entidades da sociedade civil pediram a Maia que barrasse os principais pontos do projeto. O texto afirma que a proposta representa “um dos maiores retrocessos dos últimos anos para transparência e integridade do sistema partidário brasileiro”.

Essa pressão havia levado o Senado a rejeitar praticamente a integralidade do projeto, na terça-feira. No entanto, um dia depois, a Câmara reabilitou diversos pontos rejeitados pelo Senado, apesar de ter abandonado algumas das principais polêmicas que constavam da versão original do projeto.

Repercussão nas redes

O Comprova verifica conteúdos duvidosos sobre políticas públicas do governo federal que tenham grande potencial de viralização.

A postagem no perfil do Vem Pra Rua Brasil no Twitter teve, até o dia 19 de setembro, 2,2 mil curtidas e mais de 800 compartilhamentos.

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Política

Investigado por: 2019-09-19

É falso que Paulo Guedes tenha publicado tuíte criticando o Congresso

  • Falso
Falso
O ministro da Economia não tem perfil no Twitter. Uma conta atribuída a ele já foi objeto de diversas verificações nos últimos meses

É falso que o ministro da Economia, Paulo Guedes, tenha escrito no Twitter que o Congresso Nacional está enviando o recado “deixe a gente roubar, ou você não governa” ao presidente Jair Bolsonaro (PSL). O ministro não possui conta oficial em nenhuma rede social. Não há, além disso, registro de que Guedes tenha dito esta frase em qualquer outra ocasião.

Segundo checagem anterior do site Boatos.org, o tuíte viralizado foi publicado em junho por uma conta de simpatizantes do ministro da Economia, atualmente suspensa da rede social. Desde então, uma captura de tela do tuíte, no qual o nome do usuário está incompleto, passou a circular amplamente no Facebook.

Outras imagens de tuítes da mesma conta falsa, @PauloGuedes1234, já haviam sido compartilhadas nas redes sociais e foram desmentidas por diversas agências de checagem. Essas publicações enganosas atribuíam ao ministro da Economia críticas ao jornalista Glenn Greenwald, ao vazamento de conversas da Lava Jato e ao presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia.

O Comprova verificou o conteúdo publicado em uma conta pessoal no Facebook e compartilhado em um grupo chamado Legião Bolsonariana.

Falso para o Comprova é o conteúdo divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.

Como verificamos

O Comprova entrou em contato com o Ministério da Economia e pesquisou na imprensa registros de críticas de Paulo Guedes ao Congresso. Também analisamos a tramitação do Projeto de Lei 5029/2019, referente à reforma nas regras eleitorais.

Você pode refazer o caminho da verificação do Comprova usando os links para consultar as fontes originais ou visualizar a documentação que reunimos.

Paulo Guedes não tem contas em redes sociais

A mensagem viralizada não poderia ter sido publicada pelo ministro da Economia, uma vez que Paulo Guedes não possui conta em nenhuma rede social. A informação foi confirmada ao Comprova pelo Ministério da Economia. Em 13 de junho, a pasta já havia publicado no Twitter um alerta com os endereços corretos das contas oficiais do ministério.

Além disso, personalidades públicas do governo têm contas verificadas no Twitter, sinalizadas com um selo azul ao lado do nome do perfil – símbolo que não aparece na captura de tela viralizada.

Ao buscar a mensagem do suposto tuíte no Google, também não encontramos nenhum registro de que ela tenha sido dita por Paulo Guedes.

A mensagem com críticas ao Congresso atribuída a Guedes foi desmentida em 27 de junho pelo site Boatos.Org. De acordo com a checagem, o tuíte foi publicado pela conta @PauloGuedes1234. Atualmente, o perfil está suspenso e não é possível acessar seu conteúdo. Ainda é possível ver, contudo, as respostas à publicação.

O Comprova pesquisou no Wayback Machine e no Google Web Cache, sites que arquivam páginas da internet, mas não havia registros do tuíte deletado. Na imagem que viralizou no Facebook, o nome da conta está oculto.

Ao menos três tuítes da conta @PauloGuedes1234 foram compartilhados como se fossem do ministro da Economia. No dia 14 de junho, a Lupa verificou que era falsa uma publicação com críticas a Glenn Greenwald, com uma foto do jornalista com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O Fato ou Fake checou o mesmo conteúdo três dias depois.

Em 25 de junho, a Lupa voltou a desmentir uma mensagem da conta, dessa vez criticando o “governo paralelo” do presidente da Câmara, Rodrigo Maia. A checagem informa que a conta @PauloGuedes1234 estava ativa desde maio.

A Agência Lupa verificou um terceiro tuíte atribuído a Guedes em 12 de julho, esse sobre o vazamento de conversas de integrantes da força-tarefa da Operação Lava Jato do Paraná. Quando o Estadão Verifica checou o mesmo conteúdo, no dia 29 do mesmo mês, o perfil falso do ministro havia sido suspenso.

Contexto

A captura de tela do suposto tuíte de Guedes voltou a viralizar em 17 de setembro, em meio à votação de um contestado Projeto de Lei que altera diversas regras eleitorais. Entre análises na Câmara e no Senado, o PL 5029/19 (antigo PL 11021/18) passou por múltiplas mudanças e foi duramente criticado por parte da população.

No último dia 4 de setembro, a proposta foi aprovada na Câmara dos Deputados e posteriormente encaminhada ao Senado Federal.

Entre os principais pontos, o projeto previa que o Fundo Partidário poderia ser utilizado para contratar serviços advocatícios para qualquer processo judicial ou administrativo que envolvesse candidatos do partido, eleitos ou não. A proposta estabelecia que essas ações deveriam estar relacionadas ao processo eleitoral, ao exercício de mandato eletivo ou que pudessem acarretar no reconhecimento de inelegibilidade.

Esse item fez com que críticos do projeto o apelidassem de “Lei Lula Livre”, em uma referência ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que é réu em seis processos, além das duas ações nas quais já foi condenado. Em 12 de setembro, organizações da sociedade civil também assinaram uma carta aberta expressando “preocupação extrema” com o PL.

Cinco dias depois, o Senado aprovou um substitutivo ao texto original, rejeitando quase todos os itens validados pela Câmara.

No entanto, de volta à análise dos deputados, o texto foi em parte restaurado. A versão mais recente permite, entre outros pontos, que o Fundo Partidário seja utilizado para contratar assistência jurídica para qualquer processo judicial que envolva candidatos do partido, eleitos ou não, mas relacionados exclusivamente ao processo eleitoral.

Agora, o PL foi encaminhado ao presidente Jair Bolsonaro e depende de sanção para entrar em vigor. Nesta quinta-feira (19), a hashtag #VETABOLSONARO figurou em primeiro lugar nas tendências do Twitter para o Brasil.

Críticas de Guedes ao Congresso

Apesar de não ter publicado o tuíte viralizado, Guedes já criticou o Congresso em outras ocasiões, como durante a tramitação da reforma da Previdência.

Depois da divulgação do relatório aprovado na Comissão Especial da Câmara, que previa uma economia menor do que a proposta inicialmente, Guedes afirmou que os parlamentares mostraram “que não há um compromisso com as novas gerações”. “O compromisso com os servidores públicos do Legislativo parece maior do que com as futuras gerações”, afirmou ele na época.

Horas depois, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, reagiu chamando o governo de “usina de crises”. “Vamos aprovar a reforma da Previdência. Nós blindamos a reforma das crises que são geradas todos os dias pelo governo. Cada dia um ministério gerando uma crise”, disse ele na ocasião.

Também no contexto de articulação para a reforma da Previdência, Guedes foi acusado de criticar o parlamento uma segunda vez. No final de junho, deputados ameaçaram esvaziar uma sessão da Comissão Especial da Câmara em reação a uma suposta fala de Guedes — ele teria se referido ao Congresso como uma “máquina de corrupção”. Na época, o ministro negou que tivesse usado a expressão naquele contexto.

Com a aprovação da reforma, os ânimos entre Guedes e o Congresso esfriaram. Em agosto, o ministro da Economia parabenizou os deputados após a votação da proposta de emenda à Constituição. “Vim aqui cumprimentar o excelente trabalho da Câmara, o excelente trabalho de coordenação pelo presidente Rodrigo Maia. Estou muito feliz com o apoio da Câmara dos Deputados”, disse Guedes em discurso no plenário da Câmara.

Repercussão nas redes

O Comprova verifica conteúdos duvidosos sobre políticas públicas do governo federal que tenham grande potencial de viralização.

O tuíte falso foi compartilhado por uma conta pessoal no Facebook no dia 17 de setembro e obteve 22 mil compartilhamentos. A mesma publicação foi reproduzida no dia 19 de setembro no grupo “Legião Bolsonariana — A favor do Super Ministro Moro”, com 323 compartilhamentos. No Twitter, a imagem teve 73 retweets.

Política

Investigado por: 2019-09-17

É falso que aviões israelenses tenham sido enviados para apagar incêndio na Amazônia brasileira

  • Falso
Falso
Vídeo mostra, na verdade, um avião norte-americano apagando incêndios na Bolívia

É falso o texto que acompanhava um vídeo publicado no Facebook e que supostamente mostrava um avião israelense apagando incêndio na Amazônia brasileira, em meio à onda recente de queimadas descontroladas na região. O vídeo, na realidade, foi gravado na Bolívia no dia 5 de setembro e mostra o avião Boeing 747 da empresa norte-americana Global SuperTanker.

A postagem afirmava: “Brasil e Israel unidos como nunca antes”. No entanto, Israel não enviou aeronaves ao país para combater incêndios. Segundo o Ministério da Defesa, a ajuda israelense ocorreu pelo envio de bombeiros munidos de equipamentos antichamas.

O Chile emprestou ao Brasil aeronaves para cessar o fogo — mas o modelo das aeronaves chilenas, o Air Tractor 802, tampouco coincide com o visto no vídeo.

O vídeo que viralizou foi feito em Concepción, na Bolívia, no dia 5 de setembro, às 11h09 no horário local. Ele foi gravado pela moradora da cidade María René Céspedes Bazán, com quem o Comprova entrou em contato. Ela estava ajudando a apagar os incêndios em uma propriedade da região, com seu marido e outros voluntários, quando o avião sobrevoou o local.

Os dados do vídeo de Bazán são compatíveis com as informações dos voos realizados pela empresa norte-americana contratada pelo governo da Bolívia para combater os incêndios na Amazônia boliviana.

Esta checagem verificou uma publicação da página República de Curitiba, no Facebook, cuja legenda já foi alterada. O Comprova manteve a verificação porque várias páginas, como a do Canal Net TV no YouTube a compartilharam sem a correção. Até o dia 12 de setembro, a postagem original tinha mais de 500 mil visualizações e 21 mil compartilhamentos. A versão antiga, com a informação falsa, foi salva pelo Comprova com auxílio do site Wayback Machine.

Falso para o Comprova é o conteúdo divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.

Como verificamos

Com o uso do Invid, uma ferramenta que busca (por meio de imagens congeladas) postagens que compartilham determinada gravação, o Comprova localizou o mesmo vídeo viralizado em um site holandês. A postagem era do dia 6 de setembro. Apesar de não parecer ser o registro original, um dos comentários dizia se tratar de um “747 Supertanker”.

O Comprova buscou então no Twitter pelos termos “747 Supertanker” e chegou a um tuíte de 6 de setembro com o mesmo vídeo viralizado, com legenda que afirmava se tratar de um 747 Supertanker apagando incêndios na Amazônia boliviana.

Como o usuário do perfil informava ser da Venezuela e não possuía outras postagens sobre o tema nem dava fonte do vídeo, não havia evidências de que essa seria a fonte original. No entanto, notícias da CNN e do G1 informavam sobre o uso do Supertanker no combate ao fogo na Bolívia.

O presidente da empresa norte-americana Global SuperTanker, Dan Reese, assistiu ao vídeo viralizado, enviado a ele pelo Comprova, e afirmou que a gravação de fato parecia mostrar um de seus aviões do modelos 747.

Usando a nova pista, a busca “Supertanker Bolivia” nas diferentes redes sociais levou a diversas postagens. No entanto, cada uma delas creditava o vídeo a locais diferentes no país, ainda que próximos uns dos outros.

O registro do vídeo mais antigo que foi localizado é do dia 5 de setembro e foi publicado pela página “boliviaalalucha” no Instagram. A postagem foi enviada ao Comprova por jornalistas locais. Ao entrar em contato com o administrador da página mencionada, o Comprova conversou com duas pessoas até chegar a María René Céspedes Bazán.

Ela falou com o Comprova por vídeo e mostrou a gravação original no celular de seu marido, com o qual afirmou ter filmado a cena do avião, que viralizou como sendo no Brasil. É ela quem grita ao fim do vídeo.

Bazán também enviou uma gravação ao Comprova mostrando os detalhes da imagem, onde era possível ver a data da gravação e localização na qual foi feita. O vídeo é do dia 5 de setembro, às 11h09, e foi gravado em Concépcion, na Bolívia, onde ela mora.

Colaboraram com esta verificação os jornalistas Cecilio Moreno, da revista Vistazo, do Equador, e Fabiola Chambi, de Los Tiempos de Cochabamba, na Bolívia.

Dados sobre voos na região são compatíveis

Os dados do vídeo de Bazán, tanto horário quanto localização, coincidem com os dados sobre os voos da empresa Global Supertanker na região naquela data.

O Comprova localizou no FlightAware (site de rastreio de voos), que, no dia 5 de setembro, o Boeing 747 da empresa Global SuperTanker decolou do Aeroporto Internacional Viru Viru às 10h40 e retornou ao mesmo aeroporto às 11h37. A foto de Bazán consta como tendo sido tirada às 11h09.

Além disso, ao comparar o trajeto do voo no site e distância entre o aeroporto e a localidade de Concepción, as informações de Bazán também se mostram compatíveis. A distância apontada no percurso é de cerca de 190 km e a distância real percorrida pelo avião, contando ida e volta, foi de 394 km.

Antes de localizar Bazán, o Comprova entrou em contato com diversas páginas e veículos que compartilharam a foto no dia 6 de setembro, mas nenhum deles sabia dizer a autoria do filme.

Apenas uma das postagens mencionava um empresário como autor. No entanto, como os arquivos enviados por ele ao Comprova não tinham metadados (dados como data, horário e local onde foram captadas as imagens e permitem confirmar a origem do vídeo) e ele não enviou nada que comprovasse a autoria, a busca prosseguiu.

Contexto

A viralização do vídeo do avião que sobrevoou a Bolívia acontece em meio a uma crise de queimadas e incêndios florestais que dura desde o início de agosto na Amazônia. Mais de 75 mil focos de incêndios foram registrados pelo Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) de janeiro a agosto de 2019, o maior número em cinco anos. Mais da metade foram encontrados na Amazônia. Uma parte do fogo atingiu também a Amazônia boliviana.

Tanto Brasil como Bolívia tentam dar resposta aos incêndios, mas a situação perdura até este mês. A origem dos focos está na ação humana, como de grileiros que buscam ocupar terras onde há florestas, segundo reportagens da imprensa local e nacional. A Polícia Federal e as polícias nos estados amazônicos abriram inquéritos para verificar os casos.

O Comprova tem verificado boatos sobre as queimadas desde o início da crise. Em
agosto, um vídeo em que uma mulher indígena chorava por causa de um incêndio viralizou como se tivesse ocorrido na Amazônia, mas era de Minas Gerais. Outra postagem também associava erroneamente a prisão de um homem no Amazonas às queimadas recentes e ao MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra).

O Comprova verificou ainda que a liberação de R$ 2 bi para a educação e a preservação da Amazônia não são oriundos do orçamento disponível para o governo Bolsonaro, como insinuava uma publicação.

A associação de Israel a ações consideradas positivas para o país não é nova e apareceu em outros boatos produzidos por pessoas e páginas pró-governo. Israel é um dos aliados prioritários na política externa de Jair Bolsonaro (PSL). Meses atrás, o governo considerou transferir a embaixada do Brasil de Tel Aviv para Jerusalém, por exemplo, e anunciou que considerava fechar a embaixada da Palestina em Brasília. Nenhuma medida foi tomada.

Repercussão nas redes

O Comprova verifica conteúdos duvidosos sobre políticas públicas do governo federal que tenham grande potencial de viralização.

A postagem na página da República de Curitiba no Facebook verificada teve, até o dia 17 de setembro, 96 mil curtidas, 50 mil compartilhamentos e 4,6 mil comentários.

Não foi possível identificar em que data a legenda do vídeo foi alterada, no entanto, até o dia 12 de setembro, ela ainda apresentava o conteúdo falso e tinha mais de 500 mil visualizações.

A postagem original foi também alvo de verificação pelos sites Boatos.org, Aos Fatos, Agência Lupa e Fato ou Fake.

Política

Investigado por: 2019-09-13

Postagem exagera ao creditar apenas a Bolsonaro liberação de 2,6 bi para educação e Amazônia

  • Enganoso
Enganoso
Os valores que devem ir para ações de educação e preservação da Amazônia não são oriundos do orçamento disponível para o governo Bolsonaro, mas de multas coletadas pela Operação Lava Jato. O governo participou da decisão, no entanto, junto a outros órgãos. O STF ainda precisa dar seu aval ao uso dos recursos

Publicação que viralizou no Facebook afirma de forma enganosa que o governo Bolsonaro liberou R$ 1,6 bilhão para a educação e R$ 1 bilhão para a Amazônia.

A postagem omite, no entanto, que o dinheiro não é do governo e que a liberação da verba para essas áreas não depende exclusivamente do presidente Jair Bolsonaro. Sem o aval da Procuradoria-Geral da República (PGR), dos presidentes da Câmara e do Senado e a homologação do Supremo Tribunal Federal (STF), a transferência de verbas para esses fins não ocorrerá. Atualmente, falta apenas o aval do STF para que a distribuição do dinheiro possa ser realizada.

A verba é proveniente de um acordo firmado entre a Petrobras e o Departamento de Justiça dos Estados Unidos após as autoridades americanas apontarem violações da estatal no âmbito da Lava Jato e exigirem multa para ressarcir investidores estrangeiros que sofreram prejuízo.

Esse acordo levou a um compromisso entre o Ministério Público Federal (MPF) e a Petrobras, que chegou a ser homologado pela 13ª Vara Federal em Curitiba. O termo assinado pela força-tarefa da Operação Lava Jato previa a criação de uma fundação privada para administrar os recursos. Contrária a essa forma de utilização do dinheiro, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, acionou o STF. Em março de 2019, o ministro Alexandre de Moraes determinou a suspensão do primeiro acordo – entre a Petrobras e os procuradores do Paraná – e, no dia 5 de setembro, foi firmado um novo pacto entre diversos órgãos. O documento ainda não foi homologado por Moraes.

Conteúdo enganoso, para o Comprova, é aquele conteúdo que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde ou que seja divulgado para confundir, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Esta verificação do Comprova checou informações de uma publicação da página de Facebook Presidente Jair Bolsonaro #2022. A postagem foi feita na quinta-feira, 12 de setembro.

Como verificamos

Para esta verificação, o Comprova entrou em contato com o Ministério Público Federal (MPF), o Palácio do Planalto e o Supremo Tribunal Federal (STF). Também analisou os documentos dos acordos que levaram ao depósito do dinheiro na conta judicial e à destinação dos recursos para a Amazônia e a educação, além da movimentação processual envolvendo o fundo da Lava Jato.

Você pode refazer o caminho da verificação do Comprova usando os links para consultar as fontes originais ou visualizar a documentação que reunimos.

O que é o Fundo da Lava Jato?

É uma poupança de R$ 2,6 bilhões formada por multas pagas pela Petrobras após as investigações de corrupção na petrolífera. A força-tarefa da Lava Jato tentou usar o dinheiro para criar uma fundação privada idealizada pelos procuradores – a ideia foi criticada porque, por lei, o dinheiro de multas por corrupção deve ir para a conta da União, e não para uma entidade privada. Além disso, críticos afirmavam que o valor, caso fosse para uma fundação privada, não poderia ser fiscalizado por órgãos públicos, como o Tribunal de Contas da União (TCU).

O dinheiro irá mesmo para o meio ambiente e a educação?

Se o acordo for homologado pelo ministro Alexandre de Moraes da forma como está, sim. Ao todo, serão R$ 1,6 bilhão para programas da área de educação e outros R$ 1,060 bilhão para programas de preservação da Amazônia. A fiscalização deverá ser feita pela Controladoria-Geral da União (CGU) e pelo Tribunal de Contas da União (TCU).

Onde o dinheiro será aplicado?

Segundo o acordo encaminhado para homologação, a divisão será a seguinte:

EDUCAÇÃO: R$ 1,6 bilhão
  • R$ 1 bilhão: Ministério da Educação para ações relacionadas à educação infantil.
  • R$ 250 mil: Ministério da Cidadania, para ações relacionadas ao Programa Criança Feliz.
  • R$ 250 mil: Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, para projetos ligados a empreendedorismo, inovação, popularização da ciência, educação em ciência tecnologias aplicadas. O valor poderá ir para o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico Tecnológico (CNPq).
  • R$ 100 mil: ações socioeducativas em cooperação com os estados, preferencialmente por intermédio do Ministério da Mulher, da Família dos Direitos Humanos.
AMAZÔNIA LEGAL: R$ 1,06 bilhão
  • R$ 630 mil: governo federal. O valor deve ir para operações de Garantia da Lei da Ordem (GLO), ações do Ministério do Meio Ambiente, do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), de Regularização Fundiária e de Assistência Técnica Extensão Rural.
  • R$ 430 mil: ações entre governo federal e estados da região amazônica.
Bolsonaro decidiu que o dinheiro deve ir para essas áreas?

O presidente foi ouvido para a decisão, mas a iniciativa não é exclusiva dele. Um pedido para que parte do valor bilionário fosse para a Amazônia foi apresentado pela Câmara dos Deputados no dia 23 de agosto, devido às queimadas na região. Em manifestação ao STF três dias depois, Raquel Dodge defendeu que a sugestão fosse acatada.

O presidente Jair Bolsonaro concordou com a transferência do dinheiro para a Amazônia e a educação em reuniões com Dodge, segundo ela, em documentos de dois processos relacionados ao Fundo da Lava Jato. A agenda pública de Bolsonaro mostra dois encontros com a procuradora-geral da República, em 7 de maio e 22 de agosto. Questionado pelo Comprova sobre o assunto das reuniões, o Planalto não respondeu.

Por fim, a concordância foi manifestada por meio do advogado-geral da União, André Mendonça – responsável por defender os interesses do governo federal. Ele assinou o acordo que definiu onde o dinheiro seria utilizado.

O acordo do dia 5 de setembro não determina de que forma será feita a transferência do dinheiro para a União nem menciona prazos. Segundo o STF, essas informações dependem da homologação por Alexandre de Moraes. Ao ministro, no dia 10 de setembro, Mendonça defendeu que o destino dos recursos seja a conta única do Tesouro Nacional.

Quem criou este fundo?

O fundo foi criado a partir de um acordo entre a Petrobras e o Departamento de Justiça dos Estados Unidos (equivalente ao Ministério da Justiça). O governo norte-americano processou a Petrobras porque a estatal perdeu valor de mercado e trouxe prejuízo a investidores estrangeiros devido aos sucessivos escândalos descobertos pela Operação Lava Jato. Segundo o Departamento de Justiça, a Petrobras violou a Foreign Corrupt Practices Act (FCPA, na sigla em inglês, traduzido como “Lei de Práticas Corruptas Estrangeiras”).

No acordo, a Petrobras se comprometeu a pagar uma multa, demitir de seu quadro de funcionários investigados pela Lava Jato até a data do acordo e manter padrões de compliance reconhecidos pelas autoridades americanas. Em troca, o Departamento de Justiça se comprometeu a não processar a petrolífera criminalmente ou na área cível.

As multas pela violação da FCPA ficaram estimadas em cerca de US$ 853 milhões, dos quais 10% (US$ 85,3 milhões) iriam para o Tesouro dos Estados Unidos, outros 10% (US$ 85,3 milhões) para a Comissão de Valores Mobiliários norte-americana (SEC, na sigla em inglês), e o restante, estimado em US$ 682 milhões, seriam destinados ao Brasil. Este último equivale a R$ 2,6 bilhões e representa o dinheiro do Fundo da Lava Jato, citado na publicação analisada pelo Comprova.

A verba foi depositada em janeiro em conta vinculada à 13ª Vara Federal de Curitiba. O Ministério Público Federal (MPF) sugeriu criar uma fundação privada para aplicar os recursos em projetos de saúde, educação e meio ambiente, mas a iniciativa foi criticada por não permitir a fiscalização de órgãos públicos. O dinheiro, então, foi bloqueado pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, que proibiu qualquer movimentação de valores sem autorização da Corte.

A criação da fundação estava prevista no acordo homologado na 13ª Vara Federal de Curitiba e, segundo a força-tarefa da Lava Jato, foi a alternativa encontrada porque os procuradores não concordaram em destinar os recursos para o fundo federal de direitos difusos (dinheiro na conta do Ministério da Justiça que financia projetos sociais), para a União ou para outras entidades. No dia 12 de março, foi anunciado que a instituição da organização seria suspensa, após a ação de Raquel Dodge no STF.

Ao STF, a procuradora-geral da República afirmou que a criação de uma fundação do Ministério Público com dinheiro da multa da Petrobras era ilegal e contrariava o princípio da impessoalidade por parte dos promotores. Aqui a íntegra da ação.

No dia 1º de abril, o procurador Deltan Dallagnol afirmou que a fundação seria da sociedade civil. “Teria uma cadeira do MP lá. O modelo foi o fundo federal dos direitos difusos, que tem uma cadeira do MP, e o objetivo dessa cadeira era permitir uma fiscalização maior e esperar que a estrutura de gestão desse fundo. Agora, seria uma cadeira de 10, 20 pessoas que teriam no conselho curador. Essa fundação não é do MP, não é da Lava Jato, não seria administrada pela Lava Jato, os recursos não iriam para o MP ao contrário do que originalmente se colocou”.

A íntegra do acordo entre a Petrobras e o Departamento de Justiça dos Estados Unidos pode ser consultado aqui. A proposta de uso do fundo para posterior fundação da Lava Jato está aqui.

A imprensa cobriu o uso do dinheiro para a Amazônia e a educação?

Notícias divulgadas por diversos veículos de imprensa – como o portal jurídico ConJur, a Folha de S.Paulo, revista Veja e o jornal O Globo – já mencionavam um acordo para destinação de verbas da Lava Jato para educação e meio ambiente. São mencionados dois processos no STF: ADPF 568 e a Rcl 33667. Ambos tratam da criação do fundo bilionário da Lava Jato, criado pelos procuradores de Curitiba, para a instituição de uma fundação privada de promoção ao combate à corrupção.

Em ambos os processos, a Procuradora-Geral da República, Raquel Dodge, se manifestou pela transferência dos valores para programas ligados à educação e ao meio ambiente.

Repercussão nas redes

O Comprova verifica conteúdos duvidosos sobre políticas públicas do governo federal que tenham grande potencial de viralização.

A publicação original na página Presidente Jair Bolsonaro #2022 tinha, no dia 13 de setembro, 390 reações e mais de 660 compartilhamentos.

Política

Investigado por: 2019-09-13

É falso que vídeo mostra apreensão de diamante gigante retirado da Amazônia por ONG estrangeira

  • Falso
Falso
Mineral que aparece em vídeo compartilhado em redes sociais é um tipo de cristal encontrado na Bahia em 2018, e não um diamante contrabandeado da região amazônica

São falsas as afirmações associadas a um vídeo publicado nas redes sociais que uma pedra preciosa de mais de duas toneladas teria sido apreendida pelo Exército brasileiro ou pela Polícia Federal (PF) em uma organização não governamental (ONG) estrangeira.

A gravação mostra, na verdade, um cristal rutilado encontrado por garimpeiros em 2018 no município baiano de Novo Horizonte. Procurados, o Centro de Comunicação Social do Exército e a assessoria de imprensa da Polícia Federal confirmaram não ter qualquer relação com o vídeo viralizado.

Algumas das postagens identificam o mineral incorretamente como um diamante ou como uma esmeralda, enquanto outras dizem que a pedra foi encontrada na Amazônia e que estaria sendo levada para fora do Brasil. Há ainda versões que alegam que a França seria o destino do cristal.

A informação de que se trata de um cristal foi passada ao Comprova pela Companhia Baiana de Pesquisa Mineral (CBPM), vinculada ao Estado da Bahia, e confirmada com o geólogo Osmar Martins dos Santos, responsável técnico pela cooperativa de garimpeiros da cidade.

Martins dos Santos disse ter analisado o cristal em questão, que foi avaliado em cerca de R$ 1 milhão. De acordo com o geólogo, a pedra pesava em torno de 400 quilos.

A identificação do mineral, assim como a localidade onde foi encontrada, foram corroboradas pelos depoimentos de especialistas em Mineralogia consultados pelo Comprova.

Esta verificação investigou publicações compartilhadas por múltiplos perfis pessoais no Facebook e no Twitter e no canal BomNotíciasTV, no YouTube, desde 8 de setembro.

Falso para o Comprova é o conteúdo divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.

Como verificamos

Para esta checagem, o Comprova entrevistou os professores especializados em Mineralogia Ciro Ávila, do Museu Nacional; Frederico Vilalva, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN); e Heinrich Theodor Frank, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

Também conversamos com o geólogo Osmar Martins dos Santos, responsável técnico pela cooperativa de garimpeiros do município de Novo Horizonte e com a assessoria de imprensa da Companhia Baiana de Pesquisa Mineral (CBPM). Ainda foram consultados os setores de comunicação do Exército e da PF.

Cristal de Novo Horizonte

Por meio do mecanismo de busca reversa de imagens do Google, que permite pesquisar registros anteriores de uma mesma imagem, o Comprova encontrou capturas de tela do vídeo viralizado em uma reportagem de 30 de agosto de 2019. O artigo relata que a gravação já havia circulado com alegação de que mostrava uma pedra encontrada na cidade de Nordestina, na Bahia.

Para apurar esta informação, o Comprova procurou a Companhia Baiana de Pesquisa Mineral. A empresa esclareceu que a pedra que aparece no vídeo não é um diamante ou uma esmeralda, mas sim um cristal rutilado, encontrado em 2018 no município de Novo Horizonte, e não na Amazônia.

O relato foi confirmado pelo geólogo Osmar Martins dos Santos, responsável técnico pela cooperativa de garimpeiros do município baiano, que afirmou ter analisado o cristal visto no vídeo.

“É bastante comum o cristal rutilado em Novo Horizonte”, disse ao Comprova, acrescentando que o tamanho da pedra que aparece no vídeo não é tão frequente. O geólogo disse ter avaliado a pedra em R$ 1 milhão. “Conheço a pedra e quem tirou”.

Os professores de Mineralogia Frederico Vilalva, da UFRN, e Heinrich Theodor Frank, da UFRGS, analisaram o vídeo a pedido do Comprova e concordaram com a identificação do mineral feita por Martins dos Santos.

“Sim, isso faz sentido”, afirmou Theodor Frank, quando questionado se a pedra vista no vídeo poderia ser um cristal rutilado. “Cristais de quartzo com inclusões de rutilo, na forma de agulhas douradas, são relativamente comuns. Quartzo rutilado se chama isso”, acrescentou.

“Rutilo é um mineral de cor castanho-dourada que parece com agulhas. Eles frequentemente são encontrados como inclusões dentro de cristais de quartzo”, disse Frederico Vilalva, acrescentando que este tipo de formação realmente é encontrada em Novo Horizonte.

O município baiano, por sua vez, não tem qualquer relação com o bioma amazônico, mencionado nas postagens, estando localizado em uma região de Caatinga, a mais de 500 quilômetros de Salvador.

Vilalva acrescentou ainda que cristais muito grandes como o mostrado no vídeo são típicos de rochas chamadas pegmatitos, que não são tão comuns na Amazônia.

Apontado como um dos responsáveis pela suposta apreensão do cristal, o Exército informou ao Comprova, por telefone, que não teve participação na atividade vista no vídeo. A Polícia Federal, mencionada em outras postagens, disse não ter chegado ao seu conhecimento “qualquer ocorrência nos moldes da descrita”.

Diamante de mais de duas toneladas?

Grande parte das publicações viralizadas identifica a pedra vista no vídeo como um diamante — possibilidade descartada por todos os especialistas consultados pelo Comprova.

Ciro Ávila, professor do Museu Nacional, destacou o fato de nunca ter visto relatos de um diamante deste tamanho ou forma. O maior diamante já encontrado no mundo pesava aproximadamente 620 gramas.

O professor de Mineralogia da UFRGS Heinrich Theodor Frank explicou por que isso acontece. “Diamantes sempre apresentam tamanhos pequenos (…) Quero lembrar que diamante se origina na base da litosfera, a 100 ou mais quilômetros de profundidade, sendo transportado para cima num evento vulcânico catastrófico. Pedra grande nenhuma resiste a esse fluxo ascendente destrutivo”, disse ao Comprova.

Além de não ser um diamante, a pedra vista no vídeo não tinha mais de duas toneladas, mas cerca de 400 quilos, como esclareceu o geólogo Osmar Martins dos Santos, responsável técnico pela cooperativa de garimpeiros de Novo Horizonte, onde o mineral foi encontrado.

Contexto

O boato sobre o cristal rutilado envolve quatro elementos que têm sido citados frequentemente em peças de desinformação recentes: a Amazônia, a França, as ONGs e a exploração mineral.

O aumento recente no número de queimadas na Floresta Amazônica levou a uma reação negativa do presidente francês, Emmanuel Macron, que indicou que a política ambiental brasileira poderia colocar em risco o acordo comercial entre os blocos da União Europeia e do Mercosul.

Desde então, Macron e o presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, têm se desentendido. O brasileiro chegou a dizer que não aceitaria a ajuda econômica para combater incêndios oferecida pelo G-7, o grupo dos países mais ricos do mundo, até que o líder francês retirasse “insultos” contra ele.

Outro momento de tensão ocorreu quando o perfil oficial de Bolsonaro no Facebook riu de uma ofensa dirigida à primeira-dama francesa, Brigitte Macron. Em resposta, o presidente francês disse esperar que os brasileiros “tenham um presidente que se comporte à altura”.

Bolsonaro também criou antagonismo com as organizações da sociedade civil. O presidente sugeriu — sem provas — que eram as ONGs que estavam por trás das queimadas na Amazônia. O Observatório do Clima, grupo formado por 50 entidades, reagiu e criticou a “irresponsabilidade” do que chamam de “antipolítica ambiental” do governo.

A Amazônia é considerada uma área estratégica por Bolsonaro. Em abril, ele defendeu a mineração na região, com exploração da Reserva Nacional de Cobre e Associados (Renca). “A Amazônia pode ser uma solução para o mundo e não um problema para nós”, disse ele. “Vocês não terão problema com o ministro do Meio Ambiente, de Minas e Energia ou de qualquer outro.”

A Renca é uma área do tamanho do estado do Espírito Santo, rica em ouro, ferro e cobre. A reserva foi criada em 1984 para assegurar que o governo tivesse monopólio sobre a exploração mineral na região. No entanto, depois foram estabelecidas restrições para a mineração na área, como reservas indígenas e unidades de conservação de proteção integral e de uso sustentável.

O Comprova verificou, no final de agosto, uma publicação que sugeria, de forma enganosa, que as organizações não-governamentais que atuavam na Amazônia estavam interessadas em extrair minério da região.

Outro boato relacionado desmentido pelo Comprova alegava que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva havia vendido o solo da Amazônia para exploração de uma empresa norueguesa de mineração.

Repercussão nas redes

O Comprova verifica conteúdos duvidosos sobre políticas públicas do governo federal que tenham grande potencial de viralização.

Localizamos ao menos três perfis pessoais no Facebook que compartilharam o vídeo com legenda falsa e somavam 323 mil visualizações desde o dia 9 de setembro. A gravação também foi compartilhada no Twitter e obteve 17,8 mil visualizações desde 8 de setembro. No YouTube, a publicação no canal BomNoticiasTV, feita em 10 de setembro, alcançou 174 mil visualizações. As medições foram feitas no dia 12 de setembro.

Os sites Agência Lupa, Boatos.Org e E-Farsas também checaram esse conteúdo.